O termo "Linha Maginot" é originário da primeira guerra mundial e se refere à construção de um sistema de fortificações para defesa da França contra seus agressores. Infelizmente, ele foi usado como metáfora para algo em que se utiliza apesar da sua ineficiência. Contudo, a Linha Maginot cumpriu o que se propunha: ela protegeu uma parte da França e forçou o inimigo a contorná-la via mar do Norte, pois a sua construção foi interrompida antes de chegar até lá. Este não é o caso do Brasil; a nossa Linha Maginot contra a crise externa e a volatilidade da taxa de câmbio perfaz USD 375 bilhões. Ou seja, ela está muito sólida e é difícil contorná-la principalmente após as fortificações reforçadas advindas dos IOFs da vida.
A fim de analisar isso, neste relatório nós mensuramos os fluxos líquidos e a oferta de dólares pelo saldo de derivativos - em um contexto de crise e elevação da volatilidade cambial -, as intervenções do Banco Central e a resposta de nossos modelos a este cenário. De olho apenas nos fluxos e nos derivativos, percebemos três fatores pressionando a desvalorização do real: (i) enfraquecimento do fluxo líquido de dólares, especialmente pela via financeira, (ii) posição total liquida vendida em real por parte dos estrangeiros no mercado de derivativos e, (iii) até o final de abril, as compras de dólares por parte do BC.
Esses três movimentos combinados com o acirramento da crise externa, o que aumenta a volatilidade da taxa de câmbio em relação à sua tendência estrutural, levariam o real médio mensal para o intervalo entre 1,95/USD e 2,02/USD no curto prazo. Além disso, acreditamos que o BC deve vender dólares no mercado a fim de manter o teto do real entre 2,05/USD e 2,11/USD entre maio e agosto. Os nossos cálculos para as intervenções do BC levam em consideração muito mais os efeitos disruptivos do aumento da desvalorização cambial e da abrupta elevação de sua volatilidade sobre o ambiente de negócios e sobre os investimentos corporativos do que o repasse da desvalorização do real para a inflação. Em outras palavras, caso o BC deixe a depreciação do real escorregar para níveis superiores a 2,10/USD, assumindo (é claro) elevada volatilidade, a nossa projeção para taxa de crescimento do PIB em 2012 seria revisada para um patamar inferior aos 2,3% que estimamos atualmente.
O presente texto é elaborado pela equipe de pesquisa econômica do PINE, banco focado em soluções de crédito para grandes empresas.
PINE Flash Note: Câmbio - O sucesso da "Linha Maginot Tupiniquim"
1. Pine Flash Note: Câmbio – O sucesso da “Linha Maginot Tupiniquim”
24 de maio de 2012
O Banco Central divulgou ontem à tarde os números do fluxo cambial referentes à terceira
semana de maio, encerrada no último dia 18. Em comparação com as duas primeiras
semanas, destacamos:
• O fluxo comercial líquido (exportação menos importação) permanece positivo (USD
1,9bi), com números robustos frente à média histórica e à média observada desde o
início do ano; mais interessante, a melhora do saldo comercial líquido se deu tanto
pela ampliação das exportações (de USD 5,1bi para USD 5,7bi) quanto pela redução
das importações (de USD 4bi para USD 3,8bi). No mês, contudo, o fluxo comercial
acumulado (USD 3,7bi) perde força frente a abril (USD 7,5bi) e março (USD 6bi).
Provavelmente, a desvalorização do real no mês passado frente a março e
fevereiro, os IOFs (de outrora) sobre as posições vendidas em moeda estrangeira
e, principalmente, as expectativas de desvalorização mais significativa do real
frente ao dólar levaram os exportadores a postergarem as vendas da moeda norte-
americana.
• O fluxo financeiro líquido (compra menos venda de ativos financeiros) permanece
negativo, com aceleração de sua queda para -USD 2,8bi; de fato, esta linha é
responsável pelo recuo preliminar, observável no gráfico abaixo, do saldo líquido total
de maio (comercial líquido decrescido do fluxo financeiro líquido). Para efeitos de
comparação mensal, fizemos as respectivas médias diárias (já que maio ainda não
acabou) que confirmam a forte influência da saída líquida de fluxos financeiros sobre
desvalorização do real rumo a 2,0/USD (em média). Não há dúvida que a combinação
de IOFs sobre posições vendidas em dólares com o acirramento da crise europeia
responde pela saída líquida de dólares via segmento financeiro, pela queda da
liquidez no mercado spot e futuro de câmbio e pela forte desvalorização do real
no curto prazo.
Fluxo líquido de dólares (comercial e financeiro) – média mensal diária
775 média diária (USD mln)
575
375
175
(25)
(225)
(425)
jul-11
jan-11
jan-12
abr-11
abr-12
out-11
(X-M) Financeiro líquido Saldo
Fonte: BC; elaboração: Pine Research
• Levando em consideração apenas o enfraquecimento do fluxo, entendemos a queda
do apetite do BC nas compras de dólares, o qual não havia feito nenhuma intervenção
no câmbio ao longo de maio (até o dia 18) em função das baixíssimas liquidez e
1
2. volatilidade de mercado. O inverso ocorreu em março e abril, quando o BC mais do
que enxugou o saldo líquido de entrada de dólares (ver gráfico abaixo), apesar de o
nível de volatilidade ter permanecido relativamente baixo nos dois meses anteriores,
indicando o claro objetivo do BC de desvalorizar o real.
Fluxo líquido de dólares x intervenções do BC no mercado de câmbio
15.000
12.500
10.000
7.500
5.000
2.500
0
-2.500
-5.000
jan-11
jan-12
abr-11
abr-12
jul-11
out-11
Saldo Intervenções BC
(Comercial+Financeiro) (+ compra)
Fonte: BC; elaboração: Pine Research
Para termos uma ideia mais ampla da oferta de dólares no país, ou seja, não restrita apenas
ao mercado spot de divisas estrangeiras, nós acompanhamos a posição líquida dos
estrangeiros tanto no dólar futuro quanto no mercado de cupom cambial (DDI). Estas têm
pouco oscilado em torno de zero (sem direção clara pró-real ou pró-dólar) desde meados de
abril. Entretanto, desde a segunda semana de maio, as posições líquidas vendidas em reais,
ou pró-dólar, têm sido caracterizadas por um pouco mais de tração. O gráfico abaixo também
ilustra a força das medidas do governo para conter as apostas no real apreciado no mercado
futuro.
Posições líquidas dos bancos estrangeiros
17.000
12.000 Vendido
BRL
7.000
2.000
-3.000
-8.000
-13.000 Comprado
BRL
-18.000
-23.000
jan-09
jan-10
jan-11
jan-12
jul-09
jul-10
jul-11
Estrangeiros BMF
Fonte: BM&F; elaboração: Pine Research
2
3. Logo, de olho apenas nos fluxos e nos derivativos, percebemos três fatores pressionando a
desvalorização do real: (i) enfraquecimento do fluxo líquido de dólares, especialmente pela
via financeira, (ii) posição total liquida vendida em real por parte dos estrangeiros no
mercado de derivativos e, (iii) até o final de abril, as compras de dólares por parte do BC.
Fluxo líquido total de dólares + saldo de derivativos x R$/USD
jan-07
jan-08
jan-09
jan-10
jan-11
jan-12
jul-07
jul-08
jul-09
jul-10
jul-11
-15.000 2,5
-10.000 2,4
-5.000 2,3
2,2
0
2,1
5.000
2,0
10.000
1,9
15.000
1,8
20.000 1,7
25.000 1,6
30.000 1,5
FLUXO TOTAL (saldos + derivativos)
BRL médio
Fonte: BC e BM&F; elaboração: Pine Research
Esses três movimentos combinados com o acirramento da crise externa, o que aumenta a
volatilidade da taxa de câmbio em relação à sua tendência estrutural, levariam o real médio
mensal para o intervalo entre 1,95/USD e 2,02/USD no curto prazo (entre junho e setembro).
Essas duas curvas estão representadas pelas duas linhas inferiores da região hachurada no
gráfico a seguir. A linha inferior mostra a tendência que calculamos para o real, em torno de
1,75/USD, se não houvesse tanto crise (portanto, com volatilidade muito baixa) quanto
distorções de impostos e contribuições. A linha imediatamente superior à tendência mostra o
câmbio médio mensal contaminado por crises externas, volatilidade mais alta e distorções
advindas dos IOFs da vida. Logo, o teto do real no gráfico abaixo (ver a linha Sup mensal_vol)
descreve o eventual caminho extremo (superior) do câmbio no curto prazo (de maio a
agosto), entre 2,11/USD e 2,20/USD, caso o BC não interviesse no mercado por meio da venda
de dólares via derivativos. Logo, o BC deve vender dólares no mercado a fim de manter o
teto do real entre 2,05/USD e 2,11/USD entre maio e agosto, o que está representado no
gráfico por meio da linha Câmbio_BC.
Os nossos cálculos para as intervenções do BC levam em consideração muito mais os efeitos
disruptivos do aumento da desvalorização cambial e da abrupta elevação de sua volatilidade
sobre o ambiente de negócios e sobre os investimentos corporativos do que o repasse da
desvalorização do real para a inflação. Em outras palavras, caso o BC deixe a depreciação do
real escorregar para níveis superiores a 2,10/USD, assumindo (é claro) elevada volatilidade, a
nossa projeção para taxa de crescimento do PIB em 2012 seria revisada para um patamar
inferior aos 2,3% que estimamos atualmente.
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4. Modelo Pine de câmbio: tendência e vol x extremos e intervenções do BC
BRL: tendência (modelo estrutural) x vol
2,5
2,4
2,3
2,2
2,1
2,0
1,9
1,8
1,7
1,6
1,5
jan/08
jan/09
jan/10
jan/11
jan/12
mai/08
mai/09
mai/10
mai/11
mai/12
set/08
set/09
set/10
set/11
set/12
Sup mensal_vol Média mensal_tendência
Média mensal_vol Câmbio_BC
Fonte: Bloomberg; elaboração: Pine Research
Marco Antonio Maciel Marco Antonio Caruso
Economista-chefe Economista
Banco Pine Banco Pine
Disclaimer: Esta matéria é de caráter estritamente informativo. O Pine não se responsabiliza por
quaisquer decisões tomadas tendo como base os dados e comentários contidos neste material.
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