PROJETO DE EXTENSÃO I - TERAPIAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES.pdf
Samba Folia e Carnaval
1. Morada do Samba (Prelúdio)
Quando a vida amanhecia
Foi sob o som do tambor
Do terreiro de Santa Bárbara
Que o sentido habituou.
Estava pronta a morada
Aguardando nos quintais
A chegada dos enredos
Para alegrar carnavais.
As esquinas se alegravam
Ao som de um surdo de corte
No qual Calama marcava
O tom do samba do norte.
Se fazia batucada
De repenique e pandeiro
No correr de belas tardes
Ao longo do ano inteiro.
Quando era fevereiro
Fosse menina ou senhora
Íamos para Educandos
Sair na "Em Cima da Hora".
O Morro estava pronto
Pra receber sua amada
Pois já estava crescido
Era do samba a morada.
2
1
Fundação
Vitória
Ao final de oitenta e um,
Depois de uma reunião
Dia cinco de setembro
Estava feita a fundação
És mais que o meu próprio dia
E logo viria a ser Que a orgia, és bem melhor
O brinco da comunidade És leve assim como o vento
Sonhando ser algum dia Que o meu pensamento é bem maior
Uma jóia da cidade
És tão bela quanto a vida
Verde feito a esmeralda És tão doce quanto o mel
Branco de paz e candura És tão mansa quanto a brisa
Seu nome traz liberdade És tão ampla quanto o céu
Contrapondo à ditadura
És mais nuvem do que chão
Reino onde o regente é o samba És mais Baco que Morfeu
E nós os súditos seus És mais vinho do que pão
Unido para agrupado ser forte És mais minha que sou teu
Benzendo o chão de Morfeu És mais vôo do que pouso
Pleno repouso, és todo meu
E Morfeu, filho da noite
Deus dos sonhos da gente
Conduziu-nos sem açoite
Botando o Morro na frente
3 4
2. Comissão de Frente
A Ala
Alegria meu povo!
De fraque e cartola
Já vem desfilando
Minha amada escola A ala
Se embala
Alegria meu povo! Movimentos desiguala
Vou de fantasia Em momento algum se cala
Ouça meu samba
Que linda poesia Ala bonita
Do povo agita
Alegria meu povo! Não se conflita
Tem truque a mostrar Se adorna e se emperiquita
O ensaio secreto
Vai se desvendar Ala é peça importante
Quesito fundamental
Alegria meu povo! É a alegria da escola
Vim apresentar A vida do carnaval
Um mar de alegria
E fazê-Io chorar
Alegria meu povo!
5 6
Ala Show (passistas)
O Componente
As flores do meu jardim
São brilhantes, coloridas
São flores de carne e osso
Meninas desprotegidas.
Partícula
Célula
São lindas e são cheirosas
Doutor
São fáceis de mastigar
Camelô
Pois são morenas formosas
Rei
As frutas do meu pomar.
Palhaço
Rico
São doces e luminosas
Pobre
Do lume composto em mel
Branco
Saem estrelas gostosas
Preto
As estrelas do meu céu.
Todos iguais
Sociedade justa
Flores, frutas e estrelas
Utopia realizada
Do universo em questão
Escola de samba em desfile.
São metáforas que brotam
De dentro do meu coração.
São as passistas do morro
Dançarinas da ala show
Pois se fosse futebol
Elas seriam o gol!
7 8
3. Mestre Sala e Porta Bandeira Presidente
Se meus olhos conseguissem
Enxergar o que deveriam
E de minhas mãos fluíssem Branco
Poesia, escreveriam. Mas negro no sangue sambista
Baixo
Pelo menos uma quadra Mas alto na visão dos fatos
Ou até mesmo um terceto Calado
Para homenagear Mas falante nos momentos exatos
Os passos do minueto. Quieto
Mas agitado interiormente
Que eles dançam perfeito Sereno
Com equilíbrio e nobreza Mas determinado
Pois é a característica Sério
Daquela dança francesa. Mas sorridente
Humilde
No meio da minha escola Mas brioso.
Carregando o pavilhão
Voa a porta-bandeira Mais do que um cérebro
Deslizando pelo chão. Coração
Mais ouvido do que boca
E vai o meu mestre-sala Mais que um pai
Circulando, a protegê-Ia, Mãe.
Feito beija-flor, beijando
A mais bela das estrelas.
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Notívago
Novo Diretor (Fruto Bom)
Faz parte da noite
Da noite o dia Lá vai ele gesticulando
O sonho perfeito Dançando, pulando mais alto
E a melancolia. Lá vai ele comandando
O andamento no asfalto.
Faz parte da noite
Da noite sem fim Lá vai ele de baqueta na mão
A solução simples Sob os olhares do povo
Que brota em mim. Prende o som, para um surdão
Afina e o liberta de novo.
Faz parte da noite
O sumo da criação Lá vai ele feito Cristo
O sono perdido Crucifixo ambulante
As asas do coração. Grita: "assim não... assim... isto..."
Volta ele triunfante.
Faz parte da noite
Faz parte do dia Lá vai ele apitando
A cabeça cheia Marcando o tempo, a cadência
A alma vazia. Lá vem ele praguejando
Vai perder a paciência!
Faz parte da noite
O medo, o temor Lá vai ele, todo som
Os planos, os danos Tamborim, repique, treme-terra
O ódio, o amor. Ser ritmista é seu dom
Ganzá, centrador, caixa-de-guerra.
Da noite faz parte
As luzes da imensidão Lá vai ele o diretor de bateria
Faz parte da noite Fruto bom que o morro plantou
Toda minha inspiração. É o Iron, todo energia
Foi o Jairo que ensinou.
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4. Inspiração
Poetizando
Onde está você que eu não vejo?
Fico a sentir o tempo que passa
Perdido no mundo de grande desejo
Onde está você que não me abraça?
Em tudo impera a poesia
Na rua, na mesa, no céu.
Vê se vem logo, correndo
Em tudo impera a poesia
Para que eu saia dessa agonia
Na lua, na cama, no anel.
Não compreendo, porque não chegas
Você me ilumina e me alivia.
Em tudo impera a poesia
Na casa, na morte, na vida.
Seja breve princesa
Em tudo impera a poesia
Princesa que és da mente
Chocada, intocada, perdida.
Rainha que és
Do coração.
Mantenha minha luz acesa
Para que eu alegre minha gente
Vem logo oh!
... Minha inspiração.
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Gente do Barracão
Platonismo do Folião
Quem sustenta estas cabeças
Estes corpos desnutridos
Estes corações meninos
Com tantos sonhos perdidos?
Quem constrói o amanhã Vai minha escola passando
Desses moços tão distintos Na avenida da ilusão.
Que o destino deu o samba Desfilando vai meu amor
Família, filhos famintos? Na palma do meu coração.
Será essa ninharia
Ou a arte que os encanta Com seu sorriso encantado
Será nossa companhia Dando ao meu verso harmonia
Ou essa amizade santa? E ao conjunto do meu samba
Será irresponsabilidade É seu olhar fantasia.
Ou comida que aqui tem
Será pura vaidade Sendo sua face o enredo
Ou será arte também? Que hoje eu fiz desfilar
Não sei, não sei de verdade Em segredo no meio do povo
Do fundo do coração Fiz de você meu sonhar.
Só sei que é linda essa gente ... ...
A gente do barracão.
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5. Diretor de Bateria
Baila no ar,
Feito um passarinho.
Empunhando a baqueta,
Gesticula,
O Refúgio do Artista Olha pra trás,
Para os lados,
Como um domador.
Perplexos todos olham
Firme no gesto,
Ouvidos aguçados,
Educados,
Ao som do samba da sinfonia em marcha
Redoma a bateria,
O refúgio do artista Administra a música,
Não tem cor Divide o som, direita e esquerda,
Não tem parede, Acima e abaixo,
Não tem solo, Graves e agudos.
Não tem chão. Maestro popular,
O refúgio do artista é seu próprio amor Explode em energia,
Que cria as vidas da arte Pula,
Pelas veias do coração. Corta o samba,
Segura o coração,
Volta no tempo,
Entra em marcação,
Retoma o som,
Vitória total, afinal,
Não atravessou,
Caminha firme,
Dono da avenida,
Rei do carnaval,
Sonhador, sangue de bateria,
Vencedor... pássaro... maestro... diretor.
Nota dez!
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O Desfile
Sinto no ar um sentimento doce.
Mesmo vestido de palhaço, como agora estou
Chefe de Barracão Vou penetrar no meu dengo
E vibrar cantando tudo o que se preparou.
E na sequência do desfile vou viajar
Fugir de todos os problemas do ano inteiro
E me entregar na orgia sem me perder
Pois sou palhaço. sou alegria. sou festeiro.
Passamos pela infância E assim, seguindo vou com minha escola
E guardamos conosco A passar mais uma vez na avenida.
No íntimo do nosso ser Cobrir-me com minha fantasia de grande gola
O espírito dos primitivos E desfilar nesse orgasmo de minha vida.
Sem conforto e sem ambição
Lutando para viver Seguindo a cadência que o samba ordena
Somente pela alegria. Vou acenando para o povo coberto de emoção
Não quero nem saber quem me condena
Recolhido em meu canto Só quero seguir o ritmo dessa vibração
Orgulha-me dirigir tamanha obra.
E ir, seguindo sem pensar em nada
E orgulha-me mais ainda Somente dançar e cantar o samba escolhido
Ver em tudo isso Lembrar que sou palhaço e não fada
Poesia pura Perder-me no meio de tantos desconhecidos.
Meus amigos
Conforta lá dentro do meu coração Sou igual a qualquer outro de minha ala
Porque como eles Seja doutor, professor ou camelô,
Eu também adoro Somos todos palhaços e o palhaço iguala
Ser rato de barracão. Nesta ala ao palhaço que é meu amor.
Sendo palhaço, vou também sendo um rei
Rei da avenida, rei da vida, da ilusão
Sou soberano neste sonho que criei
Sou um palhaço, sou um rei, sou folião.
Rei, folião, palhaço
Meu total sentimento externo
Aqui guardo com alegria meu espaço
Cantando para que o desfile seja eterno.
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6. Diretor
O Ponto dos Poetas
Diretor
Aquele som nunca mais
A roda, o samba, a noite
Há um poeta em cada um de nós Coisa que ficou para trás.
E este poeta se põe em um ponto
Que as vezes se faz presente pela voz Diretor
E noutras vezes por um simples conto. Privacidade é saudade
O barzinho, o passeio, a ponte
Há sempre um poeta em tudo que existe O olhar perdido na praça
Seja na gente, nas plantas, nas flores, Ou até aquela graça
Seja até numa despedida triste, Já é página virada
Seja mesmo numa tela sem cores. Aquela vida privada
A andar pela calçada.
E ao revirar as velhas páginas deste verso
Só não vê se não quiseres perceber Diretor
Que é poesia tua presença no Universo Agora a própria vida exige
Há hoje, agora, um poeta em você. A própria palavra corrige
E se debruçam esperanças
Então desperta logo poeta, Nos rostos dessas crianças
E faz um verso para teu bem querer Que vivem a te seguir.
Que ao perceber que o continuas amando
Se fará poeta e fará um verso pra você. Poetas somos todos todo dia
É só querer pela ponta da caneta
Desejo, assim, que seja um verso inocente, Escrever para nosso amor, nosso bem querer
Somente um verso a revelar a pureza, Com as mãos do nosso coração...
Ponto central dos nossos sentimentos
Que faz presente o poeta que há na gente
E da nossa existência.
E deixe claro o ponto exato da beleza.
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Novo Carnaval
Vai Minha Escola
Novo samba, novo alento
Nova luz, nova canção
Nova estrela no firmamento
Nova paz no coração.
Vai minha escola menina Novo som, nova poesia
Descrever outra alegria Novo ser, novo voar
Em meio a essa tristeza Novo barco em calmaria
Com meu povo em romaria. Novo brilho no olhar.
Vai minha escola mais linda
Fazer o que és capaz Novo lar, nova alegria
E seja menina faceira Novo azul, nova emoção
Cortejando outro rapaz. Nova leve sinfonia
Vai minha escola de samba Nova chuva no meu chão.
Fazer o que te mandam os poetas
Poetas que do povo surgiram Novo enredo, nova dança
E para o povo escrevem suas metas. Nova ala, novo passo
Vai minha escola de sonhos Nova cara de criança
De samba e de humildade Nova vida-descompasso
Pois em teu selo és de ouro
Um tesouro da cidade. Novo feito, nova glória
Novo sonho, nova ilusão
Nova página da história
Velha vida em contramão.
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7. Minha Filha Mais Velha
O Compositor
Criei-te entregando-te flores
Perfumando-te para que perfumosa foste
Beijando teu pavilhão, tuas cores
Amando-te sem ver teus defeitos
Ao contrário, os fazendo adornos
Pelos cantos por onde andei.
Poeta do povo, do meio da gente Amei-te mais que a tudo
Garoto do samba, moleque decente. Que em volta de mim se fez presente
Poeta da gente, sem letra e sem verbo Fui teu corpo, teu poeta, tua mente
Sonhador do samba, que do instinto é servo. Fiz-te jóia amada por tantos
Fiz-te bela e formosa moça
Chorei teus choros
Sem precisão de pensamento nas coisas da vida
E sorri teu sorriso
Vai levando a vida pensando na escola
Enxuguei teus soluços
E pensando na escola vai pensando na avenida
E afaguei teus braços
Vagando na vida só no samba consola.
Fui teus sinais, teus traços
Fui muito mais pra ti
Sem ligar muito pra hora e pro dia
Fui concerto e canção
Só pensa no samba, na escolha do enredo
Fui cravo e não espinho
E guardando as estrofes, o refrão da poesia
Vivi a limpar teus caminhos
Parece um tesouro. É puro segredo.
Ficaste moça linda e formosa
Ficaste moça leve e perfumosa
Quando aponta a escola cantando seu samba
Ficaste moça estranha e dengosa,
Soluça o menino em seu interior
De repente, para ofuscar minha alegria
Foi o ano inteiro andando em corda bamba
Para finalmente exprimir arte-amor. Sem pensar foste em busca de
outras companhias
Te rebelaste contra teu próprio pai
Ninguém decifrará donde velo a melodia
Que hoje chora a perda da moça meiga e bela
Ninguém descreverá donde saiu a canção
Que embalou os sonhos da janela
Pois dos poetas do povo ela vem todo dia
Daquela casa de madeira do Morro.
No surdo que marca as batidas do coração.
Resignado, eu, teu pai
Vou deixar-te a sofrer um pouquinho sem mim
São assim os poetas da arte do povo
Para que conheças teus novos parceiros
Que descem do Morro pra encantar a cidade
E para que num dia desses de chuva e trovões
E sempre compõem um lindo samba novo
Sem o afago de meu grito de guerra
Que corre fama e lhes devolve a felicidade.
Voltes, mansa, de novo para mim
Implorando que não seja o fim
De nós dois, da nossa família, pai e filha.
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Samba Novo Jardim Florido
Meu samba
Chega bem devagarinho
Vem chegando de mansinho
Quando a voz ecoa fundo
Vem devagar
Quando a mão procura alguém
Meu samba
Quando a beleza é o mundo
Eu me fiz bem mais contente
Quando a melodia vem
No meio de minha gente
Noutra canção a cantar
O amigo é mais bonito
Meu samba
O amanhã esperança
Minha escola é majestade
A mulher eterno abrigo
Símbolo da liberdade
O ar areja bonança Reino forte de emoção
Meu samba
Quando o céu é confiança Você trouxe a alegria
Quando a mente fica limpa Protegido pela guia
Quando a noite é criança Fez do Morro campeão
Quando a inspiração é grimpa
Então valeu senhor
A boca fala Tanto lutar para ver
O coração acelera Ontem semear sementes
A maldade cala Hoje o jardim florescer
O bem impera
Surge ele, do povo. Dedicado ao Axé Mãe Preta,
Nasce um samba novo. Samba de Gilson e Almeron.
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8. Minha Maldade (Samba)
Meu Novo Amor
(Escola de Samba)
Quando você chorou
Seu pranto molhou meu peito
Meu coração alagou
Meu verso estava feito Andei pelo mundo
E pelo mundo onde andei
Vi seu choro sem soluço Procurei meu sonho
Vi silêncio e calmarias O meu sonho procurei
Sendo expulso vi o amor
Dando lugar a agonia Conheci mil coisas belas
Acalentei meu sonhar
Quando você chorou Sambei muito entre elas
Vi faltar água na fonte Serviu só pra me alegrar
Para regar a flor
Que abriu meu horizonte E assim
Quase perdido em desencanto
Vi faltar a harmonia Enxuguei todo meu pranto
Coisa comum nos casais Bem ali no meu pomar
A alegria vi se esvair
Que aliviou meus ais Ela é
Hoje a fruta mais gostosa
Amor perdoa Meu alimento, minha prosa
jamais posso te perder Meu pavilhão, meu olhar.
Quase perdi minha vida
Pois minha vida é você
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Pureza Ferida (Samba)
A pura beleza
Estampada em teu rosto
Tão simples, tão belo
A Passista Socorro A singeleza
Em teu moreno corpo
Doce caramelo
A alegria
Em tuas doces palavras
Tão boas de ouvir
Tuas carícias
Ou simples malícias
Bate o relógio: seis horas da tarde. Tão bom de se sentir
Lá vem ela subindo o Morro, Esses teus negros olhos
O sol senta, já não arde Tão cheios de brilho
Vai rebolando. É a Socorro. Torrentes de vida
A tua boca
Bate o relógio: seis da manhã. Teus lábios carnudos
Lá vai ela, descendo a ladeira E mãos atrevidas
O sol nasce, é o amanhã Fizeram menino
É sempre assim: trabalhadeira. Esse teu poeta
Esse teu cantor
Nessa vida. Entra ano e sai ano Louco felino
Nunca muda esse cotidiano Sem traço e sem meta
É mulher, índia, guerreira. Te deu todo amor
E então veio a noite
Sobe e desce todo dia, Com as trevas o medo, a desilusão
Sem perder a alegria Você revelando alguns seus segredos
É mulher. Bela e faceira. E sem compaixão
Deixou teu menino em desatino
Chorando num canto, banhado em lamento
Em profundo pranto
Só restou o sofrimento
Mas não há de ser nada, não, não há
O castigo é seu, foi você quem perdeu
Quem vivia a te amar. Eu.
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9. Alegoria
Artesão
Adorna as flores do jardim
Enfeitando o que já é enfeite
Surge a arte Às vezes é flor de jasmim
Do seio e do suor do povo. Às vezes café com leite.
É a nossa parte
Materializar o sonho novo. Se o jardim que se plantou
Fez-se jardim ambulante
Barro, pano e madeira Faz-se também furta cor
Couro, tinta e lata E alterna opaco e brilhante.
Arame, martelo, besteira
Misturando ouro e prata. Adereçando meus sonhos
De compostura confusa
Surge a arte Que se fizeram desenhos
Parte final da história Com mil faces difusas.
Que resulta em Carnaval
Ficou pronta nossa parte E o jardim do sonho completo
Resta buscar a vitória Feito desfile de flores na avenida
E levantar nosso astral. Onde o folião atrepado
Dá-lhe movimento e vida.
33 34
Rainha Vitória
Vaga pelo espaço meu pensamento
Sem que consiga concatenar as idéias
Porque um imenso vazio
Se apossou de mim ultimamente
Sem me permitir sonhar meus inocentes sonhos.
Rainha Vitória
Penso em "vitória" despedaçadamente. Espero vê-Ia logo à minha frente
Senti-Ia terna e pura, feito filha
Senti-Ia altiva e nobre, feito mãe
Hora é palpável e material
Senti-Ia possível, como em meus sonhos
Hora é sonho absolutamente desfeito
É tudo o que preciso
Hora é cinza que vejo despejada no cinzeiro
Para que o sangue guerreiro volte
Hora é a fumaça que foge das minhas mãos
A correr em meu corpo.
Sem me permitir senti-Ia jamais
Hora retoma aos meus braços, de noite
Rainha Vitória
E me endoida durante o dia inteiro
Sem ti não há luta
Hora me acorda em sonho pesado,
Sem ti não há esperança
De madrugada
E não me permite mais dormir Sem ti não há vida em mim.
Me forçando a ver clarear o dia
E me aumentando as olheiras no rosto cansado.
Rainha Vitória
Comparo a minha luta por ti
Às lutas e ao sofrimento dos Grandes da história
Se os diminuo em razão dos meus sonhos
Que se diminuam, não me importo
O que me importa
É que comparo minha luta
Às lutas de Bolívar, Arafat, Mandela ...
35 36
10. Lugar Feliz (Samba)
Enredo
Apesar de viver sobre a lama
O Morro chama
Por você pra sambar
Apesar de o tempo ser triste
A felicidade existe
E com o Morro forma o par
Bem-vindo
Se envolve em sua pobreza
Enredo dos meus sonhos
E alimenta a certeza
Bem-vindo
Que a liberdade chegará
Sonhos de meu enredo
Bem-vinda
Seja por um simples ato
Fantasia de meus dias
Seja por vias de fato
Bem-vinda
Este povo sorrirá
Ilusão dos meus segredos
E esta poesia mostra
Que seja lindo e colorido
Através de sua terra exposta
Que seja alegre e vibrante
Num dia-a-dia contente
Que seja o manto protegido
Envolto sempre em ternura
Que proteja minha amante
De face simples e pura
Simples povo, pura gente
E que me conte algo novo
No folhetim da história.
Ah! Morro amigo querido
Sei que teu brio ferido
Foi Deus que assim quis
Mas és da luta a glória
Em breve mudarás a história
Serás um lugar feliz.
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Pó Brilhante
Os Pés
Quem brilha, e brilha
De verdade
Clareia a avenida, de vida
E Liberdade
Deixa-me beijar teus pés.
E essa liberdade que brilha
Porque quando eu os beijar
E incendeia
Estarei beijando os pés
É o brilho natural das cores
Daquelas que conduziram as trouxas de roupa:
Que incendeia.
- As lavadeiras do Igarapé da Vovó.
Estarei beijando os pés
O brilho alucinante
Das crianças que correm subindo a
Que faz de conta que brilha
Rua São Benedito,
E que empolga o brincante
Estarei beijando os pés
Quando aspira sua trilha
Das mães do Igarapé do Quarenta,
E retira a inocência
Que os poderosos teimam em não enxergar
Que da vida faz o brilho
Sua luta e seu sofrimento.
Que não é a aparência
Mas do canto o estribilho,
Deixa-me beijar teus pés
Da canção o tom mais forte
Porque quando o fizer
Que o cantor faz entoar
Estarei beijando os pés
Quando assim brilha na música
Daqueles que construíram o Morro
Realmente a desfilar.
E estarei, sobretudo, beijando os pés
Que conduziram o Reino Unido
O pó brilhante que conta
A tantas vitórias!
No carnaval, na avenida
É o pó que brilha o corpo
Bom pros olhos e pra vida.
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11. 1988 - Conta Amazonas
Lantejoula
As lendas, emoções inesperadas
Foi o que a cidade viu passar
Na frente, árvores inacabadas
Brilha de lado e de frente Os juizes, pasmos, a olhar
Brilhante de tons diferentes. Sem entenderem o incêndio
Clareia meus olhos opacos O fogo em erupção
São cores, brilhos os cacos. Escorrendo sob aplausos
Frenesi na multidão
Milhões de imagens se faz Que escolheu a vencedora
Trilhões de formas de paz Mas a comissão julgadora
Com a carta marcada na mão
Coberto o Morro de lantejoula Sem nenhuma piedade
Se embebe em néctar de papoulas. Na contramão da cidade
Escreveu: decepção.
E mesmo sem a vitória
Aquela menina simplória
Retirou do morro o caos
Quando apaixonou Manaus.
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Barracão Que ao alvorecer não será mais um lençol
Mas um estandarte ou uma franja
Quando recolhido em meu canto Ainda de noite,
Veio as coisas surgindo Novas visitas
Evoluindo, Novos devaneios
Saindo do nada E novos planos
Somente da mente da gente Não são mais pobres
Nascendo entre vários sons São orgulho só
Se fazendo presentes A mãe que chega
Quando recolhido em meu canto A irmã que traz notícias
Veio a solidariedade O pedido de um diretor
Armada entre ferragens Uma reunião pra falar sério
Entre ferramentas e madeira O presidente que fala, fala, fala...
Sinto o bem estar Injeta ânimo
De estar ao lado Distribui cigarros
De homens e mulheres Serve café
Brancos, pretos e índios, Eles querem mostrar a sujeira da produção
Mais índios O cansaço, a estafa
Que brancos e pretos. Apontam a obra prima irmã do sonho
No dia a obra Querem um carinho
Animada sob o som Precisam de um abraço
De um samba novo Não lhes importa mais nada
De um abraço de quem chega Somente um abraço, com carinho
De uma saudação de quem vai Um cigarro
De um lanche ou um presente de visitante A confiança
Eles, orgulhosos, são os donos da festa Sentem-se homens assim
E feito pavões Importantes feito gente grande
Ficam orgulhosos de sua obra Importantes feito gente humilde.
De sua sujeira Ainda é noite,
De seu cansaço. Cantarola-se um samba, ao fundo
Quando recolhido ao meu canto, Devora-se goles
A noite ouço estórias engraçadas Da cachaça proibida, no ambiente.
Misturados aos que continuam a trabalhar E eu, recolhido ao meu canto
O beijo da namorada nova Vejo quanto amor
Ou da namorada do dia Se derrama pelos cantos
Buscam o esconderijo Dos olhos dessa gente
Dentro das sujas redes Que traz no sangue
Ou descansam o cansado corpo O sentimento da arte popular.
Após um banho rápido, Vou gostando, cada vez mais, desse clima
Sobre uma peça de pano Desse clímax
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12. Desse ambiente simples
De mutirão em forma de arte
De vida comum
De comunidade
Comida dividida
Espelho
Bebida distribuída igualmente
Construindo ilusões
Sonhos de muitos
Desejo de milhares
Glória de poucos
Que se sentem gente
Humilde e importante
Construtores e irmãos Quebrado ou inteiro
Experientes, mas meninos Reflete alegria
Que irresponsavelmente Seja cedo ou tarde
Abandonam suas vidas Seja noite ou dia
E que responsavelmente
Deliciam-se nos prazeres Reluz as imagens
Da convivência com o parceiro Que a gente sonhou
Simplesmente no afã Confundindo a cena
De construir a alegria Que o artista formou
De um carnaval,
De um lugar, Espelho quebrado
De uma cidade, Juntado do lixo
De uma vida Serviu de beleza
Em forma de arte. Compôs um capricho
Barracão da Reino Unido, na preparação do AXE MÃE PRETA (1989) Espelho inteiro
Perfeito e polido
Deformou a cena
Perdeu o sentido
O lixo do espelho virou arte pura
Compondo o cenário do que é essa vida
E a peça luxuosa falhou na avenida
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Pavilhão
Pluma
Bandeira,
Estandarte,
Balção,
Pendão,
Lábaro,
Seja lá como queiram chamar. Nobreza colorida
Mas quando este pedaço de pano Necessária aparição
Tremula dançando no ar Desfilante na avenida
Meu corpo é que treme insano O tom leve da visão.
Sob meu molhado olhar.
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13. O Tamborim
Ala das Baianas
O samba as fazem girar O couro agudo afinado
E também cuidar de nós Nas mãos de um bom tocador
Na avenida se transformam Coreografa o bailado
Num campo de girassóis. Com fortes batidas de amor.
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A Bateria
A Fantasia
Mãos e cordas
Lata e couro
A fantasia é tudo
Pano e bordas
Pois tudo é fantasia
Prata e ouro
E fantasia na pista
Som, compasso, animação
O povo em harmonia.
É da Escola o coração.
51 52
14. A Torcida Organizada
A Rainha da Bateria
Vou olhar no teu olhar
Pois quero vê-Ia brilhar
E quando o brilho for crescendo
Sei que também vou chorar
Vou levantar os teus braços
Bem na altura dos meus
Para fechá-Io em abraços Vai sambando bem na frente
Entrelaçando-me aos teus Frenética e alucinante
Reluzindo na avenida
Vou soltar a minha voz Como uma pedra brilhante.
Junto contigo em coral
Juntando à voz do povo
Que embala o carnaval
Vou aplaudir loucamente
Tudo o que for passando
Desde a comissão de frente
Até quem vier limpando.
53 54
Vai com Deus Reino Unido
(O GRITO DE GUERRA)
Clareou, escureceu.
Balançou, estremeceu.
O Carnavalesco Agitou, ensurdeceu.
Rufaram os tambores
Benzeram-se os cantores
Rezaram os diretores
Foguetes espocaram
Destaques se arrumaram
Casais se abraçaram
De repente, da visão Cavaquinho afinado
De um lampejo da vida, Carro alegórico adornado
De qualquer um lugar Pulmão paralisado
O artista põe a mão
Vê seu povo na avenida Semblantes tensos
Feito esmeralda a brilhar. Abraços extensos
Beijos imensos
Dá forma a todas as artes
E as artes a ele obedecem Vai falar o presidente
Monta sua tela em partes Vai ter choro de emoção
Mesmo às noites se aquecem O seu "grito" é comovente
Fadiga e talento em contraste Emociona o folião
Que aos sonhos rejuvenescem.
Fala o que vem à mente
Quando monta a aquarela Solta a escola na avenida
E as cores vão dançando, Faz chorar o componente
Surge a cena mais bela: Manda alegrar a vida
... O artista "viajando".
É sempre assim todo ano
Com seu povo reunido
Solta o discurso profano
"Vai com Deus meu Reino Unido..."
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15. Quarta-Feira (Cinzas)
Ambiente Vivo da Memória
A pontuação contada
A bebida tragada Terra preta... pés descalços... espinhos de tucumã
A testa suada Urtigas batendo nas pernas... coceira de matar qualquer um
Pés de sorva... campinho de peladas... bola de seringa
A camisa enfeitada Castanheiras... cacimbas de água cristalina... cajueiros.
A voz apressada Barranco alto... piranhas... aracus... pacús... traíras
A tez preocupada Catraia... canoas e botes... remo e faia... igarapé cheio
Nado livre... afogamento sem morte... folhas de vindicá
Concluída a apuração Sabão em pedra... trouxa de roupa... lavadeiras.. .
Meia voz vira explosão Linha de nylon e anzol... tarrafa e malhadeira Pipira... sanhaçu... bem-te-vi...
Mil gestos de vibração tesouras... caga sibite... rasga mortalha... preguiças
Papagaios de papel.. casquetas... linha zero... linha zebra
Só se ouve o samba enredo Floresta viva... vida nativa... raízes presentes
Tantas vezes repetido Sessenta e sete... Distrito Industrial... fábricas
E as baquetas entre os dedos Progresso... empregos... linha de montagem
Dando o tom: dever cumprido Esgoto... fezes... destruição veloz... morte
Jaz o Igarapé do Quarenta... meu riacho...
O povo dança endoidecido Minha infância... meu brinquedo... (quebrado).
Como se não houvesse o amanhã
Comemorando a vitória
Da escola campeã.
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