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Como os jesuítas de hoje estão usando o poder 
espiritual conquistado através dos séculos para 
tentar influir nos rumos da política internacional, 
De aliados do Papa e seus intransigentes de-fensores, 
os jesuítas passaram de algum tempo 
para cá a ser os seus mais ativos opositores. 
Malachi Martin, teólogo eminente e antigo je-suíta, 
revela como os atuais dirigentes da Com-panhia 
de Jesus a transformaram na maior 
inimiga do capitalismo democrático do Mundo 
Ocidental 
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OS JESUÍTAS 
Malachi Martin, destacado teólogo e especialista em Igreja Cató - 
lica, ex-jesuíta e professor do Pontifício Instituto Bíblico do Vaticano, 
ousou assestar um holofote nos véus dos segredos que encobrem as a ti-vidades 
da mundialmente poderosa Igreja Católica Romana. Neste uni - 
verso em que a fé e o poder entram em choque, a Sociedade de Jesus 
tem sido, talvez, a mais lendária e fabulosa, a mais admirada e inju riada 
na prática de ambos. De seu início numa época revolucionária, e ao 
longo dos quatro séculos e meio de sua tumultuada existência, os 
jesuítas têm sido ao mesmo tempo um enigma e um modelo para o resto 
do mundo. Amigos e inimigos, católicos e não-católicos, todos têm ten-tado 
resolver o poder e o segredo desses homens, treinados e devotados 
do ponto de vista religioso que também são gigantes em todas as 
atividades seculares da humanidade. Nas ciências e nas artes, nas le tras, 
na exploração e no ensino — para não falar na política mundial —, os 
jesuítas sempre visaram ao melhor. E foram. 
No entanto, o aspecto mais desconcertante da Sociedade de Je sus, 
e o que mais enfurecia seus inimigos, era que, apesar de todo o poder, 
os jesuítas eram gigantes com uma finalidade: a defesa e a pro pagação 
da autoridade e do ensinamento papais. Fiéis a um ideal espiritual, e 
para “A Maior Glória de Deus”, eram os defensores por excelência dos 
interesses vitais da Igreja, a Força Especial do vigário terreno de Cristo. 
Não eram apenas “Homens do Papa”. Eram os Homens do Papa. Até 
agora. 
Em Os Jesuítas, Malachi Martin torna pública, pela primeira vez, a 
pungente história dos bastidores de homens e seus motivos e dos meios 
por eles usados, por trás da camuflagem da grandeza jesuíta no pas sado, 
para construir a “nova” Sociedade de Jesus no âmbito mundial. O leitor 
conhecerá os líderes e os joguetes; o sangue e o pathos-, a política, as 
traições e as humilhações; as campanhas de vendas enlatadas que se 
estendem de Roma e de Washington para o mundo e que mas caram uma 
missão estranha e destruidora. 
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MALACHI MARTIN 
OS JESUÍTAS 
Tradução de LUIZ CARLOS DO NASCIMENTO 
SILVA 
EDITORA RECORD 
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Título original norte -americano 
THE JESUITS 
Copyright da edição original cm l íngua inglesa © 1987 by Malachi Martin Copyright 
desta tradução - 1989 by Distribuidora Record S.A. 
Todos os direi tos reservados inclusive o direito de reprodução total ou parcial sob 
qualquer forma Esta edição é publ icada mediante acordo com o edi tor original , Simon 
& Schus ter, 
New York. 
O contrato celebrado com o edi tor original proíbe a exportação des te l ivro para 
Portugal e outros países de l íngua portuguesa. 
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PEDIDOS PELO REEMBOLSO POSTAL 
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SUMÁRIO 
A Guerra 9 
1ª Parte: A ACUSAÇÃO 
1. Objeções Papais 35 
2. O Campo de Provas 45 
3. Papa Branco, Papa Negro 69 
4. A Humilhação Papal 93 
5. Desobediência Sumária 107 
2ª Parte: A SOCIEDADE DE JESUS 
6. Iñigo de Loyola 129 
7. O Modelo Inaciano 153 
8. A Companhia de Inácio 169 
9. O Caráter da Sociedade 181 
10. O Superior Máximo 203 
11. Furacões na Cidade 221 
3ª Parte: OS LIBERTADORES 
12. A Doutrina Cativante 235 
13. George Tyrrell, S.J. 247 
14. Pierre Teilhard de Chardin, S.J. 259 
15. A Teologia da Libertação 275 
16. O Segundo Concílio Vaticano 289 
4ª Parte: O CAVALO DE TRÓIA 
17. O Segundo Basco 303 
18. Roupas Antiquadas 327 
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19. Novos Fios Contínuos 339 
20. A Procura do Carisma Primitivo 355 
21. O Novo Tecido 385 
22. Imagem Pública 409 
A Ânsia para Construir o Mundo do Homem 425 
Notas 453 
Fontes e Dados 463 
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À Nossa Senhora de Fátima 
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A GUERRA 
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E 
xiste um estado de guerra entre o papado e a Ordem Religiosa dos 
Jesuítas — a Sociedade de Jesus, para dar à Ordem seu nome 
oficial. Essa guerra assinala a mais mortífera alteração a acontecer 
nas fileiras do clero romano nos últimos mil anos. E, como todos 
os acontecimentos importantes na Igreja Católica Romana, envolve 
os interesses, as vidas e os destinos de milhões de homens e 
mulheres comuns. 
Como acontece com tantas guerras de nossa época, os jesuí tas não 
declararam a deles contra o papado. Na verdade, embora as primeiras 
escaramuças às claras começassem na década de 1960, levou tempo para que os 
efeitos da guerra — até mesmo efeitos muito profundos — se tornassem 
amplamente visíveis. Como os líderes da guerra eram os Superiores da Ordem, 
foi uma questão simples colocar homens com a mesma identidade de 
pensamento encarregados dos órgãos de poder, autoridade e comunicações por 
toda a organização. Feito isso, a imensa maioria dos jesuítas pouco tinha a 
dizer nas decisões extraordinárias que se seguiram. 
Com o tempo, houve manifestações em voz grave e avisos sobre o que 
estava acontec endo. “Está havendo um golpe de estado”, escreveu um jesuíta, 
ao olhar estupefato para “ a facilidade com que está sendo conseguida a 
dissolução da ordem estabelecida [na Sociedade de Jesus]”. 
Àquela altura, entretanto, já se estava no início dos anos 70, a guer ra já 
vinha sendo feita há quase uma década, e alarmas como aquele de pouco 
adiantavam. De fato, dada a estrita obediência dos jesuítas — um elemento 
lendário e de eficiência comprovada ao longo dos anos, da anti ga estrutura, que 
os novos líderes ainda achavam útil quando tratavam com os dissidentes de 
suas políticas estranhas —, os subalternos da Ordem não tinham outra 
alternativa senão acompanhar as mudanças que, nas palavras de outro jesuíta, 
“arrancaram a Sociedade de Jesus de sob os nossos pés e [a] transformaram 
numa entidade monstruosa sob o dis farce de bons objetivos”. 
Ainda assim, pode alguém pensar em perguntar, suponhamos que haja um 
problema entre o papado romano e os jesuítas; qual a gravidade que isso pode 
ter? Chame de guerra, se quiser. Mas, francamente, será que não se trata de 
apenas outra disputa na Igreja Católica Romana? Num mundo que se vê 
balançando à perpétua beira da aniquilação, e no qual metade da população 
morre de fome enquanto a maioria da outra metade está presa à lama por um 
tipo de injustiça ou outro, que importância pode ter uma desinteressante 
discussão teológica? Mais ou menos tão importante, talvez, quanto saber 
quantos anjos podem dançar na cabeça de um alfinete! 
A verdade, porém, é que não se trata de disputa sobre sutilezas, nem 
- 11 -
mesmo de desavença teológica entre o papado e os jesuítas que envolva apenas 
doutos, clérigos e fiéis. Como o papado e os jesuítas sabem, os efeitos de suas 
políticas vão muito além dos limites da Igreja Católica Romana; além até 
mesmo dos quase um bilhão de homens e mulheres católicos no mundo inteiro. 
Quase tudo o que acontece nessa guerra tem relaç ão direta e imediata com as 
grandes dissensões que castigam todas as nações e povos do mundo. Está no 
exato centro da rivalidade entre os Estados Unidos e a União Soviética, por 
exemplo. Relaciona-se, neste exato momento, ao destino — de miséria ou de 
felicidade — de 350 milhões de pessoas na América Latina. Afeta o código de 
moral pública e o consenso nacional do povo norte-americano, ambos em 
profunda mudança; a iminente preponderância, nos assuntos humanos, da 
República Popular da China; a frágil persistência de uma Europa Ocidental 
livre; a segurança de Israel; a ainda tosca promessa de uma África negra 
viável, que está no nascedouro. Todas essas coisas, por separadas e desconexas 
que possam parecer, estão não apenas interligadas umas às outras, mas estão e 
serão profundamente influenciadas pelas ondas e pelo resultado da coli são 
global entre o papado e a Sociedade de Jesus. 
Todas as guerras se relacionam ao poder. Na guerra entre o papado e a 
Sociedade, o poder flui ao longo das linhas de duas questões fundamentais e 
concretas. A primeira é a autoridade: quem está no comando da Igreja Católica 
Romana no mundo inteiro? Quem estabelece a lei quanto a em que os católicos 
romanos devem acreditar e que tipo de princípios morais devem eles praticar? 
A segunda questão é o propósito: qual é o propósito da Igreja Católica 
Romana neste mundo? 
Para o papado, as respostas a ambas as questões são claras e bem 
conhecidas. A autoridade para ordenar e ensinar desce, pela sua estrutu ra 
hierárquica, do papa aos bispos, aos padres e aos leigos. E o único propósito da 
Igreja neste mundo é fazer com que todo indivíduo tenha os meios de alcançar 
a vida eterna de Deus depois da morte. Trata -se de um propósito 
exclusivamente espiritual. 
Para muitos jesuítas, em contrapartida, a autoridade centralizada da 
Igreja, a estrutura de comando por meio da qual é exercida e sua finali dade 
são, todas, inaceitáveis hoje em dia. As tradicionais prerrogativas deste papa, 
João Paulo II, ou de qualquer papa, são censuráveis. 
No lugar de uma Igreja hierárquica, eles visam a uma Igreja composta de 
comunidades pequenas e autônomas — “ o povo de Deus”, como são conhecidas 
em conjunto, ou “ a Igreja do p ovo” — todas associadas livremente apenas pela 
fé, mas de forma nenhuma por uma autoridade central e centralizadora como o 
papado alega ser. 
No lugar do propósito espiritual da Igreja tradicional, a Sociedade de 
Jesus colocou a luta, no presente, pela libertação de uma classe de homens e 
mulheres da nossa sociedade de hoje: os milhões de vít imas da injustiça social, 
econômica e política. 
A maneira de falar na luta de classes é uma questão importante e 
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Os Jesuítas † Malachi Martin 
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delicada para os jesuítas. A nova missão da Sociedade — porque não é nada 
menos do que isso — coloca-os subitamente numa aliança real e, em certos 
casos, de bom grado com os marxistas em sua luta de classes. O objeti vo de 
ambos é criar um sistema sócio-político que afete as economias das nações por 
uma completa redistribuição dos recursos e bens da terra; e, no processo, 
alterar os sistemas de governo atuais em voga entre as nações. 
Para a Sociedade, porém, não interessa vir a público e dizer tudo isso 
como sendo política da entidade. Seria perder a guerra antes mesmo que as 
tropas estivessem todas dispostas em formação de combate. Para cobrir a 
mesma realidade, a expressão corrente entre os jesuítas e outros dentro da 
Igreja que simpatizem com essa nova missão é uma frase ar rancada de seu 
contexto original num documento divulgado em 1968 por uma Conferência de 
Bispos Católicos realizada em Medellín, Colômbia: “ exercer uma opção 
preferencial pelos pobres e oprimidos”. 
Nada do que foi dito significa que a Sociedade de Jesus se tornou, em 
qualquer momento, marxista. Não. Apesar disso, a cruel realidade é que muitos 
jesuítas desejam ver uma alteração radical no capitalismo democrático do 
Ocidente, em favor de um socialismo que parece inevitavelmente sur gir 
cheirando a comunismo totalitário. E a verdade é que não faltam jesuí tas 
influentes que se manifestem regularmente em favor da nova cruzada. 
Um breve retrato de três jesuítas — um cientista sócio-político, um 
dedicado guerrilheiro e um tremendo teólogo-professor — irá fazer um rápido 
esboço do amplo e geral arco do empenho do jesuíta moderno em vencer essa 
guerra. 
O primeiro, Arthur F. McGovern, S.J., é um destacado e convicto 
apologista do novo anticapitalismo jesuítico. Em 1980, ele publicou um livro 
sobre a matéria — Marxism: An American Christian Perspective — e em muitas 
ocasiões tem exposto com franqueza o que pensa. Em essência, McGovern diz 
que o marxismo foi e é uma crítica social, pura e simples. Marx queria, apenas, 
que pensássemos mais claramente nos meios de produção, em como as pessoas 
produzem; e nos meios de distribuição, nas pessoas que possuem e controlam 
os meios de produção. Em tudo isso, o marxismo não pode ser riscado por ser 
“ não verdadeiro”. Foram Engels e Lenin q ue acrescentaram os desagradá veis 
ingredientes de “materialismo científico” e ateísmo. Basta ler os trabalhos não 
publicados do jovem Marx para que se fique conhecendo o “ seu lado mais 
huma nista”. 
Em consequência, conclui McGovern, temos que isolar a crítica social de 
Marx, que é “ verdadeira”, daqueles elementos estranhos. Podemos acei tar o 
conceito de Marx de uma luta de classes, porque existe uma luta de classes. 
Isso quer dizer, mesmo, revolução, mas “revolução não significa nitidamente 
violência (...) significa que temos que ter um novo tipo de so ciedade, por certo 
não o capitalismo democrático tal como o conhecemos”. 
McGovern vê em Jesus, tal como retratado no Evangelho Segundo São 
Lucas, um modelo de revolução. O Eva ngelho de São Lucas é um “ evan gelho 
social”, diz ele, citando Jesus em apoio de sua causa: “Vim para pre gar a boa-nova 
aos pobres, libertar os oprimidos, redimir os cativos.” 
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“Vejam”, acrescenta McGovern, “ quantas vezes Jesus fala na pobreza; se 
identifica com os p obres; critica aqueles que lançam ônus sobre os pobres.” 
Está claro, portanto, que Jesus reconhecia a “ luta de clas ses” e endossava a 
“revolução”. 
Consciente ou inconscientemente, como a maioria dos jesuítas modernos e 
muitos ativistas católicos, McGovern pôs de lado, efetivamente, mil e 
quatrocentos anos de uma rica interpretação católica, autenticamente cristã, da 
Bíblia. Ele reinterpretou o Evangelho e a missão salvífica do Filh o de Deus 
num sentido econômico, num sentido de preocupação com as coisas terrenas, 
num sentido não-sobrenatural, num sentido não-católico. Todo o resto vem em 
seguida. 
Como o “ novo tipo de sociedade” não p ode ser “ o capitalismo de - 
mocrático tal como o conhec emos”, os Estados Unidos, como líder e mais bem-sucedido 
expoente do capitalismo democrático, vêm para o centro do palco. De 
fato, logo nos primórdios da guerra, na década de 1960, quando os jesuítas dos 
Estados Unidos adotaram um “projeto jesuítico de liderança nacional”, o plano 
deles era explícito quanto à intenção de alterar a estrutura fundamental da 
América de uma democracia capitalista: “Nós, os jesuítas, temos qu e 
reconhecer que participamos de muitas estruturas pecaminosas da sociedade 
americana. Por isso, corremos o risco do pecado, a menos que trabalhemos para 
mudar isso.” 
Como uma andorinha, só, não faz verão, um só McGovern — ou mesmo 
um só “ projeto jesuítico de liderança nacional” — não faz uma guerra. 
Tirando-se a política declarada no projeto, em todos os sentidos práticos a 
Sociedade de Jesus se dedica como um todo a essa luta de clas ses. A sua 
mensagem chega, hoje, de mil fontes diferentes entre clérigos e teólogos que 
vivem nos países de capitalismo democrático. Ela é vene rada numa teologia 
totalmente nova — a Teologia da Libertação — cujo manual foi escrito por um 
jesuíta peruano, padre Gustavo Gutierrez, e cujo quadro de honra inclui um 
número notável de destacados jesuítas latino-americanos como Jon Sobrino, 
Juan Luis Segundo e Fernando Cardenal. Não se trata de nomes bem 
conhecidos ouvidos nos noticiosos de todas as noites nos EUA. Mas são 
homens de significativa influência internacional para as Américas e para a 
Europa. 
Embora o movimento tenha sido global desde o começo, foi acima de tudo 
na América Latina que a estranha aliança entre jesuítas e marxis tas tomou o 
seu primeiro impulso prático. Foi lá que essa nova missão jesuítica, 
envolvendo, como envolve, nada menos do que a transforma ção da face sócio-política 
do Ocidente, enredou vidas de maneira muito mais profunda do que 
McGovern e teóricos como ele previam. Rapidamente, dezenas e dezenas de 
jesuítas começaram a trabalhar, com a paixão e o zelo que sempre lhes foram 
característicos, pelo sucesso dos sandino-comunistas na Nicarágua; e quando os 
sandinistas tomaram o poder, aqueles mesmos jesuítas assumiram cargos 
cruciais no governo central e atraíram outros para participarem em vários 
níveis regionais. Enquanto isso, em outros países centro-americanos os jesuítas 
não apenas 
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participavam no treinamento de quadros marxistas em guerrilhas, mas alguns 
se tornaram também guerrilheiros. Inspirados pelo idealismo que viam na 
Teologia da Libertação, e encorajados pela independência ine rente à nova ideia 
da Igreja como um grupo de comunidades autônomas, os jesuítas achavam que 
tudo era permitido — e mesmo estimulado — desde que promovesse o conceito 
da nova “ Igreja do povo”. 
Aqueles homens eram o sonho e o ideal dos verdadeiros teólogos da li - 
bertação. Pois eles eram os combatentes, os quadros que levaram a Teologia da 
Libertação de teoria para o que chamavam de práxis — a implementação da 
revolução popular pela libertação econômica e política. Daquela práxis, 
insistiam os teólogos da libertação, “ lá de baixo, entre o povo”, viria toda a 
verdadeira teologia, para substituir a velha teologia que certa vez fora imposta 
autocraticamente “ de cima” pela hierarquia da Igreja Roma na. 
O segundo nome naquele arco dos novos esforços jesuíticos é James 
Francis Carney, S.J., homem que foi o modelo da práxis — talvez o mais 
completo, embora não o mais famoso ou influente de todos os modernos 
teólogos jesuítas da Libertação. 
Carney nasceu e foi criado em Chicago. Fez o aprendizado para je suíta na 
província de Chicago; ao terminar seu aprendizado, apresentou-se como 
voluntário para trabalhar na América Central e foi enviado para lá em 1961. 
Ficou tão impressionado pela sua temporada centro-americana, que se tornou 
cidadão hondurenho. Ao longo dos anos, Carney sorvia a Teologia da 
Libertação como se se tratasse de vinho raro. Tornou-se conhecido como 
defensor dos pobres e crítico severo, incansável e impiedo so dos governos e 
dos exércitos estabelecidos, em especial em Honduras. Seu nome e suas 
atividades eram publicamente associados aos guerrilhei ros baseados na selva. 
Mesmo quando foi fixado um preço por sua cabeça pelas autoridades militares 
hondurenhas, não houve providência alguma dos superiores jesuítas no sentido 
de impedir as associações de Carney às guerrilhas. Na verdade, Carney era 
apenas um dos vários jesuítas em Honduras, Nicarágua, Guatemala e Costa 
Rica que estavam todos seguindo o mesmo caminho com as bênçãos de seus 
superiores locais e romanos. 
Contente, sentado numa champa em ruínas, de chão batido, na cidade 
nicaraguense de Limay, onde fora buscar refúgio da guerra de guer rilhas em 
Honduras, o padre jesuíta de 47 anos acabou de escrever sua autobiografia à luz 
de vela. Era o dia 6 de março de 1971. Àquela época, Carney já tinha atrás de 
si dez anos de dificuldades e trabalho na América Central, e cerca de doze anos 
ainda para viver. O “ padre Lup e”, como o chamavam os nativos com carinho (o 
nome era a forma abreviada de Guadalupe), Contou ao mundo que havia 
extraído os três esteios ou verdades básicas da Teologia da Libertação do s 
trabalhos de seu colega jesuíta Juan Luis Segundo. As obras são áridas e 
deploráveis. 
Grace and the Human Condition, de Segundo, mostrou a Carney que “ tudo, 
neste mundo, é sobrenatural”. The Sacraments Today, de Segundo, revelou ao 
padre Lupe que “ a humanidade está desenvolvendo uma ideia mais correta de 
Deus”. E Evolution and Guilt, de Segundo, ensinou 
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a ele que “ a dialética revolucionária tem que vencer o pecado do con - 
servadorismo da Igreja”. 
Com o mais triste dos amores, Lupe já havia escrito para sua família nos 
Estados Unidos, para dizer-lhe o que iria fazer. A carta é reproduzida em sua 
autobiografia. Ele tinha que compartilhar da revolução com seus adorados 
campesinos hondurenhos porque, escreveu ele, “ não suporto viver com vocês 
segundo a sua ma neira de viver”. O capitalismo, disse ele, em cujos pecados 
estavam imersos todos os americanos, era um mal tão abominável quanto se 
achava que era o comunismo. Só a revolução armada poderia erradicar “ o 
capitalismo e o imperialismo supranacional da América Central. (...) Ser 
cristão é ser revolucionário”. 
“Nós, os cristãos-marxistas, teremos que lutar lado a lado, na América 
Central, com os marxistas que não acreditam em Deus, a fim de formarmos 
uma nova sociedade socialista (...) um modelo centro-americano puro.” 
Embriagado pelo idealismo carregado de ignorância dos teólogos da 
libertação, esse jesuíta passou a acreditar que “ um marxista não é dogmático, 
mas dialético. Um cristão não condena ninguém do ponto de vis ta dogmático, 
mas respeita as crenças dos outros. Um cristão anticomunista dogmático não é 
um cristão verdadeiro, e um marxista anticristão dogmático não é um marxista 
de verdade”. 
Tendo investido a dura realidade do marxismo, tal como tem sido 
historicamente conhecida, com uma magia visionária sem nenhuma realidade 
tridimensional, Carney esboçou, para a família, o seu “modelo centro - 
americano p uro”. 
“Nem comunista nem capitalista (...).” O novo socialismo será “ uma 
fraternidade de toda a humanidade (...) e igualmente uma sociedade sem 
classes (...)”. Teologicamente falando, “ o universo do homem está em 
evolução dialética em direção ao Reino de Deus (...)”. 
Muito embora todos “ respeitem a crença dos outros”, Carney con seguiu 
ser muito mais honesto do que McGovern a o reconhecer q ue “ (...) d ialético 
significa conflitante, avançando por uma série de lutas entre pes soas de 
ideologias contraditórias (...)”. Na verdade, Carney ficara con vencido de que o 
propósito real da dialética da luta era vencer “ o pecado” do conserva dorismo 
que é o pecado peculiar da Igreja Católica Romana. O plano de Deus para a 
evolução do mundo e da sociedade humana iria desdobrar -se em conflito e na 
revolução armada. A transformação assim provocada seria completa; seria, ao 
mesmo tempo, uma mudança “cultural -espiritual” , e uma “mudança econômica, 
social e política”. 
Carney terminava sua autobiografia com um apelo a todos os cristãos: 
“(...) livrem-se de quaisquer preconceitos injustos e não-cristãos que tiverem 
contra a revolução armada, o socialismo, o marxismo e o comunismo. (...) Não 
existe uma terceira opção entre ser cristão e ser revolucionário (...).” 
Isso foi o apelo máximo em favor da práxis. 
Mais tarde, naquela primavera de 1971, com a concordância de seus 
superiores, Carney atravessou ilegalmente a fronteira, t ornando a entrar em 
Honduras para partilhar da vida de ataques e retiradas rápidas de um 
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comando guerrilheiro. Foi o início de doze anos de práxis a mão armada pelo 
“conflito dialético” que ele tinha em alta estima como sendo a cha ve para o 
futuro do catolicismo. 
De comum acordo com seu superior provincial, padre Jerez, que àque la 
altura sofria certa pressão de Roma e do Vaticano, o padre Carney aca bou se 
desligando dos jesuítas. O entendimento que tinha com Jerez e seus superiores 
era de que poderia tornar a entrar para a Sociedade tão logo a luta terminasse. 
A Sociedade, no final das contas, era apenas conveniência. Num mundo em 
que tudo já era sobrenatural, como o padre Lupe escreveu dizendo ser essa a 
verdade para ele, não havia lugar para regras rígidas; não havia lugar para uma 
Igreja Romana infalivelmente autoritária. Não havia necessidade de qualquer 
Igreja santificar coisa alguma, porque tudo era sobrenatural e, portanto, já era 
santo. A Igreja era apenas uma parte outra da humanidade, ao nível da 
humanidade em relação a Deus, aprendendo à medida que a humanidade 
aprende, deslocando-se com a humanidade em direção a uma utopia na Terra. 
“ Fico desgostoso”, escreveu Carney, “mas quero ser honesto e não 
prejudicar os jesuítas ao me unir às guerrilhas como um desobediente fugitivo 
da Sociedade, obrigando-os a me expulsarem.” Como demonstra ram outros que 
vieram depois dele, Carney não precisava ter -se preocupado com 
desobediência ou expulsão. Ainda assim, se o padre Lupe não pre servara os 
rudimentos de sua fé católica romana, pelo menos preservara a sua sinceridade 
e sua capacidade de fazer uma escolha bem definida. 
Em setembro de 1983, a unidade de assalto de Carney, com noventa 
homens, foi aniquilada numa batalha com tropas hondurenhas de seu ve lho 
inimigo, o general Gustavo Alvarez Martinez, que tantas vezes fora por ele 
denunciado em público. Uns poucos de seus homens que sobrevi veram foram 
capturados e atirados numa cova retangular na selva, atrás do acampamento 
militar hondurenho de Nueva Palestina. Será que Carney era um daqueles 
homens? Ninguém conseguiu descobrir. Será que ele morreu? É muito 
provável. De esgotamento? Pelo menos de esgotamento. Terá sido interrogado? 
É provável. Torturado? É provável. Será que foi deixado para morrer de 
inanição? Provavelmente. Será que ainda es tá vivo e ainda é prisioneiro na 
selva? Não parece possível; mas jamais se revelou uma notícia precisa. 
Este é o tipo de guerra que existe. Não se trata, nem de longe, de saber 
quantos anjos podem dançar na cabeça de um alfinete. É uma guerra na qual 
sangue é derramado com regularidade e em grandes quantidades. Sacerdotes 
como Carney não constituem raras exceções. É claro que nem todos escrevem 
testamentos de sua conversão para a violência revolucio nária, a fim de que o 
mundo os leia; e nem todos chegam ao ponto de viverem a vida de membros de 
unidades de assalto. Mas nos muitos e va riados papéis que eles representam na 
arena puramente política do mundo, homens como o padre Carney, S.J., cada 
um deles, são essenciais para o sucesso dos jesuítas em sua luta contra o 
papado. 
Para os jesuítas, a realidade da vida, hoje, é que o nosso mundo 
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bipolar gira inexoravelmente em torno do marxismo-leninismo soviético e do 
capitalismo ao estilo ocidental. A única disputa que pa rece ter importância para 
a Sociedade de Jesus neste último quarto do século XX é aquela entre essas 
duas esferas de influência. E o fato é que, embora a Sociedade em si não seja 
oficialmente marxista, os jesuítas que se diziam ou se di zem marxistas — 
porque o padre Lupe não estava sozinho nem mesmo nisso — não são, por esse 
motivo, expulsos da Sociedade ou censurados ou silenciados. Ao contrário, 
fazem-se os maiores esforços no sentido de protegê -los de ataques. Isso se 
tornou tão espalhafatoso que, não faz muito tempo, quando o papa João Paulo 
II conheceu um jesuíta indiano que, como verificou, não era marxista, 
exclamou, surpreso: “Com que então nem todos vocês são marxistas!” 
A guerra entre o papado e os jesuítas parece, então, ser de natureza 
política. E, num sentido, é. Mas presumir, como fazem muitos jesuítas da nova 
missão, que a sua guerra contra o papado começa e termina com a luta 
marxista-capitalista pelo poder, pela autoridade e pelo domínio do mundo, seria 
confundir os sintomas de apodrecimento da Sociedade com a condição mais 
básica que permite que esses sintomas progridam e se multipliquem. Porque 
embora a guerra que eles se decidiram a fazer tenha lugar no plano da 
geopolítica, é também, e mais fundamentalmente, uma guerra por causa da 
questão da existência mesma do Espírito como a dimensão básica do mundo dos 
homens e das mulheres. É sobre o sobrenatural como o elemento que torna cada 
um de nós humano e define nossa existência e nosso mundo. 
A esse nível, os novos conceitos jesuíticos rela tivos à autoridade na Igreja 
e ao propósito da Igreja no mundo representam uma reviravolta da mais 
profunda natureza. Para a Sociedade de Jesus, a autoridade má xima para crença 
e moralidade já não está na Igreja Católica Romana, com o seu papado e sua 
hierarquia de âmbito mundial, mas no “ povo de Deus”. Os resultados dessa 
substituição são que, até esta data, não há dogma importante ou lei moral 
capital do catolicismo romano que não tenha sido contestada e negada por 
jesuítas, a começar com jesuítas das mais altas posições hierárquicas e das mais 
elevadas reputações. 
Eles têm sido imitados e têm recebido a adesão de uma infinidade de 
grupos, tanto católicos como não-católicos, com as mais diversas razões para 
defenderem essa nova igreja, o “povo de Deus”, como superior à Igreja 
hierárquica Católica Romana. Mas foram eles, os jesuítas, que abriram o 
caminho e que deram os maiores e mais consistentes exemplos nessa nova 
atitude em relação ao pontífice romano e aos dogmas definidos de Roma. 
O teólogo-professor dessa guerra — e o terceiro nome naquele arco do 
novo empenho jesuítico — é o homem aceito e celebrado como o maior teólogo 
jesuíta dos últimos cem anos, Karl Rahner, S. J. Rahner viveu to da uma vida de 
esforços — cautelosamente, a princípio, mas com uma estridência cada vez 
maior à medida que o tempo passava — no sentido de alterar a crença católica. 
Embora não trabalhasse em campos isolados, sua estatura, sua ousadia que não 
ligava para as consequências, e 
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seu sucesso o destacam como o líder no que pode ser perfeitamente descrito 
como o esquadrão de combate de teólogos católicos que, a partir de 1965, 
laceraram e cortaram em pedaços não apenas os flancos, mas a própria 
substância do catolicismo. 
Rahner era tão diferente de seu colega jesuíta James Carney quanto é o 
frio do calor. O contraste entre os dois homens é a melhor ilustração do velho 
ditado que diz que uma ideia pode provocar um inferno de chamas no coração 
de certos homens, mas explode no cérebro de outros. En quanto Carney era um 
fazedor impulsivo e apaixonado, Rahner era o intelectual meditativo, 
pensativo, impassível. Enquanto Carney podia es crever ilógica mas 
emocionalmente para justificar suas ações aos olhos da família, e depois contar 
apenas com o amor da família para aceitá-lo como era, Rahner escrevia, 
proferia conferências e conversava com lógi ca sutil e mente desprovida de 
paixão para desengatar os dogmas de fé mais caros que se achavam na mente de 
seus leitores e ouvintes. 
Carney ficava zangado com a injustiça, revoltava -se contra a opressão, 
clamava dolorosamente contra a miséria humana. Sua munição e suas armas 
não eram apenas balas e canhões, mas a sua profunda compaixão, sua fúria 
contra a injustiça e sua recusa congênita em fazer a mínima concessão. Era o 
seu coração, numa agonia avassaladora, que guiava o seu julgamento. 
Rahner, em contrapartida, apontava a artilharia pesada de sua lógica e de 
sua imensa reputação como teólogo para a sacrossanta autoridade dos papas. 
Escolheu como alvo as imemoriais fórmulas de fé. Tinha à s ua disposição 
outras armas com que Carney não contava: a mais arguta das men tes, um 
conhecimento realmente enciclopédico, um humor sempre pronto e azedo, e 
uma indômita arrogância de intelecto. “Não vou tolerar a in justiça”, era o grito 
de Carney. “Não serei um servo”, era o de Rahner. 
Num momento crítico e doloroso na moderna história do papado, Rahner 
se recusou categoricamente a defender o ensinamento católico so bre o controle 
da natalidade ou o pontífice que p ediu aos jesuítas, como “ homens do papa” , 
que o ajudassem em seu desespero. O mesmo aconteceu com virtualmente todos 
os outros dogmas e regras da Igreja Católica que Rahner havia jurado defender. 
No entanto, sua voz parecia tão autêntica, que ele era considerado por 
muitos como tendo maior autoridade do que três papas sucessivos, quando 
chegava o momento de interpretar o ensinamento moral da Igre ja Católica. O 
próprio Rahner se esforçou muito para representar esse papel de profeta 
moderno. Enquanto viajava pela Europa e pelas Américas vestindo seus 
corretos ternos de passeio, era incansável na sua crítica mordaz e sarcástica ao 
papado e à autoridade romana. 
Em Unity of the Churches: An Actual Possibility, o último livro que escreveu 
antes de morrer em 1984, Rahner fez a mais notável e patente apresentação da 
recém-aceita atitude jesuítica sobre o papado e os dogmas de finidos de sua 
Igreja. Trabalhando com um colega jesuíta e co-autor, Heinrich Fries, e com o 
imprimatur de seus superiores jesuítas, Rahner apresentou uma proposta radical 
e ultrajantemente anti-romana. Para obter a 
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unidade cristã, disse ele, era necessário parar com toda a insistência na in - 
falibilidade papal como dogma, e também acabar com a insistência em to das as 
outras doutrinas sobre o pontífice romano e o catolicismo romano que tinham 
sido definidas e propostas por papas desde o século IV. 
Com efeito, Rahner estava propondo que a Igreja Católica pegasse 
oficialmente todo o corpo de leis relativas à fé e aos costumes, tal como 
desenvolvido e ensinado pela sua Igreja durant e dezesseis séculos, e o des-vinculasse 
da vida diária. Casamento, homossexualidade, ética comercial, 
liberdade humana, piedade, todas as esferas da existência humana, tudo teria 
que ficar à deriva ao sabor das marés da redefinição, que estavam sempre 
mudando. Mas os dogmas da Igreja seriam as principais baixas. Porque aquilo 
que a Igreja definiu como básico e obrigatório para a crença católica iria, no 
plano de Rahner, tornar-se opcional. A integridade da pessoa de Cristo; o 
significado e o valor dos Sete Sacramentos; a existência do Céu e do Inferno; o 
caráter divino da autoridade dos bispos; a ver dade da Bíblia; a primazia e a 
infalibilidade do papa; o caráter de clero; a Imaculada Conceição e a Assunção 
de Maria, mãe de Cristo — tudo ficaria à ecumênica disposição de quem 
quisesse. 
Acima de tudo isso, entretanto, ficavam os principais alvos de Rah ner, os 
bloqueios que ficavam no caminho de tudo o mais: a autoridade papal que ele 
queria ver desmantelada e a Igreja Católica Romana hierár quica que ele queria 
ver reduzida a mais uma expressão idiossincrática da mensagem de Cristo. Em 
outras palavras, a autoridade prática e o propósito espiritual da Igreja — 
sempre as verdadeiras questões na guerra entre papado e jesuítas — seriam 
rejeitados e substituídos pela autoridade e pela missão materialista que 
estivesse em voga. 
A nível meramente pessoal, é razoável que se tenha que presumir a falta 
total de fé católica em Rahner. Mas o que está em jogo é menos a condição da 
alma de Rahner do que a influência prát ica que ele e muitos outros teólogos, 
que tenham as mesmas ideias, exercem sobre a vida tal como é vivida em 
nosso mundo. 
Dizer que Rahner — e Fries como co-autor secundário — estava apenas 
exprimindo o sentimento antipapal que era muito corrente entre o s teólogos 
católicos em 1984 não é contar a metade da ruína causada por ele. Rahner, 
ocupado em ensinar teologia numa prestigiosa universidade jesuítica durante a 
maior parte de sua vida, tornou-se ao longo dos anos uma imagem de sabedoria 
teológica e bom julgamento para literalmente milhares de pessoas que, por sua 
vez, agora são sacerdotes, professores e escritores com comando, influência e 
renome próprios. 
É de se admitir que esse trabalho pareça, a muitos, ter lugar em tor res de 
marfim. Mas homens como Karl Rahner ajudaram poderosamente a moldar o 
pensamento e os costumes de padres e bispos que estão, ago ra, envolvidos em 
cada nível de questões mundanas em todas as partes do globo. E uma vez 
convencidos, mesmo num plano puramente pessoal, de que os Rah ners da 
Igreja têm razão e que o papado está errado, não há chance alguma de que o 
conflito possa permanecer teórico. Em vez 
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disso, ele atinge as mais profundas áreas de pensamento, crença e sentimentos 
de milhões que são arrastados pelo coração — e pela influência direta ou 
indireta de teólogos como Rahner — para um mundo no qual a natureza, o 
significado e a mais básica finalidade de suas vidas como cristãos são 
redefinidos num cenário puramente racional e materialista. 
Sem um gigante como Karl Rahner, é de se duvidar que a Teologia da 
Libertação fosse conseguir muito mais do que rachar, oscilar e despencar; ou 
que um Francis Carney fosse ser tão pouco severo ao criticar os traba lhos 
escritos por Juan Luis Segundo. Apesar de tudo, deve -se dizer que Rahner não 
foi um inventor; tampouco o foram os homens de sua geração que foram a sua 
ferrotipia. Não foi Rahner quem iniciou a enorme reviravolta teológica na 
Sociedade de Jesus ou na Igreja Romana. Sua importância não foi como 
inovador, mas como fiel e eficiente evangelista em favor de uma influência 
perniciosa e destrutiva que já vinha se espalhando sorrateiramente dentro da 
Sociedade de Jesus há décadas antes de ele surgir em cena. Quer proferindo 
conferências na Europa, quer se transportando para as Améri cas, envolto no 
prestígio que adquirira, incontestável em sua autoridade, apresentando sempre 
o rosto não-atrativo do materialista, rápido em qualquer luta interna, e sem se 
curvar para ninguém, Rahner foi o ponta -de-lança adequado para o 
autocanibalismo católico. Ele ensinou a várias gerações a consumir sua fé com 
lógica, ceticismo e desobediência. 
Sua dedicação ao ponto de vista antipapal e anticatólico era tão sin cera, 
que ele se tornou a sua encarnação, como se poderia dizer. E, no entanto, foi 
tão eficiente na manutenção de sua estatura teológica dentro da Sociedade de 
Jesus, que deu àquele ponto de vista uma nova respeitabilidade, tanto dentro 
como fora da Sociedade e da Igreja. Nenhum superior jesuíta, no seu país natal 
ou em Roma, jamais o conteve. Tendo sido a prova em carne e osso da estranha 
corrupção que se instalara na Sociedade, Rahner morreu como havia vivido, 
numa aura de honra entre seus companheiros e superiores. 
Apesar de todas as suas diferenças, os três homens aqui esboçados 
— o cientista sócio-político, o guerrilheiro dedicado e o teólogo-professor 
— exemplificam, inclusive, a aberração da Sociedade. 
É claro que, a esta altura, a Sociedade de Jesus não está sozinha na luta 
contra o papado. Ela tem sido imitada e tem recebido a adesão de muitos 
grupos — católicos e não-católicos, religiosos e seculares — cada qual com 
suas próprias razões para defender a ideia de que uma nova igre ja, o “ povo de 
Deus”, substituiu a antiga e hierárquica Igreja Católica Roma na. Mas foram os 
jesuítas que abriram aquele caminho; foram eles que estabeleceram os maiores 
e mais consistentes exemplos dessa nova atitude em relação ao pontífice 
romano e aos dogmas definidos de Roma; e são eles que continuam a trabalhar 
nos pontos mais longínquos daquilo que só se pode chamar de política divina. 
E foi assim que o atual geral da Sociedade de Jesus, Piet -Hans Kol-venbach, 
pôde enfrentar os jesuítas que o elegeram chefe da Ordem em 1983 — 
o ano em que James Francis Carney foi engolido numa batalha 
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na selva; o ano antes daquele em que Karl Rahner voltou a Deus — e prometer, 
com uma confiança solene, que, entre outras coisas, sua tarefa seria assegurar a 
procura da justiça, escolhida pelos jesuítas, e não ser perturbado “ pelos 
gemidos de reclamação de papas”. 
Quando se fala que a Sociedade de Jesus está, hoje, em guerra com o pa pado, e 
mesmo antes de se perceber que estranha e confrangedora revira volta isso 
representa para um corpo de homens cujo principal motivo de fama foram suas 
realizações e sua reputação como “ homen s do papa”, não se deve pensar que 
essa Ordem Religiosa dos Jesuítas seja apenas mais uma organização humana. 
São muitas as organizações desse tipo que têm sua fase áurea e depois decaem, 
ossificam-se e acabam por desaparecer. 
A Sociedade de Jesus foi criada em 1540 por um obscuro basco chamado 
Iñigo de Loyola, mais conhecido como Inácio de Loyola. Não se pode colocar 
os jesuítas de Iñigo no mesmo nível de qualquer outra orga nização, pelo 
simples motivo de que nenhuma organização que conheçamos pode rivalizar, 
até o momento, com os jesuítas no que se refere aos inestimáveis serviços que 
prestaram à família humana — muito acima do que fizeram, em nome do 
papado e da Igreja Católica Romana do papado. 
Iñigo foi um gênio raro. Se Leonardo Da Vinci, contemporâ neo de Iñigo, 
tivesse projetado uma máquina, chegando até os detalhes das por cas e 
parafusos, que suportasse todos os testes do tempo e das circuns tâncias que se 
alteraram ao longo de um período de 425 anos — e se só a destruição de seu 
projeto inicial provocasse o colapso da máquina — não seria maravilha maior 
do que a Sociedade que Iñigo projetou. Por que, tal como ele a construiu — o 
molde de seu jesuitismo, sua estrutura funcional, sua devoção ao papado, seu 
caráter e seus objetivos — a Sociedade resistiu a todos os testes de tempo e 
circunstâncias, exceto um: a perversão da regra, do papel e do espírito que ele 
lhe deu. Fora isso, sua mui extraordinária durabilidade está comprovada. 
Nem mesmo Iñigo poderia ter previsto o quase-milagre da organização de 
sua Sociedade, seu sucesso meteórico e brilhante, e sua influência universal 
sobre o mundo do homem, quando a fundou. Nos 425 anos que se seguiram, as 
dezenas de milhares de pessoas que entraram para a Companhia de Iñigo 
estabeleceram um recorde que, em sua categoria, não foi igualado na história 
passada ou presente — um recorde tanto de serviços à Igreja Católica quanto à 
sociedade humana como um todo. 
Olhando para trás, um fanático do século XX que parecia um gênio, 
Lenin, mal orientado mas com admiração, afirmou, no fim da vida, que se 
tivesse contado com doze homens iguais a um daqueles jesuítas pionei ros, o 
seu comunismo teria arrebatado o mundo. 
Embora poucos em número, os princípios básicos que Iñigo estabe lecera 
para a sua Companhia eram catalisadores poderosos. Logo que seus homens 
utilizaram suas energias dentro de sua organização no trabalho de âmbito 
mundial da Igreja Romana, provocaram um fenômeno sem igual de história 
huma na. “Nunca”, escreveu Novalis, o teórico alemão do sé culo 
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XVIII, “ nunca antes na história do mundo surgiu uma Socieda de igual a essa. O 
próprio velho Senado Romano não fez planos de domínio mundial com maior 
certeza de sucesso. Nunca a execução de uma ideia maior foi examinada com 
maior compreensão. Para todo o sempre, essa Sociedade será um exemplo para 
toda sociedade que sentir um desejo orgânico de extensão infinita e duração 
eterna (...).” 
“Quanto mais universal o seu trabalho”, dissera Iñigo, “mais divi no ele se 
torna.” Trinta anos depois que ele fundara a Ordem, s eus jesuítas estavam 
trabalhando em todos os continentes e em praticamente todas as formas de 
apostolado e campo educacional. Num prazo de cem anos, os jesuítas eram uma 
força que se tinha que enfrentar em praticamente todas as fases da vida ao 
longo da qual os homens procuram, e às vezes conseguem, poder e glória. 
Não havia continente que os jesuítas não alcançassem; nenhuma lín gua 
conhecida que não falassem e estudassem ou, em dezenas e dezenas de casos, 
desenvolvessem; nenhuma cultura em que não penetr assem; nenhum ramo de 
conhecimento e ciência que não explorassem; nenhum tra balho em humanismo, 
nas artes, na educação popular, que eles não realizassem e fizessem melhor do 
que qualquer outra pessoa; nenhuma forma de violência que não tivessem 
sofrido — os jesuítas foram enforcados, arrastados e esquartejados em 
Londres; estripados na Etiópia; comidos vivos por índios iroqueses no Canadá; 
envenenados na Alemanha; esfolados até a morte no Oriente Médio; 
crucificados na Tailândia; mor tos de fome na América do Sul; decapitados no 
Japão; afogados em Madagascar; bestializados na União Soviética. Naqueles 
primeiros quatrocentos anos, eles deram à Igreja 38 santos canonizados, 134 
homens santos já declarados “Benditos” pela Igreja Roma na, 36 já decla rados 
“Venerá veis” e 115 considerados como tendo sido “ Servos de Deus”. 1 Desses, 
243 foram mártires; isto é, foram mortos por causa de suas crenças. 
Viveram entre mandarins chineses, índios norte-americanos, as brilhantes 
cortes reais da Europa, brâmanes hindus da Índia, as escolas de “ cerca viva” da 
Irlanda penal, navios escravos dos otomanos, imames e ulemás do Islã, o 
decoro e o saber dos lentes graduados de Oxford, as multiformes sociedades 
primitivas da África subsaariana, e se adaptaram. 
E, no longo catálogo de insultos e calúnias que os homens criaram a fim 
de injuriar seus inimigos, não havia termo suficientemente forte para se aplicar 
aos jesuítas, devido àquela terrível fixação que eles tinham, desde os seus 
primórdios, por outro dos princípios de Iñigo: serem “ homens do papa”; os 
homens do papa. Iñigo de Loyola, escreveu Thomas Carlyle, foi “ a fonte de 
veneno da qual nasciam todos os rios de amargura que inundavam o mundo 
agora”. 
Insultos como esse têm sido cultuados nas próprias línguas dos homens. O 
Webster’s Third New International Dictionary, depois de ter dado o significado 
básico de jesuíta como membro da Ordem, fornece os significados negativos: 
“pessoa dada à intriga e a subterfúgios; pessoa 
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ladina”; termos que são ampliados pelo dicionário de Dornseif para “ de duas 
caras, falso, insidioso, dissimulador, pérfido (...) insincero, ignó bil, desonesto, 
mentiroso”. Um provérbio francês diz que “ sempre que dois jesuítas se juntam, 
o Diabo completa o trio”. Um provérbio espanhol alerta va as pessoas, d izendo 
“ não confie sua mulher a um monge ou seu dinheiro a um jesuíta”. 
Os eternos inimigos do papado nunca poderiam perdoar Iñigo e seus 
jesuítas enquanto estivessem em missão do papa, cumprindo o sagrado voto de 
obediência, ainda que sujeitos à desonra e à morte. Estava tudo de acordo com 
o desejo expresso de Iñigo. “Esperemos”, escreveu ele certa vez, “ que a Ordem 
nunca possa ficar muito tempo sem sofrer a hostilidade do mundo!’ 
Na verdade, seu desejo foi realizado, pois os seus jesuítas eram realmente 
homens do papa. Seus primeiros alvos principais: as novas igrejas protestantes 
que pululavam pela Europa. Justamente a questão vital que estava em jogo 
entre a Igreja Católica e os líderes da revolta protestante 
— Lutero, Calvino e Henrique VIII da Inglaterr a — era a autoridade do 
pontífice romano e a primazia de sua Igreja Católica Romana. 
Os jesuítas levaram a batalha aos próprios territórios daqueles inimigos 
papais. Faziam debates públicos com reis, debatiam em universidades 
protestantes, pregavam em encruzilhadas e em mercados. Dirigiam-se a 
conselhos municipais e instruíam os concílios da Igreja. Infiltravam-se em 
territórios hostis, disfarçados, e se deslocavam às escondidas. Estavam em toda 
parte, cumulando seus contemporâneos de brilhantismo, sagacidade, 
severidade, erudição, devoção. Seu tema constante: “O bispo de Roma é o 
sucessor de Pedro o Apóstolo, sobre o qual Cristo fundou sua Igreja (...). Essa 
Igreja é uma hierarquia de bispos em comunhão com aquele bispo em Roma. 
(...) Qualquer outra instituição eclesiástica é uma rematada heresia, filha de 
Satã (...).” 
Em outras palavras, todo mundo sabia da existência dos jesuítas; e todo 
mundo sabia que os jesuítas eram os defensores sinceros daquela autoridade e 
primazia. 
Embora a violenta investida dos jesuítas contra os inimigos de Roma 
fosse vigorosa, a penetrante influência deles sobre o próprio catolicismo 
romano nunca foi igualada. Eles detiveram o monopólio da educação da Europa 
durante mais de duzentos anos, e entre seus alunos pelo mundo in teiro se 
encontrava gente famosa e gente abominável — incluindo Voltaire, Luis 
Bunuel, Fidel Castro e Alfred Hitchcock. Sozinhos, literalmente remodelaram 
o ensino da teologia e da filosofia católica romana, de modo a torná -lo outra 
vez claro e acessível, mesmo para a nova mentalidade da era turbulenta que 
despontava. Proporcionavam novos meios para a prática da devoção popular. 
Promoveram o estudo do asceticismo, do misticismo e da missiologia. 
Proporcionaram modelos novos para o treinamento de sacerdotes em 
seminários. Geraram, pelo exemplo e pela inspiração de seu Preceito Religioso, 
toda uma nova família de ordens religiosas. Foram o primeiro corpo de 
católicos eruditos que se tornou preeminente em ciências seculares — 
matemática, física, astronomia, arqueologia, linguística, 
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biologia, química, zoologia, paleografia, etnografia, genética. A lista de 
invenções e descobertas científicas realizadas por jesuítas enchera núme ros 
intermináveis de volumes nos mais diversos campos — engenharia mecânica, 
energia hidráulica, aviação, oceanografia, hipnose, cristais, linguística 
comparativa, teoria atômica, medicina de doenças internas, man chas solares, 
aparelhos de surdez, alfabetos para os surdos e mudos, car tografia. A lista da 
qual são extraídos esses exemplos aleatórios entorpece a mente, devido à sua 
variedade que abrange todos os setores. Os manuais, livros de texto, tratados e 
estudos dos jesuítas eram aceitos em caráter ofi cial e conclusivo em todos os 
ramos do saber católico e secular. 
Eles eram gigantes, mas com um propósito: a defesa e a propagação da 
autoridade papal e do ensinamento papal. 
Tampouco suas extraordinárias energias e talentos se limitavam à ciên cia. 
Fizeram como se fossem seus, também, todos os setores da arte. Em 1773, 
contavam com 350 teatros na Europa, e as atividades teatrais dos jesuítas 
lançaram as fundações para o balé moderno. Fundaram o primeiro teatro no 
continente norte-americano — precisamente em Quebec em 1640. Ensinaram a 
França a fazer porcelana. Levaram para a Europa os primeiros conhecimentos 
que os homens ocidentais tiveram da cultura indiana e chinesa. Traduziram os 
vedas do sânscrito. Até mesmo as chinoiseries do período rococó tiveram como 
base publicações dos jesuítas em chinês. O guarda-chuva, a baunilha, o 
ruibarbo, a camélia e o quinino foram inovações jesuíticas na Europa. 
As façanhas dos jesuítas como exploradores do Extremo Oriente 
ultrapassavam qualquer coisa jamais sonhada por seus contemporâneos, e 
constituem uma narrativa épica que tem o sabor de quase má gica. Os nomes de 
jesuítas estarão ligados para sempre a lugares que, para a maioria de nós, são 
motivos de fantasia — Kambaluc, Catai, Sarkand, Shrinagar, Tcho Lagram, 
Tcho Mapang, Manasarovar, Tashi-Ihumpo, Koko Nor, e o nome comprido e 
saltitante, Chomolongmo (que nós conhecemos como monte Everest). 
Menos de cem anos depois da fundação da Sociedade, os jesuítas se 
tornaram os primeiros europeus a penetrarem no Tibet e depois seguirem dali 
para a China. O padre jesuíta Matteo Ricci foi a primeira pessoa a provar que a 
Catai de Marco Polo era idêntica à China, e não um país diferen te. Em 1626, o 
padre Antonio Andrade e o irmão Manuel Marquis abriram a primeira igreja 
católica no Tibet, às margens do rio Sutlej, no reino de Guge, em Tsaparang. O 
irmão Benito de Goes está sepultado na extremidade noroeste da Grande 
Muralha da China. O túmulo do irmão Manuel Marquis fica no cume da 
cordilheira Zaskar, que dá vista para o passo Mana, na região ocidental do 
Tibet, onde o bom irmão morreu em 1647 depois de longo período de prisão no 
posto da fronteira. 
Outros jesuítas — austríacos e belgas — foram os primeiros europeus a 
atingirem Lhasa a 8 de outubro de 1661, e viram a construção do Palácio 
Potala para o Dalai Lama Chenresik. O padre Grueber, um aus tríaco, foi o 
primeiro a determinar a posição de Lhassa com exatidão, 
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a 29 graus, 6 minutos de latitude norte. Ele e seus companheiros foram 
sucedidos por uma linha de destacados tibetólogos jesuítas que produzi ram 
dicionários, estudos de língua, mapas, estudos geológicos e tratados teológicos. 
Seus túmulos, como os de Benito de Goes e Manuel Marquis, pontilham uma 
área que era tão remota e amedrontadora para seus contemporâneos quanto o 
outro lado da lua ainda continua sendo para nós. 
Esses homens e seus pares religiosos noutra parte qualquer não eram 
apenas “ os solitários e bravos” celebrados num drama teatral da década de 
1940. Em sua mente, não faziam confusão entre as dimensões da Po breza 
Religiosa e a pobreza econômica, como aconteceu com tantos je suítas nas 
últimas décadas deste século. Não visavam a um objetivo nebuloso, 
materialista, como a “ libertação integral do indivíduo huma no”. Eram gigantes 
que, proporcionalmente falando, rivalizaram as façanhas posteriores de Scott e 
Perry nos pólos, Hilary no monte Everest, e os primeiros astronautas no espaço 
e na lua. Mas, mais do que isso, eram missionários jesuítas obedientes à voz do 
pontífice romano, vivendo, trabalhando e morrendo fiéis a ele, porque ele 
representava o apóstolo Pedro, que representava o Cristo que eles acreditavam 
ser o Salvador. 
No auge de seus esforços, duzentos anos depois de sua fundação, os 
jesuítas exerciam um controle formativo e decisivo na educação e na ciência de 
praticamente todos os países da Europa e da América Latina. Ti nham um papel 
a representar em todas as alianças políticas da Europa — um cargo influente 
junto a todos os governos, uma função de assessoria junto a todo grande 
homem e a toda mulher poderosa. Um jesuíta foi o primeiro ocidental a 
frequentar a corte do grão-mogol. Outro foi o primeiro a ser declarado 
mandarim oficial no palácio do imperador em Beijing. Oliver Cromwell, Filipe 
II da Espanha, Luís XIV da França, Catarina a Grande, o cardeal Richelieu, a 
rainha Cristina da Suécia, Mary, a rainha dos escoceses, Napoleão, 
Washington, Garibaldi, Mussolini, Chiang Kai -shek — a lista dos grandes 
vultos da história frequentados pelos jesuítas se estende por várias páginas. 
Eles minutavam tratados, negociavam pactos de paz, serviam de mediadores 
entre exércitos em guerra, arranjavam casamentos reais, faziam arriscadas 
missões de resgate, viviam onde não eram bem-vindos, como agentes secretos 
da Santa Sé. Passavam-se por criadores de porcos na Irlanda, bazaaris na 
Pérsia, homens de negócios na Prússia, marinheiros mercantes na Indonésia, 
pedintes em Calcutá, swamis em Bombaim. Não havia coisa alguma, em parte 
alguma, que eles não realizassem, c omo diziam, “ para a maior gló ria de Deus”, 
em obediência ao papa romano. Estavam em todo país europeu, africano, 
asiático e americano onde fosse possível o mais leve desabrochar do 
catolicismo. Toda a influência deles era exercida visando ao atendimento da 
vontade papal. Ser jesuíta era ser um papista no senti do exato desse termo que 
já foi pejorativo. 
O poder de âmbito mundial dos jesuítas se tornou tão grande, que as 
pessoas comuns de Roma inventaram um novo título para padre jesuí ta geral. 
Elas o chama vam de “O papa negro”, comparando seu p oder 
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o sua influência globais com os do próprio papa; e fazendo entre os dois uma 
distinção apenas com base na batina toda branca do pontífice e a batina simples 
e preta do sacerdote comum, que os sucessores de Iñigo usavam imitando seu 
exemplo. O apelido popular era um exagero, é claro. Mas os romanos estavam 
suficientemente perto do centro das coisas para saberem quem exercia uma 
impressionante parte do verdadeiro poder que residia na colina Vaticano. 
Como Iñigo ha via pretendido, aquele poder do “ papa negro” e sua 
Companhia estava atrelado à vontade papal, mesmo que isso represen tasse a 
morte da própria Ordem. Em 1773, quando o papa Clemente XIV decidiu — 
certo ou errado — que deveria ser feita uma rígida opção entre a extinção do 
papado e a morte da Ordem dos Jesuítas, ele, e somente ele, agindo segundo 
decisão pessoal sua, aboliu a Sociedade de Jesus. Por um documento publicado 
oficialmente, destituiu os 23.000 jesuítas ao mesmo tempo, e colocou o padre-geral 
e seus assessores em calabouços papais, mesmo enquanto impunha o 
exílio e a morte lenta a milhares de jesuítas que se viram sem ajuda ou apoio 
em partes perigosas do mundo. 
O papa Clemente não explicou sua decisão aos jesuítas ou a qual quer 
outra pessoa. “As razões [para essa decisão] nós mantemos tranca das em Nosso 
Coração”, escreveu ele. Apesar de tudo, os jesuítas obedeceram, colaborando 
obedientes com a morte de sua Ordem. 
Quarenta e um anos depois, em 1814, o papa Pio VII decidiu que o papado 
precisava da Companhia, e com isso a ressuscitou. Os jesuítas, revivificados, 
saíram em campo novamente, com renovado zelo pela vontade do papa, e 
usaram de enorme dedicação de homens e trabalho para garantir que o Concílio 
Vaticano I, em 1860, decretasse que a autoridade infalível do papa era um 
artigo de fé e um dogma revelado de forma divina. 
O esforço foi tão incisivo e surtiu tanto sucesso, e tão odioso para tantos, 
que angariou para os jesuítas pós-supressão um novo epíteto: eles eram os 
“ ultramontanos” — pessoas que apoiavam aquele abominável bispo que vivia 
“para lá das montanhas” (os Alpes), em Roma. O desprezo contido nesse nome 
injurioso é um claro indício daquilo que os jesuítas defendiam com o mesmo 
vigor de sempre: a antiga crença católica romana de que, por decreto divino, o 
homem que levava em si mesmo toda a autoridade de Cris to na Igreja deveria 
ser identificado por um elo físico com um ponto geográfico sobre a face desta 
Terra: a cidade de Roma. Esse homem seria, sempre, o bispo legal de Roma. E 
vigário pessoal de Cristo. 
Os novos inimigos daquela crença moravam, em sua maior parte, na 
França, Bélgica, Holanda, Alemanha, Áustria, Suíça e Inglaterra. Eram bispos, 
sacerdotes, teólogos e filósofos. Falando do seu lado dos Alpes, eles se 
chama vam de “ cismontanos” (pessoas “ do lado de cá das montanhas”, o lado 
norte), e se opunham à autoridade e à primazia do bispo romano. 
O fato de o catolicismo romano concentrado no papa romano ter 
florescido e se mantido na Europa ocidental até o último quarto do sécu lo 
XX deveu-se, principalmente, àqueles “ homens do papa” — ao seu 
zelo, à sua devoção àquela missão papal, à sua cultura, e à evolução que 
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eles instigavam na mente católica romana. Porque em qualquer área em que 
tocavam, os jesuítas introduziam uma nota de razão, um discurso racional, e 
eles o fermentavam com uma fé brilhante e vigorosa. 
Em poucas palavras, eles tomaram de assalto a mentalidade dos católicos 
no século XVI. Essa mentalidade tinha todas as suas amarras numa esfera pré - 
científica, pré-naturalista. No espaço de quatrocentos anos, com o seu próprio 
sepultamento no meio, os jesuítas mudaram aquilo tudo. Pelos seus métodos 
educacionais, por suas pesquisas e sua intrepidez intelec tual, eles 
possibilitaram aos católicos romanos a manutenção de sua posição, como 
homens e mulheres crentes e fiéis, no oceano de novas ideias e nova 
tecnologia que começou na década de 1770 e nunca mais parou. 
Periodicamente, na sua existência de mais de quatrocentos anos, os 
jesuítas foram expulsos e banidos de vários países — França, Alemanha, 
Áustria, Inglaterra, Bélgica, México, Suécia e Suíça. O termo “ jesuíta” se 
tornara tão conhecido como sinônimo de autoridade papal, que a ex pulsão 
deles era sempre um sinal claro de que o governo daquele país es tava 
determinado a eliminar a autoridade e jurisdição do papa romano. E quando a 
força bruta era usada contra eles, passavam para a clandestinidade ou faziam 
as malas e partiam, para esperar o dia em que pudes sem voltar. Sempre 
voltavam. Mesmo quando a situação não chegava a caso de expulsão, ninguém 
tinha qualquer ilusão sobre o que eles representavam — o papado — e muitas 
vezes a função dos jesuítas em nome do papado era desvirtuada por seus 
inimigos. Na América de início do século XIX, a oposição e o ódio 
protestantes aos jesuítas era expresso com vigor: “Eles [os jesuítas] vão fazer 
com q ue Roma governe a Uniã o.” 
Aquela identificação com o papado e aquela dedicação a ele tinham sido 
a vontade e a intenção de Inácio, seu fundador; e fora a condição sob a qual o 
papado consentira em criar a Sociedade de Jesus. Na vida e na mor te, os 
jesuítas escreveram realmente a história como “ homens do papa” 
— fosse o padre jesuíta Peter Claver consumindo sua existência entre es cravos 
sul-americanos; ou o padre Matteo Ricci tornando-se um autêntico mandarim 
na corte imperial de Beijing; ou o padre Peter Canisius, o Mar telo dos 
Hereges, recuperando províncias e cidades inteiras do protestantismo com suas 
incansáveis e incessantes viagens, pregações e obras escritas; ou o padre 
Walter Ciszek definhando no gulag soviético por dezessete anos; ou o padre 
Jacquineau servindo de mediador ente japones es e chineses que guerreavam 
por causa de Hong Kong; ou o padre Augustin Bea, viajando clandestinamente 
pelos quatro pontos cardeais da União Soviética na época de Stalin, para obter 
um retrato fiel das condições para a Santa Sé; ou o padre Tacchi Venturi 
levando de um lado para outro as negociações entre o ditador Benito Mussolini 
e o papa Pio XII. 
Não importa quem fossem ou onde estivessem, ou o que fizessem, 
inerente na mente de cada jesuíta estava aquele santa estrutura da Igreja de 
Cristo, ancorada por Jesus ao seu vigário pessoal, o papa, e mantida unida pela 
hierarquia de bispos e sacerdotes, pessoas religiosas e leigas em união com 
aquele vigário pessoal de Cristo. E não importa o ano ou 
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o século em que trabalhasse, cada jesuíta sabia que a Igreja Católica a que ele 
jurara servir sob as ordens do papa era a mesma Igreja que havia existido no 
século VI sob Gregório o Grande, no século XI sob Inocêncio IX e em 1540 
sob Paulo III. 
De lato, o que mantinha a vontade deles com relação ao seu traba lho por 
grandes distâncias de espaço e tempo era a lendária obediência jesuítica, 
consagrada pelo seu voto especial: o de que todo e qualquer trabalho que 
realizassem seria sob a obediência papal. 
Para os inimigos dos jesuítas, enquanto isso, eram precisamente o s erviço 
e a obediência ao papado que constituíam a abominação jesuíti ca. Seus críticos 
nunca cessaram de acusar os jesuítas de terem distorcido a filosofia humanista. 
Mas o escritor francês F. R. de Chateaubriand, que não era nada amigo da 
Sociedade, foi muito preciso em seu julgamento quando disse que “ o leve da no 
que a filosofia pensa lhe ter sido causado pelos jesuítas” não vale a pena ser 
lembrado, tendo em vista “ os incomensurá veis serviços que os jesuítas têm 
prestado à sociedade humana”. 
A mentalidade e a perspectiva criadas pelos jesuítas atingiram seu ponto 
máximo de desenvolvimento na primeira metade do século XX. Como 
resultado de seus esforços, houve uma pseudo-renascença do catolicismo 
social e cultural, permitindo que os católicos fossem cientistas, tecnólogos, 
psicólogos, sociólogos, cientistas políticos, líderes, artistas, eruditos, saindo - 
se bem mesmo nos campos mais novos do conhecimento e, no entanto, 
conciliando tudo com a sua crença firme como um roche do. O testemunho de 
tudo isso se encontra em muitas coisas — na poesia e na literatura de um G. K. 
Chesterton e um Paul Claudel; na sociologia militante de católicos franceses, 
alemães, belgas e italianos entre as duas guerras mundiais; na florescente 
missiologia que transformou os campos missionários da Ásia e da África; na 
temível escola de apologética na Europa e nos Estados Unidos; na 
padronização das devoções populares e dos regulamentos eclesiásticos; no 
vibrante catolicismo dos Estados Unidos; e quando nada, no relutante mas 
finalmente admitido respeito, por parte tanto de católicos como de não - 
católicos, que ficou evidente com relação ao catolicismo no mundo na década 
de 1950. 
Durante a época de seu maior florescimento, na primeira metade do século 
XX, o número de jesuítas atingiu o seu apogeu — cerca de 36.038 
— dos quais pelo menos a quinta parte era de missionários. A influência 
jesuítica sobre a política papal nunca foi maior, nem antes nem depois; e o 
prestígio dos jesuítas entre os católicos e os não-católicos nunca foi mais 
elevado. 
No entanto, já um pouco de podridão interna estava corroendo tan to os 
jesuítas como o corpo eclesiástico católico. Um câncer oculto, inse rido 
décadas antes naqueles corpos, ficara neutro, mas não benigno. 
Sintomas ocasionais traíam a sua presença — às vezes, revoltas de 
jesuítas em caráter individual; de vez em quando, abusos flagrantes na liturgia 
por parte de grupos individuais; raramente, mas com regularida de, a confusão 
entre atividade espiritual e vantagem política. Mas nada 
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do que acontecia vaticinava a violenta mudança que aguardava a Igreja, o 
papado e os jesuítas na década de 1960. 
Com plena visão das realizações sem paralelo, torna -se fascinante 
examinar que tipo de característica a Sociedade de Jesus desenvolveu durante 
suas atividades ao longo de séculos, e por que ou como, no século XX, ela 
transmudou a sua finalidade original. Não que seja esta a primeira vez em que 
um ou outro grupo da Igreja saiu de forma e decla rou guerra ao papado. Mas é 
a primeira vez que a Sociedade de Jesus se voltou contra o papado com a nítida 
ideia de desfazer as prerrogativas do papado, diluir o governo hierárquico da 
Igreja Católica e criar uma nova estrutura da Igreja; e é a primeira vez que a 
Sociedade de Jesus, tanto em bloco como por seus membros individuais, 
empreende uma missão sócio-política. 
Iñigo fundou a sua “Companhia de Jesus”, como ele a chamava originalmente, 
com uma finalidade: ser a defensora da Igreja e do papado. 
O papa que deu à Ordem uma existência oficial, no século XVI, tornou aquela 
finalidade a missão da Sociedade e a razão de sua existência. Como instituição, 
ela sempre esteve presa ao papa. Seus membros professos sempre estiveram 
ligados ao papa por um voto sagrado de absoluta obediência. Durante 425 anos, 
eles ficaram ao lado do papado, foram soldados em suas batalhas, ensinaram 
suas doutrinas, sofreram suas derrotas, defenderam suas posições, 
compartilharam de seus poderes, foram ata cados por seus inimigos, e 
constantemente promoveram seus interesses por todo o globo. Eram 
considerados por muitos, tal como eles mesmos se consideravam, os “ homens 
do papa”; e os muitos privilégios extraordinários concedidos por papas ao 
longo dos séculos eram como distintivos da confiança que o papado tinha na 
Sociedade. 
Nunca, pode-se dizer, a Sociedade de Jesus, como um bloco, se desviou 
dessa missão, até 1965. Naquele ano, o Concílio Vaticano II encerrou a última 
de suas quatro sessões; e Pedro de Arrupe y Gondra foi eleito para ser o 27º 
geral dos jesuítas. Sob a liderança de Arrupe, e na estonteante expectativa de 
mudança provocada pelo próprio Concílio, o novo ponto de vista — antipapal e 
de natureza sócio-política — que vinha medrando às escondidas há mais de um 
século, foi adotado pela Sociedade como pessoa jurídica. 
A rápida e completa reviravolta da Sociedade em sua missão e em sua 
razão de ser não foi acidente ou obra do acaso. Foi um ato delibera do, para o 
qual Arrupe, como geral, proporcionou uma liderança inspiradora, entusiástica 
e ardilosa. 
As percepções, entretanto, especialmente em questões de grandes ins-tituições 
religiosas, não se alteram com facilidade ou rapidez. A reputa ção 
angariada pela Sociedade ao longo de centenas de anos foi a melhor 
camuflagem para formar uma nova e muito diferente Sociedade que pas sou a 
existir nos últimos vinte anos. Com efeito, a história passada e glo riosa da 
Sociedade parece ter tornado invisíveis os feitos presentes e possibilitado à 
nova liderança jesuítica apresentar ao mundo o seu novo 
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ponto de vista como sendo a mais recente e melhor expressão da 
espiritualidade e da lealdade inacianas. 
Para a massa geral dos católicos, clérigos e leigos, era inconcebível 
que os jesuítas, logo eles, propagassem uma nova ideia da Igreja; ou que 
passassem a combater um só papa, quanto mais três, difamando-o, enganando-o, 
desobedecendo-o, esperando que cada um deles morresse, na esperança de 
que o papa seguinte lhes desse plenos poderes. 
Inevitavelmente, a guerra dos jesuítas contra o papado intensificou -se 
durante o pontificado de Karol Wojtyla como João Paulo II. Esse homem 
carismático, teimoso, chegou ao papado com sua vivida experiência dos 
marxistas na Polônia. Tudo o que se relacionava com ele — mas em especial 
seus objetivos, seu plano de ação e sua estratégia como papa — indicava um 
bem definido afastamento de tudo o que estivera em voga em Roma desde a 
década de 1950. 
Desde o momento de sua eleição, ficou evidente que João Paulo sofria 
a oposição de muitos elementos da burocracia do Vaticano por ele herdada. O 
que estava menos claro, mesmo para os veteranos observadores do Vaticano, 
era que ele também sofria forte oposição, e sua autori dade seria violentamente 
desafiada, por questões de método de ação, pela Sociedade de Jesus. 
Nada que João Paulo tem tentado desde que chegou ao Trono de Pedro em 
1978 — e ele já tentou tudo, da persuasão ao confronto e à intervenção direta 
— dissipou ou mesmo suavizou a decidida postura jesuítica contra ele. Até 
agora, os jesuítas têm frustrado os esforços do pontífice para cercá-los; e o 
exemplo deles ainda está sendo seguido em escala cada vez maior. 
Mas, como a Sociedade está aprendendo, esse papa polonês não é outro 
Paulo VI. Ele se recusa a erguer as mãos em desespero. Ao contrá rio, acaba de 
iniciar uma nova campanha na guerra, dessa vez num campo de batalha 
escolhido por ele mesmo. 
Como João Paulo está aprendendo, os jesuítas serão tão espertos e tão 
vivos em sua resposta a cada ofensiva papal como sempre foram em tudo o que 
fizeram. De fato, foram os jesuítas, e não o papado, que dis pararam a primeira 
salva de tiros na mais recente confrontação direta, num esforço de tirar a 
iniciativa do papado e da hierarquia romana. 
Seja qual for o resultado dessa campanha mais recente, e de outras que se 
seguirão, com toda certeza, não pode haver dúvida de que durante a nossa 
geração aquilo que o papado representa tornou-se inaceitável para os jesuítas; 
e que aquilo que a Sociedade de Jesus passou ultimamente a defender é hostil 
ao papado e, portanto, inaceitável para ele. 
No entanto, apesar do fato de que cada qual se coloca num pólo oposto ao 
outro, ainda permanecem poderosas similaridades entre o pa pado e a Sociedade 
— similaridades que irão significar que a guerra entre eles será mortal a um 
nível e a um grau atingidos por poucas guer ras. 
A primeira e mais poderosa similaridade é o inextirpável senso de 
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missão divina que é o instinto motor tanto no papado como nos jesuítas. Cada 
um deles alega estar agindo unicamente para o bem-estar do povo de Deus no 
mundo inteiro e para a exaltação da Igreja que Cristo fundou sobre Pedro. 
Uma segunda é que, como organizações que lidam com potencial humano 
e dons naturais, cada qual segura com mão firme as alavancas de um imenso 
poder temporal. Cada qual aplica suas energias e seus re cursos a situações 
específicas visando a fins particulares, concretos e definidos. 
Apesar de tudo — e isto é uma terceira similaridade — em meio à paixão 
e à aparente confusão que sempre acompanham a atividade humana, tanto o 
papado quanto os jesuítas operam num plano universal e desprovido de pai xão, 
com motivos que não permitem a vulnerabilidade dos sentimentos humanos. 
Ambos tentam agarrar o valor do momento presente, passageiro. Mas ambos 
têm lembranças respeitáveis; ambos medem constantemente seus planos e 
ações por um gabarito do futuro que desejam ver tornado realidade; e ambos 
partem do pressuposto de que o tempo está do seu lado. Bastante tempo. 
É neste ponto capital relativo ao tempo que melhor pode ser percebi do o 
inevitável resultado de todas as batalhas. Porque na perspectiva ca tólica 
romana — e também na perspectiva do jesuitismo inaciano clássico 
— existe outra dimensão, outra condição de existência humana, que ofusca 
essa guerra entre o papado e a Sociedade: dois poderes cósmicos — o bem 
inteligente e o mal inteligente, personificados em Deus e Lúcifer — estão 
atracados numa luta de vida ou morte pela fidelidade de todos os seres 
humanos. Essa luta só se torna tangível — pode ser rastreada e identificada — 
nos múltiplos detalhes de complexas situações humanas. Mas, pela mesma 
razão, tudo o que é tangível, toda e qualquer situação humana, é colorido pelo 
que é trans-humano e eterno. 
É essencialmente nesse plano que está sendo travada a guerra entre o 
papado e a Sociedade de Jesus. E nesse plano, só o papado é que tem a 
promessa divina de tempo. 
No plano que ocupamos como espectadores dos acontecimentos con-temporâneos, 
não temos possibilidade de prever quais as sementes do bem 
poderão germinar no que temos que resumir como área de calamidade. Estamos 
demasiado próximos desses acontecimentos. Falta-nos perspectiva — bem 
como presciência. A visão que temos pelo espelho da história é obscura. Não 
podemos, portanto, saber quais as alterações que haveria na Sociedade de 
Jesus se todos os extremismos atuais da Ordem dos je suítas fossem eliminados 
— entendendo-se por extremismos óbvios o abandono do ensinamento católico 
romano básico, a substituição dele por soluções sócio-políticas, e o abandono 
inevitavelmente consequente da primordial vocação dos jesuítas de serem 
“ homens do papa”. Uma tal reforma da Sociedade e uma nova adesão ao seu 
carisma inicial parecem, humanamente falando, improváveis quando se analisa 
até mesmo uma branda acusação de suas condições em nossos dias. 
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1ª PARTE 
A ACUSAÇÃO 
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1 . OBJEÇÕES PAPAIS 
Todo papa competente estabelece uma estratégia dominante para o seu 
papado. Formula muitos planos de ação, persegue vá rios objetivos 
determinados: mas todas as políticas e cada objetivo são enquadrados na esfera 
daquela estratégia. 
A Sociedade de Jesus foi criada pelo papado em 1540 como “ unidade de 
combate” muito especial, à disposição total do papa romano — fosse ele quem 
fosse. Desde o início, os jesuítas foram concebidos num estilo militar. 
Soldados de Cristo, receberam dois objetivos: propagar a doutrina religiosa e a 
lei moral do papa romano, e defender os direitos e prerrogativas daquele 
mesmo papa. Objetivos puramente espirituais e sobrenaturais. E 
especificamente católicos romanos. E o surpreendente foi que, devido a esse 
mandato da Sociedade, a própria estratégia papal s e tornou a cunha da 
separação entre os jesuítas e o papado — na verdade, a própria arena em que 
está sendo travada a batalha entre os dois. 
Pio XII, papa de 1939 a 1958, se viu num mundo novo dominado por duas 
superpotências rivais, uma das quais — a URSS — ele excomungou. Sua 
política de pós-guerra foi de uma intratável oposição ao marxismo soviético e 
de apoio à civilização “ ocidental”, centralizada na Europa e protegida pelos 
Estados Unidos. 
João XXIII, papa de 1958 a 1963, estava convencido de que uma política 
de “ janelas abertas, campos abertos” induziria outros — inclusive os soviéticos 
— a reformarem suas atitudes e políticas. O papa João arriou tantas barreiras 
entre a Igreja e o mundo — inclusive a União Soviética — quanto lhe foi 
possível em seu curto e muito ativo pontificado. Chegou, até, a garantir à 
União Soviética imunidade aos ataques da Igre ja, uma assombrosa reversão das 
atitudes papais. 
Foi um enorme jogo. E que só podia funcionar se reinasse entre os 
adversários participantes uma dos e adequada de boa vontade. 
O jogo fracassou. O grande detalhe comovente foi que, ao morrer, o papa 
João, aquele camponês realista, sabia que a sua abertura tinha sido vista como 
fraqueza, e dele se tinham aproveitado homens de um espírito muito inferior. 
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O papa Paulo VI, 1963-1978, cego para as deficiências da política de 
João, aprimorou-a ainda mais. A Santa Sé se tornou nada menos do que uma 
querelante no tribunal do poder soviético, pleiteando, no âmbi to diplomático, 
uma audiência; organizando conversações cautelosas; praticando a arte 
irresoluta das aproximações concessórias — e até mesmo se rebaixando ao 
mesquinho engano e traição do reconhecidamente difí cil primaz da Hungria, 
cardeal Mindszenty, a fim de agradar os soviéti cos e seu castrado representante 
húngaro, Janos Kadar.1 
Em tudo isso, Paulo VI, pessoalmente o mais delicado de todos os papas 
modernos, comprometeu inconscientemente a sua autoridade papal. Sua grande 
estratégia para a sua Igreja foi arrebatada e prostituída por terceiros, 
reduzindo-o a uma impotência que deixou cicatrizes nos seus últimos anos 
atormentados pela doença, até sua morte no dia 6 de agosto de 1978. 
Ainda assim, foi Paulo VI que, quando seu período papal já ia mui to 
avançado, percebeu que o propósito duplo original da Sociedade de Jesus tinha 
sido alterado. Durante o seu pontificado, foi organizado extenso dossiê crítico 
sobre a Sociedade. Por enquanto, é suficiente di zer que o que esse dossiê 
continha era comprometedor. Era um retra to, na realidade, de uma ordem 
jesuítica que, como um cata-vento no alto de um telhado, tivesse sido virada 
por um vento diferente. Para os jesuítas, o papado já não tinha a primazia de 
posição. O objetivo coletivo da Sociedade era colocar -se, junto com a Igreja, à 
disposição de uma mudança radical e puramente sócio-política do mundo, sem 
se reportar — na verdade, desafiando — à estratégia, às políticas e aos ob-jetivos 
papais. 
Em 1973, Paulo VI, alarmado mais do que nunca pela maneira de os 
membros da Sociedade se portarem, tentou deter a investida dos acon-tecimentos. 
Reuniu-se várias vezes com o chefe da Ordem, o padre-geral 
jesuíta Pedro Arrupe. Boa parte desses encontros entre os dois homens foi 
tempestuosa. Mais de uma vez, Paulo quis que Arrupe renunciasse ao cargo. De 
uma maneira ou de outra, Arrupe sobreviveu a todos os ata ques papais. Paulo 
VI insistiu, mesmo, q ue Arrupe transmitisse a seus jesuítas “ nossa ordem de 
que os jesuítas continuem leais ao papa”. Ar rupe e seus assistentes em Roma, 
àquela época, estavam decididos a se preparar para outra reunião internacional 
da Ordem, uma Congregação Geral, como é chamada essa assembleia. Por isso, 
foi ganhando tempo, um tempo precioso. Paulo, na sua fraqueza, não 
encontrava outra alternativa que não a de esperar. 
Paulo fez uma última, mas ineficaz, tentativa de lembrar a obediência da 
Sociedade ao papado, durante a assembleia internacional de líde res jesuítas, 
que durou 96 dias, a XXXII Congregação Geral de 1974-1975. Seus esforços 
encontraram total incompreensão e uma obstinada — farisaica até, alguns 
disseram — oposição por parte da Ordem. Papa e jesuítas simplesmente não 
conseguiram chegar a um acordo. Os jesuítas não queriam obedecer. Paulo 
estava fraco demais para forçar mais o debate. 
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“Quando se tem pessoas [os jesuítas]”, escreveu o padre jesuíta M. 
Buckley a respeito da atitude de Paulo para com aquela XXXII Congre gação 
Geral, “que não acham que tenham cometido erro, quer de conteúdo, quer de 
procedimento, e quando essas pessoas sofrem a desconfiança, resistência ou 
reprovação do próprio homem que elas estão tentando servir (...) tem-se (...) um 
problema religioso muito sério.” 
Para dizer o mínimo. 
O cardeal Albino Luciani, de Veneza, foi eleito para suceder Paulo VI no 
dia 26 de agosto de 1978. Mesmo antes de se tornar papa, parece que ele já 
tomara uma decisão notadamente desfavorável com relação à Sociedade. 
E aparentemente a Sociedade já tomara uma decisão com referência ao 
papa João Paulo I. Assim que foi eleito, os jesuítas fizeram suas reivindicações. 
O padre Vincent O’Keefe, o mais destacado dos quatro assistentes -gerais de 
Arrupe, e que estava sendo preparado para suceder a Arrupe um dia como geral 
da Ordem, declarou em entrevista a um jornal holandês que o novo papa deveria 
rever a condenação da Igreja ao aborto, à homossexualidade e ao sacerdócio 
feminino. A entrevista foi publicada. 
O papa João Paulo I ficou enfurecido. Aquilo era mais do que des prezo. 
Era uma afirmação de que a Sociedade de Jesus sabia, mais do que o papa, 
quais os princípios morais que os católicos deveriam praticar. E era uma 
afirmação de que a Sociedade tinha autoridade para dizer o que pensava; isto é, 
era uma apropriação direta da autoridade que pertencia exclusivamente ao papa. 
João Paulo I mandou chamar Arrupe e exigiu uma explicação. Arrupe 
prometeu, humildemente, investigar o caso todo. Mas João Paulo podia sentir o 
que estava no ar, tão bem quanto qualquer papa. Com ba se no dossiê crítico de 
Paulo VI, e com a ajuda de um velho jesuíta muito experiente, padre Paolo 
Dezza, que tinha sido confessor do papa Paulo VI e agora era o confessor de 
João Paulo I, o papa redigiu um violento discurso de aviso. Ele planejava 
proferi-lo à assembleia internacional de líderes jesuítas com o geral Arrupe, em 
outra de suas congregações gerais a ser realizada em Roma em 30 de setembro 
de 1978. 
Uma das características mais notáveis do discurso era a repetida re ferência 
que João Paulo I fazia aos desvios doutrinários por parte dos jesuítas. “Que não 
aconteça que os ensinamentos e as publicações dos jesuítas contenham alguma 
coisa que cause confusão entre os fiéis.” O desvio doutrinário era, para ele, o 
mais ominoso sintoma do fracasso jesuítico. 
Encoberto pelo polido verniz de sua graciosa romanità, aquele discurso 
continha uma clara ameaça: a Sociedade dever ia voltar ao seu papel adequado e 
prescrito, ou o papa seria obrigado a tomar providências. 
Que providências? Com base nos memorandos e notas de João Paulo, está 
claro que, a menos que fosse factível uma rápida reforma da Ordem, 
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ele tinha em mente a efetiva liquidação da Sociedade de Jesus tal como existe 
hoje — talvez para ser reconstituída mais tarde, numa forma que fosse mais 
controlável. João Paulo I recebeu pedidos de muitos je suítas implorando para 
que não fizesse aquilo. 
O papa nunca proferiu aquele discurso de aviso. Na manhã de 29 de 
setembro, depois de 33 dias no Trono de Pedro, e um dia antes de se dirigir à 
congregação geral da sociedade, João Paulo I foi encontrado mor to em seu 
leito. 
Nos dias que se seguiram, o geral jesuíta Arrupe apresentou um pedido ao 
cardeal Jean Villot, que como secretário de estado do Vaticano governava a 
Santa Sé no período intermediário entre a morte de João Paulo I e a eleição de 
seu sucessor: será que os jesuítas poderiam obter uma cópia do discurso? 
Depois de uma discussão com o Colégio de Cardeais, que o estava 
ajudando nos preparativos para a eleição do próximo papa, o cardeal pru - 
dentemente negou o pedido. Arrupe foi avisado de que, na opinião de Villot e 
do concílio, “ estava mais do que na hora de os jesuíta s colocarem seus assuntos 
em ordem”. 
Por sua parte, Arrupe e os jesuítas decidiram não fazer nada e ver quem se 
tornaria o papa seguinte. Tempo era o artigo que eles sempre procuravam ter. 
Mais do que nenhum de seus dois antecessores imediatos, Karol Wojt yla, 
da Polônia, eleito como João Paulo II no dia 16 de outubro de 1978, não podia 
hesitar naquela questão dos jesuítas. A grande estratégia papal de João Paulo II 
abrangia o Primeiro Mundo do capitalismo, o Segundo Mundo do comunismo 
soviético e o Terceiro Mundo dos chamados países subdesenvolvidos e em 
desenvolvimento. 
Wojtyla foi extremamente sagaz ao analisar o caráter e as limitações da 
estratégia papal a partir de 1945. Em sua opinião, Pio XII havia guia do a Igreja 
na base de uma mentalidade de “ cer co”, só permitindo à es tratégia papal um 
movimento clandestino dentro do império soviético, mas não oferecendo 
desafio algum à continuada erosão da Igreja naque la área. A política de 
“campos abertos”, de João XXIII, tinha sido um fracasso. A política de Paulo 
VI consistira apenas de uma refinação de uma política já defeituosa e 
fracassada. Até a época da morte de Paulo VI em 1978, seu Secretariado de 
Estado conseguira elaborar protocolos de acordo com mais de um governo - 
membro da “ fraternidade” socialis ta soviética, mas nenhum tinha sido 
rubricado, quanto mais assinado e transformado em lei. De qualquer maneira, 
ainda que aqueles protocolos tivessem sido ratificados, já se tornara claro que 
não teriam feito diferença alguma para a situação dos católicos romanos sob 
domínio soviético. 
Segundo a análise de João Paulo II, enquanto os chamados Primei ro, 
Segundo e Terceiro Mundos ficassem trancados no frio glacial da ri validade de 
superpotências alimentada indefinidamente pelo sistema de “ bola ao chão” 
entre o marxismo-leninismo e o capitalismo rígido, não haveria a mínima 
esperança, em termos mundanos, de que alguma coisa 
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pudesse ser salva — de que qualquer batalha fosse vencida ou de que fosse 
encontrada qualquer solução para o perigoso dilema das nações. A situação só 
iria se desintegrar, lenta mas inevitavelmente, possivelmente arrasando a 
civilização tal como os homens a conheceram no último quarto do século XX, e 
reduzindo a história humana a uma longa e angustiada caminhada sonambúlica 
até o fim da noite humana. 
Wojtyla achou que estava na hora de adotar uma norma de ação 
completamente diferente daquela que Pio, João, ou Paulo, tinha adotado antes 
dele. Sua abordagem seria na base da “força muscular”: onde os católicos 
constituíssem maioria ou, então, uma minoria de bom tamanho, em sociedade 
fechadas, deveriam exigir o espaço sócio-político que lhes cabia por direito — 
reivindicar seus direitos, em outras palavras, sob a alegação de que a sua 
simples presença como católicos romanos seria suficiente para garantir a 
defesa daqueles direitos. 
Quando cardeal-arcebispo da Cracóvia, na Polônia, Wojtyla já ha via 
afiado sua sagacidade no planejamento de uma estratégia pela qual tais 
maiorias e minorias católicas que ele tinha em mente pudessem rei vindicar 
seus direitos; no entanto, não havia entrado em conflito com o totalitário e 
inescrupuloso controle militar característico dos governos comunistas. 
O método de “ força” de João Paulo não afastou a hipótese de diá logo e 
discurso com os soviéticos e seus representantes. Pelo contrário. Mas seria de 
um tipo totalmente diferente daquele que João XXIII ou Paulo VI tinha 
adotado. E de fato, nenhum líder mundial de hoje tem falado aos líderes 
soviéticos com tanta frequência e de forma tão direta quanto João Paulo II, 
logo desde o princípio de seu pontificado. Ele re cebeu o prestigiado Andrei 
Gromyko, da União Soviética, que participara de muitos governos, no dia 24 de 
janeiro de 1979, pouco mais de três meses depois de sua eleição papal. Foi 
apenas o primeiro de oito encontros pessoais entre este pontífice e Gromyko 
entre 1979 e 1985. Suas conversas telefônicas com a Europa Oriental e com a 
União Soviética são assunto seu; é bastante que se diga que elas acontecem. Se 
você é um eslavo dos eslavos, se você fala russo além de duas ou três outras 
línguas europeias orientais, se você é papa, e se você é Karol Wojtyla, os 
agentes do poder desejam falar com você. 
Seria essencial, para a estratégia “ de força” de João Paulo II, que ele 
proporcionasse e impusesse, com sucesso, uma nova liderança mundial 
alimentada exclusiva e inquestionavelmente por motivos morais e es pirituais. 
A fim de ter até mesmo uma esperança de vencer numa estratégia assim tão 
ousada e tão radical, João Paulo II teria que demonstrar a lide rança que ele 
estava propondo em suas áreas-chave: sua autoridade suprema quanto a 
doutrina e moralidade teria que ser defendida e reafirmada dentro de sua Igreja 
de âmbito mundial; e deveria haver um exemplo concreto do que aquela 
liderança podia oferecer como solução para o dilema internacional. 
Daí as duas linhas mais visíveis da atividade papal de João Paulo: 
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suas viagens pelo mundo todo e sua cuidadosa orientação do movimento 
Solidariedade na Polônia. O aparecimento dessa figura papal em todos os 
principais países e em muitos outros sem tanta importância seria o meio de 
restabelecer aquela autoridade. E se o movimento Solidariedade con seguisse a 
liberdade de ação econômica e cultural sob a égide do comu nismo soviético na 
Polônia, os comunistas e os capitalistas teriam um exemplo vivo para mostrar 
que a política doutrinária não precisa resultar em escravidão, pobreza ou um 
devastador militarismo. 
Com a orientação e a ajuda financeira de João Paulo II, o primaz da 
Polônia, cardeal Stefan Wyszynski, de oitenta anos, estava obtendo progresso 
no desenvolvimento de uma atitude na organização do Solida riedade através da 
qual a Igreja e seu povo pudessem escapar, cultural e socialmente, das garras 
do comunismo. O éthos do Solidariedade foi desenvolvido precisamente pa ra 
permitir essa liberdade cultural e social, enquanto deixava intato o controle 
político e militar do marxismo. “Não ameacem os marxistas do Partido 
Comunista da Polônia, no Parlamento Nacional, no seu exército ou em suas 
forças de segurança”, era o lema dos fundadores do Solidariedade. “Deixem-nos 
em paz. Vamos reivindicar liberdade nas outras áreas.” 
Ao mesmo tempo, no outro lado do mundo, na área que se estende das 
fronteiras sul do Texas até à ponta da América do Sul, jesuítas e ou tros 
estavam executando uma política própria como criadores e princi pais 
fomentadores de uma nova concepção — que eles chama vam de “Teologia da 
Libertação”, numa tentativa caracteristicamente eficiente de inspirar um apelo 
romântico — baseada em princípios revolucionários marxistas e visando 
instalar um sistema comunista de governo. A contra dição entre o modelo 
polonês de João Paulo e o modelo de “Libertação” defendido ardorosa e 
abertamente pelos jesuítas na América Latina não poderia ter sido mais 
completa ou petulante. 
João Paulo II, como João Paulo I antes dele, tinha conhecimento do dossiê 
sobre os jesuítas compilado na época de Paulo VI. E tinha em seu poder, 
também, o discurso de reprovação que João Paulo I havia preparado mas nunca 
pronunciara. Em novembro de 1978, um mês após sua eleição, o papa enviou o 
discurso de João Paulo I ao padre-geral Arrupe no Gesù, como é chamada a 
sede internacional dos jesuítas em Roma. 
O papa queria que o gesto tivesse a natureza de um aviso benigno: é como se 
este discurso tivesse sido escrito por mim, dizia o gesto. Em respos ta, como era 
de se esperar, ele recebeu do geral os devidos protestos de lealdade e 
obediência. Mas estes iriam revelar-se apenas isso: protestos. 
Na noite de 31 de dezembro, como gesto de boa vontade, o papa fo i à 
igreja jesuítica do Gesù, a fim de honrar a Sociedade com a sua presen ça 
durante as tradicionais cerimônias religiosas de fim de ano, de dar gra ças a 
Deus. João Paulo mandou dizer aos jesuítas, de antemão, que não queria ver 
nenhum deles em trajes civis. E não viu. Talvez fosse uma pequena concessão 
ao papa, ao qual cada um dos presentes prestara votos importantes e sem igual. 
Mas foi a única. 
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Até mesmo a comitiva de João Paulo observou a polida frieza dos 
notáveis jesuítas reunidos para a ocasião. Depois das cerimônias religiosos, o 
papa jantou com os jesuítas no refeitório deles. Foi cortês em suas 
observações, reclamou um dos jesuítas presentes mais tarde, mas “ não nos fez 
a menor insinuação sobre o futuro da Sociedade”. 
Aquela reclamação tinha um significado que daria para encher volumes, 
Os jesuítas tinham conseguido ignorar Paulo VI e João Paulo I. Por que iriam 
precisar de João Paulo II? Os jesuítas teriam simplesmente que ter paciência e 
sobreviver a esse papa, como haviam sobrevivido aos doi s anteriores. 
Dois meses após aquele encontro de fim de ano entre o papa e seus 
jesuítas, nos meses de fevereiro e março de 1979 o geral Arrupe convocou 
entrevistas coletivas no México e em Roma, nas quais afirmou afavelmente 
que não havia atrito algum ent re o santo padre e os jesuítas. Sim, confirmou 
Arrupe a jornalistas no Gabinete Internacional de Imprensa da Santa Sé, ele 
havia recebido aquele discurso de João Paulo I, que João Paulo II havia 
assumido como sendo dele próprio. Falava -se, continuou ele, que o 
documento “ tinha um sentido pejorativo e era uma reprimenda” dirigida às 
alterações feitas na Sociedade sob a liderança de Arrupe que já durava 
quatorze anos. Mas aquilo era um absurdo, disse Arrupe. O papa sabia que, 
“ naturalmente, a Sociedade de Je sus ha via mudado”, conti nuou ele. “Não 
poderia ser de outra maneira, ao ver que a própria Igreja havia mudado.” Não 
havia, na realidade, atrito algum, concluiu ele. 
Sua Santidade pensava o contrário: havia um grave atrito. Aquilo que 
João Paulo chamava de “ atrito sobre pontos fundamentais”. 
Teólogos e escritores jesuítas, na Europa e nas Américas, tinham estado, 
e ainda estavam, ensinando e escrevendo sobre crenças e leis católi cas de uma 
maneira que se opunha aos ensinamentos papais tradicionais e aos 
ensinamentos anteriores da Igreja como um todo — sobre a autoridade papal; 
sobre o casamento entre o marxismo e a cristandade; sobre a moralidade 
sexual em todos os seus aspectos; sobre crenças sagradas católicas como a 
Conceição da Virgem Maria, a existência do Inferno, 
o sacerdócio. Eles estavam, na verdade, redefinindo e remodelando tudo do 
catolicismo que os católicos sempre consideraram como valores pelos quais 
valia a pena viver e morrer — inclusive a própria natureza e consti tuição da 
Igreja que Cristo fundou. 
O geral Arrupe continuou a permitir a publicação de livros que con - 
tradiziam toda a gama de ensinamentos tradicionais, e a defender seus homens 
que escreviam e ensinavam segundo aquela orientação. Nenhum apelo papal ao 
padre Arrupe jamais pareceu ter qualquer efeito, diante da complicada e 
engenhosa delonga do geral jesuíta. 
Arrupe iria examinar a situação, prometia ele ao santo padre. Dizia ele 
que já tinha inquéritos em mãos. Iria mandar informações o mais rá pido 
possível. Era difícil separar a verdade de boatos malévolos. Ele fa ria esforços 
no sentido de esclarecer posições. Era preciso tempo. Seus homens estavam 
fazendo o possível. Seus pontos de vista tinham sido dis torcidos. 
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A guerra entre o papado e os jesuítas
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  • 1.
  • 2. Como os jesuítas de hoje estão usando o poder espiritual conquistado através dos séculos para tentar influir nos rumos da política internacional, De aliados do Papa e seus intransigentes de-fensores, os jesuítas passaram de algum tempo para cá a ser os seus mais ativos opositores. Malachi Martin, teólogo eminente e antigo je-suíta, revela como os atuais dirigentes da Com-panhia de Jesus a transformaram na maior inimiga do capitalismo democrático do Mundo Ocidental - 2 -
  • 3. OS JESUÍTAS Malachi Martin, destacado teólogo e especialista em Igreja Cató - lica, ex-jesuíta e professor do Pontifício Instituto Bíblico do Vaticano, ousou assestar um holofote nos véus dos segredos que encobrem as a ti-vidades da mundialmente poderosa Igreja Católica Romana. Neste uni - verso em que a fé e o poder entram em choque, a Sociedade de Jesus tem sido, talvez, a mais lendária e fabulosa, a mais admirada e inju riada na prática de ambos. De seu início numa época revolucionária, e ao longo dos quatro séculos e meio de sua tumultuada existência, os jesuítas têm sido ao mesmo tempo um enigma e um modelo para o resto do mundo. Amigos e inimigos, católicos e não-católicos, todos têm ten-tado resolver o poder e o segredo desses homens, treinados e devotados do ponto de vista religioso que também são gigantes em todas as atividades seculares da humanidade. Nas ciências e nas artes, nas le tras, na exploração e no ensino — para não falar na política mundial —, os jesuítas sempre visaram ao melhor. E foram. No entanto, o aspecto mais desconcertante da Sociedade de Je sus, e o que mais enfurecia seus inimigos, era que, apesar de todo o poder, os jesuítas eram gigantes com uma finalidade: a defesa e a pro pagação da autoridade e do ensinamento papais. Fiéis a um ideal espiritual, e para “A Maior Glória de Deus”, eram os defensores por excelência dos interesses vitais da Igreja, a Força Especial do vigário terreno de Cristo. Não eram apenas “Homens do Papa”. Eram os Homens do Papa. Até agora. Em Os Jesuítas, Malachi Martin torna pública, pela primeira vez, a pungente história dos bastidores de homens e seus motivos e dos meios por eles usados, por trás da camuflagem da grandeza jesuíta no pas sado, para construir a “nova” Sociedade de Jesus no âmbito mundial. O leitor conhecerá os líderes e os joguetes; o sangue e o pathos-, a política, as traições e as humilhações; as campanhas de vendas enlatadas que se estendem de Roma e de Washington para o mundo e que mas caram uma missão estranha e destruidora. - 3 -
  • 4. MALACHI MARTIN OS JESUÍTAS Tradução de LUIZ CARLOS DO NASCIMENTO SILVA EDITORA RECORD - 4 -
  • 5. Título original norte -americano THE JESUITS Copyright da edição original cm l íngua inglesa © 1987 by Malachi Martin Copyright desta tradução - 1989 by Distribuidora Record S.A. Todos os direi tos reservados inclusive o direito de reprodução total ou parcial sob qualquer forma Esta edição é publ icada mediante acordo com o edi tor original , Simon & Schus ter, New York. O contrato celebrado com o edi tor original proíbe a exportação des te l ivro para Portugal e outros países de l íngua portuguesa. Direitos de publ icação exclusivos em l íngua portuguesa no Brasi l adquiridos pela DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVIÇOS DE IMPRENSA S.A. que se reserva a propriedade l iterária desta tradução Impresso no Brasi l pelo Sistema Cameron da Divisão Gráf ica da DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVIÇOS DE IMPRENSA S.A. Rua Argentina 171 — 20921 Rio de Janeiro, RJ — Tel . : 580-3668 PEDIDOS PELO REEMBOLSO POSTAL Caixa Postal 23.052 — Rio de Janeiro, RJ — 20922 - 5 -
  • 6. SUMÁRIO A Guerra 9 1ª Parte: A ACUSAÇÃO 1. Objeções Papais 35 2. O Campo de Provas 45 3. Papa Branco, Papa Negro 69 4. A Humilhação Papal 93 5. Desobediência Sumária 107 2ª Parte: A SOCIEDADE DE JESUS 6. Iñigo de Loyola 129 7. O Modelo Inaciano 153 8. A Companhia de Inácio 169 9. O Caráter da Sociedade 181 10. O Superior Máximo 203 11. Furacões na Cidade 221 3ª Parte: OS LIBERTADORES 12. A Doutrina Cativante 235 13. George Tyrrell, S.J. 247 14. Pierre Teilhard de Chardin, S.J. 259 15. A Teologia da Libertação 275 16. O Segundo Concílio Vaticano 289 4ª Parte: O CAVALO DE TRÓIA 17. O Segundo Basco 303 18. Roupas Antiquadas 327 - 6 -
  • 7. 19. Novos Fios Contínuos 339 20. A Procura do Carisma Primitivo 355 21. O Novo Tecido 385 22. Imagem Pública 409 A Ânsia para Construir o Mundo do Homem 425 Notas 453 Fontes e Dados 463 - 7 -
  • 8. À Nossa Senhora de Fátima - 8 -
  • 11. E xiste um estado de guerra entre o papado e a Ordem Religiosa dos Jesuítas — a Sociedade de Jesus, para dar à Ordem seu nome oficial. Essa guerra assinala a mais mortífera alteração a acontecer nas fileiras do clero romano nos últimos mil anos. E, como todos os acontecimentos importantes na Igreja Católica Romana, envolve os interesses, as vidas e os destinos de milhões de homens e mulheres comuns. Como acontece com tantas guerras de nossa época, os jesuí tas não declararam a deles contra o papado. Na verdade, embora as primeiras escaramuças às claras começassem na década de 1960, levou tempo para que os efeitos da guerra — até mesmo efeitos muito profundos — se tornassem amplamente visíveis. Como os líderes da guerra eram os Superiores da Ordem, foi uma questão simples colocar homens com a mesma identidade de pensamento encarregados dos órgãos de poder, autoridade e comunicações por toda a organização. Feito isso, a imensa maioria dos jesuítas pouco tinha a dizer nas decisões extraordinárias que se seguiram. Com o tempo, houve manifestações em voz grave e avisos sobre o que estava acontec endo. “Está havendo um golpe de estado”, escreveu um jesuíta, ao olhar estupefato para “ a facilidade com que está sendo conseguida a dissolução da ordem estabelecida [na Sociedade de Jesus]”. Àquela altura, entretanto, já se estava no início dos anos 70, a guer ra já vinha sendo feita há quase uma década, e alarmas como aquele de pouco adiantavam. De fato, dada a estrita obediência dos jesuítas — um elemento lendário e de eficiência comprovada ao longo dos anos, da anti ga estrutura, que os novos líderes ainda achavam útil quando tratavam com os dissidentes de suas políticas estranhas —, os subalternos da Ordem não tinham outra alternativa senão acompanhar as mudanças que, nas palavras de outro jesuíta, “arrancaram a Sociedade de Jesus de sob os nossos pés e [a] transformaram numa entidade monstruosa sob o dis farce de bons objetivos”. Ainda assim, pode alguém pensar em perguntar, suponhamos que haja um problema entre o papado romano e os jesuítas; qual a gravidade que isso pode ter? Chame de guerra, se quiser. Mas, francamente, será que não se trata de apenas outra disputa na Igreja Católica Romana? Num mundo que se vê balançando à perpétua beira da aniquilação, e no qual metade da população morre de fome enquanto a maioria da outra metade está presa à lama por um tipo de injustiça ou outro, que importância pode ter uma desinteressante discussão teológica? Mais ou menos tão importante, talvez, quanto saber quantos anjos podem dançar na cabeça de um alfinete! A verdade, porém, é que não se trata de disputa sobre sutilezas, nem - 11 -
  • 12. mesmo de desavença teológica entre o papado e os jesuítas que envolva apenas doutos, clérigos e fiéis. Como o papado e os jesuítas sabem, os efeitos de suas políticas vão muito além dos limites da Igreja Católica Romana; além até mesmo dos quase um bilhão de homens e mulheres católicos no mundo inteiro. Quase tudo o que acontece nessa guerra tem relaç ão direta e imediata com as grandes dissensões que castigam todas as nações e povos do mundo. Está no exato centro da rivalidade entre os Estados Unidos e a União Soviética, por exemplo. Relaciona-se, neste exato momento, ao destino — de miséria ou de felicidade — de 350 milhões de pessoas na América Latina. Afeta o código de moral pública e o consenso nacional do povo norte-americano, ambos em profunda mudança; a iminente preponderância, nos assuntos humanos, da República Popular da China; a frágil persistência de uma Europa Ocidental livre; a segurança de Israel; a ainda tosca promessa de uma África negra viável, que está no nascedouro. Todas essas coisas, por separadas e desconexas que possam parecer, estão não apenas interligadas umas às outras, mas estão e serão profundamente influenciadas pelas ondas e pelo resultado da coli são global entre o papado e a Sociedade de Jesus. Todas as guerras se relacionam ao poder. Na guerra entre o papado e a Sociedade, o poder flui ao longo das linhas de duas questões fundamentais e concretas. A primeira é a autoridade: quem está no comando da Igreja Católica Romana no mundo inteiro? Quem estabelece a lei quanto a em que os católicos romanos devem acreditar e que tipo de princípios morais devem eles praticar? A segunda questão é o propósito: qual é o propósito da Igreja Católica Romana neste mundo? Para o papado, as respostas a ambas as questões são claras e bem conhecidas. A autoridade para ordenar e ensinar desce, pela sua estrutu ra hierárquica, do papa aos bispos, aos padres e aos leigos. E o único propósito da Igreja neste mundo é fazer com que todo indivíduo tenha os meios de alcançar a vida eterna de Deus depois da morte. Trata -se de um propósito exclusivamente espiritual. Para muitos jesuítas, em contrapartida, a autoridade centralizada da Igreja, a estrutura de comando por meio da qual é exercida e sua finali dade são, todas, inaceitáveis hoje em dia. As tradicionais prerrogativas deste papa, João Paulo II, ou de qualquer papa, são censuráveis. No lugar de uma Igreja hierárquica, eles visam a uma Igreja composta de comunidades pequenas e autônomas — “ o povo de Deus”, como são conhecidas em conjunto, ou “ a Igreja do p ovo” — todas associadas livremente apenas pela fé, mas de forma nenhuma por uma autoridade central e centralizadora como o papado alega ser. No lugar do propósito espiritual da Igreja tradicional, a Sociedade de Jesus colocou a luta, no presente, pela libertação de uma classe de homens e mulheres da nossa sociedade de hoje: os milhões de vít imas da injustiça social, econômica e política. A maneira de falar na luta de classes é uma questão importante e _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 12 -
  • 13. delicada para os jesuítas. A nova missão da Sociedade — porque não é nada menos do que isso — coloca-os subitamente numa aliança real e, em certos casos, de bom grado com os marxistas em sua luta de classes. O objeti vo de ambos é criar um sistema sócio-político que afete as economias das nações por uma completa redistribuição dos recursos e bens da terra; e, no processo, alterar os sistemas de governo atuais em voga entre as nações. Para a Sociedade, porém, não interessa vir a público e dizer tudo isso como sendo política da entidade. Seria perder a guerra antes mesmo que as tropas estivessem todas dispostas em formação de combate. Para cobrir a mesma realidade, a expressão corrente entre os jesuítas e outros dentro da Igreja que simpatizem com essa nova missão é uma frase ar rancada de seu contexto original num documento divulgado em 1968 por uma Conferência de Bispos Católicos realizada em Medellín, Colômbia: “ exercer uma opção preferencial pelos pobres e oprimidos”. Nada do que foi dito significa que a Sociedade de Jesus se tornou, em qualquer momento, marxista. Não. Apesar disso, a cruel realidade é que muitos jesuítas desejam ver uma alteração radical no capitalismo democrático do Ocidente, em favor de um socialismo que parece inevitavelmente sur gir cheirando a comunismo totalitário. E a verdade é que não faltam jesuí tas influentes que se manifestem regularmente em favor da nova cruzada. Um breve retrato de três jesuítas — um cientista sócio-político, um dedicado guerrilheiro e um tremendo teólogo-professor — irá fazer um rápido esboço do amplo e geral arco do empenho do jesuíta moderno em vencer essa guerra. O primeiro, Arthur F. McGovern, S.J., é um destacado e convicto apologista do novo anticapitalismo jesuítico. Em 1980, ele publicou um livro sobre a matéria — Marxism: An American Christian Perspective — e em muitas ocasiões tem exposto com franqueza o que pensa. Em essência, McGovern diz que o marxismo foi e é uma crítica social, pura e simples. Marx queria, apenas, que pensássemos mais claramente nos meios de produção, em como as pessoas produzem; e nos meios de distribuição, nas pessoas que possuem e controlam os meios de produção. Em tudo isso, o marxismo não pode ser riscado por ser “ não verdadeiro”. Foram Engels e Lenin q ue acrescentaram os desagradá veis ingredientes de “materialismo científico” e ateísmo. Basta ler os trabalhos não publicados do jovem Marx para que se fique conhecendo o “ seu lado mais huma nista”. Em consequência, conclui McGovern, temos que isolar a crítica social de Marx, que é “ verdadeira”, daqueles elementos estranhos. Podemos acei tar o conceito de Marx de uma luta de classes, porque existe uma luta de classes. Isso quer dizer, mesmo, revolução, mas “revolução não significa nitidamente violência (...) significa que temos que ter um novo tipo de so ciedade, por certo não o capitalismo democrático tal como o conhecemos”. McGovern vê em Jesus, tal como retratado no Evangelho Segundo São Lucas, um modelo de revolução. O Eva ngelho de São Lucas é um “ evan gelho social”, diz ele, citando Jesus em apoio de sua causa: “Vim para pre gar a boa-nova aos pobres, libertar os oprimidos, redimir os cativos.” _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 13 -
  • 14. “Vejam”, acrescenta McGovern, “ quantas vezes Jesus fala na pobreza; se identifica com os p obres; critica aqueles que lançam ônus sobre os pobres.” Está claro, portanto, que Jesus reconhecia a “ luta de clas ses” e endossava a “revolução”. Consciente ou inconscientemente, como a maioria dos jesuítas modernos e muitos ativistas católicos, McGovern pôs de lado, efetivamente, mil e quatrocentos anos de uma rica interpretação católica, autenticamente cristã, da Bíblia. Ele reinterpretou o Evangelho e a missão salvífica do Filh o de Deus num sentido econômico, num sentido de preocupação com as coisas terrenas, num sentido não-sobrenatural, num sentido não-católico. Todo o resto vem em seguida. Como o “ novo tipo de sociedade” não p ode ser “ o capitalismo de - mocrático tal como o conhec emos”, os Estados Unidos, como líder e mais bem-sucedido expoente do capitalismo democrático, vêm para o centro do palco. De fato, logo nos primórdios da guerra, na década de 1960, quando os jesuítas dos Estados Unidos adotaram um “projeto jesuítico de liderança nacional”, o plano deles era explícito quanto à intenção de alterar a estrutura fundamental da América de uma democracia capitalista: “Nós, os jesuítas, temos qu e reconhecer que participamos de muitas estruturas pecaminosas da sociedade americana. Por isso, corremos o risco do pecado, a menos que trabalhemos para mudar isso.” Como uma andorinha, só, não faz verão, um só McGovern — ou mesmo um só “ projeto jesuítico de liderança nacional” — não faz uma guerra. Tirando-se a política declarada no projeto, em todos os sentidos práticos a Sociedade de Jesus se dedica como um todo a essa luta de clas ses. A sua mensagem chega, hoje, de mil fontes diferentes entre clérigos e teólogos que vivem nos países de capitalismo democrático. Ela é vene rada numa teologia totalmente nova — a Teologia da Libertação — cujo manual foi escrito por um jesuíta peruano, padre Gustavo Gutierrez, e cujo quadro de honra inclui um número notável de destacados jesuítas latino-americanos como Jon Sobrino, Juan Luis Segundo e Fernando Cardenal. Não se trata de nomes bem conhecidos ouvidos nos noticiosos de todas as noites nos EUA. Mas são homens de significativa influência internacional para as Américas e para a Europa. Embora o movimento tenha sido global desde o começo, foi acima de tudo na América Latina que a estranha aliança entre jesuítas e marxis tas tomou o seu primeiro impulso prático. Foi lá que essa nova missão jesuítica, envolvendo, como envolve, nada menos do que a transforma ção da face sócio-política do Ocidente, enredou vidas de maneira muito mais profunda do que McGovern e teóricos como ele previam. Rapidamente, dezenas e dezenas de jesuítas começaram a trabalhar, com a paixão e o zelo que sempre lhes foram característicos, pelo sucesso dos sandino-comunistas na Nicarágua; e quando os sandinistas tomaram o poder, aqueles mesmos jesuítas assumiram cargos cruciais no governo central e atraíram outros para participarem em vários níveis regionais. Enquanto isso, em outros países centro-americanos os jesuítas não apenas _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 14 -
  • 15. participavam no treinamento de quadros marxistas em guerrilhas, mas alguns se tornaram também guerrilheiros. Inspirados pelo idealismo que viam na Teologia da Libertação, e encorajados pela independência ine rente à nova ideia da Igreja como um grupo de comunidades autônomas, os jesuítas achavam que tudo era permitido — e mesmo estimulado — desde que promovesse o conceito da nova “ Igreja do povo”. Aqueles homens eram o sonho e o ideal dos verdadeiros teólogos da li - bertação. Pois eles eram os combatentes, os quadros que levaram a Teologia da Libertação de teoria para o que chamavam de práxis — a implementação da revolução popular pela libertação econômica e política. Daquela práxis, insistiam os teólogos da libertação, “ lá de baixo, entre o povo”, viria toda a verdadeira teologia, para substituir a velha teologia que certa vez fora imposta autocraticamente “ de cima” pela hierarquia da Igreja Roma na. O segundo nome naquele arco dos novos esforços jesuíticos é James Francis Carney, S.J., homem que foi o modelo da práxis — talvez o mais completo, embora não o mais famoso ou influente de todos os modernos teólogos jesuítas da Libertação. Carney nasceu e foi criado em Chicago. Fez o aprendizado para je suíta na província de Chicago; ao terminar seu aprendizado, apresentou-se como voluntário para trabalhar na América Central e foi enviado para lá em 1961. Ficou tão impressionado pela sua temporada centro-americana, que se tornou cidadão hondurenho. Ao longo dos anos, Carney sorvia a Teologia da Libertação como se se tratasse de vinho raro. Tornou-se conhecido como defensor dos pobres e crítico severo, incansável e impiedo so dos governos e dos exércitos estabelecidos, em especial em Honduras. Seu nome e suas atividades eram publicamente associados aos guerrilhei ros baseados na selva. Mesmo quando foi fixado um preço por sua cabeça pelas autoridades militares hondurenhas, não houve providência alguma dos superiores jesuítas no sentido de impedir as associações de Carney às guerrilhas. Na verdade, Carney era apenas um dos vários jesuítas em Honduras, Nicarágua, Guatemala e Costa Rica que estavam todos seguindo o mesmo caminho com as bênçãos de seus superiores locais e romanos. Contente, sentado numa champa em ruínas, de chão batido, na cidade nicaraguense de Limay, onde fora buscar refúgio da guerra de guer rilhas em Honduras, o padre jesuíta de 47 anos acabou de escrever sua autobiografia à luz de vela. Era o dia 6 de março de 1971. Àquela época, Carney já tinha atrás de si dez anos de dificuldades e trabalho na América Central, e cerca de doze anos ainda para viver. O “ padre Lup e”, como o chamavam os nativos com carinho (o nome era a forma abreviada de Guadalupe), Contou ao mundo que havia extraído os três esteios ou verdades básicas da Teologia da Libertação do s trabalhos de seu colega jesuíta Juan Luis Segundo. As obras são áridas e deploráveis. Grace and the Human Condition, de Segundo, mostrou a Carney que “ tudo, neste mundo, é sobrenatural”. The Sacraments Today, de Segundo, revelou ao padre Lupe que “ a humanidade está desenvolvendo uma ideia mais correta de Deus”. E Evolution and Guilt, de Segundo, ensinou _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 15 -
  • 16. a ele que “ a dialética revolucionária tem que vencer o pecado do con - servadorismo da Igreja”. Com o mais triste dos amores, Lupe já havia escrito para sua família nos Estados Unidos, para dizer-lhe o que iria fazer. A carta é reproduzida em sua autobiografia. Ele tinha que compartilhar da revolução com seus adorados campesinos hondurenhos porque, escreveu ele, “ não suporto viver com vocês segundo a sua ma neira de viver”. O capitalismo, disse ele, em cujos pecados estavam imersos todos os americanos, era um mal tão abominável quanto se achava que era o comunismo. Só a revolução armada poderia erradicar “ o capitalismo e o imperialismo supranacional da América Central. (...) Ser cristão é ser revolucionário”. “Nós, os cristãos-marxistas, teremos que lutar lado a lado, na América Central, com os marxistas que não acreditam em Deus, a fim de formarmos uma nova sociedade socialista (...) um modelo centro-americano puro.” Embriagado pelo idealismo carregado de ignorância dos teólogos da libertação, esse jesuíta passou a acreditar que “ um marxista não é dogmático, mas dialético. Um cristão não condena ninguém do ponto de vis ta dogmático, mas respeita as crenças dos outros. Um cristão anticomunista dogmático não é um cristão verdadeiro, e um marxista anticristão dogmático não é um marxista de verdade”. Tendo investido a dura realidade do marxismo, tal como tem sido historicamente conhecida, com uma magia visionária sem nenhuma realidade tridimensional, Carney esboçou, para a família, o seu “modelo centro - americano p uro”. “Nem comunista nem capitalista (...).” O novo socialismo será “ uma fraternidade de toda a humanidade (...) e igualmente uma sociedade sem classes (...)”. Teologicamente falando, “ o universo do homem está em evolução dialética em direção ao Reino de Deus (...)”. Muito embora todos “ respeitem a crença dos outros”, Carney con seguiu ser muito mais honesto do que McGovern a o reconhecer q ue “ (...) d ialético significa conflitante, avançando por uma série de lutas entre pes soas de ideologias contraditórias (...)”. Na verdade, Carney ficara con vencido de que o propósito real da dialética da luta era vencer “ o pecado” do conserva dorismo que é o pecado peculiar da Igreja Católica Romana. O plano de Deus para a evolução do mundo e da sociedade humana iria desdobrar -se em conflito e na revolução armada. A transformação assim provocada seria completa; seria, ao mesmo tempo, uma mudança “cultural -espiritual” , e uma “mudança econômica, social e política”. Carney terminava sua autobiografia com um apelo a todos os cristãos: “(...) livrem-se de quaisquer preconceitos injustos e não-cristãos que tiverem contra a revolução armada, o socialismo, o marxismo e o comunismo. (...) Não existe uma terceira opção entre ser cristão e ser revolucionário (...).” Isso foi o apelo máximo em favor da práxis. Mais tarde, naquela primavera de 1971, com a concordância de seus superiores, Carney atravessou ilegalmente a fronteira, t ornando a entrar em Honduras para partilhar da vida de ataques e retiradas rápidas de um _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 16 -
  • 17. comando guerrilheiro. Foi o início de doze anos de práxis a mão armada pelo “conflito dialético” que ele tinha em alta estima como sendo a cha ve para o futuro do catolicismo. De comum acordo com seu superior provincial, padre Jerez, que àque la altura sofria certa pressão de Roma e do Vaticano, o padre Carney aca bou se desligando dos jesuítas. O entendimento que tinha com Jerez e seus superiores era de que poderia tornar a entrar para a Sociedade tão logo a luta terminasse. A Sociedade, no final das contas, era apenas conveniência. Num mundo em que tudo já era sobrenatural, como o padre Lupe escreveu dizendo ser essa a verdade para ele, não havia lugar para regras rígidas; não havia lugar para uma Igreja Romana infalivelmente autoritária. Não havia necessidade de qualquer Igreja santificar coisa alguma, porque tudo era sobrenatural e, portanto, já era santo. A Igreja era apenas uma parte outra da humanidade, ao nível da humanidade em relação a Deus, aprendendo à medida que a humanidade aprende, deslocando-se com a humanidade em direção a uma utopia na Terra. “ Fico desgostoso”, escreveu Carney, “mas quero ser honesto e não prejudicar os jesuítas ao me unir às guerrilhas como um desobediente fugitivo da Sociedade, obrigando-os a me expulsarem.” Como demonstra ram outros que vieram depois dele, Carney não precisava ter -se preocupado com desobediência ou expulsão. Ainda assim, se o padre Lupe não pre servara os rudimentos de sua fé católica romana, pelo menos preservara a sua sinceridade e sua capacidade de fazer uma escolha bem definida. Em setembro de 1983, a unidade de assalto de Carney, com noventa homens, foi aniquilada numa batalha com tropas hondurenhas de seu ve lho inimigo, o general Gustavo Alvarez Martinez, que tantas vezes fora por ele denunciado em público. Uns poucos de seus homens que sobrevi veram foram capturados e atirados numa cova retangular na selva, atrás do acampamento militar hondurenho de Nueva Palestina. Será que Carney era um daqueles homens? Ninguém conseguiu descobrir. Será que ele morreu? É muito provável. De esgotamento? Pelo menos de esgotamento. Terá sido interrogado? É provável. Torturado? É provável. Será que foi deixado para morrer de inanição? Provavelmente. Será que ainda es tá vivo e ainda é prisioneiro na selva? Não parece possível; mas jamais se revelou uma notícia precisa. Este é o tipo de guerra que existe. Não se trata, nem de longe, de saber quantos anjos podem dançar na cabeça de um alfinete. É uma guerra na qual sangue é derramado com regularidade e em grandes quantidades. Sacerdotes como Carney não constituem raras exceções. É claro que nem todos escrevem testamentos de sua conversão para a violência revolucio nária, a fim de que o mundo os leia; e nem todos chegam ao ponto de viverem a vida de membros de unidades de assalto. Mas nos muitos e va riados papéis que eles representam na arena puramente política do mundo, homens como o padre Carney, S.J., cada um deles, são essenciais para o sucesso dos jesuítas em sua luta contra o papado. Para os jesuítas, a realidade da vida, hoje, é que o nosso mundo _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 17 -
  • 18. bipolar gira inexoravelmente em torno do marxismo-leninismo soviético e do capitalismo ao estilo ocidental. A única disputa que pa rece ter importância para a Sociedade de Jesus neste último quarto do século XX é aquela entre essas duas esferas de influência. E o fato é que, embora a Sociedade em si não seja oficialmente marxista, os jesuítas que se diziam ou se di zem marxistas — porque o padre Lupe não estava sozinho nem mesmo nisso — não são, por esse motivo, expulsos da Sociedade ou censurados ou silenciados. Ao contrário, fazem-se os maiores esforços no sentido de protegê -los de ataques. Isso se tornou tão espalhafatoso que, não faz muito tempo, quando o papa João Paulo II conheceu um jesuíta indiano que, como verificou, não era marxista, exclamou, surpreso: “Com que então nem todos vocês são marxistas!” A guerra entre o papado e os jesuítas parece, então, ser de natureza política. E, num sentido, é. Mas presumir, como fazem muitos jesuítas da nova missão, que a sua guerra contra o papado começa e termina com a luta marxista-capitalista pelo poder, pela autoridade e pelo domínio do mundo, seria confundir os sintomas de apodrecimento da Sociedade com a condição mais básica que permite que esses sintomas progridam e se multipliquem. Porque embora a guerra que eles se decidiram a fazer tenha lugar no plano da geopolítica, é também, e mais fundamentalmente, uma guerra por causa da questão da existência mesma do Espírito como a dimensão básica do mundo dos homens e das mulheres. É sobre o sobrenatural como o elemento que torna cada um de nós humano e define nossa existência e nosso mundo. A esse nível, os novos conceitos jesuíticos rela tivos à autoridade na Igreja e ao propósito da Igreja no mundo representam uma reviravolta da mais profunda natureza. Para a Sociedade de Jesus, a autoridade má xima para crença e moralidade já não está na Igreja Católica Romana, com o seu papado e sua hierarquia de âmbito mundial, mas no “ povo de Deus”. Os resultados dessa substituição são que, até esta data, não há dogma importante ou lei moral capital do catolicismo romano que não tenha sido contestada e negada por jesuítas, a começar com jesuítas das mais altas posições hierárquicas e das mais elevadas reputações. Eles têm sido imitados e têm recebido a adesão de uma infinidade de grupos, tanto católicos como não-católicos, com as mais diversas razões para defenderem essa nova igreja, o “povo de Deus”, como superior à Igreja hierárquica Católica Romana. Mas foram eles, os jesuítas, que abriram o caminho e que deram os maiores e mais consistentes exemplos nessa nova atitude em relação ao pontífice romano e aos dogmas definidos de Roma. O teólogo-professor dessa guerra — e o terceiro nome naquele arco do novo empenho jesuítico — é o homem aceito e celebrado como o maior teólogo jesuíta dos últimos cem anos, Karl Rahner, S. J. Rahner viveu to da uma vida de esforços — cautelosamente, a princípio, mas com uma estridência cada vez maior à medida que o tempo passava — no sentido de alterar a crença católica. Embora não trabalhasse em campos isolados, sua estatura, sua ousadia que não ligava para as consequências, e _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 18 -
  • 19. seu sucesso o destacam como o líder no que pode ser perfeitamente descrito como o esquadrão de combate de teólogos católicos que, a partir de 1965, laceraram e cortaram em pedaços não apenas os flancos, mas a própria substância do catolicismo. Rahner era tão diferente de seu colega jesuíta James Carney quanto é o frio do calor. O contraste entre os dois homens é a melhor ilustração do velho ditado que diz que uma ideia pode provocar um inferno de chamas no coração de certos homens, mas explode no cérebro de outros. En quanto Carney era um fazedor impulsivo e apaixonado, Rahner era o intelectual meditativo, pensativo, impassível. Enquanto Carney podia es crever ilógica mas emocionalmente para justificar suas ações aos olhos da família, e depois contar apenas com o amor da família para aceitá-lo como era, Rahner escrevia, proferia conferências e conversava com lógi ca sutil e mente desprovida de paixão para desengatar os dogmas de fé mais caros que se achavam na mente de seus leitores e ouvintes. Carney ficava zangado com a injustiça, revoltava -se contra a opressão, clamava dolorosamente contra a miséria humana. Sua munição e suas armas não eram apenas balas e canhões, mas a sua profunda compaixão, sua fúria contra a injustiça e sua recusa congênita em fazer a mínima concessão. Era o seu coração, numa agonia avassaladora, que guiava o seu julgamento. Rahner, em contrapartida, apontava a artilharia pesada de sua lógica e de sua imensa reputação como teólogo para a sacrossanta autoridade dos papas. Escolheu como alvo as imemoriais fórmulas de fé. Tinha à s ua disposição outras armas com que Carney não contava: a mais arguta das men tes, um conhecimento realmente enciclopédico, um humor sempre pronto e azedo, e uma indômita arrogância de intelecto. “Não vou tolerar a in justiça”, era o grito de Carney. “Não serei um servo”, era o de Rahner. Num momento crítico e doloroso na moderna história do papado, Rahner se recusou categoricamente a defender o ensinamento católico so bre o controle da natalidade ou o pontífice que p ediu aos jesuítas, como “ homens do papa” , que o ajudassem em seu desespero. O mesmo aconteceu com virtualmente todos os outros dogmas e regras da Igreja Católica que Rahner havia jurado defender. No entanto, sua voz parecia tão autêntica, que ele era considerado por muitos como tendo maior autoridade do que três papas sucessivos, quando chegava o momento de interpretar o ensinamento moral da Igre ja Católica. O próprio Rahner se esforçou muito para representar esse papel de profeta moderno. Enquanto viajava pela Europa e pelas Américas vestindo seus corretos ternos de passeio, era incansável na sua crítica mordaz e sarcástica ao papado e à autoridade romana. Em Unity of the Churches: An Actual Possibility, o último livro que escreveu antes de morrer em 1984, Rahner fez a mais notável e patente apresentação da recém-aceita atitude jesuítica sobre o papado e os dogmas de finidos de sua Igreja. Trabalhando com um colega jesuíta e co-autor, Heinrich Fries, e com o imprimatur de seus superiores jesuítas, Rahner apresentou uma proposta radical e ultrajantemente anti-romana. Para obter a _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 19 -
  • 20. unidade cristã, disse ele, era necessário parar com toda a insistência na in - falibilidade papal como dogma, e também acabar com a insistência em to das as outras doutrinas sobre o pontífice romano e o catolicismo romano que tinham sido definidas e propostas por papas desde o século IV. Com efeito, Rahner estava propondo que a Igreja Católica pegasse oficialmente todo o corpo de leis relativas à fé e aos costumes, tal como desenvolvido e ensinado pela sua Igreja durant e dezesseis séculos, e o des-vinculasse da vida diária. Casamento, homossexualidade, ética comercial, liberdade humana, piedade, todas as esferas da existência humana, tudo teria que ficar à deriva ao sabor das marés da redefinição, que estavam sempre mudando. Mas os dogmas da Igreja seriam as principais baixas. Porque aquilo que a Igreja definiu como básico e obrigatório para a crença católica iria, no plano de Rahner, tornar-se opcional. A integridade da pessoa de Cristo; o significado e o valor dos Sete Sacramentos; a existência do Céu e do Inferno; o caráter divino da autoridade dos bispos; a ver dade da Bíblia; a primazia e a infalibilidade do papa; o caráter de clero; a Imaculada Conceição e a Assunção de Maria, mãe de Cristo — tudo ficaria à ecumênica disposição de quem quisesse. Acima de tudo isso, entretanto, ficavam os principais alvos de Rah ner, os bloqueios que ficavam no caminho de tudo o mais: a autoridade papal que ele queria ver desmantelada e a Igreja Católica Romana hierár quica que ele queria ver reduzida a mais uma expressão idiossincrática da mensagem de Cristo. Em outras palavras, a autoridade prática e o propósito espiritual da Igreja — sempre as verdadeiras questões na guerra entre papado e jesuítas — seriam rejeitados e substituídos pela autoridade e pela missão materialista que estivesse em voga. A nível meramente pessoal, é razoável que se tenha que presumir a falta total de fé católica em Rahner. Mas o que está em jogo é menos a condição da alma de Rahner do que a influência prát ica que ele e muitos outros teólogos, que tenham as mesmas ideias, exercem sobre a vida tal como é vivida em nosso mundo. Dizer que Rahner — e Fries como co-autor secundário — estava apenas exprimindo o sentimento antipapal que era muito corrente entre o s teólogos católicos em 1984 não é contar a metade da ruína causada por ele. Rahner, ocupado em ensinar teologia numa prestigiosa universidade jesuítica durante a maior parte de sua vida, tornou-se ao longo dos anos uma imagem de sabedoria teológica e bom julgamento para literalmente milhares de pessoas que, por sua vez, agora são sacerdotes, professores e escritores com comando, influência e renome próprios. É de se admitir que esse trabalho pareça, a muitos, ter lugar em tor res de marfim. Mas homens como Karl Rahner ajudaram poderosamente a moldar o pensamento e os costumes de padres e bispos que estão, ago ra, envolvidos em cada nível de questões mundanas em todas as partes do globo. E uma vez convencidos, mesmo num plano puramente pessoal, de que os Rah ners da Igreja têm razão e que o papado está errado, não há chance alguma de que o conflito possa permanecer teórico. Em vez _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 20 -
  • 21. disso, ele atinge as mais profundas áreas de pensamento, crença e sentimentos de milhões que são arrastados pelo coração — e pela influência direta ou indireta de teólogos como Rahner — para um mundo no qual a natureza, o significado e a mais básica finalidade de suas vidas como cristãos são redefinidos num cenário puramente racional e materialista. Sem um gigante como Karl Rahner, é de se duvidar que a Teologia da Libertação fosse conseguir muito mais do que rachar, oscilar e despencar; ou que um Francis Carney fosse ser tão pouco severo ao criticar os traba lhos escritos por Juan Luis Segundo. Apesar de tudo, deve -se dizer que Rahner não foi um inventor; tampouco o foram os homens de sua geração que foram a sua ferrotipia. Não foi Rahner quem iniciou a enorme reviravolta teológica na Sociedade de Jesus ou na Igreja Romana. Sua importância não foi como inovador, mas como fiel e eficiente evangelista em favor de uma influência perniciosa e destrutiva que já vinha se espalhando sorrateiramente dentro da Sociedade de Jesus há décadas antes de ele surgir em cena. Quer proferindo conferências na Europa, quer se transportando para as Améri cas, envolto no prestígio que adquirira, incontestável em sua autoridade, apresentando sempre o rosto não-atrativo do materialista, rápido em qualquer luta interna, e sem se curvar para ninguém, Rahner foi o ponta -de-lança adequado para o autocanibalismo católico. Ele ensinou a várias gerações a consumir sua fé com lógica, ceticismo e desobediência. Sua dedicação ao ponto de vista antipapal e anticatólico era tão sin cera, que ele se tornou a sua encarnação, como se poderia dizer. E, no entanto, foi tão eficiente na manutenção de sua estatura teológica dentro da Sociedade de Jesus, que deu àquele ponto de vista uma nova respeitabilidade, tanto dentro como fora da Sociedade e da Igreja. Nenhum superior jesuíta, no seu país natal ou em Roma, jamais o conteve. Tendo sido a prova em carne e osso da estranha corrupção que se instalara na Sociedade, Rahner morreu como havia vivido, numa aura de honra entre seus companheiros e superiores. Apesar de todas as suas diferenças, os três homens aqui esboçados — o cientista sócio-político, o guerrilheiro dedicado e o teólogo-professor — exemplificam, inclusive, a aberração da Sociedade. É claro que, a esta altura, a Sociedade de Jesus não está sozinha na luta contra o papado. Ela tem sido imitada e tem recebido a adesão de muitos grupos — católicos e não-católicos, religiosos e seculares — cada qual com suas próprias razões para defender a ideia de que uma nova igre ja, o “ povo de Deus”, substituiu a antiga e hierárquica Igreja Católica Roma na. Mas foram os jesuítas que abriram aquele caminho; foram eles que estabeleceram os maiores e mais consistentes exemplos dessa nova atitude em relação ao pontífice romano e aos dogmas definidos de Roma; e são eles que continuam a trabalhar nos pontos mais longínquos daquilo que só se pode chamar de política divina. E foi assim que o atual geral da Sociedade de Jesus, Piet -Hans Kol-venbach, pôde enfrentar os jesuítas que o elegeram chefe da Ordem em 1983 — o ano em que James Francis Carney foi engolido numa batalha _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 21 -
  • 22. na selva; o ano antes daquele em que Karl Rahner voltou a Deus — e prometer, com uma confiança solene, que, entre outras coisas, sua tarefa seria assegurar a procura da justiça, escolhida pelos jesuítas, e não ser perturbado “ pelos gemidos de reclamação de papas”. Quando se fala que a Sociedade de Jesus está, hoje, em guerra com o pa pado, e mesmo antes de se perceber que estranha e confrangedora revira volta isso representa para um corpo de homens cujo principal motivo de fama foram suas realizações e sua reputação como “ homen s do papa”, não se deve pensar que essa Ordem Religiosa dos Jesuítas seja apenas mais uma organização humana. São muitas as organizações desse tipo que têm sua fase áurea e depois decaem, ossificam-se e acabam por desaparecer. A Sociedade de Jesus foi criada em 1540 por um obscuro basco chamado Iñigo de Loyola, mais conhecido como Inácio de Loyola. Não se pode colocar os jesuítas de Iñigo no mesmo nível de qualquer outra orga nização, pelo simples motivo de que nenhuma organização que conheçamos pode rivalizar, até o momento, com os jesuítas no que se refere aos inestimáveis serviços que prestaram à família humana — muito acima do que fizeram, em nome do papado e da Igreja Católica Romana do papado. Iñigo foi um gênio raro. Se Leonardo Da Vinci, contemporâ neo de Iñigo, tivesse projetado uma máquina, chegando até os detalhes das por cas e parafusos, que suportasse todos os testes do tempo e das circuns tâncias que se alteraram ao longo de um período de 425 anos — e se só a destruição de seu projeto inicial provocasse o colapso da máquina — não seria maravilha maior do que a Sociedade que Iñigo projetou. Por que, tal como ele a construiu — o molde de seu jesuitismo, sua estrutura funcional, sua devoção ao papado, seu caráter e seus objetivos — a Sociedade resistiu a todos os testes de tempo e circunstâncias, exceto um: a perversão da regra, do papel e do espírito que ele lhe deu. Fora isso, sua mui extraordinária durabilidade está comprovada. Nem mesmo Iñigo poderia ter previsto o quase-milagre da organização de sua Sociedade, seu sucesso meteórico e brilhante, e sua influência universal sobre o mundo do homem, quando a fundou. Nos 425 anos que se seguiram, as dezenas de milhares de pessoas que entraram para a Companhia de Iñigo estabeleceram um recorde que, em sua categoria, não foi igualado na história passada ou presente — um recorde tanto de serviços à Igreja Católica quanto à sociedade humana como um todo. Olhando para trás, um fanático do século XX que parecia um gênio, Lenin, mal orientado mas com admiração, afirmou, no fim da vida, que se tivesse contado com doze homens iguais a um daqueles jesuítas pionei ros, o seu comunismo teria arrebatado o mundo. Embora poucos em número, os princípios básicos que Iñigo estabe lecera para a sua Companhia eram catalisadores poderosos. Logo que seus homens utilizaram suas energias dentro de sua organização no trabalho de âmbito mundial da Igreja Romana, provocaram um fenômeno sem igual de história huma na. “Nunca”, escreveu Novalis, o teórico alemão do sé culo _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 22 -
  • 23. XVIII, “ nunca antes na história do mundo surgiu uma Socieda de igual a essa. O próprio velho Senado Romano não fez planos de domínio mundial com maior certeza de sucesso. Nunca a execução de uma ideia maior foi examinada com maior compreensão. Para todo o sempre, essa Sociedade será um exemplo para toda sociedade que sentir um desejo orgânico de extensão infinita e duração eterna (...).” “Quanto mais universal o seu trabalho”, dissera Iñigo, “mais divi no ele se torna.” Trinta anos depois que ele fundara a Ordem, s eus jesuítas estavam trabalhando em todos os continentes e em praticamente todas as formas de apostolado e campo educacional. Num prazo de cem anos, os jesuítas eram uma força que se tinha que enfrentar em praticamente todas as fases da vida ao longo da qual os homens procuram, e às vezes conseguem, poder e glória. Não havia continente que os jesuítas não alcançassem; nenhuma lín gua conhecida que não falassem e estudassem ou, em dezenas e dezenas de casos, desenvolvessem; nenhuma cultura em que não penetr assem; nenhum ramo de conhecimento e ciência que não explorassem; nenhum tra balho em humanismo, nas artes, na educação popular, que eles não realizassem e fizessem melhor do que qualquer outra pessoa; nenhuma forma de violência que não tivessem sofrido — os jesuítas foram enforcados, arrastados e esquartejados em Londres; estripados na Etiópia; comidos vivos por índios iroqueses no Canadá; envenenados na Alemanha; esfolados até a morte no Oriente Médio; crucificados na Tailândia; mor tos de fome na América do Sul; decapitados no Japão; afogados em Madagascar; bestializados na União Soviética. Naqueles primeiros quatrocentos anos, eles deram à Igreja 38 santos canonizados, 134 homens santos já declarados “Benditos” pela Igreja Roma na, 36 já decla rados “Venerá veis” e 115 considerados como tendo sido “ Servos de Deus”. 1 Desses, 243 foram mártires; isto é, foram mortos por causa de suas crenças. Viveram entre mandarins chineses, índios norte-americanos, as brilhantes cortes reais da Europa, brâmanes hindus da Índia, as escolas de “ cerca viva” da Irlanda penal, navios escravos dos otomanos, imames e ulemás do Islã, o decoro e o saber dos lentes graduados de Oxford, as multiformes sociedades primitivas da África subsaariana, e se adaptaram. E, no longo catálogo de insultos e calúnias que os homens criaram a fim de injuriar seus inimigos, não havia termo suficientemente forte para se aplicar aos jesuítas, devido àquela terrível fixação que eles tinham, desde os seus primórdios, por outro dos princípios de Iñigo: serem “ homens do papa”; os homens do papa. Iñigo de Loyola, escreveu Thomas Carlyle, foi “ a fonte de veneno da qual nasciam todos os rios de amargura que inundavam o mundo agora”. Insultos como esse têm sido cultuados nas próprias línguas dos homens. O Webster’s Third New International Dictionary, depois de ter dado o significado básico de jesuíta como membro da Ordem, fornece os significados negativos: “pessoa dada à intriga e a subterfúgios; pessoa _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 23 -
  • 24. ladina”; termos que são ampliados pelo dicionário de Dornseif para “ de duas caras, falso, insidioso, dissimulador, pérfido (...) insincero, ignó bil, desonesto, mentiroso”. Um provérbio francês diz que “ sempre que dois jesuítas se juntam, o Diabo completa o trio”. Um provérbio espanhol alerta va as pessoas, d izendo “ não confie sua mulher a um monge ou seu dinheiro a um jesuíta”. Os eternos inimigos do papado nunca poderiam perdoar Iñigo e seus jesuítas enquanto estivessem em missão do papa, cumprindo o sagrado voto de obediência, ainda que sujeitos à desonra e à morte. Estava tudo de acordo com o desejo expresso de Iñigo. “Esperemos”, escreveu ele certa vez, “ que a Ordem nunca possa ficar muito tempo sem sofrer a hostilidade do mundo!’ Na verdade, seu desejo foi realizado, pois os seus jesuítas eram realmente homens do papa. Seus primeiros alvos principais: as novas igrejas protestantes que pululavam pela Europa. Justamente a questão vital que estava em jogo entre a Igreja Católica e os líderes da revolta protestante — Lutero, Calvino e Henrique VIII da Inglaterr a — era a autoridade do pontífice romano e a primazia de sua Igreja Católica Romana. Os jesuítas levaram a batalha aos próprios territórios daqueles inimigos papais. Faziam debates públicos com reis, debatiam em universidades protestantes, pregavam em encruzilhadas e em mercados. Dirigiam-se a conselhos municipais e instruíam os concílios da Igreja. Infiltravam-se em territórios hostis, disfarçados, e se deslocavam às escondidas. Estavam em toda parte, cumulando seus contemporâneos de brilhantismo, sagacidade, severidade, erudição, devoção. Seu tema constante: “O bispo de Roma é o sucessor de Pedro o Apóstolo, sobre o qual Cristo fundou sua Igreja (...). Essa Igreja é uma hierarquia de bispos em comunhão com aquele bispo em Roma. (...) Qualquer outra instituição eclesiástica é uma rematada heresia, filha de Satã (...).” Em outras palavras, todo mundo sabia da existência dos jesuítas; e todo mundo sabia que os jesuítas eram os defensores sinceros daquela autoridade e primazia. Embora a violenta investida dos jesuítas contra os inimigos de Roma fosse vigorosa, a penetrante influência deles sobre o próprio catolicismo romano nunca foi igualada. Eles detiveram o monopólio da educação da Europa durante mais de duzentos anos, e entre seus alunos pelo mundo in teiro se encontrava gente famosa e gente abominável — incluindo Voltaire, Luis Bunuel, Fidel Castro e Alfred Hitchcock. Sozinhos, literalmente remodelaram o ensino da teologia e da filosofia católica romana, de modo a torná -lo outra vez claro e acessível, mesmo para a nova mentalidade da era turbulenta que despontava. Proporcionavam novos meios para a prática da devoção popular. Promoveram o estudo do asceticismo, do misticismo e da missiologia. Proporcionaram modelos novos para o treinamento de sacerdotes em seminários. Geraram, pelo exemplo e pela inspiração de seu Preceito Religioso, toda uma nova família de ordens religiosas. Foram o primeiro corpo de católicos eruditos que se tornou preeminente em ciências seculares — matemática, física, astronomia, arqueologia, linguística, _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 24 -
  • 25. biologia, química, zoologia, paleografia, etnografia, genética. A lista de invenções e descobertas científicas realizadas por jesuítas enchera núme ros intermináveis de volumes nos mais diversos campos — engenharia mecânica, energia hidráulica, aviação, oceanografia, hipnose, cristais, linguística comparativa, teoria atômica, medicina de doenças internas, man chas solares, aparelhos de surdez, alfabetos para os surdos e mudos, car tografia. A lista da qual são extraídos esses exemplos aleatórios entorpece a mente, devido à sua variedade que abrange todos os setores. Os manuais, livros de texto, tratados e estudos dos jesuítas eram aceitos em caráter ofi cial e conclusivo em todos os ramos do saber católico e secular. Eles eram gigantes, mas com um propósito: a defesa e a propagação da autoridade papal e do ensinamento papal. Tampouco suas extraordinárias energias e talentos se limitavam à ciên cia. Fizeram como se fossem seus, também, todos os setores da arte. Em 1773, contavam com 350 teatros na Europa, e as atividades teatrais dos jesuítas lançaram as fundações para o balé moderno. Fundaram o primeiro teatro no continente norte-americano — precisamente em Quebec em 1640. Ensinaram a França a fazer porcelana. Levaram para a Europa os primeiros conhecimentos que os homens ocidentais tiveram da cultura indiana e chinesa. Traduziram os vedas do sânscrito. Até mesmo as chinoiseries do período rococó tiveram como base publicações dos jesuítas em chinês. O guarda-chuva, a baunilha, o ruibarbo, a camélia e o quinino foram inovações jesuíticas na Europa. As façanhas dos jesuítas como exploradores do Extremo Oriente ultrapassavam qualquer coisa jamais sonhada por seus contemporâneos, e constituem uma narrativa épica que tem o sabor de quase má gica. Os nomes de jesuítas estarão ligados para sempre a lugares que, para a maioria de nós, são motivos de fantasia — Kambaluc, Catai, Sarkand, Shrinagar, Tcho Lagram, Tcho Mapang, Manasarovar, Tashi-Ihumpo, Koko Nor, e o nome comprido e saltitante, Chomolongmo (que nós conhecemos como monte Everest). Menos de cem anos depois da fundação da Sociedade, os jesuítas se tornaram os primeiros europeus a penetrarem no Tibet e depois seguirem dali para a China. O padre jesuíta Matteo Ricci foi a primeira pessoa a provar que a Catai de Marco Polo era idêntica à China, e não um país diferen te. Em 1626, o padre Antonio Andrade e o irmão Manuel Marquis abriram a primeira igreja católica no Tibet, às margens do rio Sutlej, no reino de Guge, em Tsaparang. O irmão Benito de Goes está sepultado na extremidade noroeste da Grande Muralha da China. O túmulo do irmão Manuel Marquis fica no cume da cordilheira Zaskar, que dá vista para o passo Mana, na região ocidental do Tibet, onde o bom irmão morreu em 1647 depois de longo período de prisão no posto da fronteira. Outros jesuítas — austríacos e belgas — foram os primeiros europeus a atingirem Lhasa a 8 de outubro de 1661, e viram a construção do Palácio Potala para o Dalai Lama Chenresik. O padre Grueber, um aus tríaco, foi o primeiro a determinar a posição de Lhassa com exatidão, _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 25 -
  • 26. a 29 graus, 6 minutos de latitude norte. Ele e seus companheiros foram sucedidos por uma linha de destacados tibetólogos jesuítas que produzi ram dicionários, estudos de língua, mapas, estudos geológicos e tratados teológicos. Seus túmulos, como os de Benito de Goes e Manuel Marquis, pontilham uma área que era tão remota e amedrontadora para seus contemporâneos quanto o outro lado da lua ainda continua sendo para nós. Esses homens e seus pares religiosos noutra parte qualquer não eram apenas “ os solitários e bravos” celebrados num drama teatral da década de 1940. Em sua mente, não faziam confusão entre as dimensões da Po breza Religiosa e a pobreza econômica, como aconteceu com tantos je suítas nas últimas décadas deste século. Não visavam a um objetivo nebuloso, materialista, como a “ libertação integral do indivíduo huma no”. Eram gigantes que, proporcionalmente falando, rivalizaram as façanhas posteriores de Scott e Perry nos pólos, Hilary no monte Everest, e os primeiros astronautas no espaço e na lua. Mas, mais do que isso, eram missionários jesuítas obedientes à voz do pontífice romano, vivendo, trabalhando e morrendo fiéis a ele, porque ele representava o apóstolo Pedro, que representava o Cristo que eles acreditavam ser o Salvador. No auge de seus esforços, duzentos anos depois de sua fundação, os jesuítas exerciam um controle formativo e decisivo na educação e na ciência de praticamente todos os países da Europa e da América Latina. Ti nham um papel a representar em todas as alianças políticas da Europa — um cargo influente junto a todos os governos, uma função de assessoria junto a todo grande homem e a toda mulher poderosa. Um jesuíta foi o primeiro ocidental a frequentar a corte do grão-mogol. Outro foi o primeiro a ser declarado mandarim oficial no palácio do imperador em Beijing. Oliver Cromwell, Filipe II da Espanha, Luís XIV da França, Catarina a Grande, o cardeal Richelieu, a rainha Cristina da Suécia, Mary, a rainha dos escoceses, Napoleão, Washington, Garibaldi, Mussolini, Chiang Kai -shek — a lista dos grandes vultos da história frequentados pelos jesuítas se estende por várias páginas. Eles minutavam tratados, negociavam pactos de paz, serviam de mediadores entre exércitos em guerra, arranjavam casamentos reais, faziam arriscadas missões de resgate, viviam onde não eram bem-vindos, como agentes secretos da Santa Sé. Passavam-se por criadores de porcos na Irlanda, bazaaris na Pérsia, homens de negócios na Prússia, marinheiros mercantes na Indonésia, pedintes em Calcutá, swamis em Bombaim. Não havia coisa alguma, em parte alguma, que eles não realizassem, c omo diziam, “ para a maior gló ria de Deus”, em obediência ao papa romano. Estavam em todo país europeu, africano, asiático e americano onde fosse possível o mais leve desabrochar do catolicismo. Toda a influência deles era exercida visando ao atendimento da vontade papal. Ser jesuíta era ser um papista no senti do exato desse termo que já foi pejorativo. O poder de âmbito mundial dos jesuítas se tornou tão grande, que as pessoas comuns de Roma inventaram um novo título para padre jesuí ta geral. Elas o chama vam de “O papa negro”, comparando seu p oder _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 26 -
  • 27. o sua influência globais com os do próprio papa; e fazendo entre os dois uma distinção apenas com base na batina toda branca do pontífice e a batina simples e preta do sacerdote comum, que os sucessores de Iñigo usavam imitando seu exemplo. O apelido popular era um exagero, é claro. Mas os romanos estavam suficientemente perto do centro das coisas para saberem quem exercia uma impressionante parte do verdadeiro poder que residia na colina Vaticano. Como Iñigo ha via pretendido, aquele poder do “ papa negro” e sua Companhia estava atrelado à vontade papal, mesmo que isso represen tasse a morte da própria Ordem. Em 1773, quando o papa Clemente XIV decidiu — certo ou errado — que deveria ser feita uma rígida opção entre a extinção do papado e a morte da Ordem dos Jesuítas, ele, e somente ele, agindo segundo decisão pessoal sua, aboliu a Sociedade de Jesus. Por um documento publicado oficialmente, destituiu os 23.000 jesuítas ao mesmo tempo, e colocou o padre-geral e seus assessores em calabouços papais, mesmo enquanto impunha o exílio e a morte lenta a milhares de jesuítas que se viram sem ajuda ou apoio em partes perigosas do mundo. O papa Clemente não explicou sua decisão aos jesuítas ou a qual quer outra pessoa. “As razões [para essa decisão] nós mantemos tranca das em Nosso Coração”, escreveu ele. Apesar de tudo, os jesuítas obedeceram, colaborando obedientes com a morte de sua Ordem. Quarenta e um anos depois, em 1814, o papa Pio VII decidiu que o papado precisava da Companhia, e com isso a ressuscitou. Os jesuítas, revivificados, saíram em campo novamente, com renovado zelo pela vontade do papa, e usaram de enorme dedicação de homens e trabalho para garantir que o Concílio Vaticano I, em 1860, decretasse que a autoridade infalível do papa era um artigo de fé e um dogma revelado de forma divina. O esforço foi tão incisivo e surtiu tanto sucesso, e tão odioso para tantos, que angariou para os jesuítas pós-supressão um novo epíteto: eles eram os “ ultramontanos” — pessoas que apoiavam aquele abominável bispo que vivia “para lá das montanhas” (os Alpes), em Roma. O desprezo contido nesse nome injurioso é um claro indício daquilo que os jesuítas defendiam com o mesmo vigor de sempre: a antiga crença católica romana de que, por decreto divino, o homem que levava em si mesmo toda a autoridade de Cris to na Igreja deveria ser identificado por um elo físico com um ponto geográfico sobre a face desta Terra: a cidade de Roma. Esse homem seria, sempre, o bispo legal de Roma. E vigário pessoal de Cristo. Os novos inimigos daquela crença moravam, em sua maior parte, na França, Bélgica, Holanda, Alemanha, Áustria, Suíça e Inglaterra. Eram bispos, sacerdotes, teólogos e filósofos. Falando do seu lado dos Alpes, eles se chama vam de “ cismontanos” (pessoas “ do lado de cá das montanhas”, o lado norte), e se opunham à autoridade e à primazia do bispo romano. O fato de o catolicismo romano concentrado no papa romano ter florescido e se mantido na Europa ocidental até o último quarto do sécu lo XX deveu-se, principalmente, àqueles “ homens do papa” — ao seu zelo, à sua devoção àquela missão papal, à sua cultura, e à evolução que _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 27 -
  • 28. eles instigavam na mente católica romana. Porque em qualquer área em que tocavam, os jesuítas introduziam uma nota de razão, um discurso racional, e eles o fermentavam com uma fé brilhante e vigorosa. Em poucas palavras, eles tomaram de assalto a mentalidade dos católicos no século XVI. Essa mentalidade tinha todas as suas amarras numa esfera pré - científica, pré-naturalista. No espaço de quatrocentos anos, com o seu próprio sepultamento no meio, os jesuítas mudaram aquilo tudo. Pelos seus métodos educacionais, por suas pesquisas e sua intrepidez intelec tual, eles possibilitaram aos católicos romanos a manutenção de sua posição, como homens e mulheres crentes e fiéis, no oceano de novas ideias e nova tecnologia que começou na década de 1770 e nunca mais parou. Periodicamente, na sua existência de mais de quatrocentos anos, os jesuítas foram expulsos e banidos de vários países — França, Alemanha, Áustria, Inglaterra, Bélgica, México, Suécia e Suíça. O termo “ jesuíta” se tornara tão conhecido como sinônimo de autoridade papal, que a ex pulsão deles era sempre um sinal claro de que o governo daquele país es tava determinado a eliminar a autoridade e jurisdição do papa romano. E quando a força bruta era usada contra eles, passavam para a clandestinidade ou faziam as malas e partiam, para esperar o dia em que pudes sem voltar. Sempre voltavam. Mesmo quando a situação não chegava a caso de expulsão, ninguém tinha qualquer ilusão sobre o que eles representavam — o papado — e muitas vezes a função dos jesuítas em nome do papado era desvirtuada por seus inimigos. Na América de início do século XIX, a oposição e o ódio protestantes aos jesuítas era expresso com vigor: “Eles [os jesuítas] vão fazer com q ue Roma governe a Uniã o.” Aquela identificação com o papado e aquela dedicação a ele tinham sido a vontade e a intenção de Inácio, seu fundador; e fora a condição sob a qual o papado consentira em criar a Sociedade de Jesus. Na vida e na mor te, os jesuítas escreveram realmente a história como “ homens do papa” — fosse o padre jesuíta Peter Claver consumindo sua existência entre es cravos sul-americanos; ou o padre Matteo Ricci tornando-se um autêntico mandarim na corte imperial de Beijing; ou o padre Peter Canisius, o Mar telo dos Hereges, recuperando províncias e cidades inteiras do protestantismo com suas incansáveis e incessantes viagens, pregações e obras escritas; ou o padre Walter Ciszek definhando no gulag soviético por dezessete anos; ou o padre Jacquineau servindo de mediador ente japones es e chineses que guerreavam por causa de Hong Kong; ou o padre Augustin Bea, viajando clandestinamente pelos quatro pontos cardeais da União Soviética na época de Stalin, para obter um retrato fiel das condições para a Santa Sé; ou o padre Tacchi Venturi levando de um lado para outro as negociações entre o ditador Benito Mussolini e o papa Pio XII. Não importa quem fossem ou onde estivessem, ou o que fizessem, inerente na mente de cada jesuíta estava aquele santa estrutura da Igreja de Cristo, ancorada por Jesus ao seu vigário pessoal, o papa, e mantida unida pela hierarquia de bispos e sacerdotes, pessoas religiosas e leigas em união com aquele vigário pessoal de Cristo. E não importa o ano ou _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 28 -
  • 29. o século em que trabalhasse, cada jesuíta sabia que a Igreja Católica a que ele jurara servir sob as ordens do papa era a mesma Igreja que havia existido no século VI sob Gregório o Grande, no século XI sob Inocêncio IX e em 1540 sob Paulo III. De lato, o que mantinha a vontade deles com relação ao seu traba lho por grandes distâncias de espaço e tempo era a lendária obediência jesuítica, consagrada pelo seu voto especial: o de que todo e qualquer trabalho que realizassem seria sob a obediência papal. Para os inimigos dos jesuítas, enquanto isso, eram precisamente o s erviço e a obediência ao papado que constituíam a abominação jesuíti ca. Seus críticos nunca cessaram de acusar os jesuítas de terem distorcido a filosofia humanista. Mas o escritor francês F. R. de Chateaubriand, que não era nada amigo da Sociedade, foi muito preciso em seu julgamento quando disse que “ o leve da no que a filosofia pensa lhe ter sido causado pelos jesuítas” não vale a pena ser lembrado, tendo em vista “ os incomensurá veis serviços que os jesuítas têm prestado à sociedade humana”. A mentalidade e a perspectiva criadas pelos jesuítas atingiram seu ponto máximo de desenvolvimento na primeira metade do século XX. Como resultado de seus esforços, houve uma pseudo-renascença do catolicismo social e cultural, permitindo que os católicos fossem cientistas, tecnólogos, psicólogos, sociólogos, cientistas políticos, líderes, artistas, eruditos, saindo - se bem mesmo nos campos mais novos do conhecimento e, no entanto, conciliando tudo com a sua crença firme como um roche do. O testemunho de tudo isso se encontra em muitas coisas — na poesia e na literatura de um G. K. Chesterton e um Paul Claudel; na sociologia militante de católicos franceses, alemães, belgas e italianos entre as duas guerras mundiais; na florescente missiologia que transformou os campos missionários da Ásia e da África; na temível escola de apologética na Europa e nos Estados Unidos; na padronização das devoções populares e dos regulamentos eclesiásticos; no vibrante catolicismo dos Estados Unidos; e quando nada, no relutante mas finalmente admitido respeito, por parte tanto de católicos como de não - católicos, que ficou evidente com relação ao catolicismo no mundo na década de 1950. Durante a época de seu maior florescimento, na primeira metade do século XX, o número de jesuítas atingiu o seu apogeu — cerca de 36.038 — dos quais pelo menos a quinta parte era de missionários. A influência jesuítica sobre a política papal nunca foi maior, nem antes nem depois; e o prestígio dos jesuítas entre os católicos e os não-católicos nunca foi mais elevado. No entanto, já um pouco de podridão interna estava corroendo tan to os jesuítas como o corpo eclesiástico católico. Um câncer oculto, inse rido décadas antes naqueles corpos, ficara neutro, mas não benigno. Sintomas ocasionais traíam a sua presença — às vezes, revoltas de jesuítas em caráter individual; de vez em quando, abusos flagrantes na liturgia por parte de grupos individuais; raramente, mas com regularida de, a confusão entre atividade espiritual e vantagem política. Mas nada _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 29 -
  • 30. do que acontecia vaticinava a violenta mudança que aguardava a Igreja, o papado e os jesuítas na década de 1960. Com plena visão das realizações sem paralelo, torna -se fascinante examinar que tipo de característica a Sociedade de Jesus desenvolveu durante suas atividades ao longo de séculos, e por que ou como, no século XX, ela transmudou a sua finalidade original. Não que seja esta a primeira vez em que um ou outro grupo da Igreja saiu de forma e decla rou guerra ao papado. Mas é a primeira vez que a Sociedade de Jesus se voltou contra o papado com a nítida ideia de desfazer as prerrogativas do papado, diluir o governo hierárquico da Igreja Católica e criar uma nova estrutura da Igreja; e é a primeira vez que a Sociedade de Jesus, tanto em bloco como por seus membros individuais, empreende uma missão sócio-política. Iñigo fundou a sua “Companhia de Jesus”, como ele a chamava originalmente, com uma finalidade: ser a defensora da Igreja e do papado. O papa que deu à Ordem uma existência oficial, no século XVI, tornou aquela finalidade a missão da Sociedade e a razão de sua existência. Como instituição, ela sempre esteve presa ao papa. Seus membros professos sempre estiveram ligados ao papa por um voto sagrado de absoluta obediência. Durante 425 anos, eles ficaram ao lado do papado, foram soldados em suas batalhas, ensinaram suas doutrinas, sofreram suas derrotas, defenderam suas posições, compartilharam de seus poderes, foram ata cados por seus inimigos, e constantemente promoveram seus interesses por todo o globo. Eram considerados por muitos, tal como eles mesmos se consideravam, os “ homens do papa”; e os muitos privilégios extraordinários concedidos por papas ao longo dos séculos eram como distintivos da confiança que o papado tinha na Sociedade. Nunca, pode-se dizer, a Sociedade de Jesus, como um bloco, se desviou dessa missão, até 1965. Naquele ano, o Concílio Vaticano II encerrou a última de suas quatro sessões; e Pedro de Arrupe y Gondra foi eleito para ser o 27º geral dos jesuítas. Sob a liderança de Arrupe, e na estonteante expectativa de mudança provocada pelo próprio Concílio, o novo ponto de vista — antipapal e de natureza sócio-política — que vinha medrando às escondidas há mais de um século, foi adotado pela Sociedade como pessoa jurídica. A rápida e completa reviravolta da Sociedade em sua missão e em sua razão de ser não foi acidente ou obra do acaso. Foi um ato delibera do, para o qual Arrupe, como geral, proporcionou uma liderança inspiradora, entusiástica e ardilosa. As percepções, entretanto, especialmente em questões de grandes ins-tituições religiosas, não se alteram com facilidade ou rapidez. A reputa ção angariada pela Sociedade ao longo de centenas de anos foi a melhor camuflagem para formar uma nova e muito diferente Sociedade que pas sou a existir nos últimos vinte anos. Com efeito, a história passada e glo riosa da Sociedade parece ter tornado invisíveis os feitos presentes e possibilitado à nova liderança jesuítica apresentar ao mundo o seu novo _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 30 -
  • 31. ponto de vista como sendo a mais recente e melhor expressão da espiritualidade e da lealdade inacianas. Para a massa geral dos católicos, clérigos e leigos, era inconcebível que os jesuítas, logo eles, propagassem uma nova ideia da Igreja; ou que passassem a combater um só papa, quanto mais três, difamando-o, enganando-o, desobedecendo-o, esperando que cada um deles morresse, na esperança de que o papa seguinte lhes desse plenos poderes. Inevitavelmente, a guerra dos jesuítas contra o papado intensificou -se durante o pontificado de Karol Wojtyla como João Paulo II. Esse homem carismático, teimoso, chegou ao papado com sua vivida experiência dos marxistas na Polônia. Tudo o que se relacionava com ele — mas em especial seus objetivos, seu plano de ação e sua estratégia como papa — indicava um bem definido afastamento de tudo o que estivera em voga em Roma desde a década de 1950. Desde o momento de sua eleição, ficou evidente que João Paulo sofria a oposição de muitos elementos da burocracia do Vaticano por ele herdada. O que estava menos claro, mesmo para os veteranos observadores do Vaticano, era que ele também sofria forte oposição, e sua autori dade seria violentamente desafiada, por questões de método de ação, pela Sociedade de Jesus. Nada que João Paulo tem tentado desde que chegou ao Trono de Pedro em 1978 — e ele já tentou tudo, da persuasão ao confronto e à intervenção direta — dissipou ou mesmo suavizou a decidida postura jesuítica contra ele. Até agora, os jesuítas têm frustrado os esforços do pontífice para cercá-los; e o exemplo deles ainda está sendo seguido em escala cada vez maior. Mas, como a Sociedade está aprendendo, esse papa polonês não é outro Paulo VI. Ele se recusa a erguer as mãos em desespero. Ao contrá rio, acaba de iniciar uma nova campanha na guerra, dessa vez num campo de batalha escolhido por ele mesmo. Como João Paulo está aprendendo, os jesuítas serão tão espertos e tão vivos em sua resposta a cada ofensiva papal como sempre foram em tudo o que fizeram. De fato, foram os jesuítas, e não o papado, que dis pararam a primeira salva de tiros na mais recente confrontação direta, num esforço de tirar a iniciativa do papado e da hierarquia romana. Seja qual for o resultado dessa campanha mais recente, e de outras que se seguirão, com toda certeza, não pode haver dúvida de que durante a nossa geração aquilo que o papado representa tornou-se inaceitável para os jesuítas; e que aquilo que a Sociedade de Jesus passou ultimamente a defender é hostil ao papado e, portanto, inaceitável para ele. No entanto, apesar do fato de que cada qual se coloca num pólo oposto ao outro, ainda permanecem poderosas similaridades entre o pa pado e a Sociedade — similaridades que irão significar que a guerra entre eles será mortal a um nível e a um grau atingidos por poucas guer ras. A primeira e mais poderosa similaridade é o inextirpável senso de _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 31 -
  • 32. missão divina que é o instinto motor tanto no papado como nos jesuítas. Cada um deles alega estar agindo unicamente para o bem-estar do povo de Deus no mundo inteiro e para a exaltação da Igreja que Cristo fundou sobre Pedro. Uma segunda é que, como organizações que lidam com potencial humano e dons naturais, cada qual segura com mão firme as alavancas de um imenso poder temporal. Cada qual aplica suas energias e seus re cursos a situações específicas visando a fins particulares, concretos e definidos. Apesar de tudo — e isto é uma terceira similaridade — em meio à paixão e à aparente confusão que sempre acompanham a atividade humana, tanto o papado quanto os jesuítas operam num plano universal e desprovido de pai xão, com motivos que não permitem a vulnerabilidade dos sentimentos humanos. Ambos tentam agarrar o valor do momento presente, passageiro. Mas ambos têm lembranças respeitáveis; ambos medem constantemente seus planos e ações por um gabarito do futuro que desejam ver tornado realidade; e ambos partem do pressuposto de que o tempo está do seu lado. Bastante tempo. É neste ponto capital relativo ao tempo que melhor pode ser percebi do o inevitável resultado de todas as batalhas. Porque na perspectiva ca tólica romana — e também na perspectiva do jesuitismo inaciano clássico — existe outra dimensão, outra condição de existência humana, que ofusca essa guerra entre o papado e a Sociedade: dois poderes cósmicos — o bem inteligente e o mal inteligente, personificados em Deus e Lúcifer — estão atracados numa luta de vida ou morte pela fidelidade de todos os seres humanos. Essa luta só se torna tangível — pode ser rastreada e identificada — nos múltiplos detalhes de complexas situações humanas. Mas, pela mesma razão, tudo o que é tangível, toda e qualquer situação humana, é colorido pelo que é trans-humano e eterno. É essencialmente nesse plano que está sendo travada a guerra entre o papado e a Sociedade de Jesus. E nesse plano, só o papado é que tem a promessa divina de tempo. No plano que ocupamos como espectadores dos acontecimentos con-temporâneos, não temos possibilidade de prever quais as sementes do bem poderão germinar no que temos que resumir como área de calamidade. Estamos demasiado próximos desses acontecimentos. Falta-nos perspectiva — bem como presciência. A visão que temos pelo espelho da história é obscura. Não podemos, portanto, saber quais as alterações que haveria na Sociedade de Jesus se todos os extremismos atuais da Ordem dos je suítas fossem eliminados — entendendo-se por extremismos óbvios o abandono do ensinamento católico romano básico, a substituição dele por soluções sócio-políticas, e o abandono inevitavelmente consequente da primordial vocação dos jesuítas de serem “ homens do papa”. Uma tal reforma da Sociedade e uma nova adesão ao seu carisma inicial parecem, humanamente falando, improváveis quando se analisa até mesmo uma branda acusação de suas condições em nossos dias. _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 32 -
  • 33. 1ª PARTE A ACUSAÇÃO - 33 -
  • 35. 1 . OBJEÇÕES PAPAIS Todo papa competente estabelece uma estratégia dominante para o seu papado. Formula muitos planos de ação, persegue vá rios objetivos determinados: mas todas as políticas e cada objetivo são enquadrados na esfera daquela estratégia. A Sociedade de Jesus foi criada pelo papado em 1540 como “ unidade de combate” muito especial, à disposição total do papa romano — fosse ele quem fosse. Desde o início, os jesuítas foram concebidos num estilo militar. Soldados de Cristo, receberam dois objetivos: propagar a doutrina religiosa e a lei moral do papa romano, e defender os direitos e prerrogativas daquele mesmo papa. Objetivos puramente espirituais e sobrenaturais. E especificamente católicos romanos. E o surpreendente foi que, devido a esse mandato da Sociedade, a própria estratégia papal s e tornou a cunha da separação entre os jesuítas e o papado — na verdade, a própria arena em que está sendo travada a batalha entre os dois. Pio XII, papa de 1939 a 1958, se viu num mundo novo dominado por duas superpotências rivais, uma das quais — a URSS — ele excomungou. Sua política de pós-guerra foi de uma intratável oposição ao marxismo soviético e de apoio à civilização “ ocidental”, centralizada na Europa e protegida pelos Estados Unidos. João XXIII, papa de 1958 a 1963, estava convencido de que uma política de “ janelas abertas, campos abertos” induziria outros — inclusive os soviéticos — a reformarem suas atitudes e políticas. O papa João arriou tantas barreiras entre a Igreja e o mundo — inclusive a União Soviética — quanto lhe foi possível em seu curto e muito ativo pontificado. Chegou, até, a garantir à União Soviética imunidade aos ataques da Igre ja, uma assombrosa reversão das atitudes papais. Foi um enorme jogo. E que só podia funcionar se reinasse entre os adversários participantes uma dos e adequada de boa vontade. O jogo fracassou. O grande detalhe comovente foi que, ao morrer, o papa João, aquele camponês realista, sabia que a sua abertura tinha sido vista como fraqueza, e dele se tinham aproveitado homens de um espírito muito inferior. - 35 -
  • 36. O papa Paulo VI, 1963-1978, cego para as deficiências da política de João, aprimorou-a ainda mais. A Santa Sé se tornou nada menos do que uma querelante no tribunal do poder soviético, pleiteando, no âmbi to diplomático, uma audiência; organizando conversações cautelosas; praticando a arte irresoluta das aproximações concessórias — e até mesmo se rebaixando ao mesquinho engano e traição do reconhecidamente difí cil primaz da Hungria, cardeal Mindszenty, a fim de agradar os soviéti cos e seu castrado representante húngaro, Janos Kadar.1 Em tudo isso, Paulo VI, pessoalmente o mais delicado de todos os papas modernos, comprometeu inconscientemente a sua autoridade papal. Sua grande estratégia para a sua Igreja foi arrebatada e prostituída por terceiros, reduzindo-o a uma impotência que deixou cicatrizes nos seus últimos anos atormentados pela doença, até sua morte no dia 6 de agosto de 1978. Ainda assim, foi Paulo VI que, quando seu período papal já ia mui to avançado, percebeu que o propósito duplo original da Sociedade de Jesus tinha sido alterado. Durante o seu pontificado, foi organizado extenso dossiê crítico sobre a Sociedade. Por enquanto, é suficiente di zer que o que esse dossiê continha era comprometedor. Era um retra to, na realidade, de uma ordem jesuítica que, como um cata-vento no alto de um telhado, tivesse sido virada por um vento diferente. Para os jesuítas, o papado já não tinha a primazia de posição. O objetivo coletivo da Sociedade era colocar -se, junto com a Igreja, à disposição de uma mudança radical e puramente sócio-política do mundo, sem se reportar — na verdade, desafiando — à estratégia, às políticas e aos ob-jetivos papais. Em 1973, Paulo VI, alarmado mais do que nunca pela maneira de os membros da Sociedade se portarem, tentou deter a investida dos acon-tecimentos. Reuniu-se várias vezes com o chefe da Ordem, o padre-geral jesuíta Pedro Arrupe. Boa parte desses encontros entre os dois homens foi tempestuosa. Mais de uma vez, Paulo quis que Arrupe renunciasse ao cargo. De uma maneira ou de outra, Arrupe sobreviveu a todos os ata ques papais. Paulo VI insistiu, mesmo, q ue Arrupe transmitisse a seus jesuítas “ nossa ordem de que os jesuítas continuem leais ao papa”. Ar rupe e seus assistentes em Roma, àquela época, estavam decididos a se preparar para outra reunião internacional da Ordem, uma Congregação Geral, como é chamada essa assembleia. Por isso, foi ganhando tempo, um tempo precioso. Paulo, na sua fraqueza, não encontrava outra alternativa que não a de esperar. Paulo fez uma última, mas ineficaz, tentativa de lembrar a obediência da Sociedade ao papado, durante a assembleia internacional de líde res jesuítas, que durou 96 dias, a XXXII Congregação Geral de 1974-1975. Seus esforços encontraram total incompreensão e uma obstinada — farisaica até, alguns disseram — oposição por parte da Ordem. Papa e jesuítas simplesmente não conseguiram chegar a um acordo. Os jesuítas não queriam obedecer. Paulo estava fraco demais para forçar mais o debate. _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 36 -
  • 37. “Quando se tem pessoas [os jesuítas]”, escreveu o padre jesuíta M. Buckley a respeito da atitude de Paulo para com aquela XXXII Congre gação Geral, “que não acham que tenham cometido erro, quer de conteúdo, quer de procedimento, e quando essas pessoas sofrem a desconfiança, resistência ou reprovação do próprio homem que elas estão tentando servir (...) tem-se (...) um problema religioso muito sério.” Para dizer o mínimo. O cardeal Albino Luciani, de Veneza, foi eleito para suceder Paulo VI no dia 26 de agosto de 1978. Mesmo antes de se tornar papa, parece que ele já tomara uma decisão notadamente desfavorável com relação à Sociedade. E aparentemente a Sociedade já tomara uma decisão com referência ao papa João Paulo I. Assim que foi eleito, os jesuítas fizeram suas reivindicações. O padre Vincent O’Keefe, o mais destacado dos quatro assistentes -gerais de Arrupe, e que estava sendo preparado para suceder a Arrupe um dia como geral da Ordem, declarou em entrevista a um jornal holandês que o novo papa deveria rever a condenação da Igreja ao aborto, à homossexualidade e ao sacerdócio feminino. A entrevista foi publicada. O papa João Paulo I ficou enfurecido. Aquilo era mais do que des prezo. Era uma afirmação de que a Sociedade de Jesus sabia, mais do que o papa, quais os princípios morais que os católicos deveriam praticar. E era uma afirmação de que a Sociedade tinha autoridade para dizer o que pensava; isto é, era uma apropriação direta da autoridade que pertencia exclusivamente ao papa. João Paulo I mandou chamar Arrupe e exigiu uma explicação. Arrupe prometeu, humildemente, investigar o caso todo. Mas João Paulo podia sentir o que estava no ar, tão bem quanto qualquer papa. Com ba se no dossiê crítico de Paulo VI, e com a ajuda de um velho jesuíta muito experiente, padre Paolo Dezza, que tinha sido confessor do papa Paulo VI e agora era o confessor de João Paulo I, o papa redigiu um violento discurso de aviso. Ele planejava proferi-lo à assembleia internacional de líderes jesuítas com o geral Arrupe, em outra de suas congregações gerais a ser realizada em Roma em 30 de setembro de 1978. Uma das características mais notáveis do discurso era a repetida re ferência que João Paulo I fazia aos desvios doutrinários por parte dos jesuítas. “Que não aconteça que os ensinamentos e as publicações dos jesuítas contenham alguma coisa que cause confusão entre os fiéis.” O desvio doutrinário era, para ele, o mais ominoso sintoma do fracasso jesuítico. Encoberto pelo polido verniz de sua graciosa romanità, aquele discurso continha uma clara ameaça: a Sociedade dever ia voltar ao seu papel adequado e prescrito, ou o papa seria obrigado a tomar providências. Que providências? Com base nos memorandos e notas de João Paulo, está claro que, a menos que fosse factível uma rápida reforma da Ordem, _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 37 -
  • 38. ele tinha em mente a efetiva liquidação da Sociedade de Jesus tal como existe hoje — talvez para ser reconstituída mais tarde, numa forma que fosse mais controlável. João Paulo I recebeu pedidos de muitos je suítas implorando para que não fizesse aquilo. O papa nunca proferiu aquele discurso de aviso. Na manhã de 29 de setembro, depois de 33 dias no Trono de Pedro, e um dia antes de se dirigir à congregação geral da sociedade, João Paulo I foi encontrado mor to em seu leito. Nos dias que se seguiram, o geral jesuíta Arrupe apresentou um pedido ao cardeal Jean Villot, que como secretário de estado do Vaticano governava a Santa Sé no período intermediário entre a morte de João Paulo I e a eleição de seu sucessor: será que os jesuítas poderiam obter uma cópia do discurso? Depois de uma discussão com o Colégio de Cardeais, que o estava ajudando nos preparativos para a eleição do próximo papa, o cardeal pru - dentemente negou o pedido. Arrupe foi avisado de que, na opinião de Villot e do concílio, “ estava mais do que na hora de os jesuíta s colocarem seus assuntos em ordem”. Por sua parte, Arrupe e os jesuítas decidiram não fazer nada e ver quem se tornaria o papa seguinte. Tempo era o artigo que eles sempre procuravam ter. Mais do que nenhum de seus dois antecessores imediatos, Karol Wojt yla, da Polônia, eleito como João Paulo II no dia 16 de outubro de 1978, não podia hesitar naquela questão dos jesuítas. A grande estratégia papal de João Paulo II abrangia o Primeiro Mundo do capitalismo, o Segundo Mundo do comunismo soviético e o Terceiro Mundo dos chamados países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Wojtyla foi extremamente sagaz ao analisar o caráter e as limitações da estratégia papal a partir de 1945. Em sua opinião, Pio XII havia guia do a Igreja na base de uma mentalidade de “ cer co”, só permitindo à es tratégia papal um movimento clandestino dentro do império soviético, mas não oferecendo desafio algum à continuada erosão da Igreja naque la área. A política de “campos abertos”, de João XXIII, tinha sido um fracasso. A política de Paulo VI consistira apenas de uma refinação de uma política já defeituosa e fracassada. Até a época da morte de Paulo VI em 1978, seu Secretariado de Estado conseguira elaborar protocolos de acordo com mais de um governo - membro da “ fraternidade” socialis ta soviética, mas nenhum tinha sido rubricado, quanto mais assinado e transformado em lei. De qualquer maneira, ainda que aqueles protocolos tivessem sido ratificados, já se tornara claro que não teriam feito diferença alguma para a situação dos católicos romanos sob domínio soviético. Segundo a análise de João Paulo II, enquanto os chamados Primei ro, Segundo e Terceiro Mundos ficassem trancados no frio glacial da ri validade de superpotências alimentada indefinidamente pelo sistema de “ bola ao chão” entre o marxismo-leninismo e o capitalismo rígido, não haveria a mínima esperança, em termos mundanos, de que alguma coisa _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 38 -
  • 39. pudesse ser salva — de que qualquer batalha fosse vencida ou de que fosse encontrada qualquer solução para o perigoso dilema das nações. A situação só iria se desintegrar, lenta mas inevitavelmente, possivelmente arrasando a civilização tal como os homens a conheceram no último quarto do século XX, e reduzindo a história humana a uma longa e angustiada caminhada sonambúlica até o fim da noite humana. Wojtyla achou que estava na hora de adotar uma norma de ação completamente diferente daquela que Pio, João, ou Paulo, tinha adotado antes dele. Sua abordagem seria na base da “força muscular”: onde os católicos constituíssem maioria ou, então, uma minoria de bom tamanho, em sociedade fechadas, deveriam exigir o espaço sócio-político que lhes cabia por direito — reivindicar seus direitos, em outras palavras, sob a alegação de que a sua simples presença como católicos romanos seria suficiente para garantir a defesa daqueles direitos. Quando cardeal-arcebispo da Cracóvia, na Polônia, Wojtyla já ha via afiado sua sagacidade no planejamento de uma estratégia pela qual tais maiorias e minorias católicas que ele tinha em mente pudessem rei vindicar seus direitos; no entanto, não havia entrado em conflito com o totalitário e inescrupuloso controle militar característico dos governos comunistas. O método de “ força” de João Paulo não afastou a hipótese de diá logo e discurso com os soviéticos e seus representantes. Pelo contrário. Mas seria de um tipo totalmente diferente daquele que João XXIII ou Paulo VI tinha adotado. E de fato, nenhum líder mundial de hoje tem falado aos líderes soviéticos com tanta frequência e de forma tão direta quanto João Paulo II, logo desde o princípio de seu pontificado. Ele re cebeu o prestigiado Andrei Gromyko, da União Soviética, que participara de muitos governos, no dia 24 de janeiro de 1979, pouco mais de três meses depois de sua eleição papal. Foi apenas o primeiro de oito encontros pessoais entre este pontífice e Gromyko entre 1979 e 1985. Suas conversas telefônicas com a Europa Oriental e com a União Soviética são assunto seu; é bastante que se diga que elas acontecem. Se você é um eslavo dos eslavos, se você fala russo além de duas ou três outras línguas europeias orientais, se você é papa, e se você é Karol Wojtyla, os agentes do poder desejam falar com você. Seria essencial, para a estratégia “ de força” de João Paulo II, que ele proporcionasse e impusesse, com sucesso, uma nova liderança mundial alimentada exclusiva e inquestionavelmente por motivos morais e es pirituais. A fim de ter até mesmo uma esperança de vencer numa estratégia assim tão ousada e tão radical, João Paulo II teria que demonstrar a lide rança que ele estava propondo em suas áreas-chave: sua autoridade suprema quanto a doutrina e moralidade teria que ser defendida e reafirmada dentro de sua Igreja de âmbito mundial; e deveria haver um exemplo concreto do que aquela liderança podia oferecer como solução para o dilema internacional. Daí as duas linhas mais visíveis da atividade papal de João Paulo: _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 39 -
  • 40. suas viagens pelo mundo todo e sua cuidadosa orientação do movimento Solidariedade na Polônia. O aparecimento dessa figura papal em todos os principais países e em muitos outros sem tanta importância seria o meio de restabelecer aquela autoridade. E se o movimento Solidariedade con seguisse a liberdade de ação econômica e cultural sob a égide do comu nismo soviético na Polônia, os comunistas e os capitalistas teriam um exemplo vivo para mostrar que a política doutrinária não precisa resultar em escravidão, pobreza ou um devastador militarismo. Com a orientação e a ajuda financeira de João Paulo II, o primaz da Polônia, cardeal Stefan Wyszynski, de oitenta anos, estava obtendo progresso no desenvolvimento de uma atitude na organização do Solida riedade através da qual a Igreja e seu povo pudessem escapar, cultural e socialmente, das garras do comunismo. O éthos do Solidariedade foi desenvolvido precisamente pa ra permitir essa liberdade cultural e social, enquanto deixava intato o controle político e militar do marxismo. “Não ameacem os marxistas do Partido Comunista da Polônia, no Parlamento Nacional, no seu exército ou em suas forças de segurança”, era o lema dos fundadores do Solidariedade. “Deixem-nos em paz. Vamos reivindicar liberdade nas outras áreas.” Ao mesmo tempo, no outro lado do mundo, na área que se estende das fronteiras sul do Texas até à ponta da América do Sul, jesuítas e ou tros estavam executando uma política própria como criadores e princi pais fomentadores de uma nova concepção — que eles chama vam de “Teologia da Libertação”, numa tentativa caracteristicamente eficiente de inspirar um apelo romântico — baseada em princípios revolucionários marxistas e visando instalar um sistema comunista de governo. A contra dição entre o modelo polonês de João Paulo e o modelo de “Libertação” defendido ardorosa e abertamente pelos jesuítas na América Latina não poderia ter sido mais completa ou petulante. João Paulo II, como João Paulo I antes dele, tinha conhecimento do dossiê sobre os jesuítas compilado na época de Paulo VI. E tinha em seu poder, também, o discurso de reprovação que João Paulo I havia preparado mas nunca pronunciara. Em novembro de 1978, um mês após sua eleição, o papa enviou o discurso de João Paulo I ao padre-geral Arrupe no Gesù, como é chamada a sede internacional dos jesuítas em Roma. O papa queria que o gesto tivesse a natureza de um aviso benigno: é como se este discurso tivesse sido escrito por mim, dizia o gesto. Em respos ta, como era de se esperar, ele recebeu do geral os devidos protestos de lealdade e obediência. Mas estes iriam revelar-se apenas isso: protestos. Na noite de 31 de dezembro, como gesto de boa vontade, o papa fo i à igreja jesuítica do Gesù, a fim de honrar a Sociedade com a sua presen ça durante as tradicionais cerimônias religiosas de fim de ano, de dar gra ças a Deus. João Paulo mandou dizer aos jesuítas, de antemão, que não queria ver nenhum deles em trajes civis. E não viu. Talvez fosse uma pequena concessão ao papa, ao qual cada um dos presentes prestara votos importantes e sem igual. Mas foi a única. _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 40 -
  • 41. Até mesmo a comitiva de João Paulo observou a polida frieza dos notáveis jesuítas reunidos para a ocasião. Depois das cerimônias religiosos, o papa jantou com os jesuítas no refeitório deles. Foi cortês em suas observações, reclamou um dos jesuítas presentes mais tarde, mas “ não nos fez a menor insinuação sobre o futuro da Sociedade”. Aquela reclamação tinha um significado que daria para encher volumes, Os jesuítas tinham conseguido ignorar Paulo VI e João Paulo I. Por que iriam precisar de João Paulo II? Os jesuítas teriam simplesmente que ter paciência e sobreviver a esse papa, como haviam sobrevivido aos doi s anteriores. Dois meses após aquele encontro de fim de ano entre o papa e seus jesuítas, nos meses de fevereiro e março de 1979 o geral Arrupe convocou entrevistas coletivas no México e em Roma, nas quais afirmou afavelmente que não havia atrito algum ent re o santo padre e os jesuítas. Sim, confirmou Arrupe a jornalistas no Gabinete Internacional de Imprensa da Santa Sé, ele havia recebido aquele discurso de João Paulo I, que João Paulo II havia assumido como sendo dele próprio. Falava -se, continuou ele, que o documento “ tinha um sentido pejorativo e era uma reprimenda” dirigida às alterações feitas na Sociedade sob a liderança de Arrupe que já durava quatorze anos. Mas aquilo era um absurdo, disse Arrupe. O papa sabia que, “ naturalmente, a Sociedade de Je sus ha via mudado”, conti nuou ele. “Não poderia ser de outra maneira, ao ver que a própria Igreja havia mudado.” Não havia, na realidade, atrito algum, concluiu ele. Sua Santidade pensava o contrário: havia um grave atrito. Aquilo que João Paulo chamava de “ atrito sobre pontos fundamentais”. Teólogos e escritores jesuítas, na Europa e nas Américas, tinham estado, e ainda estavam, ensinando e escrevendo sobre crenças e leis católi cas de uma maneira que se opunha aos ensinamentos papais tradicionais e aos ensinamentos anteriores da Igreja como um todo — sobre a autoridade papal; sobre o casamento entre o marxismo e a cristandade; sobre a moralidade sexual em todos os seus aspectos; sobre crenças sagradas católicas como a Conceição da Virgem Maria, a existência do Inferno, o sacerdócio. Eles estavam, na verdade, redefinindo e remodelando tudo do catolicismo que os católicos sempre consideraram como valores pelos quais valia a pena viver e morrer — inclusive a própria natureza e consti tuição da Igreja que Cristo fundou. O geral Arrupe continuou a permitir a publicação de livros que con - tradiziam toda a gama de ensinamentos tradicionais, e a defender seus homens que escreviam e ensinavam segundo aquela orientação. Nenhum apelo papal ao padre Arrupe jamais pareceu ter qualquer efeito, diante da complicada e engenhosa delonga do geral jesuíta. Arrupe iria examinar a situação, prometia ele ao santo padre. Dizia ele que já tinha inquéritos em mãos. Iria mandar informações o mais rá pido possível. Era difícil separar a verdade de boatos malévolos. Ele fa ria esforços no sentido de esclarecer posições. Era preciso tempo. Seus homens estavam fazendo o possível. Seus pontos de vista tinham sido dis torcidos. _____________________ Os Jesuítas † Malachi Martin ____________________________________________________________ - 41 -