O documento discute as políticas de cotas raciais no Brasil. Alguns argumentam que as cotas podem instituir racismo velado e que o Brasil é um país miscigenado, tornando a discriminação por raça artificial. Em vez disso, propõem melhorar o acesso à educação, como bolsas de estudo, para combater a desigualdade.
A história da escravidão, cotas raciais e desigualdade educacional
1. A história da escravidão no mundo é tão antiga quanto a da própria humanidade.
Porém a forma mais comum de escravidão registrada historicamente tem origem a
partir da relação de forças entre conquistadores e conquistados, com os primeiros
impondo a condição servil aos segundos. Povos inteiros eram submetidos à
servidão por terem sucumbido ao poder de um determinado conquistador.
2. Enviada ao Congresso, a proposta do MEC
instituiu cotas para estudantes que tenham
cursado integralmente o Ensino Médio em escolas
públicas ou que se declarem afro-descendentes.
O assunto é polêmico e, ipso facto, merece um
amplo debate não só nos meios acadêmicos, mas
em toda a sociedade.
Olhando sob o prisma educaional, existem excelentes escolas públicas que
se ombreiam com as boas escolas particulares (exemplos em Curitiba/PR:
Colégio Militar, Cefet Ensino Médio, Colégio Estadual do Paraná, Escola
Técnica da UFPR, etc.). As cotas (50% das vagas) serão essencialmente
preenchidas por esses alunos, cujo padrão socioeconômico se assemelha
ao dos estudantes de boa parte das escolas particulares. Muitos até
mesmo têm condições financeiras de pagar cursos paralelos no
contraturno. Se isso vier a acontecer, não se estará instituindo-se um
privilégio?
3. • As piores mazelas, as maiores exclusões socio
educacionais se dão nas escolas rurais ou de
periferia das grandes cidades. É onde se justificam
políticas afirmativas, como a implantação de escolas
profissionalizantes e de cursos pré-vestibulares
gratuitos, como o da USP e o Em Ação, de Curitiba
(para o qual a UFPR cede instalações e cujos
professores são voluntários). Por iniciativa do
governo, podem ser organizadas ações proativas
com diretores, professores, líderes comunitários,
APMs, ONGs, universitários — ou até mesmo
estudantes do Ensino Médio — das instituições
públicas e privadas.
• Para finalizar, a tão premente melhoria do ensino
deve priorizar as séries de 1.ª a 8.ª. Em entrevista à
Gazeta do Povo, Vitor B. Nascimento, que é
afrodescendente e formado em Educação Física
pela UFPR, posiciona-se muito bem quando fala do
sistema de cotas: “É uma solução que começa pelo
fim. É preciso investir mais no Ensino Fundamental”.
• Com o projeto de lei, o governo se parece com o
construtor bem intencionado que assume um prédio:
sob o pretexto de consertar as paredes (Ensino
Médio), danifica o telhado (Ensino Superior), sem se
importar com a fundação (Ensino Fundamental), que
está bastante comprometida.
4. O sistema de cotas é uma medida emergencial, circunstancial e inevitável. Cabe
aqui a metáfora que Martin Luther King usou ao se referir à duração do período de
escravatura nos EUA: quot;Em uma corrida, não se pode comparar uma pessoa que já
estava no ponto de partida com outra que chegou 300 anos atrasadaquot;. Nenhum de
nós é tolo a ponto de achar que o sistema de cotas vai resolver o problema da
desigualdade racial, mas não se pode deixar políticas afirmativas como essa de
lado. Os EUA implantaram o sistema de cotas há 30 anos e, agora, estão
reorientando-o e até mesmo abandonando-o em algumas áreas por acreditarem
que ele já causou o efeito desejado. Collin Powell e Condoleezza Rice usufruíram
dessas cotas e chegaram ao posto de secretários de Estado.
Trata-se de uma medida circunstancial para amenizar os efeitos de um atraso
histórico e, assim que chegarmos a patamares mínimos de igualdade, ela deve ser
abandonada.
A tônica principal dos artigos é que as leis
propostas instauram o “racismo velado” no
País, a pretexto de combatê-lo...
Roldão Arruda
5. Um grupo de 113 cidadãos influentes – intelectuais,
empresários, advogados, artistas e sindicalistas –
tomou, no início de maio deste ano, uma das iniciativas
mais fortes contra a política de cotas raciais do país.
Eles argumentam que as cotas não fazem sentido. “O
processo de formação da sociedade brasileira foi
marcado pela miscigenação desde a primeira presença
de portugueses aqui”, diz a historiadora Isabel Lustosa,
do museu e centro de estudos Casa Rui Barbosa.
Segundo ela, tentar discriminar por raça agora cria uma
divisão artificial na sociedade. “Em Brasília, o sujeito
tem de olhar se o cabelo do candidato está no padrão
ou não”.
Para compensar a desigualdade econômica e racial do
país, os autores do manifesto propõem outro tipo de
ação. “A política que tem de haver é de uma distribuição
melhor do acesso à boa educação”, diz Isabel. “Sou a
favor de bolsas de estudo, como tive em meu colégio de
freiras no Ceará. Éramos 13 filhos. Todos de cores
variadas.”