1º Plano Decenal de Educação de Bom Jardim MA. 2003-2013
Educação sexual e direitos humanos
1. Educação sexual e direitos humanos
São especialmente necessárias medidas em dois domínios: primeiro, para
estabelecer os direitos humanos em sentido amplo que permitem os direitos
sexuais e reprodutivos e para criar as condições para o seu exercício; e, em
segundo lugar, para disponibilizar informação e serviços susceptíveis de
satisfazer a gama completa de exigências em matéria de saúde sexual e
reprodutiva.
Há que prestar mais atenção a questões ligadas aos direitos humanos num
sentido mais amplo, em especial aos que promovem a igualdade entre os
sexos e a emancipação das mulheres. As leis e os procedimentos devem ser
reformados e a atual proteção dos direitos deve ser melhor aplicada. São
necessários procedimentos para documentar as violações de direitos humanos.
Tanto as instituições governamentais como civis devem ser responsabilizadas
pela proteção dos direitos. Há que empreender a educação acerca de direitos
humanos e estabelecer alianças entre as diversas instituições preocupadas com
os direitos. A nível internacional, deve dar-se mais importância às metas de
direitos humanos nos programas de assistência.
A pobreza é o fator definidor que impede tanto os homens como as mulheres,
especialmente nos países em desenvolvimento, de exercerem os seus direitos
sexuais e reprodutivos. A ação defendida neste relatório terá um forte impacto
sobre a pobreza, mas são necessárias medidas concretas para aumentar o
acesso das mulheres ao crédito e aos recursos econômicos.
É necessária, a todos níveis, a educação, quer de caráter geral quer sobre a
saúde sexual e reprodutiva. Depois dos cuidados de saúde primários, o
investimento mais valioso que um país pode fazer é na diminuição das
disparidades entre homens e mulheres, no campo da educação. Os meninos e
os homens têm necessidades educacionais concretas, sobretudo no plano das
relações entre os sexos, para que possam ocupar o lugar que lhes cabe como
parceiros das mulheres, em pé de igualdade, na vida familiar, comunitária e
nacional. A violência doméstica e sexual não acabará, enquanto subsistir a
desigualdade entre homens e mulheres.
Os serviços de saúde precisam de ser reestruturados, a fim de satisfazerem as
necessidades dos clientes em matéria de saúde reprodutiva e sexual, inclusive
dos grupos que hoje em dia estão deficientemente servidos. Há que elaborar
diretrizes, normas de conduta e métodos de avaliação. Todas as organizações
da sociedade civil - governos, organizações não-governamentais e o setor
privado - devem participar na concepção, aplicação e fiscalização dos
2. programas. É preciso dar prioridade à saúde sexual e reprodutiva, quando da
atribuição de recursos.
Estratégia a nível de população e desenvolvimento. Em países de todo o
mundo, os enquadramentos de políticas para os programas de população e
desenvolvimento estão a ser estudados e revistos, a fim de refletirem o
consenso internacional alcançado em conferências sobre desenvolvimento,
incluindo o compromisso da Conferência Internacional sobre População e
Desenvolvimento (CIPD) sobre a saúde e direitos reprodutivos. Esse processo
deve continuar.
Igualdade e equidade entre os sexos. As conferências internacionais da década
de 1990 chamaram a atenção mundial, de uma forma sem precedentes, para o
desenvolvimento social e, em especial, para o que significa, ou deveria
significar, para as mulheres. Esta consciência deveria aumentar, à medida que
os países continuam a aplicar os acordos conseguidos nas conferências. O
sistema das Nações Unidas está a integrar as questões ligadas às disparidades
entre os sexos nos programas e procedimentos, a produzir dados diferenciados
segundo os sexos e a prestar ajuda aos esforços nacionais que visam a criar
programas de educação sensíveis ao fator cultural. Os órgãos das Nações
Unidas estão a trabalhar para que sejam retiradas as reservas nacionais à
Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as
Mulheres e para que seja adotado o seu projeto de protocolo adicional, que
acrescenta um mecanismo para a sua aplicação.
Métodos para controlar o progresso conseguido. Dentro do sistema das
Nações Unidas, o Grupo de Trabalho Inter-Organismos sobre Serviços Sociais
Básicos para Todos está a trabalhar sobre um conjunto de indicadores para
medir os diferenciais entre os sexos quanto ao nível de instrução alcançado,
acesso aos serviços de saúde básicos, acesso aos serviços de planejamento
familiar e níveis de morbidade e mortalidade (incluindo mortalidade materna).
Foram iniciados esforços tendentes a conciliar as diferentes metodologias das
organizações de direitos humanos, da comunidade de saúde pública, dos
organismos especializados das Nações Unidas e dos sistemas nacionais de
registo de dados.
Os organismos de ajuda multinacional ou bilateral estão a cooperar para criar
indicadores capazes de medir o desempenho dos programas de saúde
reprodutiva. O Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP) está a
criar indicadores que meçam as condições nacionais em termos de saúde
reprodutiva (relacionadas com planejamento familiar, saúde materna,
infecções do aparelho reprodutor e doenças sexualmente transmitidas (DST),
aborto e assistência pós-aborto, infecundidade e práticas tradicionais nocivas)
e o impacto das políticas e programas. Dados demográficos, sociais e
3. econômicos complementares proporcionarão o contexto necessário para
interpretar esses indicadores.
Os ativistas de direitos humanos, o FNUAP, o UNICEF, a Organização
Mundial de Saúde (OMS) e a Divisão das Nações Unidas para a Promoção
das Mulheres e os órgãos dos tratados sobre direitos humanos iniciaram
consultas sobre mecanismos de fiscalização dos direitos reprodutivos e
sexuais, no contexto dos mecanismos de tratados sobre direitos humanos.
Poderiam ser incorporados nos procedimentos nacionais para informar os
órgãos dos tratados os indicadores de saúde pública pertinentes.
Documentar as violações. Da mesma maneira que a fiscalização dos direitos
civis e políticos revela violações concretas como a prisão ou detenção
arbitrárias, também devem existir mecanismos para identificar e procurar
corrigir as violações dos direitos reprodutivos e sexuais, tais como os
procedimentos médicos não autorizados. Isto deveria ser ampliado a questões
ligadas às disparidades entre os sexos, tais como as diferenças quanto ao
direito sucessório e ao direito de propriedade.
Aplicando as proteções dos direitos. As atuais salvaguardas legais dos direitos
civis, económicos e sociais devem ser efectivamente postas em prática e
aplicadas com justiça. Há que dar formação aos funcionários, para que
analisem as queixas com justiça e apliquem as leis (por exemplo, leis contra a
violência doméstica, o assédio sexual e a violação) que protegem os direitos à
igualdade entre os sexos e à saúde reprodutiva e sexual. Devem ser feitos
esforços no sentido de mobilizar a preocupação da comunidade e garantir que
os responsáveis pela elaboração de políticas e as instituições civis dêem
prioridade a esses problemas.
Reforma das leis e dos procedimentos. O direito à saúde sexual e reprodutiva
precisa de ser reforçado por enquadramentos legais e institucionais. Algumas
constituições nacionais (nomeadamente do Chile, do México e da África do
Sul) garantem explicitamente os direitos reprodutivos. Muitos outros países
reformaram as leis e procedimentos relativos à família, à herança, ao acesso
ao crédito, à escolaridade, à violência doméstica e à não-discriminação. Em
alguns países, os códigos médicos de ética e as diretrizes foram revistos, de
modo a incorporarem padrões de cuidados conseqüentes com a garantia dos
direitos. A dimensão das modificações recentes revela uma intensificação da
revisão das leis e dos procedimentos nacionais, na seqüência das conferências
internacionais.
Responsabilização. Devem ser institucionalizadas medidas que visem a
responsabilizar os programas tanto pelo desempenho como pelas transgressões
de direitos. As comunidades e os prestadores de serviços deveriam incentivar
a nomeação de observadores independentes, para receber e avaliar as queixas.
4. Alianças não-governamentais. As organizações centradas nos direitos
humanos, na atribuição de poderes às mulheres, na saúde e nos direitos
reprodutivos têm andado a forjar alianças para promover as suas causas
comuns. O consenso histórico sobre direitos reprodutivos e sexuais alcançado
na CIPD e ampliado em Pequim foi conseguido com a participação ativa de
centenas de organizações internacionais, nacionais e locais e facilitado pela
crescente aceitação das contribuições das organizações não-governamentais
(ONGs) por parte dos governos. Foram formados grupos para influenciar os
resultados das conferências e para participarem e fiscalizarem os esforços
consecutivos. As organizações de direitos humanos, tanto internacionais como
locais, estão a documentar e publicitar as questões dos direitos das mulheres,
incluindo os direitos reprodutivos, em muitos países. Os meios de
comunicação internacionais e nacionais ajudam a aumentar a consciência
acerca de questões relacionadas com as disparidades entre os sexos, tal como
a violência sexual, a discriminação e a liberdade reprodutiva. As reuniões
internacionais ajudaram a assegurar uma grande atenção a estes problemas.
A mobilização das comunidades é a melhor garantia dos direitos sexuais e
reprodutivos. As mulheres e homens que procuram exercer esses direitos
conhecem os obstáculos sociais, legais e institucionais que enfrentam. As
mulheres, em especial, têm consciência da desigualdade entre os sexos, no que
se refere a participar do desenvolvimento econômico e social e beneficiar-se
deles; sabem quando as decisões e as medidas lhes são impostas. Mobilizar o
público para fiscalizar questões de direitos humanos vai exigir mais educação
acerca destes problemas e dos procedimentos necessários para conseguir
corrigi-los. Foram elaborados textos, para esse fim, os quais se destinam a ser
utilizados nos currículos escolares de vários níveis.
Os programas de assistência internacional, tanto multilaterais como bilaterais,
precisam assegurar que os programas que apoiam contribuem para promover
os direitos humanos. O sistema das Nações Unidas, em colaboração com os
governos e as ONGs, deveria trabalhar para reforçar o controlo dos
programas, a fim de evitar violações dos direitos. O FNUAP está empenhado
nos direitos reprodutivos, na igualdade entre os sexos e na responsabilidade
masculina, bem como na autonomia e emancipação das mulheres em todo o
mundo; reconhece que a salvaguarda e a defesa desses direitos e a promoção
das crianças, em especial das do sexo feminino, são, por si mesmas, metas de
desenvolvimento. O FNUAP atribui a máxima prioridade a programas que
apóiem a promoção dos direitos reprodutivos e sexuais e inclui esses aspectos
na avaliação de programas e na concepção e aplicação dos projectos.
Em direção a uma melhor saúde sexual e reprodutiva
O programa de ação da CIPD apela para que sejam eliminados de obstáculos,
relacionados com os programas, à informação e serviços de saúde reprodutiva,
5. incluindo o planejamento familiar e a saúde sexual, até 2005, e seja alcançado
o acesso universal aos serviços, até 2015. A função dos programas de
prestação de serviços deveria ajudar os homens e as mulheres a alcançar as
suas metas em matéria de reprodução.
Desenvolvimento de capacidades. O fornecimento de serviços de elevada
qualidade exige uma melhor formação e supervisão do pessoal, apoiadas por
um controlo sistemático e minucioso do desempenho, incluindo as interacções
terapeuta-cliente. Para trabalharem com o seu pessoal e clientes, tendo em
vista rever e melhorar os serviços, os gestores precisam de compreender as
metodologias de avaliação e atribuir os recursos, aliás relativamente
reduzidos, necessários para os aplicar. Os instrumentos de auto-avaliação
podem ajudar os gestores a identificar problemas clínicos, incluindo escassez
de pessoal e provisões, equipamento insuficiente, lacunas na manutenção e
recuperação de dados e deficiências no aconselhamento e na divulgação.
Melhorar a qualidade dos cuidados e reorientar os serviços de modo a ir ao
encontro de todo o conjunto de problemas de saúde reprodutiva pode exigir
investimentos suplementares tanto em infra-estruturas (incluindo equipamento
e abastecimento de água e electricidade) como pessoal (incluindo formação de
gestores e de pessoal ligado aos serviços). Há que utilizar o equipamento e o
pessoal de uma maneira mais eficiente. Os gestores precisam de informação
para identificar e corrigir as deficiências, como uma qualidade, eficiência e
eficácia irregulares, ao servir centros de prestação de serviços diferentes e
grupos de clientes também diferentes.
Servir grupos deficientemente assistidos. Os indicadores a nível nacional dos
progressos na resolução de problemas de saúde reprodutiva deveriam incluir
informação sobre grupos específicos (por exemplo, os pobres, as mulheres, os
habitantes das zonas rurais, os adolescentes, os povos indígenas, os
deficientes, os migrantes e os refugiados), que são, muitas vezes,
deficientemente servidos pelos programas e excluídos dos sistemas de
informação e investigação. As perspectivas dos grupos deficientemente
servidos precisam de estar refletidas na concepção, aplicação e controlo dos
programas.
A geografia, a língua e as barreiras culturais limitam o acesso das pessoas
indígenas aos serviços de saúde. Nos serviços públicos de saúde, aqueles que
prestam os serviços não respondem, por vezes, às queixas das mulheres
indígenas. As diferenças de língua podem limitar a compreensão que as
clientes indígenas têm do processo da consulta. Os grupos indígenas têm
criticado a utilização, nas suas comunidades, da esterilização e de métodos
anticoncepcionais controlados pelo prestador dos cuidados (especialmente
injetáveis e implantes). Algumas ONGs participaram casos de experiências
6. médicas, sem consentimento esclarecido, e de utilização de drogas não
aprovadas ou inadequadas.
No Equador, com o apoio do FNUAP, a Federação Indígena de Imbabura
proporciona às comunidades indígenas serviços de saúde integrados, incluindo
vacinação, planejamento familiar, encaminhamento em caso de emergência e
educação sobre nutrição, prestados por médicos indígenas e curandeiros
tradicionais. É prestada especial atenção à qualidade dos serviços e ao
acompanhamento.
Parceria com a sociedade civil. A CIPD e outras conferências sublinharam a
importância de implicar a sociedade civil - as organizações não-governamentais
e comunitárias, bem como as mulheres e os homens, a título
individual - na concepção, aplicação e controle dos programas de saúde
reprodutiva, para que respondam às necessidades sentidas e declaradas
daqueles a quem prestam serviços. Isso é verdade, tanto no que se refere às
empresas públicas que servem os que são demasiado pobres para poder pagar
serviços privados, como a programas com uma participação substancial do
setor privado. Os programas podem também beneficiar com uma investigação
qualitativa (tal como grupos interessados no tema, entrevistas a grupos e
procedimentos de avaliação rápida) sobre a dinâmica de uma transformação
social que apoie a expansão dos direitos sexuais e reprodutivos. Foram
estabelecidas, em muitos países, parcerias entre os programas dos governos e
as ONGs, as quais reconhecem as vantagens comparativas dos diferentes
agentes. As ONGs ajudaram a testar novos métodos de prestação de serviços,
incluindo a divulgação aos pobres e aos adolescentes, e colaboraram na
formação de prestadores de serviços do estado e na defesa da expansão do
programa nacional.
As diretrizes e normas de conduta destinadas aos sistemas de saúde precisam
de incorporar uma perspectiva de direitos reprodutivos. A OMS (em
colaboração com o FNUAP, o UNICEF, o Banco Mundial e outras
organizações) está a elaborar normas que sublinham o consentimento
esclarecido, a atenção à qualidade dos cuidados e as concepções de cuidados
de saúde reprodutiva que estão centradas nos clientes e assentam na sua
participação; tais cuidados abrangem o planejamento familiar, a sexualidade, a
maternidade segura e a prevenção e gestão de DST/HIV/AIDS. Os elementos
do pessoal precisam de formação na proteção dos direitos dos clientes, bem
como de material de informação sobre salvaguardas quanto aos
procedimentos, para utilização com os clientes.
A situação da população mundial. Nações Unidas, Fundo das Nações Unidas para a
População (FNUAP), 1997, pp. 54-56.