Este documento apresenta um estudo realizado por alunas de Arquivologia sobre a relação entre a dança e a Arquivologia. Ele descreve uma oficina realizada onde analisaram um vídeo de tango usando os conceitos de Diplomática e Tipologia Documental. O documento explica como esses conceitos foram aplicados para analisar as características formais e internas do vídeo, relacionando-os aos elementos da dança e da criação de um espetáculo.
Novena de Pentecostes com textos de São João Eudes
Trabalho final
1. Universidade de Brasília
Faculdade de Ciência da Informação
Diplomática e Tipologia Documental
Professor: André Porto Ancona Lopez
A Relação entre a Arquivologia e a Dança
Um estudo dos elementos Diplomáticos e Tipológicos
em documentos não convencionais
Elkelly Alves Franco
Flávia Helena do Espírito Santo
Julia Araújo Donato
Natália Elisa Lucchetti
Brasília, 2015
2. Introdução
Este artigo é resultado do trabalho de alunas da matéria de Diplomática e
Tipologia Documental, do curso de bacharelado em Arquivologia. O tema que
escolhemos para ser trabalhado ao longo do semestre foi a dança, por ser uma
linguagem corporal universal. Também achamos que seria interessante o desafio de
estudar sobre um tema que não fosse tão obviamente ligado à Arquivologia.
A Arquivologia, segundo o Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística,
é a disciplina que estuda as funções do arquivo e os princípios e técnicas a serem
observados na produção, organização, preservação, utilização e guarda dos arquivos. O
objeto de estudo dessa área é o documento de arquivo que, segundo a Resolução nº
20/2004 do CONARQ, é a informação registrada, independente da forma ou do suporte,
produzida e recebida no decorrer das atividades de um órgão, entidade ou pessoa,
dotada de organicidade e que possui elementos constitutivos suficientes para servir de
prova dessas atividades.
Assim, esses documentos arquivísticos, além de provar as atividades, são
fundamentais para tomar decisões, recuperar informações e preservar a memória. Ainda,
alguns arquivos são de cunho probatório e/ou histórico, podendo conter informações
científicas e culturais, dessa forma, torna-se necessária a guarda permanente. Esse valor
permanente atrelado aos documentos é resultado de uma natural acumulação, ou seja, é
um valor que já nasce com o documento.
Para que a Arquivologia possa ser posta em prática, no que diz respeito à
organização da informação, uma análise documental fornecida pela Diplomática precisa
ser realizada. Esta possui um ponto em comum com a Arquivologia: o documento de
arquivo como objeto de análise. Desse modo, o arquivista possui base para estudar a
Tipologia documental e, assim, compreender o processo de criação dos documentos
contemporâneos que, devido a grande burocracia brasileira, possuem características
variadas.
A Diplomática nos permite analisar as características extrínsecas do documento,
visando atestar sua autenticidade e validar seus aspectos jurídicos, e nos ajuda, também,
a compreender o processo de criação dos documentos contemporâneos.
3. Contextualizando: Diplomática e Dança
A contextualização da matéria com o nosso tema nos veio ao pensarmos nos
documentos que seriam produzidos a partir da criação de um espetáculo de dança.
Existem várias pessoas físicas e jurídicas envolvidas neste processo, como figurinistas,
roteiristas, maquiadores, professores, dançarinos, instituições (como os lugares nos
quais os espetáculos são apresentados), entre outros.
Neste contexto, podemos pensar em documentos convencionais, que são
produzidos antes do espetáculo em si, como os contratos firmados entre os dançarinos e
a companhia de dança, por exemplo. Mas e o documento que nos mostra o resultado
final do espetáculo? Qual seria o documento que melhor representa e reproduz a dança
propriamente dita?
Foi então que pensamos no universo musical como um todo. A partitura com as
notas musicais reproduz fielmente a música como ela deve ser tocada, seja em um
piano, em uma guitarra ou em um violão. Mas como podemos reproduzir, da mesma
maneira, os movimentos corporais presentes na coreografia de um espetáculo de dança?
A resposta nos veio em formato de gravação de mp4. O vídeo é o documento
que possui o poder de reproduzir perfeitamente a movimentação típica e única de cada
dançarino de modo detalhado, como nenhum outro instrumento é capaz de fazer.
Para representar bem o nosso trabalho de seminário – que foi realizado em
formato de Oficina no dia 6 de novembro, na Universidade de Brasília – escolhemos o
vídeo de tango do Projeto Projeto PÉS? (mais informações aqui) como objeto de
análise.
A Oficina foi outro trabalho realizado no âmbito da matéria de DTD, que visava
representar a ligação do estudo dos documentos ao tema que cada grupo escolheu no
começo do semestre e reproduzir isto de maneira que qualquer pessoa que passasse no
local da apresentação pudesse compreender. O evento teve duração de três horas, e
contamos com a presença de cerca de cinquenta ouvintes.
O tema da nossa Oficina foi o Tango, motivo pelo qual, nosso trabalho teve o
nome de “Milonga Arquivística” ou “Da Milonga à Arquivologia”.
Fizemos também a Oficina Virtual, que pode ser acessada no blog
(www.dancarq.blogspot.com.br) que criamos para realizar as atividades da matéria
neste link Milonga Arquivistica Virtual. Reproduzimos tudo o que foi mostrado na
4. Oficina presencial, de modo que nossos leitores pudessem participar da Oficina, mesmo
sem ter comparecido pessoalmente em nossa apresentação.
O objetivo final do nosso trabalho da Disciplina de Diplomática e Tipologia
Documental é fazer com que nossos leitores entendam a relação que a dança tem com o
estudo dos documentos, à medida que mostramos várias análises de documentos
convencionais e não convencionais ao longo do semestre.
Estudo dos Elementos Diplomáticos e Tipológicos
Quando falamos de documentos arquivísticos, nos referimos a documentos que
estejam inseridos em um contexto organizacional. Ao acrescentarmos a dança neste
conceito, nos deparamos com vários tipos documentais inseridos neste contexto de
produção de um espetáculo de dança. A Instituição Produtora dos documentos
envolvidos com a dança tem várias pessoas trabalhando para a criação de um
espetáculo, como falamos anteriormente.
Todas estas pessoas geram uma demanda para a criação de documentação
envolvida com contratação, pagamento de honorários e direitos, enfim, atividade meio.
Além dos documentos referentes à atividade fim, que seria a realização dos espetáculos
(por exemplo, o vídeo que iremos analisar posteriormente).
Para falarmos sobre o processo de criação dos documentos, precisamos,
primeiramente, entender as Funções das Instituições. Como assim Funções? Estamos
falando das Funções Arquivísticas e Administrativas.
A Função Arquivística, nada mais é do que as atividades exercidas no âmbito do
Produtor Arquivístico, por exemplo: divulgação e comprovação da produção artística,
pesquisa de criação e execução de movimentos, prestação de contas, entre outras.
Já a Função Administrativa se refere à finalidade administrativa do documento,
no caso do vídeo analisado seria a reprodução da apresentação do Espetáculo com o
intuito de capturar o desenvolvimento coreográfico.
Na nossa Milonga, para explicarmos o passo a passo das análises realizadas,
fizemos uma analogia dos conceitos da Arquivologia com os passos do Tango. Como já
sabemos, quando analisamos diplomaticamente um documento, estamos focados na
estrutura formal do documento. Então, podemos comparar a estrutura Diplomática, à
estrutura do Tango e da Milonga: elementos como a postura dos dançarinos, os passos
5. harmônicos, o abraço e o sentido no qual se dança dentro de um salão (sentido anti-
horário, para os homens).
A seguir a Análise Diplomática do vídeo do Projeto PÉS? (disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=3xWyC2rKjLY):
Espécie: "configuração que assume um documento de acordo com a disposição
e a natureza das informações nele contidas" (AAB/SP, 1996, p. 34.); ex: folder,
memorando, resolução etc.
Formato: "configuração física de um suporte, de acordo com a sua natureza e o
modo como foi confeccionado" (AAB/SP, 1996, p. 39); ex: banner, cartaz, livro,
folha avulsa etc.
Gênero: "configuração que assume um documento de acordo com o sistema de
signos utilizado na comunicação de seu conteúdo" (AAB/SP, 1996, p. 41); ex:
textual, sonoro, imagético etc.
Forma: completude de um documento; ex: cópia, original, rascunho etc.
Denominação: descrição do que é o documento; ex: Gravação Audiovisual de
Espetáculo de Tango.
Definição: definir o documento, destacando sua finalidade; ex: Gravação de um
vídeo durante a apresentação coreográfica do grupo, com o intuito de capturar os
movimentos e coreografia.
Suporte: "material sobre o qual as informações são registradas" (AAB/SP,
1996, p. 72); ex: pen drive – no caso do vídeo reproduzido no dia da Oficina – o
suporte, no caso do vídeo disponibilizado na Internet, o suporte é o YouTube.
Dimensão: porção de espaço ocupado por um documento; ex: 32,1 MB
(00:03:14).
Sinais de validação: "marcam a autenticidade de atos e documentos" (LOPEZ,
2012, p.23); ex: carimbos, assinaturas, marcas d’água, logomarcas, metadados
(sinais ocultos de documentos digitais).
A Tipologia é o "conjunto de elementos formais que caracterizam um
documento de acordo com as funções a que se destina" (Funções Arquivísticas e
Administrativas), ou seja, é a análise intrínseca de um documento em relação à sua
gênese documental (atribuições, competências, funções e atividades da entidade
6. acumuladora de documentos). Seguindo o mesmo raciocínio, comparamos a Análise
Tipológica, que é a análise das características internas do documento, com os
procedimentos internos de criação de um espetáculo, tais como o roteiro, a formulação
da dança, a escolha do figurino, a escolha da coreografia, a escolha das músicas etc.
Assim, fizemos a Análise Tipológica do vídeo:
Função Arquivística: atividades exercidas no âmbito do Produtor Arquivístico;
ex: divulgação e comprovação da produção artística, pesquisa de criação e
execução de movimentos, prestação de contas.
Produtor/fundo arquivístico: entidade produtora de documentos; ex: Projeto
PÉS?.
Atividade: finalidade do documento; ex: reprodução da apresentação do
Espetáculo com o intuito de capturar o desenvolvimento coreográfico.
Contexto: informa o motivo pelo qual o documento foi gerado; ex: necessidade
de divulgar o projeto e preservar a memória coreográfica.
Tipo Documental: configuração que assume uma espécie documental, de
acordo com a atividade que a gerou, ex: Gravação Audiovisual para divulgação
de Apresentação Coreográfica.
Emissor: quem gera demanda para a produção de documento; ex: integrantes do
Projeto PÉS?.
Destinatário: a quem se destina o documento; ex: todo público interessado em
assistir ao espetáculo ou saber mais informações sobre o projeto de extensão
permanente.
Data Tópica: local em que o documento foi produzido; ex: Brasília.
Data de Produção: data em que o documento foi produzido; ex: ano de 2012
(sem dia e mês definidos).
Vale salientar que, apesar de existirem vários modelos de análises Diplomáticas e
Tipológicas, baseadas em autores como Lopez e Belotto, não seguimos à risca um
modelo pré-definido, pois fizemos a análise de modo que os elementos mais
importantes do vídeo fossem contemplados e que fossem de fácil entendimento para o
público alvo da Oficina.
7. Conclusão
Depois de muitos trabalhos no âmbito da Disciplina de Diplomática e Tipologia
Documental, percebemos que o estudo da Arquivologia é bem mais amplo do que o
estudo da Teoria das Três Idades Documentais e os Princípios básicos da Arquivologia.
As Análises Diplomática e Tipológica nos fazem perceber a importância do
processo de criação dos documentos para o melhor entendimento do ciclo de vida dos
documentos. Assim, podemos elaborar o Plano de Classificação, com base nas séries
documentais, que são as sequências ordenadas de um mesmo tipo documental.
No âmbito das informações internas de um documento, um conceito importante
é o contexto. Quando analisamos o documento inserido em certo contexto, estamos
entendendo sua origem, o motivo de sua criação, a pessoa que gerou a demanda da
produção do documento.
Assim, não estamos analisando um documento isolado. Quando fazemos
referência a um documento dentro de um contexto, estamos estendendo nossos estudos
à Instituição que o produziu.
Dentro de todo esse universo, o que nos gerou maior dificuldade foi a falta de
vocabulário controlado para a definição dos elementos Diplomáticos dos documentos
não convencionais.
Quando nos referimos a documentos convencionais, estamos frente a frente com
a informação escrita, que, na maioria das vezes, nos traz todo o conteúdo necessário
para a análise Diplomática. Definir elementos como o suporte, a espécie e o gênero é
um trabalho muito simples nos documentos não convencionais.
A falta de padronização destas nomenclaturas para a definição da espécie e do
gênero dos documentos não convencionais deixa uma lacuna no tocante da análise
correta dos elementos Diplomáticos destes documentos.
Para definir a espécie do nosso documento, a dúvida era como encaixar a análise
do vídeo em só uma das nomenclaturas existentes, sem que fosse confundido nenhum
conceito, ou que a nossa análise se tornasse ambígua, pois poderíamos defini-lo como
sendo vídeo, filme, gravação audiovisual ou documento fílmico.
Outro elemento problemático foi o gênero do documento analisado. Existiam as
possibilidades de definirmos o gênero como Audiovisual, Imagético ou iconográfico.
8. Na conclusão deste trabalho, decidimos por definir a espécie como Gravação
Audiovisual de espetáculo de dança, pois representa mais especificamente nosso
documento (que não é uma gravação qualquer, por isso a necessidade do complemento
“de espetáculo de dança). O gênero ficou definido como Audiovisual, pelo motivo das
nomenclaturas imagético e iconográfico serem referentes a imagens estáticas, e no caso,
o vídeo é uma técnica de reprodução de imagens em movimento em conjunto com os
sons reproduzidos.
Referências Bibliográficas
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