Em um ambiente econômico cada vez mais competitivo, grandes potências como os Estados unidos, França, itália e Reino unido – que ostentaram sua liderança por muitos séculos vêm perdendo espaço para nações emergentes como Cingapura, Hong Kong, China e Coreia do Sul.
Em 2010, o relatório de competitividade do imd (World Competitiveness Report)apresentou Cingapura como o país mais competitivo do mundo, seguido de Hong Kong, superando os Estados unidos, que passou para a terceira posição. o Brasil, no mesmo relatório, avança
também duas posições, passando do 40º para o 38º lugar.
Apesar de alguns fatores como infraestrutura, educação e saúde influenciarem negativamente o posicionamento do país no relatório, sua leve melhora no rendimento geral foi atribuída à avaliação da eficiência de seus negócios e, principalmente, ao seu desenvolvimento econômico recente e à sua capacidade de superação da crise econômica mundial de 2008.
Relatório de pesquisa - De Minas Para o Mundo, do Mundo Para Minas
1. RP1105 Gestão estratéGica do suprimento e o impacto no
desempenho das empresas Brasileiras
de minas para o mundo do mundo para minas
Coordenador
Carlos Arruda
Equipe Técnica
Anderson Leitoguinho Rossi
Lucas Calais Ferreira
Telma Dias Ragonezi
Fabian Ariel Salum
Arthur Ribeiro de Paiva Kux
Bernardo de Assis Meireles
Núcleo de Inovação
2. SumáRio
Introdução …………………………………………………………3
Pesquisa: Gestão da Inovação em grandes
empresas mineiras ......................................4
Apresentação .........................................4
Referencial teórico ..................................4
Metodologia .........................................14
Critérios para seleção de projetos............47
Conclusões ..........................................48
Políticas e ações de inovação em
Minas Gerais e outras regiões do mundo.......60
O sistema regional de inovação de Minas
Gerais .................................................60
Considerações finais ..................................84
Anexos ....................................................89
Minicasos ............................................89
Listagem completa de empresas –
universo.............................................102
Listagem completa de contatos..............104
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 2
3. iNtRodução desde então, vários pesquisadores incorporaram a
inovação em seus estudos, ou até mesmo a trataram
como tema central, como foi o caso dos autores Burns e
e m um ambiente econômico cada vez mais competitivo,
grandes potências como os Estados unidos, França, itália
Stalker3. No trabalho publicado em 1961, eles analisaram
20 indústrias diferentes na Inglaterra e classificaram os
ambientes externos às organizações daquele momento
e Reino unido – que ostentaram sua liderança por muitos
como “estáveis e previsíveis” e “instáveis e previsíveis”.
séculos vêm perdendo espaço para nações emergentes
Enquanto os ambientes estáveis exigiam estruturas
como Cingapura, Hong Kong, China e Coreia do Sul.
organizacionais mais rígidas, portanto mais “mecânicas”,
Em 2010, o relatório de competitividade do imd (World
ambientes mais instáveis demandariam estruturas
Competitiveness Report)1 apresentou Cingapura como
flexíveis, que abrissem espaço para a inovação. Sugerindo
o país mais competitivo do mundo, seguido de Hong
várias características desejáveis às empresas nesse
Kong, superando os Estados unidos, que passou para
sentido, os autores serviram não só ao desenvolvimento
a terceira posição. o Brasil, no mesmo relatório, avança
da teoria contingencial das organizações como também
também duas posições, passando do 40º para o 38º lugar.
influenciaram uma série de outros trabalhos, nas correntes
Apesar de alguns fatores como infraestrutura, educação
teóricas evolutiva e cognitiva4.
e saúde influenciarem negativamente o posicionamento
do país no relatório, sua leve melhora no rendimento Já na segunda metade da década de 80, a inovação
geral foi atribuída à avaliação da eficiência de seus organizacional passa a ser vista de forma sistêmica,
negócios e, principalmente, ao seu desenvolvimento com modelos dinâmicos5 que cobriam não só a ênfase
econômico recente e à sua capacidade de superação estruturalista, mas também a funcionalista do tema. isso
da crise econômica mundial de 2008. quer dizer que a gestão da inovação compreenderia não
só a definição de estruturas e estratégias pró-inovação,
A importância do estudo da variável “desenvolvimento”
mas também aspectos rotineiros como a geração e
na economia, embora aparentemente se situe no âmbito
implementação de ideias, a cultura organizacional,
macroeconômico, passa essencialmente pelo mundo
processos e rotinas do dia a dia, entre outros. o cerne
corporativo. A teoria do desenvolvimento econômico de
do conceito de modelo sistêmico permanece o mesmo
Schumpeter2, cuja primeira publicação data de 1911,
hoje em dia. os principais modelos de inovação dos
apresenta um novo ponto de vista que coloca a inovação
últimos anos tentaram agrupar diferentes combinações
como a principal causa de mudanças descontínuas
e relações entre essas variáveis com o objetivo de
no que ele chamou de “fluxo circular” da economia.
entender ainda melhor esse fenômeno.
Essas mudanças descontínuas no fluxo circular
geram o desenvolvimento econômico. As inovações, o Núcleo de inovação da Fundação dom Cabral também
consideradas pelo autor como “novas combinações”, vem tentando compor esse debate. Atuando desde
seriam um fenômeno inerente ao meio produtivo e 2003, seus trabalhos de treinamento e parcerias com
comercial das organizações. empresas de diferentes tamanhos e setores e pesquisas
realizadas no tema permitiram um entendimento teórico e
Embora o principal objetivo de Schumpeter na época
prático significativo de como a inovação se manifesta nas
tenha sido propor uma alternativa aos modelos
empresas. Esse entendimento se traduziu na concepção
econômicos clássicos da teoria vigente, ele acabou por
de um modelo sistêmico de inovação enraizado em
estabelecer a inovação como um importante foco de
estratégia, cultura organizacional, estrutura e sistemas de
estudos, não só na macroeconomia, mas principalmente
gestão, processos e indicadores6. Diante da experiência
numa abordagem micro, cujo objeto de análise passa
do Núcleo de inovação nesse tema, o Governo de minas
a ser o empreendedor. Afinal, se o desenvolvimento
e a Secretaria de Estado de Ciência, tecnologia e Ensino
econômico era basicamente influenciado pela inovação,
Superior (Sectes-mG) convidaram, em 2009, a Fundação
sendo essa última um fenômeno inerente às lideranças
dom Cabral a trabalhar em conjunto no projeto “de minas
organizacionais, não é de se espantar que os meios
para o mundo e do mundo para minas”.
acadêmico e empresarial tenham voltado seus olhares
para ela. 3
BuRNS, tom; StALKER, G. m. The management of innovation.
Oxford University Press, 1961.
1
WoRLd ECoNomiC FoRum. World Competitiveness 4
tidd, Joseph; BESSANt, Paul. Gestão da inovação.
Report. imd, 2010. Longman, 2008.
2
A Teoria do desenvolvimento econômico, de Joseph Alois 5
ROTHWELL, Roy. Sucessful industrial innovation: critical
Schumpeter, foi inicialmente publicada na Alemanha, em 1911, factors for the 1990s. R&d management, 1992.
e posteriormente traduzida para o inglês, em 1934, quando 6
ARRudA, Carlos; RoSSi, Anderson; SAVAGEt, Paulo.
também recebeu pequenas mudanças e incrementos pelo Criando as condições para inovar. Revista DOM, Nova Lima,
autor. 2009.
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 3
4. o objetivo desse projeto reside na proposição de políticas PESquiSA GEStão dA
públicas que fomentem a atividade inovadora do meio
empresarial de Minas Gerais. Para isso, foram definidas iNoVAção Em GRANdES
atividades em quatro fases. As fases i e ii se relacionam
ao viés “de minas para o mundo”, enquanto as fases iii e EmPRESAS miNEiRAS
iV estão relacionadas ao viés “do mundo para minas”.
Na fase I, houve extensa revisão bibliográfica sobre a
gestão da inovação e suas variáveis. de um ponto de APRESENtAção
vista cronológico, cujo marco teria sido estabelecido
por Schumpeter, percorreram-se diferentes correntes, A revisão teórica, na tentativa de um entendimento mais
teorias e modelos. Além disso, foram trabalhados em aprofundado do processo de inovação organizacional,
específico os pilares do Modelo FDC de Inovação, que serviu como base conceitual para a fase posterior,
será apresentado mais à frente. que seria orientada por uma pesquisa de campo. A
pesquisa empírica teve como objetivo a realização
Na fase ii, a equipe do Núcleo de inovação realizou de um diagnóstico da inovação perante um contexto
pesquisa de campo sobre o processo de inovação bem específico, o de grandes empresas mineiras que
de 60 grandes empresas sediadas no estado. Foram investem parte de sua receita em atividades de pesquisa,
feitas visitas presenciais, entrevistas semiestruturadas desenvolvimento e inovação.
e a aplicação de survey visando posterior análise
quantitativa e qualitativa do material coletado. os de um universo inicial composto por 243 grandes
métodos, as análises e os resultados se encontram nos empresas (acima de R$60 milhões de dólares conforme
tópicos seguintes deste documento. definição do BNDES em 2009) com sede no Estado
de minas Gerais, foi realizada uma breve pesquisa
A fase III contou com pesquisa bibliográfica e de campo exploratória nesse grupo, na tentativa de identificar
acerca do tema políticas públicas de fomento à inovação. aquelas companhias que comporiam uma amostragem
Foi realizada pesquisa exploratória sobre o Sistema representativa dos diversos setores econômicos e das
Regional de inovação de minas Gerais, o SRi-mG, regiões do Estado. Foi assim definido o número-alvo
os programas, ações, projetos existentes, principais de 60 empresas a serem estudadas, compondo os
agentes, estratégias de atuação e interações do sistema, setores de indústria, serviços, comércio e agronegócio,
bem como pesquisa bibliográfica e de campo acerca do com participantes de quase todas as regiões do Estado.
tema em outras regiões do mundo. Foi também realizada Esse estudo empírico das empresas se deu através de
uma visita ao Canadá, na tentativa de estabelecer um visita às suas instalações, entrevista com os líderes e
benchmarking potencial para estratégias locais. a aplicação de survey com um membro de cada uma
Finalmente, a fase iV, paralela às outras três, contou delas, permitindo uma abordagem ampliada do foco
com seminários sobre inovação conduzidos sob a de estudo. Além das fontes de dados e informações
responsabilidade da Fundação dom Cabral, com supracitadas, a pesquisa também contou com dados
palestrantes como o professor Robert Wolcott, da secundários, seja através de documentos e registros
Kellogg School of management, e o dr. Flávio ávila, da oferecidos pelas próprias empresas, ou de informações
Embrapa. Nesse caso, o objetivo foi o conhecimento e disponibilizadas por outras vias, como websites oficiais
a disseminação de outros trabalhos interessantes, de e notícias veiculadas pela imprensa.
cunho teórico e prático, sobre gestão da inovação. A survey foi realizada através da aplicação de questões
As principais análises, resultados e considerações abertas e fechadas, cujo conteúdo foi direcionado pela
dessas atividades serão apresentados a seguir. Além base conceitual construída na primeira fase do projeto,
disso, serão propostas algumas recomendações ao tratada neste relatório na parte i. A estrutura do mesmo foi
Governo do Estado de minas Gerais, no intuito de idealizada conforme os pilares do modelo desenvolvido
promover um ambiente favorável à inovação. Espera- pelo Núcleo de inovação da FdC. os resultados a seguir
se que as informações, análises e propostas aqui estão orientados por esses pilares.
discutidas sirvam ao debate da inovação no Estado,
e que, ao melhor entendê-la, possamos construir um
cenário competitivo mais promissor para as empresas REFERENCiAL tEóRiCo
dessa região.
Presente tanto nas rotineiras decisões gerenciais quanto
nos principais debates acadêmicos contemporâneos,
a inovação adquiriu enorme importância nos estudos
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 4
5. organizacionais, embora ainda não seja um tema Além de Burns e Stalker (1968) e de outros estudos da
consensual, tampouco sistêmico – como são, por teoria contingencial, também serão analisadas outras
exemplo, os estudos sobre a qualidade total. Inúmeras obras que tratam a gestão da inovação em momentos
pesquisas realizadas sobre inovação nessa área e épocas distintos, passando por Utterback e Abernathy
apresentaram dados valiosos na tentativa de entender (1975), Van de Ven (1986), Rothwell (1992), Christensen
esse complexo processo, que muitas vezes é confundido (2001) e tidd et al. (2008), sempre sob a luz dos
com vocábulos correlatos, porém substancialmente pilares schumpeterianos. independentemente de qual
diferentes, como criatividade, P&d ou invenções. abordagem ou corrente teórica funcionasse como suas
Numerosas teorias e modelos de inovação foram plataformas, todas aparentemente se aproveitaram de
concebidos ao longo do tempo e este trabalho considera premissas firmadas em 1911 por Schumpeter e sua teoria
que a obra de Schumpeter (1997, 2003) pode ter do desenvolvimento econômico. E essa possibilidade
influenciado a quase totalidade deles. ajuda a nortear o debate que aqui se pretende conduzir.
teria o austríaco sido o responsável pelo início dos
Em contraposição ao mainstream econômico, Schumpeter
estudos da inovação no âmbito das organizações?
(1997) apresentou sua teoria do desenvolvimento
econômico, ancorada no que ele chamava de “fluxo o objetivo desse referencial teórico é, além de percorrer
circular”, impactado por mudanças descontínuas num por diversas obras sobre a gestão da inovação que
contexto econômico caracterizado pela incerteza. adquiriram relevância com o tempo, investigar o
Embora o enfoque do autor fosse mais macroeconômico, estabelecimento de um paradigma schumpeteriano,
é notória a sua contribuição para os estudos internos através do entendimento da inovação como um processo
das firmas, posto que essas mudanças descontínuas, propiciado pelas organizações, fortemente influenciado
responsáveis pelo desenvolvimento econômico, pela incerteza do ambiente externo e causado por
ocorreriam primordialmente nas organizações em seus mudanças descontínuas nas regras do jogo. o método
meios produtivo e comercial (SCHumPEtER, 1997). A escolhido residiu na revisão bibliográfica para a
notoriedade do trabalho de Schumpeter aparentemente construção de um ensaio teórico usando o paradigma
influenciou uma nova geração de estudos sobre as de Kuhn (1996) como plataforma metodológica.
organizações que tinham a inovação como foco parcial
ou até mesmo integral em suas pesquisas.
Escrita em 1911, a teoria do desenvolvimento econômico O paradigma de Kuhn e a obra
schumpeteriana só seria traduzida do alemão para o
schumpeteriana
inglês em 1934 (SCHumPEtER, 1997). Nessa época,
a produção acadêmica sobre estrutura organizacional o desenvolvimento científico em uma determinada
era basicamente dominada pela teoria clássica, a qual área ou disciplina está diretamente relacionado à forma
indicava apenas um tipo ideal de estrutura, baseada como a empiria e a teoria se integram na criação de
em rigorosa hierarquia, controle de tarefas e no estudo um determinado conhecimento. Autores como Popper
dos tempos e movimentos (CLEGG, 1998). Porém, já (1972) e Lakatos (1989) são bastante importantes
na década de 50, começaram a surgir trabalhos que nesse aspecto, uma vez que apresentaram arcabouços
consideravam o ambiente externo às organizações teóricos no que tange ao estudo da formação da ciência
como uma grande contingência, transformando de vez em si. Embora se saiba da relevância dos trabalhos dos
a abordagem estruturalista. Para eles, as estruturas autores citados, esta pesquisa acredita que thomas
das organizações seriam fortemente influenciadas pela Kuhn (1996) tenha sido quem melhor conseguiu decifrar
incerteza diante do ambiente externo: contingência tal realidade.
responsável pelas adaptações. Essa nova corrente daria Kuhn (1996) trouxe na década de 60 uma importante
origem à teoria contingencial, cujos primeiros trabalhos contribuição à literatura com A Estrutura das Revoluções
de relevância foram de Skinner (1953) e Woodward Científicas. denomina como “ciência normal” o período
(1958). o terceiro deles, de Burns e Stalker (1968), viria a que se segue a uma descoberta de alta relevância
reconhecer a internalização da inovação diretamente no ou a um importante feito científico. A partir dessas
contexto corporativo, conforme estabelecido pela teoria descobertas, novas verdades passam a ser trabalhadas
schumpeteriana. A ênfase nessa obra que veremos a e articuladas na busca de incrementar essa ciência,
seguir é fruto do entendimento de que ela tenha sido a confirmando ainda mais os preceitos já preestabelecidos
primeira a realmente reconhecer a inovação como um pela conquista científica (KUHN, 1996). Esses grandes
fator organizacional, além de prover também a relação feitos, que o autor chama de “achievements”, são
próxima da teoria contingencial com os conceitos trabalhos que serviram para definir e legitimar problemas
defendidos por Schumpeter. e métodos para os pesquisadores engajados em um
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 5
6. campo de estudo. Justamente por terem se tornado o de Schumpeter, que provavelmente influenciou todo o
pilar central de uma disciplina, como assim fizeram, por desenvolvimento de conhecimento acerca da gestão da
exemplo, Isaac Newton, no campo da física, e Benjamin inovação que encontramos hoje na literatura.
Franklin, no campo da eletricidade. tais obras teriam
Schumpeter nasceu em 1883, na Áustria, tendo finalizado
estabelecido novos paradigmas na ciência, orientando e
em 1906 sua graduação em direito pela universidade
servindo como base para praticamente toda a pesquisa
de Viena, com alguns cursos e exames complementares
realizada posteriormente no assunto.
de economia e ciência política (SCHumPEtER,
o estabelecimento de um paradigma, no entanto, não 1997). Sua precocidade no meio acadêmico ficou logo
traz respostas imediatas às questões levantadas pela evidente, com a publicação de seu primeiro livro já em
ciência – e de fato nem possui esse objetivo (KuHN, 1908, intitulado The Nature and Essence of Theoretical
1996). Essas questões passariam a ser respondidas, ou Economics. Esse estudo serviria como plataforma para
pelo menos tentar-se-ia respondê-las, através da criação a concepção teórica do autor estabelecida em The
de revistas e journals acadêmicos especializados, Theory of Economic Development, publicada em 1911.
fundações de grupos de especialistas na área e uma Sua teoria do desenvolvimento econômico se baseava
agenda de pesquisa que tentaria adereçar a essas no que ele chamava de “fluxo circular” da economia,
perguntas ações que, segundo o autor, estariam o qual seria impactado por mudanças descontínuas
associadas às primeiras percepções de um novo que afastariam a economia do seu ponto de equilíbrio
paradigma científico. Nesse sentido, o estabelecimento (SCHumPEtER, 1997). As mudanças descontínuas a
do paradigma seria seguido pela ciência normal, que o autor se refere seriam frequentemente associadas
baseada em três fases: 1) a extensão do conhecimento à inovação em sua obra, embora ele tenha sido deveras
e da particularidade dos fatos apresentados pelo cauteloso na utilização desse termo.
paradigma; 2) a busca por novos fatos dentro dessa
Quando trouxe a inovação para o foco central de seu
ciência, assim como a comparação desses com os
estudo (uma vez que a análise do desenvolvimento
observados anteriormente e 3) a posterior articulação
econômico deveria passar pela compreensão dessas
empírica e teórica do próprio paradigma. Exaurindo as
mudanças descontínuas), Schumpeter foi ainda mais
três fases, a ciência em questão estaria preparada para
longe, ao afirmar que a inovação seria um fenômeno
uma quebra de paradigma e o estabelecimento de um
inerente às organizações:
novo, que por sua vez guiará uma nova era de ciência
normal (KuHN, 1996).
Os preceitos das revoluções científicas trazidos pela Essas mudanças espontâneas e descontínuas
obra de thomas Kuhn foram principalmente associados no canal do fluxo circular e essas perturbações
a campos de estudo dominados por leis e métodos do centro do equilíbrio aparecem na esfera da
muito bem definidos. Usando exemplos de estudiosos vida industrial e comercial, não na esfera das
de ciências naturais, a identificação de quebras e necessidades dos consumidores de produtos
criações de novos paradigmas ficava bastante clara. finais. (...) é o produtor que, via de regra, inicia
No entanto, essa pode não ser uma realidade tão a mudança econômica, e os consumidores
facilmente aplicável à temática das ciências sociais e, são educados por ele, se necessário; são,
no nosso caso, gerenciais. Kuhn (1996) traz no prefácio por assim dizer, ensinados a querer coisas
da segunda edição do livro, publicada em 1966, o fato novas, ou coisas que diferem em um aspecto
de que cientistas frequentemente levantavam questões ou outro daquelas que tinham o hábito de usar
acerca da legitimidade da replicação da teoria da (SCHumPEtER, 1997).
ciência normal para estudos sociais e econômicos.
mesmo que algumas áreas das ciências sociais ainda
Com essa afirmação, o austríaco provavelmente abriu
sequer tivessem um paradigma a ser seguido (KuHN,
espaço para a incorporação da inovação e a sua
1996), isso não impediria a transição dos conceitos da
gestão aos estudos organizacionais, estabelecendo
obra kuhniana para um ponto de vista mais qualitativo
um campo que viria posteriormente a ser trabalhado
do que quantitativo. dessa forma, ao inserirmos os
por outros pesquisadores, mesmo que influenciados
conceitos de paradigma e ciência normal neste presente
e algumas vezes até englobados por outras áreas
trabalho, já de antemão reconhecemos as limitações
da administração e da economia. Ao internalizar a
em tratar a gestão empresarial e mais especificamente
inovação para os meios organizacionais, Schumpeter
a gestão da inovação como ciência – e não como um
(1997) passa a utilizar os termos empreendimento
conjunto de técnicas, como é usualmente aceito. Essa
e empreendedor para se referir, respectivamente, à
preocupação pode ser atenuada pela existência da obra
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 6
7. atividade e aos seus responsáveis. o conceito do ter sinalizado características da primeira das três fases
empreendedor schumpeteriano vai, inclusive, além do de exaustão do paradigma kuhniano, representada
próprio dono do negócio, incluindo também gerentes principalmente pela extensão do conhecimento e dos
e membros da diretoria, desde que estivessem ligados fatos previamente estabelecidos.
diretamente às inovações, frequentemente tratadas
A grande relevância de Schumpeter para a gestão da
pelo autor como “novas combinações” (SCHumPEtER,
inovação tornou-se aparente a partir da década de 50.
1997). Os tipos de novas combinações identificados
Naquela época o campo de estudos organizacionais
pela obra em muito se assemelham com os que
ainda era incipiente, o que teria facilitado a incorporação
vemos hoje na literatura sobre o tema. os cinco tipos
da inovação como tema (algumas vezes central) dos
indicados pelo autor foram: 1) introdução de um novo
trabalhos que surgiam na época. um desses trabalhos
bem; 2) introdução de um novo método de produção;
foi o de Burns e Stalker (1968), que teria demonstrado
3) abertura de um novo mercado; 4) conquista de uma
aptidão peculiar ao reconhecer esse conhecimento
nova fonte de oferta de matéria-prima; 5) criação de
previamente concebido.
uma posição de monopólio através da diferenciação
(SCHumPEtER, 1997).
Schumpeter (1997) também foi claro em diferenciar as
novas combinações conforme seu grau de intensidade
A teoria contingencial na gestão da
e novidade. Para ele, algumas dessas inovações são inovação e outras contribuições ao
oriundas de ajustes contínuos na forma ou no que já era paradigma
feito antes, não determinando um fenômeno propriamente
novo. Essas mudanças geram crescimento econômico, tom Burns e George. m. Stalker publicaram, em 1961,
mas não são responsáveis pelo desenvolvimento, que uma relevante obra intitulada The Management of
só acontece através das mudanças descontínuas (ou Innovation. Burns e Stalker (1968) se situam numa
inovações) no fluxo circular da economia – o que hoje corrente teórica de estudos organizacionais iniciada por
em dia poderíamos associar a conceitos amplamente Taylor (1911) e seu estudo dos ‘tempos e movimentos”
aceitos de inovação radical ou disruptiva, como será nas organizações. A abordagem taylorista serviu como
explicado mais à frente. Nesse sentido, foi trazida à tona marco à administração científica, embora a teoria clássica
a questão da dificuldade das empresas já estabelecidas da administração tenha sido instituída apenas em Fayol
e controladoras dos meios de produção em introduzir (1949). Essa teoria foi pioneira na compreensão da
esse tipo de mudança. O autor ainda afirma que as gestão como campo de estudo, além de estabelecer
novas combinações (e aqui ele se refere às inovações princípios básicos para a administração de empresas
de cunho mais radical) “estão corporificadas, por assim claramente ligados à rigidez organizacional, propondo
dizer, em empresas novas que geralmente não surgem um modelo único e ideal de estrutura organizacional
das antigas, mas começam a produzir do seu lado” (CLEGG, 1998).
(SCHumPEtER, 1997). A sociologia passa a ser introduzida nos estudos
A questão das mudanças descontínuas que acarretariam organizacionais com o estabelecimento da escola das
o afastamento da economia de seu ponto principal de relações humanas, cujo trabalho mais relevante é de
equilíbrio voltou a ser alvo dos estudos de Schumpeter, Mayo (1949). A escola busca o foco no indivíduo como
que, anos mais tarde, relacionou o fenômeno ao que possuidor de necessidades psicológicas e sociais,
denominou “destruição criativa” (SCHumPEtER, determinantes na cooperação do empregado para
2003). Para ele, as inovações na economia seriam atingir os fins da organização (CLEGG, 1998). Como
responsáveis por uma destruição completa das regras sociólogo, Tom Burns provavelmente foi influenciado por
do jogo anteriormente definidas, estabelecendo uma essa escola, ao afirmar que os primeiros trabalhos que
nova realidade no mesmo lugar. mesmo que ainda deram origem à sua publicação mais famosa objetivavam
num cunho predominantemente macroeconômico, o estudo das organizações como “comunidades de
essa obra também foi fonte de grande influência para pessoas no trabalho” (BuRNS; StALKER, 1968). Esse
os posteriores estudos de gestão da inovação, como objetivo se ampliava à medida que os autores percebiam
será apresentado no decorrer deste paper. dado que ser impossível conceber tal estudo sem considerar o
a teoria do desenvolvimento econômico só veio a ser ambiente externo das organizações.
traduzida para o inglês em 1934, de alguma forma pode- Ao conduzir um estudo preliminar em duas organizações
se considerar a abordagem da “destruição criativa”, em do ramo de engenharia, dois pontos centrais emergiram:
obra publicada em 1943, um incremento importante à o primeiro residia na observação de que as estruturas
teoria do desenvolvimento econômico. Ela pode inclusive organizacionais analisadas estavam bem condizentes com
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 7
8. a estrutura proposta pela teoria clássica, especialmente inglesas da indústria de eletrônicos, dando origem a um
em relação à rigidez. o segundo, no fato de que as terceiro estudo, cuja pesquisa foi conduzida com oito
estruturas de pesquisa e desenvolvimento (P&d) dessas empresas. diferentemente das empresas escocesas
empresas estavam orientadas para solução de problemas, previamente analisadas, estas se caracterizavam
sem poder dar a devida atenção a projetos de longo prazo. por maior comprometimento com o desenvolvimento
Essas constatações serviram de pano de fundo para um tecnológico no ramo da eletrônica. Esse novo estudo
segundo estudo conduzido junto a empresas escocesas propiciou insights mais profundos sobre a caracterização
do ramo da engenharia eletrônica. e a diferenciação entre os dois modelos de gestão
apresentados, além de reforçar a opinião dos autores
Nesse segundo trabalho, Burns e Stalker focaram no
de que as relações humanas e os códigos de conduta
estudo de cinco empresas pertencentes ao conselho
(envolvendo questões como poder, hierarquia, controle
escocês chamado electronics scheme, que visava
etc.) praticamente definem as próprias organizações
facilitar o acesso de empresas escocesas a recursos
(BuRNS; StALKER, 1968).
e técnicas certos no setor de eletrônicos, e ajudá-
las também no processo de comercialização dessas Ao introduzir a variável ambiente como principal
novas soluções (BuRNS; StALKER, 1968). dessa contingência a ser considerada nos estudos
forma, o contexto em que as organizações foram organizacionais e propor um modelo orgânico ideal para
analisadas era o de significativa mudança, de um a gestão em ambientes caracterizados pela inovação,
ambiente antes caracterizado pela maior estabilidade, Burns e Stalker avançaram de forma significativa. Desde
com amplo conhecimento de tarefas técnicas e a teoria do desenvolvimento econômico de Schumpeter,
comerciais da organização, para um ambiente de que introduziu a inovação como um fator gerenciável
incerteza, caracterizado pelo dinamismo e pela e, em consequência, a necessidade da abordagem do
instabilidade constantes, principalmente proporcionado tema nos estudos organizacionais, a obra clássica da
por avanços tecnológicos e pela inovação. Assim, os teoria contingencial foi a primeira a tratar a gestão da
autores propuseram sistemas que se adequassem e inovação de uma forma mais abrangente. A obra se
respondessem às contingências impostas por cada um traduziu numa significante contribuição ao paradigma
desses ambientes. os sistemas de gestão “mecânicos” schumpeteriano explicitado anteriormente, sendo o
propiciaram uma estrutura organizacional própria a primeiro trabalho a propor uma estrutura de gestão
ambientes estáveis, e os sistemas “orgânicos”, por sua diferenciada nas organizações com o objetivo de torná-
vez, definiram estruturas voltadas para ambientes de las mais inovadoras. Além disso, tratou de reaver a
mudança e incerteza, caracterizados pelo constante mudança e a incerteza como fatores influenciadores
processo de inovação (BuRNS; StALKER, 1968). do processo de inovação, como também já tratado na
obra de Schumpeter. Nota-se que, embora fizessem
No modelo mecanicista, as tarefas são quebradas
parte de um campo de estudo distinto do abordado
em tarefas especializadas, e os métodos e poderes
pelo austríaco, direcionado à macroeconomia, Burns e
associados a cada função, bem definidos. A interação
Stalker (1968) trataram de adicionar novos e relevantes
com a gestão tende a ser vertical, de superior para
fatos ao paradigma preestabelecido, no processo de
subordinado, e a hierarquia é clara e bem estabelecida.
desenvolvimento da ciência normal (KuHN, 1996) da
A informação é filtrada e não é disponibilizada a todos,
gestão da inovação.
através de um processo de controle contínuo. Já no
modelo orgânico, as tarefas são realizadas à luz da Além disso, outra grande contribuição – geralmente
organização, tendo seus fins considerados como um atribuída a Burns e Stalker consiste na disseminação
todo, ou seja, elas não são especializadas. Não há clara do campo da teoria contingencial, cujos primeiros
definição de funções, métodos, tarefas e poderes. Estes trabalhos relevantes foram Skinner (1953) e Woodward
são redefinidos constantemente conforme o contexto e as (1958), mas que só viria a tomar corpo com Burns e
mudanças se apresentam. A interação e a comunicação Stalker (1968), responsáveis pelo enunciado seminal
são tanto laterais quanto verticais, e os poderes são mais que iniciou essa abordagem (CLEGG, 1998). A análise
descentralizados (BuRNS; StALKER, 1968). conceitual desses trabalhos e de seguidores dessa teoria
focou em como os diferentes graus de incerteza das
os autores identificaram uma enorme inabilidade
tarefas organizacionais (conforme as características de
das empresas em adaptar seus sistemas de gestão
estabilidade ou instabilidade ditadas pelo fator tecnológico
às novas condições a elas impostas, principalmente
do ambiente onde essas organizações estiverem
na transição de modelos mecanicistas mais rígidos
inseridas) deveriam influenciar a escolha por diferentes
para outros mais orgânicos e, portanto, mais flexíveis
estruturas e sistemas de gestão (CLEGG, 1998). As
(BuRNS; StALKER, 1968). Esses resultados foram
contribuições do trabalho de Burns e Stalker (1968), assim
apresentados na inglaterra junto a grandes empresas
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9. como outras obras relevantes da teoria contingencial que Nesse modelo, os ciclos de vida de inovações
serão apresentadas a seguir, muito fizeram, por estender de processos e produtos sugerem um padrão de
a amplitude do paradigma aqui defendido. A busca deslocamento ao longo do amadurecimento das
por novos fatos – orientados basicamente por estudos organizações, de inovações radicais para incrementais
empíricos – nos ajuda a configurá-la como esforços e daquelas associadas a produtos para processos. o
relacionados à segunda fase da ciência normal, aqui desenvolvimento passaria por três fases, que influenciam
previamente explorada (KUHN, 1996). de forma diferenciada as empresas, o mercado, os
recursos e as capacitações necessárias para a geração
Nesse sentido, Lawrence e Lorsch (1967) determinaram
e propagação das inovações. Nota-se que, além de
que a taxa de mudança ambiental afeta a diferenciação
trabalharem a questão das inovações de produto e
e a integração da organização, de modo que taxas
processo, introduzidas na teoria schumpeteriana, eles
elevadas de mudanças ambientais exigem que certas
ainda incluíram a diferenciação estratégica e estrutural
áreas da organização enfrentem índices de incerteza
das organizações ao perseguir inovações incrementais
maiores do que outras e, dessa forma, demandem
ou radicais. mesmo com algumas diferenças conceituais,
estruturas mais inovativas. Afirmam ainda que, face às
podemos identificar, portanto, mais um relevante trabalho
diferenças estruturais e culturais interdepartamentais, as
que seguiu a lógica central introduzida na teoria do
organizações devem coordená-las através da promoção
desenvolvimento de Schumpeter (1997).
da maior integração dos seus colaboradores. Além disso,
é importante mencionar que a abordagem contingencial O trabalho de Utterback e Abernathy (1975), apesar
sinaliza, progressivamente, que o índice de inovação das de lidar com questões já trabalhadas anteriormente
organizações reflete a competição e concorrência, já que em outros estudos, alguns deles aqui brevemente
são respostas ao ambiente que as circunda. apresentados, já indicava uma tendência a lidar com a
inovação de uma maneira mais abrangente, ao tratar
outra importante publicação nessa área seria a de
também aspectos mais funcionalistas de sua gestão.
Woodward (1965), que conduziu um estudo quantitativo
Rothwell (1992) foi especificamente hábil em entender
e comparativo de organizações manufatureiras,
essa questão, e seu trabalho será detalhado na seção
seguindo os ditames contingenciais: a tecnologia como
seguinte.
contingência de operação foi indicada como o elemento
explicativo da estrutura organizacional e, a partir disso,
seria possível aferir sobre a relação de performance,
estrutura organizacional e produção de tecnologia. O surgimento de modelos dinâmicos de
mintzberg (1979), uma das mais reconhecidas obras
gestão da inovação
nesse campo de estudo, em concordância com seus
predecessores, contribuiu muito para a concepção sobre o legado da obra de Schumpeter para a gestão da
a adaptação estrutural face às contingências ambientais. inovação continuava a dar bons frutos, uma vez que a
Para tal, propôs uma nova taxonomia que contava quantidade de trabalhos que estudavam essa temática
com cinco arquétipos sobre a configuração básica das cresceu bastante nos anos de 1970 e 1980. Como vimos
estruturas organizacionais, com diferentes potenciais aqui anteriormente, a abordagem da gestão da inovação
inovativos, e onde cada organização poderia ser era basicamente focada em uma lógica estruturalista, que
enquadrada em uma delas, segundo a maior similaridade buscava identificar sistemas ideais para as organizações
com suas características primordiais. lidarem com ambientes mais propícios à inovação. Apenas
na segunda metade da década de 80 uma ênfase mais
Contemporâneos a Mintzberg, Utterback e Abernathy
funcionalista passou a ser introduzida, cujos trabalhos
(1975) não necessariamente se encaixam na teoria
buscavam entender questões menos estratégicas e,
contingencial. Sua presença neste estudo é justificada
portanto, mais rotineiras nesse processo (RotHWELL,
pela relação aparentemente próxima com o paradigma
1992). A partir desse momento, os modelos de gestão
schumpeteriano que aqui se defende. os autores
da inovação passavam a reconhecer a importância
recorreram a dados empíricos de cinco indústrias
gestora não só na escolha de modelos gerenciais e
diferentes, apontando que as teorias contingenciais
estruturas ideais, mas também no gerenciamento de
anteriores consideraram os fatores que afetam a inovação
processos internos e outras ferramentas com o objetivo
sob uma perspectiva fixa, sem uma dimensão dinâmica.
de facilitar a inovação organizacional, o que corrobora
Nesse sentido, visaram romper com tal tendência
para a visão dos empreendedores como indutores
analítica, criando um modelo no qual a inovação de
principais do processo (SCHUMPETER, 1997). Roy
processos, produtos, estrutura organizacional e ambiente
Rothwell foi um dos primeiros teóricos a perceber essa
competitivo interagem e se correlacionam.
nova abordagem.
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 9
10. Rothwell (1992) analisa, inicialmente, as principais quando ele discorre sobre as estratégias corporativas,
características do processo de inovação das já que ficava cada vez mais evidente que a inovação
organizações desde os anos 1950 até os anos 1990, derivaria de uma rede de companhias interagindo em
conforme os teóricos do assunto, em suas respectivas uma multiplicidade de maneiras (miLES; SNoW, 1986,
épocas. As primeiras duas gerações de modelos apud ROTHWELL, 1992). Exemplos bem-sucedidos
de inovação apresentadas por Rothwell (1992) se da inclusão de fornecedores nos estágios iniciais do
caracterizavam por uma visão linear do processo, numa desenvolvimento de automóveis na indústria japonesa
relação de causalidade entre as empresas e o mercado. confirmavam essa nova realidade (GRAVES, 1987, apud
A primeira delas, iniciada na década de 50 e centrada RotHWELL, 1992).
no termo “technology-push” (RotHWELL, 1992), se A quarta e quinta gerações de Rothwell, que representavam
baseava na oferta tecnológica como a grande indutora o momento em que a inovação passava a ser vista de
da inovação nas organizações, o que representa uma uma forma mais sistêmica nas organizações se valendo
visão bastante semelhante à introduzida por Schumpeter de aspectos estruturalistas e funcionalistas da gestão do
(1997). As outras etapas do processo inovativo viriam processo, eram cada vez mais disseminadas em meados
de forma lógica e sequencial, como o P&d industrial, da década de 80. Valendo-se dessas novas premissas,
a engenharia e a manufatura (RotHWELL, 1992). um dos principais estudos empíricos de gestão de
Nota-se que, até então, o mercado era visto como um inovação a partir de modelos integrados e sistêmicos foi
receptor passivo do resultado dos esforços tecnológicos conduzido por um grupo de professores e pesquisadores
das empresas. Para o autor, essa visão evolui na associados à universidade de minnesota.
segunda geração de modelos de inovação (década
Esses estudos se baseavam em uma definição central
de 1960), a partir de uma ênfase maior no papel do
do processo de inovação como “o desenvolvimento e
mercado consumidor como o lado proativo da relação.
implementação de novas ideias por indivíduos que, por
A pesquisa e o desenvolvimento atuariam captando
um período determinado de tempo, se envolvem em
necessidades desse mercado, o que justifica o uso do
transações com outros indivíduos em um determinado
termo “market-pull” (RotHWELL, 1992).
contexto institucional” (VAN DE VEN, 1986). A definição,
A linearidade dos modelos de inovação deu lugar a uma de escopo mais genérico, indica a intenção de
visão diferente a partir dos anos 1970, representada abordar as inovações técnicas (novas tecnologias,
pela terceira geração no trabalho de Rothwell. produtos e serviços) juntamente com as inovações
Na terceira geração, os teóricos viam a ciência, a administrativas (novos procedimentos, políticas e
tecnologia e o mercado de maneira mais integrada, modelos organizacionais), corroborando com a inclusão
criticando os modelos anteriores pela sua simplicidade da visão funcionalista. Segundo o autor, os quatro fatores
excessiva (ROTHWELL, 1992). Apenas na segunda básicos inseridos no conceito de inovação acima (ideias,
metade da década de 80 é que a visão linear passaria pessoas, transações e contexto institucional) e a relação
a ser preterida. Essa possível ruptura foi justificada deles entre si indicam quatro questões ou problemas
pelo autor através da adoção de um entendimento centrais à gestão da inovação: o problema humano
da inovação como um processo que envolveria do gerenciamento da atenção (foco); o processual da
simultaneamente elementos de P&d, prototipagem e aceitação e transformação de ideias em inovações; o
manufatura, enquanto a visão anterior apontava para estrutural da gestão entre as partes do processo e o
uma ordem sequencial de etapas, com as unidades processo de inovação como um todo e o estratégico da
atuando em momentos distintos o que caracterizou liderança institucional (VAN dE VEN, 1986).
a quarta geração de modelos de inovação, segundo o gerenciamento da atenção nas organizações,
Rothwell (1992). Na quarta geração, caracterizada anteriormente pesquisado por Van de Ven e Hudson
pelos modelos dinâmicos, ou integrados (RotHWELL, (1985), estaria relacionado ao trade-off vivido diariamente
1992), também fica clara a inserção da importância das pelas pessoas em direcionar sua atenção entre o
parcerias para o desenvolvimento em conjunto. complexo e o rotineiro, duas direções assumidamente
Como proposta, o autor traz uma evolução idealizada opostas. os autores chegaram à conclusão, baseados
do modelo integrado, cujas novas características em uma literatura de psicologia cognitiva, de que uma
incorporadas estariam atreladas, principalmente, às visão mais realista da inovação deveria considerar
redes de colaboração por softwares de ti e parcerias limitações psicológicas dos seres humanos em lidar
entre organizações distintas e relações com os com questões não rotineiras, influenciados pela inércia
fornecedores, clientes e mercado como um todo o das organizações. Ao trabalhar o problema da aceitação
que configuraria assim a futura quinta geração. Essa de ideias na gestão da inovação, Van de Ven (1986)
abordagem também é utilizada por Rothwell (1992) destacou o papel das pessoas nessa questão. Na
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 10
11. análise, o autor expôs ideias de Schon (1971), que além de outros pontos de sua teoria aqui já debatidos,
detalhou as várias etapas do processo de aceitação de foi relembrado e até aprofundado em vários autores
ideias com foco em políticas públicas, apresentando que percorreram o caminho do estudo da inovação nas
resultados valiosos também para o setor empresarial. organizações ao longo do tempo. As obras de Rothwell e
Fica claro que é o foco central nas ideias que proveria Van de Ven expostas nesta seção também demonstram
um veículo para os antes isolados, desconectados e esforços de extensão do paradigma schumpeteriano
competitivos stakeholders contribuírem para o processo conforme a ciência normal de thomas Kuhn, que serve
de inovação (VAN dE VEN, 1986). como base metodológica desse referencial teórico. Além
Além de trabalhar as duas problemáticas citadas, também disso, essa fase de ciência normal, caracterizada pela
foi explorada uma terceira questão, a das transações complementaridade teórica às premissas do paradigma
entre diferentes pessoas, departamentos, unidades schumpeteriano, permanece em trabalhos mais recentes
e organizações envolvidas no processo de inovação, e não menos relevantes. Nesse sentido, será exposta,
desde a concepção da ideia até sua implementação. o a seguir, uma análise das obras de Christensen e tidd,
que Van de Ven (1986) chamou de transações seriam também sob a luz dos preceitos de Schumpeter.
as relações de negociações e trocas existentes entre
essas partes à medida que a inovação toma seu curso.
Ele concluiu que talvez o mais significante problema A continuidade da fase de ciência normal:
estrutural então vivido pelas organizações seria o a análise de obras mais recentes de gestão
gerenciamento das relações entre as partes e o todo.
o quarto problema detalhado trata da importância do da inovação
contexto extraorganizacional (RUTTAN; HAYAMI, 1984, Atualmente, quando se debate a gestão da inovação e
apud VAN dE VEN, 1986). Nesse ponto é detalhado se discute, por exemplo, a diferença entre estratégias
o papel de uma liderança institucional que proponha (ou estruturas organizacionais) melhor orientadas para
estratégia, estrutura e sistemas internos que reajam bem perseguir inovações incrementais ou radicais, nem
ao ambiente externo e sirvam como facilitadores para a sempre se questiona de onde vieram essas ideias e
inovação. o autor usa o termo “supportive leadership” quando, mais especificamente, elas foram primeiramente
e garante que havia um reconhecimento crescente no introduzidas na literatura. Conforme percorremos a obra
papel da liderança nesse sentido. Essa quarta questão de Schumpeter (1997), percebemos que alguns desses
tratada por Van de Ven o aproxima do ponto de vista mais preceitos, mesmo que em uma roupagem ainda mais
estruturalista da sua obra, embora a ênfase tenha sido básica e genérica, já haviam sido tratados pela academia.
claramente no funcionalismo da gestão da inovação. um dos autores que conseguiu tratar essa temática de
A característica basicamente funcionalista da obra de Van forma bastante intuitiva foi Christensen (2001).
de Ven também o coloca próximo de algumas premissas Clayton Christensen ficou bastante conhecido devido à
da teoria do desenvolvimento econômico de Schumpeter, grande aceitação de sua obra The Innovator’s Dilemma,
na ênfase de implementar e comercializar novas ideias inicialmente publicada em 1997. o objetivo principal
na forma de produtos e serviços que os consumidores dessa obra era investigar o motivo de empresas líderes
não estão acostumados a utilizar. Embora Schumpeter em seus setores fracassarem diante do aparecimento de
(1997) não tenha respondido como deveria ser gerido o novas tecnologias introduzidas no mercado. Essas novas
processo de geração e implementação de novas ideias tecnologias estavam intimamente ligadas a uma nova
no mercado, ele aparentemente compartilhava do ponto percepção por parte dos consumidores em relação à
de vista de que a gestão da inovação deveria ir além maneira como enxergavam produtos e serviços lançados
da escolha de sistemas e estruturas organizacionais no mercado.
que a facilitassem. Esse trabalho de Van de Ven e sua
Embora aparentemente seus estudos tenham focado
equipe aqui analisado foi norteador de estudos empíricos
na inovação tecnológica (seu livro é principalmente
conduzidos em empresas norte-americanas, como a 3m.
estruturado pelo estudo da indústria de hard disks), a
o grupo analisou algumas inovações desde a criação da
amplitude do seu conceito de tecnologia – relacionada
ideia até a comercialização do produto ou serviço. Embora
aos processos organizacionais e produtivos que
os resultados dessa pesquisa tenham sido bastante
transformam recursos em produtos e serviços de alto
reveladores, nos limitaremos ao modelo que guiou esse
valor agregado – permite incluí-lo também na área da
estudo, aqui já explicitado cujo debate mais aprofundado
gestão da inovação organizacional (CHRiStENSEN,
pode ser encontrado em Van de Ven et al. (1999).
2001). o pilar da obra de Christensen se encontra na
Como vemos, o conceito de Schumpeter (1997) de clara diferenciação entre tecnologias incrementais e
inovação como um fator gerenciável nas empresas, disruptivas. Segundo ele, as tecnologias incrementais
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12. dão suporte à melhoria do desempenho de produtos também aborda o fator de alteração nas “regras do jogo”de
(com dimensões de desempenho que os clientes teriam um mercado, através de mudanças descontínuas que
historicamente valorizado), enquanto as disruptivas redefiniriam condições de espaço e limites, promovendo
(podendo ser descontínuas ou caracteristicamente a necessidade de os atuais ‘jogadores’ se adequarem
radicais) trazem uma proposição de valor distinta da às novas condições impostas. A relação de sua obra
disponível até então (CHRiStENSEN, 2001). com a schumpeteriana vem a ser destacada ao apontar
características desse processo, o que poderíamos chamar
o autor percorre as características necessárias às
de uma visão contemporânea de conceitos previamente
empresas para decidirem focar em um ou outro tipo de
introduzidos e que ainda hoje são atuais:
tecnologia, e ainda expõe as dificuldades em encontrar
organizações ambidestras, que possam lidar com Às vezes algo acontece que descola esse
duas situações tão distintas numa mesma estrutura. padrão e altera as regras do jogo. Por definição,
Christensen (2001) defende que seja criada uma nova não são eventos corriqueiros, mas possuem
organização, distinta da primeira, com estratégia, a capacidade de redefinir as condições de
estrutura e objetivos diferenciados, caso a organização espaço e limites abrem novas oportunidades,
decida sair de uma visão incremental para outra mas também desafiam os jogadores existentes
mais radical, e vice-versa. isso porque a adaptação a remodelarem o que estão fazendo à luz de
aos processos e rotinas organizacionais – que antes novas condições. É o processo de destruição
visavam à eficiência operacional e administrativa criativa (tidd, 2008).
para uma nova realidade de inovações disruptivas,
ou vice-versa – seria bastante lenta e trabalhosa, o
que causaria perda da liderança de mercado. Essa As semelhanças de tidd (2008) com preceitos da
extrema dificuldade leva a um patamar que indica a teoria schumpeteriana do desenvolvimento econômico
maior facilidade de novos entrantes do mercado em não param por aí. Além de classificar a inovação em
entenderem melhor as novas regras estipuladas pelas tipos, como a inovação de produto e a de processo, já
tecnologias disruptivas, e se aproveitarem dessa antecipadas por Schumpeter quando abordou o tema
nova versão do ambiente competitivo em que elas se na roupagem das “novas combinações”, ele ainda cita
encontram (CHRiStENSEN, 2001). mais dois tipos de inovação, que seriam de posição e
paradigma (tidd, 2008). Esse último caso visa trabalhar
mesmo que o autor tenha tratado de forma bem
as mudanças descontínuas num cenário competitivo,
mais detalhada tópicos anteriormente levantados por
que, como colocaria Schumpeter (1997), tende ao
Schumpeter (1997), assim como novas proposições
afastamento de um possível ponto de equilíbrio.
inexistentes na obra schumpeteriana, vemos algumas
pistas claras de que Christensen (2001) tenha contribuído A inovação de paradigma para tidd tende também
bastante para o paradigma aqui defendido. Chega a a demonstrar sua tendência à teoria contingencial,
ser curioso o fato de que temas levantados no início que já havia ficado clara logo em um dos seus
do século passado sejam ainda tão atuais no âmbito primeiros trabalhos relevantes. Tidd (1993, 2001) trouxe
da gestão da inovação nas organizações. isso pode anteriormente um modelo de inovação de orientação
também se traduzir no fato de que as contribuições de contingencial, que, embora também considerasse alguns
Christensen provavelmente configuraram uma extensão aspectos funcionalistas de gestão, tendia a considerar
de conhecimento e incorporação de novos fatos ao a incerteza e a complexidade como as duas grandes
paradigma, embora não tenham atingido a terceira contingências que afetariam o processo inovativo das
fase dos preceitos de Kuhn de rearticulação empírica organizações. Esses preceitos vieram a ser confirmados
e teórica, no estágio que antecederia a revolução pelo autor através da consideração de que não existiria
paradigmática, que negaria as premissas previamente uma forma ideal de se gerir a inovação, uma vez
introduzidas por Schumpeter. que as organizações se situam diante de diferentes
oportunidades tecnológicas ou mercadológicas, que
Na mesma linha de trabalho, principalmente em relação
restringiriam as opções gerenciais (tidd, 2008).
a questões de inovações incrementais, disruptivas e a
um maior potencial dos novos entrantes no mercado Como aqui fica claro, é possível citar vários links entre
gerarem maior disrupção, surgia o trabalho de Joseph as obras de Christensen e tidd com o trabalho de
tidd, que defendia premissas no mínimo semelhantes Schumpeter, que os precedeu em quase um século.
às propostas por Christensen. Tidd (2008) afirmou que Aqui não procuramos defender a tese de que se trata
a maneira como lidamos com a mudança incremental de reaproveitamento teórico ou até mesmo replicação
diária deve ser diferente daquela utilizada quando lidamos de um modelo, mas sim a de que Joseph Schumpeter
com mudanças radicais em produtos ou processos. Ele teria realmente influenciado obras posteriores a ele
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 12
13. através do que consideramos o estabelecimento de um pela teoria do desenvolvimento econômico de
paradigma. Ao tratar as diferentes obras aqui detalhadas, Schumpeter.
fica a real sensação do entendimento dos trabalhos pós-
schumpeterianos como pertencentes à ciência normal
(KuHN, 1996) da gestão da inovação.
Referências
BuRNS, t.; StALKER, G. the Management of innovation.
Londres: tavitock Publications, 1968.
Considerações finais
CLEGG, S. Handbook de estudos organizacionais:
Com o estudo das diferentes propostas e a evolução
modelos de análise e novas questões em estudos
dos modelos de gestão da inovação que surgiram na
organizacionais. São Paulo: Atlas, 1998. v. 1.
literatura ao longo do tempo, fica claro que o foco de
análise também mudou. de um ponto de vista mais CHRiStENSEN, C. O dilema da inovação. São Paulo:
estruturalista e estratégico, que dominou dos anos makron Books, 2001.
de 1950 aos de 1970 e 1980, até o surgimento de FAYOL, H. General and industrial management, 1949.
modelos que incluíram aspectos mais funcionalistas
da inovação organizacional, vemos que a abordagem GRAVES, A. Comparative trends in automotive research
dessa temática se tornou consideravelmente mais and development. Sussex University, 1987.
abrangente. mas independentemente do foco KuHN, t. The scructure of scientific revolutions. the
de análise de cada uma das obras de gestão da University of Chicago Press, 1996.
inovação (e aqui buscamos explorar algumas das
mais relevantes), a revisão bibliográfica aqui exposta LAKAtoS, i. La metodologia de los programas de
mostrou uma série de convergências entre as teorias e investigación científica. madrid: Alianza, 1989.
modelos de várias obras dessa temática com preceitos LAWRENCE, Paul R.; LORSCH, Jay William. Organization
estabelecidos por Schumpeter em seus dois trabalhos and environment: managing differentiation and integration.
aqui detalhados. mesmo que esse fato por si só não Cambridge: Harvard University Press, 1967.
represente uma replicação ou até mesmo cópia de
MAYO, E. The Human problems of an industrial
premissas teóricas anteriormente concebidas, ele
civilization, 1949.
mostra que vários modelos de gestão da inovação pós-
schumpeterianos chegaram a levantar novos fatos e miLES, R.; SNoW, C. Organizational strategy, structure,
até mesmo a rearticular essas premissas, configurando and process. New York: McGraw-Hill, 1978.
a fase de ciência normal (KuHN, 1996). miNtZBERG, H. The structuring of organizations: a
Valendo-nos da plataforma conceitual de Kuhn (1996), synthesis of the research. Englewood Cliffs: Prentice-
procuramos identificar a criação de um possível Hall, 1979.
paradigma estabelecido por Schumpeter: a inovação PoPPER, K. A lógica da pesquisa científica. São Paulo:
como um fator central às organizações e, mais do Cultrix, 1972.
que isso, um fator gerenciável. Embora cada obra
aqui analisada possua particularidades, objetivos SCHumPEtER, J. A teoria do desenvolvimento
e metodologia distintos, chega-se à conclusão de econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1997.
que esse paradigma realmente existe, o que nos SCHumPEtER, J. Capitalism, socialism & democracy.
permite aceitar a gestão da inovação como ciência, Londres: Routledge, 2003.
que recebeu vários incrementos e contribuições ao
longo do tempo. Embora esses incrementos tenham RotHWELL, R. development towards the fifth-
ajudado a desenvolver aspectos das fases de extensão generation model of innovation. Technology Analysis &
do conhecimento previamente estabelecido e o Strategic Management, 1992.
levantamento de novos fatos, não chegaram à fase da RUTTAN, V.; HAYAMI. Toward a theory of induced
ciência normal que levaria à introdução de um novo institutional innovation. Journal of Development Studies,
paradigma, à rearticulação teórica em cima desses 1984.
conhecimentos anteriormente introduzidos. tal análise
SCHoN, d. Beyond the stable state. New York: Norton,
traz à tona condições suficientes para afirmarmos que,
1971.
desde o marco da inovação como fator internalizável
às empresas – e, portanto, gerenciável –, a gestão da SKiNNER, B. Science and human behavior. New York:
inovação como ciência ainda vive o desenvolvimento macmillan, 1953.
pautado sobre o paradigma estabelecido em 1911
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 13
14. TAYLOR, F. The principles of scientific management, A pesquisa teve característica descritiva, buscando
1911. identificar quais situações, eventos, atitudes ou opiniões
se manifestam em uma determinada população. quanto
TIDD, J. Innovation management in context: environment,
à temporalidade, trata-se de um estudo de corte
organization and performance. International Journal of
transversal, ou seja, através da coleta de dados em
Management Review, v. 3, n. 3, p. 169-183, 2001.
um só momento9. A unidade de análise foi a empresa,
tidd, J. technological innovation: organizational nesse caso, do ponto de vista de um respondente que
linkages and strategic degrees of freedom. Technology possua um cargo de alto escalão na organização, como
Analysis and Strategic Management, v. 5, n. 3, p. 273- diretores e presidentes. A escolha do respondente se
285, 1993. deu por meio induzido, pela necessidade de a survey ser
aplicada em alguém que compreenda as principais ações
tidd, J.; BESSANt, J. Gestão da inovação. São Paulo: relacionadas à inovação planejadas e desenvolvidas
Longman, 2008. pela empresa em análise. A maioria das 60 empresas
VAN dE VEN, A. Central problems in management of participantes foi visitada considerando-se práticas do
innovation. Management Science, 1986. método de observação direta.
VAN dE VEN, A.; HudSoN, R. managing attention A pesquisa de campo também contou com entrevistas
to strategic choice. In: PENNiNGS, J. (Ed.). Strategic presenciais semiestruturadas, com instituições distintas
decision making in complex organizations. San Fancisco: das que compuseram o grupo de análise, resultando
Jossey-Bass, 1984. na confecção de casos que se encontram no anexo
deste documento. A coleta de dados, que ocorreu entre
VAN DE VEN, A.; POLLEY, D.; GARUD, R.; os meses de agosto e dezembro de 2009, também
VENKAtARAmAN, S. The innovation journey. Oxford: contou com dados secundários, como documentos
Oxford University Press, 1999. e material publicitário das empresas estudadas e
pesquisas realizadas anteriormente no tema inovação
WoodWARd, J. Management and technology. Londres:
organizacional por instituições como Anpei, iBGE e
HmSo, 1958.
ABdi10.
WoodWARd, J. Industrial organization: theory and
practice. Londres: Oxford University Press, 1965.
UTTERBACK, W.; ABERNATHY, J. Patterns of industrial Instrumento de pesquisa
innovation. Technology Review, p. 40-47, 1978.
o instrumento de pesquisa escolhido para a realização
da survey foi o questionário, com uso da estratégia
de entrevista pessoal. Esse questionário apresentou
mEtodoLoGiA uma abordagem quantitativa e qualitativa, através de
questões abertas e fechadas. A escolha do questionário
A fase de pesquisa de campo do projeto “de minas se deve ao grande número de empresas entrevistadas.
para o mundo e do mundo para minas” foi centrada, Como foram aplicados através de entrevista pessoal,
principalmente, na realização de uma survey. Por também foi possível a utilização de métodos de
definição, a survey se relaciona à obtenção de dados análise de discurso, que colaboraram para o melhor
e informações de um grupo de pessoas, representante entendimento do tema nas organizações estudadas. As
de uma população-alvo, através de um instrumento de questões do questionário foram divididas em oito blocos.
pesquisa7. Esse método é considerado apropriado devido A escolha do tipo de questão se deve à característica
ao objetivo de se entender “como” se dá o processo de de cada um dos temas tratados, conforme debatido
inovação nas organizações pesquisadas. Através dela, no referencial teórico anteriormente apresentado. os
tenta-se chegar à descrição, à explicação e à exploração blocos foram:
do fenômeno em estudo, no caso a inovação8. Além
disso, o objeto de estudo ocorre no presente, uma vez 1. Caracterização da empresa - questões abertas e
que se deseja obter uma fotografia do cenário atual fechadas (dicotômicas e de múltipla escolha)
dessas empresas em relação à gestão da inovação.
2. Estratégia de inovação - questões fechadas com
uso de escala de classificação (Likert)
7
FREITAS, Henrique. O método de pesquisa survey. Revista
de Administração da USP, São Paulo, 2000. 9
FREITAS, Henrique. O método de pesquisa survey. Revista
8
BAPtiStA, makilim; CAmPoS, dinael. Metodologias de de Administração da USP, São Paulo, 2000.
Pesquisa em Ciências. Rio de Janeiro: LtC, 2009. 10
ABdi. Sondagem de inovação, 2010.
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 14
15. 3. Cultura organizacional - questões fechadas com Inovação como opção estratégica
uso de escala de classificação (Likert)
A gestão da inovação requer uma atuação de forma
4. Gestão da inovação - questões abertas e integrada, considerando-se que a empresa é um
fechadas dicotômicas sistema de aprendizado dinâmico, estruturada com
5. Processos - questões fechadas em escala de base no conhecimento e comprometida, dentre outros,
múltipla escolha com a inovação sustentável. No entanto, há um dilema
empresarial: a importância primordial de definir quais são
6. indicadores - questões abertas e fechadas
as aspirações estratégicas organizacionais, buscando
dicotômicas
não apenas incluir a inovação como um dos aspectos
7. Competências, conhecimentos e tecnologias fundamentais, mas integrá-la e adaptá-la às demais
-questões abertas orientações estratégicas.
8. Barreiras para inovar - questões fechadas com A empresa deve, portanto, buscar empreender
uso de escala de classificação (Likert) os objetivos previstos com base no planejamento
estratégico da inovação, que consiste na definição
clara de estratégias, planos, objetivos, investimentos
Embora capte também informações em temas como
a serem realizados e indicadores de desempenho.
competências, conhecimentos, tecnologias e barreiras
No que tange a estratégias tecnológicas, Freeman
para inovar, o questionário foi basicamente orientado
(2000) classifica-as como imitativas, dependentes,
pelo modelo FdC de inovação. o modelo de inovação
tradicionais, ofensivas, defensivas e oportunistas;
como ferramenta estratégica, desenvolvido pelos
identificações que, embora generalizem uma gama
pesquisadores do Núcleo de inovação da FdC, surgiu
infinita de possibilidades, podem ser consideravelmente
da observação de melhores práticas e do relacionamento
úteis para os gestores. Porter (1980) destaca que a
com empresas inovadoras que operam no Brasil.
estratégia consiste, essencialmente, na relação entre a
inspirado em alguns importantes autores trabalhados no
empresa e o ambiente externo, definindo cinco forças,
referencial teórico já explanado, o modelo apresenta um
ancoradas no modelo estrutura-conduta-desempenho.
processo integrado de gestão da inovação, baseado nas
dessas forças, a inovação impacta apenas em uma, a
decisões estratégicas da organização. incorpora, ainda,
uma visão sistêmica, promovendo a integração das “rivalidade competitiva”, assegurando a competência
diversas áreas da empresa e dos níveis estratégico, tático distintiva que a capacitará a oferecer melhores produtos
e operacional. Nessa proposta, os elementos essenciais que a concorrência12.
para o processo de inovação são: inovação como opção Segundo Prahalad e Hamel (1990), o desafio gerencial
estratégica; cultura de inovação; estrutura e sistema de mais crítico a ser considerado pelos elaboradores
gestão (incluindo indicadores) e processos11. das diretrizes estratégicas é criar produtos que os
consumidores precisam, mas ainda não imaginaram,
a partir do estímulo às competências que possibilitem
concebê-los, antecipá-los. A concepção supracitada
está, de certo modo, em concordância com o
pensamento de Platão (1997): “A necessidade é a mãe
da invenção”. Veblen (1965), no entanto, inverte a frase,
demonstrando que o processo de criação de produtos
forja a preferência de consumo, através de emulação
e propagandas.
Numa visão ampliada, a inovação é fruto de um
trabalho multifuncional e multidisciplinar que envolve,
em seu processo, portanto, as áreas de marketing,
produção, finanças, pesquisa e desenvolvimento,
além dos clientes, parceiros e fornecedores. torna-se
nítida, dessa forma, a importância de a formulação da
Figura 1 - modelo FdC de inovação estratégia de inovação estar totalmente alinhada com a
visão estratégica da empresa, com nove percepções de
11
ARRudA, Carlos; RoSSi, Anderson; SAVAGEt, Paulo.
Investigando a gestão da inovação, suas particularidades e 12
tidd, Joseph; BESSANt, Paul. Gestão da inovação.
práticas organizacionais contemporâneas, 2009. Longman, 2008.
Relatório de Pesquisa - Nova Lima - 2011 - RP 1105 15
16. âmbito interno e externo, sejam elas setoriais, regionais propensão a criação, mobilização e interação entre
ou internacionais13. conhecimentos tácitos e explícitos, assim como a sua
transmissão pela organização18. Essa propensão não
destaca-se o papel fundamental do empreendedor,
corresponde apenas a uma característica intrínseca à
que deve estar apto a criar um ambiente favorável à
personalidade, pode ser estimulada através de um clima
inovação e assumir os seus riscos, atuando não apenas
na busca de oportunidades inovadoras, mas também na favorável à inovação, no qual as pessoas se sintam
gestão dos recursos internos, com o intuito de reduzir confortáveis para criar – embora moldar a cultura, uma
obstáculos, definir diretrizes, orientar os funcionários complexa rede de comportamentos e artefatos, seja
para o novo empreendimento, criar uma cultura de uma tarefa árdua e gradual 19. destacam-se, dessa
inovação, construir e alinhar a estratégia de inovação forma, a importância e os impactos das especificidades
aos processos corporativos, além de difundir os novos da cultura organizacional na conformação do processo
conhecimentos14. de inovação, assim como a dificuldade de moldar um
elemento tão subjetivo e dinâmico para atender aos
objetivos estratégicos.
Cultura de inovação A cultura organizacional pode inibir ou estimular a
tendência à inovação. Entretanto, identificar isoladamente
No entanto, para estimular a inovação em uma uma cultura e atribuir a ela a receita do sucesso
organização não basta, apenas, definir sua importância ou fracasso constitui um grande erro, pois exprimir
na posição estratégica e alocar capital e esforços os impactos da cultura em fórmulas empresariais
à produção de conhecimento: é imprescindível que desconsideraria as peculiaridades inerentes a cada
a cultura e o clima organizacionais estabeleçam as organização20. O que podemos afirmar é que a cultura
estruturas informais favoráveis à busca pela inovação pró-inovação, independentemente das peculiaridades,
e à manifestação criativa15. deve ser orientada em direção à estratégia da empresa:
A cultura organizacional corresponde ao padrão de assumir os riscos intrínsecos à promoção da inovação,
comportamento adotado pela corporação e inclui não além de eliminar ou reduzir barreiras às manifestações
apenas normas, valores, crenças e premissas dos criativas – num ambiente onde os funcionários se sintam
colaboradores, mas ainda todas as formas institucionais instigados e livres para explorar e gerar conhecimento,
que orientam e governam as atitudes rotineiras e a sem medo de punições.
tomada de decisões definindo, portanto, as normas e
os valores dominantes na organização16. As práticas da
empresa são, dessa forma, influenciadas pela cultura
organizacional. Concomitantemente, ao desenvolver Estrutura e sistemas de gestão
determinado padrão de comportamento, os membros
diante dos diversos desafios organizacionais à
solidificam as bases culturais da organização. Trata- manifestação criativa e ao surgimento de inovações,
se, portanto, de um sistema no qual a rotina da torna-se imprescindível, adequar sua estrutura às
empresa é inspirada na cultura, ao mesmo tempo em exigências estratégicas. Para o sucesso da gestão da
que estabelece as suas características e diretrizes. É inovação, é imperativa a definição dos seus responsáveis,
importante destacar, sobretudo, que uma cultura só é com o estabelecimento da equipe que implementará
enraizada caso haja consenso e intensidade no que a gestão integrada da inovação, atuando com alta
tange às práticas organizacionais17. representatividade diante dos demais colaboradores da
Cada empresa possui uma cultura própria, com empresa21. É importante destacar a importância da mais
características peculiares, diferenciada de qualquer outra ampla compreensão da natureza do processo inovativo,
entidade, na medida em que reflete as especificidades assim como os interesses e as particularidades de cada
de cada membro, além dos valores imbuídos pelo time organização. Portanto, o trabalho de profissionais com
gerencial. Para inovar, os membros devem manifestar expertise nesse ramo propicia a melhor orientação
de todos os processos e etapas vinculados à gestão
13
tiGRE, Paulo. Gestão da inovação: a economia da tecnologia
no Brasil. Rio de Janeiro, 2006. 18
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17
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