O documento discute a colaboração versus cooperação e as características da colaboração, incluindo perspectivas estratégicas como entendimento dos desafios, criação a partir das diferenças e soluções integradoras que requerem obtenção de apoio e compartilhamento de recursos.
1. Sinergia Organizacional
Colaboração vs. cooperação
Sérgio Lins
Colaboração é trabalhar em conjunto com uma ou mais pessoas e
cooperação é operar simultaneamente.[19] Ambos os conceitos implicam
objetivo comum e uma intenção explícita de contribuir, visando criar alguma
coisa nova ou diferente como resultado do esforço compartilhado. Ambos os
conceitos implicam algo mais significativo do que uma simples troca de
informação ou transmissão de instruções. Compartilhar implica participar e
tomar parte, compondo neste sentido um conceito de cooperação que implica
trabalho de co-realização.
Mesmo sabendo que o conceito de cooperação vai além do significado de
colaboração, neste livro estes termos são tratados como sinônimos. Desta
forma, colaboração engloba o trabalho coletivo simultâneo, visando alcançar
um objetivo comum cuja realização exige: respeito mútuo, atitude tolerante,
aceitação de diferenças, relações não hierárquicas e negociação constante.
Assim, não será considerada colaboração a interação em que o apoio é apenas
unilateral e tudo é feito “por obrigação”. A colaboração exige espontaneidade
para enfrentar objetivos comuns com ações conjuntas e coordenadas. A
colaboração tem suas características próprias, seu processo de
desenvolvimento, sua operacionalidade, um produto final desejado e muitas
vezes um término estabelecido.
Características da colaboração
No sentido de cooperação que é co-operação, colaborar significa cooperar
na ação. Colaborar também pode ser coordenar pontos de vista diferentes,
obtendo reciprocidade, complementaridade e respeito mútuo. Os melhores
resultados de colaboração são obtidos quando se estabelece uma escala de
valores e se mantém constante a reciprocidade na interação. Seja no sentido
de cooperar na ação ou coordenar pontos de vista, a colaboração é um
processo que tem perspectivas estratégicas, sociais, psicológicas e
operacionais que influenciam em muito a eficácia do trabalho colaborativo e o
resultado final desejado.
Perspectivas Estratégicas
A estratégia dá o rumo e serve de bússola para que a organização
mantenha a rota no seu ambiente, coordenando a concentração e canalização
de esforços, sendo além disto um meio prático para que as pessoas
compreendam o propósito da organização.[17] Desta forma, as características
estratégicas da colaboração são aquelas que consideram o desafio a ser
151
2. Colaboração Sinergística
alcançado, as soluções integradoras esperadas e principalmente a visão
unificada que dá rumo ao trabalho colaborativo.
Entendimento dos Desafios
A idéia de que existem coisas que não podem ser feitas por um só
indivíduo atravessa a história e ocorre em quase todas as profissões e regiões
do mundo.1 Além disto, as narrativas das melhores experiências pessoais
descartam a competição como uma forma de conseguir alto desempenho
coletivo. Muitos defendem com veemência o trabalho em equipe como a
melhor fórmula para o sucesso, principalmente em situações onde grandes
desafios ocorrem com elevada prioridade. Muitos reconhecem que a
realização de coisas extraordinárias exige o envolvimento e comprometimento
de muitos.[10] Assim, quando o esforço não é isolado, descarta-se a competição
em prol da cooperação e se reconhece as vantagens da sinergia obtida com o
trabalho em equipe. Para tanto se deve considerar: a criação a partir das
diferenças, a reciprocidade, continuidade da interação e o prazo da intenção.
Criação a partir das diferenças
A criação a partir das diferenças exige uma permanente atenção sobre
potenciais individuais, pontos de vista, lacunas de estilos e habilidades,
diversidade de formação e vivência. Deve-se procurar determinar como
aproveitar a sinergia a partir de habilidades, conhecimentos e pontos fortes
individuais que se complementem. Esta complementação envolve a mútua
valorização das diferenças e aprendizagem conjunta, incluindo indivíduos que
não fazem parte da equipe e podem contribuir com seus diferentes pontos de
vista.
Reciprocidade
Se num trabalho colaborativo todo o esforço vem apenas de um parceiro,
este se sentirá explorado e o outro se sentirá privilegiado. É uma sensação
falsa, pois o todo está perdendo e não existe colaboração. Para evitar isto,
devem-se estabelecer normas de reciprocidade para a colaboração. A
reciprocidade está associada a um comportamento que implica previsibilidade
e estabilidade dos relacionamentos, num circuito de feedback positivo que, ao
mesmo tempo em que a reforça, evita que a mesma se desfaça, facilitando as
negociações. Este comportamento traz a reboque a consciência de que quando
compartilhamos metas, retribuímos para alcançá-las e tornamos o trabalho em
conjunto menos estressante, mais eficaz e compensador. Por isto pode-se dizer
que o desenvolvimento de metas cooperativas não depende de altruísmo, pois
quando se compreende os ganhos decorrentes da cooperação recíproca,
reconhece-se mais facilmente a legitimidade dos interesses alheios. Talvez um
1
Ver o caso “Longas colheres” no capítulo “Comportamentos sinergísticos”
152
3. Sinergia Organizacional
das tarefas mais importantes do líder seja garantir que cada parte compreenda
os interesses da outra e esteja consciente do que ganha com a colaboração.
Continuidade da Interação
A perspectiva de continuar interagindo no futuro talvez seja um dos mais
fortes argumentos a favor da colaboração. Isto porque, quem espera ter
interações duráveis e freqüentes no futuro tende a cooperar melhor no aqui e
agora. A expectativa de interações a longo prazo incita a prática constante da
dedicação e cortesia. Alguns acreditam que as condutas do amanhã são o
reflexo das atitudes de hoje, sendo assim, elas precisam produzir sentimentos
positivos entre as pessoas desde o início.
Algo nos leva a crer que quanto mais complexos forem os interesses,
maior será a necessidade de comunicação direta para harmonizar as
diferenças. Para que esta comunicação ocorra, devem-se criar facilidades para
que os colaboradores se encontrem e conversem. Caso o encontro não possa
ser físico, que seja lógico pela Internet ou virtual através de teleconferência.2
Os encontros encorajam as interações e ajudam a quebrar barreiras entre os
indivíduos, as equipes e os setores organizacionais.
Quanto mais os colaboradores perceberem a magnitude das possibilidades
dos resultados a longo prazo, mais eles lidam com facilidade com as
vicissitudes que podem vir a ocorrer no dia-a-dia do trabalho colaborativo.
Por sua vez, a percepção desses resultados depende de uma interação que
promova o compartilhamento de uma visão inspiradora do produto final do
trabalho colaborativo.
Soluções Integradoras
Quando as pessoas deixam de ficar atentas ao proprietário da solução ou
ao originador da idéia, encarando o trabalho em conjunto como uma chance
de triunfo coletivo, diz-se que estão em busca de uma solução integradora. O
foco da solução integradora está todo sobre o que se pode ganhar com as
semelhanças explícitas e a diversidade complementar dos colaboradores,3
evitando-se referência a qualquer perda que possa advir do trabalho em
conjunto. Isto porque na prática, parece que as pessoas ficam mais dispostas a
fazer concessões quando são enfatizados os benefícios e lucros no lugar dos
esforços e custos. Para desenvolver soluções que realmente se orientem para
essa integração, temos que estar atentos à obtenção do apoio necessário e ao
compartilhamento dos recursos interdependentes; sem em nenhum momento
2
Na sociedade do conhecimento, as facilidades tecnológicas estendem as possibilidades de encontros.
Além dos encontros físicos, hoje podemos nos encontrar por teleconferência, em chats, ou de forma
assíncrona por E-mail.[11]
3
Ver mais detalhes sobre semelhanças explícitas e diversidade complementar no capítulo “Diversidade e
Complementaridade”
153
4. Colaboração Sinergística
perder de vista o ganho que se pode obter pela heterogeneidade dos
indivíduos.
Obtenção de apoio
A obtenção de apoio a uma solução integradora depende da objetividade
da proposta, que não basta ser altamente relevante, mas tem que ter elevada
concretude.4 Enquanto o projeto ainda estiver na base do “estamos pensando
fazer”, mesmo que haja uma lista enorme de benefícios em potencial, eles
serão considerados suposições e não ajudarão a conseguir apoio. Para que um
parceiro ou colaborador se sinta seguro e assuma o risco do empreendimento,
ele precisa ver uma proposta específica sobre a qual possa avaliar o risco que
correrá. Acredita-se que qualquer risco pode ser atenuado com a certeza de se
ganhar algo em troca do esforço ou da contribuição para integrar a solução.
Dentre os ganhos mais significativos está a oportunidade do aumento de
competência como resultado da mútua transferência de conhecimento e
habilidades complementares. Como este é um ganho imaterial, é muito
importante que ele seja explicitado o máximo possível. Quando isto acontece,
esse ganho intangível, bem compreendido por todos os envolvidos, pode ser
mais importante para obtenção de apoio do que qualquer outra compensação
material.
Compartilhamento
Nos treinamentos de equipe em que se usam jogos e trabalhos
vivenciais,[08] fica patente que a única forma que cada grupo tem de cumprir
sua missão é pelo compartilhamento de recursos. Cada grupo fornece
recursos a outros grupos, na confiança de que receberá em troca o que
necessitam. Não leva muito tempo para eles descobrirem que o compromisso
com a meta comum requer uma disposição para compartilhar recursos, e que o
compartilhamento aumenta a chance de realização da meta. Desta forma, ao
associar o jogo à realidade do dia-a-dia, compreendem que metas cooperativas
podem ser alcançadas com um exercício de interdependência em que se
compartilham informações, trocam-se idéias e alternam-se recursos.
Interdependência
A interdependência faz com que cada um se sinta envolvido com decisões
que afeta a todos.5 Isto não garante a aceitação de qualquer decisão, mas
suaviza o efeito da resistência a qualquer decisão importante que venha a ser
tomada. À medida que vai ocorrendo o compartilhamento de idéias e troca de
informações, as comunicações vão se tornando mais abertas, as pessoas vão
“colocando suas cartas na mesa” e criando uma abertura para que sejam
4
Ver relevância e concretude dentro do conceito de Objetividade no capítulo “Confiança Sinergística”
5
Ver mais sobre interdependência no capítulo “Ingredientes da Sinergia”
154
5. Sinergia Organizacional
debatidos os mais controvertidos temas – aqueles tópicos que mais geram
conflitos.
Heterogeneidade
O envolvimento de indivíduos de culturas diferentes na realização de um
trabalho colaborativo, é um dos grandes desafios da liderança na busca por
soluções integradoras. Em geral, quanto mais heterogênea for a cultura de um
grupo, mais tempo se leva para formar uma equipe de alto desempenho. A
homogeneidade cultural parece tornar o grupo capaz de mais rapidamente
identificar problemas e apresentar soluções nas primeiras semanas de
realização de um projeto. Contudo, essa vantagem cultural, vai desaparecendo
à medida que vai crescendo o sentimento de interdependência. Experiências,
comparando o efeito da heterogeneidade sobre o desempenho, têm
demonstrado que após 13 semanas os grupos heterogêneos igualam seu
desempenho com o dos grupos homogêneos. Após 17 semanas, já não se
percebe qualquer vantagem de desempenho decorrente da homogeneidade.[10]
Parece inclusive que a heterogeneidade traz a reboque o aumento da
capacidade de examinar os problemas sob um número maior de ângulos e
geração de uma quantidade muito maior de alternativas para solucioná-los.
Por isto, pode-se dizer que colaboradores oriundos de culturas diferentes são
difíceis de integrar, porém quando se consegue a integração percebe-se que os
esforços foram compensadores.
Trecho do livro “Sinergia Fator de Sucesso nas Realizações Humanas”
Sérgio Lins editado pela Campus-Elsevier em 2005
Referências
Livros
[08] GRAMIGNA, Maria Rita Miranda. Jogos de Empresa e Técnicas Vivenciais. São Paulo:
Makron Books, 1997.
[10] KOUZES, James M. & POSNER, Barry Z. O Desafio da Liderança. Rio de Janeiro:
Editora Campus, 1995.
[11] LINS, Sérgio. Transferindo Conhecimento Tácito: uma abordagem construtivista. Rio de
Janeiro: E-Papers Serviços Editoriais Ltda, 2003
[14] SCHRAGE, Michael. Shared Minds: The New Technologies of Collaboration. New York:
Random House, 1990.
[17] MINTZBERG, Henry & LAMPEL, Joseph & AHLSTRAND, Bruce. Todas as partes do
elefante. Coletânea HSM Management. São Paulo: Publifolha, 2002.
[19] BARROSO, Ellery Girão. Dicionário Aurélio Eletrônico. Rio de Janeiro: Lacerda &
Geiger, 1996.
155