1. Asininos e Muares
mostram sua força econômica
Os asininos e muares possuem grande impor- muares no mundo. De acordo com os dados da
tância no Brasil. Esta importância pode ser obser- FAO, 82 países apresentavam criação de muares,
vada sob diferentes óticas: histórica, social e eco- totalizando 12.445.650 cabeças em 2005. Desta-
nômica. A história e o desenvolvimento do Brasil ca-se que a tropa de mulas encontra-se concentra-
estão fortemente associados a esses animais. A in- da em poucos países: 80% dos muares do mundo
Roberto Arruda de tegração do território nacional só foi possível com todo vivem em apenas seis países.
Souza Lima as longas viagens dos tropeiros, assim como o trans-
Engenheiro agrônomo, Tabela 1 - Mundo: Principais criadores
porte das riquezas minerais no Brasil Colonial não
Doutor em de muares, em 2005
Economia Aplicada, se concretizariam sem os asnos e mulas. Mesmo
Efetivo
Prof. da ESALQ/USP , no início do transporte ferroviário brasileiro a pre- Posição País Percentual
(cabeças)
Pesquisador do CEPEA sença desses animais era tão marcante que um de
raslima@esalq.usp.br 1º China 3.739.500 30,05%
seus diversos nomes populares – jegue – tem ori-
gem na denominação em inglês para jumento (jack1), 2º México 3.280.000 26,35%
idioma utilizado pelos diversos trabalhadores estran- 3º Brasil 1.209.352 11,32%
geiros empregados nas empresas ferroviárias. Nos
4º Colômbia 630.000 5,06%
quase quinhentos anos da presença no Brasil, a for-
ça e valor dos asininos e muares sempre foi reco- 5º Marrocos 563.000 4,53%
nhecida por quem trabalhava próximo a eles, mas 6º Etiópia 350.000 2,81%
pouco valorizada pela população mais distante, prin- 7º Peru 290.000 2,33%
cipalmente a urbana. Recentemente, eventos e no-
8º Paquistão 251.000 2,02%
tícias em diferentes mídias têm resgatado a impor-
FONTE: FAO (2008)
tância desses animais. Leilões, alguns transmitidos 9º Argentina 185.000 1,49%
inclusive pela televisão, têm apresentado procura 10º Índia 176.000 1,41%
crescente e resultados satisfatórios, com animais
negociados na faixa de R$ 20.000 (em leilão reali- Os asininos estão melhor distribuídos ao redor
zado na Gameleira, em Belo Horizonte, houve arre- do mundo. Os dez maiores países criadores con-
mate de animal por cerca do dobro desse valor, em centravam cerca de 70% do total mundial animais
junho passado). em 2005 (Tabela 2). O Brasil possuía, segundo
No entanto, pouco se tem publicado sobre os dados da FAO para aquele ano, a sétima maior tro-
aspectos econômicos. Mesmo as estatísticas ofici- pa de asininos. Em 2005 havia 40.953.809 asininos
1
Em inglês, o asinino macho é
denominado jack e a fêmea jenny. ais são escassas. Por exemplo, o IBGE ao divulgar no mundo.
2
Conforme já discutido em arti- dados preliminares do Censo 2006, informou o efe-
gos anteriores nesta revista, por
ocasião do Censo, recenseado- tivo de bovinos, ovinos, caprinos, suínos, entre Tabela 2 - Mundo: Principais criadores
res visitam e recolhem informa-
outros, mas somente em 2009 divulgará informa- de asininos, em 2005
ções, através de entrevistas com
pessoas aptas a responderem os ções sobre qual é o real número de asininos e mua- Efetivo
questionários, de todos os esta- Posição País Percentual
belecimentos agropecuários, flo- res no Brasil. Enquanto aguardamos os resultados (cabeças)
restais e/ou aqüícolas do país que
tiveram atividades durante o ano do Censo Agropecuário (que possivelmente trará 1º China 7.919.100 19,34%
de referência (no caso atual,
2006). No entanto, realizar tal le-
números inferiores às estimativas atuais2), pode-se
2º Etiópia 4.265.194 10,41%
vantamento é algo muito caro, de
modo que não é feito todo ano. O
discutir algumas informações da FAO (Food and
Censo Agropecuário anterior re- Agriculture Organization, a Organização das nações 3º Paquistão 4.199.000 10,25%
fere-se ao ano agrícola 95/96.
Neste longo intervalo entre os Unidas para Agricultura e Alimentação) e da Pes- 4º México 3.260.000 7,96%
Censos, a principal fonte de da-
dos sobre populações e produ- quisa Pecuária Municipal. 5º Egito 3.070.000 7,50%
ção pecuária é a Pesquisa Pecu-
ária Municipal (PPM). Diferente-
O Brasil destaca-se entre os países criadores.
6º Irã 1.600.000 3,91%
mente do Censo, na PPM o efetivo Segundo dados da FAO referente ao ano de 2005
dos rebanhos é estimado pelo
IBGE com base em informantes (informação disponível mais recente), o efetivo bra- 7º Brasil 1.170.000 2,86%
municipais qualificados envolvi-
dos com a pecuária (por exem- sileiro de muares era o terceiro maior do mundo, 8º Nigéria 1.050.000 2,56%
FONTE: FAO (2008)
plo: sindicatos, cooperativas,
instituições de crédito, entre ou-
atrás apenas de China e México, e mais de duas 9º Burkina Faso 1.028.127 2,51%
tros). Assim, é normal ocorrer di- vezes maior que o quarto colocado (Colômbia). A
vergências e correções após a 10º Marrocos 959.000 2,34%
divulgação do Censo. Tabela 1 apresenta os dez maiores criadores de
2. No comércio internacional, o Brasil tem se mos-
trado bastante discreto (Figura 1). No período de
janeiro de 1999 a setembro de 2008, as importa-
ções e exportações totalizaram US$ 132.050 dóla-
res (US$ 11.894 em importações e US$ 120.156
em exportações), segundo dados oficiais do Minis-
tério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior (MDIC). Entre as operações no período,
destacam-se as exportações ocorridas para Vene-
zuela em 2005 (37 animais, totalizando US$ 65.451).
As importações ocorreram apenas nos anos de
FONTE: MDIC (2008)
2001, 2002 e 2004. Nesses três anos, 12 animais
foram importados, com preços díspares. Enquanto Figura 1 - Brasil: exportações e importações de asininos e muares no
apenas um animal importado da Bélgica custou US$ período de janeiro de 1999 a setembro de 2008.
5.000 (em 2002), o valor médio dos animais origi-
nários do Uruguai foi de US$ 400. Na última déca-
da, apenas quatro países (Argentina, Bélgica, Uru-
guai e Suíça) comercializaram seus animais para o
Brasil (Figura 2)
As exportações de asininos e muares, embora
superiores às importações, também foram modes-
tas nos últimos dez anos. Segundo dados oficiais,
apenas 86 animais foram exportados na última dé-
cada. O principal país comprador foi a Venezuela
(37 animais), respondendo por mais da metade do
volume de divisas ingressadas no Brasil. Os valo-
FONTE: MDIC (2008)
res médios dos animais exportados apresentaram
Figura 2 - Brasil: Importações de asininos e muares no período de
grandes diferenças conforme o destino, variando
janeiro de 1999 a setembro de 2008, por país de origem.
de US$ 383 (para Espanha) até US$ 2.000/animal
(para Alemanha). Os animais exportados pelo Bra-
sil na última década tiveram como destino apenas
sete países, conforme ilustrado pela Figura 3.
De acordo com os últimos dados disponíveis
pelo IBGE, em 2006 havia 1.187.419 asininos e
1.386.015 muares no Brasil. É interessante obser-
var que a distribuição desses animais por microrre-
giões geográficas é diferente, inclusive quando com-
parada à distribuição de eqüinos. Analisando as 558
microrregiões geográficas do Brasil encontram-se,
para o ano de 2006, os seguintes índices de corre-
lação (Tabela 3):
FONTE: MDIC (2008)
Figura 3 - Brasil: Exportações de asininos e muares no período de
FONTE: ELABORADO A PARTIR DE DADOS DO IBGE (2008)
Tabela 3 - Brasil: Correlação entre os efetivos de
asininos, muares e eqüinos em 2006 janeiro de 1999 a setembro de 2008, por país de destino.
Asinino Muar Eqüino
Asinino 1
Muar 0,407 1
Eqüino 0,178 0,451 1
A Região Nordeste concentra o maior número (a) Asininos (b) Muares
tanto de asininos quanto de muares. Já a região Sul
FONTE: IBGE (2008)
é a que apresenta o menor número desses animais. Figura 4 - Brasil: Distribuição do efetivo de asininos e muares por
A Figura 4 mostra a distribuição regional dos asini- Região em 2006.
nos e muares.
3. Tabela 4 - Brasil: evolução do efetivo de asininos, por Unidade da Federação, no período de 2000 a 2006 Cinco estados concentram 80%
da população brasileira de asininos:
UF 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 Variação entre 2000 e 2006 Bahia (26,4%); Piauí (17,3%); Ceará
RO 1.298 1.364 1.666 1.901 1.790 2.695 1.974 52,08% (17,2%); Maranhão (10,5%) e Per-
AC 457 459 464 503 577 608 758 65,86% nambuco (8,6%). Observando os
AM 311 314 338 358 371 371 427 37,30% dados de 2000 até 2006, nota-se que
PA 22.395 21.436 23.439 23.223 25.251 22.321 22.823 1,91% o efetivo tem se reduzido nas regiões
AP 266 299 328 278 318 413 489 83,83%
Nordeste e Sul, enquanto nas demais
TO 15.841 16.004 15.649 15.787 15.042 14.630 14.829 -6,39%
regiões observa-se crescimento do
MA 146.152 144.255 142.740 135.151 129.896 127.382 124.994 -14,48%
número de cabeças (Tabela 4).
PI 203.240 204.084 204.886 205.465 206.233 206.929 205.717 1,22%
Os muares encontram-se melhor
CE 198.425 198.637 199.938 201.951 202.150 203.533 203.716 2,67%
RN 60.089 59.677 63.300 63.341 63.068 62.586 57.738 -3,91%
distribuídos pelo território nacional,
PB 61.811 59.408 58.107 56.917 54.734 52.787 51.265 -17,06% mas ainda concentrados. Quatro es-
PE 88.425 89.985 92.510 95.458 95.298 97.310 102.173 15,55% tados concentram 50% da população
AL 7.804 8.065 8.068 8.870 9.294 10.041 10.572 35,47% brasileira de muares: Bahia (23,4%);
SE 9.765 9.316 9.466 9.632 9.748 10.047 10.644 9,00% Minas Gerais (12,6%); Maranhão
BA 365.583 365.420 336.470 329.725 321.880 315.160 313.339 -14,29% (7,4%) e Pará (7,3%). Observando
MG 30.627 31.105 30.695 30.500 30.909 35.119 35.918 17,28% os dados de 2000 até 2006, observa-
ES 1.887 1.890 1.879 1.783 1.764 1.724 1.747 -7,42% se crescimento do efetivo nas regiões
RJ 2.097 1.937 1.722 1.988 2.076 2.091 2.153 2,67% de fronteira agrícola (regiões Norte e
SP 7.022 7.065 7.110 7.192 7.131 6.717 6.338 -9,74% Centro-Oeste), enquanto houve redu-
PR 3.471 3.319 3.251 3.148 3.047 3.025 3.043 -12,33% ção de 13% na Região Sul. Pará e Mato
SC 487 415 509 507 498 495 528 8,42% Grosso destacam-se pelo crescimen-
RS 1.710 1.629 1.612 1.785 1.563 1.502 1.503 -12,11% to (30,44% e 31,58%, respectivamen-
MS 3.638 3.710 3.802 3.881 3.935 3.987 4.042 11,11%
te) sobre uma base (número de cabe-
Fonte: IBGE (2008)
MT 3.786 3.790 3.832 3.875 4.146 4.182 4.589 21,21%
ças) que já era significativa em 2000
GO 5.490 5.342 5.236 5.351 5.525 5.802 6.030 9,84%
(Tabela 5).
DF 100 100 105 90 80 76 70 -30,00%
Os números apresentados ressal-
Tabela 5 - Brasil: evolução do efetivo de muares, por Unidade da Federação, no período de 2000 a 2006
tam a importância e evolução quanti-
tativa dos asininos e muares. Entre-
UF 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 Variação entre 2000 e 2006 tanto, deve ser destacado que tem
RO 15.990 16.793 17.924 21.105 21.230 28.825 25.172 57,42% havido importante alteração qualitati-
AC 4.294 4.266 4.899 5.423 6.455 6.699 8.242 91,94% va, para melhor, com eventos (expo-
AM 791 802 856 884 908 908 978 23,64% sição e leilões) com crescente interes-
PA 77.405 78.907 87.706 88.365 92.943 102.736 100.969 30,44% se, evolução na genética e controle
AP 518 528 578 543 744 1.008 999 92,86% (como no reconhecimento dos regis-
TO 59.096 59.183 57.803 57.632 55.927 54.406 54.209 -8,27% tros de muares pelo MAPA – Ministé-
MA 101.049 101.404 102.059 100.516 100.197 102.997 102.770 1,70% rio da Agricultura, Pecuária e abaste-
PI 38.518 38.424 38.382 38.276 38.115 38.001 37.921 -1,55%
cimento) e ações da associação Bra-
CE 76.119 76.662 77.295 77.823 78.477 78.858 79.516 4,46%
sileira dos Criadores do Jumento
RN 20.686 20.910 21.108 20.868 20.900 21.848 21.894 5,84%
Pega, entre outros fatos.
PB 25.576 25.444 25.019 24.688 24.146 23.643 23.972 -6,27%
PE 59.923 57.674 59.664 58.496 58.617 60.734 60.177 0,42%
Concluindo este artigo que buscou
AL 23.143 23.522 19.676 21.886 22.516 23.102 23.180 0,16% apresentar uma visão da dimensão da
SE 15.604 15.563 15.759 15.905 16.601 16.984 17.575 12,63% tropa de asininos e muares no Brasil,
BA 329.713 327.384 317.220 312.581 315.892 323.801 324.014 -1,73% é interessante destacar as oportunida-
MG 174.256 174.576 169.967 172.775 175.684 172.993 174.533 0,16% des que estão abertas aos criadores
ES 14.728 14.878 14.990 15.064 15.330 15.270 15.371 4,37% desses animais com a tendência no
RJ 14.936 14.855 14.726 14.907 15.618 15.951 15.870 6,25% Brasil – e em outras partes do mundo
SP 85.843 83.806 80.081 79.538 78.254 76.291 74.419 -13,31% (em especial nos Estados Unidos) –
PR 59.425 57.496 56.617 56.461 55.355 54.038 52.479 -11,69% das cavalgadas e atividades associa-
SC 2.725 2.606 2.644 2.646 2.466 2.721 2.609 -4,26% das ao turismo rural. O conforto e
RS 7.704 7.504 6.926 6.790 6.240 5.893 5.660 -26,53% demais qualidades de asininos e mua-
MS 42.795 43.398 44.027 45.289 45.863 46.515 46.791 9,34% res proporcionam boas perspectivas
FONTE: IBGE (2008)
MT 55.436 56.986 61.167 64.899 67.422 71.312 72.945 31,58%
de negócios, até mesmo no pouco ex-
GO 41.362 41.865 41.837 41.829 42.339 42.961 43.590 5,39%
plorado comércio internacional (ex-
DF 220 220 231 200 180 170 160 -27,27%
portações).