1. NOVA LÍNGUA PORTUGUESA...IMPERDIVEL, Por Helena Sacadura Cabral.
utilizada frequentemente em "ciências de educação" ...
Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar aos pretos 'afro-americanos',
com vista a acabar com as raças por via gramatical, isto tem sido um fartote
pegado!
As criadas dos anos 70 passaram a 'empregadas domésticas' e preparam-se agora para
receber a menção de 'auxiliares de apoio doméstico' .
De igual modo, extinguiram-se nas escolas os 'contínuos' que passaram todos a
'auxiliares da acção educativa' e agora são 'assistentes operacionais'.
Os vendedores de medicamentos, com alguma prosápia, tratam-se por 'delegados de
informação médica'.
E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em 'técnicos de vendas
'. O aborto eufemizou-se em 'interrupção voluntária da gravidez';
Os gangs étnicos são 'grupos de jovens'
Os operários fizeram-se de repente 'colaboradores';
As fábricas, essas, vistas de dentro são 'unidades produtivas' e vistas da estranja são
'centros de decisão nacionais'.
O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo à 'iliteracia'
galopante.
Desapareceram dos comboios as 1.ª e 2.ª classes, para não ferir a susceptibilidade social
das massas hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria
continuam a cobrar-se preços distintos nas classes 'Conforto' e 'Turística'.
A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe solteira...» ; agora, se quiser
acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia: «Tenho uma
família monoparental...» - eis o novo verso da cançoneta, se quiser fazer jus à
modernidade impante.
Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e
«terroristas»; diz-se modernamente que têm um 'comportamento disfuncional
hiperactivo'
Do mesmo modo, e para felicidade dos 'encarregados de educação’, os brilhantes
programas escolares extinguiram os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito,
'crianças de desenvolvimento instável'.
Ainda há cegos, infelizmente. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até
aviltante, quem não vê é considerado 'invisual'. (O termo é gramaticalmente impróprio,
como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o 'politicamente correcto'
marimba-se para as regras gramaticais...)
As p. passaram a ser 'senhoras de alterne'.
Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da praça desbocam-se em
'implementações', 'posturas pró-activas', 'políticas fracturantes' e outros barbarismos da
linguagem.
E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a «correcção política» e o
novo-riquismo linguístico.
Estamos "tramados" com este 'novo português'; não admira que o pessoal tenha cada
vez mais esgotamentos e stress. Já não se diz o que se pensa, tem de se pensar o que se
diz de forma 'politicamente correcta'.
Helena Sacadura Cabral