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Cultura QUARTA-FEIRA • 5 DE JUNHO DE 2013
Diário do Minho
Este suplemento faz parte da edição n.º 29971
de 5 de junho de 2013, do jornal Diário do Minho,
não podendo ser vendido separadamente
> “Gato desconfiado...”
– Bragança, agosto de 2012
[Foto de Sofia Barbosa]
II Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura
Envio de trabalhos para publicação neste suplementoDiário do Minho
CulturaCultura Diário do Minho / Secção Cultural
Rua de S.ta
Margarida, 4 - 4710-306 Braga; Fax: 253609469. E-mail: cultura@diariodominho.pt
5.Junho.
2013
N.º 701
O pressuposto essencial da vida
em sociedade é o da mútua de-
pendência, a qual, sem embargo
dos eventuais aspectos negativos,
possibilita e condiciona o desen-
volvimento das virtualidades de
cada um; mesmo quando se tra-
duzem na crítica, mais ou menos
agressiva, dos valores em cujo ho-
rizonte a pessoa veio à luz da vida,
dos afectos e da razão. Com efeito,
é no modo como recebemos, as-
similamos e aperfeiçoamos essas
influências que nos assemelhamos
e distinguimos uns dos outros. Daí
resulta que, conforme se ascende
na escala humana, mais subtis
sejam as formas de comunicação;
razão pela qual se fala em con-
genialidade a propósito das afini-
dades entre homens superiores;
as quais, no limite, escapam aos
métodos positivos da análise.
Isso me dispensa de tentar de-
monstrar algumas aproximações,
que não estou à altura de esclare-
cer, em especial quando se trata
de movimentos espirituais, cuja
verdadeira razão de ser apenas
posso inferir de textos e teste-
munhos, susceptíveis no entanto
de diferente exegese. Assim, por
exemplo, se está documentada a
relação de amizade que Mário Saa
manteve com Teófilo Braga nos
últimos anos da vida do profes-
sor, já afastado das lides públicas,
nada posso alegar de semelhante
quanto a Bruno; ainda que, tanto
por via do velho professor, como
de Fernando Pessoa e até de
José Leite de Vasconcelos, possa
presumir que conheceria bem a
invulgar personalidade do autor
de O Encoberto. Cada vez mais
desligado da vida partidária e
política, a sua atenção polarizara-
-se na decifração dos enigmas da
nossa história próxima e remota,
sobretudo desde que, em 1909,
passou a dirigir a Biblioteca Públi-
ca e o Museu Municipal do Porto,
pelo que não poderia deixar de
despertar a curiosidade do autor
da Erridânia.
O que se me afigura evidente é
que, descontadas as diferenças
de estilo, tanto pessoal como de
geração literária e mental, as teses
enfeixadas no volume A Invasão
dos Judeus recebem inesperada
luz, assim como ilustram, as do
inacabado Plano de um Livro a
Fazer, que Álvaro Ribeiro aproxima
da Historia de los Heterodoxos
Españoles, de Menéndez Pelayo, e
nós da História Secreta de Portu-
gal, de António Telmo. O judaísmo
fora objecto da persistente inda-
gação de Bruno, atento ao que ele
representou na história universal e
sobretudo na de Portugal, apesar
de pouco sabermos do que nesse
interesse influiu, durante o exílio
de 1891 a 1893, a estadia em Paris
e a passagem por Amesterdão, em
cuja comunidade sefardita, ainda
não esquecida das raízes portu-
guesas, teria colhido importantes
revelações. A verdade é que, tal
como n’O Encoberto se afastara de
algumas noções correntes acerca
do messianismo, assim também
n’Os Cavaleiros do Amor se propu-
nha desvendar uma história secre-
ta, não apenas de Portugal; tarefa
que a morte, no entanto, deixou
interrompida, como em suspenso
ficara entretanto a Teoria Nova da
Antiguidade, de que conhecemos
apenas os primeiros lineamentos.
A reflexão sobre o tempo e a
historicidade, mormente os temas
atinentes à génese e fenomeno-
logia das revoluções, fossem as
súbitas e sangrentas ou as de largo
fôlego e quase imperceptíveis,
tinha primacial importância para
quem considerava o movimen-
to a essência da realidade. Mas
compreende-se que, ao postular a
queda no homogéneo, em con-
sequência da qual se destacara
o mundo, onde reina o mal e o
erro, prestasse especial atenção
à agência dos factores subtis, dos
movimentos ocultos e das socie-
dades secretas, num devir de sua
natureza misterioso. Na série dos
volumes que tencionava publicar,
o último intitular-se-ia, em sime-
tria com o primeiro, a Síntese da
Crença Cristã; infelizmente, po-
rém, nem mesmo os amigos mais
próximos, como Teixeira Rego, ou-
saram suprir a enorme perda que,
nessa como em outras vertentes, a
morte do filósofo significou.
Por isso continua a valer como
derradeira expressão do seu
pensamento o artigo que, pouco
antes de ser internado na Ordem
do Terço, onde faleceria, entregou
para publicação n’A Águia, com a
indicação expressa de que seria o
último… No tom de tantos outros
textos eruditos, nele deixou uma
mensagem a que por certo atri-
buía grande importância, mas que,
como era hábito num escritor que
amiúde ocultava o essencial sob
a capa do banal, deixou ao nosso
cuidado decifrar, com a quota-
parte de responsabilidade que isso
implica. O título, “O ‘Judeu’”, reme-
te ostensivamente para o contro-
verso autor das peças do teatro de
fantoches que, aliás sem provas
concludentes, como mostrou
Claude-Henri Frèches (Bulletin
d’Histoire du Théatre Portugais,
n.º 1, Lisboa, 1950, pp. 33-61), se
tem identificado com António
José da Silva; mas o que está em
causa, como se depreende da
leitura atenta, é o modo pelo qual
os judeus, ou antes, uma cama-
da social de progénie hebraica,
combatia os valores tradicionais,
mormente nos séculos XVIII e XIX
e não só em Portugal.
As poucas páginas de um arti-
go redigido quando a doença o
constrangera ao último recurso,
a que sempre se furtara, apenas
lhe permitiram chamar a atenção,
com a objectividade que era seu
timbre, para o modo como, a partir
das instituições da sociedade onde
se acolhia e prosperava, um de-
terminado estrato lhe minava as
crenças e os valores. Que Bruno
achasse importante deixar esta
última mensagem, na sequência
do Plano que vinha publicando
desde os fins do ano anterior, a
um ritmo cada vez mais espaçado,
dá que pensar. Tanto mais que ti-
nha já redigidos e mais ou menos
prontos para o prelo outros vinte e
quatro textos, que ficaram inéditos
por muitos anos.
Homem de génio foi como Álva-
ro Ribeiro qualificou o autor de
A Ideia de Deus, livro onde leu o
que Bruno entendia por tal e, por
isso, com a perfeita noção do que
significava. Por isso, tal como em
outros passos da vida arrepiara ca-
minho, corrigindo o erro cometido
quando, da primeira vez, no “casi-
no”, resistiu à voz que lhe indicava
o número da sorte, é de presumir
que agora também se decidira a
abrir um pouco mais o jogo. Com
efeito, o último texto oferece uma
chave para ler o Plano de um Livro
Uma herançaUma herança
inconscienteinconsciente
POR
JOAQUIM DOMINGUES
PROFESSOR DE FILOSOFIA
O escritor e filósofo
José Pereira de Sampaio
(1857 - 1915),
de pseudónimo Sampaio Bruno
CulturaCultura IIIDiário do Minho QUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013
a Fazer, que talvez não estivesse
na sua mente quando o iniciou.
Não sendo um pensador apolíneo,
como observa José Marinho, mas
inspira-do pelas constelações
invisíveis, fizera ele de Bruno um
nome de combate pela luz, não
pelo ocultismo; de modo que o
livro de que traçou o Plano se
intitularia, bem a propósito, Os
Cavaleiros do Amor ou a Religião
da Razão. Compreende-se a pre-
ferência editorial pela primeira
parte do título, tal como saiu no
volume de Guimarães Editores,
mas importa prestar igual aten-
ção à segunda parte, que evoca
aliás a Defesa do Racionalismo ou
Análise da Fé, de Amorim Viana, e
de algum modo antecipa A Razão
Animada, de Álvaro Ribeiro. Numa
linhagem consentânea ao amplo
racionalismo da nossa tradição
que, sem excessos nem exclusivis-
mos, sempre buscou ver claro, na
senda de um iluminismo integral,
que não o de restrita feição físico-
matemática.
Seria isso, porventura, o que Bruno
pretendia distinguir, ao mostrar a
feição corrosiva dessoutra linha-
gem que, impondo-se já então
nos meios prestigiosos da Cidade
Luz, tivera bem modesta géne-
se, em meios como o do Bairro
Alto lisboeta do século XVIII?! Um
rebate me levou a aproximar o texto
brunino do livro que nem sequer o
cita; para mais assaz díspar no estilo
e nas circunstâncias em que sur-
giu, como é A Invasão dos Judeus.
Admitida a hipótese, porém, tenho
hoje como assente que, mesmo
que nada devesse à leitura de Bru-
no, o livro de Mário Saa nele poderia
encontrar a perfeita epígrafe para
uma das mais penetrantes tentativas
de compreensão da nossa história
moderna e contemporânea.
Faltaria à verdade se dissesse que,
por minha vez, nada lhe fiquei a
dever também, pelo menos no
domínio da informação que pro-
digaliza e até de algumas ilações.
A verdade, porém, é que chegara
por mim a idêntica conclusão,
ainda que interpretando de forma
mais ampla e vaga o que Mário
Saa explica, em termos categóri-
cos, como obra judaica ou, antes,
judaico-portuguesa. A distinção é
importante, pois tem a ver com a
tese de que os homens de nação
acabaram por se fundir na so-
ciedade onde se acolheram, mas
como um elemento heterogéneo
que, em vez de ser o fermento
renovador, corrompeu o corpo
social de que se assenhoreou.
No seu característico jeito polémi-
co, julgo no entanto que demons-
trou demais, visto o ascendente
da comunidade judaica não poder
explicar, por si só, a decadência
da nobreza e do clero, que abriu
via à subversão da escala dos
valores sociais. Em todo o caso,
julgo fecunda e pertinente, desde
que corrigidos alguns exageros
retóricos (para já não falar nas
gralhas), uma abordagem que
permite compreender o que, de
outro modo, se não entende; em
especial uma sanha destruidora
da herança cultural e da estrutura
social, que só por equívoco se
atribuiu ao povo, de sua natureza
conservador, ainda que fácil de
iludir pelos demagogos. Se admi-
tirmos, porém, que houve uma
mudança dos detentores do poder,
não só isso resulta lógico, como
a notória desafeição do povo aos
seus dirigentes e a consequente
crise da identidade nacional.
A pulsão auto-destruidora, suicida,
como diria D. Miguel de Unamuno,
ganha foros de compreensível,
apesar da sua insanidade, se ad-
mitirmos que a vida colectiva – do
ponto de vista mental, económico
e político – passou a ser dirigida
por uma camada social marcada
pelo ressentimento, cujas causas
entretanto esqueceu ou ignora. A
irracionalidade, já apontada por
Basílio Teles, de muitas das deci-
sões tomadas pelos dirigentes em
certos momentos decisivos, resul-
taria, nesse caso, duma tão irrepri-
mível como inconsciente atitude
de retaliação contra os que teriam
oprimido os seus antepassados.
Com efeito, Mário Saa insiste na
ideia de que nem os protagonistas
teriam consciência das razões do
seu procedimento, até porque se
trataria de pessoas de todo des-
prendidas já da tradição religiosa e
da pertença étnica.
Passado quase um século sobre
o diagnóstico e ultrapassados os
aspectos mais datados da argumen-
tação, justo será reconhecer que o
essencial da tese se mantém válido,
se não foi mesmo reforçado pelo
que nem o autor podia prever. Ele,
que refere o sintomático projecto
republicano de construir em Angola
um estado judaico, não imaginaria
talvez que passados cinquenta anos
todos os territórios portugueses de
além-mar, à excepção dos arqui-
pélagos dos Açores e da Madeira,
seriam alienados sem especial
sobressalto da consciência política,
aliviada por se libertar de um fardo
incómodo e sobretudo incompre-
ensível para os seus critérios. O
que por certo não estranharia seria
que, sucedendo-se os governos
e os titulares dos órgãos políticos,
económicos e culturais, tenha no
entanto permanecido a directriz do
combate aos valores cristãos; os
quais o povo continua a prezar, não
obstante o permanente desgaste a
que são submetidos pelos meios de
condicionamento social.
O que distingue um povo é preci-
samente a fidelidade a um sistema
de valores, que ora é potenciado
ora reprimido por quem domina
as instituições, formais e informais,
onde se concentram os meios de
acção e de reacção social. É inegá-
vel que a relação dos portugueses
com essas instituições e os seus
detentores se alterou radicalmente
nos dois últimos séculos. Não foi o
povo que mudou, por certo. ◗
Braga, 2013
“O que distingue um povo é precisamente a fidelida-
de a um sistema de valores, que ora é potenciado ora
reprimido por quem domina as instituições, formais e
informais, onde se concentram os meios de acção e de
reacção social. É inegável que a relação dos portu-
gueses com essas instituições e os seus detentores se
alterou radicalmente nos dois últimos séculos. Não foi
o povo que mudou, por certo.”
Sol
Dizem que o sol é importante...
Porquê? Penso que descobri...
O sol oferece-nos sorrisos, boa disposição e uma boa vida.
No entanto, há algo que o sol não consegue oferecer:
Uma mãe dedicada, carinhosa, esperta, querida, divertida...
Bem: acabei por te descrever, minha querida Mãe!
Os sorrisos e abraços partilhados...
A felicidade sentida...
Sinto-me bem ao teu lado:
És o sol da minha vida!
Chuva
Plin, plin, plop, plop...
Ouve-se o som da chuva quando há tristeza, dor, sofrimento...
É um som triste, mas também pode ser agradável,
porque depois de chorares tudo o que tens,
recebes um abraço quente e protetor...
Não gostas de me ver chora;
Tu desejas partilhar o meu desgosto;
Proteges-me de tudo...
Não permitindo que a chuva alcance o meu rosto!
Tempestade
Eu não gosto, tu detestas, nós odiamos...
Afinal, por que é que existem?
Penso que a culpa é minha...
Não faz sentido!
Não há nenhuma razão!
Às vezes tudo acaba mal...
Acabando por surgir uma tempestade com tanta confusão...
Lua
As fadas existem” Sou infantil? Não...
Sou alguém sortudo que tem
uma fada sempre ao meu lado... mesmo de noite,
Protegendo-me dos pesadelos, dando-me sonhos!
É no passado, presente, futuro...
Deixando tudo sereno:
És a lua que me observa no escuro!
O amor de uma mãe reflete-se no tempo...
Sol: felicidade; Chuva: tristeza; Tempestade: discussões; Lua: serenidade...
Em relação à lua, queria dizer-te: Obrigada!
Em relação à tempestade, queria dizer-te: Desculpa!
Em relação à chuva, queria dizer-te:
Estarei sempre do teu lado.
Em relação ao sol, queria dizer: Adoro-te!
Poemas
à Mãe!
Sara Daniela Gomes Braga
(15 anos)
IV Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura
Amanhã, na Faculdade de Teologia (Braga)Amanhã, na Faculdade de Teologia (Braga)
HomeHomenagem ao compositornagem ao compositor
Manuel FariaManuel Faria
A Faculdade de Teologia (Braga), e oA Faculdade de Teologia (Braga), e o
Seminário Maior vão homenagear ama-Seminário Maior vão homenagear ama-
nhã, dia 6 de junho, o compositor Manuelnhã, dia 6 de junho, o compositor Manuel
Faria, assinalando o 30.º aniversário daFaria, assinalando o 30.º aniversário da
sua morte. Esta iniciativa tem lugar nosua morte. Esta iniciativa tem lugar no
Auditório S. Tomás de Aquino, na Fa-Auditório S. Tomás de Aquino, na Fa-
culdade de Teologia (Rua de Santa Mar-culdade de Teologia (Rua de Santa Mar-
garida), às 21h30. A iniciativa é marcadagarida), às 21h30. A iniciativa é marcada
por uma conferência proferida pelopor uma conferência proferida pelo
músico Jorge Alves Barbosa, seguidamúsico Jorge Alves Barbosa, seguida
de um concerto pelo grupo “Cappellade um concerto pelo grupo “Cappella
Bracarensis”. A entrada é livre.Bracarensis”. A entrada é livre.
O Cónego e compositor Manuel Faria nasceu em
S. Miguel de Seide, V. N. de Famalicão, em 18 de
novembro de 1916, e faleceu no Porto em 5 de
julho de 1983 (aos 66 anos) Iniciou os estudos
musicais no seu tempo de seminarista, em Bra-
ga. Assimilou, desde cedo, modelos alternativos
aos cânones de harmonia e composição e exibiu
com êxito, nos meios académico-musicais
religiosos, composições de sua autoria consi-
deradas extemporâneas para a época.
Em 1939, a arquidiocese de Braga enviou-o para
o Pontifício Instituto de Música Sacra, em Roma.
Depois da Segunda Guerra Mundial, conseguiu
concluir a sua formação em órgão, canto gre-
goriano e composição sacra como bolseiro do
Instituto de Alta Cultura. No regresso a Portugal,
Manuel Faria passou a desempenhar, nos Se-
minários bracarenses, as funções de professor
de música. Ainda em 1945, o compositor deu a
conhecer obras de sua autoria interpretadas pelo
Coro da Rádio Roma, num concerto que obteve
bastante reconhecimento por parte da imprensa
musical italiana.
Aenormeapetênciaparaoconhecimentodenovas
experiênciaseasuapassagemporParis,noregresso
a Braga, tornaram-no admirador dos compositores
franceses de meados do Século XX.
Manuel Faria incutiu um espírito de renovação
musical nas paróquias nortenhas (especialmente
nas da diocese de Braga), afirmando que aquela
arte,“antes de ser litúrgica, tem que ser música”.
Ensaiou canto gregoriano na Sé de Braga e foi
dinamizador de coros litúrgicos sem nunca ter
descurado a faceta de compositor, tanto para
música sacra como para música de câmara. Em
1949, o autor dos“Cânticos Litúrgicos” preparou,
no Palácio de Cristal (Porto) um concerto por si
dirigido, inteiramente dedicado à apresentação
das suas obras, desde motetes“em estilo moder-
no” até às obras consagradas a coro e orquestra
de câmara.
A sua música foi conhecida na Áustria, país onde
esteve durante algum tempo, tendo sido gra-
vada pela rádio de Viena, em 1956, a “Missa em
Honra de Nossa Senhora de Fátima”. Também o
maestro Frederico de Freitas levou a sua mú-
sica sinfónica para Baía e Recife, no Brasil. Em
1961, Manuel Faria tornou-se bolseiro da Fun-
dação Calouste Gulbenkian, estabelecendo-se
novamente em Itália para aprofundar estudos
na área da Composição e proceder à divulgação
da sua obra.
Posteriormente, foi o responsável pela criação
da Semana de Música Sacra em Braga e da “Nova
Revista de Música Sacra”. Em 1972, recebeu o 1.º
Prémio do Concurso Nacional Carlos Seixas.
No que diz respeito à música de cariz profano,
salientam-se as obras compostas sobre poesia
de Antero de Quental e de Fernando Pessoa.
Manuel Faria escreveu ainda uma ópera em dois
actos, nunca estreada, na ocasião do 9.º Cente-
nário da Conquista de Coimbra aos Mouros.
Em 1983, foi agraciado com o grau de Comen-
dador de Santiago de Espada, vindo a falecer
nesse mesmo ano. ◗
V. Blanco de Vasconcellos
do meu querido Mestredo meu querido Mestre
Dr. Manuel FariaDr. Manuel Faria
Poeta,Poeta,
Calou-se a tua lira para nósCalou-se a tua lira para nós
– Essa lira que era a voz– Essa lira que era a voz
D’Aquele que a tangiaD’Aquele que a tangia
No silêncio da entregaNo silêncio da entrega
E da oração!E da oração!
Mas não morreu! Apenas se calouMas não morreu! Apenas se calou
– Que à nossa alma ainda chega– Que à nossa alma ainda chega
Esse canto profundo e sonhadorEsse canto profundo e sonhador
De quem amou a dorDe quem amou a dor
E a transformou em ritmo e melodia!E a transformou em ritmo e melodia!
Era divina e terna a sinfoniaEra divina e terna a sinfonia
Do teu ser!Do teu ser!
Tão meiga e tão suaveTão meiga e tão suave
A tua fala,A tua fala,
Que a minha lira, ao recordá-la,Que a minha lira, ao recordá-la,
Entoa os versos tristes da saudadeEntoa os versos tristes da saudade
E da ternura...E da ternura...
Poeta,Poeta,
Irmão deste outro que te rezaIrmão deste outro que te reza
Na tristezaNa tristeza
Do derradeiro adeus da despedida:Do derradeiro adeus da despedida:
A tua lira não morreuA tua lira não morreu
– Apenas emudeceu– Apenas emudeceu
Para cantar na eterna vidaPara cantar na eterna vida
A suprema beleza do Amor...A suprema beleza do Amor...
Por isso, Mestre, a minha humilde avenaPor isso, Mestre, a minha humilde avena
Se ajoelhaSe ajoelha
No lajedo da tua sepulturaNo lajedo da tua sepultura
(E muito já se orgulha a pobre ovelha(E muito já se orgulha a pobre ovelha
Na venturaNa ventura
De se dobrar à voz de tal pastor!).De se dobrar à voz de tal pastor!).
Ajoelha... mas não choraAjoelha... mas não chora
– Que as lágrimas desfolham a Saudade– Que as lágrimas desfolham a Saudade
E, essa, eu quero tê-la vida fora,E, essa, eu quero tê-la vida fora,
Até poder sonhar, na minha Aurora,Até poder sonhar, na minha Aurora,
Os hinos que cantaste à Eternidade!Os hinos que cantaste à Eternidade!
Abílio PeixotoAbílio Peixoto
InIn “No Coração da Ausência” (1984)“No Coração da Ausência” (1984)
Em Memória
Em Memória
CulturaCultura VDiário do Minho QUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013
Ocorre hoje, 5 de junho, mais um aniversário da morte de um dos maiores
poetas de Espanha e do mundo: Federico García Lorca. Sendo um poeta por
muitosconsideradoum“revolucionário”,nemsempreasuaobratemmerecido
a relevância que se lhe ajusta, sendo até bastante desconhecida entre nós.Por
isso, evocamos hoje a sua memória, nomeadamente através de uma breve re-
senha biográfica e a transcrição de um dos seus mais belos sonetos.
O poetaO poeta FedericoFederico
GarcíaGarcía LORCALORCA
No 115.ºNo 115.º
aniversárioaniversário
do seudo seu
nascimentonascimento
Federico García Lorca nasceu em
Fuente Vaqueros, Província de
Granada, no dia 5 de junho de
1898 — e foi assassinado às portas
da cidade de Granada no dia 19 de
agosto de 1936.
Considerado um dos maiores poe-
tas de Espanha (e do mundo), foi
também um dramaturgo de enor-
me talento – e, por que não dizê-
-lo desde já?, uma das primeiras
vítimas da Guerra Civil Espanhola,
devido ao seus alinhamentos políti-
cos com os republicanos.
Nascido de família abastada numa
pequena localidade da Andaluzia,
García Lorca ingressou na faculda-
de de Direito de Granada em 1914,
e cinco anos depois transferiu-se
para Madrid, onde ficou amigo de
artistas como Luis Buñuel e Sal-
vador Dali, ali publicando os seus
primeiros poemas.
Grande parte dos seus trabalhos
iniciais remetem para temas
relativos à Andaluzia (Impressões
e Paisagens, 1918), bem como
para a música e para o folclore
regionais (Poemas do Canto
Fundo, 1921-1922). Os ciganos
surgem também como um dos
seus temas preferidos, como o
demonstra o volume Romancero
Gitano, que publicou em 1928.
Concluído o curso, foi para os
Estados Unidos e para Cuba. Ali
iniciou a sua fase poética eivada
dos princípios surrealistas, mani-
festando grande desprezo pelo
“modus vivendi” dos Estados
Unidos. Expressou esse seu horror,
sobretudo pela brutalidade da civi-
lização mecanizada, nas chocantes
imagens da obra Poeta em Nova
Iorque, publicado em 1940.
Regressado a Espanha, criou um
grupo de teatro chamado“La Barra-
ca”. Não ocultava suas ideias so-
cialistas, pelo que foi um dos alvos
mais visados pelo conservadorismo
espanhol da altura, que ensaiava a
tomada do poder, dando início a
uma das mais sangrentas guerras
fratricidas do século XX.
Intimidado a depor em tribunal,
Federico García Lorca deslocou-se
para Granada, na esperança de en-
contrar um refúgio na casa paterna.
Ali, porém, foi preso por ordem de
um deputado, sob o argumento
(que se tornou célebre) de que seria
“mais perigoso com a caneta do
que outros com o revólver”.
Assim, no dia 19 de agosto de 1936,
sem julgamento, o grande poeta
foi executado com um tiro na nuca
pelos nacionalistas, e o seu corpo
foi lançado num local ermo da
Serra Nevada.
Com este assassinato, calava-se
para sempre uma das mais ilustres
canetas espanholas. Todavia, a sua
Poesia nascia para a eternidade, já
que o crime teve repercussão em
todo o mundo, despertando por
todas as partes um sentimento de
que o que ocorria em Espanha dizia
respeito a todo o planeta. E isso terá
sido, também, um prenúncio da
Segunda Guerra Mundial, que três
anos depois teve início
Tal como a obra de muitos outros
artistas republicanos espanhóis –
entre as quais a famosa“Guernica”,
de Pablo Picasso –, durante o longo
regime ditatorial do Generalíssimo
Franco, a obra dramática e poética
de García Lorca foi remetida, em
Espanha, para as catacumbas da
“clandestinidade”.
Com o fim do regime, porém, e o
regresso do país vizinho à demo-
cracia, finalmente a sua terra natal
rendeu-lhe homenagens, sendo
hoje considerado o maior autor es-
panhol desde Miguel de Cervantes.
Lorca foi o mais notável poe-
ta numa constelação de vates
surgidos durante a Guerra Civil,
conhecida como“Geração de 27”.
Foi ainda um excelente pintor,
compositor precoce e pianista. A
sua música reflete o ritmo e sono-
ridade de sua obra poética. E como
dramaturgo, Lorca fez incursões no
drama histórico e na farsa antes de
obter grande sucesso com peças
trágicas. As três tragédias rurais
passadas na Andaluzia – Bodas
de Sangue (1933), Yerma (1934) e
A Casa de Bernarda Alba (1936) –
asseguraram-lhe uma posição de
relevo entre os mais importantes
dramaturgos do século passado.
Lorca era defensor da República
e um empenhado ativista. Em
1934, chegou mesmo a declarar:
“Sempre estarei ao lado dos que
não têm nada”. Assinava com fre-
quência manifestos antifascistas e
mantinha vínculos com organiza-
ções humanitárias internacionais.
Durante a sua curta existência,
García Lorca deixou importantes
obras-primas da literatura, muitas
delas publicadas postumamente,
dentre as quais destacamos as
seguintes:
– Poesia: Livro de Poemas - 1921;
Ode a Salvador Dalí - 1926; Can-
ciones (1921-24) - 1927; Roman-
cero Gitano (1924-27) - 1928; Poe-
ma del cante jondo (1921-22) -
1931; Ode a Walt Whitman - 1933;
Canto a Ignacio Sánchez Mejías -
1935; Seis poemas galegos - 1935;
Primeiras canções (1922) - 1936;
Poeta em Nueva York (1929-30)
- 1940; Divã do Tamarit - 1940; e
Sonetos del Amor Oscuro - 1936;
– Prosa: Impressões e Paisagens
- 1918; Desenhos (publicados em
Madrid) - 1949; Cartas aos Amigos
- 1950;
– Teatro: Assim que passarem
cinco anos - Lenda do tempo -
1931;
Retábulo de Don Cristóvão e
D. Rosita - 1931; Amores de Dom
Perlimplim e Belisa em seu jardim”
- 1926; Mariana Piñeda - 1925;
Dona Rosinha, a solteira - 1927;
Bodas de Sangue (Trilogia) - 1933;
Yerma (Trilogia) - 1934; A Casa de
Bernarda Alba (Trilogia) - 1936;
Quimera - 1930; El publico - 1933;
O sortilégio da mariposa - 1918;
A sapateira prodigiosa - 1930;
Pequeno retábulo de Dom Cristó-
vão - 1931.
Atualmente, Espanha conta com
uma “Casa-Museu Federico García
Lorca”, instalada na Veiga de São
Vicente, moradia de veraneio
da família do poeta entre 1926
e 1936, pouco depois do poeta
ter sido executado pelas tropas
franquistas no início da Guerra
Civil. Esta Casa foi aberta ao pú-
blico como Museu em 1995, após
ter sido adquirida pelo governo
municipal de Granada em 1985.
Situa-se no centro do parque
Federico García Lorca e nela é
possível ver muitos objetos (mó-
veis) relacionados com o poeta,
bem como alguns documentos e
manuscritos que lhe estão dire-
tamente associados. A finalizar,
e como curiosidade, diga-se que
foi nesta Casa (agora Museu) que
García Lorca terá escrito a trilogia
“Bodas de Sangue”. ◗
V. Blanco de Vasconcellos
Tenho medo de perder a maravilha
de teus olhos de estátua e aquele acento
que de noite me imprime em plena face
de teu alento a solitária rosa.
Tenho pena de ser nesta ribeira
tronco sem ramos; e o que mais eu sinto
é não ter a flor, polpa, ou argila
para o verme do meu sofrimento.
Se és o tesouro que oculto tenho,
se és minha cruz e minha dor molhada,
se de teu senhorio sou o cão,
não me deixes perder o que ganhei
e as águas decora de teu rio
com as folhas do meu outono esquivo.
Federico García Lorca
(In ‘Poemas Esparsos’) - Trad. de V.B.V.
Tenho medo
de Perder
a Maravilha
VI Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura
Ah, há quanto tempo lá não vou,
disse eu de mim para mim. Desde
os dezanove anos. Vivi um dia na
Rússia, sentia-a minha, tinha liber-
dade plena para viajar por onde
me apetecesse, e não era grande
dificuldade fazer umas trezentas
verstás1
. Mas nunca ia, adiava
sempre. E tinham passado anos e
anos, décadas. Mas eis que já não
é possível adiar mais: é agora, ou
nunca. É preciso aproveitar a única
e última oportunidade, tanto mais
que a hora é tardia e não encon-
trarei ninguém.
E eu fui pela ponte sobre o rio,
vendo, ao longe, tudo em redor à
luz do luar da noite de Julho.
A ponte era tão familiar, a mesma
de outrora, tal como se ontem a
tivesse visto: tosca e vetusta, ar-
queada, e como se nem fosse feita
de pedra, mas de uma indestruti-
bilidade petrificada pelo tempo até
à eternidade, – quando eu andava
no liceu, pensava que ela existia já
nos tempos de Bati2
. Do passado
ancestral da cidade, porém, falam
só alguns vestígios das muralhas
na encosta abaixo da igreja e esta
ponte. Tudo o resto é simples-
mente velho, provinciano, e não
mais do que isso. Só uma coisa era
estranha, uma coisa indicava, no
entanto, que algo havia mudado
à face da terra desde o tempo
em que eu era rapazinho, depois
adolescente: dantes o rio não
era navegável, e agora, decerto,
aprofundaram-no, dragaram-no; a
lua ficava à minha esquerda, bem
longe acima do rio, e à sua luz va-
cilante, no brilho trémulo da água,
alvejava um vapor de rodas, que
parecia vazio – de tão silencio-
so – embora todas as janelas de
vigia estivessem iluminadas, quais
olhos doirados imóveis, e tudo se
reflectisse na água em rastos de
luz, como colunas doiradas em
que o vapor parecia assentar. Era
assim também em Iaroslav, e no
Canal do Suez, e no Nilo. Em Paris
as noites são húmidas e escuras,
roseia no céu impenetrável um
brilho nebuloso, e o Sena corre
sob as pontes como alcatrão ne-
gro, mas delas estão suspensas se-
melhantes colunas de rastos de luz
do reflexo dos candeeiros, só que
estas são tricolores: branco, azul
e vermelho – bandeiras nacionais
russas. Aqui não há candeeiros na
ponte, e ela é seca e poeirenta. E
adiante, no outeiro, anoitecem os
jardins da cidade, acima deles so-
bressai a torre de vigia. Meu Deus,
que inefável felicidade aquela! Foi
durante o incêndio nocturno que
eu beijei a tua mão pela primei-
ra vez e tu estreitaste a minha
em resposta – nunca esquecerei
esse teu secreto consentimento.
A rua inteira negrejava de gente
no clarão descomunal e sinistro.
Eu estava em vossa casa quan-
do, de repente, tocou a rebate e
todos correram para as janelas,
e depois para a cancela. Ardia ao
longe, para lá do rio, mas com
um calor, uma voracidade e uma
prontidão terríveis. Elevavam-se,
densas, espessas nuvens de fumo
num velo negro-rúbido, alto se
soltavam delas panos de andri-
nópola3
de chamas, que, perto de
nós, reverberavam, tremendo, em
reflexos acobreados na cúpula do
Arcanjo São Miguel. E no meio da
multidão compacta, do burburi-
nho ora alarmado, ora lamentoso,
ora de regozijo do tropel da gente
simples que acorria de todos os
lados, eu sentia o cheiro dos teus
cabelos virginais, do teu pescoço,
do teu vestido de linho – e eis que
subitamente me atrevi, tomei, com
o coração a parar-me no peito, a
tua mão...
Depois da ponte subi a encosta e
dirigi-me para a cidade pela estra-
da empedrada.
Na cidade não se via vivalma e
nem uma única luz. Tudo era
mudo e amplo, tranquilo e tris-
te – com a tristeza da noite da
estepe russa, a tristeza das cida-
des adormecidas da estepe. E só
os jardins mal se ouviam, com o
palpitar cauteloso da folhagem
sob o ritmo constante do sopro do
leve vento de Julho, que, algures
vindo dos campos, me afagava o
rosto. Eu andava – a grande lua
andava também, passeando-se
no negrume dos ramos e trans-
parecendo como um círculo
espelhado; as ruas largas ficavam
na penumbra – só nas casas do
lado direito, que a sombra não
alcançava, as paredes brancas
estavam alumiadas e as vidraças
rutilavam num brilho de luto; e
eu ia pelo passeio manchado de
sombras, – diafanamente coberto
por rendas de seda negra. Ela tinha
um vestido de noite assim, muito
elegante, comprido e gracioso.
Ficava-lhe singularmente bem ao
corpo delicado e aos jovens olhos
negros. Nele ela parecia misteriosa
e, ofensivamente, não reparara em
mim. Onde é que isto tinha sido?
Em casa de quem?
O meu propósito consistia em ir
até à rua Velha. E eu podia cortar
caminho até lá. Mas desviei-me
em direcção a estas ruas amplas
nos jardins, pois queria relancear
o liceu. E, uma vez lá chegado,
de novo me espantei: também
aqui tudo permanecera tal como
há meio século atrás; o muro de
pedra, o pátio de pedra, o grande
edifício de pedra no pátio – tudo
igualmente formal e enfadonho,
como fora outrora, no meu tempo.
Detive-me um pouco aos portões,
queria evocar em mim a mágoa e
a pena das recordações – mas não
era capaz: sim, primeiro entrava
por estes portões um aluno da pri-
meira classe com o cabelo cortado
à escovinha num boné azul novi-
nho com palmazinhas de prata na
pala e sobretudo novo com botões
de prata, depois um jovem magro
num jaquetão cinzento e janotas
calças de presilha; mas acaso
serei eu?
Hora TardiaHora Tardia
– um conto do poeta russo Ivan A.– um conto do poeta russo Ivan A. BuninBunin
POR
IVAN A. BUNIN
TRADUÇÃO DO RUSSO
POR
ANA LUÍSA GAMBOA
SÃO PETERSBURGO – RÚSSIA
“E nós tínhamo-nos sentado, e ficado assim, numa
inconcebível felicidade. Eu enlaçava-te com uma
das mãos, ouvindo o bater do teu coração, na outra
segurava a tua mão, sentindo através dela todo o teu
ser. E era já tão tarde que nem mesmo a matraca se
ouvia – deitou-se algures num banco e ficou a dor-
mitar o velho de cachimbo na boca, aquecendo-se ao
luar. Quando eu olhava para o lado direito, via quão
alta e inocente resplandecia a lua acima do pátio e
brilhava luzidio o telhado da casa, como um peixe.
Quando olhava para o lado esquerdo, via a vereda
de relva seca que se sumia sob outras ervas ainda, e,
para além delas, baixa, uma estrela verde, solitária,
que espreitava de um outro jardim, e, indiferente e
ao mesmo tempo expectante, irradiava uma luz té-
nue e dizia qualquer coisa, inaudivelmente. Porém,
pátio e estrela eu via só de relance – só uma coisa
havia no mundo: a suave penumbra e o cintilar
radioso dos teus olhos.”
CulturaCultura VIIDiário do Minho QUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013
A rua Velha pareceu-me apenas
um pouco mais estreita do que
antigamente me parecera. Tudo o
mais não tinha mudado. A calça-
da cheia de buracos, nem uma
única arvorezinha, de ambos os
lados as casas dos comerciantes
cobertas de poeira, os passeios
também cheios de buracos, tais,
que é melhor ir pelo meio da
rua, em pleno luar... E a noite era
quase tal como aquela. Só que
aquela tinha sido no fim de Agos-
to, quando toda a cidade cheira
às maçãs que se amontoam nos
mercados, e tão quente que era
um deleite andar só de kossovo-
rotka4
, cingida por um cintozinho
do Cáucaso... Lá, supostamente
no céu, será possível recordar esta
noite?
Não me decidi, no entanto, a ir
até à vossa casa. Também ela,
decerto, não mudara, e, por isso,
tanto mais terrível vê-la. Nela vive
agora gente nova, estranha. Teu
pai, tua mãe, teu irmão – todos te
sobreviveram, jovem, mas, che-
gada a sua hora, também morre-
ram. E também a mim todos me
morreram; e não só familiares,
mas também muitos, muitos, com
quem eu, em relações de amizade
ou camaradagem, começara a
vida, há muito a tinham também
eles começado, certos de que ela
não teria fim, e tudo começara,
passara e findara diante dos meus
olhos, – tão célere e diante dos
meus olhos! E eu sentei-me num
marco de pedra perto de uma das
casas dos comerciantes, inexpug-
nável por detrás das suas trancas
e portões, e pus-me a pensar em
como ela era naquele nosso tem-
po distante: os cabelos escuros
arranjados de maneira simples,
o olhar límpido, a pele do jovem
rosto levemente crestada pelo
sol, o vestido leve de verão, e por
baixo dele a candura, o vigor e a
liberdade do corpo jovem... Isto
fora o princípio do nosso amor,
tempo de felicidade ainda não por
nada ensombrada, de intimidade,
confiança, de ternura enlevada,
contentamento...
Há qualquer coisa verdadei-
ramente singular nas tépidas
e claras noites das cidades da
província no fim do verão. Que
paz, que bem-estar! Vagueia
pela alegre cidade nocturna um
velhote com uma matraca, mas
unicamente para seu bel-prazer:
não há nada para guardar, dormi
sossegada, boa gente, zela por
vós a benevolência Divina, este
alto céu resplandecente que
o velho despreocupadamente
relanceia, ao vaguear pela calçada
aquecida durante o dia, e só de
quando em quando, por diverti-
mento, fazendo soar o trino da
matraca. E eis que numa noite
assim, àquela hora tardia, quando
na cidade era só ele o único que
não dormia, tu esperaste por mim
no vosso jardim já um pouco
seco antecipando o Outono, e eu,
furtivamente, me esgueirei nele:
sem ruído empurrei a cancela de
antemão aberta por ti, sem ruído
e sem demora atravessei o pátio
a correr, e, por detrás do telheiro,
ao fundo do pátio, penetrei na
penumbra matizada do jardim,
onde ao longe levemente alveja-
va, no banco sob as macieiras, o
teu vestido, e, ao aproximar-me
célere, com um sobressalto feliz
encontrei o brilho dos teus olhos
à minha espera.
E nós tínhamo-nos sentado, e
ficado assim, numa inconcebível
felicidade. Eu enlaçava-te com
uma das mãos, ouvindo o bater
do teu coração, na outra segu-
rava a tua mão, sentindo através
dela todo o teu ser. E era já tão
tarde que nem mesmo a matraca
se ouvia – deitou-se algures num
banco e ficou a dormitar o velho de
cachimbo na boca, aquecendo-se
ao luar. Quando eu olhava para o
lado direito, via quão alta e ino-
cente resplandecia a lua acima do
pátio e brilhava luzidio o telhado
da casa, como um peixe. Quando
olhava para o lado esquerdo, via a
vereda de relva seca que se sumia
sob outras ervas ainda, e, para
além delas, baixa, uma estrela
verde, solitária, que espreitava de
um outro jardim, e, indiferente
e ao mesmo tempo expectante,
irradiava uma luz ténue e dizia
qualquer coisa, inaudivelmente.
Porém, pátio e estrela eu via só
de relance – só uma coisa havia
no mundo: a suave penumbra e o
cintilar radioso dos teus olhos.
E depois tu acompanhaste-me até
à cancela, e eu disse:
– Se houver vida para além desta
e nós nela nos encontrarmos, eu
pôr-me-ei de joelhos e beijarei os
teus pés por tudo o que me deste
na terra.
Saí para o meio da rua clara e
dirigi-me para a minha hospe-
daria. Ao virar-me, via que ainda
alvejava na cancela.
Agora, erguendo-me do mar-
co, voltei para trás pelo mesmo
caminho pelo qual tinha vindo.
Não, eu tinha, para além da rua
Velha, ainda um outro propósito
que a mim próprio me era terrível
confessar, mas cujo cumprimento
sabia ser inevitável. E eu fui – um
último olhar antes de partir, desta
vez para sempre.
A estrada era de novo familiar.
Sempre a direito, depois à esquer-
da, pelo mercado, e do merca-
do – pela rua do Mosteiro – em
direcção à saída da cidade.
O mercado é como que uma
cidade dentro da cidade. Fileiras
de vendas muito odorosas. Na
ala dos Comes e Bebes, debaixo
dos toldos acima das mesas, reina
a penumbra. Na das Ferragens
está pendurado, numa corrente
lá em cima, a meio da passa-
gem, o ícone do Salvador, de
olhos grandes, numa guarnição
enferrujada. Na da Farinha, pela
manhã, havia sempre um bando
inteiro de pombos que corriam e
debicavam pela calçada. Vais para
o liceu – quantos! E todos gor-
“Eu sabia para onde era preciso ir, fui sempre a direito pela
alameda – e, bem ao fundo, já a alguns passos do muro das
traseiras, detive-me: diante de mim, num lugar plano, no meio
das ervas secas, jazia, solitária, uma laje alongada e bem
estreita, com a cabeça para o muro.”
Ivan Alekseyevich Bunin (à esquerda) nasceu em 22 de Outubro de 1870, na Rússia, e mor-
reu em 8 de Novembro de 1953 em Paris. Foi laureado com o Prémio Nobel da Literatura
em 1933. Está sepultado no cemitério russo de Sainte-Geneviève-des-Bois (mais conhecido
por “Cimetière de Leirs”, em Essonne, França. Este conto (“Hora Tardia”) está datado de 19 de
outubro de 1938.
A autora da tradução deste conto – Ana Luísa Simões Gamboa (à direita) – é doutorada em
Química pela Univ. de Lisboa e autora de várias publicações científicas. Atualmente, é profes-
sora em S. Petersburgo, Rússia, e tem colaborado regularmente no caderno“Cultura” do Diário
do Minho (o seu último trabalho aqui publicado – em 3 de Abril do corrente ano – incidiu
sobre a exposição “Sem Barreiras - Arte Russa 1985-2000: Que farei com esta liberdade?”).
VIII Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura
dos, de papos irisados – debicam
e correm, com graça feminina,
ziguezagueando aos poucochi-
nhos, balançando-se, meneando
uniformemente as cabecinhas,
como se não reparassem em ti:
levantam vôo, com um assobio de
asas, só quando por pouco não
pisas um deles. E à noite, aqui,
corriam apressadas grandes rata-
zanas, abjectas e horríveis, rápida
e alvoroçadamente.
A rua do Mosteiro é, ao mesmo
tempo, clareira nos campos e
estrada: para uns, da cidade para
casa, para a aldeia, para outros
– para a cidade dos mortos. Em
Paris, durante dois dias e duas
noites, distingue-se dos demais
o prédio número tal na rua tal
pela falsa aparência de peste da
entrada, a sua cortina drapeada
fúnebre com prata, dois dias e
duas noites na entrada jaz uma
folha de papel tarjada de luto na
cobertura fúnebre da mesinha –
nela assinam, expressando as suas
condolências, os visitantes cor-
teses; depois, num derradeiro mo-
mento, detem-se à entrada, enor-
me, com um baldaquim fúnebre,
uma carruagem de madeira negra
de azeviche como um caixão da
peste, as abas arrendondadas do
baldaquim dão testemunho dos
céus em grandes estrelas brancas,
e os cantos do tecto são coroados
de penachos negros encaraco-
lados nas pontas – plumas de
avestruz do reino dos mortos;
à carruagem estão atrelados
monstros alentados cobertos por
xairéis negros como carvão, com
chifres e com os anéis brancos
das órbitas; na boleia, infinita-
mente alta, está sentado, à espera
do féretro, um velho borrachão,
também simbolicamente ataviado
numa grotesca farda fúnebre e
semelhante chapéu de três bicos,
intimamente, por certo, sempre
dando risadinhas ao escutar as
palavras solenes: “Requiem ae-
ternam dona eis, Domine, et lux
perpetua luceat eis”5
. – Aqui tudo
é diferente. Sopra dos campos a
brisa pela rua do Mosteiro, e, em
toalhas6
, levam-lhe ao encontro o
caixão aberto, balouça-se o rosto
branco de arroz com a coroa
multicolor na fronte7
, acima das
proeminentes pálpebras fechadas.
Assim a levaram também a ela.
À saída, à esquerda da rodovia,
fica o mosteiro do tempo do czar
Alexei Mikhailovitch8
, com portões
de fortaleza sempre fechados e
muros de fortaleza, para lá dos
quais brilham os bolbos doirados
da igreja. Mais adiante, inteira-
mente no campo, fica um quadra-
do muito amplo de outros muros,
mas não muito altos: neles se
encerra todo um pequeno bosque,
dividido por longas alamedas
que se intersectam, ao longo das
quais, sob velhos ulmeiros, tílias
e bétulas, tudo está semeado de
variegadas cruzes e lápides. Aqui
os portões estavam abertos de
par em par, e eu vi a alameda
principal, recta e interminável.
Eu, timidamente, tirei o chapéu e
entrei. Quão tarde e quão mudo!
A lua ficava já baixa para além das
árvores, mas tudo em volta, tanto
quanto a vista podia alcançar,
se via ainda claramente. Toda a
extensão deste pequeno bosque
de mortos, com as suas cruzes e
lápides, se recortava na sombra
transparente. O vento cessou pela
hora da alvorada – as manchas
claras e escuras, todas matizadas
sob as árvores, dormiam. Longe
do bosquete, para além da igre-
ja do cemitério, algo perpassou
subitamente e, com uma veloci-
dade louca, em novelos escuros
rolou sobre mim – eu, fora de
mim, saltei bruscamente para o
lado, a cabeça toda logo gelou e
contraiu-se, o coração disparou e
emudeceu... O que foi isto? Pas-
sou como um relâmpago e desa-
pareceu. Mas o coração no peito
permaneceu parado. E assim, com
um coração que não bate, carre-
gando-o em mim como um cáli-
ce pesado, continuei para diante.
Eu sabia para onde era preciso ir,
fui sempre a direito pela alameda –
e, bem ao fundo, já a alguns passos
do muro das traseiras, detive-me:
diante de mim, num lugar plano,
no meio das ervas secas, jazia,
solitária, uma laje alongada e bem
estreita, com a cabeça para o muro.
E, do outro lado do muro, como
uma deslumbrante pedra preciosa,
espreitava uma estrela verde, baixa,
radiosa, como aquela, de outrora,
mas muda, e imóvel. ◗
Notas da tradutora:
1
Antiga medida russa (1 verstá é igual
a cerca de 1,06 km)
2
Bati Khan (ou Batu Khan) (1208-1255),
neto de Genghis Khan, fundou a Horda
de Ouro (1236-1502), que dominou a
Antiga Rússia cerca de 250 anos.
3
Tecido vermelho de algodão.
4
Camisa russa com gola abotoada
ao lado.
5
“Dai-lhes eterno descanso, Senhor, e
que a luz eterna os ilumine.”
6
Antigamente, o féretro era colocado
sobre três faixas de tecido – toalhas –
e levado até ao cemitério em ombros
por seis homens, cada um segurando
uma das extremidades das toalhas.
7
De acordo com a tradição da Igreja
Ortodoxa, na testa do morto é colo-
cada uma coroa (uma faixa de papel
ou tecido) onde estão representados
ícones e o texto de um cântico.
8
Alexei Mikhailovitch (1629-1676), czar
da Rússia (1645-1676), segundo Czar
da dinastia dos Romanov e pai de
Pedro I, o Grande.
S. Petersburgo, Abril de 2013
Ko-haru 2
O amor tem destas coisas:
por vezes acaba. A alma de
Ko-haru dissolve-se por en-
tre as emanações de fumo
perfumado do crematório de
Kasugano.
Pobre Ko-haru! Caída na flor
da juventude, tísica do pul-
mão esquerdo. Doce Ko-haru!
quantas e quantas vezes este
velho de bengala velou con-
tigo as noites sombrias do
hospital branco.
– Mestre, não se apoquente,
deixe-me só – pedias-me,
fintando a tosse que rompia
os teus lábios finos. Mas como
podia deixar-te eu?… agora
que os ardores do corpo já não
me acompanham, restam-me
os ímpetos da alma, e essa
ainda está bem viva e lateja por
ti, leve borboleta.
Agora que és Mariposa diáfana
de ar puro, recordo a candura de
tua mão enquanto a segurava na
maca que te levaria para o hospício
dos ocidentais. Recordava o teu rir,
os teus dentinhos alvos, o teu tique
de poetisa aluada, minha pobre
rapariga de rua. Sempre desconfiei
que sabias. Afinal, meus olhos de
velho que te admiravam no sepul-
cro adiado eram de amante e não
de amigo. Amante já sem o vigor
do corpo, mas creio que não te
importavas. Afinal estavas sozinha,
rodeada de vómitos de dispépti-
cos, tosse e escarro de tísicos, e,
no meio da loucura, estava eu, o
estranho velho ocidental barbudo
que te acarinhava, que te elevava
por entre os nenúfares dos jardins
das cerejeiras.
– Vive, meu amor… – dizia para
mim próprio e minha mente va-
gueava pelos opiários das geishas
da minha destravada juventude na
marinha.
Comopossuir-teàsportasdamorte?
Serápecadopensarnaluxúriajásem
carne?
Doce Ko-haru, enquanto teu corpo
se desfaz impotente, eu tento erigir
um altar lascivo sem um físico que
me acompanhe.
Amo-te…intensamente…semmedida
nem tempo… imerso nos templos
budistas da eternidade solitária.
Seráloucuraumkeô-jin3
amarassim,
sofregamente, uma moribunda?
Amarrei-me ainda à esperança de te
ver erguer, deixando cair o lençol de
linho do hospício, parecias vender
saúde e acorrentei-me à ideia de
que recuperarias, de que a maldita
tuberculose cederia caminho à tua
vontade, à tua alegria, à tua formo-
sura,lindaKo-haru!mas,paragrande
tristeza minha, afinal o que sempre
temera acabara de acontecer… ◗
1
Cidade no Japão onde Wenceslau de
Moraes passou a velhice
2
Pequena primavera
3
Selvagem barbudo
Mário Escoto
Tokushima, 1919Tokushima, 1919
1
Fixando o meu olhar no teu
Eu dou-me conta, bom Jesus,
Que amor assim não pode haver
Quando me olhas cravado nessa cruz.
Que vês em mim,
Humilde criatura pecadora?
Nesse Teu olhar só há amor!
Pois sei que Tu me amas… E mesmo assim
Não Te esqueceste de mim na tua dor!
Quero dizer-Te, nesta hora,
Que sinto o Teu amor até ao fim.
E sendo o que sou, tão pequenina,
Decidiste pousar o Teu olhar em mim...
Ó olhar bondoso e penetrante
Que deixas meu olhar enternecido:
Não o desvies de mim um só instante,
Deixa ficar o Teu olhar comigo!
Ajuda-me a levar a minha cruz
Fixando sempre em mim o Teu olhar,
E, quando eu não puder, ó bom Jesus,
Ajuda-me a minha cruz a carregar!
Quando ao Céu subires Glorioso,
Guardarei o Teu olhar no coração:
Cantar-Te-ei, ó meu Jesus bondoso,
O Aleluia da Ressurreição!
Emília Fechas (Inédito. Quaresma de 2013)
Contemplação

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  • 1. Cultura QUARTA-FEIRA • 5 DE JUNHO DE 2013 Diário do Minho Este suplemento faz parte da edição n.º 29971 de 5 de junho de 2013, do jornal Diário do Minho, não podendo ser vendido separadamente > “Gato desconfiado...” – Bragança, agosto de 2012 [Foto de Sofia Barbosa]
  • 2. II Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura Envio de trabalhos para publicação neste suplementoDiário do Minho CulturaCultura Diário do Minho / Secção Cultural Rua de S.ta Margarida, 4 - 4710-306 Braga; Fax: 253609469. E-mail: cultura@diariodominho.pt 5.Junho. 2013 N.º 701 O pressuposto essencial da vida em sociedade é o da mútua de- pendência, a qual, sem embargo dos eventuais aspectos negativos, possibilita e condiciona o desen- volvimento das virtualidades de cada um; mesmo quando se tra- duzem na crítica, mais ou menos agressiva, dos valores em cujo ho- rizonte a pessoa veio à luz da vida, dos afectos e da razão. Com efeito, é no modo como recebemos, as- similamos e aperfeiçoamos essas influências que nos assemelhamos e distinguimos uns dos outros. Daí resulta que, conforme se ascende na escala humana, mais subtis sejam as formas de comunicação; razão pela qual se fala em con- genialidade a propósito das afini- dades entre homens superiores; as quais, no limite, escapam aos métodos positivos da análise. Isso me dispensa de tentar de- monstrar algumas aproximações, que não estou à altura de esclare- cer, em especial quando se trata de movimentos espirituais, cuja verdadeira razão de ser apenas posso inferir de textos e teste- munhos, susceptíveis no entanto de diferente exegese. Assim, por exemplo, se está documentada a relação de amizade que Mário Saa manteve com Teófilo Braga nos últimos anos da vida do profes- sor, já afastado das lides públicas, nada posso alegar de semelhante quanto a Bruno; ainda que, tanto por via do velho professor, como de Fernando Pessoa e até de José Leite de Vasconcelos, possa presumir que conheceria bem a invulgar personalidade do autor de O Encoberto. Cada vez mais desligado da vida partidária e política, a sua atenção polarizara- -se na decifração dos enigmas da nossa história próxima e remota, sobretudo desde que, em 1909, passou a dirigir a Biblioteca Públi- ca e o Museu Municipal do Porto, pelo que não poderia deixar de despertar a curiosidade do autor da Erridânia. O que se me afigura evidente é que, descontadas as diferenças de estilo, tanto pessoal como de geração literária e mental, as teses enfeixadas no volume A Invasão dos Judeus recebem inesperada luz, assim como ilustram, as do inacabado Plano de um Livro a Fazer, que Álvaro Ribeiro aproxima da Historia de los Heterodoxos Españoles, de Menéndez Pelayo, e nós da História Secreta de Portu- gal, de António Telmo. O judaísmo fora objecto da persistente inda- gação de Bruno, atento ao que ele representou na história universal e sobretudo na de Portugal, apesar de pouco sabermos do que nesse interesse influiu, durante o exílio de 1891 a 1893, a estadia em Paris e a passagem por Amesterdão, em cuja comunidade sefardita, ainda não esquecida das raízes portu- guesas, teria colhido importantes revelações. A verdade é que, tal como n’O Encoberto se afastara de algumas noções correntes acerca do messianismo, assim também n’Os Cavaleiros do Amor se propu- nha desvendar uma história secre- ta, não apenas de Portugal; tarefa que a morte, no entanto, deixou interrompida, como em suspenso ficara entretanto a Teoria Nova da Antiguidade, de que conhecemos apenas os primeiros lineamentos. A reflexão sobre o tempo e a historicidade, mormente os temas atinentes à génese e fenomeno- logia das revoluções, fossem as súbitas e sangrentas ou as de largo fôlego e quase imperceptíveis, tinha primacial importância para quem considerava o movimen- to a essência da realidade. Mas compreende-se que, ao postular a queda no homogéneo, em con- sequência da qual se destacara o mundo, onde reina o mal e o erro, prestasse especial atenção à agência dos factores subtis, dos movimentos ocultos e das socie- dades secretas, num devir de sua natureza misterioso. Na série dos volumes que tencionava publicar, o último intitular-se-ia, em sime- tria com o primeiro, a Síntese da Crença Cristã; infelizmente, po- rém, nem mesmo os amigos mais próximos, como Teixeira Rego, ou- saram suprir a enorme perda que, nessa como em outras vertentes, a morte do filósofo significou. Por isso continua a valer como derradeira expressão do seu pensamento o artigo que, pouco antes de ser internado na Ordem do Terço, onde faleceria, entregou para publicação n’A Águia, com a indicação expressa de que seria o último… No tom de tantos outros textos eruditos, nele deixou uma mensagem a que por certo atri- buía grande importância, mas que, como era hábito num escritor que amiúde ocultava o essencial sob a capa do banal, deixou ao nosso cuidado decifrar, com a quota- parte de responsabilidade que isso implica. O título, “O ‘Judeu’”, reme- te ostensivamente para o contro- verso autor das peças do teatro de fantoches que, aliás sem provas concludentes, como mostrou Claude-Henri Frèches (Bulletin d’Histoire du Théatre Portugais, n.º 1, Lisboa, 1950, pp. 33-61), se tem identificado com António José da Silva; mas o que está em causa, como se depreende da leitura atenta, é o modo pelo qual os judeus, ou antes, uma cama- da social de progénie hebraica, combatia os valores tradicionais, mormente nos séculos XVIII e XIX e não só em Portugal. As poucas páginas de um arti- go redigido quando a doença o constrangera ao último recurso, a que sempre se furtara, apenas lhe permitiram chamar a atenção, com a objectividade que era seu timbre, para o modo como, a partir das instituições da sociedade onde se acolhia e prosperava, um de- terminado estrato lhe minava as crenças e os valores. Que Bruno achasse importante deixar esta última mensagem, na sequência do Plano que vinha publicando desde os fins do ano anterior, a um ritmo cada vez mais espaçado, dá que pensar. Tanto mais que ti- nha já redigidos e mais ou menos prontos para o prelo outros vinte e quatro textos, que ficaram inéditos por muitos anos. Homem de génio foi como Álva- ro Ribeiro qualificou o autor de A Ideia de Deus, livro onde leu o que Bruno entendia por tal e, por isso, com a perfeita noção do que significava. Por isso, tal como em outros passos da vida arrepiara ca- minho, corrigindo o erro cometido quando, da primeira vez, no “casi- no”, resistiu à voz que lhe indicava o número da sorte, é de presumir que agora também se decidira a abrir um pouco mais o jogo. Com efeito, o último texto oferece uma chave para ler o Plano de um Livro Uma herançaUma herança inconscienteinconsciente POR JOAQUIM DOMINGUES PROFESSOR DE FILOSOFIA O escritor e filósofo José Pereira de Sampaio (1857 - 1915), de pseudónimo Sampaio Bruno
  • 3. CulturaCultura IIIDiário do Minho QUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013 a Fazer, que talvez não estivesse na sua mente quando o iniciou. Não sendo um pensador apolíneo, como observa José Marinho, mas inspira-do pelas constelações invisíveis, fizera ele de Bruno um nome de combate pela luz, não pelo ocultismo; de modo que o livro de que traçou o Plano se intitularia, bem a propósito, Os Cavaleiros do Amor ou a Religião da Razão. Compreende-se a pre- ferência editorial pela primeira parte do título, tal como saiu no volume de Guimarães Editores, mas importa prestar igual aten- ção à segunda parte, que evoca aliás a Defesa do Racionalismo ou Análise da Fé, de Amorim Viana, e de algum modo antecipa A Razão Animada, de Álvaro Ribeiro. Numa linhagem consentânea ao amplo racionalismo da nossa tradição que, sem excessos nem exclusivis- mos, sempre buscou ver claro, na senda de um iluminismo integral, que não o de restrita feição físico- matemática. Seria isso, porventura, o que Bruno pretendia distinguir, ao mostrar a feição corrosiva dessoutra linha- gem que, impondo-se já então nos meios prestigiosos da Cidade Luz, tivera bem modesta géne- se, em meios como o do Bairro Alto lisboeta do século XVIII?! Um rebate me levou a aproximar o texto brunino do livro que nem sequer o cita; para mais assaz díspar no estilo e nas circunstâncias em que sur- giu, como é A Invasão dos Judeus. Admitida a hipótese, porém, tenho hoje como assente que, mesmo que nada devesse à leitura de Bru- no, o livro de Mário Saa nele poderia encontrar a perfeita epígrafe para uma das mais penetrantes tentativas de compreensão da nossa história moderna e contemporânea. Faltaria à verdade se dissesse que, por minha vez, nada lhe fiquei a dever também, pelo menos no domínio da informação que pro- digaliza e até de algumas ilações. A verdade, porém, é que chegara por mim a idêntica conclusão, ainda que interpretando de forma mais ampla e vaga o que Mário Saa explica, em termos categóri- cos, como obra judaica ou, antes, judaico-portuguesa. A distinção é importante, pois tem a ver com a tese de que os homens de nação acabaram por se fundir na so- ciedade onde se acolheram, mas como um elemento heterogéneo que, em vez de ser o fermento renovador, corrompeu o corpo social de que se assenhoreou. No seu característico jeito polémi- co, julgo no entanto que demons- trou demais, visto o ascendente da comunidade judaica não poder explicar, por si só, a decadência da nobreza e do clero, que abriu via à subversão da escala dos valores sociais. Em todo o caso, julgo fecunda e pertinente, desde que corrigidos alguns exageros retóricos (para já não falar nas gralhas), uma abordagem que permite compreender o que, de outro modo, se não entende; em especial uma sanha destruidora da herança cultural e da estrutura social, que só por equívoco se atribuiu ao povo, de sua natureza conservador, ainda que fácil de iludir pelos demagogos. Se admi- tirmos, porém, que houve uma mudança dos detentores do poder, não só isso resulta lógico, como a notória desafeição do povo aos seus dirigentes e a consequente crise da identidade nacional. A pulsão auto-destruidora, suicida, como diria D. Miguel de Unamuno, ganha foros de compreensível, apesar da sua insanidade, se ad- mitirmos que a vida colectiva – do ponto de vista mental, económico e político – passou a ser dirigida por uma camada social marcada pelo ressentimento, cujas causas entretanto esqueceu ou ignora. A irracionalidade, já apontada por Basílio Teles, de muitas das deci- sões tomadas pelos dirigentes em certos momentos decisivos, resul- taria, nesse caso, duma tão irrepri- mível como inconsciente atitude de retaliação contra os que teriam oprimido os seus antepassados. Com efeito, Mário Saa insiste na ideia de que nem os protagonistas teriam consciência das razões do seu procedimento, até porque se trataria de pessoas de todo des- prendidas já da tradição religiosa e da pertença étnica. Passado quase um século sobre o diagnóstico e ultrapassados os aspectos mais datados da argumen- tação, justo será reconhecer que o essencial da tese se mantém válido, se não foi mesmo reforçado pelo que nem o autor podia prever. Ele, que refere o sintomático projecto republicano de construir em Angola um estado judaico, não imaginaria talvez que passados cinquenta anos todos os territórios portugueses de além-mar, à excepção dos arqui- pélagos dos Açores e da Madeira, seriam alienados sem especial sobressalto da consciência política, aliviada por se libertar de um fardo incómodo e sobretudo incompre- ensível para os seus critérios. O que por certo não estranharia seria que, sucedendo-se os governos e os titulares dos órgãos políticos, económicos e culturais, tenha no entanto permanecido a directriz do combate aos valores cristãos; os quais o povo continua a prezar, não obstante o permanente desgaste a que são submetidos pelos meios de condicionamento social. O que distingue um povo é preci- samente a fidelidade a um sistema de valores, que ora é potenciado ora reprimido por quem domina as instituições, formais e informais, onde se concentram os meios de acção e de reacção social. É inegá- vel que a relação dos portugueses com essas instituições e os seus detentores se alterou radicalmente nos dois últimos séculos. Não foi o povo que mudou, por certo. ◗ Braga, 2013 “O que distingue um povo é precisamente a fidelida- de a um sistema de valores, que ora é potenciado ora reprimido por quem domina as instituições, formais e informais, onde se concentram os meios de acção e de reacção social. É inegável que a relação dos portu- gueses com essas instituições e os seus detentores se alterou radicalmente nos dois últimos séculos. Não foi o povo que mudou, por certo.” Sol Dizem que o sol é importante... Porquê? Penso que descobri... O sol oferece-nos sorrisos, boa disposição e uma boa vida. No entanto, há algo que o sol não consegue oferecer: Uma mãe dedicada, carinhosa, esperta, querida, divertida... Bem: acabei por te descrever, minha querida Mãe! Os sorrisos e abraços partilhados... A felicidade sentida... Sinto-me bem ao teu lado: És o sol da minha vida! Chuva Plin, plin, plop, plop... Ouve-se o som da chuva quando há tristeza, dor, sofrimento... É um som triste, mas também pode ser agradável, porque depois de chorares tudo o que tens, recebes um abraço quente e protetor... Não gostas de me ver chora; Tu desejas partilhar o meu desgosto; Proteges-me de tudo... Não permitindo que a chuva alcance o meu rosto! Tempestade Eu não gosto, tu detestas, nós odiamos... Afinal, por que é que existem? Penso que a culpa é minha... Não faz sentido! Não há nenhuma razão! Às vezes tudo acaba mal... Acabando por surgir uma tempestade com tanta confusão... Lua As fadas existem” Sou infantil? Não... Sou alguém sortudo que tem uma fada sempre ao meu lado... mesmo de noite, Protegendo-me dos pesadelos, dando-me sonhos! É no passado, presente, futuro... Deixando tudo sereno: És a lua que me observa no escuro! O amor de uma mãe reflete-se no tempo... Sol: felicidade; Chuva: tristeza; Tempestade: discussões; Lua: serenidade... Em relação à lua, queria dizer-te: Obrigada! Em relação à tempestade, queria dizer-te: Desculpa! Em relação à chuva, queria dizer-te: Estarei sempre do teu lado. Em relação ao sol, queria dizer: Adoro-te! Poemas à Mãe! Sara Daniela Gomes Braga (15 anos)
  • 4. IV Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura Amanhã, na Faculdade de Teologia (Braga)Amanhã, na Faculdade de Teologia (Braga) HomeHomenagem ao compositornagem ao compositor Manuel FariaManuel Faria A Faculdade de Teologia (Braga), e oA Faculdade de Teologia (Braga), e o Seminário Maior vão homenagear ama-Seminário Maior vão homenagear ama- nhã, dia 6 de junho, o compositor Manuelnhã, dia 6 de junho, o compositor Manuel Faria, assinalando o 30.º aniversário daFaria, assinalando o 30.º aniversário da sua morte. Esta iniciativa tem lugar nosua morte. Esta iniciativa tem lugar no Auditório S. Tomás de Aquino, na Fa-Auditório S. Tomás de Aquino, na Fa- culdade de Teologia (Rua de Santa Mar-culdade de Teologia (Rua de Santa Mar- garida), às 21h30. A iniciativa é marcadagarida), às 21h30. A iniciativa é marcada por uma conferência proferida pelopor uma conferência proferida pelo músico Jorge Alves Barbosa, seguidamúsico Jorge Alves Barbosa, seguida de um concerto pelo grupo “Cappellade um concerto pelo grupo “Cappella Bracarensis”. A entrada é livre.Bracarensis”. A entrada é livre. O Cónego e compositor Manuel Faria nasceu em S. Miguel de Seide, V. N. de Famalicão, em 18 de novembro de 1916, e faleceu no Porto em 5 de julho de 1983 (aos 66 anos) Iniciou os estudos musicais no seu tempo de seminarista, em Bra- ga. Assimilou, desde cedo, modelos alternativos aos cânones de harmonia e composição e exibiu com êxito, nos meios académico-musicais religiosos, composições de sua autoria consi- deradas extemporâneas para a época. Em 1939, a arquidiocese de Braga enviou-o para o Pontifício Instituto de Música Sacra, em Roma. Depois da Segunda Guerra Mundial, conseguiu concluir a sua formação em órgão, canto gre- goriano e composição sacra como bolseiro do Instituto de Alta Cultura. No regresso a Portugal, Manuel Faria passou a desempenhar, nos Se- minários bracarenses, as funções de professor de música. Ainda em 1945, o compositor deu a conhecer obras de sua autoria interpretadas pelo Coro da Rádio Roma, num concerto que obteve bastante reconhecimento por parte da imprensa musical italiana. Aenormeapetênciaparaoconhecimentodenovas experiênciaseasuapassagemporParis,noregresso a Braga, tornaram-no admirador dos compositores franceses de meados do Século XX. Manuel Faria incutiu um espírito de renovação musical nas paróquias nortenhas (especialmente nas da diocese de Braga), afirmando que aquela arte,“antes de ser litúrgica, tem que ser música”. Ensaiou canto gregoriano na Sé de Braga e foi dinamizador de coros litúrgicos sem nunca ter descurado a faceta de compositor, tanto para música sacra como para música de câmara. Em 1949, o autor dos“Cânticos Litúrgicos” preparou, no Palácio de Cristal (Porto) um concerto por si dirigido, inteiramente dedicado à apresentação das suas obras, desde motetes“em estilo moder- no” até às obras consagradas a coro e orquestra de câmara. A sua música foi conhecida na Áustria, país onde esteve durante algum tempo, tendo sido gra- vada pela rádio de Viena, em 1956, a “Missa em Honra de Nossa Senhora de Fátima”. Também o maestro Frederico de Freitas levou a sua mú- sica sinfónica para Baía e Recife, no Brasil. Em 1961, Manuel Faria tornou-se bolseiro da Fun- dação Calouste Gulbenkian, estabelecendo-se novamente em Itália para aprofundar estudos na área da Composição e proceder à divulgação da sua obra. Posteriormente, foi o responsável pela criação da Semana de Música Sacra em Braga e da “Nova Revista de Música Sacra”. Em 1972, recebeu o 1.º Prémio do Concurso Nacional Carlos Seixas. No que diz respeito à música de cariz profano, salientam-se as obras compostas sobre poesia de Antero de Quental e de Fernando Pessoa. Manuel Faria escreveu ainda uma ópera em dois actos, nunca estreada, na ocasião do 9.º Cente- nário da Conquista de Coimbra aos Mouros. Em 1983, foi agraciado com o grau de Comen- dador de Santiago de Espada, vindo a falecer nesse mesmo ano. ◗ V. Blanco de Vasconcellos do meu querido Mestredo meu querido Mestre Dr. Manuel FariaDr. Manuel Faria Poeta,Poeta, Calou-se a tua lira para nósCalou-se a tua lira para nós – Essa lira que era a voz– Essa lira que era a voz D’Aquele que a tangiaD’Aquele que a tangia No silêncio da entregaNo silêncio da entrega E da oração!E da oração! Mas não morreu! Apenas se calouMas não morreu! Apenas se calou – Que à nossa alma ainda chega– Que à nossa alma ainda chega Esse canto profundo e sonhadorEsse canto profundo e sonhador De quem amou a dorDe quem amou a dor E a transformou em ritmo e melodia!E a transformou em ritmo e melodia! Era divina e terna a sinfoniaEra divina e terna a sinfonia Do teu ser!Do teu ser! Tão meiga e tão suaveTão meiga e tão suave A tua fala,A tua fala, Que a minha lira, ao recordá-la,Que a minha lira, ao recordá-la, Entoa os versos tristes da saudadeEntoa os versos tristes da saudade E da ternura...E da ternura... Poeta,Poeta, Irmão deste outro que te rezaIrmão deste outro que te reza Na tristezaNa tristeza Do derradeiro adeus da despedida:Do derradeiro adeus da despedida: A tua lira não morreuA tua lira não morreu – Apenas emudeceu– Apenas emudeceu Para cantar na eterna vidaPara cantar na eterna vida A suprema beleza do Amor...A suprema beleza do Amor... Por isso, Mestre, a minha humilde avenaPor isso, Mestre, a minha humilde avena Se ajoelhaSe ajoelha No lajedo da tua sepulturaNo lajedo da tua sepultura (E muito já se orgulha a pobre ovelha(E muito já se orgulha a pobre ovelha Na venturaNa ventura De se dobrar à voz de tal pastor!).De se dobrar à voz de tal pastor!). Ajoelha... mas não choraAjoelha... mas não chora – Que as lágrimas desfolham a Saudade– Que as lágrimas desfolham a Saudade E, essa, eu quero tê-la vida fora,E, essa, eu quero tê-la vida fora, Até poder sonhar, na minha Aurora,Até poder sonhar, na minha Aurora, Os hinos que cantaste à Eternidade!Os hinos que cantaste à Eternidade! Abílio PeixotoAbílio Peixoto InIn “No Coração da Ausência” (1984)“No Coração da Ausência” (1984) Em Memória Em Memória
  • 5. CulturaCultura VDiário do Minho QUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013 Ocorre hoje, 5 de junho, mais um aniversário da morte de um dos maiores poetas de Espanha e do mundo: Federico García Lorca. Sendo um poeta por muitosconsideradoum“revolucionário”,nemsempreasuaobratemmerecido a relevância que se lhe ajusta, sendo até bastante desconhecida entre nós.Por isso, evocamos hoje a sua memória, nomeadamente através de uma breve re- senha biográfica e a transcrição de um dos seus mais belos sonetos. O poetaO poeta FedericoFederico GarcíaGarcía LORCALORCA No 115.ºNo 115.º aniversárioaniversário do seudo seu nascimentonascimento Federico García Lorca nasceu em Fuente Vaqueros, Província de Granada, no dia 5 de junho de 1898 — e foi assassinado às portas da cidade de Granada no dia 19 de agosto de 1936. Considerado um dos maiores poe- tas de Espanha (e do mundo), foi também um dramaturgo de enor- me talento – e, por que não dizê- -lo desde já?, uma das primeiras vítimas da Guerra Civil Espanhola, devido ao seus alinhamentos políti- cos com os republicanos. Nascido de família abastada numa pequena localidade da Andaluzia, García Lorca ingressou na faculda- de de Direito de Granada em 1914, e cinco anos depois transferiu-se para Madrid, onde ficou amigo de artistas como Luis Buñuel e Sal- vador Dali, ali publicando os seus primeiros poemas. Grande parte dos seus trabalhos iniciais remetem para temas relativos à Andaluzia (Impressões e Paisagens, 1918), bem como para a música e para o folclore regionais (Poemas do Canto Fundo, 1921-1922). Os ciganos surgem também como um dos seus temas preferidos, como o demonstra o volume Romancero Gitano, que publicou em 1928. Concluído o curso, foi para os Estados Unidos e para Cuba. Ali iniciou a sua fase poética eivada dos princípios surrealistas, mani- festando grande desprezo pelo “modus vivendi” dos Estados Unidos. Expressou esse seu horror, sobretudo pela brutalidade da civi- lização mecanizada, nas chocantes imagens da obra Poeta em Nova Iorque, publicado em 1940. Regressado a Espanha, criou um grupo de teatro chamado“La Barra- ca”. Não ocultava suas ideias so- cialistas, pelo que foi um dos alvos mais visados pelo conservadorismo espanhol da altura, que ensaiava a tomada do poder, dando início a uma das mais sangrentas guerras fratricidas do século XX. Intimidado a depor em tribunal, Federico García Lorca deslocou-se para Granada, na esperança de en- contrar um refúgio na casa paterna. Ali, porém, foi preso por ordem de um deputado, sob o argumento (que se tornou célebre) de que seria “mais perigoso com a caneta do que outros com o revólver”. Assim, no dia 19 de agosto de 1936, sem julgamento, o grande poeta foi executado com um tiro na nuca pelos nacionalistas, e o seu corpo foi lançado num local ermo da Serra Nevada. Com este assassinato, calava-se para sempre uma das mais ilustres canetas espanholas. Todavia, a sua Poesia nascia para a eternidade, já que o crime teve repercussão em todo o mundo, despertando por todas as partes um sentimento de que o que ocorria em Espanha dizia respeito a todo o planeta. E isso terá sido, também, um prenúncio da Segunda Guerra Mundial, que três anos depois teve início Tal como a obra de muitos outros artistas republicanos espanhóis – entre as quais a famosa“Guernica”, de Pablo Picasso –, durante o longo regime ditatorial do Generalíssimo Franco, a obra dramática e poética de García Lorca foi remetida, em Espanha, para as catacumbas da “clandestinidade”. Com o fim do regime, porém, e o regresso do país vizinho à demo- cracia, finalmente a sua terra natal rendeu-lhe homenagens, sendo hoje considerado o maior autor es- panhol desde Miguel de Cervantes. Lorca foi o mais notável poe- ta numa constelação de vates surgidos durante a Guerra Civil, conhecida como“Geração de 27”. Foi ainda um excelente pintor, compositor precoce e pianista. A sua música reflete o ritmo e sono- ridade de sua obra poética. E como dramaturgo, Lorca fez incursões no drama histórico e na farsa antes de obter grande sucesso com peças trágicas. As três tragédias rurais passadas na Andaluzia – Bodas de Sangue (1933), Yerma (1934) e A Casa de Bernarda Alba (1936) – asseguraram-lhe uma posição de relevo entre os mais importantes dramaturgos do século passado. Lorca era defensor da República e um empenhado ativista. Em 1934, chegou mesmo a declarar: “Sempre estarei ao lado dos que não têm nada”. Assinava com fre- quência manifestos antifascistas e mantinha vínculos com organiza- ções humanitárias internacionais. Durante a sua curta existência, García Lorca deixou importantes obras-primas da literatura, muitas delas publicadas postumamente, dentre as quais destacamos as seguintes: – Poesia: Livro de Poemas - 1921; Ode a Salvador Dalí - 1926; Can- ciones (1921-24) - 1927; Roman- cero Gitano (1924-27) - 1928; Poe- ma del cante jondo (1921-22) - 1931; Ode a Walt Whitman - 1933; Canto a Ignacio Sánchez Mejías - 1935; Seis poemas galegos - 1935; Primeiras canções (1922) - 1936; Poeta em Nueva York (1929-30) - 1940; Divã do Tamarit - 1940; e Sonetos del Amor Oscuro - 1936; – Prosa: Impressões e Paisagens - 1918; Desenhos (publicados em Madrid) - 1949; Cartas aos Amigos - 1950; – Teatro: Assim que passarem cinco anos - Lenda do tempo - 1931; Retábulo de Don Cristóvão e D. Rosita - 1931; Amores de Dom Perlimplim e Belisa em seu jardim” - 1926; Mariana Piñeda - 1925; Dona Rosinha, a solteira - 1927; Bodas de Sangue (Trilogia) - 1933; Yerma (Trilogia) - 1934; A Casa de Bernarda Alba (Trilogia) - 1936; Quimera - 1930; El publico - 1933; O sortilégio da mariposa - 1918; A sapateira prodigiosa - 1930; Pequeno retábulo de Dom Cristó- vão - 1931. Atualmente, Espanha conta com uma “Casa-Museu Federico García Lorca”, instalada na Veiga de São Vicente, moradia de veraneio da família do poeta entre 1926 e 1936, pouco depois do poeta ter sido executado pelas tropas franquistas no início da Guerra Civil. Esta Casa foi aberta ao pú- blico como Museu em 1995, após ter sido adquirida pelo governo municipal de Granada em 1985. Situa-se no centro do parque Federico García Lorca e nela é possível ver muitos objetos (mó- veis) relacionados com o poeta, bem como alguns documentos e manuscritos que lhe estão dire- tamente associados. A finalizar, e como curiosidade, diga-se que foi nesta Casa (agora Museu) que García Lorca terá escrito a trilogia “Bodas de Sangue”. ◗ V. Blanco de Vasconcellos Tenho medo de perder a maravilha de teus olhos de estátua e aquele acento que de noite me imprime em plena face de teu alento a solitária rosa. Tenho pena de ser nesta ribeira tronco sem ramos; e o que mais eu sinto é não ter a flor, polpa, ou argila para o verme do meu sofrimento. Se és o tesouro que oculto tenho, se és minha cruz e minha dor molhada, se de teu senhorio sou o cão, não me deixes perder o que ganhei e as águas decora de teu rio com as folhas do meu outono esquivo. Federico García Lorca (In ‘Poemas Esparsos’) - Trad. de V.B.V. Tenho medo de Perder a Maravilha
  • 6. VI Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura Ah, há quanto tempo lá não vou, disse eu de mim para mim. Desde os dezanove anos. Vivi um dia na Rússia, sentia-a minha, tinha liber- dade plena para viajar por onde me apetecesse, e não era grande dificuldade fazer umas trezentas verstás1 . Mas nunca ia, adiava sempre. E tinham passado anos e anos, décadas. Mas eis que já não é possível adiar mais: é agora, ou nunca. É preciso aproveitar a única e última oportunidade, tanto mais que a hora é tardia e não encon- trarei ninguém. E eu fui pela ponte sobre o rio, vendo, ao longe, tudo em redor à luz do luar da noite de Julho. A ponte era tão familiar, a mesma de outrora, tal como se ontem a tivesse visto: tosca e vetusta, ar- queada, e como se nem fosse feita de pedra, mas de uma indestruti- bilidade petrificada pelo tempo até à eternidade, – quando eu andava no liceu, pensava que ela existia já nos tempos de Bati2 . Do passado ancestral da cidade, porém, falam só alguns vestígios das muralhas na encosta abaixo da igreja e esta ponte. Tudo o resto é simples- mente velho, provinciano, e não mais do que isso. Só uma coisa era estranha, uma coisa indicava, no entanto, que algo havia mudado à face da terra desde o tempo em que eu era rapazinho, depois adolescente: dantes o rio não era navegável, e agora, decerto, aprofundaram-no, dragaram-no; a lua ficava à minha esquerda, bem longe acima do rio, e à sua luz va- cilante, no brilho trémulo da água, alvejava um vapor de rodas, que parecia vazio – de tão silencio- so – embora todas as janelas de vigia estivessem iluminadas, quais olhos doirados imóveis, e tudo se reflectisse na água em rastos de luz, como colunas doiradas em que o vapor parecia assentar. Era assim também em Iaroslav, e no Canal do Suez, e no Nilo. Em Paris as noites são húmidas e escuras, roseia no céu impenetrável um brilho nebuloso, e o Sena corre sob as pontes como alcatrão ne- gro, mas delas estão suspensas se- melhantes colunas de rastos de luz do reflexo dos candeeiros, só que estas são tricolores: branco, azul e vermelho – bandeiras nacionais russas. Aqui não há candeeiros na ponte, e ela é seca e poeirenta. E adiante, no outeiro, anoitecem os jardins da cidade, acima deles so- bressai a torre de vigia. Meu Deus, que inefável felicidade aquela! Foi durante o incêndio nocturno que eu beijei a tua mão pela primei- ra vez e tu estreitaste a minha em resposta – nunca esquecerei esse teu secreto consentimento. A rua inteira negrejava de gente no clarão descomunal e sinistro. Eu estava em vossa casa quan- do, de repente, tocou a rebate e todos correram para as janelas, e depois para a cancela. Ardia ao longe, para lá do rio, mas com um calor, uma voracidade e uma prontidão terríveis. Elevavam-se, densas, espessas nuvens de fumo num velo negro-rúbido, alto se soltavam delas panos de andri- nópola3 de chamas, que, perto de nós, reverberavam, tremendo, em reflexos acobreados na cúpula do Arcanjo São Miguel. E no meio da multidão compacta, do burburi- nho ora alarmado, ora lamentoso, ora de regozijo do tropel da gente simples que acorria de todos os lados, eu sentia o cheiro dos teus cabelos virginais, do teu pescoço, do teu vestido de linho – e eis que subitamente me atrevi, tomei, com o coração a parar-me no peito, a tua mão... Depois da ponte subi a encosta e dirigi-me para a cidade pela estra- da empedrada. Na cidade não se via vivalma e nem uma única luz. Tudo era mudo e amplo, tranquilo e tris- te – com a tristeza da noite da estepe russa, a tristeza das cida- des adormecidas da estepe. E só os jardins mal se ouviam, com o palpitar cauteloso da folhagem sob o ritmo constante do sopro do leve vento de Julho, que, algures vindo dos campos, me afagava o rosto. Eu andava – a grande lua andava também, passeando-se no negrume dos ramos e trans- parecendo como um círculo espelhado; as ruas largas ficavam na penumbra – só nas casas do lado direito, que a sombra não alcançava, as paredes brancas estavam alumiadas e as vidraças rutilavam num brilho de luto; e eu ia pelo passeio manchado de sombras, – diafanamente coberto por rendas de seda negra. Ela tinha um vestido de noite assim, muito elegante, comprido e gracioso. Ficava-lhe singularmente bem ao corpo delicado e aos jovens olhos negros. Nele ela parecia misteriosa e, ofensivamente, não reparara em mim. Onde é que isto tinha sido? Em casa de quem? O meu propósito consistia em ir até à rua Velha. E eu podia cortar caminho até lá. Mas desviei-me em direcção a estas ruas amplas nos jardins, pois queria relancear o liceu. E, uma vez lá chegado, de novo me espantei: também aqui tudo permanecera tal como há meio século atrás; o muro de pedra, o pátio de pedra, o grande edifício de pedra no pátio – tudo igualmente formal e enfadonho, como fora outrora, no meu tempo. Detive-me um pouco aos portões, queria evocar em mim a mágoa e a pena das recordações – mas não era capaz: sim, primeiro entrava por estes portões um aluno da pri- meira classe com o cabelo cortado à escovinha num boné azul novi- nho com palmazinhas de prata na pala e sobretudo novo com botões de prata, depois um jovem magro num jaquetão cinzento e janotas calças de presilha; mas acaso serei eu? Hora TardiaHora Tardia – um conto do poeta russo Ivan A.– um conto do poeta russo Ivan A. BuninBunin POR IVAN A. BUNIN TRADUÇÃO DO RUSSO POR ANA LUÍSA GAMBOA SÃO PETERSBURGO – RÚSSIA “E nós tínhamo-nos sentado, e ficado assim, numa inconcebível felicidade. Eu enlaçava-te com uma das mãos, ouvindo o bater do teu coração, na outra segurava a tua mão, sentindo através dela todo o teu ser. E era já tão tarde que nem mesmo a matraca se ouvia – deitou-se algures num banco e ficou a dor- mitar o velho de cachimbo na boca, aquecendo-se ao luar. Quando eu olhava para o lado direito, via quão alta e inocente resplandecia a lua acima do pátio e brilhava luzidio o telhado da casa, como um peixe. Quando olhava para o lado esquerdo, via a vereda de relva seca que se sumia sob outras ervas ainda, e, para além delas, baixa, uma estrela verde, solitária, que espreitava de um outro jardim, e, indiferente e ao mesmo tempo expectante, irradiava uma luz té- nue e dizia qualquer coisa, inaudivelmente. Porém, pátio e estrela eu via só de relance – só uma coisa havia no mundo: a suave penumbra e o cintilar radioso dos teus olhos.”
  • 7. CulturaCultura VIIDiário do Minho QUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013 A rua Velha pareceu-me apenas um pouco mais estreita do que antigamente me parecera. Tudo o mais não tinha mudado. A calça- da cheia de buracos, nem uma única arvorezinha, de ambos os lados as casas dos comerciantes cobertas de poeira, os passeios também cheios de buracos, tais, que é melhor ir pelo meio da rua, em pleno luar... E a noite era quase tal como aquela. Só que aquela tinha sido no fim de Agos- to, quando toda a cidade cheira às maçãs que se amontoam nos mercados, e tão quente que era um deleite andar só de kossovo- rotka4 , cingida por um cintozinho do Cáucaso... Lá, supostamente no céu, será possível recordar esta noite? Não me decidi, no entanto, a ir até à vossa casa. Também ela, decerto, não mudara, e, por isso, tanto mais terrível vê-la. Nela vive agora gente nova, estranha. Teu pai, tua mãe, teu irmão – todos te sobreviveram, jovem, mas, che- gada a sua hora, também morre- ram. E também a mim todos me morreram; e não só familiares, mas também muitos, muitos, com quem eu, em relações de amizade ou camaradagem, começara a vida, há muito a tinham também eles começado, certos de que ela não teria fim, e tudo começara, passara e findara diante dos meus olhos, – tão célere e diante dos meus olhos! E eu sentei-me num marco de pedra perto de uma das casas dos comerciantes, inexpug- nável por detrás das suas trancas e portões, e pus-me a pensar em como ela era naquele nosso tem- po distante: os cabelos escuros arranjados de maneira simples, o olhar límpido, a pele do jovem rosto levemente crestada pelo sol, o vestido leve de verão, e por baixo dele a candura, o vigor e a liberdade do corpo jovem... Isto fora o princípio do nosso amor, tempo de felicidade ainda não por nada ensombrada, de intimidade, confiança, de ternura enlevada, contentamento... Há qualquer coisa verdadei- ramente singular nas tépidas e claras noites das cidades da província no fim do verão. Que paz, que bem-estar! Vagueia pela alegre cidade nocturna um velhote com uma matraca, mas unicamente para seu bel-prazer: não há nada para guardar, dormi sossegada, boa gente, zela por vós a benevolência Divina, este alto céu resplandecente que o velho despreocupadamente relanceia, ao vaguear pela calçada aquecida durante o dia, e só de quando em quando, por diverti- mento, fazendo soar o trino da matraca. E eis que numa noite assim, àquela hora tardia, quando na cidade era só ele o único que não dormia, tu esperaste por mim no vosso jardim já um pouco seco antecipando o Outono, e eu, furtivamente, me esgueirei nele: sem ruído empurrei a cancela de antemão aberta por ti, sem ruído e sem demora atravessei o pátio a correr, e, por detrás do telheiro, ao fundo do pátio, penetrei na penumbra matizada do jardim, onde ao longe levemente alveja- va, no banco sob as macieiras, o teu vestido, e, ao aproximar-me célere, com um sobressalto feliz encontrei o brilho dos teus olhos à minha espera. E nós tínhamo-nos sentado, e ficado assim, numa inconcebível felicidade. Eu enlaçava-te com uma das mãos, ouvindo o bater do teu coração, na outra segu- rava a tua mão, sentindo através dela todo o teu ser. E era já tão tarde que nem mesmo a matraca se ouvia – deitou-se algures num banco e ficou a dormitar o velho de cachimbo na boca, aquecendo-se ao luar. Quando eu olhava para o lado direito, via quão alta e ino- cente resplandecia a lua acima do pátio e brilhava luzidio o telhado da casa, como um peixe. Quando olhava para o lado esquerdo, via a vereda de relva seca que se sumia sob outras ervas ainda, e, para além delas, baixa, uma estrela verde, solitária, que espreitava de um outro jardim, e, indiferente e ao mesmo tempo expectante, irradiava uma luz ténue e dizia qualquer coisa, inaudivelmente. Porém, pátio e estrela eu via só de relance – só uma coisa havia no mundo: a suave penumbra e o cintilar radioso dos teus olhos. E depois tu acompanhaste-me até à cancela, e eu disse: – Se houver vida para além desta e nós nela nos encontrarmos, eu pôr-me-ei de joelhos e beijarei os teus pés por tudo o que me deste na terra. Saí para o meio da rua clara e dirigi-me para a minha hospe- daria. Ao virar-me, via que ainda alvejava na cancela. Agora, erguendo-me do mar- co, voltei para trás pelo mesmo caminho pelo qual tinha vindo. Não, eu tinha, para além da rua Velha, ainda um outro propósito que a mim próprio me era terrível confessar, mas cujo cumprimento sabia ser inevitável. E eu fui – um último olhar antes de partir, desta vez para sempre. A estrada era de novo familiar. Sempre a direito, depois à esquer- da, pelo mercado, e do merca- do – pela rua do Mosteiro – em direcção à saída da cidade. O mercado é como que uma cidade dentro da cidade. Fileiras de vendas muito odorosas. Na ala dos Comes e Bebes, debaixo dos toldos acima das mesas, reina a penumbra. Na das Ferragens está pendurado, numa corrente lá em cima, a meio da passa- gem, o ícone do Salvador, de olhos grandes, numa guarnição enferrujada. Na da Farinha, pela manhã, havia sempre um bando inteiro de pombos que corriam e debicavam pela calçada. Vais para o liceu – quantos! E todos gor- “Eu sabia para onde era preciso ir, fui sempre a direito pela alameda – e, bem ao fundo, já a alguns passos do muro das traseiras, detive-me: diante de mim, num lugar plano, no meio das ervas secas, jazia, solitária, uma laje alongada e bem estreita, com a cabeça para o muro.” Ivan Alekseyevich Bunin (à esquerda) nasceu em 22 de Outubro de 1870, na Rússia, e mor- reu em 8 de Novembro de 1953 em Paris. Foi laureado com o Prémio Nobel da Literatura em 1933. Está sepultado no cemitério russo de Sainte-Geneviève-des-Bois (mais conhecido por “Cimetière de Leirs”, em Essonne, França. Este conto (“Hora Tardia”) está datado de 19 de outubro de 1938. A autora da tradução deste conto – Ana Luísa Simões Gamboa (à direita) – é doutorada em Química pela Univ. de Lisboa e autora de várias publicações científicas. Atualmente, é profes- sora em S. Petersburgo, Rússia, e tem colaborado regularmente no caderno“Cultura” do Diário do Minho (o seu último trabalho aqui publicado – em 3 de Abril do corrente ano – incidiu sobre a exposição “Sem Barreiras - Arte Russa 1985-2000: Que farei com esta liberdade?”).
  • 8. VIII Diário do MinhoQUARTA-FEIRA, 5 de junho de 2013CulturaCultura dos, de papos irisados – debicam e correm, com graça feminina, ziguezagueando aos poucochi- nhos, balançando-se, meneando uniformemente as cabecinhas, como se não reparassem em ti: levantam vôo, com um assobio de asas, só quando por pouco não pisas um deles. E à noite, aqui, corriam apressadas grandes rata- zanas, abjectas e horríveis, rápida e alvoroçadamente. A rua do Mosteiro é, ao mesmo tempo, clareira nos campos e estrada: para uns, da cidade para casa, para a aldeia, para outros – para a cidade dos mortos. Em Paris, durante dois dias e duas noites, distingue-se dos demais o prédio número tal na rua tal pela falsa aparência de peste da entrada, a sua cortina drapeada fúnebre com prata, dois dias e duas noites na entrada jaz uma folha de papel tarjada de luto na cobertura fúnebre da mesinha – nela assinam, expressando as suas condolências, os visitantes cor- teses; depois, num derradeiro mo- mento, detem-se à entrada, enor- me, com um baldaquim fúnebre, uma carruagem de madeira negra de azeviche como um caixão da peste, as abas arrendondadas do baldaquim dão testemunho dos céus em grandes estrelas brancas, e os cantos do tecto são coroados de penachos negros encaraco- lados nas pontas – plumas de avestruz do reino dos mortos; à carruagem estão atrelados monstros alentados cobertos por xairéis negros como carvão, com chifres e com os anéis brancos das órbitas; na boleia, infinita- mente alta, está sentado, à espera do féretro, um velho borrachão, também simbolicamente ataviado numa grotesca farda fúnebre e semelhante chapéu de três bicos, intimamente, por certo, sempre dando risadinhas ao escutar as palavras solenes: “Requiem ae- ternam dona eis, Domine, et lux perpetua luceat eis”5 . – Aqui tudo é diferente. Sopra dos campos a brisa pela rua do Mosteiro, e, em toalhas6 , levam-lhe ao encontro o caixão aberto, balouça-se o rosto branco de arroz com a coroa multicolor na fronte7 , acima das proeminentes pálpebras fechadas. Assim a levaram também a ela. À saída, à esquerda da rodovia, fica o mosteiro do tempo do czar Alexei Mikhailovitch8 , com portões de fortaleza sempre fechados e muros de fortaleza, para lá dos quais brilham os bolbos doirados da igreja. Mais adiante, inteira- mente no campo, fica um quadra- do muito amplo de outros muros, mas não muito altos: neles se encerra todo um pequeno bosque, dividido por longas alamedas que se intersectam, ao longo das quais, sob velhos ulmeiros, tílias e bétulas, tudo está semeado de variegadas cruzes e lápides. Aqui os portões estavam abertos de par em par, e eu vi a alameda principal, recta e interminável. Eu, timidamente, tirei o chapéu e entrei. Quão tarde e quão mudo! A lua ficava já baixa para além das árvores, mas tudo em volta, tanto quanto a vista podia alcançar, se via ainda claramente. Toda a extensão deste pequeno bosque de mortos, com as suas cruzes e lápides, se recortava na sombra transparente. O vento cessou pela hora da alvorada – as manchas claras e escuras, todas matizadas sob as árvores, dormiam. Longe do bosquete, para além da igre- ja do cemitério, algo perpassou subitamente e, com uma veloci- dade louca, em novelos escuros rolou sobre mim – eu, fora de mim, saltei bruscamente para o lado, a cabeça toda logo gelou e contraiu-se, o coração disparou e emudeceu... O que foi isto? Pas- sou como um relâmpago e desa- pareceu. Mas o coração no peito permaneceu parado. E assim, com um coração que não bate, carre- gando-o em mim como um cáli- ce pesado, continuei para diante. Eu sabia para onde era preciso ir, fui sempre a direito pela alameda – e, bem ao fundo, já a alguns passos do muro das traseiras, detive-me: diante de mim, num lugar plano, no meio das ervas secas, jazia, solitária, uma laje alongada e bem estreita, com a cabeça para o muro. E, do outro lado do muro, como uma deslumbrante pedra preciosa, espreitava uma estrela verde, baixa, radiosa, como aquela, de outrora, mas muda, e imóvel. ◗ Notas da tradutora: 1 Antiga medida russa (1 verstá é igual a cerca de 1,06 km) 2 Bati Khan (ou Batu Khan) (1208-1255), neto de Genghis Khan, fundou a Horda de Ouro (1236-1502), que dominou a Antiga Rússia cerca de 250 anos. 3 Tecido vermelho de algodão. 4 Camisa russa com gola abotoada ao lado. 5 “Dai-lhes eterno descanso, Senhor, e que a luz eterna os ilumine.” 6 Antigamente, o féretro era colocado sobre três faixas de tecido – toalhas – e levado até ao cemitério em ombros por seis homens, cada um segurando uma das extremidades das toalhas. 7 De acordo com a tradição da Igreja Ortodoxa, na testa do morto é colo- cada uma coroa (uma faixa de papel ou tecido) onde estão representados ícones e o texto de um cântico. 8 Alexei Mikhailovitch (1629-1676), czar da Rússia (1645-1676), segundo Czar da dinastia dos Romanov e pai de Pedro I, o Grande. S. Petersburgo, Abril de 2013 Ko-haru 2 O amor tem destas coisas: por vezes acaba. A alma de Ko-haru dissolve-se por en- tre as emanações de fumo perfumado do crematório de Kasugano. Pobre Ko-haru! Caída na flor da juventude, tísica do pul- mão esquerdo. Doce Ko-haru! quantas e quantas vezes este velho de bengala velou con- tigo as noites sombrias do hospital branco. – Mestre, não se apoquente, deixe-me só – pedias-me, fintando a tosse que rompia os teus lábios finos. Mas como podia deixar-te eu?… agora que os ardores do corpo já não me acompanham, restam-me os ímpetos da alma, e essa ainda está bem viva e lateja por ti, leve borboleta. Agora que és Mariposa diáfana de ar puro, recordo a candura de tua mão enquanto a segurava na maca que te levaria para o hospício dos ocidentais. Recordava o teu rir, os teus dentinhos alvos, o teu tique de poetisa aluada, minha pobre rapariga de rua. Sempre desconfiei que sabias. Afinal, meus olhos de velho que te admiravam no sepul- cro adiado eram de amante e não de amigo. Amante já sem o vigor do corpo, mas creio que não te importavas. Afinal estavas sozinha, rodeada de vómitos de dispépti- cos, tosse e escarro de tísicos, e, no meio da loucura, estava eu, o estranho velho ocidental barbudo que te acarinhava, que te elevava por entre os nenúfares dos jardins das cerejeiras. – Vive, meu amor… – dizia para mim próprio e minha mente va- gueava pelos opiários das geishas da minha destravada juventude na marinha. Comopossuir-teàsportasdamorte? Serápecadopensarnaluxúriajásem carne? Doce Ko-haru, enquanto teu corpo se desfaz impotente, eu tento erigir um altar lascivo sem um físico que me acompanhe. Amo-te…intensamente…semmedida nem tempo… imerso nos templos budistas da eternidade solitária. Seráloucuraumkeô-jin3 amarassim, sofregamente, uma moribunda? Amarrei-me ainda à esperança de te ver erguer, deixando cair o lençol de linho do hospício, parecias vender saúde e acorrentei-me à ideia de que recuperarias, de que a maldita tuberculose cederia caminho à tua vontade, à tua alegria, à tua formo- sura,lindaKo-haru!mas,paragrande tristeza minha, afinal o que sempre temera acabara de acontecer… ◗ 1 Cidade no Japão onde Wenceslau de Moraes passou a velhice 2 Pequena primavera 3 Selvagem barbudo Mário Escoto Tokushima, 1919Tokushima, 1919 1 Fixando o meu olhar no teu Eu dou-me conta, bom Jesus, Que amor assim não pode haver Quando me olhas cravado nessa cruz. Que vês em mim, Humilde criatura pecadora? Nesse Teu olhar só há amor! Pois sei que Tu me amas… E mesmo assim Não Te esqueceste de mim na tua dor! Quero dizer-Te, nesta hora, Que sinto o Teu amor até ao fim. E sendo o que sou, tão pequenina, Decidiste pousar o Teu olhar em mim... Ó olhar bondoso e penetrante Que deixas meu olhar enternecido: Não o desvies de mim um só instante, Deixa ficar o Teu olhar comigo! Ajuda-me a levar a minha cruz Fixando sempre em mim o Teu olhar, E, quando eu não puder, ó bom Jesus, Ajuda-me a minha cruz a carregar! Quando ao Céu subires Glorioso, Guardarei o Teu olhar no coração: Cantar-Te-ei, ó meu Jesus bondoso, O Aleluia da Ressurreição! Emília Fechas (Inédito. Quaresma de 2013) Contemplação