2. INTRODUÇÃO
Há um ditado português que é verdadeiro: “O
dinheiro é um bom servo, mas um péssimo
senhor”.
De quase todos os males que sofremos hoje
em nosso mundo, o dinheiro neles está
envolvido.
São males e problemas que afetam desde as
relações exteriores até às relações familiares.
3. Guerras são feitas por causa do dinheiro,
casais se separam porque não solucionam seus
problemas financeiros, empresas demitem
funcionários, sócios se desligam por questões
de ordem econômica, homens sérios se
deixam levar pela avareza e se esquecem de
seu antigo caráter, não tendo pena de maculá-
lo em nome da facilidade financeira que se
apresenta diante de si em determinada
circunstância, como a política e a liderança
religiosa, por exemplo, daí a política e a
religião serem mal vistas hoje, devido à
reinante avareza em seu meio.
4. A avareza ou apego ao dinheiro é uma doença
que escraviza o homem tanto ao interesse pelo
que não possui, como ao medo de perder o que
já possui, ainda que seja pouco.
E nesse anseio desenfreado, a pessoa perverte
a legítima busca pelo preenchimento das
necessidades, transformando-a num frenesi
de que tudo pode ser por ela capturado e
possuído.
A igreja também não está livre do
pecado da avareza, da ganância e
da ambição financeira.
5. Até pelo contrário, parece que nos
últimos anos a igreja se tornou um
depósito de pessoas avarentas, brigando
pelos mesmos ideais, todos eles carnais,
disputados de forma individualista, onde
crentes da mesma igreja se tornam rivais,
concorrendo a bênção prometida da mesma
forma que disputam um produto em promoção
no comércio.
Pregadores usam o exemplo de Jacó que lutou
com o “anjo” (segundo eles foi um “anjo”) e não o
largou até que fosse abençoado, e isso leva
pessoas a lutarem contra seus irmãos até
atingirem seus mesquinhos objetivos.
6. Obviamente, assim como “um abismo chama
outro abismo”, assim também muitos crentes
dentro das igrejas já não sabem mais se alegrar
com os que são abençoados, ao contrário,
criticam os que receberam alguma bênção
material e, por causa da avareza, enchem-se de
inveja, de cobiça e o que seria para render
glórias a Deus, acaba se tornando motivo de
contenda, inimizade e frustração.
Sem falar no questionamento que se
faz a Deus, exigindo explicações do
porquê muitos prosperam enquanto
ele não.
7. Num mundo capitalista como o que vivemos,
não parece nada de mais alguém querer ficar
rico.
Onde está o verdadeiro problema da busca por
riquezas?
É até mesmo louvável quando alguém
consegue um degrau a mais em sua vida social,
cultural, econômica, profissional, etc., que até
são chamadas para testemunhar a bênção que
alcançaram de Deus...
Todos se alegram (pelo menos
aparentemente), glorificam a Deus,
então, qual o problema nisso?
8. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Até que ponto devemos buscar cresci-
mento material, de modo que isso não venha
caracterizar pecado?
Como discernir se é para investir ou não?
Diante de tantas pregações sobre bênçãos
financeiras, o que podemos aceitar como
verdadeiro e o que temos que rejeitar como
falso?
Deus quer que sejamos ricos ou pobres?
9. Em primeiro lugar não é pecado ser rico, como
também não é pecado ser pobre.
A riqueza é um dom de Deus e, mesmo que o
homem labute para isso, se ele o alcança, isso
nada mais é do que a graça de Deus (Ec 5.19).
Lembrando que essa graça concedida não
torna Deus obrigado a nada em relação ao
indivíduo que a recebeu: isso nada tem a ver
com salvação.
Há pessoas que já nasceram ricas,
outras a adquirem com o tempo,
trabalho e investimento e outras
ainda por jogos de azar.
10. Usando para nosso estudo apenas o caso dos
que ficam ricos pelo trabalho e
empreendedorismo, deixemos de lado os que
já nasceram no “berço de ouro” e os que
ficaram ricos por jogos de azar.
Uma pessoa jovem, por exemplo, que tenha
pensamentos empreendedores, pode alcançar
sua riqueza (seja qual for o grau) de forma
lícita, quando administra suas economias
e depois as investe em um ramo
profissional raro e necessário na sua
localidade.
11. A raridade automaticamente chamará a
necessidade, pois se aquele ramo é necessário
na cidade e não é encontrado, obviamente será
procurado em outra cidade, portanto o
empreendedor jovem, observando essa
necessidade, investirá neste ramo incomum e,
como pioneiro naquele ramo em sua cidade,
com certeza ganhará muito dinheiro.
Nada há de pecado nisso. Houve investimento,
inteligência e oportunidade.
Supondo que esse jovem seja cristão,
seu pastor e sua família devem
incentivá-lo.
12. A avareza estaria presente caso esse jovem, por
exemplo, começasse a se apegar ao seu
negócio de tal forma que deixasse os
princípios cristãos de lado por causa de suas
rendas, ou abandonasse sua fé e compromisso
com o reino de Deus em busca de tais
empreendimentos.
Claro que existe a maneira correta de se lidar
com nossos bens, de sorte que não sejamos
encontrados escravos deles.
Por isso é necessário discernir a
forma de tratar os bens materiais.
13. DEFINIÇÕES
A partir de agora faremos algumas definições
do termo, tanto dentro da linguagem bíblica,
como do nosso conceito atual.
O dicionário Aurélio define a avareza:
“Excessivo e sórdido apego ao dinheiro; falta
de generosidade; mesquinhez, usura,
ganância”.
A palavra grega pleoneksia significa “ganância,
insaciabilidade, avareza, cobiça”.
14. Como verbo, pleonekteo significa “tirar
vantagem, lograr, defraudar, enganar”.
Como sujeito, pleonektēs significa “alguém
que é guloso, pessoa cobiçosa pelo dinheiro,
aquisitiva, sôfrega por dinheiro”.
Etimologicamente, as palavras vinculadas com
pleoneksia se vinculam com pleon (“mais”) e
echo (“ter”).
Os antigos escritores gregos não associavam
isso aqui apenas ao desejo por mais
possessões materiais.
15. Na sua ocorrência mais antiga, pleoneksia
significa cobiça imortal pelo poder
(Heródoto 7, 49).
Tucídides junta essa palavra com philotimia
(ambição), a força decisiva na atuação
humana e no progresso da história.
Para Platão pleoneksia significa tanto
ultrapassar alguém numa ação justa, como
também defraudar.
É usado este termo tanto para desejo
e cobiça, como também para desejo
sexual em Aristóteles – Paulo o usa assim em
1Ts 4.6.
16. Não há lugar para a pleoneksia numa
sociedade justa.
Os cínicos e estoicos repudiavam todo desejo,
pois posses de qualquer tipo significavam
apelo àquilo que é vazio.
No grego do AT (LXX), o grupo de palavras
ocorre apenas ocasionalmente.
Aparece principalmente nas denúncias e
advertências dos profetas com respeito aos
ganhos desonestos e o enriquecimento
dos poderosos, através da violência (Jr
22.17; Ez 22.27; Hc 2.9).
17. Em 2Mb 4.50, pleoneksia refere-se a
cobiçar ganhos através do suborno.
A ênfase, portanto, recai sobre a qualidade
ímpia e totalmente iníqua da cobiça.
Por essa razão, a pessoa que orava no Sl 119.36
pedia que fosse livre da pleoneksia.
No NT, a maior parte das vezes em que
acontece esta palavra é nas cartas paulinas,
exceto em Mc 7.22; Lc 12.15; 2Pe 2.3,14.
A ação a que se referem é sempre no modo
negativo, significando o que já falamos – veja
referências paulinas (2Co 7.2; 12.17,18; 1Ts 4.6).
18. Sendo assim, o verbo pleonekteō significa
“tirar vantagem de, lesar, defraudar, enganar”.
Paulo coloca pleonaksia em seus catálogos de
vícios e seu sentido é a marca de uma vida na
qual falta o conhecimento de Deus, fé e
obediência (Rm 1.29; 1Co 5.10,11; 6.10,11; Ef 5.3).
Quando se corta o vínculo entre a
criatura e o Criador, a sociedade
humana cai em desordem.
O homem, que já não tem seu alvo e realização
em Deus, procura realizar-se na sua própria
pessoa, nos seus bens e na sua ganância.
19. Em última análise, faz de si mesmo um
ídolo que luta para sujeitar tudo a si
mesmo.
É por esta razão que Cl 3.5 identifica a
avareza com a idolatria.
Em Mt 6.24 e Lc 16.13, “mamom”, a própria
riqueza é um ídolo que domina o homem que
a possui.
Paulo diz que não pode haver associação dos
cristãos com esse tipo de gente (1Co 5.11).
Tais pessoas excluem-se da igreja e finalmente
do Reino de Deus (1Co 6.10; Ef 5.5).
20. De acordo com Pedro, os falsos mestres são
caracterizados pela sua avareza por ganhos
materiais (2Pe 2.3,14).
Os opositores de Paulo eram assim também e
mercadejavam a Palavra de Deus (2Co 2.17).
O termo que Paulo usa em 1Tm 6.10 é
philargyria, (amor ao dinheiro) e é descrito
como sendo “a raiz de todos os males”.
Demócrito e outros descrevem o amor ao
dinheiro como a “metrópole” de todo o mal.
A experiência prova que Paulo tem
razão ao escrever desta forma.
21. Pois o sonho das riquezas e da felicidade
material pode tomar posse de um homem ou
de uma nação de forma demoníaca.
No contexto bíblico, este provérbio obtém
significado através de sua aplicação ao
relacionamento entre o homem e Deus.
O amontoar egoísta de posses materiais tem
seu protótipo no ato do homem em agarrar o
fruto proibido no jardim do Éden.
É uma indicação da ingratidão pela
vida da parte do homem, por causa
de muitas limitações, circunstâncias
e interesses pessoais.
22. O amor ao dinheiro levanta um muro
entre o homem e Deus e entre o homem
e seus vizinhos.
O homem que por ele é dominado, é
forçado ao isolamento total.
Sendo assim, o lutar pelas riquezas é o cerne
de alienação total de Deus.
Tendo em vista estas considerações e
definições a respeito da avareza, que também
pode ser vista como ganância, mesquinhez,
sovinice e até como cobiça e ambição,
passemos agora aos conselhos bíblicos sobre
este pecado.
23. CONSELHOS BÍBLICOS SOBRE A
RELAÇÃO COM O DINHEIRO
No AT, um dos livros mais práticos sobre o
ensino acerca da avareza (bem como outros
assuntos diários) é o livro de Provérbios e
outros da sabedoria hebraica. Vejamos o que
ela nos ensina:
Ao contrário do que se pensa, quem enriquece
não é o que retém e sim aquele que dá (Pv
11.24; 28.27).
É ameaçado aquele que tapa seus ouvidos ao
clamor do pobre (Pv 21.13).
24. Quem ama o dinheiro não pode se
fartar dele (Ec 5.10).
O sentido deste versículo pode ser que o
amante das riquezas lutará tanto por elas, mas
nunca a alcançará, ou pode ser que para o
amante das riquezas nada lhe é bastante de
tudo que possui, pois sua ambição sempre lhe
faz querer mais.
O profeta Jeremias também reclamou da
avareza dos judeus e os comparou com uma
perdiz insensata (Jr 6.13; 17.11), bem como os
profetas Ezequiel, Miqueias e Habacuque (Ez
33.31; Mq 2.2; Hc 2.9).
25. O avarento traz perturbação para
sua família (Pv 15.27).
Enquanto isso, o generoso é
abençoado (Pv 22.9).
Para a sabedoria hebraica, não compensa
estimar o rico e oprimir o pobre; ambas as
coisas trarão desgraça para quem as pratica
(Pv 22.16).
Recomenda-se estar sempre atento e
empenhado em seus negócios (Pv 27.23-27).
Por outro lado o não confiar em suas riquezas
é sinal de justiça (Pv 11.28).
26. A pressa para adquirir riquezas é um engodo e
traz resultado contrário ao esperado (Pv 13.11;
23.4,5; 28.20,22).
As riquezas não ajudarão ninguém
no dia do Juízo (Pv 11.4; Ez 7.19).
Não é abençoada a herança que se
conquista com avareza (Pv 20.21).
O avarento usa da língua enganosa para obter
seus lucros, mas isso lhe é cilada mortal (Pv
21.6).
Em Pv 14.20 é mostrado o porquê de muitas
vezes o rico se gabar de seus lucros.
27. Jó podia dizer com segurança que não confiava
em suas riquezas (Jó 31.24,25).
Assim também o salmista diz para não
colocarmos nosso coração nas riquezas, ainda
que elas aumentem (Sl 62.10).
O conselho do NT sobre dinheiro prossegue a
mesma ideia do AT.
Jesus disse que não devemos acumular
tesouros na terra (Mt 6.19-24).
Seus ensinos eram voltados para uma vida
desapegada do amor financeiro (Mt
19.21).
28. Para Jesus, o uso do dinheiro deve envolver
responsabilidade, principalmente para com o
reino de Deus (Lc 16.9-12).
Cuidar das necessidades dos pequeninos
irmãos de Jesus é uma prioridade para
o salvo (Mt 25.37-40).
O modo como lidamos com o dinheiro e
nossos bens será o termômetro de como está
nosso coração em relação ao tesouro (Mt 6.21).
Em Mt 6.24 Jesus deixa claro que o dinheiro
pode ser um concorrente direto de Deus, que
disputa o nosso serviço ao seu senhorio.
29. Jesus Cristo advertia seriamente sobre o trato
para com o dinheiro, mas isso não quer dizer
que Jesus não precisasse dele no
Seu ministério terreno.
Observe que algumas ricas
mulheres ofertavam a Jesus, talvez movidas por
um sentimento de gratidão pela libertação, ou
por ouvir dEle as palavras do Evangelho (Lc 8.1-
3).
É tão nítida a reação de Jesus com o dinheiro,
que Seu tesoureiro era Judas e, mesmo que
todos soubessem que ele roubava as ofertas de
Jesus, o Senhor nunca o demitiu do grupo (Jo
12.6)
30. Os apóstolos aprenderam o mesmo do Senhor.
Quando o mago Simão “creu e foi batizado” e
viu como o Espírito Santo vinha sobre os
discípulos de Samaria através da imposição
das mãos de Pedro e João, tentou comprar esse
dom apostólico, atitude reprovada por Pedro
(At 8.18-23).
Não tenha dúvida de que se isso acontecesse
hoje, prontamente os líderes chamariam o
mago em seu gabinete para acertar
o valor deste negócio!
31. Paulo, apesar de ordenar a prebenda, não fazia
questão de recebê-la (1Co 9.4-15; Gl 6.6; Fp 4.14-
19; 1Ts 2.7-9; 5.12,13; 2Ts 3.7-9; 1Tm 5.17,18; 2Tm
2.6).
O autor aos Hebreus constrasta a avareza com
o contentamento, ensinando-nos que esta é a
melhor forma de vencer este pecado (Hb 13.5).
Tiago era contra a retenção do salário dos
trabalhadores (Tg 5.4).
Pedro recomenda aos presbíteros que
pastoreiem a igreja de Deus sem
ganância financeira (1Pe 5.2).
32. Para Pedro, a avareza é uma característica dos
falsos mestres e falsos profetas (2Pe 2.1,3).
O apóstolo João não admite que um crente que
diz ter o amor de Deus em sua vida vire as
costas para seu irmão que está necessitado, o
que parece um sinal deste pecado da avareza,
já que esse crente possui recursos deste
mundo, ou seja, dinheiro (1Jo 3.17).
Judas também mostra a avareza como marca
distintiva dos falsos profetas e falsos
apóstolos (Jd 11,16).
33. APLICAÇÃO
Diante de tudo o que estudamos aqui sobre
nossa relação com o dinheiro, devemos
destacar que o dinheiro em si é amoral, ou
seja, nem mau nem bom.
A reação que temos perante ele é que define se
estamos agindo mal ou bem, se estamos
pecando ou não.
Na vida prática, o amor ao dinheiro pode se
manifestar de formas diversas.
34. No lar, por exemplo, podemos incorrer
no pecado da avareza, quando nos
privamos de abrir mão do nosso ganho
para as coisas essenciais da família,
jogando essa responsabilidade para outro
membro da família, enquanto nossos recursos
são gastos de forma individualista, ou até
mesmo são poupados de maneira abominável,
como ter aquele pavor de usar o dinheiro em
algum investimento para dentro de casa, com
medo de que o dinheiro se acabe.
35. Na igreja também podemos incorrer no erro
deste pecado, quando nos negamos a
contribuir para a obra de Deus, através dos
nossos dízimos e ofertas, bem como também
através das contribuições para arrecadação de
alimentos para suprir membros carentes
da igreja.
Jesus fala sobre quem se nega a usar seu
dinheiro no reino de Deus, de forma correta, e
o coloca como servo de Mamom (Lc 16.10-15).
Como vimos, estas características são
distintivas dos falsos profetas, mas podem
estar habitando em nós.
36. O nosso apego às posses materiais podem nos
levar a justificar o injustificável, a idolatrar o
condenável, a substituir a confiança que deve
estar no Deus da Providência pelos recursos
que nossas mãos alcançaram.
Se somos caracterizados desta forma, devemos
nos corrigir a tempo, nos contentando com o
que o Senhor nos deus, obviamente,
aproveitando também as oportunidades que
se abrem diante de nós, todavia, nunca
abandonando o reino de Deus em favor do
material.
37. Nem tampouco devemos desprezar os que
necessitam de ajuda, pois nossos recursos
aplicados para aqueles que carecem é uma
prova de que o amor de Deus está em nosso
coração.
Um dos sintomas de que estamos neste
pecado, ou pelo menos próximos dele é
quando ouvimos falar do assunto e ficamos
incomodados.
Devemos ouvir falar desse assunto com
tranquilidade no coração, para que sejamos
realmente vistos como libertos do dinheiro.
38. Que Deus nos guarde deste mal
que assola muitas pessoas em nossos
dias.
Na igreja, temos sido testemunhas do quanto a
avareza ainda toma conta do coração de
muitos.
Uma destas provas é a infidelidade nas
contribuições para com a igreja onde somos
alimentados, desconsiderando a palavra
bíblica de que devemos compartilhar nossos
bens com aqueles que nos instruem.
Sigamos uma trilha onde o dinheiro seja
bênção para nós e não concorrente de Cristo!