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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

                            Ameaças e Promessas
                              (Barbara Delinsky)
                    Título Original: Threats And Promises

PUBLICADO SOB ACORDO COM HARLEQUIN ENTERPRISES D B.V./S.à.r.l.
Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com
pessoas vivas ou mortas é mera coincidência.
Copyright © 1986 by Barbara Delinsky
Originalmente publicado em 1986 por Harlequin Intrigue
Digitalização: Polyana
Revisão: Vanessa Cristina




Resumo: Após fazer uma cirurgia plástica no rosto, Lauren Stevens estava tão
preocupada com o novo visual e os recentes investimentos com o dinheiro que
 herdou de seu irmão que nem percebeu a ocorrência constante de “pequenos
 incidentes”. Mas os incidentes ganham uma dimensão bem maior quando ela
começa a ser perseguida e ameaçada de morte. Para aumentar seu desespero,
um homem chamado Matt Krueger pasa a estar sempre ao seu lado, afirmando
   ter sido amigo do irmão dela. Atraente demais, fácil demais e interessado
 demais em protegê-la, Matt torna-se o principal suspeito de ser o verdadeiro
   algoz de Lauren. Afinal, poderia alguém como ele simplesmente surgir do
                                     nada?


Prólogo

    A escuridão da noite estendia-se densa no jardim da opulenta propriedade
nas colinas de Hollywood, onde dois vultos obscurecidos, ambos de homens,
conversavam em tom baixo. Um alto, forte e agitado; o outro elegante,
arrogante e calmo.
    -    Você tem certeza? Absoluta certeza? - exigiu saber o elegante,
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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

parecendo menos elegante que o habitual ao observar a escuridão e fixar os
olhos impiedosamente no companheiro.
     - Ela não estava naquele carro - insistiu o mais alto, sem se alterar.
     - Você disse que estava. Eu a enterrei.
     - Enterrou as cinzas que achamos serem dela. Nós nos enganamos.
     Embora as narinas do elegante se dilatassem, ele manteve a voz baixa.
     - E como pode ter certeza de que não era ela?
     - Um dos nossos homens ouviu comentários próximo à sala do médico-
legista encarregado da morte suspeita. Não se encontrou prova alguma do
corpo, carbonizado ou não. Uma bolsa e sapatos queimados, mas nenhum
corpo. Em âmbito não oficial, claro. Oficialmente, no que se refere ao calor,
está morta.
     O arrogante praguejou baixinho. Tirou um maço de cigarros do bolso e
mal teve tempo de levar um à boca quando o subalterno riscou um fósforo
com a unha do polegar e acendeu-o.
     - Nenhum corpo - resmungou ele, endireitando os ombros. - Então ela
conseguiu escapar,
     O irrequieto teve bom senso suficiente para ficar imóvel. Sabia o que ia
acontecer, sabia que iam descartá-lo do trabalho.
     - Quero que seja encontrada - grunhiu o elegante. -Quero que seja
encontrada já. - Mesmo assim, o outro permaneceu calado. - Ela não tinha
família, pelo menos nunca me falou que tivesse. Não tinha contato com mais
ninguém, e seus amigos eram os meus. - Uma longa tragada no cigarro
iluminou momentaneamente a ponta vermelha em brasa. - Deve ter tido
ajuda. - A fumaça saiu enroscada com as palavras e dissipou-se no ar. - Nova
identidade, novo endereço, dinheiro... Maldição! - disse por entre dentes
cerrados, as engrenagens girando na mente. - Ela vendeu as jóias. Não houve
arrombamento nem roubo. A desgraçada pegou as jóias e vendeu!
     - Eu vou encontrá-la.
     - Com toda certeza vai. Meio milhão em diamantes e rubis, para não falar
em mais quatrocentos mil em peles... mulher nenhuma pode me roubar assim!
     - Quer que eu a traga de volta?
     O chefe do mais forte pensou na pergunta, acariciando a pele recém-
raspada acima do lábio. Quando falou, a voz saiu mais uma vez baixa e
sombria.
     - É uma ladra. É traidora. Eu dei a ela um enterro digno de uma rainha.
Não vou sofrer o vexame de vê-la materializar-se da sepultura. - Fez uma
pausa momentânea antes de continuar, à sua maneira pervertida polida,
arrogante e cerebral. - Ela está morta. É assim que a quero. Faça-a contorcer-
se primeiro. Diga que sei o que ela fez. Pegue as jóias e o que mais conseguir.
Depois providencie para que seja enterrada, desta vez com uma lápide sem
identificação.
     Lançando o cigarro no gramado, esmagou-o sob a sola do sapato de couro
importado. Alisou o paletó social de seda, empinou o queixo e encaminhou-se
calmo e frio para casa.


Capitulo Um


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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

      Lauren Stevenson olhava-se no espelho. E olhava-se. E olhava-se.
      - Por mais tempo que eu continue aqui - disse, ofegante - não consigo
acreditar que sou eu!
      Richard Bowen sorriu para o reflexo dela.
      - É você, e se quer a minha opinião, está maravilhosa. Ela lançou-lhe um
tímido olhar. Nas semanas durante as quais passara a conhecer esse homem,
sentia-se inteiramente à vontade com ele como seu médico. Mas não podia
ignorar o fato de que era atraente; por isso o elogio teve mais significado.
      - Sou capaz de apostar que diz isso a todas as mulheres que operou.
      - Não necessariamente. Algumas ficam apenas bem. Outras, melhores
que antes. Quanto a isso - acrescentou ele, piscando um dos olhos - certas
mulheres eram melhores antes da cirurgia.
      - Você não diz isso a elas, diz? - repreendeu-o.
      - Está brincando? Se é a vaidade que as traz aqui, não tenho a intenção
de arranjar uma inimiga para toda a vida. Mas não foi a vaidade que a trouxe,
Lauren Stevenson, foi?
      Ela fez que não com a cabeça.
      - Foi por necessidade. - Mais uma vez, examinou-se no espelho. - Mas
continuo espantada. Sabia que teria uma melhora... - Interrompeu-se. O
narcisismo era estranho à sua natureza. Ficou com as maçãs do rosto
enrubescidas e a voz humilde. - Eu não esperava nem metade desse resultado.
      O sorriso de Richard foi de intensa satisfação.
      - Os casos como o seu são os mais satisfatórios. Você tinha as feições de
uma verdadeira beldade quando entrou aqui. Só foi necessária uma pequena
reorganização.
      Lauren correu as pontas do dedo pelo nariz reto, suavemente, e depois
pelo recém-reformado contorno da mandíbula.
      - Mais que beleza. - Abaixou a mão e virou-se para Richard. - E ganhei
uns cinco quilos durante as mesmas semanas. É estranho, mas imaginava que
ficar com os maxilares atados e apenas me alimentar de líquidos faria com que
eu perdesse peso.
      - Você não podia emagrecer, por isso eu a pus numa dieta líquida de alta
caloria. E agora, que pode ingerir sólidos, quero que siga corretamente o
regime que lhe dei. Ainda pode acrescentar mais uns três quilos a essa
estrutura magra e esguia, o que significa que terá de se alimentar bem.
Lembre-se, só vai conseguir mastigar um pouco de cada vez até os músculos
dos maxilares recuperarem a força. Como tem sido desde que removemos as
ataduras?
      - Um pouco dolorido, mas tudo bem.
      - Faz apenas três dias. A dor vai passar. Você está falando bem. Em
alguns casos, temos de recorrer a um fonoaudiologista, mas não acho que
precise se preocupar com isso. - O médico levantou-se do canto da
escrivaninha onde estava encostado. Uma suave brisa entrava pela janela
aberta atrás dele, trazendo o som do leve farfalhar de palmeiras e a frágil
essência de flores de jasmim-manga. - Então, que acha? Pronta para voltar
para casa?
      Ela exalou um suspiro preocupado e seus olhos brilharam.
      - Não sei. Dois meses e meio nas Bahamas... tratamentos naturais do

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

corpo, massagens, manicures... sol, areia, e me alimentando com todo o tipo
de líquidos deliciosos... Não é uma vida ruim.
     - Mas o melhor está por vir. Quando parte seu avião?
     - Em duas horas.
     - Nervosa?
     -   Com minha estreia? - Ela lançou-lhe um desamparado olhar de
desculpa. - Um pouco.
     - Alguém vai recebê-la quando desembarcar em Boston?
     - Sim. Beth.
     Ele franziu os olhos e ergueu um dedo, tentando lembrar os nomes
corretos.
     - Sua sócia na loja, certo? Lauren sorriu.
     - Correto. Ela está ansiosa por mostrar-me tudo que fez desde que parti.
Alugou o espaço que queríamos na área comercial, e, segundo o que escreveu,
as reformas já estão quase terminando. Temos encomendas de gravuras e
molduras e nos mantemos em estreito contato com os artistas plásticos que
vamos representar, portanto é apenas uma questão de mandar emoldurar todo
o material e montar a exposição.
     - Se é que vale minha opinião, Lauren, você me parece uma mulher
paciente mas determinada. Tenho certeza de que será bem-sucedida. - Quando
ela começou a dirigir-se para a porta, ele passou um braço gentil sobre seus
ombros. - Promete me telefonar, contar-me como estão as atividades?
     - Prometo.
     - E guardou o nome que lhe dei do especialista em Boston, caso tenha
algum problema?
     - Certamente.
     - E não vai deixar de comer... comer bem?
     - Vou tentar.
     Soltando-lhe o ombro, o médico virou-se para examinar o rosto de
Lauren, uma última vez. Absorveu com o olhar a simetria do nariz, a graciosa
Unha da mandíbula e o alinhamento agora perfeito do queixo, antes de olhá-la
com afeto.
     - Maravilhosa, Lauren, Acredite em mim, você está maravilhosa.
     - Obrigada. Obrigada por tudo, Richard.
     - O prazer é todo meu, bela dama.
     Ele deu-lhe um forte aperto de mão, tipo "vá agarrá-los", e encaminhou-
se de volta para o consultório. A última coisa que Lauren ouviu-o dizer foi um
presunçoso mas totalmente enternecedor:
     - Bom trabalho, Richard. Desta vez você nos deixou orgulhosos.
     Rindo baixinho, ela pegou a maleta na recepção e dirigiu-se ao aeroporto.
     - Você... está... maravilhosa!- foi a primeira coisa que Beth Lavin
conseguiu dizer em meio à surpresa, após Lauren ter-lhe sorrido por um
minuto, para que ela percebesse que era de fato Lauren Stevenson quem
estava diante dela. As duas se abraçaram, e Lauren riu.
     - Você disse a mesma coisa que o meu médico.
     - Ora, ele tem razão! - falou Beth, arregalando os olhos. Com as mãos
nos ombros de Lauren, deslocou a amiga para um lado e para o outro. -
Inacreditável! Seu perfil está magnífico, Lauren, até engordou um pouco, os

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Rainhas do Romance 08                        Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

olhos parecem enormes, separados, e além disso você também cortou os
cabelos...
     Num gesto tímido, por puro hábito, Lauren passou os dedos pelos cabelos
castanhos acima da orelha, para que caíssem para a frente. Então se deteve.
Com um esforço coordenado, terminou o movimento para trás delicadamente,
deixando uma mecha em volta das orelhas, para mostrar o rosto, o qual
escondera durante anos.
     - Estou bem mesmo?
     Percebia-se honesta ansiedade em sua voz.
     - Precisa perguntar?
     Lauren deu um desajeitado semi-encolher de ombros.
     - Olho-me no espelho e vejo uma nova pessoa, mas em minha mente sou
como sempre fui.
     - Eu não sou psicóloga, mas diria que isso é normal. - A expressão de
Beth mostrava excitação e o toque de travessura que Lauren conhecia tão
bem. - Uma pessoa diferente... pense nas possibilidades! E se você topasse
com alguém que tenha conhecido antes, alguém como Rafe Johnson...
     - O machão Rafe?
     - O machão Rafe, que jamais pensaria em olhar para nenhuma de nós,
mas que de repente vê essa mulher deslumbrante e não resiste. Você podia
conquistá-lo, sair com ele, e depois revelar sua verdadeira identidade, e deixá-
lo de repente. Ah, que satisfação!
     - Você é terrível, Beth.
     Mas Beth fitava-a de novo, desta vez com um toque de respeitosa
reverência.
     - Talvez... Nossa, você está maravilhosa - repetiu, momentos antes de
fingir que estava horrorizada. - E eu vou parecer muito sem graça a seu lado!
     - A chance é enorme, Beth Lavin. - Lauren envolveu um dos braços da
amiga e rumaram para a esteira de bagagem. Sabia que Beth era atraente; e
também que conservava os cabelos castanho-escuros no mesmo estilo de
penteado - longo, reto -, há 15 anos, e suas roupas... a blusa de gola redonda,
a saia-envelope e as sandálias baixas de couro que usava naquele dia eram um
exemplo... tão interioranas quanto sempre haviam sido. - Nenhuma de nós vai
parecer sem graça quando abrirmos aquela loja. Eu aprendi muito lá, Beth.
Realizavam seminários sobre penteados, maquiagem e vestuário. Fiz inúmeras
anotações...
     - Claro que sim.
     - E você também se sairá bem, portanto não me venha com complexo de
inferioridade - provocou Lauren, delicadamente. - E então, quais as últimas
novidades da loja?
     Beth inspirou fundo.
     - Consegui afinal que o anúncio ficasse do jeito que eu queria. Vai ser
publicado no próximo número do Boston. Os operários devem terminar as
obras daqui a um ou dois dias... o que é bom, porque as gravuras já
começaram a chegar. Para não falar nos blocos de pedidos, notas de venda e
artigos de papelaria. E as molduras, os ganchos, os fios e as etiquetas.
Estoquei tudo no meu apartamento.
     - Como é o apartamento?

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Rainhas do Romance 08                        Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

      - Eu gosto. E bem dividido e, a pé, fica a uma distância pequena da loja.
Beacon Hill é excitante. - Beth parou para avaliar mais uma vez a amiga. -
Você está inacreditável!
      - Mais um minuto, e vou enfiar um saco plástico na cabeça.
      - Não ouse. Estou achando o máximo acompanhá-la. Aliás, gostaria que
tivesse me deixado escolher um apartamento maior para que a gente pudesse
morar juntas.
      - Morar e trabalhar juntas, nós poderíamos nos desentender. Além disso,
você quer a cidade, enquanto eu, o campo. Muitos quartos, espaços
descampados, árvores, paz e sossego.
      - Ainda pensando naquela casa de fazenda.
      - Sim.
      - Vai ficar isolada!
      - Em Lincoln? - perguntou Lauren mexendo o nariz. - Não. Só vou ter
menos de dois hectares de terra. Quando as árvores ficarem desfolhadas, é
bem capaz que eu veja os vizinhos no outro lado. E a viagem de trem para a
loja leva pouco mais de meia hora.
      - Mas aquela casa de fazenda é um destroço!
      - Apenas precisa de amor.
      - Não me diga que já deu um lance. Lauren abriu um sorriso.
      - Já. - Diante do gemido de Beth, cutucou-a nas costelas, brincando. -
Como não consegui deixar de pensar na casa, liguei para o corretor de
imóveis. O contrato de compra está pronto para ser assinado.
      - Lauren, Lauren, Lauren, que é que eu vou fazer com você?
      Os olhos da amiga cintilaram.
      - Vai me instalar no seu apartamento esta noite. Amanhã de manhã, vai
me levar em excursão ao lugar de nosso orgulho e alegria. E então vamos
fazer compras na rua New-bury.
      - Oh?
      - Isso mesmo.
      - Talvez saia muito caro.
      - É provável - concordou Lauren, sem qualquer remorso.
      Beth curvou os ombros e deu uma risadinha infantil.
      - Adoro a idéia, adoro. - Então, bruscamente, estreitou os olhos e nivelou
a voz para citar uma manchete de jornal. - Caipiras rurais tomam a cidade de
assalto. Transformação de impacto lembra Clark Kent.
      - Clark Kent? - repetiu Lauren. - Ou Mulher Maravilha, ou seja lá quem
for. Claro, você sabe que somos as duas meio sem juízo, não sabe?
      - Temos 29 anos. Merecemos ser.
      - Vou dizer o seguinte aos credores quando começarem a ligar. Lauren
Stevenson não estava preocupada com eles. Não era esbanjadora, mas se deu
conta, afinal, de que a vida é curta demais para ser vivida com timidez. Graças
à sua prudente economia e ao legado que havia recebido do irmão por ocasião
de sua morte quase um ano atrás, tinha dinheiro suficiente para comprar e
reformar a casa de fazenda, pagar a parte não coberta pelo seguro de saúde
para a cirurgia corretiva a que se submeteu, comprar um guarda-roupa
condizente com a nova Lauren e estabelecer a loja. - Quando a bagagem
surgiu na esteira, exclamou: - Aqui vamos nós. Você veio de carro ou pegou

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

um taxi?
     - Vim de carro. Juro que o seu carro ficou "tão feliz ao me ver que veio
engasgando até aqui".
     Lauren grunhiu.
     - Deve estar precisando trocar o óleo. Pensando melhor, precisa sair da
cidade. Está vendo? "Ele" quer viver no campo também.
     As duas deixaram o terminal e dirigiram-se para o estacionamento.
     - Vai de carro ao norte neste fim de semana? - arriscou-se a perguntar
Beth.
     - Para ver meus pais? Acho que seria melhor.
     - Imagino que você ficaria emocionada... a "nova você" e tudo mais.
     Lauren fez uma careta.
     - Você conhece meus pais. Não são nem um pouco liberais. Não viram
necessidade de reconstrução facial. Acharam que eu estava simplesmente
ótima antes.
     - Mas você vinha sofrendo!
     - Eu sei disso, você sabe, e parte deles também deve saber. Os dois são
brilhantes, mas não abrem mão de suas concepções. Acho que associam
cirurgia plástica apenas à vaidade, o que não é bem classificado na lista de
qualidades. Disseram que me amavam como eu era, e sei que amavam,
porque é assim que pensam. Mas eu me sinto tão melhor agora,
independentemente do problema médico, que não sei se eles iriam entender.
     - Claro que iriam.
     Lauren não continuou a conversa. A ansiedade com a visita aos pais ia
muito além da cirurgia de reconstrução a que se submetera. Começava uma
nova vida, e grande parte desse modo de viver vinha sendo financiada pelo
legado do írmão. Os pais se ressentiam por isso. Brad vivera afastado da
família durante os 11 anos que antecederam a sua morte. Colin e Nadine
Stevenson não haviam esquecido nem perdoado o que consideravam ser a
abdicação do único filho do trono dos literatos.
     Suspirou ao tornar a falar.
     - De qualquer forma, vou visitá-los neste fim de semana. Talvez seja a
última vez que possa me ausentar por algum tempo. - Sorrindo, disse a Beth:
- Tenho a sensação de que as próximas semanas vão ser muito movimentadas.
     "Movimentadas" era descrevê-las em termos brandos, embora o ritmo
combinara com tanta excitação que Lauren não teria nem pensado em
reclamar.
     Com a redecoração da loja concluída, ela e Beth começaram a transferir o
material do apartamento da amiga. Gravuras e impressões foram emolduradas
e penduradas nas paredes. Grandes pastas de arte, repletas de uma infinidade
de estampas, reproduções e serigrafias extras, postas em vitrinas abertas no
chão para facilitar a observação dos clientes. Recortaram papéis especiais em
formato de material para passe-partout e fundo num infindável sortimento de
cores e colocaram em caixas de acrílico em cima do grande balcão feito de
ripas de madeira maciça para checagem e pagamento de mercadorias, atrás
do qual estavam organizadas amostras de cantos de moldura, cada uma presa
à parede com velcro para facilitar a remoção e a substituição. Peças de tecido
estampado à mão foram dispostas de forma atraente ao lado de latas contendo

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Rainhas do Romance 08                        Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

conjuntos de moldura de madeira natural; almofadas combinando pendiam do
teto.
      Lauren assinou o contrato de compra da casa de fazenda em Lincoln e,
como já estava desocupada, mudou-se uma semana depois. Seu entusiasmo
não diminuiu nem quando ela viu o quanto a casa precisava de reforma.
Bastava-lhe ficar na varanda da frente e olhar além do jardim a vegetação que
a circundava, ou sentir o perfume das rosas que cresciam pelas treliças laterais
da varanda, ou escutar os pássaros que gorjeavam para saber que tomara a
decisão certa. E, mais que qualquer coisa, tinha apenas de olhar-se no espelho
para compreender que começara verdadeiramente uma nova vida.
      E, como parte dessa nova vida, ela e Beth foram às compras. Compraram
elegantes calças, saias, suéteres coloridos e vestidos leves de verão.
Compraram sapatos, terninhos e bijuterias para combinar com as roupas,
sentindo-se ligeiramente irresponsáveis, mas ao mesmo tempo desfrutando
cada minuto. Nenhuma das duas fora imatura antes na vida, mas agora
achavam que mereciam o luxo.
      Três semanas após Lauren retornar das Bahamas, a loja de serigrafias e
moldura foi inaugurada. Era a segunda semana de junho, e o tempo ameno
propiciava um fluxo bastante grande de visitantes à sede do governo e ao
principal centro empresarial da capital aumentando a circulação de
compradores. Com as vendas em alta, Lauren e Beth ficaram tão
entusiasmadas que na primeira sexta-feira à noite, após fecharem a loja,
resolveram ir ao restaurante Houlihan's comemorar.
      - Se o movimento continuar assim, vamos ter de empregar alguém para
ajudar - sugeriu Lauren.
      Estavam sentadas no balcão do bar, que estava lotado, tomando drinques
gelados, enquanto aguardavam uma mesa.
      - Para mim que você diz isto? - queixou-se Beth. - Não há tempo
suficiente durante o dia para fazer a contabilidade, então tenho trabalhado à
noite. E você também vai precisar de tempo para trabalhar com os impressores
e o emoldurador.
      -   Vou ligar para o museu. Talvez saibam de alguém que esteja
interessado. Caso contrário, podemos anunciar no jornal.
      Beth balançou a cabeça, mostrando-se satisfeita.
      - E inacreditável como foram boas as coisas esta semana. Tivemos
mesmo muita sorte com a localização da loja. Chegam pessoas de todos os
lugares.
      - O verão é sempre uma estação movimentada, com todos esses turistas
na cidade. O Faneuil Hall é uma das atrações a ser visitada - comentou Lauren.
      - Parece que o inverno é igualmente bom. Pelo menos, foi o que me disse
Tom que trabalha na loja ao lado... a de artigos esportivos...
      Lauren contraiu os lábios de forma maliciosa,
      - Então já fez amizade com Tom, não é? Está vendo o que roupas e um
penteado novos podem fazer?
      Passando a mão pelos ondulados cabelos pretos recém-cortados na altura
dos ombros, Beth arqueou as sobrancelhas.
      - Olha só quem fala. Aquele rapaz ali não tirou os olhos de você desde
que entramos - disse ela, apontando para o local onde estava o tal rapaz..

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     - Ele certamente bebeu demais e está entorpecido e eu simplesmente
entrei por acaso na sua linha de visão.
     - Que absurdo o que você está dizendo! Você não acredita como está
bonita?
     Beth tinha razão. Lauren habituara-se a ser quase invisível no que se
relacionava a homens, e é difícil livrar-se de antigos hábitos. Ela então ousou
mirar-se rapidamente no espelho atrás do bar, para lembrar-se da mulher que
se transformara. E o elegante vestido de algodão de verão nas cores carmesim
e creme a tornara ainda mais atraente.
     Com um brilho conspirativo no olhar, virou-se para Beth e pediu:
     - Descreva-o para mim. Não quero encará-lo. Embora Beth não tivesse
quaisquer desses escrúpulos, falou em um tom pouco mais alto que um
sussurro:
     - Estatura e constituição medianas, terno marrom. Cabelos escuros, um
pouco curtos demais. Óculos estilo aviador... deve ser para chamar atenção,
pois não combinam com o resto. - A voz de repente se imobilizou. - Espere,
tem uma aliança de casamento. - E imediatamente se virou no assento e olhou
para frente. - Esqueça. Traria apenas problemas.
     Lauren riu.
     - Esquecido.
     - Isso não a aborrece? Quer dizer, tenho certeza que ele faria uma
encenação para você caso aceitasse flertar com ele; e o sujeito é casado.
     Fazendo um movimento com as sobrancelhas indicando pouco caso,
Lauren tomou um gole de sua bebida.
     - Acho que você está dando muita importância a isso. Eu provavelmente
tinha razão desde o início. Ele deve estar embriagado.
     Beth ficou pensativa.
     - Vamos ter de fazer alguma coisa sobre esta situação.
     - Que situação?
     - Nossa vida amorosa.
     - Que vida amorosa?
     - Aí é que está. Não existe. Precisamos conhecer uns rapazes.
     - Precisamos mesmo. Tom da loja de esportes, Anthony da loja de música
no outro lado da rua, Peter, que vende aqueles deslumbrantes moletons
pintados à mão, e os seus vizinhos, aqueles três bacharéis... Ainda podíamos
reconsiderar o convite e ir a uma das festas deles - sugeriu Lauren.
     Beth grunhiu.
     - Provavelmente a gente ficaria tonta só de entrar naquela sala. Tenho
certeza de que eles consomem alguma coisa. Sempre que os encontro,
parecem estar bem eufóricos. Acredite em mim, fomos espertas o bastante
para desistir na última vez que nos convidaram. Somos tão ingênuas que o
apartamento podia ser invadido por uma batida policial, todo mundo sair pela
porta dos fundos e nos deixar responder pelo consumo de drogas.
     - Talvez a gente conhecesse um policial bonito.
     - Não sei, não, Lauren. Ainda acho que você devia ter saído com aquele
rapaz que foi à loja na quarta-feira.
     - Era um estranho, apenas olhando tudo, sem comprar.
     - Mas bem simpático. E convidou você para tomar um drinque. Por falar

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nisso, o que entrou hoje de manhã era ainda mais simpático e mais bonito.
     - Um estorvo... tentando parecer desinteressado ao perguntar de onde eu
venho, onde moro, e até quis saber qual era meu signo. E eu nem sei qual é
meu signo. Nunca me interessei por esse tipo de coisa.
     - Você ficou assustada - afirmou Beth. Lauren hesitou apenas um minuto.
     - É.
     - Mas por quê? Já saiu com outros rapazes antes.
     - Era diferente.
     - Tem razão. Imagina-se que esta seja a nova vida que você tem levado!
     - Aparentemente, é. Mas na verdade, acho que vou precisar de mais
algum tempo para entender melhor essa mudança. Não sei, Beth. Aqueles
homens pareciam muito... rápidos. Muito espertos e sofisticados.
     - Você parece esperta e sofisticada.
     - Mas não sou. Você me conhece melhor do que qualquer um. Tenho
levado uma vida muito tranquila. Todos os encontros que tive foram com
homens calmos, mais sérios, cultos.
     - Chatos.
     - Talvez. Mas não sou aventureira.
     - Talvez precise aprender a ser. - A garçonete chamou-as para a mesa, e
Beth retomou a conversa assim que se sentaram.
     - Talvez devêssemos experimentar um bar de solteiros, ou um serviço de
encontros arranjados.
     - Se não tivemos coragem para ir à festa dos seus vizinhos, jamais
teremos para ir a um bar de solteiros. E encontros combinados em agências
me causam pânico.
     - Esses encontros causavam pânico à "antiga" Lauren. A "nova" Lauren
não tem com o que se preocupar. Além disso, não é realmente um encontro às
cegas se a gente passa por todo o processo do serviço de encontros de com-
panhia. Você tem de expressar suas preferências e escolher as possibilidades
oferecidas.
     - Assim como eles têm de escolher uma entre nós. Não, Beth. Não me
julgo realmente à altura disso.
     - Mas temos de fazer alguma coisa. Aqui estamos nós, duas mulheres
maravilhosas, brilhantes e disponíveis; devíamos ter como companhia no
jantar dois homens igualmente atraentes.
     - Talvez devêssemos colocar um anúncio no jornal - brincou Lauren, e logo
se repreendeu. - O único problema é que somos covardes. Só conversa, nada
de ação. - E ficou com uma expressão sonhadora nos olhos. - Dizem que as
coisas boas chegam para aqueles que esperam. E eu estou disposta a esperar
que algum dia um homem magnífico, brilhante, disponível, gentil e tranquilo,
se dirija a mim e se apresente.
     - Segundo o movimento de liberação feminina - rebateu com ironia Beth -,
a gente não deve se sentar e esperar. Deve lutar pelo que se deseja.
     Lauren olhou por cima do ombro de Beth em díreção à mesa onde estava
sentado um homem solitário, que terminava o jantar. Não era deslumbrante,
mas uma visão bem agradável. Quando ergueu os olhos e a encarou, sorriu.
Curiosa, Beth também se virou; e ele sorriu para ela também.
     - Eis a sua chance - incentivou Lauren num sussurro em tom de desafio

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bem-humorado.       - Eu não o quero, portanto ele é todo seu. Vá em frente. Lute.
    Voltando o      olhar para a mesa, Beth abriu o menu e concentrou-se nas
opções. Lauren      fez o mesmo. Nenhuma das duas notou quando o homem
recebeu a conta     da garçonete e dirigiu-se à caixa registradora.


Capitulo Dois

      A segunda semana após a inauguração da loja foi tão promissora quanto a
primeira. No momento em que Lauren se perguntava como ela e Beth teriam
condições de lidar sozinhas com o ritmo contínuo, um fotógrafo autônomo
entrou e ofereceu sua mercadoria. Era jovem - Lauren achou que ele não tinha
mais de 25 anos - e as fotos eram muito boas. Também procurava trabalho de
meio expediente para pagar os custos cada vez maiores dos materiais e
equipamento. Ela imediatamente o contratou, e nenhuma das duas sócias
lamentou a decisão. Agora podiam tirar uma hora de folga de manha ou à
tarde - embora separadas - para fazer trabalhos administrativos, sair para
almoçar ou fazer compras no centro de Boston. Numa dessas ocasiões, uma
semana depois de Jamie ser contratado, Lauren retornou à loja com um novo
suéter numa sacola e uma leve palidez no rosto. Beth logo chamou-a à sala
dos fundos.
      - Você está bem?
      Largando a bolsa na escrivaninha, Lauren afundou numa cadeira.
      - Acho que sim. Você não vai acreditar no que acabou de acontecer
comigo, Beth. Eu tinha comprado este suéter e voltava a pé pela rua Newbury
quando um carro perdeu o controle, se desviou e subiu na calçada. Eu vinha
sonhando acordada, me sentindo no topo do mundo, olhando meu reflexo ao
passar pelas vitrines das lojas. Quer dizer, estava tão empolgada com a
felicidade que não prestava atenção no que acontecia em volta de mim. Se não
fosse uma pessoa estranha que me agarrou e puxou quando o carro invadiu a
calçada, só Deus sabe o que teria acontecido!
      - Não pense mais nisso. Você não sofreu nada, e isso é o que importa. O
motorista estava bêbado?
      - Quem pode saber? Ele recuperou o controle do carro e continuou o seu
caminho. Nem se deu ao trabalho de parar e se assegurar de que ninguém
tinha sido ferido.
      - Irresponsável.
      - Inacreditável.
      - E o homem que a salvou... era bonito?
      - Era mulher - respondeu Lauren, ríspida, simulando o aborrecimento. - E
que tipo de pergunta é esta para se fazer nesse momento?
      - Estava apenas tentando recuperar o bom humor. Pense só como teria
sido romântico se você fosse salva do acidente por um estranho alto, moreno e
bonito. Podia ter desmaiado nos braços dele, e ele a teria erguido, abraçado
ternamente com muita delicadeza, junto ao peito rígido, enquanto olhava,
emocionado, o seu lindo rosto.
      Lauren revirou os olhos.
      - Oh, meu Deus.
      Beth apontou um dedo para ela.

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

      - Um dia isso talvez aconteça. Os milagres são assim, você sabe.
      - E você é a mesma pessoa que fazia propaganda da liberação das
mulheres não faz nem tanto tempo assim? - perguntou Lauren olhando para o
calendário na parede, e só voltando a olhar a amiga quando sentiu alguém
segurando seu braço.
      -    Sente-se bem agora? - A pergunta foi suave, mas mostrava
preocupação. - Quer uma bebida fria ou alguma outra coisa?
      Inspirando fundo, Lauren abanou a cabeça.
      - Estou bem. Só reagi foi depois que o susto passou, enquanto vinha
andando é que comecei a tremer. Mas estou melhor agora. Realmente gostaria
de voltar ao trabalho. Vai ajudar-me a manter a mente ocupada.
      E foi o que aconteceu. Quando chegou a Lincoln naquela noite quase já
esquecera completamente o incidente. Durante o dia seguinte, envolveu-se
com atividades mais importantes e imediatas relacionadas à loja.
      A noite foi para casa, trocou a roupa por uma camiseta e calça jeans e
preparou o jantar, seguindo à risca as diretrizes que lhe dera Richard Bowen.
Às vezes, precisava se esforçar, pois parecia que vinha comendo demais, e já
ganhara quase a metade dos três quilos que o cirurgião prescrevera.
Entretanto, teve de concordar que o aumento de peso lhe caía muito bem.
      Por causa das exigências impostas pelo trabalho na loja desde seu retorno
das Bahamas, tivera pouca oportunidade de organizar a reforma da casa.
Agora, com caneta e papel em mãos, percorreu cada aposento listando tudo o
que queria mandar fazer. O corretor de imóveis que lhe vendera a casa dera-
lhe os nomes de um empreiteiro, um carpinteiro, um eletricista e um bombeiro
locais. Embora não pretendesse contratar nenhum deles antes de pesquisar
outras referências, queria ter as decisões definidas para, então, marcar
encontros com os profissionais.
      Após mais de uma hora tomando notas detalhadas, Lauren largou a
caneta e o papel e saiu para a varanda da frente. A noite era clara, a lua
prateada no céu salpicado de estrelas. Por impulso, atravessou o jardim e
parou no centro, inclinou a cabeça para trás e escolheu uma estrela para ex-
pressar um desejo. Mas o que poderia desejar a alguém cuja vida já era tão
boa? Ela gozava de ótima saúde pela primeira vez em muitos anos. Tinha uma
nova aparência, que adorava. Uma loja, bem encaminhada para tornar-se um
sucesso. Casa própria, com suficiente potencial para mantê-la feliz por longo
tempo. O que pediria? Talvez um amor. Talvez filhos. Na hora certa. Baixando a
cabeça, começou a voltar devagar em direção à casa. Um ruído lhe chamou a
atenção. Ela parou. Era um ruído da natureza, mas estranho. Fora nitidamente
hostil. Quando tornou a ouvi-lo, deu meia-volta. Um grunhido baixo. Curvou a
cabeça olhando para as árvores próximas, e então estreitou os olhos para ver
a criatura que lentamente avançava para ela. Um cachorro. Lauren exalou um
suspiro de alívio. Provavelmente o animal de estimação de um dos vizinhos.
Pousando uma das mãos na altura do coração que acelerava, falou em voz
alta.
      - Você me assustou, cachorro. Isso lá é maneira de saudar uma nova
vizinha? - Ao dar um passo à frente para afagá-lo, o animal arreganhou os
dentes e emitiu outro grunhido, este claramente ameaçador. Lauren estendeu
as mãos abertas, palmas viradas para cima, e disse baixinho:

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     - Não vou machucar você, menino. - Baixou uma das mãos.
     - Aqui. Cheira. - Em vez de aproximar-se dela, o cachorro rosnou mais
uma vez, acompanhando o ruído hostil com um agachamento que sugeria
ataque iminente. - Ei, não fique irritado.
     Mal teve tempo de dizer as palavras e o cachorro pulou em cima dela,
derrubando-a no chão e grunhindo feroz. Lutando para desviar-se da fera, ela
ergueu os braços para proteger-se e balançou as pernas para expulsá-lo. Mas
com a mesma rapidez com que a atacara, o cachorro se retirou, galopando em
direção às árvores e desaparecendo na densa mata.
     Tremendo muito, Lauren conseguiu, com esforço, sentar-se. Então, não
estando disposta a correr o risco de o cachorro retornar, levantou-se de um
salto e disparou numa linha reta para dentro de casa. Assim que entrou,
recostou-se firmemente na porta fechada, cerrou os olhos e inspirou. Quando o
susto passou, sentiu raiva. Se não fosse tão tarde, teria ligado para os Young,
os vizinhos ao lado do qual viera o cachorro. Mas também, pensou, talvez
fosse uma sorte ser tarde demais para telefonar. Furiosa como estava por
alguém deixar um animal tão selvagem solto, mesmo numa área rural como
aquela, poderia dizer alguma coisa da qual se arrependeria depois. Só se
encontrara com Carol Young uma vez. Não queria afastar a mulher, nem o
marido, e tampouco um dos filhos adolescentes do casal. Era melhor se
acalmar primeiro. Ligaria na manhã seguinte.
     Ao chegar ao trabalho, ligou para o número dos Young e ficou aliviada por
ouvir a própria Carol atender.
     - Carol, aqui é Lauren Stevenson. Nós nos encontramos várias semanas
atrás quando me mudei para a casa ao lado da sua.
     - Claro, Lauren. É um prazer ter notícias suas. Como andam as coisas?
     - Na verdade, muito bem... Espero não estar interrompendo alguma
atividade sua.
     - Não seja tola. Um dos luxos do trabalho num terminal de computador
em minha casa é que posso tirar uma folga sempre que quero. Os meninos
foram visitar os avós em Maryland por uma semana, assim tenho tempo
suficiente para um ou dois telefonemas. Como está a casa?
     - Do mesmo jeito ainda. Tenho andado tão ocupada aqui na loja que não
encontro tempo para pesquisar e contratar trabalhadores para reformar a casa.
Mas não foi por isso que liguei. - Lauren escolheu as palavras com todo
cuidado, esforçando-se para ser o mais diplomática possível. - Levei um susto
terrível ontem à noite. Eu caminhava lá fora no jardim mais ou menos às 11
horas da noite quando fui atacada por um cachorro.
     - Atacada? Está tudo bem com você?
     - Tudo bem. O cachorro saltou em cima mim, arreganhou os dentes e
emitiu uns ruídos medonhos, mas fugiu correndo antes de causar algum dano.
     - Meu Deus! Eu não sabia que havia cachorros selvagens por aqui!
     - Então... não é seu?
     - Deus do céu, não. Foi isso que achou?
     - Ele veio das árvores do seu lado... me desculpe, eu simplesmente
imaginei...
     - Você devia ter ligado para nós ontem à noite mesmo. Talvez tivéssemos
podido ajudá-la a ir atrás dele. Como era o animal?

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     - Grande e preto. Pêlo curto. Talvez um Doberman, mas estava escuro
demais para eu ver a coloração exata do pêlo, e além disso fiquei muito
apavorada para perceber detalhes.
     - Coitada de você, menina. Eu também teria ficado apavorada. - Carol fez
uma pausa, pensando. - Pelo que sei, ninguém na vizinhança tem um cachorro
como esse, certamente não um cachorro que atacaria uma pessoa. Às vezes,
porém, uns animais estranhos perambulam na área. Talvez você deva chamar
a polícia local.
     Lauren não se animou com a idéia. Como nova moradora, detestaria
causar uma agitação.
     - Eu... Eu não acho que isso seja necessário. Agora que soube que o
cachorro não é da vizinhança, me sinto melhor. Provavelmente é um cão de
guarda que fugiu e se perdeu. E não me feriu, por mais que parecesse que era
o que ia fazer.
     - Escute, vamos observar as redondezas, e comunicarei esse fato a
alguns dos outros vizinhos. Mas se você o avistar de novo, deve realmente
fazer uma queixa. Não é justo ficar assustada por caminhar em sua
propriedade.
     Lauren suspirou.
     - Vou ficar atenta. Obrigada, Carol. Você me ajudou muito.
     - Gostaria de poder fazer mais. Não deixe de me avisar se surgir algo,
combinado?
     - Combinado.
     Quando Lauren desligou o telefone, Beth endireitou o corpo onde ficara
encostada na porta.
     - Um cachorro? Primeiro um carro, agora um cachorro. Meu Deus, a nova
você anda atraindo uns elementos muito misteriosos.
     - Continue - provocou Lauren -, dê uma boa risada à minha custa.
     - Eu não estou rindo. - Beth esfregou as mãos, prevendo um grande
drama. - Talvez tenha alguém aí fora para pegar você... alguém que morou
naquela antiga casa de fazenda há um século, cujo fantasma nunca vai
descansar enquanto o dono legítimo da propriedade não retornar.
     - Beth...
     A amiga ergueu a mão.
     - Não, escute. Imagine, apenas imagine, que o fantasma está decidido a
expulsá-la da cidade, por isso trama todos os tipos de pequenos "acidentes"
para deixá-la apavorada...
     - Beth!
     - Então chega um homem deslumbrante que por acaso tem uma arma
secreta que pode fulminar até mesmo um fantasma e reduzi-lo... a um lençol
esfarrapado...
     Lauren recostou-se na cadeira, não conseguindo conter o início de um
sorriso.
     - Já terminou?
     - Oh, não. O melhor vem depois que o fantasma é dizimado e você e o
homem deslumbrante se apaixonam e vivem felizes para sempre.
     - Por que não está trabalhando?
     - Porque Jamie está trabalhando.

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

    - Acho que você devia ajudá-lo. - Lauren levantou-se da cadeira. - E eu
também.
    Apertando levemente o braço de Beth ao passar, retornou à frente da loja.


      Vários dias depois, Lauren viu que precisava dar início à reforma de sua
casa. A porta da garagem inesperadamente desabou no chão quando ela se
achava a poucos centímetros de distância. Por ironia, se a garagem fosse tão
antiga quanto a própria casa, as portas abririam para os lados, e ela não teria
corrido o perigo de se machucar. Mas a garagem fora acrescentada ao imóvel
25 anos antes. Parece, pensou, frustrada, que fora tão negligenciada pelos
últimos proprietários quanto a casa.
      Lauren deu vários telefonemas, marcando reuniões para conversar sobre
os reparos com os profissionais que lhe foram indicados. Nenhum deles a
impressionara ao telefone, mas ela não via mal algum em se encontrar com
eles antes de procurar por outros. Queria que a casa ficasse perfeita, e
dispunha-se a pagar para isso.
      Decidida, sentou-se no chão da sala de estar e usou a mesa baixa de
centro para anotar os pedidos ao emoldurador. Mas a todo instante distraía-se.
Repetidas vezes interrompia as anotações e desviava o olhar para a janela. Lá
fora estava escuro, e ela lembrou-se que estava sozinha. Qualquer pessoa
podia vê-la, vigiá-la, examiná-la. Amaldiçoando Beth pelas fantasiosas
imaginações, e a si mesma por sua própria suscetibilidade, retornou ao
trabalho. Mas nessa noite, para seu pesar, adormeceu a perguntar-se se
fantasmas de cem anos de idade poderiam sabotar portas de garagem de vinte
e cinco anos.
      No dia seguinte, pouco depois do meio-dia, Lauren viu-o pela primeira
vez. Ela trabalhava na vitrine da fachada da loja, substituindo uma fotografia
emoldurada comprada naquela manhã, quando olhou por acaso em direção ao
banco que ficava em frente à loja. Lá estava ele sentado, calmo e atento. E
tinha os olhos fixos nela. Ela esboçou um sorriso, e logo desviou o olhar.
Terminou de pendurar a nova reprodução e foi refugiar-se na loja. Quinze
minutos depois, durante uma breve calmaria no movimento, tornou a olhar
para fora e viu que ele não se mexera. Um braço lançado acima do encosto do
banco, as pernas cruzadas descontraído, parecia apenas observar, com ar
inocente, as pessoas passarem - até voltar o olhar novamente para a vitrine da
loja.
      Mais uma vez Lauren desviou os olhos, desta vez se perguntando por que
agira daquela maneira.
      Nada havia de extraordinário em relação a um homem sentado num banco
no centro da cidade; as pessoas faziam isso sempre. E aquele, usando camisa
xadrez de mangas curtas, calça jeans e tênis, parecia um típico transeunte.
Embora não estivesse lanchando ela imaginou que ele somente desfrutava a
atmosfera agradável. Ou esperava alguém. Ou simplesmente descansava. O
fato de não tirar os olhos da loja era compreensível, já que ficava bem em
frente. Nesse momento ela recebeu um telefonema, era dos tipógrafos que ela
vinha tentando encontrar. Depois, os clientes ocuparam-lhe o tempo durante a
hora e meia seguinte. Já quase havia esquecido o homem lá fora, quando saiu

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Rainhas do Romance 08                      Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

da loja para comprar selos, e surpreendeu-se por ainda se lembrar dele.
     Mas não o viu em lugar algum.
     Em casa à noite, Lauren sentia-se estranhamente nervosa. Não sabia o
motivo, e por isso culpou as duas xícaras de café que tomara naquela tarde.
Com um olhar crítico, vistoriou a cozinha enquanto esperava esquentar a
bouillabaisse, que comprara embalada para viagem numa loja gastronômica de
pratos típicos franceses. Na reforma, escolhera para a cozinha a cor branca -
armários brancos com acabamento cor de gelo, fogão e geladeira brancos e o
revestimento de cerâmica do piso branco. Os complementos e utensílios
seriam em azul-claro, como o conjunto de panelas esmaltadas, papel de
parede, gravuras para a parede. Talvez encomendasse uma cortina pregueada
também na cor azul-claro - embora não tivesse planejado colocar qualquer
coisa nas janelas, de repente ocorreu-lhe que talvez gostasse da opção de
privacidade para momentos como aqueles, quando a noite parecia misteriosa.
     Estava nervosa. Café demais. Apenas isso.
     Na manhã seguinte, o homem voltou a sentar-se em frente à loja, no
mesmo banco. Usava uma camisa pólo branca, a mesma calça jeans, e agora
mantinha as pernas estendidas para a frente.
     - Admirável, não - gracejou Beth, chegando perto de Lauren.
     - Quem?
     - Aquele rapaz para quem você está olhando. Já viu cabelos mais
deslumbrantes?
     Eram castanho-claros e brilhavam ao sol - bem escovados, grossos e não
muito curtos.
     - Não.
     - Ou pernas compridas como aquelas?
     - Não.
     - Gostaria de saber quem é.
     - Não sei.
     - Na certa apenas mais um turista. Por que é que os mais bonitos
aparecem hoje e amanhã já foram embora?
     - Esse estava ali ontem.
     - Como?
     Lauren piscou os olhos e desviou o olhar do homem para a amiga. Meio
ausente, enxugou as palmas das mãos úmidas na saia de linho verde de corte
reto.
     - Eu o vi ontem no mesmo lugar. Beth arregalou os olhos.
     - Verdade! Acha que está esperando... a gente?
     - Ora, Beth, por que motivo estaria esperando por nós?
     - Talvez tenha ouvido falar de duas damas maravilhosas, donas da loja de
gravuras e molduras, e veio investigar. Se ele tivesse coragem, entraria.
     - Se tivéssemos coragem, sairíamos.
     - E, não temos, e parece que ele também não, então... - Enquanto as
duas olhavam, o homem levantou-se e caminhou sem pressa. - É...- disse
Lauren, sem saber se ficara aliviada ou decepcionada.
     Percebera algo fascinante naquele homem, não apenas as pernas e os
cabelos, mas também uma certa força. Perguntava-se se ele já tivera um
cachorro preto que rosnava com os dentes arreganhados. Então se apressou a

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

afastar essa ídéia da mente, junto com todos os pensamentos em relação ao
homem - até avistá-lo mais uma vez naquela tarde. A princípio ele passou
devagar em frente à loja, mas sequer olhou para dentro. Alguns minutos
depois, retornou pelo lado oposto, desta vez parando perto da porta, antes de
dirigir-se ao banco. Quando Lauren viu-o sentar-se, curvando-se para frente
com os joelhos abertos e as mãos entrelaçadas entre eles, sem saber a razão,
ficou apreensiva. Percebera algo definitivamente suspeito na maneira como ele
observava a loja, desviava o olhar, e mais uma vez tornava a olhá-la.
      - Quem é esse homem? - sussurrou para Beth, que logo ergueu a cabeça
do recibo do cartão de crédito que preenchia e acompanhou o olhar
preocupado da amiga.
      - Então ele voltou? - Beth retomou o preenchimento do documento mas
falou baixo. - É meio rude para o meu gosto. Pode ficar com ele.
      - Eu não o quero - resmungou Lauren entre os dentes - mas gostaria de
saber por que ele tem passado o tempo ali dois dias seguidos.
      - Por que não vai até lá e pergunta a ele? - murmurou Beth, e então,
sorrindo, entregou o recibo e uma caneta à compradora. - Por favor, assine e
ponha seu endereço e número de telefone embaixo...
      Lauren sussurrou de volta num exacerbado tom de voz.
      - Não posso simplesmente ir até lá e perguntar! Certamente ele tem um
bom motivo para estar ali, e eu me sentiria uma tola.
      - Então pare de se preocupar. Tenho certeza de que é inofensivo.
      Lauren não tinha tanta certeza. O homem examinava a loja com muito
interesse, e seu olhar era intenso demais para esquecê-lo.
      Quando uma cliente a abordou para comprar uma peça de tecido e
mandar colocá-lo numa moldura, Lauren ficou feliz por poder se ocupar com
outra coisa. Quando outra cliente escolheu uma estampa e precisou de
conselho sobre a moldura adequada, ela teve prazer em servi-la. E, no mo-
mento que uma terceira cliente entrou à procura de várias gravuras para
coordenar com retalhos de tecido e papel de parede, ela se entregou
definitivamente ao projeto. Ao aproximar-se a hora do fechamento da loja,
sentia-se cansada. Estava na sala dos fundos, amainando cuidadosamente
cartões de mostruário e aguardando ansiosa a relaxada volta de carro para
casa, um jantar tranquilo e o resto da noite lendo um bom livro.
      - Lauren? - A urgência na voz baixa de Beth a fez erguer rápido a cabeça.
- Ele está aqui, perguntando por você.
      - Quem?
      - Ele. - Beth disparou os olhos para trás. - O homem do banco.
      Lauren largou os cartões.
      - Perguntando por mim?
      - Pelo nome.
      - Como soube... ele deve ter... onde está?
      - Bem aqui - articulou Beth sem som, de um jeito que seria cómico se
Lauren estivesse calma.
      Mas não estava. Aquele homem era diferente. Uma aparência nada sem
graça. E tampouco elegante e sofisticada. Muito... diferente. Beth fez um gesto
urgente com a mão.
      - Já vou. Já vou - murmurou, Lauren, hesitando. Levantou-se, ajeitou o

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

suéter de algodão de cor marfim na altura do quadril sobre a saia e empertigou
os ombros. Depois, tentando parecer mais controlada do que estava, deixou
devagar e relutante a sala.


Capitulo Três

      Ele era muito mais alto de perto do que parecera através da vitrine da
loja. Tinha os ombros mais largos. E também mais bronzeado. O mais
surpreendente, contudo, era que parecia um pouco inseguro.
      - Lauren Stevenson? - perguntou, cauteloso.
      Ela parara vários passos distantes e apoiou a mão na bancada.
      - Sim?
      Ao examiná-la com mais atenção, ficou nitidamente perplexo.
      - É realmente estranho. Você não é de modo algum tão alta quanto eu
esperava.
      Lauren prendeu a respiração um minuto, e perguntou, também cautelosa.
      - Que esperava?
      - Alguém... bem, alguém diferente.
      Se ele tinha alguma ligação com seu passado, percebeu Lauren, não
apenas era compreensível a surpresa, mas mostrava tato ao falar. Mesmo
assim, não podia esconder uma certa cautela. Afinal, o homem vinha
examinando-a durante dois dias.
      - Você me conhece? Eu devia conhecê-lo?
      Pela primeira vez, ele sorriu, um sorriso tímido, cativante.
      - Meu nome é Matthew Kruger. Matt. - Hesitou uma fração de segundo. -
Eu era amigo de seu irmão.
      Lauren não sabia o que ela esperara ouvir, mas estava certa que não era
isso.
      - Amigo de Brad?
      Não conseguiu ocultar a surpresa nem o ceticismo.
      - Isso mesmo. Estive com ele pouco depois do acidente. Eu... sinto muito
pela morte dele.
      - Eu também - admitiu ela com franqueza, franzindo a testa levemente,
enquanto examinava Matthew Kruger.
      Ele não se encaixava nos moldes de Brad e seus amigos. Estranho nunca
ter ouvido falar dele. Mas talvez nem tanto. Como os pais, ela não convivera
intimamente com Brad antes de sua morte.
      - Mas... faz um ano que ele morreu.
      Em silêncio, perguntou-se por que aquele suposto amigo de Brad esperara
tanto tempo para entrar em contato com ela.
      - Sei que vocês não eram íntimos, mas Brad me falou de você várias
vezes, e como eu tive de vir para o leste a negócios, achei que devia procurá-
la.
      - Em que ramo de negócios você trabalha? Outra hesitação, por uma
fração de segundo.
      -   Construção civil. A empresa construtora para a qual trabalho foi
contratada para algumas obras na região oeste de Massachusetts. Estou aqui
para organizar as coisas... dar andamento no projeto.

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Rainhas do Romance 08                           Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     Ela assentiu com a cabeça. Um construtor. Em vista das rugas visíveis nos
cantos dos olhos, não era o tipo de construtor que dirigia as coisas de sua
escrivaninha. Mas que trabalhava e fazia questão de ver tudo de perto. E o
corpo bem torneado devia ser resultado do trabalho físico árduo. Isso ela podia
associar à imagem que formara da nova vida e amigos do irmão, embora se a
opinião dos pais fosse válida, talvez esperasse alguém bem mais rude.
Aparentemente, pelo menos, Matthew Kruger não parecia assim. "Arrumado e
americano típico" era uma descrição mais adequada. Seria apenas uma
aparência superficial?
     - Entendo - disse ela. Então, sentindo-se sem graça, desviou o olhar. Na
verdade, pouco soubera do irmão e seu estilo de vida... e também a presença
daquele homem intimidava-a. - Já está em Boston há muito tempo?
     - Uma semana - respondeu Matt. - Lauren balançou a cabeça – Estou
hospedado no hotel Marriott de Long Wharf.
     - Se seu trabalho é na região oeste do estado, não seria mais fácil
hospedar-se lá?
     - Eu estava lá, mas nossos investidores estão aqui e há algum trabalho
burocrático a fazer, por isso decidi tirar alguns dias para visitar locais turísticos.
     Quando ele de repente olhou para trás dela, Lauren virou a cabeça.
     - Vou fechar - sussurrou Beth, olhando com curiosidade para Matt ao
passar pelos dois.
     Lauren estendeu a mão e segurou-a pelo braço.
     - Beth, este é Matthew Kruger. É... era... amigo de Brad. - Ainda tinha
dúvidas sobre isso, mas dessa forma simplificava a apresentação. - Matt, Beth
Lavin.
     Beth conhecera Brad Stevenson antes de ele partir, e como não era
membro da família, fora mais objetiva sobre a decisão dele. Com as mãos
entrelaçadas apertadas diante de si, sorriu timidamente para Matt.
     - É um prazer conhecê-lo.
     - O prazer é meu - disse Matt, retribuindo o sorriso. Apressou-se a
desculpar-se ao tornar olhar para Lauren - Não quero incomodá-la, se precisa
fazer alguma coisa.
     Ela abriu a boca para dizer que realmente tinha trabalho a terminar, mas
Beth falou primeiro.
     - Oh, não a está atrapalhando, já tinhamos acabado quase tudo por hoje
quando você entrou. Terminei os cartões de amostras, Lauren. Por que você e
Matt não saem juntos? Eu fecho a loja.
     A última coisa que Lauren queria era sair com Matt. Não se convencera de
que ele era o que dizia ser, e mesmo que fosse, os dois ocupavam lados
opostos de uma história. Além disso, não a chamara para "saírem" juntos.
     Aceitando a sugestão oportuna, ele a convidou.
     - Gostaria, Lauren? - Fez uma pausa e inspirou rapidamente. - Soube que
tinha um cruzeiro ao pôr-do-sol em volta do porto. Se nos apressarmos,
chegaremos a tempo.
     - Eu na verdade não devia...
     - Vá, Lauren - incentivou Beth. A sutileza nunca fora o seu forte. - Você
quase não tem saído. A noite está linda. O ar fresco vai lhe fazer bem.
     - Eu realmente gostaria da companhia - incentivou-a agradavelmente

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Rainhas do Romance 08                      Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

Matt.
     As últimas palavras a convenceram. Se ele houvesse insistido com muita
veemência, talvez ela recusasse sem dificuldade. Mas pareceu sincero, e
Lauren captou a mesma insegurança que percebera quando se deparara com
ele a primeira vez. Embora alto, forte e de aparência rude, era gentil. Olhos
castanhos, afetuosos e suaves. Nesse momento, insinuavam vulnerabilidade;
acima de tudo, Lauren Stevenson adorava um pouco de vulnerabilidade nas
pessoas. Soltando a respiração que vinha prendendo sem perceber, ela
assentiu.
     - Vou pegar minhas coisas - sussurrou. Logo depois seguia a pé ao lado
de Matt em direção à orla marítima. Calado como ela, lançava-lhe olhares
intermitentes, e Lauren se perguntou se ele também se sentia estranho como
ela. Na tentativa de quebrar o silêncio, fez a primeira pergunta que lhe
ocorreu. - Como soube que eu estava em Boston?
     - Seus pais me disseram.
     - Meus pais.
     Ele lançou-lhe um olhar furtivo.
     - Não deviam?
     - Não... sim... quer dizer, simplesmente me surpreendeu. Só isso.
     Seguiram adiante mais um pouco antes de ele tornar a falar.
     - Você acha que eles não deviam ter informado assim de bom grado o seu
endereço a qualquer amigo de Brad.
     - Eu... acho que é isso mesmo.
     Ele contraiu um músculo na mandíbula.
     - Pelo menos você é franca. Ela encolheu os ombros.
     - Até onde você sabe dos motivos de Brad para ir embora?
     - Apenas o que ele me disse... que os pais não aceitavam a necessidade
dele de trabalhar com as mãos e não com a mente, que ficaram furiosos
quando ele abandonou a faculdade e se desinteressaram inteiramente de tudo
relacionado a ele. Talvez Matt houvesse conhecido Brad afinal.
     - Dito assim, parece cruel.
     -    E foi, de certa maneira. Brad ficou bastante magoado com o
rompimento.
     - Meus pais também, embora nenhum dos três tenha tentado melhorar a
relação.
     - E você, Lauren? Fez alguma coisa?
     Ela fitou-o com raiva, depois suavizou e baixou os olhos.
     - Não - admitiu, tranquila - Acho que deveria na época. Mas então o
tempo se esgotou.
     - Você lamentou a distância?
     - Brad era meu único irmão. Não tinhamos outros. Era quatro anos mais
velho que eu, e seus interesses foram sempre diferentes. Não fomos muito
ligados na infância, mas gostava de imaginar que talvez pudessemos encontrar
interesses comuns quando ficassemos mais velhos.
     Haviam chegado à avenida Atlantic. Matt pôs de leve a mão no cotovelo
dela quando atravessaram, apressados, para evitar um carro que vinha em
toda velocidade. Soltou-a quando chegaram à faixa do meio, onde esperaram
um minuto para terminar a travessia.

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     - Então você tinha 17 anos quando Brad partiu. Lauren exalou um
suspiro.
     - Você realmente sabe tudo sobre Brad, não?
     - Ele me disse que tinha 21 anos quando abandonou a faculdade. Se você
era quatro anos mais nova... - Matt deixou a frase sem terminar e suas feições
ficaram tensas. - Achou que eu estava mentindo ao dizer que era amigo dele?
     - Não. Talvez. Tenho de acreditar em sua palavra em relação a isso, visto
que não posso confirmar com ele.
     - É sempre tão desconfiada assim? Ela encarou-o.
     - Só quando vejo alguém me espreitando diante de minha loja durante
dois dias antes de entrar.
     - Oh. Você me viu.
     - Vi. - Seria um rubor o que vira em seu rosto? Lauren perguntou-se se
era culpa ou embaraço. Caso fosse a última hipótese, resolveu suavizar o tom.
- Imagino que não tentava se esconder.
     - Na verdade - confessou ele - eu tentava reunir coragem para entrar.
     Essa era uma novidade na experiência dela. - Por que teria de reunir
coragem para se aproximar de mim?
     - Vários motivos. Primeiro, eu sabia que havia ressentimentos quanto a
Brad e não tinha certeza como seria recebido. Segundo, queria me certificar se
era mesmo você. - Observou-a com interesse. Mais uma vez, aquela expressão
perplexa lhe tomou o rosto. - Você está tão diferente. Muito... muito bonita.
     Lauren agarrou com mais força a alça da bolsa no ombro.
     - Brad tinha uma fotografia?
     - Bem antiga. Você tinha 16 anos na época.
     Por motivos que não estava a fim de analisar, ela não quis entrar no
assunto da cirurgia de reconstrução.
     - Foi há muito tempo - disse, tranquila. - A gente muda.
     -    É o que estou vendo - falou Matt devagar. - Mesmo assim, é
impressionante... - Parecia que ia continuar falando, e por um instante Lauren
se perguntou apenas o quanto Brad lhe falara sobre ela. Foi salva quando ele
ergueu os olhos e anunciou, hesitante: -Acho que é ali.
     Ela acompanhou o olhar dele até onde se avistavam o cais e os barcos de
cruzeiro,
     - Parece que sim. Trata-se na verdade de uma desinformada conduzindo
outro. Eu cursei a faculdade em Boston, mas já faz algum tempo. Fiquei muito
tempo longe daqui.
     - Você mora no centro da cidade?
     O olhar que ela lhe dirigiu continha uma sutil acusação, mas também
certa diversão por trás das palavras.
     - O que foi que meus pais lhe disseram? Interpretando-a nítida e
claramente, ele reprimiu um sorriso.
     - Apenas o nome da loja. Imagino que quisessem manter nosso contato
num nível estritamente profissional.
     - Tenho certeza que sim.
     - E você?
     - E eu o quê?
     Ele ficou de repente sério.

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     - Teria me desprezado porque não tenho Ph.D. em alguma matéria
esotérica?
     - Eu não tenho Ph.D. em matéria nenhuma.
     - Mas tem mestrado de arte. Eu nunca frequentei uma faculdade.
     - Mas é bem-sucedido no que faz. Pelo menos, se tem viajado pelo país,
a empresa em que trabalha deve estar se saindo bem... você deve ser
valorizado. - Após duvidar da história dele tão pouco tempo antes,
surpreendeu-a por estar defendendo-o. Os que gostavam de vulnerabilidade
não eram sempre os mais prudentes. Inspirou fundo. - Não, Matt. Não sou
como meus pais. Brad não era o único que tinha diferenças com eles.
Simplesmente dediquei um pouco mais de tempo tentando superar essas
diferenças.
     A conversa foi interrompida quando chegaram à cabine de tiquetes. Matt
pagou as passagens e entraram no barco. Passando por entre os outros
grupos, subiram até o convés superior e encontraram um lugar vazio junto à
amurada, para olharem a silhueta dos prédios da cidade.
     - Eu adoro Boston - pensou em voz alta Lauren, após vários minutos de
silenciosa apreciação.
     - Explique.
     - É maior que Bennington e muito mais excitante, embora menor que
Nova York e também mais calma. A gente pode entendê-la, passa a conhecê-
la. É habitável.
     - Você tem apartamento?
     - Uma casa de fazenda.
     - Na cidade?
     - Em Lincoln. - Ela caiu em si e o repreendeu. - Isso foi um golpe baixo.
Você se aproveitou de mim quando baixei as defesas.
     Ele deu um sorriso amistoso.
     - Peço desculpas. Você tem mesmo uma casa de fazenda?
     De algum modo, pareceu tolice esconder aquela informação.
     - É antiga e precisa de muitas obras para poder se tornar realmente
habitável, mas fica num grande pedaço de terra e tem encanto, verdadeiro
encanto.
     - As casas antigas são assim. A história acrescenta personalidade. É uma
das razões porque eu gosto de Boston. Passear por aí, ver onde ocorreu o
Massacre de Boston, ou onde se leu pela primeira vez a Declaração da
Independência... isso nos causa arrepios. - Ele interrompeu-se, encarando
Lauren. - Por que está rindo?
     - Você e seus arrepios. É um homem tão alto e forte. Parece uma
contradição.
     - Não - disse ele, tranquilo. - Os arrepios de que falo têm causa
emocional. Ser forte fisicamente não quer dizer necessariamente insensível.
     - Não tive a intenção...
     - Eu sei.
     Dado o recado, ele deixou o assunto acabar ali. Os dois ficaram em
silêncio, vendo a prancha de embarque ser recolhida e o barco afastar-se
devagar da doca. Logo os motores, grunhiam mais alto. A embarcação fez uma
trabalhosa manobra, ganhou velocidade e entrou no corpo principal do porto,

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

deslocando-se num ritmo constante, embora ruidoso.
     -   Gostaria de uma bebida? - perguntou Matt. Lauren saiu de sua
contemplação.
     - Não..., quero sim. Um spritzer vinho, se tiver vinho branco e soda, ou
uma limonada. Qualquer coisa gelada.
     Assentindo com a cabeça, Matt atravessou de volta o convés e
desapareceu pela escada que levava ao nível inferior. Lauren, que acompanhou
a caminhada dele, teve de admitir que era um homem tão atraente quanto
qualquer outro à vista. Não bonito no sentido clássico; tinha o queixo quadrado
demais, o nariz levemente adunco, a pele muito castigada pelo clima. Mas
exalava boa saúde, força e competência. Atravessara o oscilante convés sem
vacilar. O vento açoitou seus cabelos quando ela se virou mais uma vez de
frente para o mar. Concentrou-se no cenário - o Aquário, as Torres do Porto, os
cais com o sortimento de pesqueiros e petroleiros, os restaurantes da orla. Só
quando Matt retornou, ela sorriu e percebeu como era muito mais bonito
àquela vista com ele a seu lado.
     - Duas limonadas. - Ele entregou-lhe uma. - O spritzer estava além da
compreensão do barman, e as outras bebidas eram menos leves. Havia alguns
cachorros-quentes lá, mas me pareceram muito ruins.
     Tirou um saco de batata frita de debaixo do braço, abriu-o e estendeu-o.
Ela mastigou uma, depois a engoliu com um gole.
     - Fale-me sobre Brad - pediu ela, surpreendendo-se ao fazê-lo.
     Com expressão sombria, ele a examinou.
     - Não sei se você realmente quer saber - disse Matt. Ela atribuiu à sua
própria ambivalência a hesitação dele em responder.
     - Talvez você tenha razão. Mas... Acho que na verdade estou curiosa.
Jamais estive com alguém que o conheceu depois que ele partiu. Não sei se
devo deixar escapar a oportunidade.
     Matt colocou várias batatas na boca.
     - O que você quer saber? - perguntou mordendo as batatas com força.
     - Ele trabalhava na mesma empresa que você?
     - Não.
     - Brad sempre morou em São Francisco? Ela sabia que fora onde o irmão
morrera.
     - Começou a trabalhar em Sacramento.
     - Como carpinteiro.
     - Isso mesmo. Mas quando chegou a São Francisco já vinha fazendo
muitos projetos.
     - Projetos de que? Matt hesitou um instante.
     - Casas, na maioria. Alguns parques públicos. Como arquiteto, tinha um
dom nato.
     - Era assim que o viam... como arquiteto?
     -    Não. Ele não tinha as credenciais. Era como um ghost-writer,
apresentando esboços rudimentares ao arquiteto da empresa, que depois os
embelezava e formalizava.
     - Você conhecia a empresa na qual ele trabalhava?
     - Éramos concorrentes.
     As palavras saiam simples e francas, mas alguma coisa na maneira como

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

Matt as dizia dava a Lauren a impressão que ele não tinha muito interesse pela
empresa de Brad.
      - Mas apesar disso eram amigos. Como funcionava isso?
      Matt pareceu relaxar um pouco.
      - Muito à vontade - Nossos respectivos superiores tinham a patente da
rivalidade. Brad e eu preferíamos fraternizar com o inimigo.
      - Como se conheceram?
      - Num clube de boliche.
      A expressão dela ficou distante.
      - Estranho, não consigo imaginar Brad jogando boliche. Mas também não
consigo imaginá-lo suando no telhado de uma casa. - Deixou as divagações. -
Que mais faziam juntos?
      - Comíamos fora. As vezes duas refeições por dia. Passávamos férias
juntos... éramos seis amigos, na verdade. Descemos de balsa o rio Colorado,
viajamos a cavalo por partes de Montana. Era divertido.
      - Muito machões - provocou ela, e foi presenteada com um encabulado
sorriso dele.
      - Imagino que sim.
      O sorriso dela demorou-se um minuto e depois se desfez.
      - Brad nunca se casou. - Soubera disso quando fora informada pelo
advogado que era a única beneficiária do patrimônio do irmão. - Eu gostaria de
saber por quê.
      - Talvez não tenha encontrado a moça certa, que o aceitasse como ele
era.
      - Você já se casou? - perguntou ela no impulso. Matt encarou-a um
instante, e fez que não com a cabeça.
      - Por que não?
      - Mesmo motivo.
      Ela pensou calmamente na resposta.
      - Entendo isso no caso de Brad. Foi criado numa atmosfera em que a
perfeição intelectual era a única meta válida. Esforçou-se para continuar assim
por algum tempo, depois simplesmente desistiu. Meus pais, nem ninguém do
círculo dos amigos dele, não aceitaram essa atitude. Muito antes de partir, foi
rotulado de desajustado. Tenho certeza que isso feria sua sensibilidade.
      - Todos temos nossas sensibilidades.
      - Quais são as suas, Matt? Por que iria uma mulher ter problema em
aceitar você como é?
      Ele mastigou várias batatas fritas novamente, e teria parecido
perfeitamente desinteressado não fosse o escurecimento dos olhos.
      - Sou um operário braçal. Não tenho títulos, numa série de elegantes
iniciais qualificativas para acrescentar ao fim do meu nome. Ao longo dos anos,
tenho me saído bem no trabalho, mas isso não significa que aspiro um dia ter
minha própria empresa, nem que um dia não decida abandonar e voltar a
construir cabanas rústicas de madeira. Se uma mulher achar que vai conseguir
um futuro magnata imobiliário, é melhor pensar duas vezes.
      Não escapou a Lauren o ressentimento nas palavras dele.
      - Você deve ter sido humilhado.
      - Várias vezes. - Ele desviou o olhar para a água e suavizou o tom, que

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

se tornou tímido o bastante para dissipar a arrogância. - Sempre atraí
mulheres com muita facilidade. Mas atração física não basta. Não com uma
perspectiva de sucesso duradouro.
     - A grama do vizinho é sempre mais verde... - comentou ela baixinho. -
Algumas de nós adoraríamos ter uma aparência atraente.
     Matt examinou-a como se ela fosse insana.
     - Mas você tem! Não acredito que não tenha uma lista de homens à
espera para levá-la para sair!
     Lauren precisou de um minuto para perceber o que dissera, e por que
Matt respondera tão vigorosamente como o fizera. Esquecera. Isso acontecia
muito. Um lento calor subiu-lhe pelo pescoço. Os elogios ainda eram novos
para ela, ainda mais de um homem com um físico tão maravilhoso como o de
Matthew Kruger...
     - Não sei de lista alguma - respondeu apenas.
     - Então é apenas um?
     Ela fez que não com a cabeça.
     - Você é uma mulher linda, Lauren. Com certeza tem recebido propostas.
     Mais uma vez ela abanou a cabeça, negando desta vez com um sorriso
encabulado.
     - Por que não?
     Diante da franqueza dele, ela desatou a rir.
     - Você é quase tão pouco diplomático quanto Beth.
     - Lamento. Só fiquei curioso. - Ergueu uma das mãos grandes e bem
formadas. - Não quero dizer que devia ser casada. Você só tem, quantos, 29
anos, e está obviamente construindo uma carreira promissora. - Ocorreu-lhe
uma nova idéia, e ele franziu o cenho. - Você disse que não está cm Boston há
muito tempo. Então a loja é recente?
     - Inauguramos há pouco mais de um mês.
     - E antes disso?
     - Eu trabalhava num museu em minha cidade natal Ele passou o dedo
indicador pela borda do copo de papel.
     - Cidade natal. Isso talvez explique. Brad me falou sobre a cidade natal.
     - Que foi que ele disse?
     - Que era sufocante. Unidimensional. A pessoa só podia ser artista ou
acadêmico afiliado à universidade.
     - Estava sendo injusto. Bennington é um lugar lindo. Algumas pessoas
fascinantes optaram por morar lá. Brad simplesmente não.
     - Nem você, ao que parece. Por que partiu, Lauren?
     - Porque eu queria abrir a loja.
     - Mas podia ter aberto uma loja em Bennington. Ela fez que não com a
cabeça.
     - O mercado é pequeno demais.
     - Então está atrás de vencer em grande estilo.
     - Quero que a loja seja um sucesso, sim - disse ela num tom defensivo. -
Talvez não aspire a publicar um tratado profundo atrás de outro, como fazem
mamãe e papai, mas isso não significa que não posso almejar ficar bem e
próspera.
     O sorriso de Matt transmitia uma certa melancolia.

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     - Agora você ficou mesmo igual a Brad. Ele era muito determinado...
     Um lampejo de incerteza atravessou o semblante dele.
     - Muito determinado...?
     Passou-se algum tempo antes de Matt concluir a frase, e então o fez com
cuidado.
     - A ser bem-sucedido. Reconhecido. Não sei se realizou ou não o que o
motivava, mas como muitas vezes afirmava que vinha construindo seu próprio
negócio e não ligava para o que pensava a família, acho que estava brincando
consigo mesmo.
     - Ele era feliz, Matt? Matt teve de pensar.
     - De certa maneira, sim.
     Examinando os pedacinhos de polpa de limão grudados nos lados do copo,
Lauren falou mais devagar.
     - Soubemos apenas sobre o acidente; que ele estava supervisionando
uma explosão de dinamite e acabou colhido na confusão. Houve... mais
alguma coisa, além disso?
     - Foi só isso.
     Ele respondera rápido e com firmeza. Sem saber por que, Lauren foi pega
de surpresa.
     - Você o viu logo depois?
     - No hospital. - O tom foi brusco. Quando ele continuou, a aspereza
suavizou-se. - Brad ficou lúcido por algum tempo, mas com os ferimentos
internos e tudo mais... talvez tenha sido para melhor. Se ele sobrevivesse... e
as chances disso eram mínimas desde o início... ficaria tetraplégico. Não acho
que teria condições de suportar.
     - Não - sussurrou ela, e quando ergueu a cabeça, tinha os olhos úmidos.
- Eu me sinto culpada, às vezes.
     - Culpada?
     - Tudo que tenho agora... a loja, a casa de fazenda, isto... - fez um gesto
largo em volta de si mesma - veio do dinheiro que ele me deixou. Você sabia?
     Matt pôs a mão no ombro dela e massageou-o de leve. Sua voz saiu muito
mais gentil, a tensão desviou-se.
     - Foi o desejo de Brad. Fui eu quem o transmitiu ao advogado. Em vista
das circunstâncias, ele ganhou uma certa paz.
     Lauren assentiu com a cabeça, e então, de algum modo, não pôde impedir
o transbordamento de palavras.
     - Não fosse por ele, eu com certeza ainda estaria em Bennington. A parte
o dinheiro, a morte dele foi um ponto decisivo para mim. Pela primeira vez na
vida parei para pensar em minha própria mortalidade, no que teria como
crédito quando chegasse a hora, no que estaria deixando para trás. Foi quando
decidi me mudar para Boston e abrir a loja. Só desejaria que Brad pudesse
saber como me sinto melhor comigo mesma agora.
     - Basta que você saiba, Lauren. Se Brad estivesse aqui para vê-la, estou
certo que se sentiria orgulhoso.
     Ela fitou-o timidamente, desviou o olhar e inspirou de forma longa e
trémula.
     - É ruim demais não podermos ter as duas coisas... ruim demais não
poder ter o que tenho e Brad vivo para ver.

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Rainhas do Romance 08                        Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

      Passando o braço pelas costas dela, Matt puxou-a para junto de si. O calor
que ele emanava era o conforto que ela precisava.
      - A vida é cruel assim mesmo, cheia de escolhas e concessões. Mesmo
quem chega ao sucesso faz sacrifícios pelo caminho. O melhor que podemos
fazer é decidir exatamente o quanto estamos dispostos a abrir mão e seguir
em frente.
      Ao erguer o olhar para ele, ela roçou a face em seu ombro. Pareceu um
gesto inteiramente natural.
      - Mas é uma visão negativa.
      - É realista.
      - Talvez eu seja mais romântica, então. Quero me concentrar nas metas e
enfrentar os obstáculos ao me deparar com eles.
      Ele encolheu os ombros.
      - E eu quero estar preparado para os obstáculos. É apenas uma visão
diferente. Quem pode dizer qual a melhor?
      Lauren não respondeu. Ficou com o olhar de repente perdido no dele, e
esforçou-se para aguentar a intensidade. Embora ele fosse quase um estranho,
ela contara-lhe coisas que nunca revelara a ninguém, isso devia-se ao fato de
ele ser uma ligação com o irmão, ou ser um bom ouvinte, ou ter partilhado
seus próprios pensamentos com ela? Ficara desconfiada dele a princípio; ainda
desconfiava, em alguns aspectos. E no entanto... e no entanto, sentia-se
atraída por ele...
      O barulho da buzina do barco fez os dois saltarem. Olharam em volta e
viram a maioria dos passageiros amontoada no outro lado do convés,
acenando para um navio alto que passava. Sem soltá-la, Matt foi juntar-se a
eles.
      - Impressionante - sussurrou, admirando os altivos mastros e acessórios
antigos da imponente embarcação. - É uma grande pena que não navegue a
vela.
      - É quase decepcionante. Não existiam motores antigamente.
      - Nem Walkmans Sony.
      Matt apontou o marinheiro pendurado no cordame, os fones de ouvido
firmemente instalados. Lauren sorriu da visão, e desviou o olhar para o
aeroporto.
      - Se eu tivesse um escritório no centro da cidade, com essa vista, não
acredito que conseguiria terminar qualquer trabalho. Poderia ficar sentada
durante horas vendo os aviões decolarem e pousarem.
      - Eu, não. Só olhá-los me dá calafrios. Sou um passageiro sempre em
pânico.
      Ela olhou-o, descrente.
      - Um homem desse tamanho?
      - Os homens grandes caem com mais peso. Ela reprimiu um sorriso.
      - Acho que tem razão. Mas você viaja de avião.
      Ele fez uma expressão que era, uma mistura de repulsa e resignação.
      - Quando necessário.
      - O que é frequente demais para seu gosto.
      - Acertou em cheio.
      Os olhos dela adquiriram um brilho extra.

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Rainhas do Romance 08                        Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     - Acho que eu jamais poderia voar com mais frequência. Não que tenha
viajado tanto de avião, mas sempre fiquei tão excitada com a idéia de chegar
ao lugar de destino ia que simplesmente me recostava e relaxava. É quase
tudo que se pode fazer, você sabe. Assim que ganhamos altura, ficamos nas
mãos do destino. Não há como termos controle sobre qualquer coisa que
aconteça com o avião.
     Ele soltou um eloquente grunhido.
     - É isso que me aborrece. Eu gosto de estar no controle. Como gosto de
avaliar os obstáculos...
     Lauren estreitou os olhos com um ar brincalhão.
     - Aposto que você é do tipo que vistoria cada centímetro de um novo
carro antes de aventurar-se a guiá-lo.
     - Também provo o creme chantilly, depois a castanha moída, depois a
calda de chocolate, depois o sorvete, antes de pôr na boca uma colher cheia de
sundae.
     - Mas onde está a surpresa, então?
     - Na mistura perfeita dos ingredientes. Do jeito que faço, minimizo o risco
de decepção. Se uma coisa não está certa, posso mandar corrigir, e se não
puder fazê-lo, pelo menos estou preparado, por isso minhas expectativas se
equiparam à realidade.
     - E um homem cauteloso.
     - Totalmente.
     - Mais um motivo para ter ficado sentado defronte à minha loja por dois
dias. - Ela inclinou a cabeça. - Me diga, o que teria acontecido se eu fosse
exatamente como aquela foto que você tinha visto?
     - Eu teria entrado no primeiro dia.
     Lauren perguntava-se se ele teria mesmo entrado.
     - Eu não entendo. Minha aparência deixa você cauteloso.
     - Isso mesmo.
     - Mas... estou melhor do que na foto, não estou?
     - Está linda.
     - Então?
     Atolada em confusão, não fez protesto algum quando ele a virou para
olhá-la e cruzou os pulsos em sua nuca.
     - As mulheres magníficas me intimidam. Tive decepções, lembra?
     Desta vez o sorriso dele não a tranquilizou. Ela arregalou os olhos.
     - Acha que estou interessada no seu corpo?
     Ela estremeceu e disparou um olhar encabulado para cada lado.
     - Quieta.
     Lauren pegou-lhe os braços para afastá-lo. Quando ele a segurou com
firmeza, ela sussurrou, com veemência.
     - É isso que você acha? Então deixe-me dizer o seguinte: eu não lhe pedi
que entrasse em minha loja. Não lhe pedi que me levasse num cruzeiro. Não
quero parte alguma de seu corpo! E mesmo que quisesse, não seria apenas
isso que eu iria querer. Antes de chegar ao corpo, deixaria claro que queria o
resto. - Ela arfou, indignada e virou o rosto para o outro lado. - Logo um
egocêntrico, arrogante...
     - Não foi isso que eu quis dizer, Lauren. Você está tirando conclusões

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

precipitadas. Já lhe ocorreu que pode intimidar um homem?
      - Eu?
      - É, você. Eu vinha esperando encontrar uma moça tranquila... - ele
hesitou, e então pigarreou - ...meio magra e sem graça, levando uma vida
igualmente sossegada no campo. Pelo menos, era o que Brad dava a entender.
Se ele pudesse ver você agora! É dona de sua própria loja... no centro
empresarial da cidade, nada menos. É linda. Veste-se com muita elegância. É
inteligente o bastante para afugentar qualquer um. E com toda certeza não vai
cair aos meus pés. - Ele inspirou, ressentido. - Sim, me sinto intimidado.
      Lauren ficara em suspense durante o breve discurso dele. Agora percebia
como devia ter parecido absurda sua afronta.
      -   É estranho - conseguiu dizer em voz baixa -, você não parece
intimidado.
      Ele cerrou bem os olhos. Mesmo antes de relaxar e abri-los, um sorriso já
começara a formar-se em seus lábios.
      - Acho que agora não estou, pelo menos não tanto quanto antes. Para
alguém que é linda, chique e super inteligente, você é realmente bastante
natural.
      Ela sorriu, encabulada, desviando o olhar.
      - Acho que estamos perdendo o pôr-do-sol.
      - Tem razão.
      Retornaram ao lado da amurada onde tinham se instalado antes, depois
trocaram de lugar quando o barco fez uma lenta curva e dirigiu-se de volta às
docas. Nenhum dos dois disse muita coisa. Lauren, por exemplo, ficou absorta
em seus próprios pensamentos.
      Apesar da explicação dele, continuava perplexa por sua aparência tê-lo
intimidado. No inicio apenas, mas seu orgulho fora ferido. A idéia que
melhorara completamente a aparência apenas para constatar que isso
mantinha os homens a distância era perturbadora; por isso reclamara. Ou
estivera apenas à procura de algo que pudesse servir de motivo para se
interpor entre Matt e ela?
      Ele também era atraente, muito agradável como companhia, firmemente
alinhado como Brad e tinha um estilo de vida que fora ensinada a reprovar.
Não, não estava desaprovando-o agora, mas tampouco podia ignorar a
decepção do abandono do irmão muito tempo atrás. E depois veio a culpa.
Concordara com a opinião dos pais de que Brad era um fracasso, mas aceitara
o dinheiro dele - muito dinheiro. Teria um arquiteto disfarçado de carpinteiro
ganho todo aquele dinheiro? Guardara no banco cada centavo poupado durante
11 anos? Compreendeu que precisava fazer várias outras perguntas a Matt
sobre o irmão. Em retrospecto, questionava-se se ele fora evasivo quando
falara do trabalho de Brad. As respostas haviam sido breves, a expressão
solene. Ele contara mais sobre a vida pessoal do irmão, mas ela não podia
deixar de perguntar-se se deixara de mencionar algumas coisas.
      O barco encostou no cais, prenderam-se as cordas e baixaram a prancha
de desembarque.
      - Você deve estar faminta - disse Matt. - Quer comer alguma coisa em
meu hotel?
      O Marriott ficava apenas a uma curta distância de onde se achavam, mas

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

ela logo abanou a cabeça.
     - É melhor eu ir direto para casa. Foi um longo dia.
     - Tem certeza?
     Desta vez ela não se rendeu à suavidade cor de chocolate do olhar dele.
Precisava de tempo para habituar-se ao aparecimento daquele homem em sua
vida. Era uma figura do passado de Brad, mas sua proximidade a
desequilibrava. Na verdade, ansiava pela sólida firmeza de sua própria casa.
     - Tenho - respondeu com um sorriso delicado. - Mas... obrigada, Matt. Foi
delicioso.
     -     Pelo menos me deixe acompanhar você até seu carro. Está muito
escuro.
     - Mas o caminho até meu carro é muito bem iluminado do começo ao fim.
Verdade, vou ficar bem.
     Matt empertigou os ombros e assentiu com a cabeça.
     - Tome cuidado, então.
     Ela se encaminhou para o carro.
     - Boa sorte com seu trabalho. Espero que saia tudo bem.
     Ele assentiu mais uma vez com a cabeça, acenou, virou-se e dirigiu-se
para o hotel. Lauren só olhou para trás depois que atravessara a avenida
Atlantic, e a essa altura ele já desaparecera.


     O sol do cair da tarde fulgia brilhante acima das colinas de Hollywood,
rnas as persianas no gabinete haviam sido baixadas quando o proprietário
entrou, encaminhou-se a passos largos pelo piso de cerâmica até a
escrivaninha e pegou o telefone. -Sim?
     - Estamos chegando próximo.
     - Já era hora. Eu imaginava que ia ter notícias dela mais cedo.
     - É uma moça esperta. Cobriu seus rastros como uma profissional...
quase. Ainda não sei quem a ajudou a sair de Los Angeles, mas você tinha
razão sobre as Bahamas. Ela voltou à mesma clínica que visitou quando vocês
dois passavam as férias no último outono. Foi o único deslize.
     - Então você a encontrou?
     - Fez cirurgia plástica, exatamente como você achou que faria. Não muita
coisa. Mudanças sutis. Encontrei um instantâneo falsificado de "antes" nos
arquivos do médico e um monte de históricos médicos enganadores, mas o
instantâneo "depois" tinha semelhança suficiente com a aparência real para
desmascará-la. Os cabelos estão diferentes, mais escuros e curtos. E ela
adotou outro nome.
     - Sabíamos que faria isso. Onde está ela?
     - Boston. Acabou de abrir uma pequena loja de reproduções e molduras.
     -    Com o dinheiro dos presentes que eu dei a ela. Uma loja de
reproduções e molduras. É muito cara.
     - Você ficaria espantado se a visse. É a imagem da inocência. Roupas
simplesmente muito... elegantes, mas discretas, nada chamativo como antes.
Dirige um Saab que deve ter comprado de segunda mão. Tem uma mulher
trabalhando na loja que parece quase tão pura quanto ela, e um rapaz que na
certa faz o que ela...

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

     - E as jóias? Localizou o disfarce?
     - Não. Nenhum sinal das jóias. Ela talvez tenha começado com as peles.
Seriam mais fáceis de vender e quase impossível de refazer o paradeiro.
     - Fez algum contato com ela?
     - Tenho alguém bom para isso. Ela já sofreu dois "acidentezinhos"... nada
ainda para machucá-la, na verdade, apenas para fazê-la começar a perguntar-
se.
     - E começou?
     - Sim. Anda olhando nervosamente em volta do jardim, toda vez que sai
da casa.
     - A casa?
     - Uma velha casa de fazenda que comprou fora da cidade.
     - Com meu dinheiro.
     - Vai voltar tudo para você. Entre a loja e a casa, ela fez investimentos
que retornarão com juros.
     - Quero que encontre as jóias.
     - Estamos procurando. Ela não guardou em casa. Revistei eu mesmo o
lugar hoje.
     - Revirou tudo?
     - Nada tão óbvio assim. Apenas mudei de lugar umas coisinhas aqui e ali.
Ela vai desconfiar que alguém anda bisbilhotando, mas não terá suspeita
bastante para chamar a polícia.
     - Ela não ousaria chamá-la.. Sabe como sou bem relacionado, e não faria
nada para arriscar pôr a perder sua nova identidade. Então aonde vamos daqui
em diante?
     - Ainda tenho mais alguns contratempos prontos bem escondido. Você
quer que ela se contorça. Eu quero que ela se contorça. Ela vai se contorcer.
     - Está se divertindo à beça, não?
     - Posso dizer que sim. Eu acho que, como o decepcionei antes, e a culpa
foi dela, esta vai ser a minha vingança.
     - A vingança é minha, e não esqueça isso.
     - De jeito nenhum, chefe. De jeito nenhum.


Capitulo Quatro

     Beth a esperava ansiosa quando Lauren chegou à loja na manhã seguinte.
     - E aí? Como foi? O que aconteceu? Seus pais morreriam se soubessem
que você saiu para um encontro com ele, mas eu acho maravilhoso! Um
cruzeiro de pôr-do-sol... Nunca ouvi falar de coisa mais romântica. Ele talvez
seja meio rude, mas tem charme. Foi agradável com você? E o convidou para
ir a Lincoln depois do cruzeiro? Quase liguei para você, mas não ousei. Me
conte, Lauren. Conte tudo!
     Seguida de perto pela amiga, Lauren continuou atravessando a loja até a
sala dos fundos e guardou a bolsa na gaveta de baixo do armário de arquivos.
     - Como posso lhe contar alguma coisa se você não me dá chance para
dizer uma palavra?
     - Tudo bem. Vou ficar calada. Fale.
     Lauren apenas desejou saber o que dizer. Passara boa parte da noite

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Rainhas do Romance 08                        Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

pensando em Matthew Kruger, e ainda não sabia que conclusões tirar dele.
      - Sim, ele foi simpático. O cruzeiro foi agradável. Romântico? Isso eu não
saberia dizer. E não, não o convidei para ir comigo a Lincoln.
      - Por que não?
      - Porque não era necessário. E não saí para um encontro. Ele era amigo
do meu irmão. Só isso. Conversamos um pouco sobre Brad e sobre outras
coisas. Apenas isso.
      - Ele explicou por que ficou rondando lá fora por dois dias?
      Pela primeira vez nessa manhã, Lauren sorriu. Indiferente.
      - Se conseguir acreditar nisso, ele contou que vinha tentando reunir
coragem para entrar. Brad tinha lhe mostrado uma fotografia minha. Eu não
era bem o que ele esperava.
      - Mas que maravilha! - exclamou Beth arregalando os olhos. - O belo
príncipe se sentiu tão fascinado com sua beleza que ficou na verdade
apavorado. Que maravilha!
      Lauren contraiu o rosto e cuidadosamente falou:
      - Belo príncipe? Fascinado com minha beleza? Apavorado? Que é que
você anda lendo, Beth?
      - Admita. Eu acho tudo incrível. Vai sair de novo com ele?
      - Não sei.
      - Que quer dizer com não sei?
      - Apenas isso. Ele não disse nada sobre sairmos novamente, e eu não ia
permitir intimidades tão rápido.
      Lauren pegou uma lata de café e começou a pôr colheradas do pó num
filtro.
      - "Permitir intimidades" - murmurou Beth. - palavras corretas saídas da
boca da antiga Lauren. A nova você é muitíssimo desejada. Estaria fazendo um
favor a ele pensar em vê-lo mais uma vez... E aí?
      - E aí o quê?
      - Vai?
      - O quê?
      Lauren calculou a água e despejou-a na cafeteira. Beth deu um suspiro de
frustração.
      - Pensar em sair com ele de novo.
      - Eu não sei.
      Quando o café começou a pingar devagar na garrafa, Beth revirou os
olhos e resmungou.
      - Que absurdo. A gente está entrando num círculo vicioso. Você quer ou
não sair com esse homem de novo?
      Lauren virou-se de frente para a amiga.
      - Eu não sei! Ora, Beth, como posso lhe dar uma resposta melhor se eu
não tenho nenhuma? Sim, eu gostei dele, e em circunstâncias normais teria o
maior prazer em vê-lo de novo. Mas não se trata exatamente de circunstâncias
normais. Em primeiro lugar, ele mora na Costa Oeste. Só está aqui a trabalho,
cuja maior parte o mantém na parte ocidental do estado. Vai voltar para São
Francisco e tem horror a viajar de avião. Não tenho exatamente tempo de
viajar para vê-lo todo fim de semana... isso sem falar no dinheiro, quando me
propus a fazer tantas outras coisas prioritárias. - Ela inspirou fundo. - E em

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Rainhas do Romance 08                       Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas

segundo lugar, ele era amigo de Brad. Você tem razão. Meus pais iriam ficar
enfurecidos.
      - Você é adulta. Não queriam que fosse às Bahamas, mas você foi. Não
queriam que partisse de Bennington nem abrisse esta loja, mas você fez as
duas coisas. Não precisa da permissão deles. Pode fazer o que você quiser e
ver quem quiser. Lauren exalou o ar profundamente.
      - Sei disso, Beth. Não estou pedindo a permissão deles para nada. Tenho
meus próprios escrúpulos sobre sair outra vez com Matt. Ele era amigo de
Brad. E vê a mim e a meus pais, pelos olhos de Brad. É um solteirão
consumado que adora viajar com os amigos e descer corredeira abaixo por
uma semana. Então qual o sentido de levar isso adiante?
      - O sentido - murmurou Beth, arqueando as sobrancelhas - é que ele é
solteiro e magnífico.
      - Achei que era muito rude para você.
      - Para mim, sim. Para você, não. Os dois pareciam maravilhosos saindo
daqui juntos ontem à noite. Ouça o que digo, veja até onde isso vai chegar.
      - Você tem a mente tacanha - grunhiu Lauren, tirando um fio de cabelo
do vestido de jérsei cor de damasco e cintura baixa.
      - E você está de péssimo humor. Cadê seu senso de humor? Escute,
tenho certeza de que Matthew Kruger será o homem perfeito para afugentar o
fantasma que anda frequentando a sua fazenda.
      - Besteira. Estou começando a achar que preciso fazer alguma coisa.
Aquele "fantasma" entrou mais uma vez em ação.
      Beth piscou os olhos uma vez, e depois outra. O café continuava a gotejar
no fundo, o forte aroma flutuando da garrafa e espalhando-se pela pequena
sala.
      - Como disse?
      - O "fantasma". Juro que andou mexendo em minhas coisas ontem.
      - Espere um minuto, Lauren. Não existe isso de fantasmas.
      - É você quem anda dizendo.
      - Eu estava provocando.
      - Então imagino que provocou um pouco demais. Estou quase me
tornando uma crente.
      - Não está falando sério!
      - Talvez não. Mas mesmo assim... foi misterioso. Eu podia jurar que tinha
posto algumas coisas em determinados lugares lá em casa, e elas continuavam
lá, só que... deslocadas de algum modo.
      Beth recostou-se na cadeira e cruzou os braços no peito. Parecia ser uma
psiquiatra, pelo tom indulgente da voz.
      - Acho que vai ter de ser mais específica. De que modo elas foram
"deslocadas"?
      - Pequenas mudanças de posição. Um frasco de perfume virado de
costas, de forma que o pássaro esculpido no vidro se voltava para a parede.
Um par de sapatos bem arrumado no armário, com o da direita na esquerda e
o da esquerda na direita. Uma calcinha dobrada à perfeição, mas pelo avesso.
Sempre viro do lado direito antes de dobrá-las. Calcinhas. - Estremeceu, e
sussurrou, desanimada - Dá para acreditar nisso?
      - Talvez você devesse chamar a polícia.

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Ameaças após cirurgia

  • 1. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas Ameaças e Promessas (Barbara Delinsky) Título Original: Threats And Promises PUBLICADO SOB ACORDO COM HARLEQUIN ENTERPRISES D B.V./S.à.r.l. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Copyright © 1986 by Barbara Delinsky Originalmente publicado em 1986 por Harlequin Intrigue Digitalização: Polyana Revisão: Vanessa Cristina Resumo: Após fazer uma cirurgia plástica no rosto, Lauren Stevens estava tão preocupada com o novo visual e os recentes investimentos com o dinheiro que herdou de seu irmão que nem percebeu a ocorrência constante de “pequenos incidentes”. Mas os incidentes ganham uma dimensão bem maior quando ela começa a ser perseguida e ameaçada de morte. Para aumentar seu desespero, um homem chamado Matt Krueger pasa a estar sempre ao seu lado, afirmando ter sido amigo do irmão dela. Atraente demais, fácil demais e interessado demais em protegê-la, Matt torna-se o principal suspeito de ser o verdadeiro algoz de Lauren. Afinal, poderia alguém como ele simplesmente surgir do nada? Prólogo A escuridão da noite estendia-se densa no jardim da opulenta propriedade nas colinas de Hollywood, onde dois vultos obscurecidos, ambos de homens, conversavam em tom baixo. Um alto, forte e agitado; o outro elegante, arrogante e calmo. - Você tem certeza? Absoluta certeza? - exigiu saber o elegante, Projeto Revisoras 1
  • 2. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas parecendo menos elegante que o habitual ao observar a escuridão e fixar os olhos impiedosamente no companheiro. - Ela não estava naquele carro - insistiu o mais alto, sem se alterar. - Você disse que estava. Eu a enterrei. - Enterrou as cinzas que achamos serem dela. Nós nos enganamos. Embora as narinas do elegante se dilatassem, ele manteve a voz baixa. - E como pode ter certeza de que não era ela? - Um dos nossos homens ouviu comentários próximo à sala do médico- legista encarregado da morte suspeita. Não se encontrou prova alguma do corpo, carbonizado ou não. Uma bolsa e sapatos queimados, mas nenhum corpo. Em âmbito não oficial, claro. Oficialmente, no que se refere ao calor, está morta. O arrogante praguejou baixinho. Tirou um maço de cigarros do bolso e mal teve tempo de levar um à boca quando o subalterno riscou um fósforo com a unha do polegar e acendeu-o. - Nenhum corpo - resmungou ele, endireitando os ombros. - Então ela conseguiu escapar, O irrequieto teve bom senso suficiente para ficar imóvel. Sabia o que ia acontecer, sabia que iam descartá-lo do trabalho. - Quero que seja encontrada - grunhiu o elegante. -Quero que seja encontrada já. - Mesmo assim, o outro permaneceu calado. - Ela não tinha família, pelo menos nunca me falou que tivesse. Não tinha contato com mais ninguém, e seus amigos eram os meus. - Uma longa tragada no cigarro iluminou momentaneamente a ponta vermelha em brasa. - Deve ter tido ajuda. - A fumaça saiu enroscada com as palavras e dissipou-se no ar. - Nova identidade, novo endereço, dinheiro... Maldição! - disse por entre dentes cerrados, as engrenagens girando na mente. - Ela vendeu as jóias. Não houve arrombamento nem roubo. A desgraçada pegou as jóias e vendeu! - Eu vou encontrá-la. - Com toda certeza vai. Meio milhão em diamantes e rubis, para não falar em mais quatrocentos mil em peles... mulher nenhuma pode me roubar assim! - Quer que eu a traga de volta? O chefe do mais forte pensou na pergunta, acariciando a pele recém- raspada acima do lábio. Quando falou, a voz saiu mais uma vez baixa e sombria. - É uma ladra. É traidora. Eu dei a ela um enterro digno de uma rainha. Não vou sofrer o vexame de vê-la materializar-se da sepultura. - Fez uma pausa momentânea antes de continuar, à sua maneira pervertida polida, arrogante e cerebral. - Ela está morta. É assim que a quero. Faça-a contorcer- se primeiro. Diga que sei o que ela fez. Pegue as jóias e o que mais conseguir. Depois providencie para que seja enterrada, desta vez com uma lápide sem identificação. Lançando o cigarro no gramado, esmagou-o sob a sola do sapato de couro importado. Alisou o paletó social de seda, empinou o queixo e encaminhou-se calmo e frio para casa. Capitulo Um Projeto Revisoras 2
  • 3. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas Lauren Stevenson olhava-se no espelho. E olhava-se. E olhava-se. - Por mais tempo que eu continue aqui - disse, ofegante - não consigo acreditar que sou eu! Richard Bowen sorriu para o reflexo dela. - É você, e se quer a minha opinião, está maravilhosa. Ela lançou-lhe um tímido olhar. Nas semanas durante as quais passara a conhecer esse homem, sentia-se inteiramente à vontade com ele como seu médico. Mas não podia ignorar o fato de que era atraente; por isso o elogio teve mais significado. - Sou capaz de apostar que diz isso a todas as mulheres que operou. - Não necessariamente. Algumas ficam apenas bem. Outras, melhores que antes. Quanto a isso - acrescentou ele, piscando um dos olhos - certas mulheres eram melhores antes da cirurgia. - Você não diz isso a elas, diz? - repreendeu-o. - Está brincando? Se é a vaidade que as traz aqui, não tenho a intenção de arranjar uma inimiga para toda a vida. Mas não foi a vaidade que a trouxe, Lauren Stevenson, foi? Ela fez que não com a cabeça. - Foi por necessidade. - Mais uma vez, examinou-se no espelho. - Mas continuo espantada. Sabia que teria uma melhora... - Interrompeu-se. O narcisismo era estranho à sua natureza. Ficou com as maçãs do rosto enrubescidas e a voz humilde. - Eu não esperava nem metade desse resultado. O sorriso de Richard foi de intensa satisfação. - Os casos como o seu são os mais satisfatórios. Você tinha as feições de uma verdadeira beldade quando entrou aqui. Só foi necessária uma pequena reorganização. Lauren correu as pontas do dedo pelo nariz reto, suavemente, e depois pelo recém-reformado contorno da mandíbula. - Mais que beleza. - Abaixou a mão e virou-se para Richard. - E ganhei uns cinco quilos durante as mesmas semanas. É estranho, mas imaginava que ficar com os maxilares atados e apenas me alimentar de líquidos faria com que eu perdesse peso. - Você não podia emagrecer, por isso eu a pus numa dieta líquida de alta caloria. E agora, que pode ingerir sólidos, quero que siga corretamente o regime que lhe dei. Ainda pode acrescentar mais uns três quilos a essa estrutura magra e esguia, o que significa que terá de se alimentar bem. Lembre-se, só vai conseguir mastigar um pouco de cada vez até os músculos dos maxilares recuperarem a força. Como tem sido desde que removemos as ataduras? - Um pouco dolorido, mas tudo bem. - Faz apenas três dias. A dor vai passar. Você está falando bem. Em alguns casos, temos de recorrer a um fonoaudiologista, mas não acho que precise se preocupar com isso. - O médico levantou-se do canto da escrivaninha onde estava encostado. Uma suave brisa entrava pela janela aberta atrás dele, trazendo o som do leve farfalhar de palmeiras e a frágil essência de flores de jasmim-manga. - Então, que acha? Pronta para voltar para casa? Ela exalou um suspiro preocupado e seus olhos brilharam. - Não sei. Dois meses e meio nas Bahamas... tratamentos naturais do Projeto Revisoras 3
  • 4. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas corpo, massagens, manicures... sol, areia, e me alimentando com todo o tipo de líquidos deliciosos... Não é uma vida ruim. - Mas o melhor está por vir. Quando parte seu avião? - Em duas horas. - Nervosa? - Com minha estreia? - Ela lançou-lhe um desamparado olhar de desculpa. - Um pouco. - Alguém vai recebê-la quando desembarcar em Boston? - Sim. Beth. Ele franziu os olhos e ergueu um dedo, tentando lembrar os nomes corretos. - Sua sócia na loja, certo? Lauren sorriu. - Correto. Ela está ansiosa por mostrar-me tudo que fez desde que parti. Alugou o espaço que queríamos na área comercial, e, segundo o que escreveu, as reformas já estão quase terminando. Temos encomendas de gravuras e molduras e nos mantemos em estreito contato com os artistas plásticos que vamos representar, portanto é apenas uma questão de mandar emoldurar todo o material e montar a exposição. - Se é que vale minha opinião, Lauren, você me parece uma mulher paciente mas determinada. Tenho certeza de que será bem-sucedida. - Quando ela começou a dirigir-se para a porta, ele passou um braço gentil sobre seus ombros. - Promete me telefonar, contar-me como estão as atividades? - Prometo. - E guardou o nome que lhe dei do especialista em Boston, caso tenha algum problema? - Certamente. - E não vai deixar de comer... comer bem? - Vou tentar. Soltando-lhe o ombro, o médico virou-se para examinar o rosto de Lauren, uma última vez. Absorveu com o olhar a simetria do nariz, a graciosa Unha da mandíbula e o alinhamento agora perfeito do queixo, antes de olhá-la com afeto. - Maravilhosa, Lauren, Acredite em mim, você está maravilhosa. - Obrigada. Obrigada por tudo, Richard. - O prazer é todo meu, bela dama. Ele deu-lhe um forte aperto de mão, tipo "vá agarrá-los", e encaminhou- se de volta para o consultório. A última coisa que Lauren ouviu-o dizer foi um presunçoso mas totalmente enternecedor: - Bom trabalho, Richard. Desta vez você nos deixou orgulhosos. Rindo baixinho, ela pegou a maleta na recepção e dirigiu-se ao aeroporto. - Você... está... maravilhosa!- foi a primeira coisa que Beth Lavin conseguiu dizer em meio à surpresa, após Lauren ter-lhe sorrido por um minuto, para que ela percebesse que era de fato Lauren Stevenson quem estava diante dela. As duas se abraçaram, e Lauren riu. - Você disse a mesma coisa que o meu médico. - Ora, ele tem razão! - falou Beth, arregalando os olhos. Com as mãos nos ombros de Lauren, deslocou a amiga para um lado e para o outro. - Inacreditável! Seu perfil está magnífico, Lauren, até engordou um pouco, os Projeto Revisoras 4
  • 5. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas olhos parecem enormes, separados, e além disso você também cortou os cabelos... Num gesto tímido, por puro hábito, Lauren passou os dedos pelos cabelos castanhos acima da orelha, para que caíssem para a frente. Então se deteve. Com um esforço coordenado, terminou o movimento para trás delicadamente, deixando uma mecha em volta das orelhas, para mostrar o rosto, o qual escondera durante anos. - Estou bem mesmo? Percebia-se honesta ansiedade em sua voz. - Precisa perguntar? Lauren deu um desajeitado semi-encolher de ombros. - Olho-me no espelho e vejo uma nova pessoa, mas em minha mente sou como sempre fui. - Eu não sou psicóloga, mas diria que isso é normal. - A expressão de Beth mostrava excitação e o toque de travessura que Lauren conhecia tão bem. - Uma pessoa diferente... pense nas possibilidades! E se você topasse com alguém que tenha conhecido antes, alguém como Rafe Johnson... - O machão Rafe? - O machão Rafe, que jamais pensaria em olhar para nenhuma de nós, mas que de repente vê essa mulher deslumbrante e não resiste. Você podia conquistá-lo, sair com ele, e depois revelar sua verdadeira identidade, e deixá- lo de repente. Ah, que satisfação! - Você é terrível, Beth. Mas Beth fitava-a de novo, desta vez com um toque de respeitosa reverência. - Talvez... Nossa, você está maravilhosa - repetiu, momentos antes de fingir que estava horrorizada. - E eu vou parecer muito sem graça a seu lado! - A chance é enorme, Beth Lavin. - Lauren envolveu um dos braços da amiga e rumaram para a esteira de bagagem. Sabia que Beth era atraente; e também que conservava os cabelos castanho-escuros no mesmo estilo de penteado - longo, reto -, há 15 anos, e suas roupas... a blusa de gola redonda, a saia-envelope e as sandálias baixas de couro que usava naquele dia eram um exemplo... tão interioranas quanto sempre haviam sido. - Nenhuma de nós vai parecer sem graça quando abrirmos aquela loja. Eu aprendi muito lá, Beth. Realizavam seminários sobre penteados, maquiagem e vestuário. Fiz inúmeras anotações... - Claro que sim. - E você também se sairá bem, portanto não me venha com complexo de inferioridade - provocou Lauren, delicadamente. - E então, quais as últimas novidades da loja? Beth inspirou fundo. - Consegui afinal que o anúncio ficasse do jeito que eu queria. Vai ser publicado no próximo número do Boston. Os operários devem terminar as obras daqui a um ou dois dias... o que é bom, porque as gravuras já começaram a chegar. Para não falar nos blocos de pedidos, notas de venda e artigos de papelaria. E as molduras, os ganchos, os fios e as etiquetas. Estoquei tudo no meu apartamento. - Como é o apartamento? Projeto Revisoras 5
  • 6. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Eu gosto. E bem dividido e, a pé, fica a uma distância pequena da loja. Beacon Hill é excitante. - Beth parou para avaliar mais uma vez a amiga. - Você está inacreditável! - Mais um minuto, e vou enfiar um saco plástico na cabeça. - Não ouse. Estou achando o máximo acompanhá-la. Aliás, gostaria que tivesse me deixado escolher um apartamento maior para que a gente pudesse morar juntas. - Morar e trabalhar juntas, nós poderíamos nos desentender. Além disso, você quer a cidade, enquanto eu, o campo. Muitos quartos, espaços descampados, árvores, paz e sossego. - Ainda pensando naquela casa de fazenda. - Sim. - Vai ficar isolada! - Em Lincoln? - perguntou Lauren mexendo o nariz. - Não. Só vou ter menos de dois hectares de terra. Quando as árvores ficarem desfolhadas, é bem capaz que eu veja os vizinhos no outro lado. E a viagem de trem para a loja leva pouco mais de meia hora. - Mas aquela casa de fazenda é um destroço! - Apenas precisa de amor. - Não me diga que já deu um lance. Lauren abriu um sorriso. - Já. - Diante do gemido de Beth, cutucou-a nas costelas, brincando. - Como não consegui deixar de pensar na casa, liguei para o corretor de imóveis. O contrato de compra está pronto para ser assinado. - Lauren, Lauren, Lauren, que é que eu vou fazer com você? Os olhos da amiga cintilaram. - Vai me instalar no seu apartamento esta noite. Amanhã de manhã, vai me levar em excursão ao lugar de nosso orgulho e alegria. E então vamos fazer compras na rua New-bury. - Oh? - Isso mesmo. - Talvez saia muito caro. - É provável - concordou Lauren, sem qualquer remorso. Beth curvou os ombros e deu uma risadinha infantil. - Adoro a idéia, adoro. - Então, bruscamente, estreitou os olhos e nivelou a voz para citar uma manchete de jornal. - Caipiras rurais tomam a cidade de assalto. Transformação de impacto lembra Clark Kent. - Clark Kent? - repetiu Lauren. - Ou Mulher Maravilha, ou seja lá quem for. Claro, você sabe que somos as duas meio sem juízo, não sabe? - Temos 29 anos. Merecemos ser. - Vou dizer o seguinte aos credores quando começarem a ligar. Lauren Stevenson não estava preocupada com eles. Não era esbanjadora, mas se deu conta, afinal, de que a vida é curta demais para ser vivida com timidez. Graças à sua prudente economia e ao legado que havia recebido do irmão por ocasião de sua morte quase um ano atrás, tinha dinheiro suficiente para comprar e reformar a casa de fazenda, pagar a parte não coberta pelo seguro de saúde para a cirurgia corretiva a que se submeteu, comprar um guarda-roupa condizente com a nova Lauren e estabelecer a loja. - Quando a bagagem surgiu na esteira, exclamou: - Aqui vamos nós. Você veio de carro ou pegou Projeto Revisoras 6
  • 7. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas um taxi? - Vim de carro. Juro que o seu carro ficou "tão feliz ao me ver que veio engasgando até aqui". Lauren grunhiu. - Deve estar precisando trocar o óleo. Pensando melhor, precisa sair da cidade. Está vendo? "Ele" quer viver no campo também. As duas deixaram o terminal e dirigiram-se para o estacionamento. - Vai de carro ao norte neste fim de semana? - arriscou-se a perguntar Beth. - Para ver meus pais? Acho que seria melhor. - Imagino que você ficaria emocionada... a "nova você" e tudo mais. Lauren fez uma careta. - Você conhece meus pais. Não são nem um pouco liberais. Não viram necessidade de reconstrução facial. Acharam que eu estava simplesmente ótima antes. - Mas você vinha sofrendo! - Eu sei disso, você sabe, e parte deles também deve saber. Os dois são brilhantes, mas não abrem mão de suas concepções. Acho que associam cirurgia plástica apenas à vaidade, o que não é bem classificado na lista de qualidades. Disseram que me amavam como eu era, e sei que amavam, porque é assim que pensam. Mas eu me sinto tão melhor agora, independentemente do problema médico, que não sei se eles iriam entender. - Claro que iriam. Lauren não continuou a conversa. A ansiedade com a visita aos pais ia muito além da cirurgia de reconstrução a que se submetera. Começava uma nova vida, e grande parte desse modo de viver vinha sendo financiada pelo legado do írmão. Os pais se ressentiam por isso. Brad vivera afastado da família durante os 11 anos que antecederam a sua morte. Colin e Nadine Stevenson não haviam esquecido nem perdoado o que consideravam ser a abdicação do único filho do trono dos literatos. Suspirou ao tornar a falar. - De qualquer forma, vou visitá-los neste fim de semana. Talvez seja a última vez que possa me ausentar por algum tempo. - Sorrindo, disse a Beth: - Tenho a sensação de que as próximas semanas vão ser muito movimentadas. "Movimentadas" era descrevê-las em termos brandos, embora o ritmo combinara com tanta excitação que Lauren não teria nem pensado em reclamar. Com a redecoração da loja concluída, ela e Beth começaram a transferir o material do apartamento da amiga. Gravuras e impressões foram emolduradas e penduradas nas paredes. Grandes pastas de arte, repletas de uma infinidade de estampas, reproduções e serigrafias extras, postas em vitrinas abertas no chão para facilitar a observação dos clientes. Recortaram papéis especiais em formato de material para passe-partout e fundo num infindável sortimento de cores e colocaram em caixas de acrílico em cima do grande balcão feito de ripas de madeira maciça para checagem e pagamento de mercadorias, atrás do qual estavam organizadas amostras de cantos de moldura, cada uma presa à parede com velcro para facilitar a remoção e a substituição. Peças de tecido estampado à mão foram dispostas de forma atraente ao lado de latas contendo Projeto Revisoras 7
  • 8. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas conjuntos de moldura de madeira natural; almofadas combinando pendiam do teto. Lauren assinou o contrato de compra da casa de fazenda em Lincoln e, como já estava desocupada, mudou-se uma semana depois. Seu entusiasmo não diminuiu nem quando ela viu o quanto a casa precisava de reforma. Bastava-lhe ficar na varanda da frente e olhar além do jardim a vegetação que a circundava, ou sentir o perfume das rosas que cresciam pelas treliças laterais da varanda, ou escutar os pássaros que gorjeavam para saber que tomara a decisão certa. E, mais que qualquer coisa, tinha apenas de olhar-se no espelho para compreender que começara verdadeiramente uma nova vida. E, como parte dessa nova vida, ela e Beth foram às compras. Compraram elegantes calças, saias, suéteres coloridos e vestidos leves de verão. Compraram sapatos, terninhos e bijuterias para combinar com as roupas, sentindo-se ligeiramente irresponsáveis, mas ao mesmo tempo desfrutando cada minuto. Nenhuma das duas fora imatura antes na vida, mas agora achavam que mereciam o luxo. Três semanas após Lauren retornar das Bahamas, a loja de serigrafias e moldura foi inaugurada. Era a segunda semana de junho, e o tempo ameno propiciava um fluxo bastante grande de visitantes à sede do governo e ao principal centro empresarial da capital aumentando a circulação de compradores. Com as vendas em alta, Lauren e Beth ficaram tão entusiasmadas que na primeira sexta-feira à noite, após fecharem a loja, resolveram ir ao restaurante Houlihan's comemorar. - Se o movimento continuar assim, vamos ter de empregar alguém para ajudar - sugeriu Lauren. Estavam sentadas no balcão do bar, que estava lotado, tomando drinques gelados, enquanto aguardavam uma mesa. - Para mim que você diz isto? - queixou-se Beth. - Não há tempo suficiente durante o dia para fazer a contabilidade, então tenho trabalhado à noite. E você também vai precisar de tempo para trabalhar com os impressores e o emoldurador. - Vou ligar para o museu. Talvez saibam de alguém que esteja interessado. Caso contrário, podemos anunciar no jornal. Beth balançou a cabeça, mostrando-se satisfeita. - E inacreditável como foram boas as coisas esta semana. Tivemos mesmo muita sorte com a localização da loja. Chegam pessoas de todos os lugares. - O verão é sempre uma estação movimentada, com todos esses turistas na cidade. O Faneuil Hall é uma das atrações a ser visitada - comentou Lauren. - Parece que o inverno é igualmente bom. Pelo menos, foi o que me disse Tom que trabalha na loja ao lado... a de artigos esportivos... Lauren contraiu os lábios de forma maliciosa, - Então já fez amizade com Tom, não é? Está vendo o que roupas e um penteado novos podem fazer? Passando a mão pelos ondulados cabelos pretos recém-cortados na altura dos ombros, Beth arqueou as sobrancelhas. - Olha só quem fala. Aquele rapaz ali não tirou os olhos de você desde que entramos - disse ela, apontando para o local onde estava o tal rapaz.. Projeto Revisoras 8
  • 9. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Ele certamente bebeu demais e está entorpecido e eu simplesmente entrei por acaso na sua linha de visão. - Que absurdo o que você está dizendo! Você não acredita como está bonita? Beth tinha razão. Lauren habituara-se a ser quase invisível no que se relacionava a homens, e é difícil livrar-se de antigos hábitos. Ela então ousou mirar-se rapidamente no espelho atrás do bar, para lembrar-se da mulher que se transformara. E o elegante vestido de algodão de verão nas cores carmesim e creme a tornara ainda mais atraente. Com um brilho conspirativo no olhar, virou-se para Beth e pediu: - Descreva-o para mim. Não quero encará-lo. Embora Beth não tivesse quaisquer desses escrúpulos, falou em um tom pouco mais alto que um sussurro: - Estatura e constituição medianas, terno marrom. Cabelos escuros, um pouco curtos demais. Óculos estilo aviador... deve ser para chamar atenção, pois não combinam com o resto. - A voz de repente se imobilizou. - Espere, tem uma aliança de casamento. - E imediatamente se virou no assento e olhou para frente. - Esqueça. Traria apenas problemas. Lauren riu. - Esquecido. - Isso não a aborrece? Quer dizer, tenho certeza que ele faria uma encenação para você caso aceitasse flertar com ele; e o sujeito é casado. Fazendo um movimento com as sobrancelhas indicando pouco caso, Lauren tomou um gole de sua bebida. - Acho que você está dando muita importância a isso. Eu provavelmente tinha razão desde o início. Ele deve estar embriagado. Beth ficou pensativa. - Vamos ter de fazer alguma coisa sobre esta situação. - Que situação? - Nossa vida amorosa. - Que vida amorosa? - Aí é que está. Não existe. Precisamos conhecer uns rapazes. - Precisamos mesmo. Tom da loja de esportes, Anthony da loja de música no outro lado da rua, Peter, que vende aqueles deslumbrantes moletons pintados à mão, e os seus vizinhos, aqueles três bacharéis... Ainda podíamos reconsiderar o convite e ir a uma das festas deles - sugeriu Lauren. Beth grunhiu. - Provavelmente a gente ficaria tonta só de entrar naquela sala. Tenho certeza de que eles consomem alguma coisa. Sempre que os encontro, parecem estar bem eufóricos. Acredite em mim, fomos espertas o bastante para desistir na última vez que nos convidaram. Somos tão ingênuas que o apartamento podia ser invadido por uma batida policial, todo mundo sair pela porta dos fundos e nos deixar responder pelo consumo de drogas. - Talvez a gente conhecesse um policial bonito. - Não sei, não, Lauren. Ainda acho que você devia ter saído com aquele rapaz que foi à loja na quarta-feira. - Era um estranho, apenas olhando tudo, sem comprar. - Mas bem simpático. E convidou você para tomar um drinque. Por falar Projeto Revisoras 9
  • 10. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas nisso, o que entrou hoje de manhã era ainda mais simpático e mais bonito. - Um estorvo... tentando parecer desinteressado ao perguntar de onde eu venho, onde moro, e até quis saber qual era meu signo. E eu nem sei qual é meu signo. Nunca me interessei por esse tipo de coisa. - Você ficou assustada - afirmou Beth. Lauren hesitou apenas um minuto. - É. - Mas por quê? Já saiu com outros rapazes antes. - Era diferente. - Tem razão. Imagina-se que esta seja a nova vida que você tem levado! - Aparentemente, é. Mas na verdade, acho que vou precisar de mais algum tempo para entender melhor essa mudança. Não sei, Beth. Aqueles homens pareciam muito... rápidos. Muito espertos e sofisticados. - Você parece esperta e sofisticada. - Mas não sou. Você me conhece melhor do que qualquer um. Tenho levado uma vida muito tranquila. Todos os encontros que tive foram com homens calmos, mais sérios, cultos. - Chatos. - Talvez. Mas não sou aventureira. - Talvez precise aprender a ser. - A garçonete chamou-as para a mesa, e Beth retomou a conversa assim que se sentaram. - Talvez devêssemos experimentar um bar de solteiros, ou um serviço de encontros arranjados. - Se não tivemos coragem para ir à festa dos seus vizinhos, jamais teremos para ir a um bar de solteiros. E encontros combinados em agências me causam pânico. - Esses encontros causavam pânico à "antiga" Lauren. A "nova" Lauren não tem com o que se preocupar. Além disso, não é realmente um encontro às cegas se a gente passa por todo o processo do serviço de encontros de com- panhia. Você tem de expressar suas preferências e escolher as possibilidades oferecidas. - Assim como eles têm de escolher uma entre nós. Não, Beth. Não me julgo realmente à altura disso. - Mas temos de fazer alguma coisa. Aqui estamos nós, duas mulheres maravilhosas, brilhantes e disponíveis; devíamos ter como companhia no jantar dois homens igualmente atraentes. - Talvez devêssemos colocar um anúncio no jornal - brincou Lauren, e logo se repreendeu. - O único problema é que somos covardes. Só conversa, nada de ação. - E ficou com uma expressão sonhadora nos olhos. - Dizem que as coisas boas chegam para aqueles que esperam. E eu estou disposta a esperar que algum dia um homem magnífico, brilhante, disponível, gentil e tranquilo, se dirija a mim e se apresente. - Segundo o movimento de liberação feminina - rebateu com ironia Beth -, a gente não deve se sentar e esperar. Deve lutar pelo que se deseja. Lauren olhou por cima do ombro de Beth em díreção à mesa onde estava sentado um homem solitário, que terminava o jantar. Não era deslumbrante, mas uma visão bem agradável. Quando ergueu os olhos e a encarou, sorriu. Curiosa, Beth também se virou; e ele sorriu para ela também. - Eis a sua chance - incentivou Lauren num sussurro em tom de desafio Projeto Revisoras 10
  • 11. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas bem-humorado. - Eu não o quero, portanto ele é todo seu. Vá em frente. Lute. Voltando o olhar para a mesa, Beth abriu o menu e concentrou-se nas opções. Lauren fez o mesmo. Nenhuma das duas notou quando o homem recebeu a conta da garçonete e dirigiu-se à caixa registradora. Capitulo Dois A segunda semana após a inauguração da loja foi tão promissora quanto a primeira. No momento em que Lauren se perguntava como ela e Beth teriam condições de lidar sozinhas com o ritmo contínuo, um fotógrafo autônomo entrou e ofereceu sua mercadoria. Era jovem - Lauren achou que ele não tinha mais de 25 anos - e as fotos eram muito boas. Também procurava trabalho de meio expediente para pagar os custos cada vez maiores dos materiais e equipamento. Ela imediatamente o contratou, e nenhuma das duas sócias lamentou a decisão. Agora podiam tirar uma hora de folga de manha ou à tarde - embora separadas - para fazer trabalhos administrativos, sair para almoçar ou fazer compras no centro de Boston. Numa dessas ocasiões, uma semana depois de Jamie ser contratado, Lauren retornou à loja com um novo suéter numa sacola e uma leve palidez no rosto. Beth logo chamou-a à sala dos fundos. - Você está bem? Largando a bolsa na escrivaninha, Lauren afundou numa cadeira. - Acho que sim. Você não vai acreditar no que acabou de acontecer comigo, Beth. Eu tinha comprado este suéter e voltava a pé pela rua Newbury quando um carro perdeu o controle, se desviou e subiu na calçada. Eu vinha sonhando acordada, me sentindo no topo do mundo, olhando meu reflexo ao passar pelas vitrines das lojas. Quer dizer, estava tão empolgada com a felicidade que não prestava atenção no que acontecia em volta de mim. Se não fosse uma pessoa estranha que me agarrou e puxou quando o carro invadiu a calçada, só Deus sabe o que teria acontecido! - Não pense mais nisso. Você não sofreu nada, e isso é o que importa. O motorista estava bêbado? - Quem pode saber? Ele recuperou o controle do carro e continuou o seu caminho. Nem se deu ao trabalho de parar e se assegurar de que ninguém tinha sido ferido. - Irresponsável. - Inacreditável. - E o homem que a salvou... era bonito? - Era mulher - respondeu Lauren, ríspida, simulando o aborrecimento. - E que tipo de pergunta é esta para se fazer nesse momento? - Estava apenas tentando recuperar o bom humor. Pense só como teria sido romântico se você fosse salva do acidente por um estranho alto, moreno e bonito. Podia ter desmaiado nos braços dele, e ele a teria erguido, abraçado ternamente com muita delicadeza, junto ao peito rígido, enquanto olhava, emocionado, o seu lindo rosto. Lauren revirou os olhos. - Oh, meu Deus. Beth apontou um dedo para ela. Projeto Revisoras 11
  • 12. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Um dia isso talvez aconteça. Os milagres são assim, você sabe. - E você é a mesma pessoa que fazia propaganda da liberação das mulheres não faz nem tanto tempo assim? - perguntou Lauren olhando para o calendário na parede, e só voltando a olhar a amiga quando sentiu alguém segurando seu braço. - Sente-se bem agora? - A pergunta foi suave, mas mostrava preocupação. - Quer uma bebida fria ou alguma outra coisa? Inspirando fundo, Lauren abanou a cabeça. - Estou bem. Só reagi foi depois que o susto passou, enquanto vinha andando é que comecei a tremer. Mas estou melhor agora. Realmente gostaria de voltar ao trabalho. Vai ajudar-me a manter a mente ocupada. E foi o que aconteceu. Quando chegou a Lincoln naquela noite quase já esquecera completamente o incidente. Durante o dia seguinte, envolveu-se com atividades mais importantes e imediatas relacionadas à loja. A noite foi para casa, trocou a roupa por uma camiseta e calça jeans e preparou o jantar, seguindo à risca as diretrizes que lhe dera Richard Bowen. Às vezes, precisava se esforçar, pois parecia que vinha comendo demais, e já ganhara quase a metade dos três quilos que o cirurgião prescrevera. Entretanto, teve de concordar que o aumento de peso lhe caía muito bem. Por causa das exigências impostas pelo trabalho na loja desde seu retorno das Bahamas, tivera pouca oportunidade de organizar a reforma da casa. Agora, com caneta e papel em mãos, percorreu cada aposento listando tudo o que queria mandar fazer. O corretor de imóveis que lhe vendera a casa dera- lhe os nomes de um empreiteiro, um carpinteiro, um eletricista e um bombeiro locais. Embora não pretendesse contratar nenhum deles antes de pesquisar outras referências, queria ter as decisões definidas para, então, marcar encontros com os profissionais. Após mais de uma hora tomando notas detalhadas, Lauren largou a caneta e o papel e saiu para a varanda da frente. A noite era clara, a lua prateada no céu salpicado de estrelas. Por impulso, atravessou o jardim e parou no centro, inclinou a cabeça para trás e escolheu uma estrela para ex- pressar um desejo. Mas o que poderia desejar a alguém cuja vida já era tão boa? Ela gozava de ótima saúde pela primeira vez em muitos anos. Tinha uma nova aparência, que adorava. Uma loja, bem encaminhada para tornar-se um sucesso. Casa própria, com suficiente potencial para mantê-la feliz por longo tempo. O que pediria? Talvez um amor. Talvez filhos. Na hora certa. Baixando a cabeça, começou a voltar devagar em direção à casa. Um ruído lhe chamou a atenção. Ela parou. Era um ruído da natureza, mas estranho. Fora nitidamente hostil. Quando tornou a ouvi-lo, deu meia-volta. Um grunhido baixo. Curvou a cabeça olhando para as árvores próximas, e então estreitou os olhos para ver a criatura que lentamente avançava para ela. Um cachorro. Lauren exalou um suspiro de alívio. Provavelmente o animal de estimação de um dos vizinhos. Pousando uma das mãos na altura do coração que acelerava, falou em voz alta. - Você me assustou, cachorro. Isso lá é maneira de saudar uma nova vizinha? - Ao dar um passo à frente para afagá-lo, o animal arreganhou os dentes e emitiu outro grunhido, este claramente ameaçador. Lauren estendeu as mãos abertas, palmas viradas para cima, e disse baixinho: Projeto Revisoras 12
  • 13. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Não vou machucar você, menino. - Baixou uma das mãos. - Aqui. Cheira. - Em vez de aproximar-se dela, o cachorro rosnou mais uma vez, acompanhando o ruído hostil com um agachamento que sugeria ataque iminente. - Ei, não fique irritado. Mal teve tempo de dizer as palavras e o cachorro pulou em cima dela, derrubando-a no chão e grunhindo feroz. Lutando para desviar-se da fera, ela ergueu os braços para proteger-se e balançou as pernas para expulsá-lo. Mas com a mesma rapidez com que a atacara, o cachorro se retirou, galopando em direção às árvores e desaparecendo na densa mata. Tremendo muito, Lauren conseguiu, com esforço, sentar-se. Então, não estando disposta a correr o risco de o cachorro retornar, levantou-se de um salto e disparou numa linha reta para dentro de casa. Assim que entrou, recostou-se firmemente na porta fechada, cerrou os olhos e inspirou. Quando o susto passou, sentiu raiva. Se não fosse tão tarde, teria ligado para os Young, os vizinhos ao lado do qual viera o cachorro. Mas também, pensou, talvez fosse uma sorte ser tarde demais para telefonar. Furiosa como estava por alguém deixar um animal tão selvagem solto, mesmo numa área rural como aquela, poderia dizer alguma coisa da qual se arrependeria depois. Só se encontrara com Carol Young uma vez. Não queria afastar a mulher, nem o marido, e tampouco um dos filhos adolescentes do casal. Era melhor se acalmar primeiro. Ligaria na manhã seguinte. Ao chegar ao trabalho, ligou para o número dos Young e ficou aliviada por ouvir a própria Carol atender. - Carol, aqui é Lauren Stevenson. Nós nos encontramos várias semanas atrás quando me mudei para a casa ao lado da sua. - Claro, Lauren. É um prazer ter notícias suas. Como andam as coisas? - Na verdade, muito bem... Espero não estar interrompendo alguma atividade sua. - Não seja tola. Um dos luxos do trabalho num terminal de computador em minha casa é que posso tirar uma folga sempre que quero. Os meninos foram visitar os avós em Maryland por uma semana, assim tenho tempo suficiente para um ou dois telefonemas. Como está a casa? - Do mesmo jeito ainda. Tenho andado tão ocupada aqui na loja que não encontro tempo para pesquisar e contratar trabalhadores para reformar a casa. Mas não foi por isso que liguei. - Lauren escolheu as palavras com todo cuidado, esforçando-se para ser o mais diplomática possível. - Levei um susto terrível ontem à noite. Eu caminhava lá fora no jardim mais ou menos às 11 horas da noite quando fui atacada por um cachorro. - Atacada? Está tudo bem com você? - Tudo bem. O cachorro saltou em cima mim, arreganhou os dentes e emitiu uns ruídos medonhos, mas fugiu correndo antes de causar algum dano. - Meu Deus! Eu não sabia que havia cachorros selvagens por aqui! - Então... não é seu? - Deus do céu, não. Foi isso que achou? - Ele veio das árvores do seu lado... me desculpe, eu simplesmente imaginei... - Você devia ter ligado para nós ontem à noite mesmo. Talvez tivéssemos podido ajudá-la a ir atrás dele. Como era o animal? Projeto Revisoras 13
  • 14. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Grande e preto. Pêlo curto. Talvez um Doberman, mas estava escuro demais para eu ver a coloração exata do pêlo, e além disso fiquei muito apavorada para perceber detalhes. - Coitada de você, menina. Eu também teria ficado apavorada. - Carol fez uma pausa, pensando. - Pelo que sei, ninguém na vizinhança tem um cachorro como esse, certamente não um cachorro que atacaria uma pessoa. Às vezes, porém, uns animais estranhos perambulam na área. Talvez você deva chamar a polícia local. Lauren não se animou com a idéia. Como nova moradora, detestaria causar uma agitação. - Eu... Eu não acho que isso seja necessário. Agora que soube que o cachorro não é da vizinhança, me sinto melhor. Provavelmente é um cão de guarda que fugiu e se perdeu. E não me feriu, por mais que parecesse que era o que ia fazer. - Escute, vamos observar as redondezas, e comunicarei esse fato a alguns dos outros vizinhos. Mas se você o avistar de novo, deve realmente fazer uma queixa. Não é justo ficar assustada por caminhar em sua propriedade. Lauren suspirou. - Vou ficar atenta. Obrigada, Carol. Você me ajudou muito. - Gostaria de poder fazer mais. Não deixe de me avisar se surgir algo, combinado? - Combinado. Quando Lauren desligou o telefone, Beth endireitou o corpo onde ficara encostada na porta. - Um cachorro? Primeiro um carro, agora um cachorro. Meu Deus, a nova você anda atraindo uns elementos muito misteriosos. - Continue - provocou Lauren -, dê uma boa risada à minha custa. - Eu não estou rindo. - Beth esfregou as mãos, prevendo um grande drama. - Talvez tenha alguém aí fora para pegar você... alguém que morou naquela antiga casa de fazenda há um século, cujo fantasma nunca vai descansar enquanto o dono legítimo da propriedade não retornar. - Beth... A amiga ergueu a mão. - Não, escute. Imagine, apenas imagine, que o fantasma está decidido a expulsá-la da cidade, por isso trama todos os tipos de pequenos "acidentes" para deixá-la apavorada... - Beth! - Então chega um homem deslumbrante que por acaso tem uma arma secreta que pode fulminar até mesmo um fantasma e reduzi-lo... a um lençol esfarrapado... Lauren recostou-se na cadeira, não conseguindo conter o início de um sorriso. - Já terminou? - Oh, não. O melhor vem depois que o fantasma é dizimado e você e o homem deslumbrante se apaixonam e vivem felizes para sempre. - Por que não está trabalhando? - Porque Jamie está trabalhando. Projeto Revisoras 14
  • 15. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Acho que você devia ajudá-lo. - Lauren levantou-se da cadeira. - E eu também. Apertando levemente o braço de Beth ao passar, retornou à frente da loja. Vários dias depois, Lauren viu que precisava dar início à reforma de sua casa. A porta da garagem inesperadamente desabou no chão quando ela se achava a poucos centímetros de distância. Por ironia, se a garagem fosse tão antiga quanto a própria casa, as portas abririam para os lados, e ela não teria corrido o perigo de se machucar. Mas a garagem fora acrescentada ao imóvel 25 anos antes. Parece, pensou, frustrada, que fora tão negligenciada pelos últimos proprietários quanto a casa. Lauren deu vários telefonemas, marcando reuniões para conversar sobre os reparos com os profissionais que lhe foram indicados. Nenhum deles a impressionara ao telefone, mas ela não via mal algum em se encontrar com eles antes de procurar por outros. Queria que a casa ficasse perfeita, e dispunha-se a pagar para isso. Decidida, sentou-se no chão da sala de estar e usou a mesa baixa de centro para anotar os pedidos ao emoldurador. Mas a todo instante distraía-se. Repetidas vezes interrompia as anotações e desviava o olhar para a janela. Lá fora estava escuro, e ela lembrou-se que estava sozinha. Qualquer pessoa podia vê-la, vigiá-la, examiná-la. Amaldiçoando Beth pelas fantasiosas imaginações, e a si mesma por sua própria suscetibilidade, retornou ao trabalho. Mas nessa noite, para seu pesar, adormeceu a perguntar-se se fantasmas de cem anos de idade poderiam sabotar portas de garagem de vinte e cinco anos. No dia seguinte, pouco depois do meio-dia, Lauren viu-o pela primeira vez. Ela trabalhava na vitrine da fachada da loja, substituindo uma fotografia emoldurada comprada naquela manhã, quando olhou por acaso em direção ao banco que ficava em frente à loja. Lá estava ele sentado, calmo e atento. E tinha os olhos fixos nela. Ela esboçou um sorriso, e logo desviou o olhar. Terminou de pendurar a nova reprodução e foi refugiar-se na loja. Quinze minutos depois, durante uma breve calmaria no movimento, tornou a olhar para fora e viu que ele não se mexera. Um braço lançado acima do encosto do banco, as pernas cruzadas descontraído, parecia apenas observar, com ar inocente, as pessoas passarem - até voltar o olhar novamente para a vitrine da loja. Mais uma vez Lauren desviou os olhos, desta vez se perguntando por que agira daquela maneira. Nada havia de extraordinário em relação a um homem sentado num banco no centro da cidade; as pessoas faziam isso sempre. E aquele, usando camisa xadrez de mangas curtas, calça jeans e tênis, parecia um típico transeunte. Embora não estivesse lanchando ela imaginou que ele somente desfrutava a atmosfera agradável. Ou esperava alguém. Ou simplesmente descansava. O fato de não tirar os olhos da loja era compreensível, já que ficava bem em frente. Nesse momento ela recebeu um telefonema, era dos tipógrafos que ela vinha tentando encontrar. Depois, os clientes ocuparam-lhe o tempo durante a hora e meia seguinte. Já quase havia esquecido o homem lá fora, quando saiu Projeto Revisoras 15
  • 16. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas da loja para comprar selos, e surpreendeu-se por ainda se lembrar dele. Mas não o viu em lugar algum. Em casa à noite, Lauren sentia-se estranhamente nervosa. Não sabia o motivo, e por isso culpou as duas xícaras de café que tomara naquela tarde. Com um olhar crítico, vistoriou a cozinha enquanto esperava esquentar a bouillabaisse, que comprara embalada para viagem numa loja gastronômica de pratos típicos franceses. Na reforma, escolhera para a cozinha a cor branca - armários brancos com acabamento cor de gelo, fogão e geladeira brancos e o revestimento de cerâmica do piso branco. Os complementos e utensílios seriam em azul-claro, como o conjunto de panelas esmaltadas, papel de parede, gravuras para a parede. Talvez encomendasse uma cortina pregueada também na cor azul-claro - embora não tivesse planejado colocar qualquer coisa nas janelas, de repente ocorreu-lhe que talvez gostasse da opção de privacidade para momentos como aqueles, quando a noite parecia misteriosa. Estava nervosa. Café demais. Apenas isso. Na manhã seguinte, o homem voltou a sentar-se em frente à loja, no mesmo banco. Usava uma camisa pólo branca, a mesma calça jeans, e agora mantinha as pernas estendidas para a frente. - Admirável, não - gracejou Beth, chegando perto de Lauren. - Quem? - Aquele rapaz para quem você está olhando. Já viu cabelos mais deslumbrantes? Eram castanho-claros e brilhavam ao sol - bem escovados, grossos e não muito curtos. - Não. - Ou pernas compridas como aquelas? - Não. - Gostaria de saber quem é. - Não sei. - Na certa apenas mais um turista. Por que é que os mais bonitos aparecem hoje e amanhã já foram embora? - Esse estava ali ontem. - Como? Lauren piscou os olhos e desviou o olhar do homem para a amiga. Meio ausente, enxugou as palmas das mãos úmidas na saia de linho verde de corte reto. - Eu o vi ontem no mesmo lugar. Beth arregalou os olhos. - Verdade! Acha que está esperando... a gente? - Ora, Beth, por que motivo estaria esperando por nós? - Talvez tenha ouvido falar de duas damas maravilhosas, donas da loja de gravuras e molduras, e veio investigar. Se ele tivesse coragem, entraria. - Se tivéssemos coragem, sairíamos. - E, não temos, e parece que ele também não, então... - Enquanto as duas olhavam, o homem levantou-se e caminhou sem pressa. - É...- disse Lauren, sem saber se ficara aliviada ou decepcionada. Percebera algo fascinante naquele homem, não apenas as pernas e os cabelos, mas também uma certa força. Perguntava-se se ele já tivera um cachorro preto que rosnava com os dentes arreganhados. Então se apressou a Projeto Revisoras 16
  • 17. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas afastar essa ídéia da mente, junto com todos os pensamentos em relação ao homem - até avistá-lo mais uma vez naquela tarde. A princípio ele passou devagar em frente à loja, mas sequer olhou para dentro. Alguns minutos depois, retornou pelo lado oposto, desta vez parando perto da porta, antes de dirigir-se ao banco. Quando Lauren viu-o sentar-se, curvando-se para frente com os joelhos abertos e as mãos entrelaçadas entre eles, sem saber a razão, ficou apreensiva. Percebera algo definitivamente suspeito na maneira como ele observava a loja, desviava o olhar, e mais uma vez tornava a olhá-la. - Quem é esse homem? - sussurrou para Beth, que logo ergueu a cabeça do recibo do cartão de crédito que preenchia e acompanhou o olhar preocupado da amiga. - Então ele voltou? - Beth retomou o preenchimento do documento mas falou baixo. - É meio rude para o meu gosto. Pode ficar com ele. - Eu não o quero - resmungou Lauren entre os dentes - mas gostaria de saber por que ele tem passado o tempo ali dois dias seguidos. - Por que não vai até lá e pergunta a ele? - murmurou Beth, e então, sorrindo, entregou o recibo e uma caneta à compradora. - Por favor, assine e ponha seu endereço e número de telefone embaixo... Lauren sussurrou de volta num exacerbado tom de voz. - Não posso simplesmente ir até lá e perguntar! Certamente ele tem um bom motivo para estar ali, e eu me sentiria uma tola. - Então pare de se preocupar. Tenho certeza de que é inofensivo. Lauren não tinha tanta certeza. O homem examinava a loja com muito interesse, e seu olhar era intenso demais para esquecê-lo. Quando uma cliente a abordou para comprar uma peça de tecido e mandar colocá-lo numa moldura, Lauren ficou feliz por poder se ocupar com outra coisa. Quando outra cliente escolheu uma estampa e precisou de conselho sobre a moldura adequada, ela teve prazer em servi-la. E, no mo- mento que uma terceira cliente entrou à procura de várias gravuras para coordenar com retalhos de tecido e papel de parede, ela se entregou definitivamente ao projeto. Ao aproximar-se a hora do fechamento da loja, sentia-se cansada. Estava na sala dos fundos, amainando cuidadosamente cartões de mostruário e aguardando ansiosa a relaxada volta de carro para casa, um jantar tranquilo e o resto da noite lendo um bom livro. - Lauren? - A urgência na voz baixa de Beth a fez erguer rápido a cabeça. - Ele está aqui, perguntando por você. - Quem? - Ele. - Beth disparou os olhos para trás. - O homem do banco. Lauren largou os cartões. - Perguntando por mim? - Pelo nome. - Como soube... ele deve ter... onde está? - Bem aqui - articulou Beth sem som, de um jeito que seria cómico se Lauren estivesse calma. Mas não estava. Aquele homem era diferente. Uma aparência nada sem graça. E tampouco elegante e sofisticada. Muito... diferente. Beth fez um gesto urgente com a mão. - Já vou. Já vou - murmurou, Lauren, hesitando. Levantou-se, ajeitou o Projeto Revisoras 17
  • 18. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas suéter de algodão de cor marfim na altura do quadril sobre a saia e empertigou os ombros. Depois, tentando parecer mais controlada do que estava, deixou devagar e relutante a sala. Capitulo Três Ele era muito mais alto de perto do que parecera através da vitrine da loja. Tinha os ombros mais largos. E também mais bronzeado. O mais surpreendente, contudo, era que parecia um pouco inseguro. - Lauren Stevenson? - perguntou, cauteloso. Ela parara vários passos distantes e apoiou a mão na bancada. - Sim? Ao examiná-la com mais atenção, ficou nitidamente perplexo. - É realmente estranho. Você não é de modo algum tão alta quanto eu esperava. Lauren prendeu a respiração um minuto, e perguntou, também cautelosa. - Que esperava? - Alguém... bem, alguém diferente. Se ele tinha alguma ligação com seu passado, percebeu Lauren, não apenas era compreensível a surpresa, mas mostrava tato ao falar. Mesmo assim, não podia esconder uma certa cautela. Afinal, o homem vinha examinando-a durante dois dias. - Você me conhece? Eu devia conhecê-lo? Pela primeira vez, ele sorriu, um sorriso tímido, cativante. - Meu nome é Matthew Kruger. Matt. - Hesitou uma fração de segundo. - Eu era amigo de seu irmão. Lauren não sabia o que ela esperara ouvir, mas estava certa que não era isso. - Amigo de Brad? Não conseguiu ocultar a surpresa nem o ceticismo. - Isso mesmo. Estive com ele pouco depois do acidente. Eu... sinto muito pela morte dele. - Eu também - admitiu ela com franqueza, franzindo a testa levemente, enquanto examinava Matthew Kruger. Ele não se encaixava nos moldes de Brad e seus amigos. Estranho nunca ter ouvido falar dele. Mas talvez nem tanto. Como os pais, ela não convivera intimamente com Brad antes de sua morte. - Mas... faz um ano que ele morreu. Em silêncio, perguntou-se por que aquele suposto amigo de Brad esperara tanto tempo para entrar em contato com ela. - Sei que vocês não eram íntimos, mas Brad me falou de você várias vezes, e como eu tive de vir para o leste a negócios, achei que devia procurá- la. - Em que ramo de negócios você trabalha? Outra hesitação, por uma fração de segundo. - Construção civil. A empresa construtora para a qual trabalho foi contratada para algumas obras na região oeste de Massachusetts. Estou aqui para organizar as coisas... dar andamento no projeto. Projeto Revisoras 18
  • 19. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas Ela assentiu com a cabeça. Um construtor. Em vista das rugas visíveis nos cantos dos olhos, não era o tipo de construtor que dirigia as coisas de sua escrivaninha. Mas que trabalhava e fazia questão de ver tudo de perto. E o corpo bem torneado devia ser resultado do trabalho físico árduo. Isso ela podia associar à imagem que formara da nova vida e amigos do irmão, embora se a opinião dos pais fosse válida, talvez esperasse alguém bem mais rude. Aparentemente, pelo menos, Matthew Kruger não parecia assim. "Arrumado e americano típico" era uma descrição mais adequada. Seria apenas uma aparência superficial? - Entendo - disse ela. Então, sentindo-se sem graça, desviou o olhar. Na verdade, pouco soubera do irmão e seu estilo de vida... e também a presença daquele homem intimidava-a. - Já está em Boston há muito tempo? - Uma semana - respondeu Matt. - Lauren balançou a cabeça – Estou hospedado no hotel Marriott de Long Wharf. - Se seu trabalho é na região oeste do estado, não seria mais fácil hospedar-se lá? - Eu estava lá, mas nossos investidores estão aqui e há algum trabalho burocrático a fazer, por isso decidi tirar alguns dias para visitar locais turísticos. Quando ele de repente olhou para trás dela, Lauren virou a cabeça. - Vou fechar - sussurrou Beth, olhando com curiosidade para Matt ao passar pelos dois. Lauren estendeu a mão e segurou-a pelo braço. - Beth, este é Matthew Kruger. É... era... amigo de Brad. - Ainda tinha dúvidas sobre isso, mas dessa forma simplificava a apresentação. - Matt, Beth Lavin. Beth conhecera Brad Stevenson antes de ele partir, e como não era membro da família, fora mais objetiva sobre a decisão dele. Com as mãos entrelaçadas apertadas diante de si, sorriu timidamente para Matt. - É um prazer conhecê-lo. - O prazer é meu - disse Matt, retribuindo o sorriso. Apressou-se a desculpar-se ao tornar olhar para Lauren - Não quero incomodá-la, se precisa fazer alguma coisa. Ela abriu a boca para dizer que realmente tinha trabalho a terminar, mas Beth falou primeiro. - Oh, não a está atrapalhando, já tinhamos acabado quase tudo por hoje quando você entrou. Terminei os cartões de amostras, Lauren. Por que você e Matt não saem juntos? Eu fecho a loja. A última coisa que Lauren queria era sair com Matt. Não se convencera de que ele era o que dizia ser, e mesmo que fosse, os dois ocupavam lados opostos de uma história. Além disso, não a chamara para "saírem" juntos. Aceitando a sugestão oportuna, ele a convidou. - Gostaria, Lauren? - Fez uma pausa e inspirou rapidamente. - Soube que tinha um cruzeiro ao pôr-do-sol em volta do porto. Se nos apressarmos, chegaremos a tempo. - Eu na verdade não devia... - Vá, Lauren - incentivou Beth. A sutileza nunca fora o seu forte. - Você quase não tem saído. A noite está linda. O ar fresco vai lhe fazer bem. - Eu realmente gostaria da companhia - incentivou-a agradavelmente Projeto Revisoras 19
  • 20. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas Matt. As últimas palavras a convenceram. Se ele houvesse insistido com muita veemência, talvez ela recusasse sem dificuldade. Mas pareceu sincero, e Lauren captou a mesma insegurança que percebera quando se deparara com ele a primeira vez. Embora alto, forte e de aparência rude, era gentil. Olhos castanhos, afetuosos e suaves. Nesse momento, insinuavam vulnerabilidade; acima de tudo, Lauren Stevenson adorava um pouco de vulnerabilidade nas pessoas. Soltando a respiração que vinha prendendo sem perceber, ela assentiu. - Vou pegar minhas coisas - sussurrou. Logo depois seguia a pé ao lado de Matt em direção à orla marítima. Calado como ela, lançava-lhe olhares intermitentes, e Lauren se perguntou se ele também se sentia estranho como ela. Na tentativa de quebrar o silêncio, fez a primeira pergunta que lhe ocorreu. - Como soube que eu estava em Boston? - Seus pais me disseram. - Meus pais. Ele lançou-lhe um olhar furtivo. - Não deviam? - Não... sim... quer dizer, simplesmente me surpreendeu. Só isso. Seguiram adiante mais um pouco antes de ele tornar a falar. - Você acha que eles não deviam ter informado assim de bom grado o seu endereço a qualquer amigo de Brad. - Eu... acho que é isso mesmo. Ele contraiu um músculo na mandíbula. - Pelo menos você é franca. Ela encolheu os ombros. - Até onde você sabe dos motivos de Brad para ir embora? - Apenas o que ele me disse... que os pais não aceitavam a necessidade dele de trabalhar com as mãos e não com a mente, que ficaram furiosos quando ele abandonou a faculdade e se desinteressaram inteiramente de tudo relacionado a ele. Talvez Matt houvesse conhecido Brad afinal. - Dito assim, parece cruel. - E foi, de certa maneira. Brad ficou bastante magoado com o rompimento. - Meus pais também, embora nenhum dos três tenha tentado melhorar a relação. - E você, Lauren? Fez alguma coisa? Ela fitou-o com raiva, depois suavizou e baixou os olhos. - Não - admitiu, tranquila - Acho que deveria na época. Mas então o tempo se esgotou. - Você lamentou a distância? - Brad era meu único irmão. Não tinhamos outros. Era quatro anos mais velho que eu, e seus interesses foram sempre diferentes. Não fomos muito ligados na infância, mas gostava de imaginar que talvez pudessemos encontrar interesses comuns quando ficassemos mais velhos. Haviam chegado à avenida Atlantic. Matt pôs de leve a mão no cotovelo dela quando atravessaram, apressados, para evitar um carro que vinha em toda velocidade. Soltou-a quando chegaram à faixa do meio, onde esperaram um minuto para terminar a travessia. Projeto Revisoras 20
  • 21. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Então você tinha 17 anos quando Brad partiu. Lauren exalou um suspiro. - Você realmente sabe tudo sobre Brad, não? - Ele me disse que tinha 21 anos quando abandonou a faculdade. Se você era quatro anos mais nova... - Matt deixou a frase sem terminar e suas feições ficaram tensas. - Achou que eu estava mentindo ao dizer que era amigo dele? - Não. Talvez. Tenho de acreditar em sua palavra em relação a isso, visto que não posso confirmar com ele. - É sempre tão desconfiada assim? Ela encarou-o. - Só quando vejo alguém me espreitando diante de minha loja durante dois dias antes de entrar. - Oh. Você me viu. - Vi. - Seria um rubor o que vira em seu rosto? Lauren perguntou-se se era culpa ou embaraço. Caso fosse a última hipótese, resolveu suavizar o tom. - Imagino que não tentava se esconder. - Na verdade - confessou ele - eu tentava reunir coragem para entrar. Essa era uma novidade na experiência dela. - Por que teria de reunir coragem para se aproximar de mim? - Vários motivos. Primeiro, eu sabia que havia ressentimentos quanto a Brad e não tinha certeza como seria recebido. Segundo, queria me certificar se era mesmo você. - Observou-a com interesse. Mais uma vez, aquela expressão perplexa lhe tomou o rosto. - Você está tão diferente. Muito... muito bonita. Lauren agarrou com mais força a alça da bolsa no ombro. - Brad tinha uma fotografia? - Bem antiga. Você tinha 16 anos na época. Por motivos que não estava a fim de analisar, ela não quis entrar no assunto da cirurgia de reconstrução. - Foi há muito tempo - disse, tranquila. - A gente muda. - É o que estou vendo - falou Matt devagar. - Mesmo assim, é impressionante... - Parecia que ia continuar falando, e por um instante Lauren se perguntou apenas o quanto Brad lhe falara sobre ela. Foi salva quando ele ergueu os olhos e anunciou, hesitante: -Acho que é ali. Ela acompanhou o olhar dele até onde se avistavam o cais e os barcos de cruzeiro, - Parece que sim. Trata-se na verdade de uma desinformada conduzindo outro. Eu cursei a faculdade em Boston, mas já faz algum tempo. Fiquei muito tempo longe daqui. - Você mora no centro da cidade? O olhar que ela lhe dirigiu continha uma sutil acusação, mas também certa diversão por trás das palavras. - O que foi que meus pais lhe disseram? Interpretando-a nítida e claramente, ele reprimiu um sorriso. - Apenas o nome da loja. Imagino que quisessem manter nosso contato num nível estritamente profissional. - Tenho certeza que sim. - E você? - E eu o quê? Ele ficou de repente sério. Projeto Revisoras 21
  • 22. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Teria me desprezado porque não tenho Ph.D. em alguma matéria esotérica? - Eu não tenho Ph.D. em matéria nenhuma. - Mas tem mestrado de arte. Eu nunca frequentei uma faculdade. - Mas é bem-sucedido no que faz. Pelo menos, se tem viajado pelo país, a empresa em que trabalha deve estar se saindo bem... você deve ser valorizado. - Após duvidar da história dele tão pouco tempo antes, surpreendeu-a por estar defendendo-o. Os que gostavam de vulnerabilidade não eram sempre os mais prudentes. Inspirou fundo. - Não, Matt. Não sou como meus pais. Brad não era o único que tinha diferenças com eles. Simplesmente dediquei um pouco mais de tempo tentando superar essas diferenças. A conversa foi interrompida quando chegaram à cabine de tiquetes. Matt pagou as passagens e entraram no barco. Passando por entre os outros grupos, subiram até o convés superior e encontraram um lugar vazio junto à amurada, para olharem a silhueta dos prédios da cidade. - Eu adoro Boston - pensou em voz alta Lauren, após vários minutos de silenciosa apreciação. - Explique. - É maior que Bennington e muito mais excitante, embora menor que Nova York e também mais calma. A gente pode entendê-la, passa a conhecê- la. É habitável. - Você tem apartamento? - Uma casa de fazenda. - Na cidade? - Em Lincoln. - Ela caiu em si e o repreendeu. - Isso foi um golpe baixo. Você se aproveitou de mim quando baixei as defesas. Ele deu um sorriso amistoso. - Peço desculpas. Você tem mesmo uma casa de fazenda? De algum modo, pareceu tolice esconder aquela informação. - É antiga e precisa de muitas obras para poder se tornar realmente habitável, mas fica num grande pedaço de terra e tem encanto, verdadeiro encanto. - As casas antigas são assim. A história acrescenta personalidade. É uma das razões porque eu gosto de Boston. Passear por aí, ver onde ocorreu o Massacre de Boston, ou onde se leu pela primeira vez a Declaração da Independência... isso nos causa arrepios. - Ele interrompeu-se, encarando Lauren. - Por que está rindo? - Você e seus arrepios. É um homem tão alto e forte. Parece uma contradição. - Não - disse ele, tranquilo. - Os arrepios de que falo têm causa emocional. Ser forte fisicamente não quer dizer necessariamente insensível. - Não tive a intenção... - Eu sei. Dado o recado, ele deixou o assunto acabar ali. Os dois ficaram em silêncio, vendo a prancha de embarque ser recolhida e o barco afastar-se devagar da doca. Logo os motores, grunhiam mais alto. A embarcação fez uma trabalhosa manobra, ganhou velocidade e entrou no corpo principal do porto, Projeto Revisoras 22
  • 23. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas deslocando-se num ritmo constante, embora ruidoso. - Gostaria de uma bebida? - perguntou Matt. Lauren saiu de sua contemplação. - Não..., quero sim. Um spritzer vinho, se tiver vinho branco e soda, ou uma limonada. Qualquer coisa gelada. Assentindo com a cabeça, Matt atravessou de volta o convés e desapareceu pela escada que levava ao nível inferior. Lauren, que acompanhou a caminhada dele, teve de admitir que era um homem tão atraente quanto qualquer outro à vista. Não bonito no sentido clássico; tinha o queixo quadrado demais, o nariz levemente adunco, a pele muito castigada pelo clima. Mas exalava boa saúde, força e competência. Atravessara o oscilante convés sem vacilar. O vento açoitou seus cabelos quando ela se virou mais uma vez de frente para o mar. Concentrou-se no cenário - o Aquário, as Torres do Porto, os cais com o sortimento de pesqueiros e petroleiros, os restaurantes da orla. Só quando Matt retornou, ela sorriu e percebeu como era muito mais bonito àquela vista com ele a seu lado. - Duas limonadas. - Ele entregou-lhe uma. - O spritzer estava além da compreensão do barman, e as outras bebidas eram menos leves. Havia alguns cachorros-quentes lá, mas me pareceram muito ruins. Tirou um saco de batata frita de debaixo do braço, abriu-o e estendeu-o. Ela mastigou uma, depois a engoliu com um gole. - Fale-me sobre Brad - pediu ela, surpreendendo-se ao fazê-lo. Com expressão sombria, ele a examinou. - Não sei se você realmente quer saber - disse Matt. Ela atribuiu à sua própria ambivalência a hesitação dele em responder. - Talvez você tenha razão. Mas... Acho que na verdade estou curiosa. Jamais estive com alguém que o conheceu depois que ele partiu. Não sei se devo deixar escapar a oportunidade. Matt colocou várias batatas na boca. - O que você quer saber? - perguntou mordendo as batatas com força. - Ele trabalhava na mesma empresa que você? - Não. - Brad sempre morou em São Francisco? Ela sabia que fora onde o irmão morrera. - Começou a trabalhar em Sacramento. - Como carpinteiro. - Isso mesmo. Mas quando chegou a São Francisco já vinha fazendo muitos projetos. - Projetos de que? Matt hesitou um instante. - Casas, na maioria. Alguns parques públicos. Como arquiteto, tinha um dom nato. - Era assim que o viam... como arquiteto? - Não. Ele não tinha as credenciais. Era como um ghost-writer, apresentando esboços rudimentares ao arquiteto da empresa, que depois os embelezava e formalizava. - Você conhecia a empresa na qual ele trabalhava? - Éramos concorrentes. As palavras saiam simples e francas, mas alguma coisa na maneira como Projeto Revisoras 23
  • 24. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas Matt as dizia dava a Lauren a impressão que ele não tinha muito interesse pela empresa de Brad. - Mas apesar disso eram amigos. Como funcionava isso? Matt pareceu relaxar um pouco. - Muito à vontade - Nossos respectivos superiores tinham a patente da rivalidade. Brad e eu preferíamos fraternizar com o inimigo. - Como se conheceram? - Num clube de boliche. A expressão dela ficou distante. - Estranho, não consigo imaginar Brad jogando boliche. Mas também não consigo imaginá-lo suando no telhado de uma casa. - Deixou as divagações. - Que mais faziam juntos? - Comíamos fora. As vezes duas refeições por dia. Passávamos férias juntos... éramos seis amigos, na verdade. Descemos de balsa o rio Colorado, viajamos a cavalo por partes de Montana. Era divertido. - Muito machões - provocou ela, e foi presenteada com um encabulado sorriso dele. - Imagino que sim. O sorriso dela demorou-se um minuto e depois se desfez. - Brad nunca se casou. - Soubera disso quando fora informada pelo advogado que era a única beneficiária do patrimônio do irmão. - Eu gostaria de saber por quê. - Talvez não tenha encontrado a moça certa, que o aceitasse como ele era. - Você já se casou? - perguntou ela no impulso. Matt encarou-a um instante, e fez que não com a cabeça. - Por que não? - Mesmo motivo. Ela pensou calmamente na resposta. - Entendo isso no caso de Brad. Foi criado numa atmosfera em que a perfeição intelectual era a única meta válida. Esforçou-se para continuar assim por algum tempo, depois simplesmente desistiu. Meus pais, nem ninguém do círculo dos amigos dele, não aceitaram essa atitude. Muito antes de partir, foi rotulado de desajustado. Tenho certeza que isso feria sua sensibilidade. - Todos temos nossas sensibilidades. - Quais são as suas, Matt? Por que iria uma mulher ter problema em aceitar você como é? Ele mastigou várias batatas fritas novamente, e teria parecido perfeitamente desinteressado não fosse o escurecimento dos olhos. - Sou um operário braçal. Não tenho títulos, numa série de elegantes iniciais qualificativas para acrescentar ao fim do meu nome. Ao longo dos anos, tenho me saído bem no trabalho, mas isso não significa que aspiro um dia ter minha própria empresa, nem que um dia não decida abandonar e voltar a construir cabanas rústicas de madeira. Se uma mulher achar que vai conseguir um futuro magnata imobiliário, é melhor pensar duas vezes. Não escapou a Lauren o ressentimento nas palavras dele. - Você deve ter sido humilhado. - Várias vezes. - Ele desviou o olhar para a água e suavizou o tom, que Projeto Revisoras 24
  • 25. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas se tornou tímido o bastante para dissipar a arrogância. - Sempre atraí mulheres com muita facilidade. Mas atração física não basta. Não com uma perspectiva de sucesso duradouro. - A grama do vizinho é sempre mais verde... - comentou ela baixinho. - Algumas de nós adoraríamos ter uma aparência atraente. Matt examinou-a como se ela fosse insana. - Mas você tem! Não acredito que não tenha uma lista de homens à espera para levá-la para sair! Lauren precisou de um minuto para perceber o que dissera, e por que Matt respondera tão vigorosamente como o fizera. Esquecera. Isso acontecia muito. Um lento calor subiu-lhe pelo pescoço. Os elogios ainda eram novos para ela, ainda mais de um homem com um físico tão maravilhoso como o de Matthew Kruger... - Não sei de lista alguma - respondeu apenas. - Então é apenas um? Ela fez que não com a cabeça. - Você é uma mulher linda, Lauren. Com certeza tem recebido propostas. Mais uma vez ela abanou a cabeça, negando desta vez com um sorriso encabulado. - Por que não? Diante da franqueza dele, ela desatou a rir. - Você é quase tão pouco diplomático quanto Beth. - Lamento. Só fiquei curioso. - Ergueu uma das mãos grandes e bem formadas. - Não quero dizer que devia ser casada. Você só tem, quantos, 29 anos, e está obviamente construindo uma carreira promissora. - Ocorreu-lhe uma nova idéia, e ele franziu o cenho. - Você disse que não está cm Boston há muito tempo. Então a loja é recente? - Inauguramos há pouco mais de um mês. - E antes disso? - Eu trabalhava num museu em minha cidade natal Ele passou o dedo indicador pela borda do copo de papel. - Cidade natal. Isso talvez explique. Brad me falou sobre a cidade natal. - Que foi que ele disse? - Que era sufocante. Unidimensional. A pessoa só podia ser artista ou acadêmico afiliado à universidade. - Estava sendo injusto. Bennington é um lugar lindo. Algumas pessoas fascinantes optaram por morar lá. Brad simplesmente não. - Nem você, ao que parece. Por que partiu, Lauren? - Porque eu queria abrir a loja. - Mas podia ter aberto uma loja em Bennington. Ela fez que não com a cabeça. - O mercado é pequeno demais. - Então está atrás de vencer em grande estilo. - Quero que a loja seja um sucesso, sim - disse ela num tom defensivo. - Talvez não aspire a publicar um tratado profundo atrás de outro, como fazem mamãe e papai, mas isso não significa que não posso almejar ficar bem e próspera. O sorriso de Matt transmitia uma certa melancolia. Projeto Revisoras 25
  • 26. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Agora você ficou mesmo igual a Brad. Ele era muito determinado... Um lampejo de incerteza atravessou o semblante dele. - Muito determinado...? Passou-se algum tempo antes de Matt concluir a frase, e então o fez com cuidado. - A ser bem-sucedido. Reconhecido. Não sei se realizou ou não o que o motivava, mas como muitas vezes afirmava que vinha construindo seu próprio negócio e não ligava para o que pensava a família, acho que estava brincando consigo mesmo. - Ele era feliz, Matt? Matt teve de pensar. - De certa maneira, sim. Examinando os pedacinhos de polpa de limão grudados nos lados do copo, Lauren falou mais devagar. - Soubemos apenas sobre o acidente; que ele estava supervisionando uma explosão de dinamite e acabou colhido na confusão. Houve... mais alguma coisa, além disso? - Foi só isso. Ele respondera rápido e com firmeza. Sem saber por que, Lauren foi pega de surpresa. - Você o viu logo depois? - No hospital. - O tom foi brusco. Quando ele continuou, a aspereza suavizou-se. - Brad ficou lúcido por algum tempo, mas com os ferimentos internos e tudo mais... talvez tenha sido para melhor. Se ele sobrevivesse... e as chances disso eram mínimas desde o início... ficaria tetraplégico. Não acho que teria condições de suportar. - Não - sussurrou ela, e quando ergueu a cabeça, tinha os olhos úmidos. - Eu me sinto culpada, às vezes. - Culpada? - Tudo que tenho agora... a loja, a casa de fazenda, isto... - fez um gesto largo em volta de si mesma - veio do dinheiro que ele me deixou. Você sabia? Matt pôs a mão no ombro dela e massageou-o de leve. Sua voz saiu muito mais gentil, a tensão desviou-se. - Foi o desejo de Brad. Fui eu quem o transmitiu ao advogado. Em vista das circunstâncias, ele ganhou uma certa paz. Lauren assentiu com a cabeça, e então, de algum modo, não pôde impedir o transbordamento de palavras. - Não fosse por ele, eu com certeza ainda estaria em Bennington. A parte o dinheiro, a morte dele foi um ponto decisivo para mim. Pela primeira vez na vida parei para pensar em minha própria mortalidade, no que teria como crédito quando chegasse a hora, no que estaria deixando para trás. Foi quando decidi me mudar para Boston e abrir a loja. Só desejaria que Brad pudesse saber como me sinto melhor comigo mesma agora. - Basta que você saiba, Lauren. Se Brad estivesse aqui para vê-la, estou certo que se sentiria orgulhoso. Ela fitou-o timidamente, desviou o olhar e inspirou de forma longa e trémula. - É ruim demais não podermos ter as duas coisas... ruim demais não poder ter o que tenho e Brad vivo para ver. Projeto Revisoras 26
  • 27. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas Passando o braço pelas costas dela, Matt puxou-a para junto de si. O calor que ele emanava era o conforto que ela precisava. - A vida é cruel assim mesmo, cheia de escolhas e concessões. Mesmo quem chega ao sucesso faz sacrifícios pelo caminho. O melhor que podemos fazer é decidir exatamente o quanto estamos dispostos a abrir mão e seguir em frente. Ao erguer o olhar para ele, ela roçou a face em seu ombro. Pareceu um gesto inteiramente natural. - Mas é uma visão negativa. - É realista. - Talvez eu seja mais romântica, então. Quero me concentrar nas metas e enfrentar os obstáculos ao me deparar com eles. Ele encolheu os ombros. - E eu quero estar preparado para os obstáculos. É apenas uma visão diferente. Quem pode dizer qual a melhor? Lauren não respondeu. Ficou com o olhar de repente perdido no dele, e esforçou-se para aguentar a intensidade. Embora ele fosse quase um estranho, ela contara-lhe coisas que nunca revelara a ninguém, isso devia-se ao fato de ele ser uma ligação com o irmão, ou ser um bom ouvinte, ou ter partilhado seus próprios pensamentos com ela? Ficara desconfiada dele a princípio; ainda desconfiava, em alguns aspectos. E no entanto... e no entanto, sentia-se atraída por ele... O barulho da buzina do barco fez os dois saltarem. Olharam em volta e viram a maioria dos passageiros amontoada no outro lado do convés, acenando para um navio alto que passava. Sem soltá-la, Matt foi juntar-se a eles. - Impressionante - sussurrou, admirando os altivos mastros e acessórios antigos da imponente embarcação. - É uma grande pena que não navegue a vela. - É quase decepcionante. Não existiam motores antigamente. - Nem Walkmans Sony. Matt apontou o marinheiro pendurado no cordame, os fones de ouvido firmemente instalados. Lauren sorriu da visão, e desviou o olhar para o aeroporto. - Se eu tivesse um escritório no centro da cidade, com essa vista, não acredito que conseguiria terminar qualquer trabalho. Poderia ficar sentada durante horas vendo os aviões decolarem e pousarem. - Eu, não. Só olhá-los me dá calafrios. Sou um passageiro sempre em pânico. Ela olhou-o, descrente. - Um homem desse tamanho? - Os homens grandes caem com mais peso. Ela reprimiu um sorriso. - Acho que tem razão. Mas você viaja de avião. Ele fez uma expressão que era, uma mistura de repulsa e resignação. - Quando necessário. - O que é frequente demais para seu gosto. - Acertou em cheio. Os olhos dela adquiriram um brilho extra. Projeto Revisoras 27
  • 28. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - Acho que eu jamais poderia voar com mais frequência. Não que tenha viajado tanto de avião, mas sempre fiquei tão excitada com a idéia de chegar ao lugar de destino ia que simplesmente me recostava e relaxava. É quase tudo que se pode fazer, você sabe. Assim que ganhamos altura, ficamos nas mãos do destino. Não há como termos controle sobre qualquer coisa que aconteça com o avião. Ele soltou um eloquente grunhido. - É isso que me aborrece. Eu gosto de estar no controle. Como gosto de avaliar os obstáculos... Lauren estreitou os olhos com um ar brincalhão. - Aposto que você é do tipo que vistoria cada centímetro de um novo carro antes de aventurar-se a guiá-lo. - Também provo o creme chantilly, depois a castanha moída, depois a calda de chocolate, depois o sorvete, antes de pôr na boca uma colher cheia de sundae. - Mas onde está a surpresa, então? - Na mistura perfeita dos ingredientes. Do jeito que faço, minimizo o risco de decepção. Se uma coisa não está certa, posso mandar corrigir, e se não puder fazê-lo, pelo menos estou preparado, por isso minhas expectativas se equiparam à realidade. - E um homem cauteloso. - Totalmente. - Mais um motivo para ter ficado sentado defronte à minha loja por dois dias. - Ela inclinou a cabeça. - Me diga, o que teria acontecido se eu fosse exatamente como aquela foto que você tinha visto? - Eu teria entrado no primeiro dia. Lauren perguntava-se se ele teria mesmo entrado. - Eu não entendo. Minha aparência deixa você cauteloso. - Isso mesmo. - Mas... estou melhor do que na foto, não estou? - Está linda. - Então? Atolada em confusão, não fez protesto algum quando ele a virou para olhá-la e cruzou os pulsos em sua nuca. - As mulheres magníficas me intimidam. Tive decepções, lembra? Desta vez o sorriso dele não a tranquilizou. Ela arregalou os olhos. - Acha que estou interessada no seu corpo? Ela estremeceu e disparou um olhar encabulado para cada lado. - Quieta. Lauren pegou-lhe os braços para afastá-lo. Quando ele a segurou com firmeza, ela sussurrou, com veemência. - É isso que você acha? Então deixe-me dizer o seguinte: eu não lhe pedi que entrasse em minha loja. Não lhe pedi que me levasse num cruzeiro. Não quero parte alguma de seu corpo! E mesmo que quisesse, não seria apenas isso que eu iria querer. Antes de chegar ao corpo, deixaria claro que queria o resto. - Ela arfou, indignada e virou o rosto para o outro lado. - Logo um egocêntrico, arrogante... - Não foi isso que eu quis dizer, Lauren. Você está tirando conclusões Projeto Revisoras 28
  • 29. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas precipitadas. Já lhe ocorreu que pode intimidar um homem? - Eu? - É, você. Eu vinha esperando encontrar uma moça tranquila... - ele hesitou, e então pigarreou - ...meio magra e sem graça, levando uma vida igualmente sossegada no campo. Pelo menos, era o que Brad dava a entender. Se ele pudesse ver você agora! É dona de sua própria loja... no centro empresarial da cidade, nada menos. É linda. Veste-se com muita elegância. É inteligente o bastante para afugentar qualquer um. E com toda certeza não vai cair aos meus pés. - Ele inspirou, ressentido. - Sim, me sinto intimidado. Lauren ficara em suspense durante o breve discurso dele. Agora percebia como devia ter parecido absurda sua afronta. - É estranho - conseguiu dizer em voz baixa -, você não parece intimidado. Ele cerrou bem os olhos. Mesmo antes de relaxar e abri-los, um sorriso já começara a formar-se em seus lábios. - Acho que agora não estou, pelo menos não tanto quanto antes. Para alguém que é linda, chique e super inteligente, você é realmente bastante natural. Ela sorriu, encabulada, desviando o olhar. - Acho que estamos perdendo o pôr-do-sol. - Tem razão. Retornaram ao lado da amurada onde tinham se instalado antes, depois trocaram de lugar quando o barco fez uma lenta curva e dirigiu-se de volta às docas. Nenhum dos dois disse muita coisa. Lauren, por exemplo, ficou absorta em seus próprios pensamentos. Apesar da explicação dele, continuava perplexa por sua aparência tê-lo intimidado. No inicio apenas, mas seu orgulho fora ferido. A idéia que melhorara completamente a aparência apenas para constatar que isso mantinha os homens a distância era perturbadora; por isso reclamara. Ou estivera apenas à procura de algo que pudesse servir de motivo para se interpor entre Matt e ela? Ele também era atraente, muito agradável como companhia, firmemente alinhado como Brad e tinha um estilo de vida que fora ensinada a reprovar. Não, não estava desaprovando-o agora, mas tampouco podia ignorar a decepção do abandono do irmão muito tempo atrás. E depois veio a culpa. Concordara com a opinião dos pais de que Brad era um fracasso, mas aceitara o dinheiro dele - muito dinheiro. Teria um arquiteto disfarçado de carpinteiro ganho todo aquele dinheiro? Guardara no banco cada centavo poupado durante 11 anos? Compreendeu que precisava fazer várias outras perguntas a Matt sobre o irmão. Em retrospecto, questionava-se se ele fora evasivo quando falara do trabalho de Brad. As respostas haviam sido breves, a expressão solene. Ele contara mais sobre a vida pessoal do irmão, mas ela não podia deixar de perguntar-se se deixara de mencionar algumas coisas. O barco encostou no cais, prenderam-se as cordas e baixaram a prancha de desembarque. - Você deve estar faminta - disse Matt. - Quer comer alguma coisa em meu hotel? O Marriott ficava apenas a uma curta distância de onde se achavam, mas Projeto Revisoras 29
  • 30. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas ela logo abanou a cabeça. - É melhor eu ir direto para casa. Foi um longo dia. - Tem certeza? Desta vez ela não se rendeu à suavidade cor de chocolate do olhar dele. Precisava de tempo para habituar-se ao aparecimento daquele homem em sua vida. Era uma figura do passado de Brad, mas sua proximidade a desequilibrava. Na verdade, ansiava pela sólida firmeza de sua própria casa. - Tenho - respondeu com um sorriso delicado. - Mas... obrigada, Matt. Foi delicioso. - Pelo menos me deixe acompanhar você até seu carro. Está muito escuro. - Mas o caminho até meu carro é muito bem iluminado do começo ao fim. Verdade, vou ficar bem. Matt empertigou os ombros e assentiu com a cabeça. - Tome cuidado, então. Ela se encaminhou para o carro. - Boa sorte com seu trabalho. Espero que saia tudo bem. Ele assentiu mais uma vez com a cabeça, acenou, virou-se e dirigiu-se para o hotel. Lauren só olhou para trás depois que atravessara a avenida Atlantic, e a essa altura ele já desaparecera. O sol do cair da tarde fulgia brilhante acima das colinas de Hollywood, rnas as persianas no gabinete haviam sido baixadas quando o proprietário entrou, encaminhou-se a passos largos pelo piso de cerâmica até a escrivaninha e pegou o telefone. -Sim? - Estamos chegando próximo. - Já era hora. Eu imaginava que ia ter notícias dela mais cedo. - É uma moça esperta. Cobriu seus rastros como uma profissional... quase. Ainda não sei quem a ajudou a sair de Los Angeles, mas você tinha razão sobre as Bahamas. Ela voltou à mesma clínica que visitou quando vocês dois passavam as férias no último outono. Foi o único deslize. - Então você a encontrou? - Fez cirurgia plástica, exatamente como você achou que faria. Não muita coisa. Mudanças sutis. Encontrei um instantâneo falsificado de "antes" nos arquivos do médico e um monte de históricos médicos enganadores, mas o instantâneo "depois" tinha semelhança suficiente com a aparência real para desmascará-la. Os cabelos estão diferentes, mais escuros e curtos. E ela adotou outro nome. - Sabíamos que faria isso. Onde está ela? - Boston. Acabou de abrir uma pequena loja de reproduções e molduras. - Com o dinheiro dos presentes que eu dei a ela. Uma loja de reproduções e molduras. É muito cara. - Você ficaria espantado se a visse. É a imagem da inocência. Roupas simplesmente muito... elegantes, mas discretas, nada chamativo como antes. Dirige um Saab que deve ter comprado de segunda mão. Tem uma mulher trabalhando na loja que parece quase tão pura quanto ela, e um rapaz que na certa faz o que ela... Projeto Revisoras 30
  • 31. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas - E as jóias? Localizou o disfarce? - Não. Nenhum sinal das jóias. Ela talvez tenha começado com as peles. Seriam mais fáceis de vender e quase impossível de refazer o paradeiro. - Fez algum contato com ela? - Tenho alguém bom para isso. Ela já sofreu dois "acidentezinhos"... nada ainda para machucá-la, na verdade, apenas para fazê-la começar a perguntar- se. - E começou? - Sim. Anda olhando nervosamente em volta do jardim, toda vez que sai da casa. - A casa? - Uma velha casa de fazenda que comprou fora da cidade. - Com meu dinheiro. - Vai voltar tudo para você. Entre a loja e a casa, ela fez investimentos que retornarão com juros. - Quero que encontre as jóias. - Estamos procurando. Ela não guardou em casa. Revistei eu mesmo o lugar hoje. - Revirou tudo? - Nada tão óbvio assim. Apenas mudei de lugar umas coisinhas aqui e ali. Ela vai desconfiar que alguém anda bisbilhotando, mas não terá suspeita bastante para chamar a polícia. - Ela não ousaria chamá-la.. Sabe como sou bem relacionado, e não faria nada para arriscar pôr a perder sua nova identidade. Então aonde vamos daqui em diante? - Ainda tenho mais alguns contratempos prontos bem escondido. Você quer que ela se contorça. Eu quero que ela se contorça. Ela vai se contorcer. - Está se divertindo à beça, não? - Posso dizer que sim. Eu acho que, como o decepcionei antes, e a culpa foi dela, esta vai ser a minha vingança. - A vingança é minha, e não esqueça isso. - De jeito nenhum, chefe. De jeito nenhum. Capitulo Quatro Beth a esperava ansiosa quando Lauren chegou à loja na manhã seguinte. - E aí? Como foi? O que aconteceu? Seus pais morreriam se soubessem que você saiu para um encontro com ele, mas eu acho maravilhoso! Um cruzeiro de pôr-do-sol... Nunca ouvi falar de coisa mais romântica. Ele talvez seja meio rude, mas tem charme. Foi agradável com você? E o convidou para ir a Lincoln depois do cruzeiro? Quase liguei para você, mas não ousei. Me conte, Lauren. Conte tudo! Seguida de perto pela amiga, Lauren continuou atravessando a loja até a sala dos fundos e guardou a bolsa na gaveta de baixo do armário de arquivos. - Como posso lhe contar alguma coisa se você não me dá chance para dizer uma palavra? - Tudo bem. Vou ficar calada. Fale. Lauren apenas desejou saber o que dizer. Passara boa parte da noite Projeto Revisoras 31
  • 32. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas pensando em Matthew Kruger, e ainda não sabia que conclusões tirar dele. - Sim, ele foi simpático. O cruzeiro foi agradável. Romântico? Isso eu não saberia dizer. E não, não o convidei para ir comigo a Lincoln. - Por que não? - Porque não era necessário. E não saí para um encontro. Ele era amigo do meu irmão. Só isso. Conversamos um pouco sobre Brad e sobre outras coisas. Apenas isso. - Ele explicou por que ficou rondando lá fora por dois dias? Pela primeira vez nessa manhã, Lauren sorriu. Indiferente. - Se conseguir acreditar nisso, ele contou que vinha tentando reunir coragem para entrar. Brad tinha lhe mostrado uma fotografia minha. Eu não era bem o que ele esperava. - Mas que maravilha! - exclamou Beth arregalando os olhos. - O belo príncipe se sentiu tão fascinado com sua beleza que ficou na verdade apavorado. Que maravilha! Lauren contraiu o rosto e cuidadosamente falou: - Belo príncipe? Fascinado com minha beleza? Apavorado? Que é que você anda lendo, Beth? - Admita. Eu acho tudo incrível. Vai sair de novo com ele? - Não sei. - Que quer dizer com não sei? - Apenas isso. Ele não disse nada sobre sairmos novamente, e eu não ia permitir intimidades tão rápido. Lauren pegou uma lata de café e começou a pôr colheradas do pó num filtro. - "Permitir intimidades" - murmurou Beth. - palavras corretas saídas da boca da antiga Lauren. A nova você é muitíssimo desejada. Estaria fazendo um favor a ele pensar em vê-lo mais uma vez... E aí? - E aí o quê? - Vai? - O quê? Lauren calculou a água e despejou-a na cafeteira. Beth deu um suspiro de frustração. - Pensar em sair com ele de novo. - Eu não sei. Quando o café começou a pingar devagar na garrafa, Beth revirou os olhos e resmungou. - Que absurdo. A gente está entrando num círculo vicioso. Você quer ou não sair com esse homem de novo? Lauren virou-se de frente para a amiga. - Eu não sei! Ora, Beth, como posso lhe dar uma resposta melhor se eu não tenho nenhuma? Sim, eu gostei dele, e em circunstâncias normais teria o maior prazer em vê-lo de novo. Mas não se trata exatamente de circunstâncias normais. Em primeiro lugar, ele mora na Costa Oeste. Só está aqui a trabalho, cuja maior parte o mantém na parte ocidental do estado. Vai voltar para São Francisco e tem horror a viajar de avião. Não tenho exatamente tempo de viajar para vê-lo todo fim de semana... isso sem falar no dinheiro, quando me propus a fazer tantas outras coisas prioritárias. - Ela inspirou fundo. - E em Projeto Revisoras 32
  • 33. Rainhas do Romance 08 Barbara Delinsky – Ameaças e Promessas segundo lugar, ele era amigo de Brad. Você tem razão. Meus pais iriam ficar enfurecidos. - Você é adulta. Não queriam que fosse às Bahamas, mas você foi. Não queriam que partisse de Bennington nem abrisse esta loja, mas você fez as duas coisas. Não precisa da permissão deles. Pode fazer o que você quiser e ver quem quiser. Lauren exalou o ar profundamente. - Sei disso, Beth. Não estou pedindo a permissão deles para nada. Tenho meus próprios escrúpulos sobre sair outra vez com Matt. Ele era amigo de Brad. E vê a mim e a meus pais, pelos olhos de Brad. É um solteirão consumado que adora viajar com os amigos e descer corredeira abaixo por uma semana. Então qual o sentido de levar isso adiante? - O sentido - murmurou Beth, arqueando as sobrancelhas - é que ele é solteiro e magnífico. - Achei que era muito rude para você. - Para mim, sim. Para você, não. Os dois pareciam maravilhosos saindo daqui juntos ontem à noite. Ouça o que digo, veja até onde isso vai chegar. - Você tem a mente tacanha - grunhiu Lauren, tirando um fio de cabelo do vestido de jérsei cor de damasco e cintura baixa. - E você está de péssimo humor. Cadê seu senso de humor? Escute, tenho certeza de que Matthew Kruger será o homem perfeito para afugentar o fantasma que anda frequentando a sua fazenda. - Besteira. Estou começando a achar que preciso fazer alguma coisa. Aquele "fantasma" entrou mais uma vez em ação. Beth piscou os olhos uma vez, e depois outra. O café continuava a gotejar no fundo, o forte aroma flutuando da garrafa e espalhando-se pela pequena sala. - Como disse? - O "fantasma". Juro que andou mexendo em minhas coisas ontem. - Espere um minuto, Lauren. Não existe isso de fantasmas. - É você quem anda dizendo. - Eu estava provocando. - Então imagino que provocou um pouco demais. Estou quase me tornando uma crente. - Não está falando sério! - Talvez não. Mas mesmo assim... foi misterioso. Eu podia jurar que tinha posto algumas coisas em determinados lugares lá em casa, e elas continuavam lá, só que... deslocadas de algum modo. Beth recostou-se na cadeira e cruzou os braços no peito. Parecia ser uma psiquiatra, pelo tom indulgente da voz. - Acho que vai ter de ser mais específica. De que modo elas foram "deslocadas"? - Pequenas mudanças de posição. Um frasco de perfume virado de costas, de forma que o pássaro esculpido no vidro se voltava para a parede. Um par de sapatos bem arrumado no armário, com o da direita na esquerda e o da esquerda na direita. Uma calcinha dobrada à perfeição, mas pelo avesso. Sempre viro do lado direito antes de dobrá-las. Calcinhas. - Estremeceu, e sussurrou, desanimada - Dá para acreditar nisso? - Talvez você devesse chamar a polícia. Projeto Revisoras 33