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Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 13ª VARA CRIMINAL
FEDERAL da Seção Judiciária do Paraná
Juiz Federal: - O senhor conheceu o Senhor Fábio Correa?
Interrogado: - Conheci.
Juiz Federal: - O senhor entregou dinheiro para ele ou
solicitou que outros entregassem dinheiro para ele?
Interrogado: - Não, que eu me lembre não. Na verdade,
quem tinha o relacionamento e que estava envolvido nesse
esquema era o Senhor Pedro Correa, o Senhor Fábio não
participava disso.
(Interrogatório de Alberto Youssef)
Ref.: Ação Penal n.º 5023135-31.2015.4.04.7000/PR
FÁBIO CORRÊA DE OLIVEIRA ANDRADE NETO, devidamente
qualificado nos autos da ação penal que lhe move a Justiça Pública
Federal por esse juízo, vem, por seus advogados legalmente
constituídos, apresentar, na forma do art. 403, §3º do Código de
Processo Penal, ALEGAÇÕES FINAIS, em forma de memorial, nos
termos a seguir aduzidos:
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I. INTRODUÇÃO
FÁBIO CORRÊA DE OLIVEIRA ANDRADE NETO (“FÁBIO
CORRÊA”) foi acusado pelo Ministério Público Federal de suposta
prática de lavagem de dinheiro, em concurso material, por trinta e três
vezes (Lei 9.613/98, art. 1.º, §4º, c/c art. 69 do CP).
Segundo a denúncia, teria ele comparecido por cerca de trinta e
três vezes, entre agosto de 2010 e outubro de 2012, ao escritório de
ALBERTO YOUSSEF localizado em São Paulo, e recebido de seu
funcionário RAFAEL ÂNGULO, em todas as ocasiões, na condição de
intermediário de PEDRO CORRÊA, valores supostamente provenientes
de delitos perpetrados em detrimento da PETROBRAS.1
Ainda de acordo com a acusação, ratificada nas alegações finais
ministeriais (evento 390), esses valores constituiriam pagamento de
propina relacionada a contratos celebrados entre empreiteiras
cartelizadas e a PETROBRAS (Cf. Tabela A), e entre aquelas e outras
empresas de fachada controladas por YOUSSEF (Cf. Tabela B).
1 Fl. 61 da denúncia.
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Para o Ministério Público Federal,2 três seriam as “provas” do
alegado crime de lavagem perpetrado por FÁBIO CORRÊA:
(i) o depoimento prestado por RAFAEL ÂNGULO na fase de
inquérito, no qual teria declarado a entrega de valores ao Defendente,
bem como afirmado que “FÁBIO CORRÊA apresentava contas para
pagamentos e listas de pessoas físicas e jurídicas para que fossem creditados
valores, aí incluída a conta corrente do próprio FÁBIO CORRÊA e da
empresa do cunhado LAUDO DALLA COSTA, a DALLA COSTA
CONSULTORIA LTDA”.
(ii) existência de “planilhas de movimentos” (controle de caixa)
utilizadas pelo mesmo RAFAEL ÂNGULO nas quais constaria o
registro de repasses realizados a FÁBIO CORRÊA e PEDRO
CORRÊA;
(iii) registros de entradas do Defendente no escritório de
ALBERTO YOUSSEF.
Em sua defesa (evento 69), FÁBIO CORRÊA negou, como nega, a
acusação.
2 Fls. 36/37; 61/62 da denúncia.
Página 4 de 72
Em síntese, sustentou, como ora sustenta, que jamais aderiu,
auxiliou ou foi conivente com a prática de qualquer crime, muito
menos o de lavagem de dinheiro atribuído pelo MPF a partir de
especulações e graves distorções da realidade.
Neste sentido, repudiou, como ora repudia, a descabida alegação
de que houvesse recebido (por várias vezes) de ALBERTO YOUSSEF,
RAFAEL ÂNGULO ou de quem quer que seja, dinheiro que soubesse
relacionado a pagamento de propina a PEDRO CORRÊA em função de
um esquema delitivo perpetrado contra a PETROBRAS.
Enfatizou, quanto ao ponto, não apenas desconhecer a existência
do alegado esquema criminoso como, e principalmente, que o valor por
ele recebido, numa única oportunidade, a pedido de seu pai PEDRO
CORRÊA, tivesse origem ilícita.
Na oportunidade, questionou o fato da denúncia acusá-lo a
partir de uma clara e repudiável responsabilização objetiva.
Diante desses fatos, propugnou pela rejeição da denúncia, nos
termos do art. 395, I e III do CPP, com pedido alternativo de absolvição
sumária em virtude da atipicidade subjetiva e objetiva do fato
imputado (CPP, art. 397, III).
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Não obstante, a inicial foi recebida por esse douto juízo (evento
79), deflagrando-se a persecução.
Iniciado processo e ultimada a instrução, verificou-se, contudo,
a total improcedência da imputação.
II. DAS TESES DE DEFESA
Conforme demonstrará a defesa:
(a) o MPF não comprovou o envolvimento de FÁBIO CORRÊA
no alegado esquema criminoso;
(b) quanto ao suposto crime de lavagem, além de inexistir prova
de que o Defendente tenha recebido dinheiro nas trinta e três vezes que
compareceu ao escritório de ALBERTO YOUSSEF, o próprio YOUSSEF, a
exemplo da testemunha PAULO ROBERTO COSTA e do corréu PEDRO
CORRÊA, inocentou por completo FÁBIO CORRÊA, afirmando que o
mesmo nada tem a ver com o esquema criminoso apurado;
Página 6 de 72
(c) o MPF não fez prova do nexo material e temporal entre os
contratos consignados nas Tabelas A e B da denúncia e os repasses de
dinheiro a PEDRO CORRÊA através de FÁBIO CORRÊA, o que é
imprescindível para efeito de configuração do delito de lavagem;
(d) Além da falta de provas, os fatos revelam-se atípicos:
d.1) por ausência de dolo e culpa, seja em relação à existência dos
crimes antecedentes (corrupção, formação de cartel e fraude à
licitação), seja em relação ao alegado crime de lavagem no que tange à
vontade livre e consciente de ocultar e dissimular valores provenientes
de delitos perpetrados contra a PETROBRAS;
d.2) o fato narrado na denúncia, ratificada em alegações finais,
configuraria, no limite, exaurimento de crime de corrupção passiva, do
qual não participou o Defendente, sendo, portanto, impunível em
relação a ele, conforme posição adotada pelo Plenário do STF ao julgar
Embargos Infringentes na AP 470/MG.
d.3) os delitos de formação de cartel e fraude à licitação, que a
acusação afirma constituírem crimes antecedentes à lavagem, não
figuravam, ao tempo de sua consumação e do próprio ato de lavagem,
no rol taxativo descrito na antiga redação do art. 1.º da Lei 9.613/98,
vigente à época dos fatos apontados.
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Por essa razão, incabível falar-se em crime de lavagem de
dinheiro à luz da Lei 12.683/12, sob pena de violação ao princípio da
irretroatividade da lei penal (CF, art. 5.º, XL; CP, art. 1º);
d.4) a conduta descrita pela acusação – ato de receber quantias em
espécie – não se amolda, objetiva e ontologicamente, às ações de ocultar
ou dissimular previstas no tipo de lavagem de dinheiro.
Diante desse contexto, requer-se seja julgada improcedente a
pretensão condenatória deduzida pelo MPF para absolver o
Defendente com fundamento no art. 386, II, III, V e VII do Código de
Processo Penal. Senão vejamos.
III. DA ABSOLVIÇÃO
1. Rememorando os Fatos
Embora os fatos objeto da presente demanda estejam
aparentemente bem delineados, não é demasiado rememorá-los a fim
de evitar julgamento extra, infra ou citra petita, tudo em obséquio ao
princípio da correlação entre acusação e sentença.
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Com efeito, sustenta a denúncia que ao menos a partir de 2004 –
e no âmbito de um suposto esquema criminoso engendrado por
empresas cartelizadas, agentes públicos e partidos políticos – teriam
sido cometidos diversos crimes contra a ordem econômica (formação
de cartel), administração pública (corrupção ativa e passiva) e lavagem
de dinheiro em detrimento da Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRAS.
Nesse contexto, agentes públicos do alto escalão da PETROBRAS,
previamente ajustados com membros de partidos políticos, teriam
solicitado, recebido e aceitado promessa de vantagem indevida para
colaborarem e facilitarem, através de procedimentos licitatórios
fraudulentos, a contratação de empreiteiras para execução das maiores
obras contratadas pela PETROBRAS entre os anos de 2004 e 2014.
Por sua vez, os principais executivos dessas empresas são
acusados de oferecer, prometer e efetivamente pagar “propina” a agentes
públicos e membros de partidos políticos. Para tanto, valendo-se de
terceiros – denominados “operadores” ou “doleiros”– para o repasse
da vantagem indevida, seja através da entrega de dinheiro em espécie,
seja por meio de operações bancárias no Brasil e no exterior.
No caso da Diretoria de Abastecimento, ocupada a partir de maio
de 2004 por PAULO ROBERTO COSTA, o valor da “propina” paga pelas
empresas cartelizadas corresponderia a cerca de 1% (um por cento) dos
contratos firmados.
Página 9 de 72
Este percentual seria alegadamente distribuído entre membros
do Partido Progressista (PP), o próprio PAULO ROBERTO COSTA e,
ainda, os operadores do esquema.3
De acordo com a Tabela A constante da denúncia,4 cerca de 34
contratos, 123 aditivos e 4 transações extrajudiciais teriam sido
celebrados entre 30/03/2007 e 30/03/2012 pelas empresas cartelizadas e
a PETROBRAS (vinculados à Diretoria de Abastecimento), totalizando
pouco mais de R$ 35 bilhões de reais.
Desse total, segundo especula a acusação, cerca de R$ 350
milhões (1%) teriam sido destinados ao pagamento de “propina”5 aos
partícipes do esquema.
Ainda em conformidade com a denúncia oferecida, ratificada em
alegações finais, esses repasses seriam periódicos e ocorreriam à
medida em que os pagamentos dos contratos e respectivos aditivos
eram efetivados em benefício das empresas contratadas.
3 Fls. 9/10 da denúncia.
4 Fls. 18/22 da denúncia.
5 Fls. 9/10 da denúncia.
Página 10 de 72
O primeiro desses pagamentos, consoante revela a mesma Tabela
A, ocorreu em 30/03/2007 (ENGEVIX)6 e, o último, em 30/03/2012
(MENDES JÚNIOR).7 Já em relação aos contratos indicados na Tabela B,
os pagamentos teriam ocorrido no período de 2008 a 2014, a partir de
24 contratos e emissão de 55 notas fiscais frias.
Nesse contexto, PEDRO CORRÊA, ex-deputado federal e pai do
ora Defendente, é apontado pelo Ministério Público Federal como um
dos supostos beneficiários do pretenso esquema criminoso, sendo a ele
atribuída a prática, dentre outros, de corrupção passiva em conjunto com
PAULO ROBERTO COSTA e ALBERTO YOUSSEF (CP, art. 317 – Cap. II,
da denúncia).
No ponto, sustenta a acusação ser PEDRO CORRÊA beneficiário
de repasses mensais de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais)8 promovidos
por ALBERTO YOUSSEF através: (a) da entrega de valores em espécie
ao próprio PEDRO CORRÊA e a terceiros; (b) depósitos efetuados em
contas correntes (de PEDRO CORRÊA e de terceiros).9
6 Processo n. 0800.0030725.07.2, Inicial, equivalente a R$ 224.989.477,13 (Fl. 19 da denúncia).
7 Processo n.º 0802.0045377.08.2, Aditivo 10, equivalente a R$ 107.273.036,38 (Fl. 21 da denúncia).
8 Fl. 30 da denúncia.
9 Fl. 31 da denúncia.
Página 11 de 72
Ainda em relação a PEDRO CORRÊA, é acusado de lavagem de
capitais10 ao receber parte da vantagem indevida por meio dos citados
contratos simulados firmados entre as construtoras investigadas e
empresas controladas por ALBERTO YOUSSEF (MO Consultoria,
Empreiteira Rigidez, RCI Software e GFD Investimentos) – Cf. Tabela B,
da denúncia.
Segundo o MPF, a celebração desses contratos fictícios “tinha o
intuito de viabilizar o repasse de recursos para PEDRO CORRÊA, integrante
do PARTIDO PROGRESSITA e PAULO ROBERTO COSTA com o
distanciamento do dinheiro de sua origem ilícita”.11
É nesse contexto que se inserem as infundadas e indemonstradas
acusações contra a FÁBIO CORRÊA, é dizer, no sentido de que teria
recebido valores provenientes destes contratos com o fim de ocultar e
dissimular a respectiva origem ilícita.
Não obstante, com o encerramento da instrução criminal,
verificou-se justamente aquilo que a defesa já sustentava quando do
oferecimento de sua resposta escrita: a engenhosa, porém demasiado
forçada, acusação de lavagem não tem a menor procedência. Vejamos.
10 Cf. Item III.B, “Primeiro conjunto de atos de lavagem”.
11 Fl. 55 da denúncia.
Página 12 de 72
2. A Falta de Provas. Ausência de provas quanto à existência do fato (33
crimes de lavagem). Inexistência, ainda, de provas de ter o réu concorrido
dolosamente para uma infração penal. Absolvição que se impõe (CPP, art. 386,
II, V e VII)
Conforme restou cabalmente demonstrado, sobretudo a partir da
prova oral produzida em juízo e à luz do contraditório, FÁBIO
CORRÊA, de fato, não teve qualquer envolvimento, direto ou indireto,
doloso ou culposo, nos episódios narrados na denúncia.
Por mais que o Ministério Público Federal haja se empenhado em
demonstrar o contrário, valendo-se para tanto de afirmações vazias e
retóricas, não produziu provas seguras que permitissem, longe de
qualquer dúvida razoável, condenar FÁBIO CORRÊA pela prática de
lavagem de dinheiro, sobretudo à vista dos fatos e dos argumentos que
dão sustentação a tão descabida, data vênia, acusação.
De saída, verificou-se que FÁBIO CORRÊA não teve qualquer
participação naquilo que a acusação chamou de “manobras políticas”,12
engendradas por membros do Partido Progressista para obter a
indicação de PAULO ROBERTO COSTA à Diretoria de Abastecimento
da PETROBRAS. Rigorosamente nenhuma.
12 Fls. 5; 8 da denúncia.
Página 13 de 72
Do mesmo modo, nenhuma prova foi produzida nos autos que
pudesse vincular o Defendente, formal ou materialmente, aos atos de
corrupção (ativa e passiva), à formação de cartel ou fraude à licitação,
o mesmo sucedendo em relação aos personagens, centrais ou
periféricos, envolvidos no alegado esquema criminoso.
Seja na fase de inquérito, seja na fase judicial, não se observou o
menor indício de que FÁBIO CORRÊA tenha participado de alguma das
dezenas de reuniões13 realizadas entre membros de partidos políticos e os
representantes das empresas corruptoras, ou entre executivos destas e
altos funcionários da PETROBRAS, nas quais teriam sido discutidos,
acertados e definidos “percentuais de propina a serem pagos em razão dos
contratos celebrados na Diretoria de Abastecimento”.
Mais do que isso, não há qualquer evidência de que FÁBIO
CORRÊA tenha mantido contatos, de caráter particular ou profissional,
no período descrito na denúncia (de 2004 a 2014) ou fora dele, com
quaisquer dos agentes integrantes do núcleo político,14 econômico,15
administrativo16 ou financeiro17.
13 Fl. 22 da denúncia.
14 Formado principalmente por parlamentares e ex-parlamentares (Fl. 52 da denúncia).
15 Formado pelas empreiteiras cartelizadas contratadas pela Petrobras (Fl. 52 da denúncia).
16 Formado pelos funcionários de alto escalão da Petrobras (Fls. 52/53 da denúncia).
17 Formado pelos “operadores” responsáveis pelo repasse de dinheiro aos integrantes dos
núcleos político e administrativo (Fl. 53 da denúncia).
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Definitivamente, não há ligações telefônicas, mensagens de
celular nem e-mails interceptados ou posteriormente descobertos que
associem o Defendente de algum modo aos fatos e aos personagens da
Operação Lava Jato.
Nesse mesmo contexto, também não foram produzidas
quaisquer provas que ligassem FÁBIO CORRÊA, objetiva ou
subjetivamente, formal ou materialmente, aos contratos celebrados
entre a PETROBRAS e as empreiteiras (Tabela A, da denúncia), e entre
construtoras e as empresas de fachada operadas por ALBERTO
YOUSSEF (Tabela B). Muito menos entre as empreiteiras e PAULO
ROBERTO COSTA após a saída deste da Diretoria de Abastecimento.
A questão, de fato, assume especial relevo quanto à acusação de
lavagem de dinheiro que recai sobre FÁBIO CORRÊA. Isto porque,
sustenta o MPF que os valores supostamente recebidos pelo
Defendente no escritório de ALBERTO YOUSSEF teriam relação próxima
aos contratos simulados celebrados entre as construtoras18 e as
empresas operadas por ALBERTO YOUSSEF19, e remota no tocante aos
contratos firmados entre as empreiteiras e a PETROBRAS.
18 ENGEVIX ENGENHARIA S/A, GALVÃO ENGENHARIA S/A, CONSTRUTORA
CAMARGO CORREA S/A, UTC ENGENHARIA, CONSTRUTORA OAS LTDA e MENDES JÚNIOR
TRADING E ENGENHARIA S/A.
19 MO CONSULTORIA, EMPREITEIRA RIGIDEZ, GFD INVESTIMENTOS, RCI SOFTWARE.
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Mais precisamente, afirma o parquet que os contratos celebrados
entre as empreiteiras cartelizadas e empresas controladas por YOUSSEF
(Tabela B) seriam fictícios e teriam como finalidade “distanciar o dinheiro
de sua origem ilícita, antes do repasse da propina para PAULO ROBERTO
COSTA e agentes políticos do PARTIDO PROGRESSISTA, entre eles,
PEDRO CORRÊA (...)”.20
No que se refere a FÁBIO CORRÊA, ele é justamente acusado de
“ultimar o processo de branqueamento” desses valores21 através do
recebimento de quantias em espécie no escritório de YOUSSEF.
Essa acusação, no entanto, caiu por terra a partir do momento em
que o MPF deixou de produzir provas que associassem o Defendente
aos contratos (Tabelas A e B), quer no sentido material (de eventual
auxílio), quer no plano moral, no sentido de ao menos ter conhecimento
quanto à sua existência.
Nada, rigorosamente nada foi comprovado a esse respeito,
notadamente para o fim de demonstrar o dolo da conduta do
Defendente (conforme será melhor exposto adiante).
20 Fl. 61 da denúncia.
21 Fl. 61 da denúncia.
Página 16 de 72
Há mais.
O Ministério Público Federal também não demonstrou, sequer, o
nexo material e temporal entre os valores que afirma terem sido recebidos
por FÁBIO CORRÊA e a sua origem entre os 34 contratos, 123 aditivos e
4 transações extrajudiciais (Tabela A) ou os 21 contratos e 55 notas fiscais
frias (Tabela B).
Longe disso, limita-se o parquet a sustentar uma imputação
global, genérica, que não individualiza os fatos e prejudica sobremodo
o exercício do contraditório pelo acusado.
E não é preciso ir muito além para constatar que a falta de
individualização desses fatos, e em especial do nexo temporal e
material, não permite identificar a relação econômica entre os valores
pagos nos respectivos contratos e o percentual que a acusação afirma
ter sido repassado aos membros do Partido Progressista, notadamente
a PEDRO CORRÊA.
Não há, neste sentido, a necessária construção do fluxo
econômico, isto é, das etapas percorridas pelos valores de origem ilícita
até o destino final.
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Por fim, seja ao oferecer a denúncia, seja ao apresentar suas
alegações finais, o parquet federal não comprovou, longe de qualquer
dúvida razoável, tenha FÁBIO CORRÊA: (i) Recebido valores por trinta
e três vezes, como sustenta a acusação; (ii) Agido com dolo (direto ou
eventual).
Somente esses fatos, com efeito, seriam suficientes a autorizar e,
antes, impor, a absolvição do Defendente com fulcro no art. 386, II, V e
VII do Código de Processo Penal.
Seja como for, a improcedência da acusação também resulta da
análise de provas que atestam a inocência do Defendente.
3. Da Verdade sobre os Fatos. Versão da defesa confirmada pela prova
testemunhal produzida em juízo. Existência de provas indubitáveis de que
o Defendente não participou do esquema delitivo. Absolvição que se impõe
(CPP, art. 386, IV).
Conforme a defesa teve oportunidade de enfatizar, desde o
início, FÁBIO CORRÊA jamais participou ou integrou qualquer
esquema criminoso (como, de plano, reconheceu esse douto Juízo ao
rejeitar a denúncia quanto ao ponto).
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Tampouco seria verdadeiro, como veio a demonstrar a prova
produzida ao longo da instrução, que tivesse agido “de modo consciente,
voluntário e reiterado, com unidade de desígnios” para ocultar ou
dissimular valores provenientes ou não da alegada empresa criminosa.
Isso jamais ocorreu e, como já ressaltado, não foi minimamente
demonstrado pelo Ministério Público Federal.
Neste sentido, reitera o Defendente que não tinha conhecimento
e nem motivo razoável para suspeitar que o valor por ele recebido,
numa única vez, no escritório de ALBERTO YOUSSEF, a pedido de seu
pai PEDRO CORRÊA, tivesse alguma relação com pagamento de
propina, especialmente oriunda de contratos (fraudulentos) celebrados
entre empreiteiras cartelizadas e a PETROBRAS, ou a prática de
qualquer infração penal.
Ou seja, não agiu com má-fé, seja no sentido de ocultar ou
dissimular a origem de valores.
A maior prova de sua inocência, com efeito, vem justamente do
depoimento prestado por um dos principais – senão o principal –
colaboradores da Operação Lava Jato: ALBERTO YOUSSEF!
Página 19 de 72
Como se sabe, as informações prestadas por ALBERTO
YOUSSEF em diversos termos de colaboração premiada serviram de
elemento indiciário para o ajuizamento de dezenas de denúncias pelo
MPF, a maior parte delas recebidas por esse douto juízo.
Em seu depoimento judicial (evento 380), corroborado pelo
testemunho de PAULO ROBERTO COSTA e pelo interrogatório de
PEDRO CORRÊA, ALBERTO YOUSSEF foi taxativo ao afirmar a
inocência de FÁBIO CORRÊA, declarando enfaticamente que o mesmo
não tinha como nunca teve qualquer envolvimento no esquema
criminoso.
Ou, como disse com suas próprias palavras, ele “não participava
disso”.22
É o que afirmou, textualmente, ao ser questionado por esse douto
juízo se em algum momento entregou ou determinou a entrega de
dinheiro a FÁBIO CORRÊA:
Juiz Federal: - O senhor conheceu o Senhor Fábio Correa?
Interrogado: - Conheci.
22 Esse depoimento, aliás, corrobora todos os outros prestados por ALBERTO YOUSSEF nos
vários inquéritos policiais/ações instaurados em seu desfavor. Em todas as vezes que cita pagamento
de propina a membros do Partido Progressista ou, mais especialmente, a PEDRO CORRÊA, não há
menção ao nome de FÁBIO CORRÊA como beneficiário ou pessoa que tivesse alguma participação
no suposto esquema.
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Juiz Federal: - O senhor entregou dinheiro para ele ou
solicitou que outros entregassem dinheiro para ele?
Interrogado:- Não, que eu me lembre não. Na verdade,
quem tinha o relacionamento e que estava envolvido nesse
esquema era o Senhor Pedro Correa, o Senhor Fábio não
participava disso.
Indagado sobre as idas de FÁBIO CORRÊA ao seu escritório,
ALBERTO teve oportunidade de esclarecer, com todas as letras, que o
Defendente apenas acompanhava o pai PEDRO CORRÊA, sem participar
das conversações (ao que se supõe, relativas a valores):
Juiz Federal: -Ele já foi ao seu escritório, o Senhor Fábio?
Interrogado: - Sim, ele ia sempre com o pai.
Juiz Federal: - E para tratar de que tipo de assunto?
Interrogado: - Olha, o pai sempre ia tratar de assuntos
referentes a valores e referente à campanha, ele só o
acompanhava.
Juiz Federal: - E ele ouvia, participava dessas conversações?
Interrogado: - Muitas vezes não.
Juiz Federal: - E o que ele ficava fazendo?
Interrogado: - Ficava sentado aguardando.
Em outra expressiva passagem de seu interrogatório, YOUSSEF
fez questão de frisar que das vezes em que chegou a travar algum tipo
de conversação com FÁBIO CORRÊA nunca o fez em relação a “nada
referente a dinheiro, esse tipo de coisa”:
Página 21 de 72
Juiz Federal:- Umas perguntas adicionais do Juízo aqui.
Essas visitas que o Senhor Fábio fez ao seu escritório, o senhor
chegou a conversar com ele alguma vez?
Interrogado:- Sempre conversei com o Fábio, mas não
nada referente a dinheiro, esse tipo de coisa.
Explicou, ainda, os motivos que levaram FÁBIO CORRÊA a
comparecer em cerca de trinta e três ocasiões ao seu escritório.
Sobre a questão, esclareceu ALBERTO YOUSSEF que, além de
simplesmente acompanhar PEDRO CORRÊA, em algumas outras
oportunidades o Defendente “estava em São Paulo e não tinha para onde
ir”, ou “muitas vezes ele ia para o escritório e ficava lá esperando alguém ou
alguma [coisa]”, ou, ainda, simplesmente aparecia durante o período em
que acompanhou a irmã na campanha em São Paulo:
Juiz Federal:- O senhor se recorda se o Senhor Fábio Correa
foi muitas vezes, poucas vezes lá nos seus escritórios?
Interrogado: - Olha, eu acredito que em 2010 ele esteve
mais vezes no meu escritório, por conta de que eu acho que ele
estava ajudando a irmã na campanha. E as outras vezes eu acho
que ele foi normal. Às vezes que ia com o pai a São Paulo, muitas
vezes ia no meu escritório.
Juiz Federal: - Ele foi também sem o pai no seu escritório?
Interrogado: - Acredito que deva ter ido.
Juiz Federal: - E quando ele ia sem o pai ele ia fazer o quê?
Interrogado: - Ah muitas vezes ele estava em São Paulo e
não tinha para onde ir, muitas vezes ele ia para o escritório e ficava
lá esperando alguém ou alguma...
Página 22 de 72
Por fim, ALBERTO YOUSSEF teve oportunidade de prestar
esclarecimentos a propósito de uma possível dívida deixada por JOSÉ
JANENE em favor de PEDRO CORRÊA, oriunda da compra e venda de
animais.
Essa dívida, vale recordar, foi justamente a explicação dada
posteriormente por PEDRO CORRÊA ao Defendente para justificar o
recebimento do valor junto a RAFAEL ÂNGULO em uma das visitas que
o Defendente fez ao escritório de ALBERTO YOUSSEF.
Sobre o fato, informou ALBERTO YOUSSEF:
Juiz Federal:- O senhor sabe se o Senhor José Janene
tinha alguma coisa com o Senhor Pedro Correa, alguma
dívida, alguma coisa parecida?
Interrogado:- Olha, eles eram muito amigos, pode ser
que sim. Mas nunca o Senhor José me relatou nada a respeito
desses assuntos.
Juiz Federal: - Esses pagamentos então não tinham
nenhuma relação com eventuais negócios anteriores do Senhor
José Janene com o Senhor Pedro Correa, de venda de bens, coisa
parecida.
Interrogado: - Eu acredito que não.
Juiz Federal: - Acredita ou não, porque o senhor saberia ou
não saberia?
Interrogado: - Olha, a mim o Senhor José nunca relatou esse
tipo de situação.
Página 23 de 72
Como se vê, embora tenha declarado que JOSÉ JANENE jamais
tenha lhe informado a respeito dessa dívida, YOUSSEF não descartou a
possibilidade de sua existência, dado o grau de amizade existente entre
JANENE e PEDRO CORRÊA.
A esse contundente e avassalador depoimento, somam-se outros,
não menos relevantes, prestados por PEDRO CORRÊA e PAULO
ROBERTO COSTA, este último, vale frisar, na condição de testemunha
do MPF.
No caso de PEDRO CORRÊA, mesmo exercendo parcialmente o
direito de permanecer em silêncio, fez questão de esclarecer que o
Defendente, a exemplo de outros acusados neste processo, nada tem a
ver com os fatos, e que o mesmo apenas atendeu a um pedido seu
quando se dirigiu ao escritório de YOUSSEF e lá recebeu valor em
espécie:
Juiz Federal: - O senhor prefere falar ou o senhor prefere
ficar em silêncio?
Interrogado: - Eu preferia fazer só um esclarecimento
inicialmente e depois eu vou permanecer em silêncio.
Juiz Federal: - Certo. Então, qual esclarecimento que o
senhor quer fazer?
Interrogado: - Só dizer que realmente eu estou sendo acusado
com outras pessoas e eu quero dizer que essas outras pessoas não
têm nenhuma responsabilidade dos fatos, eu assumo a
responsabilidade de todos os fatos, dizer que meu filho, o réu Fábio
Correa de Oliveira Andrade Neto, a ré Aline Lemos Correa de
Página 24 de 72
Oliveira Andrade, a ré Márcia Danzi Russo Correa e o réu Ivan
Vernon, eles faziam apenas, eles cumpriam as determinações
que eu mandava, eu era a pessoa que tratava dos assuntos, todos
os assuntos referentes às imputações que estão sendo feitas comigo
através do Paulo Roberto Costa e do Alberto Youssef.
Outro importante e elucidativo depoimento foi prestado por
PAULO ROBERTO COSTA (evento 191), seguramente um dos
personagens principais da Operação Lava Jato ao lado de ALBERTO
YOUSSEF.
Segundo esclareceu a testemunha em juízo, não possuía
qualquer tipo de aproximação ou contato com FÁBIO CORRÊA, a quem
disse conhecer apenas de eventos sociais. Foi ainda mais enfático ao
declarar, diante de questionamento da defesa, jamais ter mantido
qualquer tipo de conversa ou contato a respeito de questões
envolvendo a PETROBRAS.
Ora, de um lado, tem-se o depoimento de um significativo
colaborador e principal integrante do núcleo financeiro (YOUSSEF)
inocentando o Defendente.
De outro, o ex-funcionário da PETROBRAS, igualmente
colaborador e integrante do núcleo administrativo (PAULO ROBERTO
COSTA), negando, ainda que implicitamente, a participação de FÁBIO
CORRÊA no episódio.
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Somando-se a todos eles, o depoimento de PEDRO CORRÊA,
justamente de quem partiu o pedido para que o Defendente recebesse
valores que supunha tratar-se do pagamento de uma dívida existente
entre seu pai e JOSÉ JANENE.
Em outras palavras, os três principais personagens deste
processo, dois deles colaboradores da justiça compromissados com o
dever de dizer a verdade, inocentam por completo o Defendente, ora
afirmando, categoricamente, que nenhum envolvimento possui nos
fatos apurados (como foi o caso de YOUSSEF e PEDRO CORRÊA), ora
não apontando qualquer fato que o vinculasse ao alegado esquema
criminoso (PAULO ROBERTO COSTA).
Inobstante isso, o MPF procura desacreditar, em suas alegações
finais, justamente o depoimento prestado por um dos seus principais
colaboradores: ALBERTO YOUSSEF. O mesmo, insista-se, cujas
informações baseiam o oferecimento de uma série de denúncias pelo
Ministério Público, inclusive a destes autos. Tudo a revelar, de forma
escancarada, uma flagrante incoerência do discurso acusatório.
No caso, o MPF tenta desqualificar o depoimento dessa
testemunha-chave, precisamente no ponto em que inocenta FÁBIO
CORRÊA. Alegando, para tanto, que suas declarações “conflitariam”
com aquelas prestadas por seu assessor/auxiliar RAFAEL ÂNGULO.
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Sem razão, data vênia.
Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que a credibilidade de
RAFAEL ÂNGULO foi colocada em xeque pelo próprio Ministério
Público Federal ao reconhecer a existência de uma série de contradições
entre os depoimentos prestados na fase policial e judicial.
De acordo com o MPF:
“(...)
Em que pese o réu RAFAEL ANGULO LOPEZ,
ao ser interrogado judicialmente, afirmar que não fez
depósitos em contas de titularidade de PEDRO CORRÊA,
sua versão não está correta, uma vez que, além de divergir
com as declarações prestadas anteriormente 36 , conforme
relatado por YOUSSEF seria RAFAEL o responsável por
realizar os depósitos bancários não identificados.
(...)”
Em segundo lugar, necessário destacar que em relação aos
supostos repasses de dinheiro a FÁBIO CORRÊA que RAFAEL
ÂNGULO disse haver realizado, a versão não encontra respaldo em
qualquer outra prova dos autos.
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Nem mesmo a Planilha apresentada é suficiente a corroborar
essa mera alegação, uma vez que o FÁBIO CORRÊA apenas aparece,
uma única vez, como receptor de R$ 35 mil, e nada mais.
Por isso mesmo, o que se tem, ao fim e ao cabo, é a palavra de
RAFAEL ÂNGULO, não confirmada por ALBERTO YOUSSEF, contra a
do ora Defendente. E nada mais.
A mesma fragilidade probatória é encontrada em relação à
declaração de ÂNGULO de que FÁBIO CORRÊA teria fornecido boletos
bancários diversos para pagamento e listas de nomes e contas correntes
para depósito.
Até hoje, porém, nenhum boleto bancário foi apresentado.
Nenhuma lista de nomes foi exibida. Tampouco há comprovação
material de que eventuais depósitos realizados por RAFAEL ÂNGULO
em contas correntes de terceiros tenham sido efetivamente indicadas
por FÁBIO CORRÊA.
Ao contrário, essa declaração é infirmada por ALBERTO
YOUSSEF, ao esclarecer que o responsável pelo fornecimento de contas
para depósito seria PEDRO CORRÊA.
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A despeito de tudo isso, não se pode ignorar que diversos outros
trechos do depoimento judicial prestado por RAFAEL ÂNGULO, longe
de incriminarem FÁBIO CORRÊA, ora infirmam a acusação de lavagem
sustentada pelo MPF, ora vão ao encontro da versão da defesa.
De um lado, RAFAEL ÂNGULO deixa claro que jamais entregou
dinheiro a FÁBIO CORRÊA nas vezes em que esteve em Recife. De
outro, esclarece que jamais efetivou qualquer depósito em benefício
dele.
Também foi bastante taxativo ao afirmar que jamais conversou a
respeito da natureza do dinheiro que disse ter entregue a FÁBIO
CORRÊA, afirmando ainda que jamais presenciou qualquer conversa a
respeito disso entre ele Defendente e ALBERTO YOUSSEF, entre ele e
PEDRO CORRÊA, ou com qualquer outra pessoa:
Juiz Federal:- Quando, por exemplo, o Senhor Pedro Correa
ia buscar esse dinheiro ou o Senhor Fábio Correa ia buscar esse
dinheiro lá no escritório, não havia alguma conversação a respeito
da natureza desse dinheiro, o que era esse dinheiro?
Interrogado:- Se havia era na sala do Senhor Alberto, que a
minha sala era separada e se eles conversassem de onde vinha ou
de que era ou porque, só entre eles.
Juiz Federal: - Nunca nenhum deles chegou: - “Olha, eu
vim pegar o dinheiro da venda do carro, um carro que eu vendi
para o Senhor Alberto Youssef”.
Interrogado: - Não.
(...)
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Juiz Federal:- Quando o senhor encontrava o Pedro
Correa nessas entregas ou o Senhor Fábio Correa ou mais
alguém, nunca teve alguma conversa a respeito do que eram
esses valores?
Interrogado:- Não, entre eles ou que eu presenciei não.
Em outro momento do interrogatório, e indagado se ele próprio
tinha conhecimento da “finalidade” ou “origem” do dinheiro que disse
haver repassado a FÁBIO CORRÊA, RAFAEL ÂNGULO respondeu
negativamente, ou seja, que não sabia explicar a origem nem finalidade
dos valores que disse ter entregue:
Defesa:- O senhor tem conhecimento de qual era a finalidade
desse dinheiro que o senhor disse que algumas vezes entregou a
Fábio no escritório em São Paulo? O senhor sabia qual era a
finalidade, esse dinheiro era destinado, era para Fábio, era para ser
entregue ao Senhor Pedro Correa? Era para custear as despesas em
relação aos negócios que o Senhor Pedro Correa tinha em Recife e
tem ainda no estado de Pernambuco? O senhor sabe dizer mais ou
menos ou o senhor não sabe...
Interrogado:- Eu sei que o Senhor Fábio Correa ele deixava
uma lista de terceiros para fracionar esses valores para
pagamentos, depósitos em nome de pessoas, de terceiros, não sei
exatamente para quê, para o próprio Senhor Fábio nunca depositei
nada, mas para a Dalla Costa depositei. E isso eu sei que eram
contas do pai dele ou dele, não sei.
Defesa:- Não sabe explicar a origem...
Interrogado:- Se é de um ou do outro não sei.
Defesa:- A finalidade.
Interrogado:- Não.
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Como então, eminente julgador, diante desses fatos, chegar à
conclusão de que FÁBIO CORRÊA sabia ou poderia saber da origem ilícita
do repasse, ou, mais especificamente, que o valor por ele recebido
tivesse alguma relação com crimes perpetrados em detrimento da
PETROBRAS, se o próprio autor do suposto repasse não tinha
conhecimento disso, e, mais do que isso, se o próprio responsável
direto – ALBERTO YOUSSEF – afirmou categoricamente que jamais
tratou desse assunto com o Defendente?
Não fosse o bastante, outra importante figura na trama da Lava
Jato, LEONARDO MEIRELLES, também não fez qualquer referência à
participação de FÁBIO CORRÊA nos episódios. Aliás, sequer chegou a
mencionar seu nome durante o depoimento prestado em juízo e na
presença do MPF, que nada indagou a esse respeito.
O mesmo ocorreu em relação às testemunhas RENASCI CAMBUI
(evento 231) e VERA LÚCIA NAPOLI (evento 231).
Já em relação às demais testemunhas arroladas pelo MPF, em
especial MEIRE BONFIM DA SILVA POZA e CARLOS ALBERTO
PEREIRA DA COSTA, Procurador e administrador da GFD, afirmaram
desconhecer a pessoa de FÁBIO CORRÊA.
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Por fim, no que se refere ao depoimento judicial prestado pelo
corréu IVAN VERNON, nada trouxe a respeito da imputação de
lavagem de dinheiro que recai sobre FÁBIO CORRÊA, seja para
beneficiá-lo ou incriminá-lo.
Presente esse contexto, não há como acolher a pretensão
condenatória deduzida pelo Ministério Público Federal.
Com efeito, não desconhece Vossa Excelência que o réu tem
direito a ser julgado e condenado com base em prova segura e
inequívoca, isto é, sem que exista margem a qualquer tipo de dúvida,
demonstrando, assim, “plena clareza com a qual a verdade aparece ao
espírito e determina sua adesão ou convicção inabalável”, como acentuava
BORGES DA ROSA (Processo penal brasileiro, 1942, v.4, p. 65).
Sabe, portanto, que para prolação de um decreto penal
condenatório, é indispensável prova robusta que dê certeza da
existência do delito e seu autor. A íntima convicção do julgador deve
sempre se apoiar em dados objetivos indiscutíveis, caso contrário,
transforma o princípio do livre convencimento em arbítrio (TJRS -
Apelação nº 70003156254, Rel. Des. Sylvio Baptista).
A condenação, portanto, exige a certeza e não basta, sequer, a
alta probabilidade, que é apenas um juízo de incerteza de nossa mente
em torno à existência de certa realidade.
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A certeza é aqui a conscientia dubitandi secura, de que falava VICO,
e não admite graus. Tem de fundar-se em dados objetivos indiscutíveis,
de caráter geral, que evidenciem o delito e a autoria (Sauer, Grundlagen
des Prozessrechts, 1929, 75), sob pena de conduzir tão somente à íntima
convicção, insuficiente.
A propósito, afirma SABATINI (Teoria delle Prove nel Diritto
Giudiziario Penale, 1911, II, p. 33), que "a íntima convicção, como
sentimento da certeza, sem o concurso de dados objetivos de justificação, não é
verdadeira e própria certeza, porque, faltando aqueles dados objetivos de
justificação, faltam em nosso espírito as forças que o induzem a ser certo. No
lugar da certeza, temos a simples crença".
O princípio do livre convencimento do juiz, como ensina
UMBERTO DEL POZZO ("Appunti preliminari per una teoria della
probabilità nel processo penale", no volume Studi Antolisei, I, 445),
“não pode conduzir à arbitrária substituição da acurada busca da certeza, em
termos objetivos e gerais, por uma apodítica afirmação de "convencimento",
como verdadeiramente ocorreu nos autos.
Por isso mesmo, nenhuma pena pode ser aplicada sem a mais
completa certeza da falta. A pena, disciplinar ou criminal, atinge a
dignidade, a honra e a estima da pessoa, ferindo-a gravemente no
plano moral, além de representar a perda de bens ou interesses
materiais.
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Razão porque, como diz JEAN PATARIN ("La Théorie des
preuves en Droit Pénal", no volume, Quelques Aspects de l'Autonomie du
Droit Pénal, 1956, II) "la recherche d'ume certitude parfaite se révèle une
exigence particulièrement impérieuse du droit pénal".
Nesse sentido, não há qualquer discrepância entre os autores: a
dúvida nessa matéria, é sinônimo de ausência de prova (cf. Nelson
Hungria, Prova Penal, RF 138/338). Remo Pannain ("La certezza della
prova", in Scritti Giuridici in Onore di A. de Marsico, 1960, II, 267) afirma
que "ognun compreende che, per pronunziare un giudizio positivo, non basta
il dubbio in quale viene proclamato con l'insufficenza di prove". Isso porque,
se há dúvida, é porque a prova não está feita: "s'il subsiste un doute, c'est que
la preuve n'est pas falte" (Gorphe).
É o princípio que vigora no Direito anglo-americano, incluído
entre as regras do devido processo legal (due process of law). Não se pode
aplicar a pena sem que a prova exclua qualquer dúvida razoável (any
reasonable doubt). Aqui não basta estabelecer sequer uma alta
probabilidade (it is not suficient to establish a probability, even a strong one):
é necessário que o fato fique demonstrado de modo a conduzir à
certeza moral, que convença ao entendimento, satisfaça à razão e dirija
o raciocínio, sem qualquer possibilidade de dúvida (cf. Kenny's,
Outlines of Criminal Law, 1958, 480)" (Jurisprudência Criminal, vol. 2,
ed. José Bushatsky, 1979, pp. 806/808).
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Com efeito, o Defendente reitera aquilo que já afirmou em
resposta escrita: jamais participou ou se envolveu no esquema
denunciado pelo Ministério Público Federal.
Ainda faz questão de esclarecer que maioria das vezes em que
foi ao escritório de ALBERTO YOUSSEF o fez na condição de mero
acompanhante de PEDRO CORRÊA, como, aliás, foi confirmado pelo
próprio YOUSSEF. E, mesmo nestas oportunidades, jamais presenciou
ou ouviu qualquer coisa a respeito da existência de um esquema
criminoso contra a PETROBRAS. Ou, ainda, que valores eventualmente
recebidos por seu pai consistiriam em repasse de “propina”
relacionada ao citado esquema.
Para além de tudo isso, o Defendente reafirma que jamais
desconfiou que aqueles recursos pudessem ter qualquer relação com
pagamento de “propina”, tanto que compareceu pessoalmente ao
escritório – poderia fazê-lo através de terceiros se desejasse –
identificando-se em todas as vezes, deixando-se fotografar e registrar
suas frequências na portaria.
Com o devido e merecido respeito, difícil imaginar que alguém,
ciente e consciente de que praticava ou contribuía para um crime dessa
magnitude, se dispusesse a ir pessoalmente a um escritório de
“lavagem” – segundo afirma o MPF – e, mais do que isso, não hesitaria
em deixar vestígios dessas passagens.
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É algo, data vênia, que agride a inteligência cogitar.
À luz de todas essas considerações, impõe-se a absolvição do
Defendente com fundamento no art. 386, II, IV, V e VII do Código de
Processo Penal.
4. DA ATIPICIDADE
Embora a defesa esteja absolutamente convencida quanto à
absolvição por falta de provas, não poderia furtar-se ao dever de trazer
alguns questionamentos em torno da manifesta atipicidade do fato
imputado. Referimo-nos, no caso, à ausência de tipicidade por ausência
dos elementos subjetivo (dolo) e objetivo (verbos nucleares) do tipo.
Conforme demonstrará a defesa:
(a) O Defendente agiu em clara situação de erro de tipo escusável
(CP, art. 20);
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(b) a hipótese narrada na denúncia, ratificada em alegações
finais, corresponde, no limite, ao exaurimento de crime de corrupção já
consumado e do qual não participou o Defendente, sendo, portanto,
impunível (post factum impunível);
(c) os delitos de formação de cartel e fraude à licitação, que a
acusação afirma constituírem crimes antecedentes à lavagem, não
figuravam, ao tempo de sua consumação e do próprio ato de lavagem,
no rol taxativo descrito na antiga redação do art. 1.º da Lei 9.613/98,
vigente à época dos fatos apontados.
(d) a conduta imputada – ato de receber valores em espécie – por
si só e nas circunstâncias narradas, não corresponde, objetiva e
ontologicamente, a uma ação típica de ocultação ou dissimulação.
4.1. Do Erro de Tipo Escusável
Conforme a defesa teve oportunidade de destacar ao oferecer
resposta escrita à acusação (evento 69), FÁBIO CORRÊA, além de
desconhecer o alegado esquema criminosa, não sabia nem tinha
condições de saber nem desconfiar que o valor por ele recebido tivesse
origem em crimes perpetrados contra a PETROBRAS.
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Por essa razão, e tendo em vista que o MPF não fez prova em
sentido contrário, caso realmente venha a ser comprovado que o valor
recebido pelo Defendente possua alguma relação com o repasse de
dinheiro de origem ilícita, mesmo assim não há como imputar-lhe a
prática de lavagem de dinheiro uma vez configurada a hipótese de erro
de tipo escusável (CP, art. 20):
Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo
legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime
culposo, se previsto em lei.
Como se sabe, o erro de tipo repercute diretamente no dolo,
impedindo sua constituição pela ausência de um de seus elementos
essenciais, que é o elemento cognitivo ou intelectivo. Elemento
cognitivo, este, que representa a ideia de que o agente, ao atuar
dolosamente, deve saber o que faz através da compreensão dos
elementos que caracterizam sua ação como uma ação típica, tais
como o sujeito, resultado, relação de causalidade, objeto material,
etc.
Na presente hipótese, esse erro incidiu, precisamente, sobre a
elementar do tipo “(...) valores provenientes, direta ou indiretamente, de
infração penal”.
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Por outro lado, estamos diante de um erro de tipo essencial uma
vez que, em decorrência de uma falsa percepção ou completa
ignorância da realidade, o Defendente acabou praticando, sem
consciência, uma ação típica prevista como crime (no caso, lavagem
de dinheiro).
Além de essencial, é inevitável na medida em que não é
possível falar em omissão da cautela ou diligência exigível nas
circunstâncias. A bem da verdade, consideradas as circunstâncias do
fato, qualquer pessoa no lugar do Defendente teria incidido no
mesmo erro.
A propósito, o próprio MPF chegou a reconhecer, ainda que
implicitamente, a falta de provas objetivas de que o Defendente haja,
de fato, atuado com dolo direto. Não obstante, em vez de reconhecer a
atipicidade do fato como consequência inafastável dessa premissa, o
órgão acusador buscou uma “solução alternativa”, de última hora, por
assim dizer.
Mudando completamente a sua estratégia e a própria tese
acusatória, passou a sustentar a possibilidade de condenação por dolo
eventual.
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Esqueceu-se o parquet, entretanto, que não lhe é dado alterar de
uma hora para outra, e ao sabor de suas conveniências, a tese
acusatória.
Ainda mais quando se trata de uma clara manobra para evitar
uma inafastável absolvição por falta de provas e atipicidade da conduta
inicialmente imputada.
Seja como for, a tese inovadora do MPF – já que sustentada
apenas em alegações finais, quando não lhe foi possível comprovar o
dolo direto – não merece prosperar ao ser confrontada no mérito.
A começar pelo fato de que se contrapõe à posição dominante
da doutrina e jurisprudência, que exigem o dolo direto para
configuração do crime de lavagem, isto é, a demonstração “que o agente
conhecia a procedência criminosa dos bens e agiu com consciência e vontade de
encobri-lo”.23
De fato, para essa corrente amplamente majoritária, a ação
constitutiva de branqueamento de capitais há de ser perpetrada com a
especial "finalidade de encobrir ou dissimular a utilização do patrimônio
23 Idem.
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ilícito resultante de um dos crimes anteriores".24 Finalidade, essa, que,
portanto, "deverá obrigatoriamente integrar o dolo ao nível do tipo
subjetivo".25
Nessa linha, aliás, estão a Convenção de Viena (art. 3, 1, b), de
Palermo (art. 6, 1) e a Directiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e
do Conselho (26.10.05) (art1, 2, a e b).
Todas elas indicando que apenas quem tem pleno conhecimento da
procedência ilícita dos bens pratica lavagem de dinheiro.
O mesmo se extrai no direito comparado, como no caso da
legislação lusitana sobre branqueamento de capitais (art. 2.º. 1).
Na doutrina brasileira, essa é a posição adotada, dentre tantos
outros, por PIERPAOLO BOTTINNI e ANDRÉ LUÍS CALLEGARI.
24 Cf. CALLEGARI, André Luis. Lavagem de dinheiro: aspectos penais da Lei nº 9.613/98, 2ª ed., Porto
Alegre: Livraria do Advogado Editora, p. 111.
25 Cf. MAIA; Rodolfo Tigre. Lavagem de dinheiro (lavagem de ativos provenientes de crime), SP:
Malheiros, 1999, p. 95.
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Para CALLEGARI:26
“Essa posição [que admite o dolo eventual] não nos parece a
mais correta, já que não é possível o autor cometer o delito
apenas com a probabilidade de que estes provenham de um
dos crimes (...) é preciso que o autor conheça o caráter ilícito
de sua conduta e saiba que os bens possuem procedência
ilícita. (...) O dolo deve ser dirigido a esta conduta, ou seja, o
autor atua porque conhece a origem criminosa dos bens e
porque que lhes dar aparência de licitude”.
Não tem sido outra, com efeito, a orientação adotada nos
tribunais superiores.
Ao julgar o 16º Embargos Infringentes na AP 470/MG, o Plenário
da Suprema Corte reforçou a posição de que “A condenação pelo delito de
lavagem de dinheiro depende da comprovação de que o acusado tinha ciência
da origem ilícita dos valores”:
Ementa: Embargos infringentes na AP 470. Lavagem de
dinheiro. 1. Lavagem de valores oriundos de corrupção passiva
praticada pelo próprio agente: 1.1. O recebimento de propina
constitui o marco consumativo do delito de corrupção passiva, na
forma objetiva “receber”, sendo indiferente que seja praticada com
elemento de dissimulação. 1.2. A autolavagem pressupõe a prática
de atos de ocultação autônomos do produto do crime antecedente
26 Cf. Lavagem de dinheiro: Aspectos Penais da Lei nº 9.613/98. Porto Alegre: Livraria do advogado,
2ª ed., 2008. p.152-154.
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(já consumado), não verificados na hipótese. 1.3. Absolvição por
atipicidade da conduta. 2. Lavagem de dinheiro oriundo de crimes
contra a Administração Pública e o Sistema Financeiro Nacional.
2.1. A condenação pelo delito de lavagem de dinheiro depende
da comprovação de que o acusado tinha ciência da origem ilícita
dos valores. 2.2. Absolvição por falta de provas 3. Perda do objeto
quanto à impugnação da perda automática do mandato
parlamentar, tendo em vista a renúncia do embargante. 4.
Embargos parcialmente conhecidos e, nessa extensão, acolhidos
para absolver o embargante da imputação de lavagem de
dinheiro. (AP 470 EI-sextos/MG, rel. Min. Luiz Fux; Rel. p/
Acórdão: Min. Roberto Barroso, DJe 21/08/2014)
No mesmo sentido, tem sido a orientação adotada pelo Superior
Tribunal de Justiça que, em precedente específico, assentou: “O crime
de lavagem de dinheiro tipifica-se desde que o agente saiba que o montante
pecuniário auferido, por meio de dissimulação, é produto de crime antecedente”
(cf. STJ, HC 309.949/DF, Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe
09/03/2015.
E mesmo que se entendesse, na linha de minoritária corrente, que
o tipo de lavagem de capitais admitiria o dolo eventual, ainda assim
não haveria como reconhecê-lo na hipótese presente. Seja porque a
prova testemunhal, como visto, inocenta o Defendente quanto ao seu
envolvimento nos fatos, seja ainda porque a hipótese de erro de tipo
(escusável ou não) sempre elimina o dolo, seja ele direto ou indireto.
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De modo que, no particular, a absolvição se impõe, ex vi do art.
386, III do Código de Processo Penal.
4.2. Do Recebimento como Exaurimento do Crime de Corrupção
Se ainda assim Vossa Excelência não se convencer da plena
configuração do erro de tipo escusável, haverá de reconhecer,
entretanto, que o fato imputado ao Defendente não configura crime
nem é passível de punição. E isto por se tratar, caso verdadeiro fosse,
de mero exaurimento de crime de corrupção já consumado e no qual
não teve participação.
Explica-se.
Já se verificou, e aqui se reitera, que a imputação do crime de
lavagem de dinheiro a FÁBIO CORRÊA estaria remotamente
relacionada a contratos fraudulentos celebrados entre empreiteiras e a
PETROBRAS (Tabela A) e, proximamente, aos contratos alegadamente
simulados firmados entre as empresas cartelizadas e aquelas
controladas por ALBERTO YOUSSEF (Tabela B).
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É a própria denúncia quem afirma – e que aqui se considera
apenas para efeito de argumentação – que os repasses destinados ao
Partido Progressista e, em particular a PEDRO CORRÊA, eram
contrapartida (vantagem indevida) paga pelas empresas cartelizadas
em razão da atuação conivente de PAULO ROBERTO COSTA em
atendimento “aos interesses escusos” da agremiação partidária e das
próprias empreiteiras.
Nos exatos termos da denúncia,27
“Os integrantes do PARTIDO PROGRESSISTA, entre
eles, JOSÉ JANENE e PEDRO CORRÊA, comandando o
esquema de corrupção, discutiam, acertavam e definiam
com as empreiteiras cartelizadas os percentuais de propina
que seriam pagas em razão dos contratos celebrados na
Diretoria de Abastecimento”.
Por sua vez,
“as empresas cartelizadas participantes do ‘CLUBE’, já
previamente ajustadas com o PARTIDO PROGRESSISTA (PP),
firmaram com PAULO ROBERTO COSTA (também
previamente ajustado com o mesmo PARTIDO) e outros
funcionários da PETROBRAS, como RENATO DUQUE, um
compromisso com promessas mútuas que foram reiteradas e
confirmadas ao longo do tempo, de, respectivamente,
27 Fl. 12 da denúncia.
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oferecerem e aceitarem vantagens indevidas que variavam
entre 1% e 5% do valor integral de todos os contratos por elas
celebrados com a PETROBRAS, podendo ser superior a esse
percentual em caso de aditivos contratuais (...)”.28
Um pouco mais adiante, consigna a inicial acusatória:
“(...) especificamente para o denunciado PEDRO
CORRÊA, apurou-se que ALBERTO YOUSSEF
operacionalizava os pagamentos por meios diversos, a
saber: 1) entregas em dinheiro para o próprio
denunciado; 2) entrega de dinheiro para terceiros a
pedido do denunciado; 3) depósitos nas contas de
titularidade do denunciado PEDRO CORRÊA e para
terceiros por este indicados”.29
Partindo dessas premissas, é o próprio Ministério Público
Federal quem inclui expressamente o fato (pagamento e entrega de
dinheiro) no capítulo destinado à imputação de corrupção à PEDRO
CORRÊA.30
28 Fls. 12/13 da denúncia.
29 Fl. 31 da denúncia.
30 Cf. Cap. II. IMPUTAÇÕES DO CRIME DE CORRUPÇÃO, item II.B.3 – Entrega em dinheiro
para terceiros a pedido do denunciado).
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Em outras palavras, é a denúncia quem afirma, textualmente,
que PEDRO CORREA enviava emissários ao escritório de YOUSSEF (no
caso, MÁRCIA DANZI e FÁBIO CORRÊA) para receber valores
correspondentes ao pagamento de propina por crime de corrupção já
consumado na modalidade aceitar e solicitar, verbis:
“II.B.3 – Entregas em dinheiro para terceiros a
pedido do denunciado
Além do recebimento de vantagens indevidas
pessoalmente, PEDRO CORREA também recebia a
propina, no período compreendido entre 14 de maio de
2004 e 17 de março de 2014, por meio do
comparecimento de emissários ao escritórios de
ALBERTO YOUSSEF na cidade de São Paulo/SP, entre
eles, FABIO CORREA, MÁRCIA DANZI em valores
que giravam em torno de R$ 50.000,00 (cinquenta mil
reais) e R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) por
recebimento”.31 (g.n.)
Quando de suas alegações finais, o parquet reitera essas
acusações, afirmando, textualmente, que “no momento das operações de
lavagem, a corrupção passiva tal qual denunciada e demonstrada nos autos já
estava devidamente consumada pela aceitação da vantagem ilícita”.32
31 Fl. 36 da denúncia.
32 Fl. 39 das alegações finais.
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Ora, se o próprio MPF afirma (ainda que infundadamente) que o
recebimento de valores por FÁBIO CORRÊA constituía um dos meios
de pagamento de propina (vantagem indevida) a PEDRO CORRÊA em
razão de crime de corrupção já consumado, a hipótese corresponderia,
no limite, a exaurimento desse crime de corrupção e, não, um crime
autônomo de lavagem de capitais, sob pena de bis in idem.
Com efeito, há uma significativa e insuperável diferença entre o
recebimento capaz de configurar exaurimento do crime de corrupção e
aquele suficiente à caracterização de crime de lavagem (quando
associado a outras ações tendentes à ocultação e dissimulação).
Essa diferenciação, vale recordar, foi implementada pelo
Supremo Tribunal Federal quando do julgamento de Embargos
Infringentes na Ação Penal 470/MG opostos pelo ex-deputado federal
JOÃO PAULO CUNHA.
Como se sabe, o ex-parlamentar foi denunciado por lavagem de
dinheiro ao receber, através de sua esposa e mediante saque efetivado
em instituição financeira, R$ 50 mil provenientes de atos de corrupção
passiva.
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Mutatis mutandis, a mesma situação descrita na presente
denúncia, com a diferença de que em vez de saque em instituição
financeira o valor teria sido recebido em mãos no escritório de
ALBERTO YOUSSEF. E, em vez da esposa, tratar-se-ia do filho do agente
supostamente corrompido.
No referido julgamento, a maioria do Plenário reconheceu que, o
recebimento de dinheiro, naquelas circunstâncias, ainda que a forma
escolhida possa ser tida como escamoteada, corresponderia ao
exaurimento da corrupção já consumada, e não lavagem de capitais, o
que conduziu à absolvição do ex-parlamentar diante da configuração
de um post factum impunível (em relação e ele e, evidentemente, à
esposa).
Em voto emblemático, salientou o eminente Ministro TEORI
ZAVASCKI:
(...) À luz dessas premissas teóricas, tem-se que os fatos
narrados na denúncia – o recebimento de quantia pelo
denunciado por meio de terceira pessoa - não se adequam,
por si sós, à descrição da figura típica. Em primeiro lugar,
porque o mecanismo de utilização da própria esposa não
pode ser considerado como idôneo para qualificá-lo como
“ocultar”; e, ademais, ainda que assim não fosse, a ação
objetiva de "ocultar" reclama, para sua tipicidade, a
existência de um contexto capaz de evidenciar que o agente
realizou tal ação com a finalidade específica de emprestar
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aparência de licitude aos valores. Embora conste da
denúncia a descrição da ocorrência de crimes antecedentes
(contra o sistema financeiro nacional e a administração
pública), bem como a afirmação de que o embargante,
“consciente de que o dinheiro tinha como origem
organização criminosa voltada para a prática” desses crimes,
“almejando ocultar a origem, natureza e o real destinatário
do valor pago como propina, enviou sua esposa Márcia
Regina para sacar no caixa o valor de cinquenta mil reais em
espécie”, ela não descreve qualquer ação ou intenção do réu
tendente ao branqueamento dos valores recebidos. O que se
imputa, a rigor, é o recebimento dos valores referentes ao
crime de corrupção passiva, que, pela circunstância de ter
sido realizado por interposta pessoa, não pode produzir a
consequência de incorporar um crime autônomo, até
porque o recebimento indireto da vantagem indevida
integra o próprio tipo penal do art. 317 do Código Penal
(“solicitar ou receber (...) direta ou indiretamente (...)
vantagem indevida”).
(...)”. (g.n.)
Não foi outra a linha de raciocínio exposta no voto da eminente
Ministra ROSA WEBER:
“(...) Quem vivencia o ilícito procura a sombra e o
silêncio. O pagamento de propina não se faz perante
holofotes. Atividade das mais espúrias, aproveita todas as
formas de dissimulação para sua execução. Ninguém vai
receber dinheiro para corromper-se sem o cuidado de
resguardar-se.
Nessa ótica, assento que, na minha compreensão, e
pedindo vênia aos que entendem de modo diverso, a
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manipulação do dinheiro objeto da propina traduz,
dependendo da hipótese, (i) a própria consumação do crime
de corrupção ou (ii) o exaurimento deste mesmo crime.
(...)
Na corrupção passiva três são os núcleos: solicitar ou
receber vantagem indevida e, ainda, aceitar promessa de
vantagem indevida
Na corrupção ativa, apenas dois: oferecer ou prometer.
Na corrupção ativa ambos os núcleos importam o
reconhecimento do crime formal. Então, nesse delito, a
percepção da vantagem pelo corrompido constitui
exaurimento do delito.
Já na corrupção passiva, sob a forma solicitar, o crime é
formal; mas sob a forma receber – e aqui peço vênia, pela
primeira vez a me manifestar sobre o tema nesta Casa, para
não perfilhar a orientação jurisprudencial nela dominante -,
o crime é material. No primeiro núcleo, basta a solicitação
para realizar o tipo; no segundo, todavia, pressupõe-se o
efetivo recebimento da propina por não se esgotar, o tipo, na
mera aceitação de vantagem indevida.
Logo, em se tratando do núcleo solicitar, o efetivo
recebimento da propina constitui exaurimento do crime; no
caso do núcleo receber, a percepção da vantagem integra a
fase consumativa do delito.
(...)
Assentei que, na minha compreensão, pedindo vênia
aos entendimentos contrários, a manipulação do dinheiro
objeto da propina constitui ora meio de consumação, ora
meio de exaurimento da corrupção, a partir da distinção
entre crimes materiais e formais sob o ângulo do núcleo do
tipo (...). Logo, na hipótese solicitar – assim como nos dois
tipos da corrupção ativa -, o efetivo recebimento da propina
representa o exaurimento da corrupção passiva. Sob a
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forma receber, todavia, a percepção da vantagem está na fase
consumativa da corrupção passiva.
(...)
A meu juízo, contudo, presentes as peculiaridades dos
casos e a explicitação dos conceitos, na forma supra, inviável
considerar o crime de corrupção passiva como antecedente
do crime de lavagem ao feitio legal, inconfundível o
recebimento da vantagem indevida de forma maquiada, pelo
qual se consuma a corrupção passiva na modalidade receber,
com a ocultação e dissimulação ínsitas ao tipo do crime de
lavagem de dinheiro.
A mesma conclusão se impõe, ainda que sem a mesma
limpidez, considerada a corrupção passiva em todos os
seus núcleos como crime formal (consoante a
jurisprudência majoritária desta Casa). Nessa hipótese, o
recebimento dissimulado e mediante artifícios - como nem
se poderia imaginar diferente, pois quem vivencia o ilícito,
procura a sombra e o silêncio -, constitui exaurimento do
delito de corrupção passiva. (...)
Isso não significa que para a consumação do crime
antecedente e o início da lavagem se exija a posse física do
produto do delito por seu agente. O crime antecedente pode
se consumar com a mera disponibilidade sobre o produto do
crime, ainda que não física, pelo agente do delito, mas o ato
configurador da lavagem há de ser, a meu juízo, distinto e
posterior à disponibilidade sobre o produto do crime
antecedente.
No caso presente, concluo que o recebimento da
vantagem indevida por João Paulo Cunha e Henrique
Pizzolato, nas condições em que ocorreram os pagamentos –
com subterfúgios e dissimulação -, integra o tipo penal da
corrupção passiva e não pode, por esse motivo, em se
tratando do mesmo ato, compor o da lavagem de capitais.
(...)”. (g.n.)
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Cumpre salientar que além de absolver o ex-parlamentar a partir
da tese de exaurimento, o e. STF não reconheceu, em relação à sua
esposa, qualquer prática criminosa, seja a título de lavagem, seja de
auxílio em crime de corrupção.
Essas conclusões, que formaram maioria no plenário da Suprema
Corte, já com sua composição atual, aplicam-se exatamente à hipótese
presente.
No caso, aquilo que a denúncia afirma constituir ato de lavagem
(recebimento de quantias em espécie pagas a título de propina), a
jurisprudência do c. STF reconhece tratar-se de mero exaurimento do
crime de corrupção.
Com maior razão ainda, se o próprio MPF reconhece que no
momento do recebimento dos valores o crime de corrupção já havia se
consumado pela aceitação.
E justamente por essa razão, o fato não pode se enquadrar em
crime de lavagem. E muito menos ser punível a título de participação
em corrupção passiva (como melhor exposto adiante), já que o delito,
conforme afirma a própria acusação, já se havia consumado no
momento do recebimento.
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E de fato não haveria de ser diferente já que o crime de corrupção
é de ação múltipla e formal em relação aos núcleos do tipo aceitar e
solicitar. Por essa razão, a prática de uma dessas ações típicas já é
suficiente à consumação do delito, sendo o eventual recebimento,
nestas circunstâncias, mero desdobramento do processo delitivo.
Sem contar, ainda, que FÁBIO CORRÊA jamais foi acusado de
participar dos atos que culminaram na aceitação ou solicitação de
vantagem indevida. Tampouco possui qualquer envolvimento, como
já visto, nos atos de formalização dos contratos fraudulentos que
estariam na gênese dos crimes de corrupção.
Em suma, mostra-se totalmente improcedente e descabido o
pedido de condenação em relação a um possível crime de lavagem de
dinheiro.
4.2.1. Da Emendatio Libelli
Ciente e consciente de que o fato imputado a FÁBIO CORRÊA é
impunível, o MPF, mais uma vez, procura uma “solução alternativa”
que permita uma condenação a todo custo.
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No caso, requereu, pelo princípio da eventualidade, que “caso se
entenda, como pretendem fazer crer os réus, que suas condutas se referem à
consumação do crime de corrupção passiva, seria necessário aplicar o instituto
da emendatio libelli (artigo 384 do Código de Processo Penal), considerando
que a conduta por eles praticadas e descrita na inicial constituiu auxílio
material para a prática do delito tipificado no artigo 333, parágrafo único, de
pena mais elevada”.33
Sem razão, data vênia.
Por evidente, não é possível admitir que FÁBIO CORRÊA seja
excluído do crime de lavagem e passe a ser responsabilizado por
corrupção, como ousou cogitar o MPF.
Tampouco é verdadeiro que FÁBIO CORRÊA tenha reconhecido
que sua conduta se refira à “consumação de corrupção passiva” como
quis fazer crer o parquet. Tudo que disse a esse respeito foi apenas a
título de argumentação. E mesmo assim, deixou clara a tese de
exaurimento, embora em algumas passagens tenha feito alguma
referência à consumação diante dos próprios precedentes
jurisprudenciais que invocou e contêm menções desse gênero. E nada
mais.
33 Fl. 39 das alegações finais.
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Por outro lado, incabível falar-se em emendatio ou mutatio libelli
porque os elementos típicos da corrupção não estão descritos na
denúncia oferecida contra FÁBIO CORRÊA, além de não se tratar de
“prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não
contida na acusação”, como apenas afirma o MPF.
Em segundo lugar, caberia ao Ministério Público, na forma do
art. 384 do CPP, aditar formalmente a denúncia no prazo de cinco dias,
o que não ocorreu:
Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender
cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de
prova existente nos autos de elemento ou circunstância da
infração penal não contida na acusação, o Ministério Público
deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco)
dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo
em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o
aditamento, quando feito oralmente
Preclusa, portanto, encontra-se a matéria.
Em terceiro lugar, incabível falar-se em “auxílio material” em
crime de corrupção passiva quando o próprio órgão acusador, de
forma contraditória, afirma que no momento do recebimento de
valores por FÁBIO CORRÊA o crime de corrupção alegadamente
praticado por PEDRO CORRÊA já se havia consumado:
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“(...) no momento das operações de lavagem, a
corrupção passiva tal qual denunciada e demonstrada nos
autos já estava devidamente consumada pela aceitação da
vantagem ilícita”.34
Não fosse o bastante, para que fosse possível cogitar de auxílio
material em crime de corrupção passiva, seria necessária a
demonstração, pela acusação, de que FÁBIO CORRÊA efetivamente
soubesse da existência do alegado esquema criminoso, o que não se
ocorreu, conforme amplamente demonstrado.
Em quarto lugar, cabe reafirmar que o nome de FÁBIO CORRÊA
não é em qualquer instante mencionado nem vinculado, objetiva ou
subjetivamente, aos atos de ajuste e celebração dos contratos descritos
nas Tabelas A e B na denúncia.
Por essa razão, não há, nestas circunstâncias, como afirmar-se
que o recebimento desses valores constituiria “auxílio material” em
crime de corrupção diante da ausência de vínculo objetivo-subjetivo do
Defendente com os contratos antecedentes.
Logo, frente a essas razões, não há falar em emendatio libelli.
34 Fl. 39 das alegações finais.
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4.3. Da Atipicidade em razão da ausência dos elementos objetivos
do tipo de lavagem
Para além de todos os fatos e argumentos que evidenciam a
notória atipicidade do fato, cabem ainda algumas considerações em
torno da ausência dos elementos objetivos do tipo de lavagem.
No caso, revela-se atípico o fato, do ponto de vista dos elementos
objetivos, considerando:
(a) que os crimes antecedentes, apontados pela acusação, não
figuraram no rol então taxativo da Lei 9.613/98 vigente à época dos fatos;
(b) o ato de recebimento de valores, na forma narrada na denúncia,
não é compatível com as ações típicas de ocultação e dissimulação.
4.3.1. Dos Crimes Antecedentes
Nos termos da denúncia, teriam sido praticados “em detrimento
da PETROBRAS e da sociedade brasileira de um modo geral, de forma
sistemática, uma vasta série de crimes contra ordem econômica, de corrupção,
de fraude a licitações, contra o sistema financeiro nacional e lavagem de
dinheiro”.
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Todos eles, segundo a acusação, configurariam crimes
antecedentes da lavagem de capitais atribuída a FÁBIO CORRÊA e
outros acusados nos autos.
Já em alegações finais, o MPF exclui do universo dos delitos
antecedentes o alegado crime contra o sistema financeiro.
No que se refere ao crime de corrupção, viu-se, impossível
considerá-lo como crime antecedente, uma vez que o suposto
recebimento de valores teria configurado, nas circunstâncias narradas
pela própria acusação, exaurimento do tipo.
E melhor sorte não colhe em relação aos delitos de cartel e fraude
à licitação, “que possibilitaram a inserção do montante indevido nas
propostas contratadas pela estatal”.35
Com o devido respeito, a engenhoso raciocínio do parquet não se
sustenta.
35 Fl. 39 da denúncia.
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Primeiro, diante da garantia constitucional da irretroatividade da
lei penal (CF, art. 5.º, XL; CP, art. 1.º).
Com efeito, sabe-se que o rol antes taxativo do art. 1º da Lei
9.613/98 foi alterado e ampliado através da Lei 12.683, de 9 de julho de
2012, considerada, por isso mesmo, uma lex gravior. Irretroativa,
portanto (Cf. STJ, RHC 41.588/SP, Quinta Turma, rel. Min. Walter de
Almeida Guilherme, DJe 29/10/2014).
No caso dos autos, verifica-se que tanto os supostos crimes
antecedentes (cartel e fraude à licitação) quanto os próprios atos de
lavagem imputados a FÁBIO CORRÊA teriam ocorrido antes da entrada
em vigor da citada Lei 12.683/12.
Embora a denúncia não faça referência expressa a datas
(reforçando a alegação de inépcia), da própria narrativa e sequência
cronológica expostas é dado concluir que tanto o suposto crime de
formação de cartel quanto a alegada fraude à licitação estariam na
gênese dos fatos investigados na Operação Lava Jato, integrando as
primeiras etapas daquilo que o MPF denominou de “esquema
criminoso”.
Partindo do que expõe a denúncia, esta seria a sequência lógica
e cronológica dos fatos e crimes supostamente perpetrados:
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A reforçar a conclusão de que os crimes de formação de cartel e
a fraude à licitação se consumaram necessariamente antes da Lei
12.683/12, consta-se que o último dos contratos e aditivos indicados da
Tabela A foi formalizado em 30/03/2012.36
36 Fls. 18/22 da denúncia.
1) Corrupção ativa e
passiva, formação de
cartel
2) Fraude à
Licitação
3)Conclusão do
processo
licitatório
4) Início das obras e
pagamento dos
contratos às
empreiteiras (Tabela
A)
5) Lavagem de
Dinheiro e
Exaurimento do
crime de corrupção
ativa e passiva
(Recebimento dos
valores ao núcleo
administrativo e
político através dos
operadores)
6) Lavagem de
Dinheiro
(Formalização de
contratos simulados)
(Tabela B)
7) Lavagem de Dinheiro
(Depósitos em contas bancárias e
entregas de dinheiro)
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Portanto, não há qualquer dúvida de que a Lei 12.683/12 é
posterior à consumação dos crimes que a denúncia sustenta serem
antecedentes da lavagem supostamente perpetrada por FÁBIO
CORRÊA.
O mesmo se diga em relação aos contratos indicados na Tabela B.
Neste caso específico, embora alguns deles hajam sido
celebrados em momento posterior a julho de 2012, os crimes de cartel e
fraude à licitação já estavam consumados quando da entrada em vigor
da Lei 12.683/12, aplicando-se, pois, o mesmo raciocínio acima exposto.
E nem se diga que eventuais atos de ocultação ou dissimulação
possam ter ocorrido após a edição da Lei 12.683/12, tornando viável a
configuração do crime de lavagem.
É que o juízo de tipicidade desse delito, em particular à luz da
nova regra instituída pela Lei 12.683/12, está condicionado à
constatação objetiva de que tanto o crime antecedente quanto os
próprios atos de lavagem (ocultação e dissimulação) tenham ocorrido
na vigência da mesma Lei.
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Não há, em outras palavras, como concluir pela caracterização
da lavagem com base na Lei 12.683/12 se um dos elementos do tipo – o
crime antecedente – não se consumou durante sua vigência, pouco
importando para esse fim se os atos de ocultação ou dissimulação
ocorreram em momento posterior. Tanto mais porque o tipo é uno e
indivisível, não se podendo admitir que em relação a uma parte dos
elementos típicos incida a irretroatividade da lei e na outra não.
Do contrário, estar-se-ia criando uma terceira norma, o que não é
aceito nem pela doutrina, consoante posição adotada, dentre outros,
por CEREZO MIR, NÉLSON HUNGRIA, HELENO CLÁUDIO FRAGOSO,
FERNANDO CAPEZ e PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR.
O mesmo se diga em relação à jurisprudência.37
De todo modo, mesmo considerando os atos de lavagem
atribuídos ao Defendente, também chegamos à idêntica conclusão
quanto à irretroatividade da Lei 12.683/12.
37 Cf. STF, HC 80.008/RJ, Primeira Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 07.04.2000; STJ, Resp
598.079/RS, Quinta Turma, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 25.10.2004.
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Conforme sustenta o MPF, a lavagem de dinheiro praticada por
FÁBIO CORRÊA teria ocorrido através do recebimento de valores no
escritório de YOUSSEF, por trinta e três vezes.
Esses atos teriam supostamente ocorrido nos dias 26/08/2010,
30/08/2010, 03/09/2010, 10/09/2010, 17/09/2010, 21/09/2010, 22/09/2010
(três vezes neste dia), 03/02/2011, 17/02/2011 (três vezes neste dia),
18/02/2011, 24/02/2011 (duas vezes neste dia), 25/02/2011 (três vezes
neste dia), 28/02/2011, 01/03/2011 (três vezes neste dia), 26/05/2011,
30/05/2011, 30/07/2012 (duas vezes neste dia), 29/08/2012 (duas vezes
neste dia), 25/09/202, 26/09/2012, 28/09/2012, 02/10/2012, 03/10/2012.
Somente analisando as datas em si – abstraindo-se o fato de que
inexiste prova de que FÁBIO CORRÊA haja recebido valores em todas
as oportunidades – eliminaríamos, de plano, a possibilidade de
configuração de lavagem de dinheiro à luz da Lei 12.683/12 em relação
a nada menos do que vinte e cinco imputações (visitas ocorridas entre
26/08/2010 e 30/05/2011).
Restariam outras oito imputações de lavagem, cujos atos teriam
supostamente ocorrido após a vigência da Lei 12.683/12 (visitas
ocorridas entre 30/07/2012 e 03/10/2012)
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Sucede, porém, que em relação a essas datas inexiste prova
segura de que FÁBIO CORRÊA tenha recebido valores nessas datas.
É bem verdade que RAFAEL ÂNGULO chegou a afirmar, em
juízo, ter realizado uma entrega de R$ 35 mil a FÁBIO CORRÊA no dia
28/09/2012.
Não obstante, essa declaração não tem valor probatório algum
uma vez que não foi devidamente confirmada por outros elementos
de prova. Nenhum.
Válido é ressaltar, outrossim, que nem o próprio Defendente se
recorda a data em que teria recebido, numa única ocasião, valores que
supunha tratar-se do pagamento de antiga dívida existente entre
PEDRO CORRÊA e JOSÉ JANENE.
De todo o exposto, uma vez que inexiste prova inequívoca e fora
de qualquer dúvida de que o Defendente haja de fato recebido algum
valor após a entrada em vigor da Lei 12.683/12, não há como reconhecer
a configuração de um crime de lavagem de dinheiro, sob pena de
violação ao princípio da legalidade penal.
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Não fosse tudo o bastante, também não poderiam os crimes de
formação e cartel e fraude à licitação figurar como crimes antecedentes
na medida em que o MPF não fez prova de que FÁBIO CORRÊA
soubesse de sua existência, o que também se exige para a tipificação do
delito de lavagem.
Ao contrário disso, verificou-se que nenhuma prova existe nos
autos associando FÁBIO CORRÊA aos crimes de cartel e muito menos
às fraudes de licitação, as quais, conforme afirma o próprio parquet,
eram arquitetadas diretamente entre os funcionários da PETROBRAS e
o executivos das empreiteiras, inexistindo qualquer possibilidade de
que o Defendente soubesse que recebia valores provenientes daqueles
delitos, algo indispensável à configuração do crime de lavagem.
4.3.2. Da ausência de correlação entre o ato de receber valores em
espécie e as ações típicas de ocultar e dissimular
Por fim, cumpre considerar que o fato imputado pela denúncia,
ratificada nas alegações finais, não revela, em si, ato de “ocultação” ou
“dissimulação”, vale dizer, qualquer manobra com a especial "finalidade
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de encobrir ou dissimular a utilização do patrimônio ilícito resultante de um
dos crimes anteriores"38.
Neste sentido, entende o MPF que FÁBIO CORRÊA ao
supostamente receber quantias em espécie no escritório de ALBERTO
YOUSSEF, entre agosto de 2010 e outubro de 2012, praticou lavagem de
capitais “ocultando” e “dissimulando” a respectiva “natureza, origem,
disposição, movimentação, localização e propriedade”, e, com isso,
“ultimando o processo de branqueamento dos valores”.
Não obstante, é certo que o ato de receber, por si só e nas
circunstâncias narradas, não corresponde, objetivamente, a uma ação
típica de ocultação ou dissimulação, muito menos no sentido exigido
para a configuração do tipo de lavagem.
O contrário só seria possível, com efeito, se essa ação houvesse
ao menos sido associada pela denúncia a outros comportamentos
eventualmente praticados por FÁBIO CORRÊA – antes, durante ou
depois do recebimento – tendentes a esconder, simular ou mascarar a
verdade sobre a natureza, origem, disposição, movimentação,
localização e propriedade daqueles valores, o que definitivamente não
ocorreu na espécie.
38 Cf. CALLEGARI, André Luis. Lavagem de dinheiro. Ob. cit., p. 111.
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De fato, afora o ato de receber, na condição de mero
intermediário, determinada quantia em espécie, em nenhum momento
a acusação descreve ou faz prova em relação a ações ocultativas e/ou
dissimulativas voltadas a “modificar o status do dinheiro de origem
criminal, isto é, dar-lhe aparência de legitimidade para que possa circular
livremente na economia legal”,39 como exige o tipo de lavagem.
Nada. Rigorosamente nada é dito ou provado a esse respeito.
Nem mesmo implicitamente.
E não é só.
Se é verdade, como enfatiza RAÚL CERVINI40, que o crime de
lavagem de dinheiro é na essência “un processo que se moviliza dentro de
los sistemas económicos”, ou, como define BLANCO CORDERO,41 é um
“processo em virtude do qual os bens de origem ilícita são integrados ao sistema
econômico legal com aparência de haverem sido obtidos de forma lícita”,
caberia ao MPF descrever e provar atos eventualmente praticados por
FÁBIO CORRÊA compatíveis e representativos desses processos.
39 Cf. PRADO, Luiz Regis. Delito de Lavagem de Capitais: Um estudo introdutório. In: Doutrinas
Essenciais. Ob. Cit., p. 1155.
40 Cf. Evolución de la legislación antilavado em el Uruguay. In: Doutrinas Essenciais. FRANCO,
Alberto Silva (org.). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 1181.
41 Cf. CORDERO, Blanco. El delito de blaqueo de capitales. Navarra, Arazandi, 2002, pág. 93.
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Mais especificamente, no sentido de comprovar atos voltados a
produzir uma interação entre a economia legal e ilegal com o intuito de
conferir honorabilidade aos bens ou valores e afastar quaisquer
desconfianças que recaiam sobre a fonte ilícita dos recursos (cf. TRF4,
Proc. 5055075-44.2011.404.7100, Oitava Turma, rel. Des. Leandro
Paulsen, DJe 14/04/2015), algo indemonstrado pela acusação.
Ora, da forma como se apresenta a acusação cabe indagar: em
que medida a ação narrada – receber valores destinados a terceiro –
pode ser comparável a um conjunto complexo de operações, integrado
pelas etapas de conversão (placement), dissimulação (layering) e
integração (integracion) de bens de que fala a doutrina42? Onde se vê
algo comparável a uma “manobra” destinada a ocultar (encobrir) ou
dissimular (distanciar) a origem supostamente criminosa dos valores?
São questionamentos, data vênia, para os quais o MPF não trouxe
qualquer resposta minimamente convincente. Nem no momento de
oferecer a denúncia, nem no momento em que apresentou suas
alegações finais.
A questão, portanto, há de ser abordada à do princípio da
legalidade penal. Ou, mais precisamente, da taxatividade.
42 Cf. Lavagem de Dinheiro. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2007, pág. 53.
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Como princípio reitor do Estado Democrático de Direito, a
legalidade constitui a espinha dorsal dos sistemas jurídicos modernos.
Representa a expressão máxima de garantia dos direitos e liberdades
individuais (e coletivas). No dizer de NILO BATISTA,43 o princípio da
legalidade constitui “a chave mestra de qualquer sistema penal que se
pretenda racional e justo.”
No Direito brasileiro, é previsto no rol das garantias fundamentais
do cidadão, mais precisamente no art. 5.°, inc. XXXIX, da Constituição
Federal de 1988, e no art. 1.º do Código Penal: “Não há crime sem lei
anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”
No mesmo sentido, dispõe o art. 9.º, da Convenção Americana
sobre os Direitos Humanos (CADH – Pacto de São José da Costa Rica),
de 22 de novembro de 1969, da qual o Brasil é signatário, verbis:
“Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em
que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável.
(...)”.
43 Cf. BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 8.ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002,
p. 65.
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Um de seus três postulados, como ensina LUIS LUISI,44 é a
taxatividade (nullum crimen nulla poena sine lege certa).
No plano legislativo, a taxatividade impõe que lei estabeleça, de
forma precisa e taxativa, as condutas tidas como delituosas e as
respectivas sanções penais. Sob essa óptica, é direcionada ao legislador,
impondo-lhe o dever de especificar de modo o mais detalhado possível
os elementos essenciais que compõem os comportamentos tidos como
criminosos, o mesmo ocorrendo em relação à definição das penas
aplicáveis. O objetivo, nesse caso, é evitar tipificações dúbias,
genéricas, que deixem margem à ampla e irrestrita discricionariedade
do Estado-juiz em prejuízo das pessoas (jurisdicionados).
No plano judicial, a taxatividade garante ao acusado o direito
não ser responsabilizado penalmente se a ação por ele praticada não se
enquadrar, perfeitamente, ou, melhor, taxativamente, na figura típica
imputada.
A taxatividade, por isso mesmo, há de ser considerada em
conjunto com outra importante garantia penal: a proibição da analogia
in malam partem.
44 Neste sentido: LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. 2.ed. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 2003, p. 17.
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É a partir dessas importantes premissas, com efeito, que se há de
se realizar o juízo de (a)tipicidade do fato imputado a FÁBIO
CORRÊA.
Presente esse contexto, mesmo abstraindo-se a questão referente
ao dolo da conduta, indemonstrado pela acusação em relação a FÁBIO
CORRÊA, verifica-se que o fato se apresenta atípico no plano da
adequação legal, impondo, em consequência, a improcedência do
pedido condenatório, ex vi do art. 386, III do CPP.
5. DA CONCLUSÃO
Com estas considerações, espera e confia FÁBIO CORRÊA
Defendente seja julgada IMPROCEDENTE a pretensão condenatória
deduzida pelo Ministério Público Federal, ABSOLVENDO-SE o
Defendente com fundamento nas hipóteses do art. 386, II, III, V e VII
do Código de Processo Penal.
É o que se pede.
De Recife para Curitiba, 25 de setembro de 2015.
Página 72 de 72
ADEILDO NUNES Advogado OAB/PE 8.914
PLÍNIO LEITE NUNES Advogado OAB/PE 23.668
CAROLINE DO R. B. SANTOS Advogada OAB/PE 32.753
CLARISSA DO REGO BARROS NUNES Advogada OAB/PE 38.823

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  • 1. Página 1 de 72 Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 13ª VARA CRIMINAL FEDERAL da Seção Judiciária do Paraná Juiz Federal: - O senhor conheceu o Senhor Fábio Correa? Interrogado: - Conheci. Juiz Federal: - O senhor entregou dinheiro para ele ou solicitou que outros entregassem dinheiro para ele? Interrogado: - Não, que eu me lembre não. Na verdade, quem tinha o relacionamento e que estava envolvido nesse esquema era o Senhor Pedro Correa, o Senhor Fábio não participava disso. (Interrogatório de Alberto Youssef) Ref.: Ação Penal n.º 5023135-31.2015.4.04.7000/PR FÁBIO CORRÊA DE OLIVEIRA ANDRADE NETO, devidamente qualificado nos autos da ação penal que lhe move a Justiça Pública Federal por esse juízo, vem, por seus advogados legalmente constituídos, apresentar, na forma do art. 403, §3º do Código de Processo Penal, ALEGAÇÕES FINAIS, em forma de memorial, nos termos a seguir aduzidos:
  • 2. Página 2 de 72 I. INTRODUÇÃO FÁBIO CORRÊA DE OLIVEIRA ANDRADE NETO (“FÁBIO CORRÊA”) foi acusado pelo Ministério Público Federal de suposta prática de lavagem de dinheiro, em concurso material, por trinta e três vezes (Lei 9.613/98, art. 1.º, §4º, c/c art. 69 do CP). Segundo a denúncia, teria ele comparecido por cerca de trinta e três vezes, entre agosto de 2010 e outubro de 2012, ao escritório de ALBERTO YOUSSEF localizado em São Paulo, e recebido de seu funcionário RAFAEL ÂNGULO, em todas as ocasiões, na condição de intermediário de PEDRO CORRÊA, valores supostamente provenientes de delitos perpetrados em detrimento da PETROBRAS.1 Ainda de acordo com a acusação, ratificada nas alegações finais ministeriais (evento 390), esses valores constituiriam pagamento de propina relacionada a contratos celebrados entre empreiteiras cartelizadas e a PETROBRAS (Cf. Tabela A), e entre aquelas e outras empresas de fachada controladas por YOUSSEF (Cf. Tabela B). 1 Fl. 61 da denúncia.
  • 3. Página 3 de 72 Para o Ministério Público Federal,2 três seriam as “provas” do alegado crime de lavagem perpetrado por FÁBIO CORRÊA: (i) o depoimento prestado por RAFAEL ÂNGULO na fase de inquérito, no qual teria declarado a entrega de valores ao Defendente, bem como afirmado que “FÁBIO CORRÊA apresentava contas para pagamentos e listas de pessoas físicas e jurídicas para que fossem creditados valores, aí incluída a conta corrente do próprio FÁBIO CORRÊA e da empresa do cunhado LAUDO DALLA COSTA, a DALLA COSTA CONSULTORIA LTDA”. (ii) existência de “planilhas de movimentos” (controle de caixa) utilizadas pelo mesmo RAFAEL ÂNGULO nas quais constaria o registro de repasses realizados a FÁBIO CORRÊA e PEDRO CORRÊA; (iii) registros de entradas do Defendente no escritório de ALBERTO YOUSSEF. Em sua defesa (evento 69), FÁBIO CORRÊA negou, como nega, a acusação. 2 Fls. 36/37; 61/62 da denúncia.
  • 4. Página 4 de 72 Em síntese, sustentou, como ora sustenta, que jamais aderiu, auxiliou ou foi conivente com a prática de qualquer crime, muito menos o de lavagem de dinheiro atribuído pelo MPF a partir de especulações e graves distorções da realidade. Neste sentido, repudiou, como ora repudia, a descabida alegação de que houvesse recebido (por várias vezes) de ALBERTO YOUSSEF, RAFAEL ÂNGULO ou de quem quer que seja, dinheiro que soubesse relacionado a pagamento de propina a PEDRO CORRÊA em função de um esquema delitivo perpetrado contra a PETROBRAS. Enfatizou, quanto ao ponto, não apenas desconhecer a existência do alegado esquema criminoso como, e principalmente, que o valor por ele recebido, numa única oportunidade, a pedido de seu pai PEDRO CORRÊA, tivesse origem ilícita. Na oportunidade, questionou o fato da denúncia acusá-lo a partir de uma clara e repudiável responsabilização objetiva. Diante desses fatos, propugnou pela rejeição da denúncia, nos termos do art. 395, I e III do CPP, com pedido alternativo de absolvição sumária em virtude da atipicidade subjetiva e objetiva do fato imputado (CPP, art. 397, III).
  • 5. Página 5 de 72 Não obstante, a inicial foi recebida por esse douto juízo (evento 79), deflagrando-se a persecução. Iniciado processo e ultimada a instrução, verificou-se, contudo, a total improcedência da imputação. II. DAS TESES DE DEFESA Conforme demonstrará a defesa: (a) o MPF não comprovou o envolvimento de FÁBIO CORRÊA no alegado esquema criminoso; (b) quanto ao suposto crime de lavagem, além de inexistir prova de que o Defendente tenha recebido dinheiro nas trinta e três vezes que compareceu ao escritório de ALBERTO YOUSSEF, o próprio YOUSSEF, a exemplo da testemunha PAULO ROBERTO COSTA e do corréu PEDRO CORRÊA, inocentou por completo FÁBIO CORRÊA, afirmando que o mesmo nada tem a ver com o esquema criminoso apurado;
  • 6. Página 6 de 72 (c) o MPF não fez prova do nexo material e temporal entre os contratos consignados nas Tabelas A e B da denúncia e os repasses de dinheiro a PEDRO CORRÊA através de FÁBIO CORRÊA, o que é imprescindível para efeito de configuração do delito de lavagem; (d) Além da falta de provas, os fatos revelam-se atípicos: d.1) por ausência de dolo e culpa, seja em relação à existência dos crimes antecedentes (corrupção, formação de cartel e fraude à licitação), seja em relação ao alegado crime de lavagem no que tange à vontade livre e consciente de ocultar e dissimular valores provenientes de delitos perpetrados contra a PETROBRAS; d.2) o fato narrado na denúncia, ratificada em alegações finais, configuraria, no limite, exaurimento de crime de corrupção passiva, do qual não participou o Defendente, sendo, portanto, impunível em relação a ele, conforme posição adotada pelo Plenário do STF ao julgar Embargos Infringentes na AP 470/MG. d.3) os delitos de formação de cartel e fraude à licitação, que a acusação afirma constituírem crimes antecedentes à lavagem, não figuravam, ao tempo de sua consumação e do próprio ato de lavagem, no rol taxativo descrito na antiga redação do art. 1.º da Lei 9.613/98, vigente à época dos fatos apontados.
  • 7. Página 7 de 72 Por essa razão, incabível falar-se em crime de lavagem de dinheiro à luz da Lei 12.683/12, sob pena de violação ao princípio da irretroatividade da lei penal (CF, art. 5.º, XL; CP, art. 1º); d.4) a conduta descrita pela acusação – ato de receber quantias em espécie – não se amolda, objetiva e ontologicamente, às ações de ocultar ou dissimular previstas no tipo de lavagem de dinheiro. Diante desse contexto, requer-se seja julgada improcedente a pretensão condenatória deduzida pelo MPF para absolver o Defendente com fundamento no art. 386, II, III, V e VII do Código de Processo Penal. Senão vejamos. III. DA ABSOLVIÇÃO 1. Rememorando os Fatos Embora os fatos objeto da presente demanda estejam aparentemente bem delineados, não é demasiado rememorá-los a fim de evitar julgamento extra, infra ou citra petita, tudo em obséquio ao princípio da correlação entre acusação e sentença.
  • 8. Página 8 de 72 Com efeito, sustenta a denúncia que ao menos a partir de 2004 – e no âmbito de um suposto esquema criminoso engendrado por empresas cartelizadas, agentes públicos e partidos políticos – teriam sido cometidos diversos crimes contra a ordem econômica (formação de cartel), administração pública (corrupção ativa e passiva) e lavagem de dinheiro em detrimento da Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRAS. Nesse contexto, agentes públicos do alto escalão da PETROBRAS, previamente ajustados com membros de partidos políticos, teriam solicitado, recebido e aceitado promessa de vantagem indevida para colaborarem e facilitarem, através de procedimentos licitatórios fraudulentos, a contratação de empreiteiras para execução das maiores obras contratadas pela PETROBRAS entre os anos de 2004 e 2014. Por sua vez, os principais executivos dessas empresas são acusados de oferecer, prometer e efetivamente pagar “propina” a agentes públicos e membros de partidos políticos. Para tanto, valendo-se de terceiros – denominados “operadores” ou “doleiros”– para o repasse da vantagem indevida, seja através da entrega de dinheiro em espécie, seja por meio de operações bancárias no Brasil e no exterior. No caso da Diretoria de Abastecimento, ocupada a partir de maio de 2004 por PAULO ROBERTO COSTA, o valor da “propina” paga pelas empresas cartelizadas corresponderia a cerca de 1% (um por cento) dos contratos firmados.
  • 9. Página 9 de 72 Este percentual seria alegadamente distribuído entre membros do Partido Progressista (PP), o próprio PAULO ROBERTO COSTA e, ainda, os operadores do esquema.3 De acordo com a Tabela A constante da denúncia,4 cerca de 34 contratos, 123 aditivos e 4 transações extrajudiciais teriam sido celebrados entre 30/03/2007 e 30/03/2012 pelas empresas cartelizadas e a PETROBRAS (vinculados à Diretoria de Abastecimento), totalizando pouco mais de R$ 35 bilhões de reais. Desse total, segundo especula a acusação, cerca de R$ 350 milhões (1%) teriam sido destinados ao pagamento de “propina”5 aos partícipes do esquema. Ainda em conformidade com a denúncia oferecida, ratificada em alegações finais, esses repasses seriam periódicos e ocorreriam à medida em que os pagamentos dos contratos e respectivos aditivos eram efetivados em benefício das empresas contratadas. 3 Fls. 9/10 da denúncia. 4 Fls. 18/22 da denúncia. 5 Fls. 9/10 da denúncia.
  • 10. Página 10 de 72 O primeiro desses pagamentos, consoante revela a mesma Tabela A, ocorreu em 30/03/2007 (ENGEVIX)6 e, o último, em 30/03/2012 (MENDES JÚNIOR).7 Já em relação aos contratos indicados na Tabela B, os pagamentos teriam ocorrido no período de 2008 a 2014, a partir de 24 contratos e emissão de 55 notas fiscais frias. Nesse contexto, PEDRO CORRÊA, ex-deputado federal e pai do ora Defendente, é apontado pelo Ministério Público Federal como um dos supostos beneficiários do pretenso esquema criminoso, sendo a ele atribuída a prática, dentre outros, de corrupção passiva em conjunto com PAULO ROBERTO COSTA e ALBERTO YOUSSEF (CP, art. 317 – Cap. II, da denúncia). No ponto, sustenta a acusação ser PEDRO CORRÊA beneficiário de repasses mensais de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais)8 promovidos por ALBERTO YOUSSEF através: (a) da entrega de valores em espécie ao próprio PEDRO CORRÊA e a terceiros; (b) depósitos efetuados em contas correntes (de PEDRO CORRÊA e de terceiros).9 6 Processo n. 0800.0030725.07.2, Inicial, equivalente a R$ 224.989.477,13 (Fl. 19 da denúncia). 7 Processo n.º 0802.0045377.08.2, Aditivo 10, equivalente a R$ 107.273.036,38 (Fl. 21 da denúncia). 8 Fl. 30 da denúncia. 9 Fl. 31 da denúncia.
  • 11. Página 11 de 72 Ainda em relação a PEDRO CORRÊA, é acusado de lavagem de capitais10 ao receber parte da vantagem indevida por meio dos citados contratos simulados firmados entre as construtoras investigadas e empresas controladas por ALBERTO YOUSSEF (MO Consultoria, Empreiteira Rigidez, RCI Software e GFD Investimentos) – Cf. Tabela B, da denúncia. Segundo o MPF, a celebração desses contratos fictícios “tinha o intuito de viabilizar o repasse de recursos para PEDRO CORRÊA, integrante do PARTIDO PROGRESSITA e PAULO ROBERTO COSTA com o distanciamento do dinheiro de sua origem ilícita”.11 É nesse contexto que se inserem as infundadas e indemonstradas acusações contra a FÁBIO CORRÊA, é dizer, no sentido de que teria recebido valores provenientes destes contratos com o fim de ocultar e dissimular a respectiva origem ilícita. Não obstante, com o encerramento da instrução criminal, verificou-se justamente aquilo que a defesa já sustentava quando do oferecimento de sua resposta escrita: a engenhosa, porém demasiado forçada, acusação de lavagem não tem a menor procedência. Vejamos. 10 Cf. Item III.B, “Primeiro conjunto de atos de lavagem”. 11 Fl. 55 da denúncia.
  • 12. Página 12 de 72 2. A Falta de Provas. Ausência de provas quanto à existência do fato (33 crimes de lavagem). Inexistência, ainda, de provas de ter o réu concorrido dolosamente para uma infração penal. Absolvição que se impõe (CPP, art. 386, II, V e VII) Conforme restou cabalmente demonstrado, sobretudo a partir da prova oral produzida em juízo e à luz do contraditório, FÁBIO CORRÊA, de fato, não teve qualquer envolvimento, direto ou indireto, doloso ou culposo, nos episódios narrados na denúncia. Por mais que o Ministério Público Federal haja se empenhado em demonstrar o contrário, valendo-se para tanto de afirmações vazias e retóricas, não produziu provas seguras que permitissem, longe de qualquer dúvida razoável, condenar FÁBIO CORRÊA pela prática de lavagem de dinheiro, sobretudo à vista dos fatos e dos argumentos que dão sustentação a tão descabida, data vênia, acusação. De saída, verificou-se que FÁBIO CORRÊA não teve qualquer participação naquilo que a acusação chamou de “manobras políticas”,12 engendradas por membros do Partido Progressista para obter a indicação de PAULO ROBERTO COSTA à Diretoria de Abastecimento da PETROBRAS. Rigorosamente nenhuma. 12 Fls. 5; 8 da denúncia.
  • 13. Página 13 de 72 Do mesmo modo, nenhuma prova foi produzida nos autos que pudesse vincular o Defendente, formal ou materialmente, aos atos de corrupção (ativa e passiva), à formação de cartel ou fraude à licitação, o mesmo sucedendo em relação aos personagens, centrais ou periféricos, envolvidos no alegado esquema criminoso. Seja na fase de inquérito, seja na fase judicial, não se observou o menor indício de que FÁBIO CORRÊA tenha participado de alguma das dezenas de reuniões13 realizadas entre membros de partidos políticos e os representantes das empresas corruptoras, ou entre executivos destas e altos funcionários da PETROBRAS, nas quais teriam sido discutidos, acertados e definidos “percentuais de propina a serem pagos em razão dos contratos celebrados na Diretoria de Abastecimento”. Mais do que isso, não há qualquer evidência de que FÁBIO CORRÊA tenha mantido contatos, de caráter particular ou profissional, no período descrito na denúncia (de 2004 a 2014) ou fora dele, com quaisquer dos agentes integrantes do núcleo político,14 econômico,15 administrativo16 ou financeiro17. 13 Fl. 22 da denúncia. 14 Formado principalmente por parlamentares e ex-parlamentares (Fl. 52 da denúncia). 15 Formado pelas empreiteiras cartelizadas contratadas pela Petrobras (Fl. 52 da denúncia). 16 Formado pelos funcionários de alto escalão da Petrobras (Fls. 52/53 da denúncia). 17 Formado pelos “operadores” responsáveis pelo repasse de dinheiro aos integrantes dos núcleos político e administrativo (Fl. 53 da denúncia).
  • 14. Página 14 de 72 Definitivamente, não há ligações telefônicas, mensagens de celular nem e-mails interceptados ou posteriormente descobertos que associem o Defendente de algum modo aos fatos e aos personagens da Operação Lava Jato. Nesse mesmo contexto, também não foram produzidas quaisquer provas que ligassem FÁBIO CORRÊA, objetiva ou subjetivamente, formal ou materialmente, aos contratos celebrados entre a PETROBRAS e as empreiteiras (Tabela A, da denúncia), e entre construtoras e as empresas de fachada operadas por ALBERTO YOUSSEF (Tabela B). Muito menos entre as empreiteiras e PAULO ROBERTO COSTA após a saída deste da Diretoria de Abastecimento. A questão, de fato, assume especial relevo quanto à acusação de lavagem de dinheiro que recai sobre FÁBIO CORRÊA. Isto porque, sustenta o MPF que os valores supostamente recebidos pelo Defendente no escritório de ALBERTO YOUSSEF teriam relação próxima aos contratos simulados celebrados entre as construtoras18 e as empresas operadas por ALBERTO YOUSSEF19, e remota no tocante aos contratos firmados entre as empreiteiras e a PETROBRAS. 18 ENGEVIX ENGENHARIA S/A, GALVÃO ENGENHARIA S/A, CONSTRUTORA CAMARGO CORREA S/A, UTC ENGENHARIA, CONSTRUTORA OAS LTDA e MENDES JÚNIOR TRADING E ENGENHARIA S/A. 19 MO CONSULTORIA, EMPREITEIRA RIGIDEZ, GFD INVESTIMENTOS, RCI SOFTWARE.
  • 15. Página 15 de 72 Mais precisamente, afirma o parquet que os contratos celebrados entre as empreiteiras cartelizadas e empresas controladas por YOUSSEF (Tabela B) seriam fictícios e teriam como finalidade “distanciar o dinheiro de sua origem ilícita, antes do repasse da propina para PAULO ROBERTO COSTA e agentes políticos do PARTIDO PROGRESSISTA, entre eles, PEDRO CORRÊA (...)”.20 No que se refere a FÁBIO CORRÊA, ele é justamente acusado de “ultimar o processo de branqueamento” desses valores21 através do recebimento de quantias em espécie no escritório de YOUSSEF. Essa acusação, no entanto, caiu por terra a partir do momento em que o MPF deixou de produzir provas que associassem o Defendente aos contratos (Tabelas A e B), quer no sentido material (de eventual auxílio), quer no plano moral, no sentido de ao menos ter conhecimento quanto à sua existência. Nada, rigorosamente nada foi comprovado a esse respeito, notadamente para o fim de demonstrar o dolo da conduta do Defendente (conforme será melhor exposto adiante). 20 Fl. 61 da denúncia. 21 Fl. 61 da denúncia.
  • 16. Página 16 de 72 Há mais. O Ministério Público Federal também não demonstrou, sequer, o nexo material e temporal entre os valores que afirma terem sido recebidos por FÁBIO CORRÊA e a sua origem entre os 34 contratos, 123 aditivos e 4 transações extrajudiciais (Tabela A) ou os 21 contratos e 55 notas fiscais frias (Tabela B). Longe disso, limita-se o parquet a sustentar uma imputação global, genérica, que não individualiza os fatos e prejudica sobremodo o exercício do contraditório pelo acusado. E não é preciso ir muito além para constatar que a falta de individualização desses fatos, e em especial do nexo temporal e material, não permite identificar a relação econômica entre os valores pagos nos respectivos contratos e o percentual que a acusação afirma ter sido repassado aos membros do Partido Progressista, notadamente a PEDRO CORRÊA. Não há, neste sentido, a necessária construção do fluxo econômico, isto é, das etapas percorridas pelos valores de origem ilícita até o destino final.
  • 17. Página 17 de 72 Por fim, seja ao oferecer a denúncia, seja ao apresentar suas alegações finais, o parquet federal não comprovou, longe de qualquer dúvida razoável, tenha FÁBIO CORRÊA: (i) Recebido valores por trinta e três vezes, como sustenta a acusação; (ii) Agido com dolo (direto ou eventual). Somente esses fatos, com efeito, seriam suficientes a autorizar e, antes, impor, a absolvição do Defendente com fulcro no art. 386, II, V e VII do Código de Processo Penal. Seja como for, a improcedência da acusação também resulta da análise de provas que atestam a inocência do Defendente. 3. Da Verdade sobre os Fatos. Versão da defesa confirmada pela prova testemunhal produzida em juízo. Existência de provas indubitáveis de que o Defendente não participou do esquema delitivo. Absolvição que se impõe (CPP, art. 386, IV). Conforme a defesa teve oportunidade de enfatizar, desde o início, FÁBIO CORRÊA jamais participou ou integrou qualquer esquema criminoso (como, de plano, reconheceu esse douto Juízo ao rejeitar a denúncia quanto ao ponto).
  • 18. Página 18 de 72 Tampouco seria verdadeiro, como veio a demonstrar a prova produzida ao longo da instrução, que tivesse agido “de modo consciente, voluntário e reiterado, com unidade de desígnios” para ocultar ou dissimular valores provenientes ou não da alegada empresa criminosa. Isso jamais ocorreu e, como já ressaltado, não foi minimamente demonstrado pelo Ministério Público Federal. Neste sentido, reitera o Defendente que não tinha conhecimento e nem motivo razoável para suspeitar que o valor por ele recebido, numa única vez, no escritório de ALBERTO YOUSSEF, a pedido de seu pai PEDRO CORRÊA, tivesse alguma relação com pagamento de propina, especialmente oriunda de contratos (fraudulentos) celebrados entre empreiteiras cartelizadas e a PETROBRAS, ou a prática de qualquer infração penal. Ou seja, não agiu com má-fé, seja no sentido de ocultar ou dissimular a origem de valores. A maior prova de sua inocência, com efeito, vem justamente do depoimento prestado por um dos principais – senão o principal – colaboradores da Operação Lava Jato: ALBERTO YOUSSEF!
  • 19. Página 19 de 72 Como se sabe, as informações prestadas por ALBERTO YOUSSEF em diversos termos de colaboração premiada serviram de elemento indiciário para o ajuizamento de dezenas de denúncias pelo MPF, a maior parte delas recebidas por esse douto juízo. Em seu depoimento judicial (evento 380), corroborado pelo testemunho de PAULO ROBERTO COSTA e pelo interrogatório de PEDRO CORRÊA, ALBERTO YOUSSEF foi taxativo ao afirmar a inocência de FÁBIO CORRÊA, declarando enfaticamente que o mesmo não tinha como nunca teve qualquer envolvimento no esquema criminoso. Ou, como disse com suas próprias palavras, ele “não participava disso”.22 É o que afirmou, textualmente, ao ser questionado por esse douto juízo se em algum momento entregou ou determinou a entrega de dinheiro a FÁBIO CORRÊA: Juiz Federal: - O senhor conheceu o Senhor Fábio Correa? Interrogado: - Conheci. 22 Esse depoimento, aliás, corrobora todos os outros prestados por ALBERTO YOUSSEF nos vários inquéritos policiais/ações instaurados em seu desfavor. Em todas as vezes que cita pagamento de propina a membros do Partido Progressista ou, mais especialmente, a PEDRO CORRÊA, não há menção ao nome de FÁBIO CORRÊA como beneficiário ou pessoa que tivesse alguma participação no suposto esquema.
  • 20. Página 20 de 72 Juiz Federal: - O senhor entregou dinheiro para ele ou solicitou que outros entregassem dinheiro para ele? Interrogado:- Não, que eu me lembre não. Na verdade, quem tinha o relacionamento e que estava envolvido nesse esquema era o Senhor Pedro Correa, o Senhor Fábio não participava disso. Indagado sobre as idas de FÁBIO CORRÊA ao seu escritório, ALBERTO teve oportunidade de esclarecer, com todas as letras, que o Defendente apenas acompanhava o pai PEDRO CORRÊA, sem participar das conversações (ao que se supõe, relativas a valores): Juiz Federal: -Ele já foi ao seu escritório, o Senhor Fábio? Interrogado: - Sim, ele ia sempre com o pai. Juiz Federal: - E para tratar de que tipo de assunto? Interrogado: - Olha, o pai sempre ia tratar de assuntos referentes a valores e referente à campanha, ele só o acompanhava. Juiz Federal: - E ele ouvia, participava dessas conversações? Interrogado: - Muitas vezes não. Juiz Federal: - E o que ele ficava fazendo? Interrogado: - Ficava sentado aguardando. Em outra expressiva passagem de seu interrogatório, YOUSSEF fez questão de frisar que das vezes em que chegou a travar algum tipo de conversação com FÁBIO CORRÊA nunca o fez em relação a “nada referente a dinheiro, esse tipo de coisa”:
  • 21. Página 21 de 72 Juiz Federal:- Umas perguntas adicionais do Juízo aqui. Essas visitas que o Senhor Fábio fez ao seu escritório, o senhor chegou a conversar com ele alguma vez? Interrogado:- Sempre conversei com o Fábio, mas não nada referente a dinheiro, esse tipo de coisa. Explicou, ainda, os motivos que levaram FÁBIO CORRÊA a comparecer em cerca de trinta e três ocasiões ao seu escritório. Sobre a questão, esclareceu ALBERTO YOUSSEF que, além de simplesmente acompanhar PEDRO CORRÊA, em algumas outras oportunidades o Defendente “estava em São Paulo e não tinha para onde ir”, ou “muitas vezes ele ia para o escritório e ficava lá esperando alguém ou alguma [coisa]”, ou, ainda, simplesmente aparecia durante o período em que acompanhou a irmã na campanha em São Paulo: Juiz Federal:- O senhor se recorda se o Senhor Fábio Correa foi muitas vezes, poucas vezes lá nos seus escritórios? Interrogado: - Olha, eu acredito que em 2010 ele esteve mais vezes no meu escritório, por conta de que eu acho que ele estava ajudando a irmã na campanha. E as outras vezes eu acho que ele foi normal. Às vezes que ia com o pai a São Paulo, muitas vezes ia no meu escritório. Juiz Federal: - Ele foi também sem o pai no seu escritório? Interrogado: - Acredito que deva ter ido. Juiz Federal: - E quando ele ia sem o pai ele ia fazer o quê? Interrogado: - Ah muitas vezes ele estava em São Paulo e não tinha para onde ir, muitas vezes ele ia para o escritório e ficava lá esperando alguém ou alguma...
  • 22. Página 22 de 72 Por fim, ALBERTO YOUSSEF teve oportunidade de prestar esclarecimentos a propósito de uma possível dívida deixada por JOSÉ JANENE em favor de PEDRO CORRÊA, oriunda da compra e venda de animais. Essa dívida, vale recordar, foi justamente a explicação dada posteriormente por PEDRO CORRÊA ao Defendente para justificar o recebimento do valor junto a RAFAEL ÂNGULO em uma das visitas que o Defendente fez ao escritório de ALBERTO YOUSSEF. Sobre o fato, informou ALBERTO YOUSSEF: Juiz Federal:- O senhor sabe se o Senhor José Janene tinha alguma coisa com o Senhor Pedro Correa, alguma dívida, alguma coisa parecida? Interrogado:- Olha, eles eram muito amigos, pode ser que sim. Mas nunca o Senhor José me relatou nada a respeito desses assuntos. Juiz Federal: - Esses pagamentos então não tinham nenhuma relação com eventuais negócios anteriores do Senhor José Janene com o Senhor Pedro Correa, de venda de bens, coisa parecida. Interrogado: - Eu acredito que não. Juiz Federal: - Acredita ou não, porque o senhor saberia ou não saberia? Interrogado: - Olha, a mim o Senhor José nunca relatou esse tipo de situação.
  • 23. Página 23 de 72 Como se vê, embora tenha declarado que JOSÉ JANENE jamais tenha lhe informado a respeito dessa dívida, YOUSSEF não descartou a possibilidade de sua existência, dado o grau de amizade existente entre JANENE e PEDRO CORRÊA. A esse contundente e avassalador depoimento, somam-se outros, não menos relevantes, prestados por PEDRO CORRÊA e PAULO ROBERTO COSTA, este último, vale frisar, na condição de testemunha do MPF. No caso de PEDRO CORRÊA, mesmo exercendo parcialmente o direito de permanecer em silêncio, fez questão de esclarecer que o Defendente, a exemplo de outros acusados neste processo, nada tem a ver com os fatos, e que o mesmo apenas atendeu a um pedido seu quando se dirigiu ao escritório de YOUSSEF e lá recebeu valor em espécie: Juiz Federal: - O senhor prefere falar ou o senhor prefere ficar em silêncio? Interrogado: - Eu preferia fazer só um esclarecimento inicialmente e depois eu vou permanecer em silêncio. Juiz Federal: - Certo. Então, qual esclarecimento que o senhor quer fazer? Interrogado: - Só dizer que realmente eu estou sendo acusado com outras pessoas e eu quero dizer que essas outras pessoas não têm nenhuma responsabilidade dos fatos, eu assumo a responsabilidade de todos os fatos, dizer que meu filho, o réu Fábio Correa de Oliveira Andrade Neto, a ré Aline Lemos Correa de
  • 24. Página 24 de 72 Oliveira Andrade, a ré Márcia Danzi Russo Correa e o réu Ivan Vernon, eles faziam apenas, eles cumpriam as determinações que eu mandava, eu era a pessoa que tratava dos assuntos, todos os assuntos referentes às imputações que estão sendo feitas comigo através do Paulo Roberto Costa e do Alberto Youssef. Outro importante e elucidativo depoimento foi prestado por PAULO ROBERTO COSTA (evento 191), seguramente um dos personagens principais da Operação Lava Jato ao lado de ALBERTO YOUSSEF. Segundo esclareceu a testemunha em juízo, não possuía qualquer tipo de aproximação ou contato com FÁBIO CORRÊA, a quem disse conhecer apenas de eventos sociais. Foi ainda mais enfático ao declarar, diante de questionamento da defesa, jamais ter mantido qualquer tipo de conversa ou contato a respeito de questões envolvendo a PETROBRAS. Ora, de um lado, tem-se o depoimento de um significativo colaborador e principal integrante do núcleo financeiro (YOUSSEF) inocentando o Defendente. De outro, o ex-funcionário da PETROBRAS, igualmente colaborador e integrante do núcleo administrativo (PAULO ROBERTO COSTA), negando, ainda que implicitamente, a participação de FÁBIO CORRÊA no episódio.
  • 25. Página 25 de 72 Somando-se a todos eles, o depoimento de PEDRO CORRÊA, justamente de quem partiu o pedido para que o Defendente recebesse valores que supunha tratar-se do pagamento de uma dívida existente entre seu pai e JOSÉ JANENE. Em outras palavras, os três principais personagens deste processo, dois deles colaboradores da justiça compromissados com o dever de dizer a verdade, inocentam por completo o Defendente, ora afirmando, categoricamente, que nenhum envolvimento possui nos fatos apurados (como foi o caso de YOUSSEF e PEDRO CORRÊA), ora não apontando qualquer fato que o vinculasse ao alegado esquema criminoso (PAULO ROBERTO COSTA). Inobstante isso, o MPF procura desacreditar, em suas alegações finais, justamente o depoimento prestado por um dos seus principais colaboradores: ALBERTO YOUSSEF. O mesmo, insista-se, cujas informações baseiam o oferecimento de uma série de denúncias pelo Ministério Público, inclusive a destes autos. Tudo a revelar, de forma escancarada, uma flagrante incoerência do discurso acusatório. No caso, o MPF tenta desqualificar o depoimento dessa testemunha-chave, precisamente no ponto em que inocenta FÁBIO CORRÊA. Alegando, para tanto, que suas declarações “conflitariam” com aquelas prestadas por seu assessor/auxiliar RAFAEL ÂNGULO.
  • 26. Página 26 de 72 Sem razão, data vênia. Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que a credibilidade de RAFAEL ÂNGULO foi colocada em xeque pelo próprio Ministério Público Federal ao reconhecer a existência de uma série de contradições entre os depoimentos prestados na fase policial e judicial. De acordo com o MPF: “(...) Em que pese o réu RAFAEL ANGULO LOPEZ, ao ser interrogado judicialmente, afirmar que não fez depósitos em contas de titularidade de PEDRO CORRÊA, sua versão não está correta, uma vez que, além de divergir com as declarações prestadas anteriormente 36 , conforme relatado por YOUSSEF seria RAFAEL o responsável por realizar os depósitos bancários não identificados. (...)” Em segundo lugar, necessário destacar que em relação aos supostos repasses de dinheiro a FÁBIO CORRÊA que RAFAEL ÂNGULO disse haver realizado, a versão não encontra respaldo em qualquer outra prova dos autos.
  • 27. Página 27 de 72 Nem mesmo a Planilha apresentada é suficiente a corroborar essa mera alegação, uma vez que o FÁBIO CORRÊA apenas aparece, uma única vez, como receptor de R$ 35 mil, e nada mais. Por isso mesmo, o que se tem, ao fim e ao cabo, é a palavra de RAFAEL ÂNGULO, não confirmada por ALBERTO YOUSSEF, contra a do ora Defendente. E nada mais. A mesma fragilidade probatória é encontrada em relação à declaração de ÂNGULO de que FÁBIO CORRÊA teria fornecido boletos bancários diversos para pagamento e listas de nomes e contas correntes para depósito. Até hoje, porém, nenhum boleto bancário foi apresentado. Nenhuma lista de nomes foi exibida. Tampouco há comprovação material de que eventuais depósitos realizados por RAFAEL ÂNGULO em contas correntes de terceiros tenham sido efetivamente indicadas por FÁBIO CORRÊA. Ao contrário, essa declaração é infirmada por ALBERTO YOUSSEF, ao esclarecer que o responsável pelo fornecimento de contas para depósito seria PEDRO CORRÊA.
  • 28. Página 28 de 72 A despeito de tudo isso, não se pode ignorar que diversos outros trechos do depoimento judicial prestado por RAFAEL ÂNGULO, longe de incriminarem FÁBIO CORRÊA, ora infirmam a acusação de lavagem sustentada pelo MPF, ora vão ao encontro da versão da defesa. De um lado, RAFAEL ÂNGULO deixa claro que jamais entregou dinheiro a FÁBIO CORRÊA nas vezes em que esteve em Recife. De outro, esclarece que jamais efetivou qualquer depósito em benefício dele. Também foi bastante taxativo ao afirmar que jamais conversou a respeito da natureza do dinheiro que disse ter entregue a FÁBIO CORRÊA, afirmando ainda que jamais presenciou qualquer conversa a respeito disso entre ele Defendente e ALBERTO YOUSSEF, entre ele e PEDRO CORRÊA, ou com qualquer outra pessoa: Juiz Federal:- Quando, por exemplo, o Senhor Pedro Correa ia buscar esse dinheiro ou o Senhor Fábio Correa ia buscar esse dinheiro lá no escritório, não havia alguma conversação a respeito da natureza desse dinheiro, o que era esse dinheiro? Interrogado:- Se havia era na sala do Senhor Alberto, que a minha sala era separada e se eles conversassem de onde vinha ou de que era ou porque, só entre eles. Juiz Federal: - Nunca nenhum deles chegou: - “Olha, eu vim pegar o dinheiro da venda do carro, um carro que eu vendi para o Senhor Alberto Youssef”. Interrogado: - Não. (...)
  • 29. Página 29 de 72 Juiz Federal:- Quando o senhor encontrava o Pedro Correa nessas entregas ou o Senhor Fábio Correa ou mais alguém, nunca teve alguma conversa a respeito do que eram esses valores? Interrogado:- Não, entre eles ou que eu presenciei não. Em outro momento do interrogatório, e indagado se ele próprio tinha conhecimento da “finalidade” ou “origem” do dinheiro que disse haver repassado a FÁBIO CORRÊA, RAFAEL ÂNGULO respondeu negativamente, ou seja, que não sabia explicar a origem nem finalidade dos valores que disse ter entregue: Defesa:- O senhor tem conhecimento de qual era a finalidade desse dinheiro que o senhor disse que algumas vezes entregou a Fábio no escritório em São Paulo? O senhor sabia qual era a finalidade, esse dinheiro era destinado, era para Fábio, era para ser entregue ao Senhor Pedro Correa? Era para custear as despesas em relação aos negócios que o Senhor Pedro Correa tinha em Recife e tem ainda no estado de Pernambuco? O senhor sabe dizer mais ou menos ou o senhor não sabe... Interrogado:- Eu sei que o Senhor Fábio Correa ele deixava uma lista de terceiros para fracionar esses valores para pagamentos, depósitos em nome de pessoas, de terceiros, não sei exatamente para quê, para o próprio Senhor Fábio nunca depositei nada, mas para a Dalla Costa depositei. E isso eu sei que eram contas do pai dele ou dele, não sei. Defesa:- Não sabe explicar a origem... Interrogado:- Se é de um ou do outro não sei. Defesa:- A finalidade. Interrogado:- Não.
  • 30. Página 30 de 72 Como então, eminente julgador, diante desses fatos, chegar à conclusão de que FÁBIO CORRÊA sabia ou poderia saber da origem ilícita do repasse, ou, mais especificamente, que o valor por ele recebido tivesse alguma relação com crimes perpetrados em detrimento da PETROBRAS, se o próprio autor do suposto repasse não tinha conhecimento disso, e, mais do que isso, se o próprio responsável direto – ALBERTO YOUSSEF – afirmou categoricamente que jamais tratou desse assunto com o Defendente? Não fosse o bastante, outra importante figura na trama da Lava Jato, LEONARDO MEIRELLES, também não fez qualquer referência à participação de FÁBIO CORRÊA nos episódios. Aliás, sequer chegou a mencionar seu nome durante o depoimento prestado em juízo e na presença do MPF, que nada indagou a esse respeito. O mesmo ocorreu em relação às testemunhas RENASCI CAMBUI (evento 231) e VERA LÚCIA NAPOLI (evento 231). Já em relação às demais testemunhas arroladas pelo MPF, em especial MEIRE BONFIM DA SILVA POZA e CARLOS ALBERTO PEREIRA DA COSTA, Procurador e administrador da GFD, afirmaram desconhecer a pessoa de FÁBIO CORRÊA.
  • 31. Página 31 de 72 Por fim, no que se refere ao depoimento judicial prestado pelo corréu IVAN VERNON, nada trouxe a respeito da imputação de lavagem de dinheiro que recai sobre FÁBIO CORRÊA, seja para beneficiá-lo ou incriminá-lo. Presente esse contexto, não há como acolher a pretensão condenatória deduzida pelo Ministério Público Federal. Com efeito, não desconhece Vossa Excelência que o réu tem direito a ser julgado e condenado com base em prova segura e inequívoca, isto é, sem que exista margem a qualquer tipo de dúvida, demonstrando, assim, “plena clareza com a qual a verdade aparece ao espírito e determina sua adesão ou convicção inabalável”, como acentuava BORGES DA ROSA (Processo penal brasileiro, 1942, v.4, p. 65). Sabe, portanto, que para prolação de um decreto penal condenatório, é indispensável prova robusta que dê certeza da existência do delito e seu autor. A íntima convicção do julgador deve sempre se apoiar em dados objetivos indiscutíveis, caso contrário, transforma o princípio do livre convencimento em arbítrio (TJRS - Apelação nº 70003156254, Rel. Des. Sylvio Baptista). A condenação, portanto, exige a certeza e não basta, sequer, a alta probabilidade, que é apenas um juízo de incerteza de nossa mente em torno à existência de certa realidade.
  • 32. Página 32 de 72 A certeza é aqui a conscientia dubitandi secura, de que falava VICO, e não admite graus. Tem de fundar-se em dados objetivos indiscutíveis, de caráter geral, que evidenciem o delito e a autoria (Sauer, Grundlagen des Prozessrechts, 1929, 75), sob pena de conduzir tão somente à íntima convicção, insuficiente. A propósito, afirma SABATINI (Teoria delle Prove nel Diritto Giudiziario Penale, 1911, II, p. 33), que "a íntima convicção, como sentimento da certeza, sem o concurso de dados objetivos de justificação, não é verdadeira e própria certeza, porque, faltando aqueles dados objetivos de justificação, faltam em nosso espírito as forças que o induzem a ser certo. No lugar da certeza, temos a simples crença". O princípio do livre convencimento do juiz, como ensina UMBERTO DEL POZZO ("Appunti preliminari per una teoria della probabilità nel processo penale", no volume Studi Antolisei, I, 445), “não pode conduzir à arbitrária substituição da acurada busca da certeza, em termos objetivos e gerais, por uma apodítica afirmação de "convencimento", como verdadeiramente ocorreu nos autos. Por isso mesmo, nenhuma pena pode ser aplicada sem a mais completa certeza da falta. A pena, disciplinar ou criminal, atinge a dignidade, a honra e a estima da pessoa, ferindo-a gravemente no plano moral, além de representar a perda de bens ou interesses materiais.
  • 33. Página 33 de 72 Razão porque, como diz JEAN PATARIN ("La Théorie des preuves en Droit Pénal", no volume, Quelques Aspects de l'Autonomie du Droit Pénal, 1956, II) "la recherche d'ume certitude parfaite se révèle une exigence particulièrement impérieuse du droit pénal". Nesse sentido, não há qualquer discrepância entre os autores: a dúvida nessa matéria, é sinônimo de ausência de prova (cf. Nelson Hungria, Prova Penal, RF 138/338). Remo Pannain ("La certezza della prova", in Scritti Giuridici in Onore di A. de Marsico, 1960, II, 267) afirma que "ognun compreende che, per pronunziare un giudizio positivo, non basta il dubbio in quale viene proclamato con l'insufficenza di prove". Isso porque, se há dúvida, é porque a prova não está feita: "s'il subsiste un doute, c'est que la preuve n'est pas falte" (Gorphe). É o princípio que vigora no Direito anglo-americano, incluído entre as regras do devido processo legal (due process of law). Não se pode aplicar a pena sem que a prova exclua qualquer dúvida razoável (any reasonable doubt). Aqui não basta estabelecer sequer uma alta probabilidade (it is not suficient to establish a probability, even a strong one): é necessário que o fato fique demonstrado de modo a conduzir à certeza moral, que convença ao entendimento, satisfaça à razão e dirija o raciocínio, sem qualquer possibilidade de dúvida (cf. Kenny's, Outlines of Criminal Law, 1958, 480)" (Jurisprudência Criminal, vol. 2, ed. José Bushatsky, 1979, pp. 806/808).
  • 34. Página 34 de 72 Com efeito, o Defendente reitera aquilo que já afirmou em resposta escrita: jamais participou ou se envolveu no esquema denunciado pelo Ministério Público Federal. Ainda faz questão de esclarecer que maioria das vezes em que foi ao escritório de ALBERTO YOUSSEF o fez na condição de mero acompanhante de PEDRO CORRÊA, como, aliás, foi confirmado pelo próprio YOUSSEF. E, mesmo nestas oportunidades, jamais presenciou ou ouviu qualquer coisa a respeito da existência de um esquema criminoso contra a PETROBRAS. Ou, ainda, que valores eventualmente recebidos por seu pai consistiriam em repasse de “propina” relacionada ao citado esquema. Para além de tudo isso, o Defendente reafirma que jamais desconfiou que aqueles recursos pudessem ter qualquer relação com pagamento de “propina”, tanto que compareceu pessoalmente ao escritório – poderia fazê-lo através de terceiros se desejasse – identificando-se em todas as vezes, deixando-se fotografar e registrar suas frequências na portaria. Com o devido e merecido respeito, difícil imaginar que alguém, ciente e consciente de que praticava ou contribuía para um crime dessa magnitude, se dispusesse a ir pessoalmente a um escritório de “lavagem” – segundo afirma o MPF – e, mais do que isso, não hesitaria em deixar vestígios dessas passagens.
  • 35. Página 35 de 72 É algo, data vênia, que agride a inteligência cogitar. À luz de todas essas considerações, impõe-se a absolvição do Defendente com fundamento no art. 386, II, IV, V e VII do Código de Processo Penal. 4. DA ATIPICIDADE Embora a defesa esteja absolutamente convencida quanto à absolvição por falta de provas, não poderia furtar-se ao dever de trazer alguns questionamentos em torno da manifesta atipicidade do fato imputado. Referimo-nos, no caso, à ausência de tipicidade por ausência dos elementos subjetivo (dolo) e objetivo (verbos nucleares) do tipo. Conforme demonstrará a defesa: (a) O Defendente agiu em clara situação de erro de tipo escusável (CP, art. 20);
  • 36. Página 36 de 72 (b) a hipótese narrada na denúncia, ratificada em alegações finais, corresponde, no limite, ao exaurimento de crime de corrupção já consumado e do qual não participou o Defendente, sendo, portanto, impunível (post factum impunível); (c) os delitos de formação de cartel e fraude à licitação, que a acusação afirma constituírem crimes antecedentes à lavagem, não figuravam, ao tempo de sua consumação e do próprio ato de lavagem, no rol taxativo descrito na antiga redação do art. 1.º da Lei 9.613/98, vigente à época dos fatos apontados. (d) a conduta imputada – ato de receber valores em espécie – por si só e nas circunstâncias narradas, não corresponde, objetiva e ontologicamente, a uma ação típica de ocultação ou dissimulação. 4.1. Do Erro de Tipo Escusável Conforme a defesa teve oportunidade de destacar ao oferecer resposta escrita à acusação (evento 69), FÁBIO CORRÊA, além de desconhecer o alegado esquema criminosa, não sabia nem tinha condições de saber nem desconfiar que o valor por ele recebido tivesse origem em crimes perpetrados contra a PETROBRAS.
  • 37. Página 37 de 72 Por essa razão, e tendo em vista que o MPF não fez prova em sentido contrário, caso realmente venha a ser comprovado que o valor recebido pelo Defendente possua alguma relação com o repasse de dinheiro de origem ilícita, mesmo assim não há como imputar-lhe a prática de lavagem de dinheiro uma vez configurada a hipótese de erro de tipo escusável (CP, art. 20): Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. Como se sabe, o erro de tipo repercute diretamente no dolo, impedindo sua constituição pela ausência de um de seus elementos essenciais, que é o elemento cognitivo ou intelectivo. Elemento cognitivo, este, que representa a ideia de que o agente, ao atuar dolosamente, deve saber o que faz através da compreensão dos elementos que caracterizam sua ação como uma ação típica, tais como o sujeito, resultado, relação de causalidade, objeto material, etc. Na presente hipótese, esse erro incidiu, precisamente, sobre a elementar do tipo “(...) valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”.
  • 38. Página 38 de 72 Por outro lado, estamos diante de um erro de tipo essencial uma vez que, em decorrência de uma falsa percepção ou completa ignorância da realidade, o Defendente acabou praticando, sem consciência, uma ação típica prevista como crime (no caso, lavagem de dinheiro). Além de essencial, é inevitável na medida em que não é possível falar em omissão da cautela ou diligência exigível nas circunstâncias. A bem da verdade, consideradas as circunstâncias do fato, qualquer pessoa no lugar do Defendente teria incidido no mesmo erro. A propósito, o próprio MPF chegou a reconhecer, ainda que implicitamente, a falta de provas objetivas de que o Defendente haja, de fato, atuado com dolo direto. Não obstante, em vez de reconhecer a atipicidade do fato como consequência inafastável dessa premissa, o órgão acusador buscou uma “solução alternativa”, de última hora, por assim dizer. Mudando completamente a sua estratégia e a própria tese acusatória, passou a sustentar a possibilidade de condenação por dolo eventual.
  • 39. Página 39 de 72 Esqueceu-se o parquet, entretanto, que não lhe é dado alterar de uma hora para outra, e ao sabor de suas conveniências, a tese acusatória. Ainda mais quando se trata de uma clara manobra para evitar uma inafastável absolvição por falta de provas e atipicidade da conduta inicialmente imputada. Seja como for, a tese inovadora do MPF – já que sustentada apenas em alegações finais, quando não lhe foi possível comprovar o dolo direto – não merece prosperar ao ser confrontada no mérito. A começar pelo fato de que se contrapõe à posição dominante da doutrina e jurisprudência, que exigem o dolo direto para configuração do crime de lavagem, isto é, a demonstração “que o agente conhecia a procedência criminosa dos bens e agiu com consciência e vontade de encobri-lo”.23 De fato, para essa corrente amplamente majoritária, a ação constitutiva de branqueamento de capitais há de ser perpetrada com a especial "finalidade de encobrir ou dissimular a utilização do patrimônio 23 Idem.
  • 40. Página 40 de 72 ilícito resultante de um dos crimes anteriores".24 Finalidade, essa, que, portanto, "deverá obrigatoriamente integrar o dolo ao nível do tipo subjetivo".25 Nessa linha, aliás, estão a Convenção de Viena (art. 3, 1, b), de Palermo (art. 6, 1) e a Directiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (26.10.05) (art1, 2, a e b). Todas elas indicando que apenas quem tem pleno conhecimento da procedência ilícita dos bens pratica lavagem de dinheiro. O mesmo se extrai no direito comparado, como no caso da legislação lusitana sobre branqueamento de capitais (art. 2.º. 1). Na doutrina brasileira, essa é a posição adotada, dentre tantos outros, por PIERPAOLO BOTTINNI e ANDRÉ LUÍS CALLEGARI. 24 Cf. CALLEGARI, André Luis. Lavagem de dinheiro: aspectos penais da Lei nº 9.613/98, 2ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, p. 111. 25 Cf. MAIA; Rodolfo Tigre. Lavagem de dinheiro (lavagem de ativos provenientes de crime), SP: Malheiros, 1999, p. 95.
  • 41. Página 41 de 72 Para CALLEGARI:26 “Essa posição [que admite o dolo eventual] não nos parece a mais correta, já que não é possível o autor cometer o delito apenas com a probabilidade de que estes provenham de um dos crimes (...) é preciso que o autor conheça o caráter ilícito de sua conduta e saiba que os bens possuem procedência ilícita. (...) O dolo deve ser dirigido a esta conduta, ou seja, o autor atua porque conhece a origem criminosa dos bens e porque que lhes dar aparência de licitude”. Não tem sido outra, com efeito, a orientação adotada nos tribunais superiores. Ao julgar o 16º Embargos Infringentes na AP 470/MG, o Plenário da Suprema Corte reforçou a posição de que “A condenação pelo delito de lavagem de dinheiro depende da comprovação de que o acusado tinha ciência da origem ilícita dos valores”: Ementa: Embargos infringentes na AP 470. Lavagem de dinheiro. 1. Lavagem de valores oriundos de corrupção passiva praticada pelo próprio agente: 1.1. O recebimento de propina constitui o marco consumativo do delito de corrupção passiva, na forma objetiva “receber”, sendo indiferente que seja praticada com elemento de dissimulação. 1.2. A autolavagem pressupõe a prática de atos de ocultação autônomos do produto do crime antecedente 26 Cf. Lavagem de dinheiro: Aspectos Penais da Lei nº 9.613/98. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2ª ed., 2008. p.152-154.
  • 42. Página 42 de 72 (já consumado), não verificados na hipótese. 1.3. Absolvição por atipicidade da conduta. 2. Lavagem de dinheiro oriundo de crimes contra a Administração Pública e o Sistema Financeiro Nacional. 2.1. A condenação pelo delito de lavagem de dinheiro depende da comprovação de que o acusado tinha ciência da origem ilícita dos valores. 2.2. Absolvição por falta de provas 3. Perda do objeto quanto à impugnação da perda automática do mandato parlamentar, tendo em vista a renúncia do embargante. 4. Embargos parcialmente conhecidos e, nessa extensão, acolhidos para absolver o embargante da imputação de lavagem de dinheiro. (AP 470 EI-sextos/MG, rel. Min. Luiz Fux; Rel. p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso, DJe 21/08/2014) No mesmo sentido, tem sido a orientação adotada pelo Superior Tribunal de Justiça que, em precedente específico, assentou: “O crime de lavagem de dinheiro tipifica-se desde que o agente saiba que o montante pecuniário auferido, por meio de dissimulação, é produto de crime antecedente” (cf. STJ, HC 309.949/DF, Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 09/03/2015. E mesmo que se entendesse, na linha de minoritária corrente, que o tipo de lavagem de capitais admitiria o dolo eventual, ainda assim não haveria como reconhecê-lo na hipótese presente. Seja porque a prova testemunhal, como visto, inocenta o Defendente quanto ao seu envolvimento nos fatos, seja ainda porque a hipótese de erro de tipo (escusável ou não) sempre elimina o dolo, seja ele direto ou indireto.
  • 43. Página 43 de 72 De modo que, no particular, a absolvição se impõe, ex vi do art. 386, III do Código de Processo Penal. 4.2. Do Recebimento como Exaurimento do Crime de Corrupção Se ainda assim Vossa Excelência não se convencer da plena configuração do erro de tipo escusável, haverá de reconhecer, entretanto, que o fato imputado ao Defendente não configura crime nem é passível de punição. E isto por se tratar, caso verdadeiro fosse, de mero exaurimento de crime de corrupção já consumado e no qual não teve participação. Explica-se. Já se verificou, e aqui se reitera, que a imputação do crime de lavagem de dinheiro a FÁBIO CORRÊA estaria remotamente relacionada a contratos fraudulentos celebrados entre empreiteiras e a PETROBRAS (Tabela A) e, proximamente, aos contratos alegadamente simulados firmados entre as empresas cartelizadas e aquelas controladas por ALBERTO YOUSSEF (Tabela B).
  • 44. Página 44 de 72 É a própria denúncia quem afirma – e que aqui se considera apenas para efeito de argumentação – que os repasses destinados ao Partido Progressista e, em particular a PEDRO CORRÊA, eram contrapartida (vantagem indevida) paga pelas empresas cartelizadas em razão da atuação conivente de PAULO ROBERTO COSTA em atendimento “aos interesses escusos” da agremiação partidária e das próprias empreiteiras. Nos exatos termos da denúncia,27 “Os integrantes do PARTIDO PROGRESSISTA, entre eles, JOSÉ JANENE e PEDRO CORRÊA, comandando o esquema de corrupção, discutiam, acertavam e definiam com as empreiteiras cartelizadas os percentuais de propina que seriam pagas em razão dos contratos celebrados na Diretoria de Abastecimento”. Por sua vez, “as empresas cartelizadas participantes do ‘CLUBE’, já previamente ajustadas com o PARTIDO PROGRESSISTA (PP), firmaram com PAULO ROBERTO COSTA (também previamente ajustado com o mesmo PARTIDO) e outros funcionários da PETROBRAS, como RENATO DUQUE, um compromisso com promessas mútuas que foram reiteradas e confirmadas ao longo do tempo, de, respectivamente, 27 Fl. 12 da denúncia.
  • 45. Página 45 de 72 oferecerem e aceitarem vantagens indevidas que variavam entre 1% e 5% do valor integral de todos os contratos por elas celebrados com a PETROBRAS, podendo ser superior a esse percentual em caso de aditivos contratuais (...)”.28 Um pouco mais adiante, consigna a inicial acusatória: “(...) especificamente para o denunciado PEDRO CORRÊA, apurou-se que ALBERTO YOUSSEF operacionalizava os pagamentos por meios diversos, a saber: 1) entregas em dinheiro para o próprio denunciado; 2) entrega de dinheiro para terceiros a pedido do denunciado; 3) depósitos nas contas de titularidade do denunciado PEDRO CORRÊA e para terceiros por este indicados”.29 Partindo dessas premissas, é o próprio Ministério Público Federal quem inclui expressamente o fato (pagamento e entrega de dinheiro) no capítulo destinado à imputação de corrupção à PEDRO CORRÊA.30 28 Fls. 12/13 da denúncia. 29 Fl. 31 da denúncia. 30 Cf. Cap. II. IMPUTAÇÕES DO CRIME DE CORRUPÇÃO, item II.B.3 – Entrega em dinheiro para terceiros a pedido do denunciado).
  • 46. Página 46 de 72 Em outras palavras, é a denúncia quem afirma, textualmente, que PEDRO CORREA enviava emissários ao escritório de YOUSSEF (no caso, MÁRCIA DANZI e FÁBIO CORRÊA) para receber valores correspondentes ao pagamento de propina por crime de corrupção já consumado na modalidade aceitar e solicitar, verbis: “II.B.3 – Entregas em dinheiro para terceiros a pedido do denunciado Além do recebimento de vantagens indevidas pessoalmente, PEDRO CORREA também recebia a propina, no período compreendido entre 14 de maio de 2004 e 17 de março de 2014, por meio do comparecimento de emissários ao escritórios de ALBERTO YOUSSEF na cidade de São Paulo/SP, entre eles, FABIO CORREA, MÁRCIA DANZI em valores que giravam em torno de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) por recebimento”.31 (g.n.) Quando de suas alegações finais, o parquet reitera essas acusações, afirmando, textualmente, que “no momento das operações de lavagem, a corrupção passiva tal qual denunciada e demonstrada nos autos já estava devidamente consumada pela aceitação da vantagem ilícita”.32 31 Fl. 36 da denúncia. 32 Fl. 39 das alegações finais.
  • 47. Página 47 de 72 Ora, se o próprio MPF afirma (ainda que infundadamente) que o recebimento de valores por FÁBIO CORRÊA constituía um dos meios de pagamento de propina (vantagem indevida) a PEDRO CORRÊA em razão de crime de corrupção já consumado, a hipótese corresponderia, no limite, a exaurimento desse crime de corrupção e, não, um crime autônomo de lavagem de capitais, sob pena de bis in idem. Com efeito, há uma significativa e insuperável diferença entre o recebimento capaz de configurar exaurimento do crime de corrupção e aquele suficiente à caracterização de crime de lavagem (quando associado a outras ações tendentes à ocultação e dissimulação). Essa diferenciação, vale recordar, foi implementada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento de Embargos Infringentes na Ação Penal 470/MG opostos pelo ex-deputado federal JOÃO PAULO CUNHA. Como se sabe, o ex-parlamentar foi denunciado por lavagem de dinheiro ao receber, através de sua esposa e mediante saque efetivado em instituição financeira, R$ 50 mil provenientes de atos de corrupção passiva.
  • 48. Página 48 de 72 Mutatis mutandis, a mesma situação descrita na presente denúncia, com a diferença de que em vez de saque em instituição financeira o valor teria sido recebido em mãos no escritório de ALBERTO YOUSSEF. E, em vez da esposa, tratar-se-ia do filho do agente supostamente corrompido. No referido julgamento, a maioria do Plenário reconheceu que, o recebimento de dinheiro, naquelas circunstâncias, ainda que a forma escolhida possa ser tida como escamoteada, corresponderia ao exaurimento da corrupção já consumada, e não lavagem de capitais, o que conduziu à absolvição do ex-parlamentar diante da configuração de um post factum impunível (em relação e ele e, evidentemente, à esposa). Em voto emblemático, salientou o eminente Ministro TEORI ZAVASCKI: (...) À luz dessas premissas teóricas, tem-se que os fatos narrados na denúncia – o recebimento de quantia pelo denunciado por meio de terceira pessoa - não se adequam, por si sós, à descrição da figura típica. Em primeiro lugar, porque o mecanismo de utilização da própria esposa não pode ser considerado como idôneo para qualificá-lo como “ocultar”; e, ademais, ainda que assim não fosse, a ação objetiva de "ocultar" reclama, para sua tipicidade, a existência de um contexto capaz de evidenciar que o agente realizou tal ação com a finalidade específica de emprestar
  • 49. Página 49 de 72 aparência de licitude aos valores. Embora conste da denúncia a descrição da ocorrência de crimes antecedentes (contra o sistema financeiro nacional e a administração pública), bem como a afirmação de que o embargante, “consciente de que o dinheiro tinha como origem organização criminosa voltada para a prática” desses crimes, “almejando ocultar a origem, natureza e o real destinatário do valor pago como propina, enviou sua esposa Márcia Regina para sacar no caixa o valor de cinquenta mil reais em espécie”, ela não descreve qualquer ação ou intenção do réu tendente ao branqueamento dos valores recebidos. O que se imputa, a rigor, é o recebimento dos valores referentes ao crime de corrupção passiva, que, pela circunstância de ter sido realizado por interposta pessoa, não pode produzir a consequência de incorporar um crime autônomo, até porque o recebimento indireto da vantagem indevida integra o próprio tipo penal do art. 317 do Código Penal (“solicitar ou receber (...) direta ou indiretamente (...) vantagem indevida”). (...)”. (g.n.) Não foi outra a linha de raciocínio exposta no voto da eminente Ministra ROSA WEBER: “(...) Quem vivencia o ilícito procura a sombra e o silêncio. O pagamento de propina não se faz perante holofotes. Atividade das mais espúrias, aproveita todas as formas de dissimulação para sua execução. Ninguém vai receber dinheiro para corromper-se sem o cuidado de resguardar-se. Nessa ótica, assento que, na minha compreensão, e pedindo vênia aos que entendem de modo diverso, a
  • 50. Página 50 de 72 manipulação do dinheiro objeto da propina traduz, dependendo da hipótese, (i) a própria consumação do crime de corrupção ou (ii) o exaurimento deste mesmo crime. (...) Na corrupção passiva três são os núcleos: solicitar ou receber vantagem indevida e, ainda, aceitar promessa de vantagem indevida Na corrupção ativa, apenas dois: oferecer ou prometer. Na corrupção ativa ambos os núcleos importam o reconhecimento do crime formal. Então, nesse delito, a percepção da vantagem pelo corrompido constitui exaurimento do delito. Já na corrupção passiva, sob a forma solicitar, o crime é formal; mas sob a forma receber – e aqui peço vênia, pela primeira vez a me manifestar sobre o tema nesta Casa, para não perfilhar a orientação jurisprudencial nela dominante -, o crime é material. No primeiro núcleo, basta a solicitação para realizar o tipo; no segundo, todavia, pressupõe-se o efetivo recebimento da propina por não se esgotar, o tipo, na mera aceitação de vantagem indevida. Logo, em se tratando do núcleo solicitar, o efetivo recebimento da propina constitui exaurimento do crime; no caso do núcleo receber, a percepção da vantagem integra a fase consumativa do delito. (...) Assentei que, na minha compreensão, pedindo vênia aos entendimentos contrários, a manipulação do dinheiro objeto da propina constitui ora meio de consumação, ora meio de exaurimento da corrupção, a partir da distinção entre crimes materiais e formais sob o ângulo do núcleo do tipo (...). Logo, na hipótese solicitar – assim como nos dois tipos da corrupção ativa -, o efetivo recebimento da propina representa o exaurimento da corrupção passiva. Sob a
  • 51. Página 51 de 72 forma receber, todavia, a percepção da vantagem está na fase consumativa da corrupção passiva. (...) A meu juízo, contudo, presentes as peculiaridades dos casos e a explicitação dos conceitos, na forma supra, inviável considerar o crime de corrupção passiva como antecedente do crime de lavagem ao feitio legal, inconfundível o recebimento da vantagem indevida de forma maquiada, pelo qual se consuma a corrupção passiva na modalidade receber, com a ocultação e dissimulação ínsitas ao tipo do crime de lavagem de dinheiro. A mesma conclusão se impõe, ainda que sem a mesma limpidez, considerada a corrupção passiva em todos os seus núcleos como crime formal (consoante a jurisprudência majoritária desta Casa). Nessa hipótese, o recebimento dissimulado e mediante artifícios - como nem se poderia imaginar diferente, pois quem vivencia o ilícito, procura a sombra e o silêncio -, constitui exaurimento do delito de corrupção passiva. (...) Isso não significa que para a consumação do crime antecedente e o início da lavagem se exija a posse física do produto do delito por seu agente. O crime antecedente pode se consumar com a mera disponibilidade sobre o produto do crime, ainda que não física, pelo agente do delito, mas o ato configurador da lavagem há de ser, a meu juízo, distinto e posterior à disponibilidade sobre o produto do crime antecedente. No caso presente, concluo que o recebimento da vantagem indevida por João Paulo Cunha e Henrique Pizzolato, nas condições em que ocorreram os pagamentos – com subterfúgios e dissimulação -, integra o tipo penal da corrupção passiva e não pode, por esse motivo, em se tratando do mesmo ato, compor o da lavagem de capitais. (...)”. (g.n.)
  • 52. Página 52 de 72 Cumpre salientar que além de absolver o ex-parlamentar a partir da tese de exaurimento, o e. STF não reconheceu, em relação à sua esposa, qualquer prática criminosa, seja a título de lavagem, seja de auxílio em crime de corrupção. Essas conclusões, que formaram maioria no plenário da Suprema Corte, já com sua composição atual, aplicam-se exatamente à hipótese presente. No caso, aquilo que a denúncia afirma constituir ato de lavagem (recebimento de quantias em espécie pagas a título de propina), a jurisprudência do c. STF reconhece tratar-se de mero exaurimento do crime de corrupção. Com maior razão ainda, se o próprio MPF reconhece que no momento do recebimento dos valores o crime de corrupção já havia se consumado pela aceitação. E justamente por essa razão, o fato não pode se enquadrar em crime de lavagem. E muito menos ser punível a título de participação em corrupção passiva (como melhor exposto adiante), já que o delito, conforme afirma a própria acusação, já se havia consumado no momento do recebimento.
  • 53. Página 53 de 72 E de fato não haveria de ser diferente já que o crime de corrupção é de ação múltipla e formal em relação aos núcleos do tipo aceitar e solicitar. Por essa razão, a prática de uma dessas ações típicas já é suficiente à consumação do delito, sendo o eventual recebimento, nestas circunstâncias, mero desdobramento do processo delitivo. Sem contar, ainda, que FÁBIO CORRÊA jamais foi acusado de participar dos atos que culminaram na aceitação ou solicitação de vantagem indevida. Tampouco possui qualquer envolvimento, como já visto, nos atos de formalização dos contratos fraudulentos que estariam na gênese dos crimes de corrupção. Em suma, mostra-se totalmente improcedente e descabido o pedido de condenação em relação a um possível crime de lavagem de dinheiro. 4.2.1. Da Emendatio Libelli Ciente e consciente de que o fato imputado a FÁBIO CORRÊA é impunível, o MPF, mais uma vez, procura uma “solução alternativa” que permita uma condenação a todo custo.
  • 54. Página 54 de 72 No caso, requereu, pelo princípio da eventualidade, que “caso se entenda, como pretendem fazer crer os réus, que suas condutas se referem à consumação do crime de corrupção passiva, seria necessário aplicar o instituto da emendatio libelli (artigo 384 do Código de Processo Penal), considerando que a conduta por eles praticadas e descrita na inicial constituiu auxílio material para a prática do delito tipificado no artigo 333, parágrafo único, de pena mais elevada”.33 Sem razão, data vênia. Por evidente, não é possível admitir que FÁBIO CORRÊA seja excluído do crime de lavagem e passe a ser responsabilizado por corrupção, como ousou cogitar o MPF. Tampouco é verdadeiro que FÁBIO CORRÊA tenha reconhecido que sua conduta se refira à “consumação de corrupção passiva” como quis fazer crer o parquet. Tudo que disse a esse respeito foi apenas a título de argumentação. E mesmo assim, deixou clara a tese de exaurimento, embora em algumas passagens tenha feito alguma referência à consumação diante dos próprios precedentes jurisprudenciais que invocou e contêm menções desse gênero. E nada mais. 33 Fl. 39 das alegações finais.
  • 55. Página 55 de 72 Por outro lado, incabível falar-se em emendatio ou mutatio libelli porque os elementos típicos da corrupção não estão descritos na denúncia oferecida contra FÁBIO CORRÊA, além de não se tratar de “prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação”, como apenas afirma o MPF. Em segundo lugar, caberia ao Ministério Público, na forma do art. 384 do CPP, aditar formalmente a denúncia no prazo de cinco dias, o que não ocorreu: Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente Preclusa, portanto, encontra-se a matéria. Em terceiro lugar, incabível falar-se em “auxílio material” em crime de corrupção passiva quando o próprio órgão acusador, de forma contraditória, afirma que no momento do recebimento de valores por FÁBIO CORRÊA o crime de corrupção alegadamente praticado por PEDRO CORRÊA já se havia consumado:
  • 56. Página 56 de 72 “(...) no momento das operações de lavagem, a corrupção passiva tal qual denunciada e demonstrada nos autos já estava devidamente consumada pela aceitação da vantagem ilícita”.34 Não fosse o bastante, para que fosse possível cogitar de auxílio material em crime de corrupção passiva, seria necessária a demonstração, pela acusação, de que FÁBIO CORRÊA efetivamente soubesse da existência do alegado esquema criminoso, o que não se ocorreu, conforme amplamente demonstrado. Em quarto lugar, cabe reafirmar que o nome de FÁBIO CORRÊA não é em qualquer instante mencionado nem vinculado, objetiva ou subjetivamente, aos atos de ajuste e celebração dos contratos descritos nas Tabelas A e B na denúncia. Por essa razão, não há, nestas circunstâncias, como afirmar-se que o recebimento desses valores constituiria “auxílio material” em crime de corrupção diante da ausência de vínculo objetivo-subjetivo do Defendente com os contratos antecedentes. Logo, frente a essas razões, não há falar em emendatio libelli. 34 Fl. 39 das alegações finais.
  • 57. Página 57 de 72 4.3. Da Atipicidade em razão da ausência dos elementos objetivos do tipo de lavagem Para além de todos os fatos e argumentos que evidenciam a notória atipicidade do fato, cabem ainda algumas considerações em torno da ausência dos elementos objetivos do tipo de lavagem. No caso, revela-se atípico o fato, do ponto de vista dos elementos objetivos, considerando: (a) que os crimes antecedentes, apontados pela acusação, não figuraram no rol então taxativo da Lei 9.613/98 vigente à época dos fatos; (b) o ato de recebimento de valores, na forma narrada na denúncia, não é compatível com as ações típicas de ocultação e dissimulação. 4.3.1. Dos Crimes Antecedentes Nos termos da denúncia, teriam sido praticados “em detrimento da PETROBRAS e da sociedade brasileira de um modo geral, de forma sistemática, uma vasta série de crimes contra ordem econômica, de corrupção, de fraude a licitações, contra o sistema financeiro nacional e lavagem de dinheiro”.
  • 58. Página 58 de 72 Todos eles, segundo a acusação, configurariam crimes antecedentes da lavagem de capitais atribuída a FÁBIO CORRÊA e outros acusados nos autos. Já em alegações finais, o MPF exclui do universo dos delitos antecedentes o alegado crime contra o sistema financeiro. No que se refere ao crime de corrupção, viu-se, impossível considerá-lo como crime antecedente, uma vez que o suposto recebimento de valores teria configurado, nas circunstâncias narradas pela própria acusação, exaurimento do tipo. E melhor sorte não colhe em relação aos delitos de cartel e fraude à licitação, “que possibilitaram a inserção do montante indevido nas propostas contratadas pela estatal”.35 Com o devido respeito, a engenhoso raciocínio do parquet não se sustenta. 35 Fl. 39 da denúncia.
  • 59. Página 59 de 72 Primeiro, diante da garantia constitucional da irretroatividade da lei penal (CF, art. 5.º, XL; CP, art. 1.º). Com efeito, sabe-se que o rol antes taxativo do art. 1º da Lei 9.613/98 foi alterado e ampliado através da Lei 12.683, de 9 de julho de 2012, considerada, por isso mesmo, uma lex gravior. Irretroativa, portanto (Cf. STJ, RHC 41.588/SP, Quinta Turma, rel. Min. Walter de Almeida Guilherme, DJe 29/10/2014). No caso dos autos, verifica-se que tanto os supostos crimes antecedentes (cartel e fraude à licitação) quanto os próprios atos de lavagem imputados a FÁBIO CORRÊA teriam ocorrido antes da entrada em vigor da citada Lei 12.683/12. Embora a denúncia não faça referência expressa a datas (reforçando a alegação de inépcia), da própria narrativa e sequência cronológica expostas é dado concluir que tanto o suposto crime de formação de cartel quanto a alegada fraude à licitação estariam na gênese dos fatos investigados na Operação Lava Jato, integrando as primeiras etapas daquilo que o MPF denominou de “esquema criminoso”. Partindo do que expõe a denúncia, esta seria a sequência lógica e cronológica dos fatos e crimes supostamente perpetrados:
  • 60. Página 60 de 72 A reforçar a conclusão de que os crimes de formação de cartel e a fraude à licitação se consumaram necessariamente antes da Lei 12.683/12, consta-se que o último dos contratos e aditivos indicados da Tabela A foi formalizado em 30/03/2012.36 36 Fls. 18/22 da denúncia. 1) Corrupção ativa e passiva, formação de cartel 2) Fraude à Licitação 3)Conclusão do processo licitatório 4) Início das obras e pagamento dos contratos às empreiteiras (Tabela A) 5) Lavagem de Dinheiro e Exaurimento do crime de corrupção ativa e passiva (Recebimento dos valores ao núcleo administrativo e político através dos operadores) 6) Lavagem de Dinheiro (Formalização de contratos simulados) (Tabela B) 7) Lavagem de Dinheiro (Depósitos em contas bancárias e entregas de dinheiro)
  • 61. Página 61 de 72 Portanto, não há qualquer dúvida de que a Lei 12.683/12 é posterior à consumação dos crimes que a denúncia sustenta serem antecedentes da lavagem supostamente perpetrada por FÁBIO CORRÊA. O mesmo se diga em relação aos contratos indicados na Tabela B. Neste caso específico, embora alguns deles hajam sido celebrados em momento posterior a julho de 2012, os crimes de cartel e fraude à licitação já estavam consumados quando da entrada em vigor da Lei 12.683/12, aplicando-se, pois, o mesmo raciocínio acima exposto. E nem se diga que eventuais atos de ocultação ou dissimulação possam ter ocorrido após a edição da Lei 12.683/12, tornando viável a configuração do crime de lavagem. É que o juízo de tipicidade desse delito, em particular à luz da nova regra instituída pela Lei 12.683/12, está condicionado à constatação objetiva de que tanto o crime antecedente quanto os próprios atos de lavagem (ocultação e dissimulação) tenham ocorrido na vigência da mesma Lei.
  • 62. Página 62 de 72 Não há, em outras palavras, como concluir pela caracterização da lavagem com base na Lei 12.683/12 se um dos elementos do tipo – o crime antecedente – não se consumou durante sua vigência, pouco importando para esse fim se os atos de ocultação ou dissimulação ocorreram em momento posterior. Tanto mais porque o tipo é uno e indivisível, não se podendo admitir que em relação a uma parte dos elementos típicos incida a irretroatividade da lei e na outra não. Do contrário, estar-se-ia criando uma terceira norma, o que não é aceito nem pela doutrina, consoante posição adotada, dentre outros, por CEREZO MIR, NÉLSON HUNGRIA, HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, FERNANDO CAPEZ e PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR. O mesmo se diga em relação à jurisprudência.37 De todo modo, mesmo considerando os atos de lavagem atribuídos ao Defendente, também chegamos à idêntica conclusão quanto à irretroatividade da Lei 12.683/12. 37 Cf. STF, HC 80.008/RJ, Primeira Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 07.04.2000; STJ, Resp 598.079/RS, Quinta Turma, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 25.10.2004.
  • 63. Página 63 de 72 Conforme sustenta o MPF, a lavagem de dinheiro praticada por FÁBIO CORRÊA teria ocorrido através do recebimento de valores no escritório de YOUSSEF, por trinta e três vezes. Esses atos teriam supostamente ocorrido nos dias 26/08/2010, 30/08/2010, 03/09/2010, 10/09/2010, 17/09/2010, 21/09/2010, 22/09/2010 (três vezes neste dia), 03/02/2011, 17/02/2011 (três vezes neste dia), 18/02/2011, 24/02/2011 (duas vezes neste dia), 25/02/2011 (três vezes neste dia), 28/02/2011, 01/03/2011 (três vezes neste dia), 26/05/2011, 30/05/2011, 30/07/2012 (duas vezes neste dia), 29/08/2012 (duas vezes neste dia), 25/09/202, 26/09/2012, 28/09/2012, 02/10/2012, 03/10/2012. Somente analisando as datas em si – abstraindo-se o fato de que inexiste prova de que FÁBIO CORRÊA haja recebido valores em todas as oportunidades – eliminaríamos, de plano, a possibilidade de configuração de lavagem de dinheiro à luz da Lei 12.683/12 em relação a nada menos do que vinte e cinco imputações (visitas ocorridas entre 26/08/2010 e 30/05/2011). Restariam outras oito imputações de lavagem, cujos atos teriam supostamente ocorrido após a vigência da Lei 12.683/12 (visitas ocorridas entre 30/07/2012 e 03/10/2012)
  • 64. Página 64 de 72 Sucede, porém, que em relação a essas datas inexiste prova segura de que FÁBIO CORRÊA tenha recebido valores nessas datas. É bem verdade que RAFAEL ÂNGULO chegou a afirmar, em juízo, ter realizado uma entrega de R$ 35 mil a FÁBIO CORRÊA no dia 28/09/2012. Não obstante, essa declaração não tem valor probatório algum uma vez que não foi devidamente confirmada por outros elementos de prova. Nenhum. Válido é ressaltar, outrossim, que nem o próprio Defendente se recorda a data em que teria recebido, numa única ocasião, valores que supunha tratar-se do pagamento de antiga dívida existente entre PEDRO CORRÊA e JOSÉ JANENE. De todo o exposto, uma vez que inexiste prova inequívoca e fora de qualquer dúvida de que o Defendente haja de fato recebido algum valor após a entrada em vigor da Lei 12.683/12, não há como reconhecer a configuração de um crime de lavagem de dinheiro, sob pena de violação ao princípio da legalidade penal.
  • 65. Página 65 de 72 Não fosse tudo o bastante, também não poderiam os crimes de formação e cartel e fraude à licitação figurar como crimes antecedentes na medida em que o MPF não fez prova de que FÁBIO CORRÊA soubesse de sua existência, o que também se exige para a tipificação do delito de lavagem. Ao contrário disso, verificou-se que nenhuma prova existe nos autos associando FÁBIO CORRÊA aos crimes de cartel e muito menos às fraudes de licitação, as quais, conforme afirma o próprio parquet, eram arquitetadas diretamente entre os funcionários da PETROBRAS e o executivos das empreiteiras, inexistindo qualquer possibilidade de que o Defendente soubesse que recebia valores provenientes daqueles delitos, algo indispensável à configuração do crime de lavagem. 4.3.2. Da ausência de correlação entre o ato de receber valores em espécie e as ações típicas de ocultar e dissimular Por fim, cumpre considerar que o fato imputado pela denúncia, ratificada nas alegações finais, não revela, em si, ato de “ocultação” ou “dissimulação”, vale dizer, qualquer manobra com a especial "finalidade
  • 66. Página 66 de 72 de encobrir ou dissimular a utilização do patrimônio ilícito resultante de um dos crimes anteriores"38. Neste sentido, entende o MPF que FÁBIO CORRÊA ao supostamente receber quantias em espécie no escritório de ALBERTO YOUSSEF, entre agosto de 2010 e outubro de 2012, praticou lavagem de capitais “ocultando” e “dissimulando” a respectiva “natureza, origem, disposição, movimentação, localização e propriedade”, e, com isso, “ultimando o processo de branqueamento dos valores”. Não obstante, é certo que o ato de receber, por si só e nas circunstâncias narradas, não corresponde, objetivamente, a uma ação típica de ocultação ou dissimulação, muito menos no sentido exigido para a configuração do tipo de lavagem. O contrário só seria possível, com efeito, se essa ação houvesse ao menos sido associada pela denúncia a outros comportamentos eventualmente praticados por FÁBIO CORRÊA – antes, durante ou depois do recebimento – tendentes a esconder, simular ou mascarar a verdade sobre a natureza, origem, disposição, movimentação, localização e propriedade daqueles valores, o que definitivamente não ocorreu na espécie. 38 Cf. CALLEGARI, André Luis. Lavagem de dinheiro. Ob. cit., p. 111.
  • 67. Página 67 de 72 De fato, afora o ato de receber, na condição de mero intermediário, determinada quantia em espécie, em nenhum momento a acusação descreve ou faz prova em relação a ações ocultativas e/ou dissimulativas voltadas a “modificar o status do dinheiro de origem criminal, isto é, dar-lhe aparência de legitimidade para que possa circular livremente na economia legal”,39 como exige o tipo de lavagem. Nada. Rigorosamente nada é dito ou provado a esse respeito. Nem mesmo implicitamente. E não é só. Se é verdade, como enfatiza RAÚL CERVINI40, que o crime de lavagem de dinheiro é na essência “un processo que se moviliza dentro de los sistemas económicos”, ou, como define BLANCO CORDERO,41 é um “processo em virtude do qual os bens de origem ilícita são integrados ao sistema econômico legal com aparência de haverem sido obtidos de forma lícita”, caberia ao MPF descrever e provar atos eventualmente praticados por FÁBIO CORRÊA compatíveis e representativos desses processos. 39 Cf. PRADO, Luiz Regis. Delito de Lavagem de Capitais: Um estudo introdutório. In: Doutrinas Essenciais. Ob. Cit., p. 1155. 40 Cf. Evolución de la legislación antilavado em el Uruguay. In: Doutrinas Essenciais. FRANCO, Alberto Silva (org.). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 1181. 41 Cf. CORDERO, Blanco. El delito de blaqueo de capitales. Navarra, Arazandi, 2002, pág. 93.
  • 68. Página 68 de 72 Mais especificamente, no sentido de comprovar atos voltados a produzir uma interação entre a economia legal e ilegal com o intuito de conferir honorabilidade aos bens ou valores e afastar quaisquer desconfianças que recaiam sobre a fonte ilícita dos recursos (cf. TRF4, Proc. 5055075-44.2011.404.7100, Oitava Turma, rel. Des. Leandro Paulsen, DJe 14/04/2015), algo indemonstrado pela acusação. Ora, da forma como se apresenta a acusação cabe indagar: em que medida a ação narrada – receber valores destinados a terceiro – pode ser comparável a um conjunto complexo de operações, integrado pelas etapas de conversão (placement), dissimulação (layering) e integração (integracion) de bens de que fala a doutrina42? Onde se vê algo comparável a uma “manobra” destinada a ocultar (encobrir) ou dissimular (distanciar) a origem supostamente criminosa dos valores? São questionamentos, data vênia, para os quais o MPF não trouxe qualquer resposta minimamente convincente. Nem no momento de oferecer a denúncia, nem no momento em que apresentou suas alegações finais. A questão, portanto, há de ser abordada à do princípio da legalidade penal. Ou, mais precisamente, da taxatividade. 42 Cf. Lavagem de Dinheiro. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2007, pág. 53.
  • 69. Página 69 de 72 Como princípio reitor do Estado Democrático de Direito, a legalidade constitui a espinha dorsal dos sistemas jurídicos modernos. Representa a expressão máxima de garantia dos direitos e liberdades individuais (e coletivas). No dizer de NILO BATISTA,43 o princípio da legalidade constitui “a chave mestra de qualquer sistema penal que se pretenda racional e justo.” No Direito brasileiro, é previsto no rol das garantias fundamentais do cidadão, mais precisamente no art. 5.°, inc. XXXIX, da Constituição Federal de 1988, e no art. 1.º do Código Penal: “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.” No mesmo sentido, dispõe o art. 9.º, da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (CADH – Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969, da qual o Brasil é signatário, verbis: “Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável. (...)”. 43 Cf. BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 8.ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002, p. 65.
  • 70. Página 70 de 72 Um de seus três postulados, como ensina LUIS LUISI,44 é a taxatividade (nullum crimen nulla poena sine lege certa). No plano legislativo, a taxatividade impõe que lei estabeleça, de forma precisa e taxativa, as condutas tidas como delituosas e as respectivas sanções penais. Sob essa óptica, é direcionada ao legislador, impondo-lhe o dever de especificar de modo o mais detalhado possível os elementos essenciais que compõem os comportamentos tidos como criminosos, o mesmo ocorrendo em relação à definição das penas aplicáveis. O objetivo, nesse caso, é evitar tipificações dúbias, genéricas, que deixem margem à ampla e irrestrita discricionariedade do Estado-juiz em prejuízo das pessoas (jurisdicionados). No plano judicial, a taxatividade garante ao acusado o direito não ser responsabilizado penalmente se a ação por ele praticada não se enquadrar, perfeitamente, ou, melhor, taxativamente, na figura típica imputada. A taxatividade, por isso mesmo, há de ser considerada em conjunto com outra importante garantia penal: a proibição da analogia in malam partem. 44 Neste sentido: LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. 2.ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 17.
  • 71. Página 71 de 72 É a partir dessas importantes premissas, com efeito, que se há de se realizar o juízo de (a)tipicidade do fato imputado a FÁBIO CORRÊA. Presente esse contexto, mesmo abstraindo-se a questão referente ao dolo da conduta, indemonstrado pela acusação em relação a FÁBIO CORRÊA, verifica-se que o fato se apresenta atípico no plano da adequação legal, impondo, em consequência, a improcedência do pedido condenatório, ex vi do art. 386, III do CPP. 5. DA CONCLUSÃO Com estas considerações, espera e confia FÁBIO CORRÊA Defendente seja julgada IMPROCEDENTE a pretensão condenatória deduzida pelo Ministério Público Federal, ABSOLVENDO-SE o Defendente com fundamento nas hipóteses do art. 386, II, III, V e VII do Código de Processo Penal. É o que se pede. De Recife para Curitiba, 25 de setembro de 2015.
  • 72. Página 72 de 72 ADEILDO NUNES Advogado OAB/PE 8.914 PLÍNIO LEITE NUNES Advogado OAB/PE 23.668 CAROLINE DO R. B. SANTOS Advogada OAB/PE 32.753 CLARISSA DO REGO BARROS NUNES Advogada OAB/PE 38.823