Resenha do processo revolucionário iniciado pelo Movimento das Forças Armadas, que resultou na Revolução de 25 de Abril e na ação política consequente até à estabilização da Democracia e conclusão do processo de descolonização.
2. O MFA e o início da Revolução
Conjuntura política
Guerra colonial sem solução
O PAIGC declarara a independência unilateral da Guiné
A situação em Angola e Moçambique mantinha-se num impasse
A condenação internacional à política colonial portuguesa agravava-se
Militares descontentes com a falta de soluções políticas por parte do
governo de Marcello Caetano
Descontentamento popular contra o aumento do custo de vida (crise
dos anos 70)
Insatisfação de um setor empresarial moderno que defende a
aproximação à CEE
Aumento da violência interna por parte de grupos políticos
clandestinos
3. Do “Movimento dos Capitães” ao
“Movimento das Forças Armadas” (MFA)
Movimento dos Capitães (1973)
Criado por oficiais do quadro (capitães) em protesto contra a integração
na carreira militar de oficiais milicianos, que recebem apenas uma
formação intensiva na Academia Militar.
A satisfação das suas reivindicações mostrou a sua força política.
Passam a ter como objetivo criar uma solução política para o Ultramar.
Movimento das Forças Armadas (1974)
É uma evolução do Movimento dos Capitães, impulsionada pela insistência
do regime na guerra colonial e pela exoneração dos generais António de
Spínola e Costa Gomes do alto-comando do Estado-Maior das Forças
Armadas.
Tem como objetivo pôr fim à política do Estado Novo.
4. O “25 de Abril”
Operação “Fim Regime”.
24 de abril – 22.55 h – transmissão da canção “E Depois do Adeus” de Paulo
de Carvalho (primeira senha do movimento).
25 de abril – 00.20 h – transmissão da canção “Grândola Vila Morena” de
José Afonso (segunda senha do movimento) – avanço das unidades
militares.
Ocupação de pontos estratégicos – rádio, RTP, aeroportos civis e militares,
órgãos de direção político-militar.
Salgueiro Maia ocupa o Terreiro do Paço e enfrenta o Regimento de
Cavalaria 7 (única unidade militar do lado do regime).
Cerco do Quartel do Carmo (GNR) e rendição de Marcello Caetano, que
entrega o poder ao General António de Spínola.
A operação militar é um sucesso e ganha enorme apoio da população
de Lisboa transformando-se numa Revolução Popular – a “Revolução
dos Cravos”.
5. O fim das instituições do Estado Novo
Para regularizar a governação foi criada a Junta de Salvação Nacional,
presidida pelo general António de Spínola.
A Junta de Salvação Nacional tomou as seguintes medidas:
Destituição de Américo Tomás e de Marcello Caetano (exilados).
Dissolução da Assembleia Nacional e do Conselho de Estado.
Revogação da Constituição de 1933.
Destituição de todos os governadores civis e da Ação Nacional Popular.
Extinção da PIDE/DGS, Censura e Legião Portuguesa.
Amnistia e libertação dos presos políticos, autorização de regresso aos exilados.
Formação de partidos políticos e sindicatos livres.
Nomeação de um Governo Provisório.
Preparação de eleições livres para a Assembleia Constituinte.
Nomeação de António de Spínola para Presidente da República.
6. As tensões político-ideológicas pós revolução
A reivindicação excessiva de direitos sociolaborais conduziu a elevada
agitação social, de difícil controle, provocando a queda do I Governo
Provisório.
O II Governo Provisório é entregue a Vasco Gonçalves, que imprime uma
clara tendência revolucionária de esquerda. Neste período ocorrem:
Processos sumários de saneamento de docentes (universidades) e empresários ou
gestores (empresas) conotados com o Estado Novo.
Ocupações a fábricas, instalações laborais, campos agrícolas e residências
devolutas.
É criado o Comando Operacional do Continente (COPCON) – instrumento
político militar de ideologia radical.
O Partido Comunista ganha elevada influência política e governativa.
Surgem profundas divergências entre o Presidente da República (Spínola) e
o MFA, quanto ao processo de descolonização e à evolução política do
país.
7. Situações de confronto - 1
28 de Setembro (1974) – confrontação civil
Setores moderados (a maioria silenciosa) organizam uma
manifestação nacional de apoio a Spínola.
O MFA proíbe a manifestação e as forças de esquerda organizam
barricadas, para impedirem o acesso dos manifestantes a Lisboa.
Spínola fica fragilizado no poder e resigna. A presidência é entregue
a Costa Gomes.
Confirma-se a aliança MFA/Povo (reconhecida como uma aliança
entre o MFA e o Partido Comunista)
Os militantes do Partido Socialista afastam-se do Partido Comunista
(PCP), que acusam de tentar criar uma democracia popular.
8. Situações de confronto - 2
11 de Março (1975) – confrontação militar
Crescem as preocupações das forças políticas mais
conservadoras frente à radicalização do processo
revolucionário.
Militares afetos ao general Spínola tentam um golpe, com o
objetivo de travar o domínio revolucionário das forças de
esquerda.
O MFA domina o golpe e Spínola é obrigado a refugiar-se em
Espanha.
A esquerda revolucionária (PCP) sai reforçada.
9. Situações de confronto - 3
O Verão Quente de 1975
Em sequência ao 11 de Março, uma Assembleia do MFA, dominada
pelo PCP, procede à dissolução da Junta de Salvação Nacional e
cria o Conselho da Revolução.
As eleições para a Assembleia Constituinte (Abril de 1975) dão a
vitória ao Partido Socialista, seguido do Partido Popular Democrático
(hoje PSD), levando estes dois partidos a pedirem maior
representação no governo.
A preponderância do PCP continuava forte no MFA e no governo.
PS e PPD abandonam o governo e declaram-se opositores ao
primeiro ministro Vasco Gonçalves, exigindo o retorno ao programa
inicial do MFA.
A guerra civil (moderados X esquerda) esteve eminente. Eram os
tempos do PREC.
10. O “Processo Revolucionário em Curso”
Expressão usada para designar a vaga de ações revolucionárias
tomadas pela esquerda radical com vista à conquista do poder e ao
reforço da transição para o socialismo marxista.
Ficou marcado pela intervenção do Estado na economia através de
medidas socializantes lançadas pelos governos de Vasco Gonçalves,
nomeadamente:
Apropriação pelo Estado dos setores-chave da economia.
Intervenção do Estado na administração de pequenas e médias empresas.
Reforma agrária – expropriação institucional de grandes herdades e criação
de Unidades Coletivas de Produção.
Grandes campanhas de dinamização cultural e de ação cívica.
Grandes conquistas dos trabalhadores (direito à greve; liberdade sindical;
salário mínimo; controle de preços de bens de primeira necessidades;
redução do horário de trabalho; melhoria de reformas e pensões; garantias
de trabalho/entraves ao despedimento).
11. O “Documento dos Nove”
Inversão do processo revolucionário
Tratou-se de um manifesto assinado por nove oficiais do Conselho da
Revolução, encabeçados por Melo Antunes, publicado em agosto de
1975.
Surge para fazer frente à crescente radicalização do processo
revolucionário, pretendendo clarificar posições políticas e ideológicas e
terminar com ambiguidades criadas no processo revolucionário.
No “Documento dos Nove” surge expressa a recusa de um regime de
tipo “europeu oriental” para Portugal.
O Manifesto provoca o agravamento da confrontação política e social.
A 25 de novembro (1975), frente a uma tentativa de golpe pelos militares
de esquerda, o general Ramalho Eanes comanda um contragolpe que
sai vitorioso e provoca a demissão de Vasco Gonçalves. Terminava o
período mais extremista de revolução que regressava ao pluralismo
democrático inicial.
12. A Constituição de 1976
Condicionantes:
Pacto MFA/Partidos – acordo prévio à elaboração da Constituição
que obrigava os deputados constituintes a salvaguardar as
premissas revolucionárias (pluralismo político; via socializante;
institucionalização do MFA).
O primeiro ministro era Vasco Gonçalves e o Conselho da
Revolução era o órgão executivo do MFA.
O país vivia um período conturbado, marcado pela radicalização
das posições do MFA.
Os deputados constituintes foram alvo de várias pressões
chegando a ser cercados na Assembleia e ameaçados.
13. A Constituição de 1976
Decisões (pendor revolucionário):
“abrir caminho para uma sociedade socialista” (Preâmbulo)
[A República Portuguesa é] “um Estado de direito
democrático (…) que tem por objetivo a transição para o
socialismo (…)” (Art.º 2.º)
Defendia como “conquistas irreversíveis das classes
trabalhadoras” (Art.º 83.º) a coletivização “dos principais meios
de produção e solos, bem como dos recursos naturais” (Art.º
80.º), prevendo “expropriações de latifundiários e de grandes
proprietários e empresários ou acionistas” (Art.º 82.º 2.)
14. A Constituição de 1976
Legitimação constitucional das instituições político-administrativas:
Eleições para a primeira Assembleia da República (25.04.1976) –
vitória do Partido Socialista.
Nomeação do 1.º Governo Constitucional – Mário Soares.
Eleições para a Presidência da República – Gen. Ramalho Eanes
(julho de 1976).
Eleições para as autarquias locais (municípios e freguesias) em
dezembro de 1976.
Reconhecimento da autonomia administrativa dos arquipélagos dos
Açores e da Madeira (com Assembleia Legislativa Regional; Governo
Regional e um representante da autoridade máxima da soberania
nacional – o ministro da República).
15. Revisão Constitucional de 1982
Conjuntura:
Beneficia do acordo político entre o PS; o PSD e o CDS para a
revisão.
Os militares afastam-se do poder político (segundo Pacto
MFA/Partidos)
Decisões:
Manutenção do processo das nacionalizações e da reforma
agrária.
Extinção do Conselho da Revolução (CR).
Criação do Conselho de Estado e do Tribunal Constitucional (em
vez do CR)
Afirmação do primado do poder civil na atividade governativa.
16. Funcionamento das instituições democráticas - 1
Presidente da República
Eleito por sufrágio direto e universal, por maioria absoluta (de 5
anos em 5 anos, só pode ter dois mandatos seguidos).
Representante máximo da soberania nacional.
Comandante Supremo das Forças Armadas.
Nomeia e dá posse ao primeiro-ministro e ao governo.
Pode dissolver a Assembleia da República (ouvidos os
partidos).
Tem o poder de promulgar, executar e vetar as leis.
17. Funcionamento das instituições democráticas - 2
Assembleia da República
Órgão legislativo.
Compõe-se de 230 deputados eleitos por círculos eleitorais.
Cada legislatura tem um período normal de 4 anos.
Os deputados apresentam projetos de lei que depois de
discutidos, votados e aprovados por maioria parlamentar se
transformam em leis.
Pode interpelar o Governo; discutir e votar o seu programa;
votar moções de confiança e de censura.
18. Funcionamento das instituições democráticas - 3
Governo
É o órgão executivo.
Constituído pelo primeiro-ministro; ministros; secretários e
subsecretários de Estado.
Superintende a administração pública do país.
É formado pelo partido vencedor das eleições, na respetiva
legislatura).
Conduz a política geral do país através de decretos-lei,
propostas de leis que tem de submeter à aprovação da
Assembleia da República.
Conduz a política externa.
19. Funcionamento das instituições democráticas - 4
Tribunais
Exercem o poder judicial, em total independência do poder
político.
Ao Tribunal Constitucional (1982) compete zelar pelo
rigoroso cumprimento dos princípios consagrados na
Constituição, ao lado do Presidente da República.
Garante o funcionamento da Democracia tutelando os
vários processos eleitorais.
20. Descolonização – 1
Duas propostas:
MFA: “claro reconhecimento do direito à autodeterminação e a
adoção acelerada de medidas tendentes à autonomia
administrativa e política dos territórios ultramarinos”.
António de Spínola e moderados: “lançamento de uma política
ultramarina que conduza à paz”.
A conjuntura era favorável à primeira proposta devido a:
Exigência de uma rápida solução para a questão colonial, por
parte dos movimentos independentistas.
Pressão internacional (ONU e OUA)
Interesse em fazer regressar os militares portugueses e em confirmar
o carácter democrático e anticolonial do regime.
21. Descolonização - 2
27 de julho de 1974, o Conselho de Estado aprova a Lei n.º 7/74 reconhecendo o
direito das colónias à independência.
Via pacífica:
Guiné – reconhecimento do PAIGC - Acordo de Argel
Cabo Verde – reconhecimento do PAIGC – Acordo de Argel
S. Tomé e Príncipe – reconhecimento do MLSTP
Vertente conflituosa:
Moçambique – reconhecimento da FRELIMO – Acordo de Lusaca – contestação
interna e inicio da guerra civil – fuga dos portugueses (movimento dos retornados)
Angola – reconhecimento do MPLA; FNLA e UNITA – Acordo de Alvor – proposta de
criação de Forças Armadas integradas e de eleições livres e democráticas. Os
movimentos de libertação não se entendem e lançam-se numa guerra interna. MPLA
funda a República Popular de Angola – FNLA/UNITA fundam a República Democrática
de Angola. Portugal reconhece o MPLA e assiste a nova vaga de “retornados” numa
ponte aérea criada para retirar os portugueses do local. A paz só chegará em 2002
com o assassinato de Jonas Savimbi (dirigente da UNITA)
22. Significado internacional do “25 de Abril”
Revolução não violenta, com um programa liberalizador e descolonizador.
Fim do isolamento e hostilidade internacional contra Portugal.
Na Europa:
Influenciou o abandono do poder pelos militares conservadores na Grécia, levando
este país ao retorno à democracia.
A morte de Franco em Espanha e o exemplo da revolução portuguesa asseguraram o
caminho da democracia.
Em África:
A vitória dos movimentos de libertação nas colónias portuguesas reforçou o empenho
na luta das maiorias negras
Zimbabué – influenciado pela descolonização em Moçambique – constituição de um governo
de maioria negra.
África do Sul – influenciado pela pressão internacional – atribuição do Nobel da Paz a
Desmond Tutu – libertação de Nelson Mandela – eleições livres – governo de maioria negra.
Namíbia – A África do Sul retira a sua administração da Namíbia – Independência em 1990.