SlideShare une entreprise Scribd logo
1  sur  61
Télécharger pour lire hors ligne
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS – FIPE




            ALEXANDRE REGATTIERI BESSA




         Arte como investimento, a formação de preços
   e os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea.




                         São Paulo
                           2010
ALEXANDRE REGATTIERI BESSA




      Arte como investimento, a formação de preços
e os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea.




                     Monografia apresentada na Fundação Instituto de
                     Pesquisas Econômicas – FIPE, para conclusão do
                     curso de MBA em Economia Internacional, turma
                     III.

                     Área de Concentração: Microeconomia.
                     Orientador: Professor Alexandre de Campos.




                      São Paulo
                        2010
AGRADECIMENTOS


À Ana Ramos, Gabriel Zellmeister e Heloísa Alquéres que, entre várias outras coisas,

me ensinaram a gostar dos “parangolés” de Lígia Clark e da lucidez de Louise Bourgeois.

Ao Henrique Luz, pelas conversas memoráveis sobre legitimação.

Ao Baixo Ribeiro, pelo tempo dedicado e pelas explicações detalhadas de seu trabalho.

Ao Beto Atílio, que foi meu cicerone durante minha visita à SP-Arte 2010.



À Patrícia Sampaio, ao Marcelo Rocha, ao Chip Gasser, ao Otavio Bierrenbach, ao

Maurício Daumberg, ao Walter Donat e ao Welder Pinto: amigos cujo apoio foi

fundamental para o término desse trabalho.



À Professora Dra. Diva Benevides Pinho, que dedicou parte de seu tempo para orientar

essa monografia com leituras recomendadas e indicações que enriqueceram esse

material que estão prestes a ler.
EPÍGRAFE



Being good in business is the most fascinating kind of art. During the hippie era people

put down the idea of business—they’d say, ‘Money is bad,’ and ‘Working is bad,’ but

making money is art and working is art and good business is the best art. – Andy

Warhol (1975)




Ser bom nos negócios é o tipo mais fascinante de arte. Durante a era hippie, as pessoas

criticaram a idéia de fazer negócios. Elas diziam que “Dinheiro é ruim” e que

“Trabalhar é ruim”, mas fazer dinheiro é uma arte e trabalhar com arte fazendo bons

negócios é a melhor arte de todas. – Andy Warhol (1975)
RESUMO



BESSA, A. R. Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes

no mercado de arte contemporânea. 2010. Monografia (MBA) – Fundação Instituto

de Pesquisas Econômicas – Fipe, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.




A produção de arte é vista como investimento através do estudo dos agentes do mercado

de arte na cadeia de valorização e legitimação de obras. A teoria é montada usando

autores internacionais, documentários e, sobretudo, a bibliografia da principal estudiosa

do mercado brasileiro de artes: Professora Diva Benevides Pinho. Junto a isso tudo

estão aplicadas teorias de comportamento de consumo baseados em Microeconomia. O

levantamento de hipóteses é então verificado na prática em visitas a feiras, exposições e

galerias de arte. A teoria é então complementada por meio de entrevistas com agentes

do mercado brasileiro para montar um panorama atualizado das pesquisas da Professora

Diva.




Palavras-chave: Mercado de arte. Microeconomia. Comportamento de Consumo.

Legitimação de produtos abstratos.
ABSTRACT



BESSA, A. R. Art as investment, pricing and the agents acting in the contemporary art

market. 2010. Monograph (MBA) – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas –

Fipe, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.




The process of art production is analyzed as an investment through the study of art

market players in the chain of value production and legitimacy of works. The theory is

built using international authors, documentaries, and especially the bibliography of the

principal scholar of the Brazilian arts: Diva Benevides Pinho. In order to understand

market objectives as a whole, theories of consumer behavior based on microeconomics

are applied. The hypotheses are verified in practice on visits to fairs, exhibitions and art

galleries. The whole theory is then supplemented by interviews with representatives of

the Brazilian Art Market to assemble an updated overview of the research started by

Professora Diva Benevides Pinho in 1989.




Keywords: art market. Microeconomics. Consumer Behavior. Value of abstract

products.
LISTA DE FIGURAS E TABELAS

Figura 1 – Tendência de preços de artistas selecionados: Jeff Koons, Francis Bacon,

Andy Warhol e Damien Hirst. Base: 1988=100............................................................... 2

Figura 2 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009.

Fonte: Artprice. Base 100 = valores comercializados em janeiro de 1998. ..................... 4

Figura 3 - Diagrama da hierarquia dos agentes da demanda do mercado de arte

contemporânea................................................................................................................ 10

Figura 4 - Valores de venda em leilões públicos filtrados por Andy Warhol e Picasso.

Fonte: Artnet................................................................................................................... 12

Figura 5 – Hipótese de aquisição de credibilidade a partir do reconhecimento dos

agentes do mercado de arte na formação de “Blue Chips”............................................. 23




Tabela 1 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009.

Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com)...................................................................... 8

Tabela 2 - Os maiores preços de leilão atingidos por artistas contemporâneos entre julho

de 2008 e junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com) .......................... 13

Tabela 3 – Critérios para avaliação de uma obra de arte. Fonte: Bolsa de Arte do Rio de

janeiro. (http://www.bolsadearte.com.br)....................................................................... 18

Tabela 4 - Resumo de seis anos de SP-ARTE. Fonte Isto é Online (ISTO É)............... 36
SUMÁRIO

1 – INTRODUÇÃO.......................................................................................................................1
2 – DESENVOLVIMENTO TEÓRICO........................................................................................2
   2.1 – EM BUSCA DO NOVO PICASSO .................................................................................2
   2.2 – OS AGENTES DO MERCADO DE ARTE.....................................................................5
      2.2.1 – Artistas.......................................................................................................................5
      2.2.2 – Galeristas ...................................................................................................................6
      2.2.3 – Museus e Instituições.................................................................................................6
      2.2.4 – Grandes Colecionadores ............................................................................................7
      2.2.5 – As feiras de arte .........................................................................................................7
      2.2.6 – As casas de leilão.......................................................................................................7
   2.3 – A BUSCA DA DEMANDA POR EXCLUSIVIDADE E ESTÉTICA............................8
      2.3.1 – O mercado de arte primário .......................................................................................9
      2.3.2 – O mercado de arte secundário..................................................................................11
   2.4 – ARTE COMO INVESTIMENTO ..................................................................................12
      2.4.1 – Mercado de arte e tecnologia da informação ...........................................................14
      2.4.2 – Razões para considerar arte como investimento......................................................15
   2.5 – ATRIBUIÇÃO DE VALOR...........................................................................................17
      2.5.1 – Valores intrínsecos...................................................................................................18
      2.5.2 – Valores extrínsecos ..................................................................................................20
3 – PARTE PRÁTICA.................................................................................................................25
   3.1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS ......................................................................................25
   3.2 – RESUMOS .....................................................................................................................26
      3.2.1 – Ana Carolina Rocha, colecionadora ........................................................................26
      3.2.2 – Henrique Luz. Estudioso, crítico, colecionador e representante do MASP .............28
      3.2.3 – Baixo Ribeiro. Fundador da Galeria Choque Cultural.............................................30
      3.2.4 – Beto Atílio, colecionador e proprietário de loja de antiguidades.............................33
      3.2.5 – Visita a sexta edição da SP Arte (Abril/Maio de 2010)...........................................35
      3.2.6 – Professora Dra. Diva Benevides Pinho, economista e estudiosa das artes. .............41
      3.2.7 – Rafael Rocha Andrade, empresário e colecionador iniciante. .................................44
4 – CONCLUSÕES .....................................................................................................................47
   4.1 – O valor da arte versus a demanda por arte......................................................................47
   4.2 – Sobre as hipóteses do aumento da demanda por arte......................................................48
   4.3 – Sobre o processo de legitimação do mercado de arte mundial e brasileiro ....................49
4.4 – Fechamento.....................................................................................................................50
5 – BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................51
   5.1 – Livros..............................................................................................................................51
   5.2 – Documentários................................................................................................................52
   5.3 – Sites de períodicos na Internet........................................................................................52
1 – INTRODUÇÃO
O mercado de arte contemporânea possui agentes próprios que influenciam na definição

do valor de uma obra de arte a partir de um mercado restrito, meticuloso e com regras

próprias. Os artistas podem ser observados como marcas que desenvolvem séries de

produtos com ciclos de vida determinados pela demanda e valores definidos pela

escassez que gera exclusividade.

O projeto de monografia surgiu de uma paixão pessoal pelo mercado das artes e pelo

desejo de conhecimento do comportamento do consumidor sofisticado numa estrutura

de mercado no qual a precificação é algo subjetivo. O mercado de arte brasileiro está em

ascensão internacional, o que pode ser comprovado pelas diversas publicações em

jornais e pelo prestígio alcançado por alguns artistas no mercado global. O exemplo

mais concreto desse crescimento é a formação de feiras como a SP-Arte, que em 2010

está em sua sexta edição, movimentando todos os agentes que atuam no mercado para

uma arena comum de negociações, reconhecimento e legitimação.

De onde vem o valor da arte? Como se dá o processo de reconhecimento de uma peça

física cujo preço ultrapassa diversas vezes o valor dos materiais e do trabalho que a

compõe? Nesta monografia será usada a teoria de formação de preço de produto e a

teoria de ciclo de vida de produto para conceituar artistas e sua produção, enxergando-

os como produtos possíveis de comparação e de precificação. O objetivo principal é

mapear uma hipótese estrutural para a formação de preços das obras de arte no mercado

mundial e posteriormente, por meio de entrevistas, confirmar essa estrutura dentro do

mercado de arte brasileiro. Também faz parte do escopo desta monografia elencar

hipóteses para descobrir as razões para o aumento da demanda mundial por arte e a

conseqüente disparada de preços do mercado de arte contemporânea.


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   1
contemporânea.
2 – DESENVOLVIMENTO TEÓRICO
2.1 – EM BUSCA DO NOVO PICASSO

Não existe um consenso generalizado sobre a definição da abrangência cronológica de

arte contemporânea. A principal razão é que se trata de um assunto recente que alguns

teóricos e as principais casas de leilões divergem entre si quanto à precisão da época

correspondente. Para este estudo, serão consideradas as artes plásticas produzidas após a

segunda guerra e que foram valorizadas a partir do final da década de 1980.

O gráfico da figura 1 mostra os valores aplicados em obras dos quatro produtores mais

reconhecidos pelo mercado de arte: Andy Warhol, Francis Bacon, Damien Hirst e Jeff

Koons.

Figura 1 – Tendência de preços de artistas selecionados: Jeff Koons, Francis Bacon, Andy Warhol e
Damien Hirst. Base: 1988=100. Fonte: Artnet. (http://www.artnet.com)




De acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), a arte contemporânea possui

uma infinidade de suportes e linhas de pensamento, com rupturas agressivas e

questionadoras a cada nova teoria ou proposta apresentada. Há então vários momentos

de experimentação, como as obras do casal Christo e Jean-Claude, caracterizadas por

intervenções em grande escala, fora do ambiente de galerias e museus. O produto final,




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   2
contemporânea.
que transita entre os agentes do mercado de arte, não é a obra em si, mas os esboços,

fotografias e maquetes de suas montagens.

Esta análise é focada na produção de bens de natureza artística comercializáveis,

possíveis de serem transportadas e instaladas sem perder seu valor de troca. Instalações

temporárias e performances artísticas não serão consideradas, salvo o subproduto criado

durante a apresentação artística. O importante é que mesmo sendo efêmero e fixado no

tempo, haja um subproduto que possa ser valorado, transportado e legitimado pelos

agentes econômicos do mercado de arte.

A escolha pelas obras contemporâneas também possui uma razão econômica

fundamental: elas são um universo em contínua formação de valor e de legitimação. O

conceito de legitimação tem origem político-jurídica e o uso neste trabalho está

vinculado à designação de reconhecimento, pelas instituições detentoras de poder e

segundo articulações discursivas que esse mesmo poder domina. O olhar da economia

sobre esse processo de criação legitimação e valores a partir de conceitos subjetivos é o

objeto de estudo desta monografia. Segundo PINHO (2009) e AAKER (1998), para que

a arte como produto possa existir é necessário haver uma sociedade com excedentes

econômicos intercambiáveis, que reconheça os valores intrínsecos e extrínsecos da

produção artística. Ou seja, é preciso que haja um grupo de pessoas cujas necessidades

básicas já foram atendidas e que possuam recursos que ainda possam ser trocados. E é

preciso que tais pessoas ainda mantenham relações sócio-culturais que promovam a

troca desses recursos excedentes por produção artística, valorizada por aspectos

subjetivos da própria sociedade e estéticos da própria obra em questão.

Ainda de acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), uma obra de arte é um

bem único, praticamente inelástico, cuja principal característica é a escassez. A teoria de



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   3
contemporânea.
equilíbrio de mercado através do modelo da oferta e da demanda indica que a redução

da oferta de determinado produto aumenta seu valor. Quando a escassez tende ao limite

(unitário), a função do valor monetário é de fazer a seleção do consumidor e as

referências de valor dependem da atuação dos agentes do mercado de arte em um

período específico.

De acordo com os registros históricos das casas de leilões Sotheby’s e Christie’s, houve

um aumento significativo da demanda de arte contemporânea nas últimas décadas. Por

conta disso, a produção foi diversificada com o surgimento de novos artistas, galerias,

museus, feiras de arte e bienais. O mercado, que já era sofisticado, cresceu

consideravelmente em todo mundo como pode ser visto na Figura 2, mas

principalmente na Europa Ocidental, nos EUA e Japão, e mais recentemente na China.

Entretanto, mesmo com novos produtores e a intensificação do trabalho dos agentes, a

demanda por arte contemporânea não conseguiu ser atendida, como mostra a escalada

de preços nos últimos 20 anos.

Figura 2 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte:
Artprice. Base 100 = valores comercializados em janeiro de 1998. (http://www.artprice.com)




Segundo PINHO (2009), a utilidade da arte está na fruição estética e na expectativa de

retorno sobre o investimento. A autora define o mercado de arte “... tal como o mercado

em geral, é um mecanismo por meio do qual compradores e vendedores encontram-se


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   4
contemporânea.
em um local real ou virtual para a troca de bens e serviços, fixando preços e

quantidades”

Já em YENTOB (2009), o crítico de arte propõe uma questão prática das razões pelas

quais colecionar uma obra de arte contemporânea, já que pelo mesmo valor é possível

comprar uma obra consagrada na história da arte e com sua liquidez monetária

garantida. Adam Lindemann, entrevistado nesse documentário, responde a essa questão

apontando razões além do investimento e da fruição estética: “Se eu mostrar um Picasso

em minha parede, você irá pensar 'Oh, ele é rico e tem um Picasso.' Mas se eu lhe

mostrar que tenho o Picasso de amanhã, então você irá perceber que eu tenho algo que

nenhuma outra pessoa pode comprar com dinheiro.” Esse processo de legitimação,

nesse caso do colecionador identificar um bom investimento e acreditar nele, ocorre em

todos os pontos de troca da cadeia de produção e consumo de arte.




2.2 – OS AGENTES DO MERCADO DE ARTE

A análise do comportamento e da função dos agentes do mercado de arte permite

entender como legitimam obras e as transformam em objetos de fruição e investimento.

Cada agente responde a estímulos que convergem para o ganho de valor e a transação

no mercado de arte. Tais agentes são analisados a seguir, a partir dos estudos de PINHO

(2009), LINDEMANN (2006), THORNTON (2009) e THOMPSON (2008): artistas,

galeristas, museus e instituições, grandes colecionadores, feiras de arte e casas de leilão.

2.2.1 – Artistas

São os produtores ou criadores de valor. Se tiverem uma produção contínua,

reconhecida por críticos e com suporte de um ou mais galeristas por trás, os valores de

suas obras tendem a subir de acordo com o número de exposições e mostras que

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   5
contemporânea.
participarem. Quanto mais conhecido e recomendado por especialistas, mais chance de

ser lembrado pelo público comprador.

Há uma relação interessante entre galeristas e artistas que pode ser comparada a relação

de clubes de futebol e seus jogadores. Quanto um artista é novo no mercado, deve

obedecer a todas as regras de sua galeria, vendendo exclusivamente e deixando com que

a galeria fixe os preços. Já quando o artista é famoso, a relação se inverte. Ele trabalha

com duas ou mais galerias e influencia na curadoria de compradores, assim como na

divisão dos lucros entre galeria e artista.

2.2.2 – Galeristas

Os galeristas são os modernos marchands, os primeiros a agregar valor no ciclo do

mercado de produção de obras de arte. O bom trabalho de um galerista consiste na

escolha do melhor comprador para valorizar o conjunto das obras de um determinado

artista. Por isso alguns chegam a financiar artistas que acreditam que sejam promessas

bem aceitas no mercado futuro, em troca de exclusividade de venda.

Galeristas são os representantes do mercado primário. Vendas feitas por artistas

diretamente a colecionadores particulares são desencorajadas, pois o galerista é o agente

reconhecido pelo lado da demanda e sabe transitar por ele. Alguns galeristas

contemporâneos famosos são Charles Saatchi e Larry Gagosian. Para citar alguns

nomes nacionais temos Márcia Fortes e Luísa Strina.

2.2.3 – Museus e Instituições

São agentes de divulgação em massa da produção artística. Quando os curadores e

patrocinadores de um museu (ou qualquer instituição que tenha coleção ou espaço

expositivo) endossam um artista contemporâneo, influenciam indiretamente o valor de

suas obras. Por conta disso, existem colecionadores particulares ávidos por expor parte

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   6
contemporânea.
de sua coleção, convidando curadores a conhecê-la ou mesmo abrindo seus próprios

museus. Também em muitos casos acontecem doações de todo lado da oferta do

mercado de arte (artistas, galeristas, colecionadores) ao acervo do museu. As

instituições mais importantes para o cenário de arte contemporânea são MOMA, em

Nova Iorque, e a Tate Gallery, em Londres.

2.2.4 – Grandes Colecionadores

No acervo de um museu, a obra ganha notoriedade e exposição pública. Já num acervo

particular, ganha o cunho de quem a adquire. Os grandes colecionadores surgem logo

atrás de Museus e Instituições nas preferências de vendas dos galeristas. Nesse caso, são

compradores identificados pelo mercado de arte que não vão jogar a leilão apenas para

realizar lucro em curto prazo. No Brasil se destaca o empresário Bernardo Paz, que

possui parte de seu acervo de arte contemporânea exposto no Instituto Inhotim, em

Minas Gerais.

2.2.5 – As feiras de arte

Desde o início da década, as feiras de arte se multiplicaram em vários países com

excedente econômico intercambiável, incluindo no roteiro várias economias

emergentes. Entre elas China, Brasil e Rússia. As feiras mais famosas são Miami Basel

(nos EUA), Frieze (na Inglaterra), Basel (na Suíça), Arco (na Espanha). No Brasil, a SP-

Arte é realizada duas vezes ao ano, em abril e novembro, esta última dedicada ao

mercado de fotografias.

2.2.6 – As casas de leilão

Sotheby’s e Christie’s são as casas mais famosas. Durante o leilão, acontece a

reclassificação dos objetos de arte. Todo o conjunto de legitimações acumuladas por

uma determinada obra ao longo de sua trajetória é avaliado. E mais do que a

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   7
contemporânea.
determinação do preço de obras de arte, no leilão se determina os direitos de

propriedade de bens artísticos, estabelecendo as identidades sociais dos objetos de arte.

A tabela 1 mostra os maiores valores transacionados nas casas de leilão entre 2008 e

2009. No Brasil, podemos citar como exemplos a Bolsa de Arte do Rio de Janeiro.

Tabela 1 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte:
Artprice. (http://www.artprice.com)




2.3 – A BUSCA DA DEMANDA POR EXCLUSIVIDADE E ESTÉTICA

De acordo com PINHO (2009), a arte contemporânea vista em galerias e leilões é

produzida para um grupo específico de consumidores que representa uma parcela

restrita da população mundial. Além de serem detentores de um grande excedente

econômico intercambiável, há outras características comuns a esse público que podem

ser usadas com o fim de entender o comportamento da demanda.

Um comprador de uma obra de mais de um milhão de dólares pertence a uma classe

social diferenciada. Seus gastos são exagerados para a média da população. Entretanto,

é preciso parametrizar os valores para verificar que há coerência. Em 2009, o

proprietário da SAC Capital Advisors, Steve Cohen, arrematou por US$ 12 milhões

“The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living”, de Damien



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   8
contemporânea.
Hirst. A obra é um tubarão suspenso num aquário gigante com formaldeído. Em

THOMPSON (2008, página 3) o economista e escritor usa essa compra para justificar

como o estilo de vida dos colecionadores, diante da natureza inelástica da arte

contemporânea, acaba por influenciar o preço final do produto de que são os principais

compradores.

                              Para colocar o preço de US$ 12 milhões em seu contexto correto é preciso

                              entender o quão rico [o comprador] é. Assumindo que o Sr. Cohen possui

                              capital de US$ 4 bilhões juntamente com um lucro líquido anual de U$ 500

                              milhões antes dos impostos. Considerando um retorno de 10 por cento sobre

                              o investimento – muito aquém do que seu fundo de investimentos retorna –

                              ele possui um total de US$ 16 milhões por semana, ou US$ 90 mil a hora. O

                              tubarão custou a ele cinco dias de trabalho.


Diante desse poderio econômico associado à escassez intrínseca da natureza do produto,

é possível levantar a hipótese de que o público ao qual se destina o mercado de arte

contemporânea é quem, em última instância, define os limites de preço, através de seu

excedente econômico intercambiável. Essa hipótese deverá ser validada durante a fase

de pesquisa desta monografia. Diante da impossibilidade de se contabilizar as trocas e

as vendas diretas entre colecionadores, elas não estão incluídas nesta análise, mas são

consideradas na cadeia de legitimação.

2.3.1 – O mercado de arte primário

Segundo LINDEMANN (2006), há duas classes de consumidores com comportamentos

distintos, que moldam o mercado de arte e são moldados por ele. No chamado mercado

de arte primário, a compra é feita diretamente na galeria que representa o artista em

questão. A escassez e a demanda são tão diametralmente opostas que o principal

trabalho do galerista é escolher para quem será realizada a venda. A tendência é que a



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   9
contemporânea.
venda seja feita para quem irá agregar mais valor ao artista, seguindo uma cadeia de

legitimação. Um destaque numa coleção importante valoriza o artista e ajuda a

consolidar seu valor no mercado. Por isso o comprador que atua no mercado primário é

geralmente próximo das galerias, entende como o mercado funciona, é bem relacionado

e atua como investidor em longo prazo no mercado a termo.

De acordo com sua importância, citado em YANTOB (2008), os agentes da demanda do

mercado de arte contemporânea são: museus públicos, fundações e museus particulares,

grandes colecionadores privados, outros colecionadores.

Figura 3 - Diagrama da hierarquia dos agentes da demanda do mercado
de arte contemporânea. Fonte: própria.




O gráfico da figura 3 explicita a relação de ganho de valor para o conjunto da obra do

artista versus o preço de comercialização. O caminho da legitimação de uma obra de

arte pode ser mais rápido ou mais lento de acordo com a notoriedade dos agentes

envolvidos na troca. Uma obra colocada numa instituição pública ou privada é um

atestado de credibilidade que transfere valor para o artista, um certificado emitido pela

curadoria da instituição que o aceita, que terá mais ou menos valor de acordo com sua

notoriedade. Por isso, os preços para estes museus e também outros de menor porte são

inferiores aos praticados para colecionadores. E são mais inferiores ainda se


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   10
contemporânea.
comparados com os valores para aquisição em leilões. Por conta dos dados das vendas

primárias não se tornarem públicos, não é possível representar numericamente as

vantagens de se vender mais barato para essas instituições. Entretanto, a lógica da

negociação baseada na legitimação pode ser empiricamente comprovada no aumento

dos valores de outras obras do mesmo artista, após essa legitimação ter acontecido.

2.3.2 – O mercado de arte secundário

Já o mercado secundário, também conhecido como o mercado público dos leilões, é

onde a legitimação da obra de arte é publicamente avaliada pelo público interessado. Do

ponto de vista da demanda, o mercado secundário é destinado principalmente aos

consumidores mais afoitos que procuram validação instantânea e estão dispostos a pagar

mais por isso. Além entregar uma obra já legitimada, os leilões indiretamente vendem

credibilidade a esses novos colecionadores.

O mercado secundário influencia o valor das próximas produções dos artistas

comercializados no mercado primário e é onde geralmente ocorrem especulações. O

caminho mais fácil para aferir lucros é comprar uma obra de uma galeria de confiança e,

meses depois, levá-la a leilão. Mas se todos os consumidores de arte se tornarem

especuladores, vendendo em curto prazo, os preços irão cair. Diante disso, a escolha de

para quem vender a arte no mercado primário é fundamental. As galerias compartilham

listas negras de compradores com comportamento especulativo.

Outra característica do mercado secundário é que grandes colecionadores tendem a

proteger seus investimentos. Em LEWIS (2008), o empresário José Mugrabi é citado

como um dos maiores colecionadores de Andy Warhol. Ele detém cerca de 800 peças

do artista em seu acervo. Se levarmos em conta que o artista produziu cerca de 8.000




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   11
contemporânea.
peças durante sua vida, a figura 4 mostra que o senhor Mugrabi possui 10% de

participação de um dos investimentos em arte mais lucrativos dos últimos 20 anos.

Figura 4 – Valores de venda em leilões públicos filtrados por Andy Warhol e Picasso. Fonte:
Artnet. (http://www.artnet.com)




Em entrevista a Ben Lewis, José Mugrabi fala abertamente que freqüenta todos os

leilões onde há “Warhols” importantes para garantir que o preço de mercado seja

mantido. Ele faz isso interferindo através de lances ou mesmo adquirindo a obra se ela

não atinge o preço mínimo estipulado pela casa de leilão. Uma venda pública que

mostra tendência de queda na demanda de “Warhols” pode representar uma perda

significativa na coleção de José Mugrabi. Mas o mesmo raciocínio ao contrário também

é válido: qualquer novo pico de vendas de “Warhols” o deixa mais rico. A imagem da

figura 4 mostra o pico dos valores de “Warhols” e “Picassos”, considerados pelas casas

de leilões os “papéis” mais facilmente comercializáveis. A queda nos valores ao final de

2009 é um reflexo da crise econômica mundial, do mesmo ano.




2.4 – ARTE COMO INVESTIMENTO

Em THORNTON (2010), na reportagem especial para a publicação inglesa “The

Economist” sobre o mercado de arte e suas perspectivas como investimento, o conceito

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   12
contemporânea.
de “Blue Chips” é aplicado ao mercado de arte. Esse é um termo utilizado nas Bolsas de

Valores para designar as ações mais negociadas, as mais valorizadas pelo público. O

mesmo conceito também é visto em LINDEMANN (2006), com a mesma conotação de

objeto aceito como base do mercado de arte: se seu valor for depreciado, o mercado

como um todo sofrerá as conseqüências; se seu valor for apreciado, todos ganharam

com isso.

É possível usar essa hipótese proposta pelos dois autores para elencar alguns artistas

como “Blue Chips”. Seus valores não sofrem tendência de queda a não ser que o

mercado como um todo esteja em recessão. Dessa forma eles representam, em conjunto,

um possível termômetro sobre as trocas ocorridas no mercado de arte.

Tabela 2 – Os maiores preços de leilão atingidos por artistas contemporâneos entre julho de 2008 e
junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com)




Os artistas novos, ainda com pouca credibilidade no mercado, são investimentos mais

arriscados e de pouca liquidez. Já uma obra de um artista consagrado que tenha marcado

seu processo criativo possui valor histórico e, diante disso, seu potencial de

comercialização é grande por sua escassez intrínseca. Na tabela 2 é possível notar

alguns “Blue Chips” do mundo da arte contemporânea em ação: seu preço em leilões é

disputado e há interesse do mercado em deixá-los assim.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   13
contemporânea.
2.4.1 – Mercado de arte e tecnologia da informação

De acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), o mercado de arte se

especializou nas últimas décadas aliando-se a tecnologia, usando a tele presença junto

com o armazenamento e processamento de dados. O espaço do mercado tornou-se

global, num processo que começou nos anos 60 e 70 com a aceitação de que

compradores pudessem fazer lances por telefone. As facilidades trazidas pelas conexões

da Internet trouxeram mais compradores e aumentaram ainda mais a velocidade e o

acesso ao mercado. A tecnologia barateia o acesso, facilitando o alcance global a

excedentes econômicos intercambiáveis, uma parte considerável das transações já está

sendo realizada através de lances eletrônicos – uma transição análoga às transações que

ocorriam fisicamente à custa da força dos pulmões dos operadores na bolsa de valores e

agora acontecem atrás de terminais de computadores. Entretanto, os leilões de lotes

mais importantes ainda continuam sendo feitos presencialmente.

Já com o armazenamento e processamento de dados dos computadores interligados é

possível ter acesso rápido aos fatores intrínsecos da obra a ser comercializada, o

histórico do artista, o número de exposições em que ela participou, etc. O mapa da

legitimidade do artista pode ser construído em poucos segundos a partir de buscas em

sites     especializados         como       ArtPrice        (http://www.artprice.com)             e    ArtNet

(http://www.artnet.com). As casas de leilões, as galerias, os marchands e até mesmo os

artistas usam a Internet e seu poder de alcance global através de catálogos virtuais de

seu acervo.

O dado mais próximo de um barômetro do mercado é o índice de confiança no mercado

de arte, desenvolvido pela empresa ArtPrice. Esse índice baseia-se em respostas obtidas




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte      14
contemporânea.
com visitantes do site e se propõe a dar, em tempo real, uma leitura de tendências. As

perguntas da ArtPrice neste levantamento são:

         Em sua opinião, seria agora o momento oportuno para comprar obras de arte?

         [   ] Sim          [   ] Não          [   ] Talvez

         É a sua situação financeira melhor ou pior do que era há três meses?

         [   ] Melhor [         ] Pior         [   ] Estável

         Nos próximos três meses, você espera que o clima econômico seja

         [   ] Favoráveis            [    ] Desfavoráveis [           ] Idêntico

         Nos próximos três meses, o que você espera que aconteça com o preços de arte?

         [   ] Aumentem              [    ] Caiam       [   ] Sejam estabilizados

Apesar de pertencer a uma empresa isenta e respeitada pelos agentes do mercado de

arte, o “Art Market Confidence Index” sofre críticas pela pouca quantidade de

informação e pelo desconhecimento de quem está respondendo a pesquisa. Mesmo

assim, é uma referência que pode ser aprimorada. Para isso, a pesquisa deveria ser

direcionada reconhecendo os agentes do mercado de arte, sua regionalização e

importância dentro desse mercado num dado período de tempo.

2.4.2 – Razões para considerar arte como investimento

PINHO (2009, página 73) comenta que apesar do risco contido no investimento em arte,

a demanda está “... fortemente ligada ao mercado financeiro, a opinião geral tem sido

de que se trata de um bem de luxo escolhido pelo investidor por prazer estético e/ou

como proteção contra flutuações econômicas” Diante dessa análise sintética, a autora

dá quatro razões para se considerar o investimento em arte, descritas a seguir.



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   15
contemporânea.
Proteção da poupança contra desvalorização

Em momentos de incerteza monetária, os investimentos em propriedades físicas não

possuem a liquidez de dinheiro vivo, mas certamente são mais difíceis de perderem seu

valor diante de crises. O jornal americano “The Wall Street Journal” publicou em seu

site no dia 5 de janeiro de 2010, uma reportagem analisando uma venda de uma obra do

artista italiano Giacometti, que foi parte do acervo do Banco de Dresden por 30 anos.

A escultura de bronze “Walking Man 1”, leiloada pela Sotheby’s, é considerada

emblemática, a mais representativa de toda a produção artística de Giacometti. Por isso

seu valor atingiu US$ 104.3 milhões em Londres. O comprador anônimo pagou quatro

vezes o valor estimado pela casa de leilões. Essa obra é uma “Blue Chip”. Um

investimento que não irá perder seu valor por sua história, sua representatividade e pelo

fato de Giacometti fazer parte da cultura mundial com peças em acervos públicos e

particulares de bastante credibilidade.

Retorno: prazer estético e/ou ganho financeiro

O risco de colecionar arte é compensado pelo usufruto do prazer estético que a obra

proporciona. O uso desse valor estético não deprecia a obra, observando-se regras de

conservação e guarda. Retornando ao raciocínio de Adam Lindeman, o prazer de

encontrar o novo Picasso e ser reconhecido por seus pares, no caso outros

colecionadores, diz a todos que você possui muito mais do que apenas dinheiro para

comprar arte cara.

Ao falar sobre o retorno financeiro, Larry Gagosian, numa entrevista em THORTHON

(2010), afirma que Andy Warhol é notoriamente o novo Picasso. Suas contribuições

para a história da arte ainda não foram totalmente processadas e seu valor ainda deverá

subir mais. Gagosian, juntamente com Mugrabi, são os maiores detentores particulares


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   16
contemporânea.
de “Warhols” disponíveis no mercado. Esse último dado não deixa a afirmação de

Gagosian totalmente isenta. Entretanto, se ele não acreditasse realmente no que fala não

teria formado um acervo tão grande assim de apenas um artista.

Demanda e oferta de reserva

As grandes variações de valores também afetam o mercado de arte. Em períodos de

desvalorização, os principais vendedores acabam se tornando compradores, visando o

mercado futuro. O mesmo acontece quando há grandes valorizações: pequenos

colecionadores começam a atuar como vendedores.

PINHO (1989, pagina 142), resume de forma clara e coerente esse comportamento dos

consumidores: “... para cada indivíduo há um preço de reserva para uma obra de arte

em particular, abaixo do qual a pessoa se torna um demandador de mais quadros e

acima o qual se torna um fornecedor de quadros.”

Especulação

São as negociações no mercado a termo, que obedecem as regras de compra e venda

como qualquer outro investimento. Comprar a termo significa que o especulador

acredita que obra será valorizada. Vender a termo significa que a crença é inversa, de

uma desvalorização em curto tempo. A oferta inelástica ou quase inelástica é a

responsável pelo lucro da especulação nesse mercado.




2.5 – ATRIBUIÇÃO DE VALOR

Neste item será apresentada uma hipótese de atribuição de valor às obras de arte

contemporâneas baseado em análise de marketing de produto de acordo com AAKER

(1998). Todo produto comercializável possui valores intrínsecos e extrínsecos que


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   17
contemporânea.
influenciam seu valor de troca. Por valores intrínsecos, para este estudo, vamos

considerar o que é inerente da obra de arte contando com as características de seu

suporte e do meio no qual ela foi produzida. Já no caso de valores extrínsecos, serão

pontuados os conceitos subjetivos que existem apenas na mente das pessoas que

reconhecem o valor do produto. As obras contemporâneas serão tratadas como parte de

uma marca, uma grife destinada ao mercado de alto luxo. A grande diferença é que arte

não é um bem de consumo.

2.5.1 – Valores intrínsecos

A bolsa de arte do Rio de Janeiro (http://www.bolsadearte.com/) possui em seu site uma

forma de avaliação de obras de arte levando em conta suas características físicas. Tais

critérios são reproduzidos na tabela 3:

Tabela 3 – Critérios para avaliação de uma obra de arte. Fonte: Bolsa de Arte do Rio de janeiro.
(http://www.bolsadearte.com.br)




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   18
contemporânea.
A origem da obra é importante. Ou seja, a lista de ex-proprietários conta. Esse histórico

de compradores funciona como atestado de legitimação e credibilidade do mercado. Por

exemplo, se Charles Saatchi, o grande colecionador britânico, está nesta lista, todo o

aval de seu conhecimento de mercado é transmitido para obra. Isso não é algo

mensurável em porcentagens de valor, mas é um comportamento empírico observado

mesmo em mercados regionais.

Da mesma forma, o valor do contexto histórico da sociedade aumenta a exclusividade e

importância da obra. Se o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (Moma) realiza uma

exposição e pede uma obra emprestada, a legitimidade é criada pela curadoria do

museu. Num caso nacional, basta recordar a valorização da produção da artista Beatriz

Milhazes após a grande retrospectiva feita pelo Instituto Cultural Banco do Brasil no

Rio de Janeiro em 2004 e recentemente na Estação Pinacoteca, em 2009.

Em THEROUX (2008) e XIAOGANG (2009), o modismo, apesar de ser uma

característica intermitente, tem sido determinante nos países emergentes. Rússia, China

e Índia têm procurado resgatar sua cultura valorizando artistas do passado recente e,

sobretudo, aqueles que historicamente influenciaram a atual produção de arte

contemporânea.

Associado a esse fator de busca de passado cultural há um grande excedente econômico

intercambiável nas camadas sociais mais abastadas desses países, favorecendo a

especulação. Mas ao mesmo tempo, também intensificando o resgate de sua identidade

através da arte. Apesar de ser outro momento histórico, diferente da arte

contemporânea, a valorização do produto nacional é feito em conjunto e os artistas

locais contemporâneos são beneficiados. Em THORNTON (2010), é averiguado que




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   19
contemporânea.
obras relacionadas ao período do império chinês estão supervalorizadas e não há

previsão para que a demanda seja estabilizada.

2.5.2 – Valores extrínsecos

Segundo AAKER (1998), os valores extrínsecos de um produto são subjetivos e

determinados por um posicionamento de marca. Através desse posicionamento, é

possível influenciar o público consumidor reafirmando tendências, corrigindo

comportamentos e construindo reputações. No caso do mercado de arte, podemos fazer

uma analogia, colocando as obras como se fossem produtos e o artista criador como a

marca geradora de valor.

Há um caminho longo para que um artista seja legitimado no mercado de arte. Se for

encarado como uma marca, deve adquirir credibilidade de vários agentes, num processo

que levou 50 anos no caso dos impressionistas e apenas 20 anos com os minimalistas

norte-americanos, como é citado em YENTOB (2008). A cada vez que um agente do

mercado faz um movimento em direção a produção de um artista, esse último vai

ganhando notoriedade como se fosse um marca. A recomendação e transferência de

credibilidade num ambiente de variáveis subjetivas é o que influencia a percepção de

valor.

Não existe um roteiro rígido de como ser legitimado. Um bom exemplo de uma exceção

ao caminho esperado é um artista da geração YBA (Young British Artists), que se

tornou sinônimo de mercado na primeira década do século XXI: Damien Hirst. O caso

desse inglês é emblemático, pois subverteu o caminho normal da venda de sua produção

para o mercado primário e fez um leilão massivo com suas obras. Ele usou, no limite, a

qualidade mais preciosa de suas obras: a escassez. Como se não bastasse isso, Hirst

realizou o leilão um dia após a data histórica da concordata do Leman Brothers (15 de


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   20
contemporânea.
setembro de 2008). De acordo com o jornal “The New York Times” de 17 de setembro

de 2009, o leilão de Hirst arrecadou US$ 200.7 milhões com venda de 218 itens. No

auge da crise financeira, o valor de Hirst não só foi mantido como superado em alguns

trabalhos mais iconoclásticos do artista.

É possível esquematizar um caminho de ganho de validação e credibilidade que aos

poucos legitima a produção artística e fortalece o artista como marca de si mesmo. No

próximo capítulo, através de entrevistas com agentes do mercado de arte, esse caminho

será testado e ajustado conforme exemplos empíricos sejam relacionados.

Além de ser criativo, o artista precisa ter uma temática que seja interessante no período

em que atua, sendo reconhecido por seus pares. O passo seguinte é talvez o primeiro

grande desafio: encontrar um galerista que possa se responsabilizar pela distribuição e

comercialização de suas obras. Com um galerista acolhendo sua produção e muitas

vezes comprando toda coleção antes mesmo de ser produzido, o artista consegue

dedicar-se ao trabalho. Em GILL (2005), é descrito um exemplo interessante que

aconteceu nos anos 60 com a galerista Peggy Guggenheim e o artista Jackson Pollock.

Ele recebia mensalmente uma mesada que o libertou para dedicar-se a sua produção.

Pollock também contava com grande defensor público, o crítico de arte Clement

Greenberg, que abraçou a causa dos expressionistas abstratos e o colocou como ícone

do movimento.

Voltando a linha de legitimação e credibilidade, após conseguir um galerista, começa o

trabalho de divulgação e o “product placement”. Neste trabalho será considerado

“product placement” a curadoria dos espaços físicos mais pertinentes, com o objetivo

de que as obras sejam vistas pelo maior número de pessoas influentes que possam

continuar o processo de legitimação. Esse trabalho pode ser feito tanto pelo artista



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   21
contemporânea.
quanto pelo proprietário da galeria, os dois agentes mais interessados no

reconhecimento das obras. É possível definir uma hierarquia de poder de legitimação,

sendo que há pequenas variações em função da credibilidade do agente que interage

com a obra. Por exemplo, uma exposição individual numa galeria do interior de São

Paulo fica aquém do empréstimo de uma obra para uma exposição temporária em

Berlim.

As feiras de arte e bienais também exercem forte poder de legitimação, por serem

espaços de grande atração de compradores e interessados em arte. Isso justifica o

esforço de galeristas em enviar obras, arcando com custos de transporte e do

deslocamento do artista para onde irá ocorrer a feira ou bienal.

Um colecionador que cultiva uma coleção respeitável também é um ótimo exemplo de

espaço pertinente. Entretanto, o topo da cadeia de legitimação são os museus e acervos

de visitação pública. Se os leilões realizam a transformação de objeto mundano em

objeto de valor, da mesma forma quando um museu pede uma obra emprestada ele age

socialmente exercendo sua função de reconhecimento do objeto como arte.

Além de agir como “product placement”, a mídia especializada é o espaço no qual os

críticos de arte, os curadores, os leiloeiros, livreiros e expositores prestam o serviço

informativo ao mercado da arte. A opinião emitida pela mídia pode validar ou arruinar

reputações, ajudando a consolidar um posicionamento de artista como marca ou

alertando o mercado para uma possível queda pelo esgotamento do modelo criativo

adotado pelo artista sendo avaliado. É o efeito legitimador.

O gráfico da figura 5 possui um esboço empírico da organização do mercado de arte,

que será posto à prova durante o próximo capítulo desta monografia.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   22
contemporânea.
Figura 5 – Hipótese de aquisição de credibilidade a partir do reconhecimento dos agentes do
mercado de arte na formação de “Blue Chips”. Fonte: própria.




2.6 – HIPÓTESES PARA AUMENTO DA DEMANDA

A análise do mercado de arte permitiu levantar algumas hipóteses para o aumento da

demanda que elevou os preços a patamares recordes. Os acontecimentos próximos

ao estouro da bolha de 2008 colocaram em cheque a aposta de que o mercado de arte

sofreu uma bolha e que não se sustentaria por muito tempo. As hipóteses levantadas

abaixo serão validadas e refutadas através de pesquisas de campo, por meio de

entrevistas com profissionais do mercado.

         Análise do efeito “Blue Chip”, que identifica as obras mais seguras e cuja

         liquidez é garantida;

         Novos colecionadores em mercados emergentes surgiram nos últimos anos. Sua

         necessidade de comprar credibilidade ocidental, ou seja, arte já legitimada,

         ajudou a inflacionar os preços e a descobrir novos agentes produtores locais;

         Há excesso monetário no mundo por conta da década de crescimento do PIB

         global. Há mais moeda do que boas opões de investimento, com um número

         menor de agentes vendendo arte legitimada do que essa nova demanda necessita;


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   23
contemporânea.
Quando colecionadores como Larry Gagosian e José Mugrabi detém grande

         parte da produção de um artista e continuam validando-o, tal certificação

         legitima a obra pelo contexto dos colecionadores e não pela defesa de ativos

         econômicos que ambos são detentores;

         A globalização que trouxe o acesso a qualquer galeria, feira, museu e leilão em

         tempo real, retirando as fronteiras do mercado. Ao mesmo tempo, a globalização

         transformou a arte local em interesse mundial, influenciando os valores que são

         baseados pelo mercado exportador.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   24
contemporânea.
3 – PARTE PRÁTICA
3.1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Neste capítulo, as hipóteses serão confrontadas em consultas com especialistas do

mercado de arte. Entre eles há pessoas ligadas a galerias, colecionadores, museus e

artistas. A junção dos pontos de vista dos diferentes agentes do mercado de arte deverá

ser generalizada para refutar ou complementar o estudo teórico da primeira parte desse

trabalho.

Diante do tempo escasso para pesquisa, a decisão mais prática foi recorrer às pessoas

próximas que trabalham no mercado de arte em São Paulo e Rio de Janeiro. Encontros

por telefone, por e-mail e conversas realizadas na Feira de Arte de São Paulo em Abril

de 2010 (SP-ARTE, 6ª. edição) foram os meios para conseguir opiniões e reflexões

sobre a precificação do mercado de arte e a explicação para a escalada de valores

durante a primeira década do século XXI.

Nas próximas páginas serão relatados resumos das entrevistas. A metodologia adotada

para entrevistas seguiu uma dinâmica própria, mas sempre atento aos seguintes passos:

         a) Apresentar o projeto de pesquisa e as expectativas de geração de

              conhecimento diante das questões propostas.

         b) As entrevistas devem ser pautadas pelas hipóteses, pedindo ao entrevistado

              que liste exemplos práticos do mercado toda vez que uma nova informação

              entrar no contexto.

         c) As entrevistas também devem checar se o comportamento do mercado

              globalizado, presente na bibliografia adotada, é aplicável ao mercado local

              brasileiro.



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   25
contemporânea.
3.2 – RESUMOS

3.2.1 – Ana Carolina Rocha, colecionadora

Ana coleciona arte há mais de vinte anos. Trabalhou como publicitária e nunca deixou a

paixão pelas artes ser algo secundário em sua vida. Estuda bastante arte contemporânea,

já visitou as principais feiras e conhece pessoalmente artistas nacionais e internacionais.

Sua experiência como colecionadora é manifestada em seus questionamentos quando

obras atingem valores além dos suportados pela demanda não especulativa.

O comportamento de um colecionador é como um vício: ele persegue cada nova

aquisição durante um longo tempo e acredita no artista que está comprando. Segundo

Ana, arte é um bom investimento quando você entende e gosta de arte. Do contrário,

pode servir como uma forma nada inteligente de empatar dinheiro apenas como aspecto

decorativo.

Ana explicou que os leilões são arenas onde os mesmos jogadores se encontram sempre.

No mercado brasileiro, há pouquíssimas pessoas que podem vislumbrar a compra de um

objeto de arte e todas se conhecem. O grande segredo, segundo ela, é prestar atenção

nos catálogos naquilo que pode estar avaliada abaixo de seu valor de mercado. Tal

situação acontece várias vezes porque há modismos no mercado que influem no preço,

sem prestar atenção para a essência e o histórico das obras e do artista. Muitas vezes

esse modismo faz com que obras interessantes sejam descartadas no mercado a um

preço convidativo, mas apenas quem tem olho treinado consegue aproveitar tais ofertas.

Por isso, a figura do curador ou do arquiteto especialista em arte é muito comum no

eixo Rio-São Paulo.

Há obras que jamais perderão seu valor, comparáveis às ruínas da civilização greco-

romana que foram descobertas durante o renascimento italiano. O valor representativo


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   26
contemporânea.
irá transparecer mesmo que outras instituições civilizatórias importantes venham a ser

questionadas. O ponto é que arte quando consegue ser separada do modismo, vira uma

representação da humanidade. Esse é o conceito de “Blue Chips”, explicado de uma

forma não econômica pela entrevistada.

Ana também comentou que, em última análise, os compradores é que determinam o

preço das obras. Seja pelo seu relacionamento com os artistas, com as galerias ou

mesmo pela sua habilidade em participar de leilões, os compradores ditam os valores

que individualizam as obras. Atualmente, os preços da arte brasileira estão bem

elevados e há produções e artistas que ultrapassam o caminho da arte para quase caírem

no marketing e na publicidade.

Diante dessa afirmação, Ana começou a relacionar os preços da chamada “Street Art”,

que se encontram inflacionados desde que foram adotados pelas revistas de

comportamento direcionadas para classe A/B. O fenômeno começou no início da década

quando os pichadores ganharam o status de grafiteiros por transformarem o cenário

urbano com seus questionamentos e críticas. Nesse movimento recente, OSGEMEOS

são dois artistas plásticos gêmeos que trabalham juntos desde o começo do movimento

que saiu das ruas e foi parar dentro das galerias. Eles são o ícone de um grupo de

artistas cuja trajetória encontra-se no ápice do mercado, de acordo com os preços

praticados na última SP-ARTE. Ainda segundo Ana, quando um suporte artístico se

sujeita pelo modismo a ser enquadrado em padrões pré-determinados, ele perde sua

originalidade e parte de sua legitimação adquirida ao longo dos anos. Um graffiti não se

tornará arte por estar emoldurado, dentro de uma galeria. Isso, na verdade, é nocivo,

pois retira a obra de seu contexto, que é estar nas ruas. Essa relação delicada, segundo

ela, é que faz com que o “Street Art” esteja no início de seu declínio, sendo arrebatado

principalmente por colecionadores de capitais distantes.

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   27
contemporânea.
3.2.2 – Henrique Luz. Estudioso, crítico, colecionador e representante do MASP

Henrique já trabalhou diretamente com artistas e hoje é responsável por parte das

montagens e exposições do MASP. Ele não é curador, mas acaba sendo responsável por

projetos especiais, marketing e pela assessoria de imprensa do museu. Ao saber do

assunto principal e das hipóteses da monografia, ele mencionou um fator importante em

todo o processo de legitimação listado na parte teórica: os relacionamentos entre

pessoas que favorecem a distribuição da legitimidade.

Os artistas contemporâneos vivem sua própria marca e seu desempenho social reflete

seu valor de mercado. Eles devem aparecer e se movimentar, expandindo seu núcleo de

influência para adquirirem reconhecimento. Nesse instante, a proximidade com a classe

social que possui excedente econômico suficiente para comprar arte é fundamental. É a

diferença de vender arte na rua atrás do MASP e de começar com a curadoria na galeria

de um conhecido da família. Esse ponto demonstra um alto custo de entrada no

mercado. É uma restrição que ajuda a manter os preços altos e a exclusividade de

participação. Não basta ser bom e ter uma proposta artística coerente e em voga com o

ambiente que o cerca. É preciso ter os contatos certos para conseguir projeção.

Sobre Instituições que funcionam como bancos centrais de legitimação, o MASP é

citado como exemplo. Sendo um dos principais museus da América Latina, quando o

MASP se curva para uma específica manifestação artística, ele outorga todos seus anos

de curadoria e sábias aquisições de obras para os artistas escolhidos. Assim acontece

com a exposição anual da Coleção Pirelli, que ano após ano ajuda a legitimar a

fotografia e os artistas relacionados. Outro exemplo interessante foi a “Street Art” ter

invadido o pavilhão inferior do MASP no final de 2009. Esse evento ajudou a valorizar

a Galeria Choque Cultural e os artistas que participaram da mostra coletiva.



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   28
contemporânea.
Há uma particularidade na arte contemporânea brasileira que se refere aos artistas que

começaram a produzir durante a década de 1980. Os jornalistas culturais cunharam esse

grupo como “Geração 80”. Entre os agentes do mercado de arte, a principal

característica deste grupo é ser legitimado por críticos e curadores, possuindo coerência

em sua produção artística e com várias retrospectivas sobre o conjunto das obras. Tais

artistas são considerados colecionáveis pelo histórico que representam e pela ligação

temática e formal que existe entre eles. “Blue Chips” nacionais, apostáveis como

investimento por quem se identifica com seus expoentes. Os principais representantes

são Alex Flemming, Beatriz Milhazes, Daniel Senise, Leda Catunda, Leonilson, Luis

Ernesto, Luiz Zerbini e Nuno Ramos. Foram estes que foram lembrados durante a

entrevista e são os que relativamente aparecem mais nos catálogos e nos leilões de arte

contemporânea brasileira.

Henrique também fez um comentário que não está descrito no processo de formação de

valor: o artista é detentor da primazia da idéia. Por exemplo, Jeff Koons, Louise

Borgeois e Tomie Othake fazem projetos grandiosos que são executados por mestres de

obras e uma grande variedade de artesãos. Eles controlam uma oficina que muitas vezes

pode estar localizada na China, no caso de Jeff Koons. A produção artística se tornou

um processo especializado, quase industrial, mas que toma todo o cuidado para não

acabar com seu principal valor intrínseco – a escassez.

Henrique finaliza enfatizando que o mercado de arte possui altos e baixos como

qualquer mercado, sempre com alguns agentes interessados em apostar na subida ou na

queda, pois a especulação bem feita gera dinheiro. Para entrar no mercado é preciso

uma boa dose de sangue frio e muito dinheiro disponível.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   29
contemporânea.
3.2.3 – Baixo Ribeiro. Fundador da Galeria Choque Cultural

A galeria Choque Cultural é especializada em novos artistas da geração “Street Art”,

que saiu das ruas para as galerias e se tornaram populares em meados da década. O

espaço expositivo é mutante e cuidado nos mínimos detalhes pelos próprios artistas, que

transformam suas exposições em autênticas instalações, nas quais as obras são imersas.

Segundo Baixo Ribeiro, a galeria teve papel importante na valorização das novas

formas de arte que começaram pelos jovens e que agora se encontram nos holofotes dos

colecionadores.

Cada artista, no processo de inserção no mundo da arte, deve ter seu trabalho

reconhecido em algumas instâncias. A primeira é sempre a dos amigos, colegas e da

escola. Em seguida, vêm os salões e prêmios que são pouco representativos no Brasil.

Um dos caminhos para dar suporte a novos artistas é o intercâmbio e a parceria com

galerias estrangeiras, dando oportunidade de residência dos artistas da Galeria Choque

Cultural em outros países. Em contrapartida, a galeria também convida artistas

estrangeiros para trabalhar no Brasil e assim conhecerem a produção nacional,

influenciarem nossos artistas e, ao mesmo tempo, serem influenciados por eles.

Os museus são órgãos de reconhecimento por sua própria definição. Existe nesse

campo, toda uma escala de importância que depende da hierarquia das instituições, dos

curadores envolvidos e da própria natureza das exposições em questão. O que importa

para o currículo do artista é a qualidade de cada participação e a coerência com a sua

carreira. Outro patamar de reconhecimento importante para o artista plástico é a

literatura em torno dele. Livros bem editados, teses universitárias, ensaios feitos por

críticos importantes são fatores que aumentam a exposição e a legitimidade dos artistas.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   30
contemporânea.
Entrar no mercado de arte e criar uma rede de colecionadores em torno de si é uma

opção para o artista, mas não uma regra. Os artistas podem criar outras formas de

parceria para realização de seus projetos, que independam dos colecionadores. Podemos

citar como exemplos para sair da sombra dos colecionadores o mecenato, as comissões

estatais ou a associação com outros tipos de patrocinadores. Mas o modelo considerado

como melhor ainda é a inserção no mercado através da representação por galerias de

arte. Existem diversos modelos de relacionamento entre artistas e galerias, mas é bom

lembrar que vão desde a galeria-educativa – que forma artistas e colecionadores, como a

Choque – até galerias que praticam a simples comercialização de obras. Já os

colecionadores vão desde os institucionais, que compram para museus e outros acervos

importantes, até o colecionador mais simples, que compra apenas “para decorar a casa”.

Olhando sem preconceito para qualquer categoria intermediária, todos têm o poder de

legitimar um artista.

Há casos em que alguns colecionadores colaboram indiretamente entre si, formando

uma rede de apoio em torno de um determinado artista. Essa comunidade age como um

grupo de fãs que custeiam projetos com pequenas aquisições. Em certos casos,

conseguem viabilizar projetos mais ousados dividindo o risco do investimento e

cobrindo custos de material. Isso acontece não só pela compra de originais, mas também

pela comercialização de múltiplos, que são um número determinado de cópias de uma

obra, geralmente de suporte fotográfico ou computadorizado. Livros e produtos

industrializados com referências iconográficas da produção do artista em questão

também entram como suporte de investimento. Alguns artistas chegam a envolver-se na

divulgação de produtos populares, tendo suas imagens emprestadas para campanhas

publicitárias.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   31
contemporânea.
A fama e popularidade também podem ser consideradas instâncias de reconhecimento

muito importante para alguns artistas, mas não necessariamente de todos. Cada caso é

um caso e a galeria deve projetar o artista de acordo com sua essência.

Há muitos colecionadores estrangeiros acompanhando o trabalho dos artistas

representados pela Galeria Choque Cultural. Com seis anos de existência, há uma

presença constante em algumas praças (Nova Iorque, Londres e Los Angeles), mas a

galeria ainda não freqüenta as feiras internacionais de arte. Isto significa que ainda não

há uma rede regular de compradores estrangeiros.

Os artistas da Galeria Choque Cultural têm valorizado desde o começo da atuação da

galeria, promovendo-os no mercado de arte. Isso concretiza a importância das conexões

da galeria no processo de legitimação do artista e de sua produção. Entretanto arte não é

um bom investimento financeiro. Na galeria, a sugestão é que o colecionador nunca crie

expectativas de valorização rápida de nenhuma obra de qualquer artista. A carreira de

um artista é construída num ritmo diferente para cada um, com características e

processos criativos distintos e que precisam de tempos de maturação próprios.

Baixo Ribeiro comenta que o colecionador deve ter consciência de que, ao comprar uma

obra de arte, ele tornar-se parceiro do artista no conjunto da sua obra. Indo mais fundo,

tornar-se investidor de toda a cena artística que gira em torno da sua coleção. O

colecionador ou o investidor de arte contemporânea terá retorno do seu investimento se

alguns fatores convergirem. O primeiro deles é se a obra adquirida tornar-se relevante

na carreira do artista. O segundo fator é se o artista ficar relevante entre os artistas do

seu tempo. Finalmente, o terceiro e último fator é se o artista pertencer a uma cena que

se torne relevante historicamente. Partimos da obra, contextualizando-a na carreira do

artista e contextualizando o artista em seu meio histórico e social.



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   32
contemporânea.
A recomendação para colecionadores iniciantes é saber avaliar e esperar. É preciso um

bom tempo para o colecionador ter retorno sólido do seu investimento. A Galeria

Choque Cultural aconselha seus colecionadores a pensarem que estão construindo um

patrimônio para seus descendentes




3.2.4 – Beto Atílio, colecionador e proprietário de loja de antiguidades.

Tive o prazer de conhecer Beto durante minha visita à sexta edição da SP-Arte. Beto é

um colecionador apaixonado, que faz questão de elencar os artistas que gosta com uma

narrativa para cada peça adquirida. Esse comportamento é comum entre colecionadores:

mostrar sua coleção para quem sabe apreciá-la e contar pormenores do processo de

aquisição, as dúvidas e como as transações foram feitas. Uma narrativa sólida,

romanceada a ponto de quase personificar o objeto de arte.

Durante a visita a feira, Beto apresentou-me alguns artistas, colecionadores e galeristas.

Através de sua rede de contatos foi possível observar que o mercado de arte é pequeno e

todos se conhecem, mesmo com a expressividade internacional que as obras brasileiras

adquiriram nos últimos anos.

É interessante notar que Beto faz o papel intermediário entre os agentes. Em seu

estabelecimento, um misto de antiquário e galeria, ele possui uma coleção de arte junto

com objetos decorativos de produção escassa. Ou seja, após conhecer seu cliente ele o

apresenta ao mercado de arte com sua visão especializada e seu gosto apurado, fazendo

uma seleção de obras interessantes dentro de seu acervo.

Ana Maria Tavares é uma das artistas com a qual Beto se relaciona e ajudou no começo

da carreira. Ele chegou a viajar junto com a artista para representá-la no exterior. Esse

tipo de relacionamento que é próximo ao mecenato é comum entre colecionadores. Ana

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   33
contemporânea.
Ramos, entrevistada anteriormente, afirmou que ela e seu marido ajudam alguns artistas

que ainda não foram descobertos por acreditarem em seu potencial. E essa ajuda não é

necessariamente financeira. Um colecionador possui muitos contatos e, dependendo do

seu grau de importância, um poder de legitimação razoável. Ao abraçar a causa de um

artista novo, ele sinaliza ao mercado que toda sua “expertise” reconhece um novo

talento. Os movimentos no mercado são gradativos, mas ao fazer essa indicação, o

colecionador coloca em evidência para as galerias um elemento novo. Hoje Ana Maria

Tavares é representada pela Galeria Vermelho. Já participou de várias exposições

nacionais e internacionais, tendo obras em acervos importantes. Na quinta edição do

evento, em 2009, as obras de Ana atingiram valores de até U$ 18 mil.

Sobre os valores atingidos pelas obras, Beto comenta que os preços aumentaram

bastante nos últimos tempos. Alguns artistas chegaram a dobrar ou triplicar seu valor

em questão de poucos anos devido ao aumento na demanda. Com a estabilidade

econômica e a projeção de alguns artistas internacionalmente, o mercado de arte

mundial começou a voltar-se para o Brasil. A produção da Geração 80 é a mais concisa

e procurada, pela sua própria cadeia de legitimação. Esse grupo de artistas é um dos

mais valorizados e procurados tanto por colecionadores quanto por fundos de

investimentos, bancos e instituições que apóiam arte e adquirem algumas peças. Ainda

sobre os preços, Beto declarou que em seu estabelecimento não realiza descontos ou

barganhas. Segundo ele, cada peça possui seu preço e isso deve ser respeitado ou a arte

fica banalizada. É a diferença entre preço e valor: o preço diante de uma crise pode ter

que ser reduzido em relação a outros bens, mas o valor de uma obra é aquele atribuído

por críticos, colecionadores, galeristas e toda a cadeia de legitimação de valor do

mercado de arte.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   34
contemporânea.
Beto comentou que geralmente as galerias brasileiras ficam com 20% do valor sobre a

venda de uma peça. Esse percentual é relativamente superior se comparado ao praticado

pelas galerias de Londres e Nova Iorque. Lá se costuma trabalhar com uma margem de

10% sobre o valor final, sem impostos. No caso brasileiro há dois pontos que podem

ajudar a explicar esse comportamento. O primeiro é que o mercado está aquecido e isso

segura os preços em patamares elevados. O segundo é que há um custo para as galerias

nacionais se projetarem internacionalmente. No circuito das artes plásticas, é

imprescindível que a arte contemporânea seja globalizada. É preciso haver

representações nas principais feiras e bienais, é preciso participar de leilões, saber

quando e como realizar doações para museus e instituições. Tudo isso requer recursos

maiores do que para quem está geograficamente inserido no contexto de centro de arte

mundial (Londres e Nova Iorque).




3.2.5 – Visita a sexta edição da SP Arte (Abril/Maio de 2010)

Considerada o maior evento de Arte da América Latina, a SP Arte vem sendo realizada

desde 2005, sempre entre abril e maio. A feira tornou-se parte do calendário da cidade,

seguindo o modelo da inglesa Frieze e da suíça Art Basel. Esses eventos são notórios

por acontecerem em poucos dias, movimentando altos valores e valendo-se de uma

grande concentração dos agentes do mercado de arte interagindo entre si.

O histórico da feira mostra a evolução do mercado de arte brasileiro. Hoje ela pode ser

considerada um termômetro mais acurado que os leilões, servindo para indicar o

tamanho da demanda por arte. Em 2005, em seu início, a feira era tímida diante de um

mercado em que artistas brasileiros precisavam ser reconhecidos internacionalmente

para conseguirem alguma expressividade diante do gosto ainda pouco apurado dos que


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   35
contemporânea.
possuíam os recursos necessários para comprar arte. Ao fazer um estudo dos resultados

das últimas das edições, é possível notar que o volume de negócios cresceu junto com o

número de obras, artistas, galerias e público, como pode ser visto na tabela 4.

Tabela 4 - Resumo de seis anos de SP-ARTE. Fonte Isto é Online (http://www.istoeonline.com.br)




Segundo o Jornal Estado de São Paulo (O ESTADO), o volume de vendas declarado

pela diretora do evento, Fernanda Feitosa, ficou entre R$ 30 e 32 milhões de reais. Um

aumento significativo de 15% se comparado com a edição do ano anterior. Ainda

segundo a mesma reportagem, a Bolsa de Arte do Rio de Janeiro realizou dois leilões

que renderam cerca de R$ 2 milhões cada um, com destaque para tela de Cildo Meireles

(“This Is a Canvas, This Is a Box”, de 1996), que foi arrematada por R$ 400 mil.

A demanda define o formato de apresentação

O primeiro dia da feira é apenas para convidados. Mesmo assim, os colecionadores

possuem um convite especial para calmamente observarem o acervo de cada galeria e as

novidades de seus artistas preferidos antes da abertura oficial para a imprensa e

interessados pela arte. De acordo com vários representantes de galerias, são os


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   36
contemporânea.
colecionadores que movimentam os maiores valores da feira e por isso há esse

tratamento diferenciado. Além de terem tratamento diferenciado na SP-ARTE, os

colecionadores são os mesmos que movimentam os leilões que acontecem na mesma

semana da feira.

Se pensarmos estrategicamente, como nas análises mercadológicas de posicionamento

de marca de AAKER (1998), os colecionadores são o “target” principal de um evento

como esses. Todavia não são os únicos. Além dos agentes já conhecidos e que

movimentam o mercado de arte durante todo o ano, a feira é uma oportunidade de

converter amantes de arte com potencial econômico ativo em novos colecionadores.

Esses últimos podem ser considerados “targets” complementares, cada vez mais

importantes.

Por meio de observação in loco, é possível notar que a feira se organiza para atender a

três tipos de públicos: o colecionador avançado, o colecionador iniciante e o amante de

arte que potencialmente poderá se tornar um colecionador. Nessa última categoria

entram a imprensa especializada, os artistas, os estudantes de arte e toda miríade de

pessoas interessadas ou que trabalham com arte, mas que ainda não despertaram a

necessidade de colecionar. O tratamento é diferenciado para cada “target”, feito de

forma cuidadosa e que de nenhuma maneira exclua potenciais consumidores.

Segundo um representante da Casa Triângulo (importante galeria com sede na cidade de

São Paulo, presente desde a primeira versão da feira), o evento é reconhecido por trazer

sempre o melhor da produção de cada artista. As obras mais conhecidas estão bem

visíveis, ocupando lugares nobres nos stands e constam no catálogo da feira. Elas são as

mais representativas e por isso são mais valorizadas. Nessa sexta edição da feira, a

homenagem feita à artista plástica Maria Martins, a principal representante do



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   37
contemporânea.
movimento surrealista brasileiro, serve como exemplo. Era de sua autoria a peça mais

valiosa exposta na feira: uma escultura estimada em R$ 1,5 milhão. Por representarem o

melhor da produção artística, essas obras atraem um público novo ávido e interessado

em arte, que começa a aprender a colecionar.

Além das obras expressivas e valorizadas, as galerias tem o cuidado de expor trabalhos

mais acessíveis, cujos preços variam em função do suporte, dos materiais, do autor e da

representatividade diante da produção do artista. Essa exposição de obras diversificadas

é racional, feita para criar intencionalmente novos agentes da demanda. Esse “target”

precisa sentir e racionalizar o porquê de adquirir obras de arte. Um evento com muitas

pessoas falando em valores altos e citando obras conhecidas ajuda nesse processo de

familiarização. Um colecionador principiante até pode ter recursos para adquirir uma

dessas obras, mas precisa ser treinado no ato de colecionar para conseguir enxergar

claramente o investimento e a dedicação necessários quando faz uma aquisição. As

obras complementares e mais acessíveis entram então como excelentes opções por

estarem no mesmo contexto curatorial (a galeria) das obras mais conhecidas e

obviamente por serem relativamente mais acessíveis.

Segundo explicação de um representante da Galeria Vermelho (outro expositor

importante, com sede na cidade de São Paulo e também presente desde a primeira

versão do evento), a “aquisição” é como um contrato que o colecionador faz com o

artista. Um casamento de interesses que ganha importância pelos valores envolvidos. Se

as obras fossem muito acessíveis e produzidas em grande quantidade seriam

descartáveis, tornando-se objetos de desejo puramente decorativos. O valor alto é um

seguro que mantém a seriedade das transações no mercado de arte. E o colecionador

precisa acreditar no que está adquirindo.



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   38
contemporânea.
Os altos investimentos são feitos por colecionadores com olhos treinados, ou

assessorados por críticos e curadores que ajudam a criar a expectativa da compra,

valorizando o desejo de consumo e o status que o novo elemento irá determinar ao se

juntar às outras obras da coleção. Em muitas galerias se fala em “namorar a obra antes

de comprá-la”. Essa criação de desejo sustenta os altos valores e transforma o ato da

compra em algo significativo, distante dos acontecimentos do cotidiano. Por isso todos

os agentes evitam falar em “comprar”. No caso de obras de arte o verbo utilizado é

“adquirir”.

De acordo com depoimento do representante do Instituto Moreira Salles, as fotografias

são o suporte ideal para quem está começando a colecionar. As características que

tornam a fotografia um suporte racionalmente recomendado são o seu preço acessível e

seu aspecto de fácil fruição estética – diferente, por exemplo, de uma instalação ou de

uma escultura que necessitam de um apartamento com pé direito de três metros e um

alto investimento. Ainda segundo o mesmo representante, geralmente quem adquire

obras expressivas e valorizadas normalmente faz outras aquisições menores.

Todos os galeristas são prestativos e conseguem em poucas palavras contextualizar as

obras dentro do momento de vida do artista e sua importância na história da arte

brasileira e/ou mundial.           O discurso é geralmente parecido, com mais ou menos

envolvimento dependendo do interesse mostrado pelo potencial comprador, mas pode

ser resumido da seguinte forma:

    a) O artista é apresentado e reconhecido como marca. Os atributos que definem o

         artista e estão presentes na obra em questão são listados e contextualizados para

         mostrara unicidade da possível aquisição;




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   39
contemporânea.
b) A partir disso, segue-se uma cadeia de participações da obra em exposições,

         salientando o contexto diante de sua significância dentro do mercado de arte;

    c) Finalmente, em alguns casos de ex-proprietários notórios, o histórico de

         compradores é citado. Mas não gratuitamente: sempre existe uma narrativa que

         justifica a unicidade da obra e as razões pelas quais tal artista foi descoberto,

         tornando a aquisição quase que um romance único onde o final feliz depende

         apenas da paixão do futuro comprador.

A legitimação e o reconhecimento social através da arte.

Entre os vários agentes do mercado de arte entrevistados, dois colecionadores ingleses

casados e que moram há vinte anos no Brasil, foram os que mais contribuíram para

mapear um histórico da criação da demanda por arte no país. Eles salientaram que a arte

está ocupando o lugar no imaginário das classes mais altas. Esse imaginário estava

dominado pela moda, pelos carros e por outros bens de consumo durante a década de

1990. Em pouco tempo, com a massificação de objetos de luxo, perdeu-se a áurea da

exclusividade. Isso, aliado ao acúmulo de capital e ao período de desenvolvimento

econômico do país na última década, favoreceu o florescimento de arte como opção de

investimento e reconhecimento social. Os artistas brasileiros começaram a ser

valorizados, principalmente os do período de ruptura modernista, no qual o Brasil se

inseriu no contexto artístico mundial. Por isso, os representantes do Grupo da Família

Artística Paulista (artistas de imigração européia que trabalhavam em São Paulo no

começo do século XX) são um exemplo de investimentos mais seguro e valorizado no

contexto atual.

O cultivo do gosto pela arte contemporânea tornou-se símbolo de posição social, de

riqueza e, sobretudo, de conhecimento de uma área que requer dedicação e muitos


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   40
contemporânea.
recursos disponíveis. Ser reconhecido como um colecionador é salientar sua

personalidade através da diferenciação vinda do capital cultural e intelectual adquirido.

“Só há prazer em mostrar nossa coleção para quem tem olhos que reconhecem o

investimento monetário e intelectual representado pelo nosso conjunto de obras. De

certa forma, nossas aquisições nos definem”, eles complementaram no final.




3.2.6 – Professora Dra. Diva Benevides Pinho, economista e estudiosa das artes.

A Professora Dra. Diva Pinho é autora de alguns dos livros que serviram para a

construção da base teórica desta monografia. Ela gentilmente cedeu alguns de seus

livros junto com algumas horas de explicação e comentários a respeito das pesquisas

que fez sobre arte como investimento.                  Professora Diva começou nossa entrevista

comentando que seu interesse por arte começou perto dos cinqüenta anos, quando

procurava outros assuntos para desenvolver seus estudos. Ao pintar seus quadros,

começou a questionar a razão de um Picasso atingir valores milhares de vezes

superiores aos seus. Seu interesse voltou então para a valorização da arte e o processo

de reconhecimento. É preciso complementar que seus quadros até hoje enfeitam as

paredes das salas de professores na Faculdade de Economia da USP.

A arte sempre teve sua representação direcionada pela sociedade e pelos eventos

históricos que marcaram essa sociedade em questão. Algumas vezes servindo a política,

outras vezes servindo a religião, mas sempre gravitando ao redor de eventos importantes

e legitimando-os, determinando-os para a posteridade. Com o desenvolvimento das

cidades italianas no século XIV, surge a figura do Mecenas, com expoente para a

família Medici. Esses agentes, junto com a Igreja e o Estado, foram os principais

formadores da demanda de arte até o surgimento da burguesia. Por conta desses novos


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   41
contemporânea.
entrantes na demanda por arte, o suporte foi diminuído e a arte passou de grandes

murais, tapetes e obras enraizadas na arquitetura espacial para quadros menores e

transportáveis. A arte tomou vida e podia passar de um proprietário para outro. Surge o

mercado de arte e com ele o “marchand”, o conhecedor do mercado que faz a união da

demanda com a oferta.

Ainda existem exemplos de mecenatos e as obras para Igrejas, associações e instituições

públicas continuam até hoje. Nos anos 30, podemos citar o governo americano

financiando artistas que pintavam murais durante o período da grande recessão. Mais

tarde esse grupo caracterizou-se como “muralistas”, influenciados diretamente por

Diego Rivera (mexicano, que visitou os EUA diversas vezes nesse período). Outro

exemplo importante de mecenato, já mencionado nesta monografia, foi Peggy

Guggenheim durante o ápice da segunda grande guerra. Ela emigrou vários artistas

europeus e ajudou o desenvolvimento de um novo tipo de arte, até então desconhecido

nos EUA. Sua influência na sociedade americana permitiu acolher nomes importantes,

como Marcel Duchamp e Max Ernest.

Em nossa época contemporânea podemos pressupor que há um número de amantes das

artes com excedentes econômicos intercambiáveis, o que determina como a produção

artística será feita. Segundo a Professora, mesmo com o receio de magoar a liberdade

artística e a criatividade, quem determina o a direção do mercado é a demanda. Ou seja,

os artistas são famosos porque sua produção foi aceita após um meticuloso julgamento

dos agentes demandantes. Algumas vezes esse julgamento acontece muito tarde, como

no clássico exemplo de Van Gogh, que jamais vendeu um quadro sequer em toda sua

vida e cujas obras são “Blue Chips” do mercado de arte do pós-impressionismo.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   42
contemporânea.
Para quem produzir é uma das perguntas determinantes dentro do mercado de arte, mas

como os discursos de uma demanda fracionada podem ser unidos a ponto de haver

reconhecimentos quase universais dos artistas contemporâneos? Nesse ponto surgem os

influenciadores da demanda, representados pela mídia especializada e pelos galeristas.

A professora exemplifica que um crítico de arte, assim como um crítico gastronômico

ou de qualquer outra atividade, cuja qualidade é determinada através de fatores

subjetivos, tem o poder de ascender ou naufragar a carreira e a produção de um

determinado artista. Quanto mais importante o crítico e o veículo especializado onde ele

manifesta seu julgamento, maior poder de alavancar a credibilidade de um artista ele

possui em suas palavras.

Já os galeristas funcionam como o primeiro filtro, indicando o que pode ser

comercializável ou não, o que pode ser aceito ou não, de acordo com seu conhecimento

das necessidades da demanda. Um exemplo interessante pode ser visto logo após os

acontecimentos de 11 de setembro de 2001. Durante alguns meses, as artes plásticas

embarcaram em representações sóbrias e algumas vezes obscuras. Somente depois da

demanda americana conseguir recuperar certa flexibilidade de julgamento próprio, foi

possível que artistas pudessem comercializar representações questionadoras e

irreverentes do evento.

Com exceção de galeristas famosos como Saatchi e Gagosian, a maioria dos agentes do

mercado primário acabam por voltar-se a mídia especializada e aos críticos como

principal fonte para entender as tendências do mercado e orientar a produção dos

artistas que representam.

A questão da busca pela inovação constante é inerente aos mercados competitivos. Há

evoluções nas formas representativas, pois os artistas devem estar sempre um passo a



BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   43
contemporânea.
frente da cultura de massa. Esse comportamento é exacerbado no mercado brasileiro,

pois arte e conhecimento sobre arte, além de legitimação, são usados também como

fator de segmentação entre classes sociais. A profundidade de conhecimento sobre o

meio permite maior ou menor fruição e reconhecimento de uma obra contemporânea.

Sem referências anteriores e refinamento do gosto, não é possível apreciar em sua

totalidade algumas obras mais complexas. Por isso, ao pensar no que a demanda

brasileira da nova classe média que surgiu na estabilidade econômica da última década

procura, a Professora finaliza indicando que flores, paisagens e elementos bucólicos –

praticamente expulsos das representações abstratas modernas – são os pedidos que ela

mais ouve quando alguém lhe pede um quadro de sua autoria.




3.2.7 – Rafael Rocha Andrade, empresário e colecionador iniciante.

Rafael é um jovem advogado que fez fortuna atuando no mercado de capitais durante a

subida dos preços de petróleo no início do século XXI. Ele se define como emergente

que já possui os elementos de diferenciação de consumo de luxo e não vê mais valor

neles porque se esgotam em si próprios. Então, começou a freqüentar galerias e

exposições de arte com o intuito de começar a investir em alguns artistas, assim como

fez com o mercado de commodities. Mas apesar de ter o capital e o conhecimento

necessários para tal empreitada, Rafael sabe que as perdas e ganhos podem ser muito

maiores se o colecionador iniciante não tiver relações fortes com outros agentes do

mercado. Ele identifica que o conhecimento dos novos artistas e a capacidade de

observar as tendências da arte contemporânea são as principais ferramentas que possui

para fazer um bom investimento.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   44
contemporânea.
Ele conta que ainda não fez uma grande aquisição. Entretanto é freqüentador da “SP-

ARTE Foto”, uma feira de arte focada em fotografia cujos organizadores são os mesmos

da SP-ARTE, onde busca fotografias, o suporte que considera ser um bom investimento

para um colecionador iniciante. Já adquiriu obras do Instituto Moreira Salles, com

destaque para fotos de Otto Stupakoff e Thomaz Farkas. Suas mais ousadas aquisições,

em termos de valores investidos, foram Claudia Jaguaribe e Miguel Rio Branco.

Rafael pondera que, independentemente da cadeia de legitimação de um artista, espera-

se que sua produção mostre algo inovador e disruptivo. Não há criação de novo valor

em algo que repete uma fórmula criativa. Por isso, quando o artista novato arrisca, é o

salto em que os colecionadores precisam prestar atenção. Um novo suporte, uma forma

expressiva diferente, um sistema de leitura que impõe novas interpretações a partir de

um contexto social e histórico únicos. Ele cita Ligia Clark e seus “bichos” como uma

ruptura que hoje é valorizada. As esculturas, que são carinhosamente chamadas de

“bichos”, chegam a valer de 150 a 200 mil reais cada uma. Ainda sobre a cadeia de

legitimação, ele complementa dizendo que a real especulação acontece quando um

artista tem apenas uma grande sacada e, por conta de sua atuação, acaba por sucumbir à

mídia, misturando arte com publicidade sobre a arte. É o caso de Jeff Koons e Vik

Muniz, segundo ele. Não que tais artistas não tenham seu valor, mas eles estão

supervalorizados e fora de seu radar para futuras aquisições. Por isso prefere voltar-se

para quem está começando.

De certa forma, ele pondera, o artista precisa atender aos desejos da demanda. Por isso,

acredita que um investidor bem sucedido deve observar tanto os artistas quanto todos os

outros agentes do mercado para tirar as conclusões da viabilidade de tal artista como

investimento. Ao especializar-se num segmento bem definido, como fotografia

contemporânea, ele pode diminuir os riscos de seu investimento. E define que seu

BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   45
contemporânea.
processo de busca é aberto, primeiro gostando do objeto de arte para depois procurar as

referências que possam atestar o valor ou a possibilidade de investimento para

valorização posterior. Assim, ele espera treinar seu olhar antes de falar de valores. Nos

vernissages que freqüenta, ele já sabe o que será exposto antes da abertura. Então, no

dia de abertura do evento, ele conversa com os agentes do mercado com conhecimento

prévio, buscando o parecer de cada um deles sobre o impacto da exposição na carreira

do artista.

Rafael cita que qualquer um pode ser um colecionador, mesmo com recursos escassos,

dando como exemplo o casal de classe média nova-iorquina que acumulou mais de

quatro mil obras num pequeno apartamento em Manhattan. A vida desses

colecionadores tornou-se um filme chamado “Herb e Dorothy”, SASAKI (2009). Nesse

documentário, o casal é reconhecido por diretores de museus, artistas e outros

conhecedores de arte como os maiores colecionadores de arte minimalista americana.

Herbert e Dorothy Voguel não eram milionários, ele trabalhava como funcionário dos

correios e ela como bibliotecária. Ambos, com a mesma paixão pela arte, começaram a

colecionar com o salário dele enquanto ela pagava as despesas gerais em uma Nova

Iorque da década de 1960. Segundo Rafael, eles identificaram o ponto de virada de um

novo movimento e começaram a entender e colecionar os artistas minimalistas no

momento em que eles ainda não eram reconhecidos pela mídia. Alguns exemplos de

artistas que foram descobertos e reconhecidos pelos Voguel são Robert Mangold, Lucio

Pozzi e James Siena, Todos bastante valorizados no mercado de arte contemporânea por

sua contribuição ao movimento Minimalista. Rafael conclui que está educando seu

olhar para um dia ter propriedade suficiente para conseguir identificar expoentes de um

movimento novo e disruptivo como fizeram o casal retratado nesse documentário.




BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   46
contemporânea.
4 – CONCLUSÕES
4.1 – O valor da arte versus a demanda por arte.

Arte contemporânea é um assunto que possui interpretações divergentes, pois sua

função está em constante transformação, assim como a sociedade para qual ela é

produzida. Mesmo assim, há uma unidade quando se olha para quem a arte é produzida.

A primeira conclusão que salta aos olhos após o cruzamento das entrevistas com os

estudos teóricos é que não importa o suporte, os questionamentos filosóficos ou a

necessidade ou não de ruptura com o passado versus a continuidade: em última

instância, quem determina o que será produzido é a demanda.

Apesar de ser uma afirmação limitadora, que coloca o artista em segundo plano, ela não

tira a criatividade e o fator de inovação e expressão pessoal necessários a qualquer tipo

de arte. A demanda legitima a arte que lhe interessa, podendo ser algo inovador ou

apenas mais uma necessidade de representação que logo será esquecida. Os preços

realizados em leilões apenas refletem o gosto sacramentado da demanda, mas não o

valor artístico produzido para uma sociedade. Não é porque o preço é caro que o artigo

será realmente um ícone dentro da história da arte. Outro argumento plausível: muitas

vezes o que é realmente bom não é absorvido imediatamente pela demanda. Há

exemplos clássicos, como o caso dos impressionistas no final do século XIX, ou mesmo

as vanguardas européias do início do século XX.

HUGUES (2008) e LEWIS (2009) separam claramente a arte como representação,

síntese de um posicionamento filosófico e cultural, da arte como produto, que apenas

responde à expansão de uma demanda não atendida pela escassez inerente à natureza

desse produto. Através desses dois críticos, olhando a produção artística após o estouro

da bolha especulativa em 2009, é possível ver como a especulação está enraizada no


BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte   47
contemporânea.
Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto
Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto
Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto
Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto
Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto

Contenu connexe

En vedette

Formação de preços no varejo
Formação de preços no varejoFormação de preços no varejo
Formação de preços no varejoNathalia Santos
 
Gestão de custos e formação de preços no e-commerce
Gestão de custos e formação de preços no e-commerceGestão de custos e formação de preços no e-commerce
Gestão de custos e formação de preços no e-commerceMILLENNIUM NETWORK®
 
Apostila formacao-preco-vendas
Apostila formacao-preco-vendasApostila formacao-preco-vendas
Apostila formacao-preco-vendasThiagoAJ
 
Processos de formação de preços
Processos de formação de preçosProcessos de formação de preços
Processos de formação de preçosRosane Domingues
 
Palestra - Gestão estratégica de preços
Palestra - Gestão estratégica de preçosPalestra - Gestão estratégica de preços
Palestra - Gestão estratégica de preçosValini & Associates
 
Como baixar os estudo no slideshare
Como baixar os estudo no slideshareComo baixar os estudo no slideshare
Como baixar os estudo no slideshareMoisés Sampaio
 
Passo a passo para baixar slides
Passo a passo para baixar slidesPasso a passo para baixar slides
Passo a passo para baixar slidesDênia Cavalcante
 
A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...
A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...
A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...SlideShare
 

En vedette (10)

Formação de preços no varejo
Formação de preços no varejoFormação de preços no varejo
Formação de preços no varejo
 
Modulo4 henrique santos
Modulo4 henrique santosModulo4 henrique santos
Modulo4 henrique santos
 
Gestão de custos e formação de preços no e-commerce
Gestão de custos e formação de preços no e-commerceGestão de custos e formação de preços no e-commerce
Gestão de custos e formação de preços no e-commerce
 
Apostila formacao-preco-vendas
Apostila formacao-preco-vendasApostila formacao-preco-vendas
Apostila formacao-preco-vendas
 
Processos de formação de preços
Processos de formação de preçosProcessos de formação de preços
Processos de formação de preços
 
Métodos de formação de preços
Métodos de formação de preçosMétodos de formação de preços
Métodos de formação de preços
 
Palestra - Gestão estratégica de preços
Palestra - Gestão estratégica de preçosPalestra - Gestão estratégica de preços
Palestra - Gestão estratégica de preços
 
Como baixar os estudo no slideshare
Como baixar os estudo no slideshareComo baixar os estudo no slideshare
Como baixar os estudo no slideshare
 
Passo a passo para baixar slides
Passo a passo para baixar slidesPasso a passo para baixar slides
Passo a passo para baixar slides
 
A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...
A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...
A Guide to SlideShare Analytics - Excerpts from Hubspot's Step by Step Guide ...
 

Similaire à Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto

Sistema de arte
Sistema de arteSistema de arte
Sistema de arteIpsun
 
Penna; monica brandão oliveira estudo sobre o mercado de artes plásticas em...
Penna; monica brandão oliveira   estudo sobre o mercado de artes plásticas em...Penna; monica brandão oliveira   estudo sobre o mercado de artes plásticas em...
Penna; monica brandão oliveira estudo sobre o mercado de artes plásticas em...Acervo_DAC
 
Santos -projeto_tcc_1._ago.2013
Santos  -projeto_tcc_1._ago.2013Santos  -projeto_tcc_1._ago.2013
Santos -projeto_tcc_1._ago.2013Cristina Zoya
 
Apresentacao artrio atualizada
Apresentacao artrio atualizadaApresentacao artrio atualizada
Apresentacao artrio atualizadafelipediasartrio
 
O P I N I A O
O P I N I A OO P I N I A O
O P I N I A Oana
 
A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...
A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...
A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...Nathália Camargo
 
Espaços autonomos uemg e faop
Espaços autonomos   uemg e faopEspaços autonomos   uemg e faop
Espaços autonomos uemg e faopIpsun
 
Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2
Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2
Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2Cultura e Mercado
 
Dissertação almeida junior a afirmação de uma subjetividad
Dissertação almeida junior   a afirmação de uma subjetividadDissertação almeida junior   a afirmação de uma subjetividad
Dissertação almeida junior a afirmação de uma subjetividadJefferson Geronimo
 
Processos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideia
Processos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideiaProcessos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideia
Processos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideiaAnarqueologia
 
História do Design - Conceitos - Hd01
  História do Design - Conceitos - Hd01  História do Design - Conceitos - Hd01
História do Design - Conceitos - Hd01Valdir Soares
 
Marchands, curadores e galerias de arte_I Parte
Marchands, curadores e galerias de arte_I ParteMarchands, curadores e galerias de arte_I Parte
Marchands, curadores e galerias de arte_I ParteCatarina Argolo
 
A exposição como trabalho de arte. jens hoffmann
A exposição como trabalho de arte. jens hoffmannA exposição como trabalho de arte. jens hoffmann
A exposição como trabalho de arte. jens hoffmannkamillanunes
 
Dissertacao andreapossa
Dissertacao andreapossaDissertacao andreapossa
Dissertacao andreapossaAninhabig
 
Semana Desing e Decoração
Semana Desing e DecoraçãoSemana Desing e Decoração
Semana Desing e DecoraçãoMeio & Mensagem
 

Similaire à Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto (20)

Sistema de arte
Sistema de arteSistema de arte
Sistema de arte
 
Penna; monica brandão oliveira estudo sobre o mercado de artes plásticas em...
Penna; monica brandão oliveira   estudo sobre o mercado de artes plásticas em...Penna; monica brandão oliveira   estudo sobre o mercado de artes plásticas em...
Penna; monica brandão oliveira estudo sobre o mercado de artes plásticas em...
 
Santos -projeto_tcc_1._ago.2013
Santos  -projeto_tcc_1._ago.2013Santos  -projeto_tcc_1._ago.2013
Santos -projeto_tcc_1._ago.2013
 
Prova de arte 4b 7 ano (reparado)
Prova de arte 4b 7 ano (reparado)Prova de arte 4b 7 ano (reparado)
Prova de arte 4b 7 ano (reparado)
 
Apresentacao artrio atualizada
Apresentacao artrio atualizadaApresentacao artrio atualizada
Apresentacao artrio atualizada
 
O P I N I A O
O P I N I A OO P I N I A O
O P I N I A O
 
Arte Lisboa 09
Arte Lisboa 09Arte Lisboa 09
Arte Lisboa 09
 
A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...
A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...
A mediação cultural e a construção de uma vanguarda institucional: O caso da ...
 
Bienal B 2010 apresentação
Bienal B 2010 apresentaçãoBienal B 2010 apresentação
Bienal B 2010 apresentação
 
Projeto Niemeyer
Projeto Niemeyer Projeto Niemeyer
Projeto Niemeyer
 
Espaços autonomos uemg e faop
Espaços autonomos   uemg e faopEspaços autonomos   uemg e faop
Espaços autonomos uemg e faop
 
Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2
Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2
Cemec Mercado das Artes - Baixo Ribeiro - Aula 2
 
Dissertação almeida junior a afirmação de uma subjetividad
Dissertação almeida junior   a afirmação de uma subjetividadDissertação almeida junior   a afirmação de uma subjetividad
Dissertação almeida junior a afirmação de uma subjetividad
 
Processos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideia
Processos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideiaProcessos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideia
Processos da poética: o paradoxo como paradigma - o museu como ideia
 
História do Design - Conceitos - Hd01
  História do Design - Conceitos - Hd01  História do Design - Conceitos - Hd01
História do Design - Conceitos - Hd01
 
Onde encontrar a arte.pdf
Onde encontrar a arte.pdfOnde encontrar a arte.pdf
Onde encontrar a arte.pdf
 
Marchands, curadores e galerias de arte_I Parte
Marchands, curadores e galerias de arte_I ParteMarchands, curadores e galerias de arte_I Parte
Marchands, curadores e galerias de arte_I Parte
 
A exposição como trabalho de arte. jens hoffmann
A exposição como trabalho de arte. jens hoffmannA exposição como trabalho de arte. jens hoffmann
A exposição como trabalho de arte. jens hoffmann
 
Dissertacao andreapossa
Dissertacao andreapossaDissertacao andreapossa
Dissertacao andreapossa
 
Semana Desing e Decoração
Semana Desing e DecoraçãoSemana Desing e Decoração
Semana Desing e Decoração
 

Plus de Alexandre Bessa

Competências valorizadas pelo Mercado Digital
Competências valorizadas pelo Mercado DigitalCompetências valorizadas pelo Mercado Digital
Competências valorizadas pelo Mercado DigitalAlexandre Bessa
 
AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I)
 AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I) AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I)
AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I)Alexandre Bessa
 
AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas
AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas
AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas Alexandre Bessa
 
AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento
AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento
AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento Alexandre Bessa
 
AULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // Persuasão
AULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // PersuasãoAULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // Persuasão
AULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // PersuasãoAlexandre Bessa
 
AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (II)
AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor  (II)AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor  (II)
AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (II)Alexandre Bessa
 
01/04 - Psicologia das Massas
01/04 - Psicologia das Massas01/04 - Psicologia das Massas
01/04 - Psicologia das MassasAlexandre Bessa
 
02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos
02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos
02/04 - Segmentação, Cauda Longa, TribosAlexandre Bessa
 
03/04 - Elementos da Persuasão Digital
03/04 - Elementos da Persuasão Digital03/04 - Elementos da Persuasão Digital
03/04 - Elementos da Persuasão DigitalAlexandre Bessa
 
04/04 - Ferramentas Digitiais
04/04 - Ferramentas Digitiais04/04 - Ferramentas Digitiais
04/04 - Ferramentas DigitiaisAlexandre Bessa
 
Aula 02/03 - Gerenciamento de Projetos
Aula 02/03 - Gerenciamento de ProjetosAula 02/03 - Gerenciamento de Projetos
Aula 02/03 - Gerenciamento de ProjetosAlexandre Bessa
 
Aula 01/03 Consumidor 2.0
Aula 01/03 Consumidor 2.0Aula 01/03 Consumidor 2.0
Aula 01/03 Consumidor 2.0Alexandre Bessa
 
Aula 03/03 - Cardápio Digital
Aula 03/03 - Cardápio DigitalAula 03/03 - Cardápio Digital
Aula 03/03 - Cardápio DigitalAlexandre Bessa
 
INTERCON 2011 - Alexande Bessa
INTERCON 2011 - Alexande BessaINTERCON 2011 - Alexande Bessa
INTERCON 2011 - Alexande BessaAlexandre Bessa
 

Plus de Alexandre Bessa (16)

Big Data
Big DataBig Data
Big Data
 
Competências valorizadas pelo Mercado Digital
Competências valorizadas pelo Mercado DigitalCompetências valorizadas pelo Mercado Digital
Competências valorizadas pelo Mercado Digital
 
Planejamento
PlanejamentoPlanejamento
Planejamento
 
AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I)
 AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I) AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I)
AULA 04 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (I)
 
AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas
AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas
AULA 01 - IdezMarketing - Psicologia das massas
 
AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento
AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento
AULA 02 - IdezMarketing - Segmentação e comportamento
 
AULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // Persuasão
AULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // PersuasãoAULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // Persuasão
AULA 03 - IdezMarketing - Redes Sociais // Persuasão
 
AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (II)
AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor  (II)AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor  (II)
AULA 05 - IdezMarketing - Ferramentas Digitais e o Consumidor (II)
 
01/04 - Psicologia das Massas
01/04 - Psicologia das Massas01/04 - Psicologia das Massas
01/04 - Psicologia das Massas
 
02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos
02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos
02/04 - Segmentação, Cauda Longa, Tribos
 
03/04 - Elementos da Persuasão Digital
03/04 - Elementos da Persuasão Digital03/04 - Elementos da Persuasão Digital
03/04 - Elementos da Persuasão Digital
 
04/04 - Ferramentas Digitiais
04/04 - Ferramentas Digitiais04/04 - Ferramentas Digitiais
04/04 - Ferramentas Digitiais
 
Aula 02/03 - Gerenciamento de Projetos
Aula 02/03 - Gerenciamento de ProjetosAula 02/03 - Gerenciamento de Projetos
Aula 02/03 - Gerenciamento de Projetos
 
Aula 01/03 Consumidor 2.0
Aula 01/03 Consumidor 2.0Aula 01/03 Consumidor 2.0
Aula 01/03 Consumidor 2.0
 
Aula 03/03 - Cardápio Digital
Aula 03/03 - Cardápio DigitalAula 03/03 - Cardápio Digital
Aula 03/03 - Cardápio Digital
 
INTERCON 2011 - Alexande Bessa
INTERCON 2011 - Alexande BessaINTERCON 2011 - Alexande Bessa
INTERCON 2011 - Alexande Bessa
 

Alexandre Bessa - monografia_economia_internaciona_iii_mercado_de_arte_texto

  • 1. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS – FIPE ALEXANDRE REGATTIERI BESSA Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea. São Paulo 2010
  • 2. ALEXANDRE REGATTIERI BESSA Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea. Monografia apresentada na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE, para conclusão do curso de MBA em Economia Internacional, turma III. Área de Concentração: Microeconomia. Orientador: Professor Alexandre de Campos. São Paulo 2010
  • 3. AGRADECIMENTOS À Ana Ramos, Gabriel Zellmeister e Heloísa Alquéres que, entre várias outras coisas, me ensinaram a gostar dos “parangolés” de Lígia Clark e da lucidez de Louise Bourgeois. Ao Henrique Luz, pelas conversas memoráveis sobre legitimação. Ao Baixo Ribeiro, pelo tempo dedicado e pelas explicações detalhadas de seu trabalho. Ao Beto Atílio, que foi meu cicerone durante minha visita à SP-Arte 2010. À Patrícia Sampaio, ao Marcelo Rocha, ao Chip Gasser, ao Otavio Bierrenbach, ao Maurício Daumberg, ao Walter Donat e ao Welder Pinto: amigos cujo apoio foi fundamental para o término desse trabalho. À Professora Dra. Diva Benevides Pinho, que dedicou parte de seu tempo para orientar essa monografia com leituras recomendadas e indicações que enriqueceram esse material que estão prestes a ler.
  • 4. EPÍGRAFE Being good in business is the most fascinating kind of art. During the hippie era people put down the idea of business—they’d say, ‘Money is bad,’ and ‘Working is bad,’ but making money is art and working is art and good business is the best art. – Andy Warhol (1975) Ser bom nos negócios é o tipo mais fascinante de arte. Durante a era hippie, as pessoas criticaram a idéia de fazer negócios. Elas diziam que “Dinheiro é ruim” e que “Trabalhar é ruim”, mas fazer dinheiro é uma arte e trabalhar com arte fazendo bons negócios é a melhor arte de todas. – Andy Warhol (1975)
  • 5. RESUMO BESSA, A. R. Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea. 2010. Monografia (MBA) – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – Fipe, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. A produção de arte é vista como investimento através do estudo dos agentes do mercado de arte na cadeia de valorização e legitimação de obras. A teoria é montada usando autores internacionais, documentários e, sobretudo, a bibliografia da principal estudiosa do mercado brasileiro de artes: Professora Diva Benevides Pinho. Junto a isso tudo estão aplicadas teorias de comportamento de consumo baseados em Microeconomia. O levantamento de hipóteses é então verificado na prática em visitas a feiras, exposições e galerias de arte. A teoria é então complementada por meio de entrevistas com agentes do mercado brasileiro para montar um panorama atualizado das pesquisas da Professora Diva. Palavras-chave: Mercado de arte. Microeconomia. Comportamento de Consumo. Legitimação de produtos abstratos.
  • 6. ABSTRACT BESSA, A. R. Art as investment, pricing and the agents acting in the contemporary art market. 2010. Monograph (MBA) – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – Fipe, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. The process of art production is analyzed as an investment through the study of art market players in the chain of value production and legitimacy of works. The theory is built using international authors, documentaries, and especially the bibliography of the principal scholar of the Brazilian arts: Diva Benevides Pinho. In order to understand market objectives as a whole, theories of consumer behavior based on microeconomics are applied. The hypotheses are verified in practice on visits to fairs, exhibitions and art galleries. The whole theory is then supplemented by interviews with representatives of the Brazilian Art Market to assemble an updated overview of the research started by Professora Diva Benevides Pinho in 1989. Keywords: art market. Microeconomics. Consumer Behavior. Value of abstract products.
  • 7. LISTA DE FIGURAS E TABELAS Figura 1 – Tendência de preços de artistas selecionados: Jeff Koons, Francis Bacon, Andy Warhol e Damien Hirst. Base: 1988=100............................................................... 2 Figura 2 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte: Artprice. Base 100 = valores comercializados em janeiro de 1998. ..................... 4 Figura 3 - Diagrama da hierarquia dos agentes da demanda do mercado de arte contemporânea................................................................................................................ 10 Figura 4 - Valores de venda em leilões públicos filtrados por Andy Warhol e Picasso. Fonte: Artnet................................................................................................................... 12 Figura 5 – Hipótese de aquisição de credibilidade a partir do reconhecimento dos agentes do mercado de arte na formação de “Blue Chips”............................................. 23 Tabela 1 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com)...................................................................... 8 Tabela 2 - Os maiores preços de leilão atingidos por artistas contemporâneos entre julho de 2008 e junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com) .......................... 13 Tabela 3 – Critérios para avaliação de uma obra de arte. Fonte: Bolsa de Arte do Rio de janeiro. (http://www.bolsadearte.com.br)....................................................................... 18 Tabela 4 - Resumo de seis anos de SP-ARTE. Fonte Isto é Online (ISTO É)............... 36
  • 8. SUMÁRIO 1 – INTRODUÇÃO.......................................................................................................................1 2 – DESENVOLVIMENTO TEÓRICO........................................................................................2 2.1 – EM BUSCA DO NOVO PICASSO .................................................................................2 2.2 – OS AGENTES DO MERCADO DE ARTE.....................................................................5 2.2.1 – Artistas.......................................................................................................................5 2.2.2 – Galeristas ...................................................................................................................6 2.2.3 – Museus e Instituições.................................................................................................6 2.2.4 – Grandes Colecionadores ............................................................................................7 2.2.5 – As feiras de arte .........................................................................................................7 2.2.6 – As casas de leilão.......................................................................................................7 2.3 – A BUSCA DA DEMANDA POR EXCLUSIVIDADE E ESTÉTICA............................8 2.3.1 – O mercado de arte primário .......................................................................................9 2.3.2 – O mercado de arte secundário..................................................................................11 2.4 – ARTE COMO INVESTIMENTO ..................................................................................12 2.4.1 – Mercado de arte e tecnologia da informação ...........................................................14 2.4.2 – Razões para considerar arte como investimento......................................................15 2.5 – ATRIBUIÇÃO DE VALOR...........................................................................................17 2.5.1 – Valores intrínsecos...................................................................................................18 2.5.2 – Valores extrínsecos ..................................................................................................20 3 – PARTE PRÁTICA.................................................................................................................25 3.1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS ......................................................................................25 3.2 – RESUMOS .....................................................................................................................26 3.2.1 – Ana Carolina Rocha, colecionadora ........................................................................26 3.2.2 – Henrique Luz. Estudioso, crítico, colecionador e representante do MASP .............28 3.2.3 – Baixo Ribeiro. Fundador da Galeria Choque Cultural.............................................30 3.2.4 – Beto Atílio, colecionador e proprietário de loja de antiguidades.............................33 3.2.5 – Visita a sexta edição da SP Arte (Abril/Maio de 2010)...........................................35 3.2.6 – Professora Dra. Diva Benevides Pinho, economista e estudiosa das artes. .............41 3.2.7 – Rafael Rocha Andrade, empresário e colecionador iniciante. .................................44 4 – CONCLUSÕES .....................................................................................................................47 4.1 – O valor da arte versus a demanda por arte......................................................................47 4.2 – Sobre as hipóteses do aumento da demanda por arte......................................................48 4.3 – Sobre o processo de legitimação do mercado de arte mundial e brasileiro ....................49
  • 9. 4.4 – Fechamento.....................................................................................................................50 5 – BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................51 5.1 – Livros..............................................................................................................................51 5.2 – Documentários................................................................................................................52 5.3 – Sites de períodicos na Internet........................................................................................52
  • 10. 1 – INTRODUÇÃO O mercado de arte contemporânea possui agentes próprios que influenciam na definição do valor de uma obra de arte a partir de um mercado restrito, meticuloso e com regras próprias. Os artistas podem ser observados como marcas que desenvolvem séries de produtos com ciclos de vida determinados pela demanda e valores definidos pela escassez que gera exclusividade. O projeto de monografia surgiu de uma paixão pessoal pelo mercado das artes e pelo desejo de conhecimento do comportamento do consumidor sofisticado numa estrutura de mercado no qual a precificação é algo subjetivo. O mercado de arte brasileiro está em ascensão internacional, o que pode ser comprovado pelas diversas publicações em jornais e pelo prestígio alcançado por alguns artistas no mercado global. O exemplo mais concreto desse crescimento é a formação de feiras como a SP-Arte, que em 2010 está em sua sexta edição, movimentando todos os agentes que atuam no mercado para uma arena comum de negociações, reconhecimento e legitimação. De onde vem o valor da arte? Como se dá o processo de reconhecimento de uma peça física cujo preço ultrapassa diversas vezes o valor dos materiais e do trabalho que a compõe? Nesta monografia será usada a teoria de formação de preço de produto e a teoria de ciclo de vida de produto para conceituar artistas e sua produção, enxergando- os como produtos possíveis de comparação e de precificação. O objetivo principal é mapear uma hipótese estrutural para a formação de preços das obras de arte no mercado mundial e posteriormente, por meio de entrevistas, confirmar essa estrutura dentro do mercado de arte brasileiro. Também faz parte do escopo desta monografia elencar hipóteses para descobrir as razões para o aumento da demanda mundial por arte e a conseqüente disparada de preços do mercado de arte contemporânea. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 1 contemporânea.
  • 11. 2 – DESENVOLVIMENTO TEÓRICO 2.1 – EM BUSCA DO NOVO PICASSO Não existe um consenso generalizado sobre a definição da abrangência cronológica de arte contemporânea. A principal razão é que se trata de um assunto recente que alguns teóricos e as principais casas de leilões divergem entre si quanto à precisão da época correspondente. Para este estudo, serão consideradas as artes plásticas produzidas após a segunda guerra e que foram valorizadas a partir do final da década de 1980. O gráfico da figura 1 mostra os valores aplicados em obras dos quatro produtores mais reconhecidos pelo mercado de arte: Andy Warhol, Francis Bacon, Damien Hirst e Jeff Koons. Figura 1 – Tendência de preços de artistas selecionados: Jeff Koons, Francis Bacon, Andy Warhol e Damien Hirst. Base: 1988=100. Fonte: Artnet. (http://www.artnet.com) De acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), a arte contemporânea possui uma infinidade de suportes e linhas de pensamento, com rupturas agressivas e questionadoras a cada nova teoria ou proposta apresentada. Há então vários momentos de experimentação, como as obras do casal Christo e Jean-Claude, caracterizadas por intervenções em grande escala, fora do ambiente de galerias e museus. O produto final, BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 2 contemporânea.
  • 12. que transita entre os agentes do mercado de arte, não é a obra em si, mas os esboços, fotografias e maquetes de suas montagens. Esta análise é focada na produção de bens de natureza artística comercializáveis, possíveis de serem transportadas e instaladas sem perder seu valor de troca. Instalações temporárias e performances artísticas não serão consideradas, salvo o subproduto criado durante a apresentação artística. O importante é que mesmo sendo efêmero e fixado no tempo, haja um subproduto que possa ser valorado, transportado e legitimado pelos agentes econômicos do mercado de arte. A escolha pelas obras contemporâneas também possui uma razão econômica fundamental: elas são um universo em contínua formação de valor e de legitimação. O conceito de legitimação tem origem político-jurídica e o uso neste trabalho está vinculado à designação de reconhecimento, pelas instituições detentoras de poder e segundo articulações discursivas que esse mesmo poder domina. O olhar da economia sobre esse processo de criação legitimação e valores a partir de conceitos subjetivos é o objeto de estudo desta monografia. Segundo PINHO (2009) e AAKER (1998), para que a arte como produto possa existir é necessário haver uma sociedade com excedentes econômicos intercambiáveis, que reconheça os valores intrínsecos e extrínsecos da produção artística. Ou seja, é preciso que haja um grupo de pessoas cujas necessidades básicas já foram atendidas e que possuam recursos que ainda possam ser trocados. E é preciso que tais pessoas ainda mantenham relações sócio-culturais que promovam a troca desses recursos excedentes por produção artística, valorizada por aspectos subjetivos da própria sociedade e estéticos da própria obra em questão. Ainda de acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), uma obra de arte é um bem único, praticamente inelástico, cuja principal característica é a escassez. A teoria de BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 3 contemporânea.
  • 13. equilíbrio de mercado através do modelo da oferta e da demanda indica que a redução da oferta de determinado produto aumenta seu valor. Quando a escassez tende ao limite (unitário), a função do valor monetário é de fazer a seleção do consumidor e as referências de valor dependem da atuação dos agentes do mercado de arte em um período específico. De acordo com os registros históricos das casas de leilões Sotheby’s e Christie’s, houve um aumento significativo da demanda de arte contemporânea nas últimas décadas. Por conta disso, a produção foi diversificada com o surgimento de novos artistas, galerias, museus, feiras de arte e bienais. O mercado, que já era sofisticado, cresceu consideravelmente em todo mundo como pode ser visto na Figura 2, mas principalmente na Europa Ocidental, nos EUA e Japão, e mais recentemente na China. Entretanto, mesmo com novos produtores e a intensificação do trabalho dos agentes, a demanda por arte contemporânea não conseguiu ser atendida, como mostra a escalada de preços nos últimos 20 anos. Figura 2 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte: Artprice. Base 100 = valores comercializados em janeiro de 1998. (http://www.artprice.com) Segundo PINHO (2009), a utilidade da arte está na fruição estética e na expectativa de retorno sobre o investimento. A autora define o mercado de arte “... tal como o mercado em geral, é um mecanismo por meio do qual compradores e vendedores encontram-se BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 4 contemporânea.
  • 14. em um local real ou virtual para a troca de bens e serviços, fixando preços e quantidades” Já em YENTOB (2009), o crítico de arte propõe uma questão prática das razões pelas quais colecionar uma obra de arte contemporânea, já que pelo mesmo valor é possível comprar uma obra consagrada na história da arte e com sua liquidez monetária garantida. Adam Lindemann, entrevistado nesse documentário, responde a essa questão apontando razões além do investimento e da fruição estética: “Se eu mostrar um Picasso em minha parede, você irá pensar 'Oh, ele é rico e tem um Picasso.' Mas se eu lhe mostrar que tenho o Picasso de amanhã, então você irá perceber que eu tenho algo que nenhuma outra pessoa pode comprar com dinheiro.” Esse processo de legitimação, nesse caso do colecionador identificar um bom investimento e acreditar nele, ocorre em todos os pontos de troca da cadeia de produção e consumo de arte. 2.2 – OS AGENTES DO MERCADO DE ARTE A análise do comportamento e da função dos agentes do mercado de arte permite entender como legitimam obras e as transformam em objetos de fruição e investimento. Cada agente responde a estímulos que convergem para o ganho de valor e a transação no mercado de arte. Tais agentes são analisados a seguir, a partir dos estudos de PINHO (2009), LINDEMANN (2006), THORNTON (2009) e THOMPSON (2008): artistas, galeristas, museus e instituições, grandes colecionadores, feiras de arte e casas de leilão. 2.2.1 – Artistas São os produtores ou criadores de valor. Se tiverem uma produção contínua, reconhecida por críticos e com suporte de um ou mais galeristas por trás, os valores de suas obras tendem a subir de acordo com o número de exposições e mostras que BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 5 contemporânea.
  • 15. participarem. Quanto mais conhecido e recomendado por especialistas, mais chance de ser lembrado pelo público comprador. Há uma relação interessante entre galeristas e artistas que pode ser comparada a relação de clubes de futebol e seus jogadores. Quanto um artista é novo no mercado, deve obedecer a todas as regras de sua galeria, vendendo exclusivamente e deixando com que a galeria fixe os preços. Já quando o artista é famoso, a relação se inverte. Ele trabalha com duas ou mais galerias e influencia na curadoria de compradores, assim como na divisão dos lucros entre galeria e artista. 2.2.2 – Galeristas Os galeristas são os modernos marchands, os primeiros a agregar valor no ciclo do mercado de produção de obras de arte. O bom trabalho de um galerista consiste na escolha do melhor comprador para valorizar o conjunto das obras de um determinado artista. Por isso alguns chegam a financiar artistas que acreditam que sejam promessas bem aceitas no mercado futuro, em troca de exclusividade de venda. Galeristas são os representantes do mercado primário. Vendas feitas por artistas diretamente a colecionadores particulares são desencorajadas, pois o galerista é o agente reconhecido pelo lado da demanda e sabe transitar por ele. Alguns galeristas contemporâneos famosos são Charles Saatchi e Larry Gagosian. Para citar alguns nomes nacionais temos Márcia Fortes e Luísa Strina. 2.2.3 – Museus e Instituições São agentes de divulgação em massa da produção artística. Quando os curadores e patrocinadores de um museu (ou qualquer instituição que tenha coleção ou espaço expositivo) endossam um artista contemporâneo, influenciam indiretamente o valor de suas obras. Por conta disso, existem colecionadores particulares ávidos por expor parte BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 6 contemporânea.
  • 16. de sua coleção, convidando curadores a conhecê-la ou mesmo abrindo seus próprios museus. Também em muitos casos acontecem doações de todo lado da oferta do mercado de arte (artistas, galeristas, colecionadores) ao acervo do museu. As instituições mais importantes para o cenário de arte contemporânea são MOMA, em Nova Iorque, e a Tate Gallery, em Londres. 2.2.4 – Grandes Colecionadores No acervo de um museu, a obra ganha notoriedade e exposição pública. Já num acervo particular, ganha o cunho de quem a adquire. Os grandes colecionadores surgem logo atrás de Museus e Instituições nas preferências de vendas dos galeristas. Nesse caso, são compradores identificados pelo mercado de arte que não vão jogar a leilão apenas para realizar lucro em curto prazo. No Brasil se destaca o empresário Bernardo Paz, que possui parte de seu acervo de arte contemporânea exposto no Instituto Inhotim, em Minas Gerais. 2.2.5 – As feiras de arte Desde o início da década, as feiras de arte se multiplicaram em vários países com excedente econômico intercambiável, incluindo no roteiro várias economias emergentes. Entre elas China, Brasil e Rússia. As feiras mais famosas são Miami Basel (nos EUA), Frieze (na Inglaterra), Basel (na Suíça), Arco (na Espanha). No Brasil, a SP- Arte é realizada duas vezes ao ano, em abril e novembro, esta última dedicada ao mercado de fotografias. 2.2.6 – As casas de leilão Sotheby’s e Christie’s são as casas mais famosas. Durante o leilão, acontece a reclassificação dos objetos de arte. Todo o conjunto de legitimações acumuladas por uma determinada obra ao longo de sua trajetória é avaliado. E mais do que a BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 7 contemporânea.
  • 17. determinação do preço de obras de arte, no leilão se determina os direitos de propriedade de bens artísticos, estabelecendo as identidades sociais dos objetos de arte. A tabela 1 mostra os maiores valores transacionados nas casas de leilão entre 2008 e 2009. No Brasil, podemos citar como exemplos a Bolsa de Arte do Rio de Janeiro. Tabela 1 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com) 2.3 – A BUSCA DA DEMANDA POR EXCLUSIVIDADE E ESTÉTICA De acordo com PINHO (2009), a arte contemporânea vista em galerias e leilões é produzida para um grupo específico de consumidores que representa uma parcela restrita da população mundial. Além de serem detentores de um grande excedente econômico intercambiável, há outras características comuns a esse público que podem ser usadas com o fim de entender o comportamento da demanda. Um comprador de uma obra de mais de um milhão de dólares pertence a uma classe social diferenciada. Seus gastos são exagerados para a média da população. Entretanto, é preciso parametrizar os valores para verificar que há coerência. Em 2009, o proprietário da SAC Capital Advisors, Steve Cohen, arrematou por US$ 12 milhões “The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living”, de Damien BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 8 contemporânea.
  • 18. Hirst. A obra é um tubarão suspenso num aquário gigante com formaldeído. Em THOMPSON (2008, página 3) o economista e escritor usa essa compra para justificar como o estilo de vida dos colecionadores, diante da natureza inelástica da arte contemporânea, acaba por influenciar o preço final do produto de que são os principais compradores. Para colocar o preço de US$ 12 milhões em seu contexto correto é preciso entender o quão rico [o comprador] é. Assumindo que o Sr. Cohen possui capital de US$ 4 bilhões juntamente com um lucro líquido anual de U$ 500 milhões antes dos impostos. Considerando um retorno de 10 por cento sobre o investimento – muito aquém do que seu fundo de investimentos retorna – ele possui um total de US$ 16 milhões por semana, ou US$ 90 mil a hora. O tubarão custou a ele cinco dias de trabalho. Diante desse poderio econômico associado à escassez intrínseca da natureza do produto, é possível levantar a hipótese de que o público ao qual se destina o mercado de arte contemporânea é quem, em última instância, define os limites de preço, através de seu excedente econômico intercambiável. Essa hipótese deverá ser validada durante a fase de pesquisa desta monografia. Diante da impossibilidade de se contabilizar as trocas e as vendas diretas entre colecionadores, elas não estão incluídas nesta análise, mas são consideradas na cadeia de legitimação. 2.3.1 – O mercado de arte primário Segundo LINDEMANN (2006), há duas classes de consumidores com comportamentos distintos, que moldam o mercado de arte e são moldados por ele. No chamado mercado de arte primário, a compra é feita diretamente na galeria que representa o artista em questão. A escassez e a demanda são tão diametralmente opostas que o principal trabalho do galerista é escolher para quem será realizada a venda. A tendência é que a BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 9 contemporânea.
  • 19. venda seja feita para quem irá agregar mais valor ao artista, seguindo uma cadeia de legitimação. Um destaque numa coleção importante valoriza o artista e ajuda a consolidar seu valor no mercado. Por isso o comprador que atua no mercado primário é geralmente próximo das galerias, entende como o mercado funciona, é bem relacionado e atua como investidor em longo prazo no mercado a termo. De acordo com sua importância, citado em YANTOB (2008), os agentes da demanda do mercado de arte contemporânea são: museus públicos, fundações e museus particulares, grandes colecionadores privados, outros colecionadores. Figura 3 - Diagrama da hierarquia dos agentes da demanda do mercado de arte contemporânea. Fonte: própria. O gráfico da figura 3 explicita a relação de ganho de valor para o conjunto da obra do artista versus o preço de comercialização. O caminho da legitimação de uma obra de arte pode ser mais rápido ou mais lento de acordo com a notoriedade dos agentes envolvidos na troca. Uma obra colocada numa instituição pública ou privada é um atestado de credibilidade que transfere valor para o artista, um certificado emitido pela curadoria da instituição que o aceita, que terá mais ou menos valor de acordo com sua notoriedade. Por isso, os preços para estes museus e também outros de menor porte são inferiores aos praticados para colecionadores. E são mais inferiores ainda se BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 10 contemporânea.
  • 20. comparados com os valores para aquisição em leilões. Por conta dos dados das vendas primárias não se tornarem públicos, não é possível representar numericamente as vantagens de se vender mais barato para essas instituições. Entretanto, a lógica da negociação baseada na legitimação pode ser empiricamente comprovada no aumento dos valores de outras obras do mesmo artista, após essa legitimação ter acontecido. 2.3.2 – O mercado de arte secundário Já o mercado secundário, também conhecido como o mercado público dos leilões, é onde a legitimação da obra de arte é publicamente avaliada pelo público interessado. Do ponto de vista da demanda, o mercado secundário é destinado principalmente aos consumidores mais afoitos que procuram validação instantânea e estão dispostos a pagar mais por isso. Além entregar uma obra já legitimada, os leilões indiretamente vendem credibilidade a esses novos colecionadores. O mercado secundário influencia o valor das próximas produções dos artistas comercializados no mercado primário e é onde geralmente ocorrem especulações. O caminho mais fácil para aferir lucros é comprar uma obra de uma galeria de confiança e, meses depois, levá-la a leilão. Mas se todos os consumidores de arte se tornarem especuladores, vendendo em curto prazo, os preços irão cair. Diante disso, a escolha de para quem vender a arte no mercado primário é fundamental. As galerias compartilham listas negras de compradores com comportamento especulativo. Outra característica do mercado secundário é que grandes colecionadores tendem a proteger seus investimentos. Em LEWIS (2008), o empresário José Mugrabi é citado como um dos maiores colecionadores de Andy Warhol. Ele detém cerca de 800 peças do artista em seu acervo. Se levarmos em conta que o artista produziu cerca de 8.000 BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 11 contemporânea.
  • 21. peças durante sua vida, a figura 4 mostra que o senhor Mugrabi possui 10% de participação de um dos investimentos em arte mais lucrativos dos últimos 20 anos. Figura 4 – Valores de venda em leilões públicos filtrados por Andy Warhol e Picasso. Fonte: Artnet. (http://www.artnet.com) Em entrevista a Ben Lewis, José Mugrabi fala abertamente que freqüenta todos os leilões onde há “Warhols” importantes para garantir que o preço de mercado seja mantido. Ele faz isso interferindo através de lances ou mesmo adquirindo a obra se ela não atinge o preço mínimo estipulado pela casa de leilão. Uma venda pública que mostra tendência de queda na demanda de “Warhols” pode representar uma perda significativa na coleção de José Mugrabi. Mas o mesmo raciocínio ao contrário também é válido: qualquer novo pico de vendas de “Warhols” o deixa mais rico. A imagem da figura 4 mostra o pico dos valores de “Warhols” e “Picassos”, considerados pelas casas de leilões os “papéis” mais facilmente comercializáveis. A queda nos valores ao final de 2009 é um reflexo da crise econômica mundial, do mesmo ano. 2.4 – ARTE COMO INVESTIMENTO Em THORNTON (2010), na reportagem especial para a publicação inglesa “The Economist” sobre o mercado de arte e suas perspectivas como investimento, o conceito BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 12 contemporânea.
  • 22. de “Blue Chips” é aplicado ao mercado de arte. Esse é um termo utilizado nas Bolsas de Valores para designar as ações mais negociadas, as mais valorizadas pelo público. O mesmo conceito também é visto em LINDEMANN (2006), com a mesma conotação de objeto aceito como base do mercado de arte: se seu valor for depreciado, o mercado como um todo sofrerá as conseqüências; se seu valor for apreciado, todos ganharam com isso. É possível usar essa hipótese proposta pelos dois autores para elencar alguns artistas como “Blue Chips”. Seus valores não sofrem tendência de queda a não ser que o mercado como um todo esteja em recessão. Dessa forma eles representam, em conjunto, um possível termômetro sobre as trocas ocorridas no mercado de arte. Tabela 2 – Os maiores preços de leilão atingidos por artistas contemporâneos entre julho de 2008 e junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com) Os artistas novos, ainda com pouca credibilidade no mercado, são investimentos mais arriscados e de pouca liquidez. Já uma obra de um artista consagrado que tenha marcado seu processo criativo possui valor histórico e, diante disso, seu potencial de comercialização é grande por sua escassez intrínseca. Na tabela 2 é possível notar alguns “Blue Chips” do mundo da arte contemporânea em ação: seu preço em leilões é disputado e há interesse do mercado em deixá-los assim. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 13 contemporânea.
  • 23. 2.4.1 – Mercado de arte e tecnologia da informação De acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), o mercado de arte se especializou nas últimas décadas aliando-se a tecnologia, usando a tele presença junto com o armazenamento e processamento de dados. O espaço do mercado tornou-se global, num processo que começou nos anos 60 e 70 com a aceitação de que compradores pudessem fazer lances por telefone. As facilidades trazidas pelas conexões da Internet trouxeram mais compradores e aumentaram ainda mais a velocidade e o acesso ao mercado. A tecnologia barateia o acesso, facilitando o alcance global a excedentes econômicos intercambiáveis, uma parte considerável das transações já está sendo realizada através de lances eletrônicos – uma transição análoga às transações que ocorriam fisicamente à custa da força dos pulmões dos operadores na bolsa de valores e agora acontecem atrás de terminais de computadores. Entretanto, os leilões de lotes mais importantes ainda continuam sendo feitos presencialmente. Já com o armazenamento e processamento de dados dos computadores interligados é possível ter acesso rápido aos fatores intrínsecos da obra a ser comercializada, o histórico do artista, o número de exposições em que ela participou, etc. O mapa da legitimidade do artista pode ser construído em poucos segundos a partir de buscas em sites especializados como ArtPrice (http://www.artprice.com) e ArtNet (http://www.artnet.com). As casas de leilões, as galerias, os marchands e até mesmo os artistas usam a Internet e seu poder de alcance global através de catálogos virtuais de seu acervo. O dado mais próximo de um barômetro do mercado é o índice de confiança no mercado de arte, desenvolvido pela empresa ArtPrice. Esse índice baseia-se em respostas obtidas BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 14 contemporânea.
  • 24. com visitantes do site e se propõe a dar, em tempo real, uma leitura de tendências. As perguntas da ArtPrice neste levantamento são: Em sua opinião, seria agora o momento oportuno para comprar obras de arte? [ ] Sim [ ] Não [ ] Talvez É a sua situação financeira melhor ou pior do que era há três meses? [ ] Melhor [ ] Pior [ ] Estável Nos próximos três meses, você espera que o clima econômico seja [ ] Favoráveis [ ] Desfavoráveis [ ] Idêntico Nos próximos três meses, o que você espera que aconteça com o preços de arte? [ ] Aumentem [ ] Caiam [ ] Sejam estabilizados Apesar de pertencer a uma empresa isenta e respeitada pelos agentes do mercado de arte, o “Art Market Confidence Index” sofre críticas pela pouca quantidade de informação e pelo desconhecimento de quem está respondendo a pesquisa. Mesmo assim, é uma referência que pode ser aprimorada. Para isso, a pesquisa deveria ser direcionada reconhecendo os agentes do mercado de arte, sua regionalização e importância dentro desse mercado num dado período de tempo. 2.4.2 – Razões para considerar arte como investimento PINHO (2009, página 73) comenta que apesar do risco contido no investimento em arte, a demanda está “... fortemente ligada ao mercado financeiro, a opinião geral tem sido de que se trata de um bem de luxo escolhido pelo investidor por prazer estético e/ou como proteção contra flutuações econômicas” Diante dessa análise sintética, a autora dá quatro razões para se considerar o investimento em arte, descritas a seguir. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 15 contemporânea.
  • 25. Proteção da poupança contra desvalorização Em momentos de incerteza monetária, os investimentos em propriedades físicas não possuem a liquidez de dinheiro vivo, mas certamente são mais difíceis de perderem seu valor diante de crises. O jornal americano “The Wall Street Journal” publicou em seu site no dia 5 de janeiro de 2010, uma reportagem analisando uma venda de uma obra do artista italiano Giacometti, que foi parte do acervo do Banco de Dresden por 30 anos. A escultura de bronze “Walking Man 1”, leiloada pela Sotheby’s, é considerada emblemática, a mais representativa de toda a produção artística de Giacometti. Por isso seu valor atingiu US$ 104.3 milhões em Londres. O comprador anônimo pagou quatro vezes o valor estimado pela casa de leilões. Essa obra é uma “Blue Chip”. Um investimento que não irá perder seu valor por sua história, sua representatividade e pelo fato de Giacometti fazer parte da cultura mundial com peças em acervos públicos e particulares de bastante credibilidade. Retorno: prazer estético e/ou ganho financeiro O risco de colecionar arte é compensado pelo usufruto do prazer estético que a obra proporciona. O uso desse valor estético não deprecia a obra, observando-se regras de conservação e guarda. Retornando ao raciocínio de Adam Lindeman, o prazer de encontrar o novo Picasso e ser reconhecido por seus pares, no caso outros colecionadores, diz a todos que você possui muito mais do que apenas dinheiro para comprar arte cara. Ao falar sobre o retorno financeiro, Larry Gagosian, numa entrevista em THORTHON (2010), afirma que Andy Warhol é notoriamente o novo Picasso. Suas contribuições para a história da arte ainda não foram totalmente processadas e seu valor ainda deverá subir mais. Gagosian, juntamente com Mugrabi, são os maiores detentores particulares BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 16 contemporânea.
  • 26. de “Warhols” disponíveis no mercado. Esse último dado não deixa a afirmação de Gagosian totalmente isenta. Entretanto, se ele não acreditasse realmente no que fala não teria formado um acervo tão grande assim de apenas um artista. Demanda e oferta de reserva As grandes variações de valores também afetam o mercado de arte. Em períodos de desvalorização, os principais vendedores acabam se tornando compradores, visando o mercado futuro. O mesmo acontece quando há grandes valorizações: pequenos colecionadores começam a atuar como vendedores. PINHO (1989, pagina 142), resume de forma clara e coerente esse comportamento dos consumidores: “... para cada indivíduo há um preço de reserva para uma obra de arte em particular, abaixo do qual a pessoa se torna um demandador de mais quadros e acima o qual se torna um fornecedor de quadros.” Especulação São as negociações no mercado a termo, que obedecem as regras de compra e venda como qualquer outro investimento. Comprar a termo significa que o especulador acredita que obra será valorizada. Vender a termo significa que a crença é inversa, de uma desvalorização em curto tempo. A oferta inelástica ou quase inelástica é a responsável pelo lucro da especulação nesse mercado. 2.5 – ATRIBUIÇÃO DE VALOR Neste item será apresentada uma hipótese de atribuição de valor às obras de arte contemporâneas baseado em análise de marketing de produto de acordo com AAKER (1998). Todo produto comercializável possui valores intrínsecos e extrínsecos que BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 17 contemporânea.
  • 27. influenciam seu valor de troca. Por valores intrínsecos, para este estudo, vamos considerar o que é inerente da obra de arte contando com as características de seu suporte e do meio no qual ela foi produzida. Já no caso de valores extrínsecos, serão pontuados os conceitos subjetivos que existem apenas na mente das pessoas que reconhecem o valor do produto. As obras contemporâneas serão tratadas como parte de uma marca, uma grife destinada ao mercado de alto luxo. A grande diferença é que arte não é um bem de consumo. 2.5.1 – Valores intrínsecos A bolsa de arte do Rio de Janeiro (http://www.bolsadearte.com/) possui em seu site uma forma de avaliação de obras de arte levando em conta suas características físicas. Tais critérios são reproduzidos na tabela 3: Tabela 3 – Critérios para avaliação de uma obra de arte. Fonte: Bolsa de Arte do Rio de janeiro. (http://www.bolsadearte.com.br) BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 18 contemporânea.
  • 28. A origem da obra é importante. Ou seja, a lista de ex-proprietários conta. Esse histórico de compradores funciona como atestado de legitimação e credibilidade do mercado. Por exemplo, se Charles Saatchi, o grande colecionador britânico, está nesta lista, todo o aval de seu conhecimento de mercado é transmitido para obra. Isso não é algo mensurável em porcentagens de valor, mas é um comportamento empírico observado mesmo em mercados regionais. Da mesma forma, o valor do contexto histórico da sociedade aumenta a exclusividade e importância da obra. Se o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (Moma) realiza uma exposição e pede uma obra emprestada, a legitimidade é criada pela curadoria do museu. Num caso nacional, basta recordar a valorização da produção da artista Beatriz Milhazes após a grande retrospectiva feita pelo Instituto Cultural Banco do Brasil no Rio de Janeiro em 2004 e recentemente na Estação Pinacoteca, em 2009. Em THEROUX (2008) e XIAOGANG (2009), o modismo, apesar de ser uma característica intermitente, tem sido determinante nos países emergentes. Rússia, China e Índia têm procurado resgatar sua cultura valorizando artistas do passado recente e, sobretudo, aqueles que historicamente influenciaram a atual produção de arte contemporânea. Associado a esse fator de busca de passado cultural há um grande excedente econômico intercambiável nas camadas sociais mais abastadas desses países, favorecendo a especulação. Mas ao mesmo tempo, também intensificando o resgate de sua identidade através da arte. Apesar de ser outro momento histórico, diferente da arte contemporânea, a valorização do produto nacional é feito em conjunto e os artistas locais contemporâneos são beneficiados. Em THORNTON (2010), é averiguado que BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 19 contemporânea.
  • 29. obras relacionadas ao período do império chinês estão supervalorizadas e não há previsão para que a demanda seja estabilizada. 2.5.2 – Valores extrínsecos Segundo AAKER (1998), os valores extrínsecos de um produto são subjetivos e determinados por um posicionamento de marca. Através desse posicionamento, é possível influenciar o público consumidor reafirmando tendências, corrigindo comportamentos e construindo reputações. No caso do mercado de arte, podemos fazer uma analogia, colocando as obras como se fossem produtos e o artista criador como a marca geradora de valor. Há um caminho longo para que um artista seja legitimado no mercado de arte. Se for encarado como uma marca, deve adquirir credibilidade de vários agentes, num processo que levou 50 anos no caso dos impressionistas e apenas 20 anos com os minimalistas norte-americanos, como é citado em YENTOB (2008). A cada vez que um agente do mercado faz um movimento em direção a produção de um artista, esse último vai ganhando notoriedade como se fosse um marca. A recomendação e transferência de credibilidade num ambiente de variáveis subjetivas é o que influencia a percepção de valor. Não existe um roteiro rígido de como ser legitimado. Um bom exemplo de uma exceção ao caminho esperado é um artista da geração YBA (Young British Artists), que se tornou sinônimo de mercado na primeira década do século XXI: Damien Hirst. O caso desse inglês é emblemático, pois subverteu o caminho normal da venda de sua produção para o mercado primário e fez um leilão massivo com suas obras. Ele usou, no limite, a qualidade mais preciosa de suas obras: a escassez. Como se não bastasse isso, Hirst realizou o leilão um dia após a data histórica da concordata do Leman Brothers (15 de BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 20 contemporânea.
  • 30. setembro de 2008). De acordo com o jornal “The New York Times” de 17 de setembro de 2009, o leilão de Hirst arrecadou US$ 200.7 milhões com venda de 218 itens. No auge da crise financeira, o valor de Hirst não só foi mantido como superado em alguns trabalhos mais iconoclásticos do artista. É possível esquematizar um caminho de ganho de validação e credibilidade que aos poucos legitima a produção artística e fortalece o artista como marca de si mesmo. No próximo capítulo, através de entrevistas com agentes do mercado de arte, esse caminho será testado e ajustado conforme exemplos empíricos sejam relacionados. Além de ser criativo, o artista precisa ter uma temática que seja interessante no período em que atua, sendo reconhecido por seus pares. O passo seguinte é talvez o primeiro grande desafio: encontrar um galerista que possa se responsabilizar pela distribuição e comercialização de suas obras. Com um galerista acolhendo sua produção e muitas vezes comprando toda coleção antes mesmo de ser produzido, o artista consegue dedicar-se ao trabalho. Em GILL (2005), é descrito um exemplo interessante que aconteceu nos anos 60 com a galerista Peggy Guggenheim e o artista Jackson Pollock. Ele recebia mensalmente uma mesada que o libertou para dedicar-se a sua produção. Pollock também contava com grande defensor público, o crítico de arte Clement Greenberg, que abraçou a causa dos expressionistas abstratos e o colocou como ícone do movimento. Voltando a linha de legitimação e credibilidade, após conseguir um galerista, começa o trabalho de divulgação e o “product placement”. Neste trabalho será considerado “product placement” a curadoria dos espaços físicos mais pertinentes, com o objetivo de que as obras sejam vistas pelo maior número de pessoas influentes que possam continuar o processo de legitimação. Esse trabalho pode ser feito tanto pelo artista BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 21 contemporânea.
  • 31. quanto pelo proprietário da galeria, os dois agentes mais interessados no reconhecimento das obras. É possível definir uma hierarquia de poder de legitimação, sendo que há pequenas variações em função da credibilidade do agente que interage com a obra. Por exemplo, uma exposição individual numa galeria do interior de São Paulo fica aquém do empréstimo de uma obra para uma exposição temporária em Berlim. As feiras de arte e bienais também exercem forte poder de legitimação, por serem espaços de grande atração de compradores e interessados em arte. Isso justifica o esforço de galeristas em enviar obras, arcando com custos de transporte e do deslocamento do artista para onde irá ocorrer a feira ou bienal. Um colecionador que cultiva uma coleção respeitável também é um ótimo exemplo de espaço pertinente. Entretanto, o topo da cadeia de legitimação são os museus e acervos de visitação pública. Se os leilões realizam a transformação de objeto mundano em objeto de valor, da mesma forma quando um museu pede uma obra emprestada ele age socialmente exercendo sua função de reconhecimento do objeto como arte. Além de agir como “product placement”, a mídia especializada é o espaço no qual os críticos de arte, os curadores, os leiloeiros, livreiros e expositores prestam o serviço informativo ao mercado da arte. A opinião emitida pela mídia pode validar ou arruinar reputações, ajudando a consolidar um posicionamento de artista como marca ou alertando o mercado para uma possível queda pelo esgotamento do modelo criativo adotado pelo artista sendo avaliado. É o efeito legitimador. O gráfico da figura 5 possui um esboço empírico da organização do mercado de arte, que será posto à prova durante o próximo capítulo desta monografia. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 22 contemporânea.
  • 32. Figura 5 – Hipótese de aquisição de credibilidade a partir do reconhecimento dos agentes do mercado de arte na formação de “Blue Chips”. Fonte: própria. 2.6 – HIPÓTESES PARA AUMENTO DA DEMANDA A análise do mercado de arte permitiu levantar algumas hipóteses para o aumento da demanda que elevou os preços a patamares recordes. Os acontecimentos próximos ao estouro da bolha de 2008 colocaram em cheque a aposta de que o mercado de arte sofreu uma bolha e que não se sustentaria por muito tempo. As hipóteses levantadas abaixo serão validadas e refutadas através de pesquisas de campo, por meio de entrevistas com profissionais do mercado. Análise do efeito “Blue Chip”, que identifica as obras mais seguras e cuja liquidez é garantida; Novos colecionadores em mercados emergentes surgiram nos últimos anos. Sua necessidade de comprar credibilidade ocidental, ou seja, arte já legitimada, ajudou a inflacionar os preços e a descobrir novos agentes produtores locais; Há excesso monetário no mundo por conta da década de crescimento do PIB global. Há mais moeda do que boas opões de investimento, com um número menor de agentes vendendo arte legitimada do que essa nova demanda necessita; BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 23 contemporânea.
  • 33. Quando colecionadores como Larry Gagosian e José Mugrabi detém grande parte da produção de um artista e continuam validando-o, tal certificação legitima a obra pelo contexto dos colecionadores e não pela defesa de ativos econômicos que ambos são detentores; A globalização que trouxe o acesso a qualquer galeria, feira, museu e leilão em tempo real, retirando as fronteiras do mercado. Ao mesmo tempo, a globalização transformou a arte local em interesse mundial, influenciando os valores que são baseados pelo mercado exportador. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 24 contemporânea.
  • 34. 3 – PARTE PRÁTICA 3.1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS Neste capítulo, as hipóteses serão confrontadas em consultas com especialistas do mercado de arte. Entre eles há pessoas ligadas a galerias, colecionadores, museus e artistas. A junção dos pontos de vista dos diferentes agentes do mercado de arte deverá ser generalizada para refutar ou complementar o estudo teórico da primeira parte desse trabalho. Diante do tempo escasso para pesquisa, a decisão mais prática foi recorrer às pessoas próximas que trabalham no mercado de arte em São Paulo e Rio de Janeiro. Encontros por telefone, por e-mail e conversas realizadas na Feira de Arte de São Paulo em Abril de 2010 (SP-ARTE, 6ª. edição) foram os meios para conseguir opiniões e reflexões sobre a precificação do mercado de arte e a explicação para a escalada de valores durante a primeira década do século XXI. Nas próximas páginas serão relatados resumos das entrevistas. A metodologia adotada para entrevistas seguiu uma dinâmica própria, mas sempre atento aos seguintes passos: a) Apresentar o projeto de pesquisa e as expectativas de geração de conhecimento diante das questões propostas. b) As entrevistas devem ser pautadas pelas hipóteses, pedindo ao entrevistado que liste exemplos práticos do mercado toda vez que uma nova informação entrar no contexto. c) As entrevistas também devem checar se o comportamento do mercado globalizado, presente na bibliografia adotada, é aplicável ao mercado local brasileiro. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 25 contemporânea.
  • 35. 3.2 – RESUMOS 3.2.1 – Ana Carolina Rocha, colecionadora Ana coleciona arte há mais de vinte anos. Trabalhou como publicitária e nunca deixou a paixão pelas artes ser algo secundário em sua vida. Estuda bastante arte contemporânea, já visitou as principais feiras e conhece pessoalmente artistas nacionais e internacionais. Sua experiência como colecionadora é manifestada em seus questionamentos quando obras atingem valores além dos suportados pela demanda não especulativa. O comportamento de um colecionador é como um vício: ele persegue cada nova aquisição durante um longo tempo e acredita no artista que está comprando. Segundo Ana, arte é um bom investimento quando você entende e gosta de arte. Do contrário, pode servir como uma forma nada inteligente de empatar dinheiro apenas como aspecto decorativo. Ana explicou que os leilões são arenas onde os mesmos jogadores se encontram sempre. No mercado brasileiro, há pouquíssimas pessoas que podem vislumbrar a compra de um objeto de arte e todas se conhecem. O grande segredo, segundo ela, é prestar atenção nos catálogos naquilo que pode estar avaliada abaixo de seu valor de mercado. Tal situação acontece várias vezes porque há modismos no mercado que influem no preço, sem prestar atenção para a essência e o histórico das obras e do artista. Muitas vezes esse modismo faz com que obras interessantes sejam descartadas no mercado a um preço convidativo, mas apenas quem tem olho treinado consegue aproveitar tais ofertas. Por isso, a figura do curador ou do arquiteto especialista em arte é muito comum no eixo Rio-São Paulo. Há obras que jamais perderão seu valor, comparáveis às ruínas da civilização greco- romana que foram descobertas durante o renascimento italiano. O valor representativo BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 26 contemporânea.
  • 36. irá transparecer mesmo que outras instituições civilizatórias importantes venham a ser questionadas. O ponto é que arte quando consegue ser separada do modismo, vira uma representação da humanidade. Esse é o conceito de “Blue Chips”, explicado de uma forma não econômica pela entrevistada. Ana também comentou que, em última análise, os compradores é que determinam o preço das obras. Seja pelo seu relacionamento com os artistas, com as galerias ou mesmo pela sua habilidade em participar de leilões, os compradores ditam os valores que individualizam as obras. Atualmente, os preços da arte brasileira estão bem elevados e há produções e artistas que ultrapassam o caminho da arte para quase caírem no marketing e na publicidade. Diante dessa afirmação, Ana começou a relacionar os preços da chamada “Street Art”, que se encontram inflacionados desde que foram adotados pelas revistas de comportamento direcionadas para classe A/B. O fenômeno começou no início da década quando os pichadores ganharam o status de grafiteiros por transformarem o cenário urbano com seus questionamentos e críticas. Nesse movimento recente, OSGEMEOS são dois artistas plásticos gêmeos que trabalham juntos desde o começo do movimento que saiu das ruas e foi parar dentro das galerias. Eles são o ícone de um grupo de artistas cuja trajetória encontra-se no ápice do mercado, de acordo com os preços praticados na última SP-ARTE. Ainda segundo Ana, quando um suporte artístico se sujeita pelo modismo a ser enquadrado em padrões pré-determinados, ele perde sua originalidade e parte de sua legitimação adquirida ao longo dos anos. Um graffiti não se tornará arte por estar emoldurado, dentro de uma galeria. Isso, na verdade, é nocivo, pois retira a obra de seu contexto, que é estar nas ruas. Essa relação delicada, segundo ela, é que faz com que o “Street Art” esteja no início de seu declínio, sendo arrebatado principalmente por colecionadores de capitais distantes. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 27 contemporânea.
  • 37. 3.2.2 – Henrique Luz. Estudioso, crítico, colecionador e representante do MASP Henrique já trabalhou diretamente com artistas e hoje é responsável por parte das montagens e exposições do MASP. Ele não é curador, mas acaba sendo responsável por projetos especiais, marketing e pela assessoria de imprensa do museu. Ao saber do assunto principal e das hipóteses da monografia, ele mencionou um fator importante em todo o processo de legitimação listado na parte teórica: os relacionamentos entre pessoas que favorecem a distribuição da legitimidade. Os artistas contemporâneos vivem sua própria marca e seu desempenho social reflete seu valor de mercado. Eles devem aparecer e se movimentar, expandindo seu núcleo de influência para adquirirem reconhecimento. Nesse instante, a proximidade com a classe social que possui excedente econômico suficiente para comprar arte é fundamental. É a diferença de vender arte na rua atrás do MASP e de começar com a curadoria na galeria de um conhecido da família. Esse ponto demonstra um alto custo de entrada no mercado. É uma restrição que ajuda a manter os preços altos e a exclusividade de participação. Não basta ser bom e ter uma proposta artística coerente e em voga com o ambiente que o cerca. É preciso ter os contatos certos para conseguir projeção. Sobre Instituições que funcionam como bancos centrais de legitimação, o MASP é citado como exemplo. Sendo um dos principais museus da América Latina, quando o MASP se curva para uma específica manifestação artística, ele outorga todos seus anos de curadoria e sábias aquisições de obras para os artistas escolhidos. Assim acontece com a exposição anual da Coleção Pirelli, que ano após ano ajuda a legitimar a fotografia e os artistas relacionados. Outro exemplo interessante foi a “Street Art” ter invadido o pavilhão inferior do MASP no final de 2009. Esse evento ajudou a valorizar a Galeria Choque Cultural e os artistas que participaram da mostra coletiva. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 28 contemporânea.
  • 38. Há uma particularidade na arte contemporânea brasileira que se refere aos artistas que começaram a produzir durante a década de 1980. Os jornalistas culturais cunharam esse grupo como “Geração 80”. Entre os agentes do mercado de arte, a principal característica deste grupo é ser legitimado por críticos e curadores, possuindo coerência em sua produção artística e com várias retrospectivas sobre o conjunto das obras. Tais artistas são considerados colecionáveis pelo histórico que representam e pela ligação temática e formal que existe entre eles. “Blue Chips” nacionais, apostáveis como investimento por quem se identifica com seus expoentes. Os principais representantes são Alex Flemming, Beatriz Milhazes, Daniel Senise, Leda Catunda, Leonilson, Luis Ernesto, Luiz Zerbini e Nuno Ramos. Foram estes que foram lembrados durante a entrevista e são os que relativamente aparecem mais nos catálogos e nos leilões de arte contemporânea brasileira. Henrique também fez um comentário que não está descrito no processo de formação de valor: o artista é detentor da primazia da idéia. Por exemplo, Jeff Koons, Louise Borgeois e Tomie Othake fazem projetos grandiosos que são executados por mestres de obras e uma grande variedade de artesãos. Eles controlam uma oficina que muitas vezes pode estar localizada na China, no caso de Jeff Koons. A produção artística se tornou um processo especializado, quase industrial, mas que toma todo o cuidado para não acabar com seu principal valor intrínseco – a escassez. Henrique finaliza enfatizando que o mercado de arte possui altos e baixos como qualquer mercado, sempre com alguns agentes interessados em apostar na subida ou na queda, pois a especulação bem feita gera dinheiro. Para entrar no mercado é preciso uma boa dose de sangue frio e muito dinheiro disponível. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 29 contemporânea.
  • 39. 3.2.3 – Baixo Ribeiro. Fundador da Galeria Choque Cultural A galeria Choque Cultural é especializada em novos artistas da geração “Street Art”, que saiu das ruas para as galerias e se tornaram populares em meados da década. O espaço expositivo é mutante e cuidado nos mínimos detalhes pelos próprios artistas, que transformam suas exposições em autênticas instalações, nas quais as obras são imersas. Segundo Baixo Ribeiro, a galeria teve papel importante na valorização das novas formas de arte que começaram pelos jovens e que agora se encontram nos holofotes dos colecionadores. Cada artista, no processo de inserção no mundo da arte, deve ter seu trabalho reconhecido em algumas instâncias. A primeira é sempre a dos amigos, colegas e da escola. Em seguida, vêm os salões e prêmios que são pouco representativos no Brasil. Um dos caminhos para dar suporte a novos artistas é o intercâmbio e a parceria com galerias estrangeiras, dando oportunidade de residência dos artistas da Galeria Choque Cultural em outros países. Em contrapartida, a galeria também convida artistas estrangeiros para trabalhar no Brasil e assim conhecerem a produção nacional, influenciarem nossos artistas e, ao mesmo tempo, serem influenciados por eles. Os museus são órgãos de reconhecimento por sua própria definição. Existe nesse campo, toda uma escala de importância que depende da hierarquia das instituições, dos curadores envolvidos e da própria natureza das exposições em questão. O que importa para o currículo do artista é a qualidade de cada participação e a coerência com a sua carreira. Outro patamar de reconhecimento importante para o artista plástico é a literatura em torno dele. Livros bem editados, teses universitárias, ensaios feitos por críticos importantes são fatores que aumentam a exposição e a legitimidade dos artistas. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 30 contemporânea.
  • 40. Entrar no mercado de arte e criar uma rede de colecionadores em torno de si é uma opção para o artista, mas não uma regra. Os artistas podem criar outras formas de parceria para realização de seus projetos, que independam dos colecionadores. Podemos citar como exemplos para sair da sombra dos colecionadores o mecenato, as comissões estatais ou a associação com outros tipos de patrocinadores. Mas o modelo considerado como melhor ainda é a inserção no mercado através da representação por galerias de arte. Existem diversos modelos de relacionamento entre artistas e galerias, mas é bom lembrar que vão desde a galeria-educativa – que forma artistas e colecionadores, como a Choque – até galerias que praticam a simples comercialização de obras. Já os colecionadores vão desde os institucionais, que compram para museus e outros acervos importantes, até o colecionador mais simples, que compra apenas “para decorar a casa”. Olhando sem preconceito para qualquer categoria intermediária, todos têm o poder de legitimar um artista. Há casos em que alguns colecionadores colaboram indiretamente entre si, formando uma rede de apoio em torno de um determinado artista. Essa comunidade age como um grupo de fãs que custeiam projetos com pequenas aquisições. Em certos casos, conseguem viabilizar projetos mais ousados dividindo o risco do investimento e cobrindo custos de material. Isso acontece não só pela compra de originais, mas também pela comercialização de múltiplos, que são um número determinado de cópias de uma obra, geralmente de suporte fotográfico ou computadorizado. Livros e produtos industrializados com referências iconográficas da produção do artista em questão também entram como suporte de investimento. Alguns artistas chegam a envolver-se na divulgação de produtos populares, tendo suas imagens emprestadas para campanhas publicitárias. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 31 contemporânea.
  • 41. A fama e popularidade também podem ser consideradas instâncias de reconhecimento muito importante para alguns artistas, mas não necessariamente de todos. Cada caso é um caso e a galeria deve projetar o artista de acordo com sua essência. Há muitos colecionadores estrangeiros acompanhando o trabalho dos artistas representados pela Galeria Choque Cultural. Com seis anos de existência, há uma presença constante em algumas praças (Nova Iorque, Londres e Los Angeles), mas a galeria ainda não freqüenta as feiras internacionais de arte. Isto significa que ainda não há uma rede regular de compradores estrangeiros. Os artistas da Galeria Choque Cultural têm valorizado desde o começo da atuação da galeria, promovendo-os no mercado de arte. Isso concretiza a importância das conexões da galeria no processo de legitimação do artista e de sua produção. Entretanto arte não é um bom investimento financeiro. Na galeria, a sugestão é que o colecionador nunca crie expectativas de valorização rápida de nenhuma obra de qualquer artista. A carreira de um artista é construída num ritmo diferente para cada um, com características e processos criativos distintos e que precisam de tempos de maturação próprios. Baixo Ribeiro comenta que o colecionador deve ter consciência de que, ao comprar uma obra de arte, ele tornar-se parceiro do artista no conjunto da sua obra. Indo mais fundo, tornar-se investidor de toda a cena artística que gira em torno da sua coleção. O colecionador ou o investidor de arte contemporânea terá retorno do seu investimento se alguns fatores convergirem. O primeiro deles é se a obra adquirida tornar-se relevante na carreira do artista. O segundo fator é se o artista ficar relevante entre os artistas do seu tempo. Finalmente, o terceiro e último fator é se o artista pertencer a uma cena que se torne relevante historicamente. Partimos da obra, contextualizando-a na carreira do artista e contextualizando o artista em seu meio histórico e social. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 32 contemporânea.
  • 42. A recomendação para colecionadores iniciantes é saber avaliar e esperar. É preciso um bom tempo para o colecionador ter retorno sólido do seu investimento. A Galeria Choque Cultural aconselha seus colecionadores a pensarem que estão construindo um patrimônio para seus descendentes 3.2.4 – Beto Atílio, colecionador e proprietário de loja de antiguidades. Tive o prazer de conhecer Beto durante minha visita à sexta edição da SP-Arte. Beto é um colecionador apaixonado, que faz questão de elencar os artistas que gosta com uma narrativa para cada peça adquirida. Esse comportamento é comum entre colecionadores: mostrar sua coleção para quem sabe apreciá-la e contar pormenores do processo de aquisição, as dúvidas e como as transações foram feitas. Uma narrativa sólida, romanceada a ponto de quase personificar o objeto de arte. Durante a visita a feira, Beto apresentou-me alguns artistas, colecionadores e galeristas. Através de sua rede de contatos foi possível observar que o mercado de arte é pequeno e todos se conhecem, mesmo com a expressividade internacional que as obras brasileiras adquiriram nos últimos anos. É interessante notar que Beto faz o papel intermediário entre os agentes. Em seu estabelecimento, um misto de antiquário e galeria, ele possui uma coleção de arte junto com objetos decorativos de produção escassa. Ou seja, após conhecer seu cliente ele o apresenta ao mercado de arte com sua visão especializada e seu gosto apurado, fazendo uma seleção de obras interessantes dentro de seu acervo. Ana Maria Tavares é uma das artistas com a qual Beto se relaciona e ajudou no começo da carreira. Ele chegou a viajar junto com a artista para representá-la no exterior. Esse tipo de relacionamento que é próximo ao mecenato é comum entre colecionadores. Ana BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 33 contemporânea.
  • 43. Ramos, entrevistada anteriormente, afirmou que ela e seu marido ajudam alguns artistas que ainda não foram descobertos por acreditarem em seu potencial. E essa ajuda não é necessariamente financeira. Um colecionador possui muitos contatos e, dependendo do seu grau de importância, um poder de legitimação razoável. Ao abraçar a causa de um artista novo, ele sinaliza ao mercado que toda sua “expertise” reconhece um novo talento. Os movimentos no mercado são gradativos, mas ao fazer essa indicação, o colecionador coloca em evidência para as galerias um elemento novo. Hoje Ana Maria Tavares é representada pela Galeria Vermelho. Já participou de várias exposições nacionais e internacionais, tendo obras em acervos importantes. Na quinta edição do evento, em 2009, as obras de Ana atingiram valores de até U$ 18 mil. Sobre os valores atingidos pelas obras, Beto comenta que os preços aumentaram bastante nos últimos tempos. Alguns artistas chegaram a dobrar ou triplicar seu valor em questão de poucos anos devido ao aumento na demanda. Com a estabilidade econômica e a projeção de alguns artistas internacionalmente, o mercado de arte mundial começou a voltar-se para o Brasil. A produção da Geração 80 é a mais concisa e procurada, pela sua própria cadeia de legitimação. Esse grupo de artistas é um dos mais valorizados e procurados tanto por colecionadores quanto por fundos de investimentos, bancos e instituições que apóiam arte e adquirem algumas peças. Ainda sobre os preços, Beto declarou que em seu estabelecimento não realiza descontos ou barganhas. Segundo ele, cada peça possui seu preço e isso deve ser respeitado ou a arte fica banalizada. É a diferença entre preço e valor: o preço diante de uma crise pode ter que ser reduzido em relação a outros bens, mas o valor de uma obra é aquele atribuído por críticos, colecionadores, galeristas e toda a cadeia de legitimação de valor do mercado de arte. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 34 contemporânea.
  • 44. Beto comentou que geralmente as galerias brasileiras ficam com 20% do valor sobre a venda de uma peça. Esse percentual é relativamente superior se comparado ao praticado pelas galerias de Londres e Nova Iorque. Lá se costuma trabalhar com uma margem de 10% sobre o valor final, sem impostos. No caso brasileiro há dois pontos que podem ajudar a explicar esse comportamento. O primeiro é que o mercado está aquecido e isso segura os preços em patamares elevados. O segundo é que há um custo para as galerias nacionais se projetarem internacionalmente. No circuito das artes plásticas, é imprescindível que a arte contemporânea seja globalizada. É preciso haver representações nas principais feiras e bienais, é preciso participar de leilões, saber quando e como realizar doações para museus e instituições. Tudo isso requer recursos maiores do que para quem está geograficamente inserido no contexto de centro de arte mundial (Londres e Nova Iorque). 3.2.5 – Visita a sexta edição da SP Arte (Abril/Maio de 2010) Considerada o maior evento de Arte da América Latina, a SP Arte vem sendo realizada desde 2005, sempre entre abril e maio. A feira tornou-se parte do calendário da cidade, seguindo o modelo da inglesa Frieze e da suíça Art Basel. Esses eventos são notórios por acontecerem em poucos dias, movimentando altos valores e valendo-se de uma grande concentração dos agentes do mercado de arte interagindo entre si. O histórico da feira mostra a evolução do mercado de arte brasileiro. Hoje ela pode ser considerada um termômetro mais acurado que os leilões, servindo para indicar o tamanho da demanda por arte. Em 2005, em seu início, a feira era tímida diante de um mercado em que artistas brasileiros precisavam ser reconhecidos internacionalmente para conseguirem alguma expressividade diante do gosto ainda pouco apurado dos que BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 35 contemporânea.
  • 45. possuíam os recursos necessários para comprar arte. Ao fazer um estudo dos resultados das últimas das edições, é possível notar que o volume de negócios cresceu junto com o número de obras, artistas, galerias e público, como pode ser visto na tabela 4. Tabela 4 - Resumo de seis anos de SP-ARTE. Fonte Isto é Online (http://www.istoeonline.com.br) Segundo o Jornal Estado de São Paulo (O ESTADO), o volume de vendas declarado pela diretora do evento, Fernanda Feitosa, ficou entre R$ 30 e 32 milhões de reais. Um aumento significativo de 15% se comparado com a edição do ano anterior. Ainda segundo a mesma reportagem, a Bolsa de Arte do Rio de Janeiro realizou dois leilões que renderam cerca de R$ 2 milhões cada um, com destaque para tela de Cildo Meireles (“This Is a Canvas, This Is a Box”, de 1996), que foi arrematada por R$ 400 mil. A demanda define o formato de apresentação O primeiro dia da feira é apenas para convidados. Mesmo assim, os colecionadores possuem um convite especial para calmamente observarem o acervo de cada galeria e as novidades de seus artistas preferidos antes da abertura oficial para a imprensa e interessados pela arte. De acordo com vários representantes de galerias, são os BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 36 contemporânea.
  • 46. colecionadores que movimentam os maiores valores da feira e por isso há esse tratamento diferenciado. Além de terem tratamento diferenciado na SP-ARTE, os colecionadores são os mesmos que movimentam os leilões que acontecem na mesma semana da feira. Se pensarmos estrategicamente, como nas análises mercadológicas de posicionamento de marca de AAKER (1998), os colecionadores são o “target” principal de um evento como esses. Todavia não são os únicos. Além dos agentes já conhecidos e que movimentam o mercado de arte durante todo o ano, a feira é uma oportunidade de converter amantes de arte com potencial econômico ativo em novos colecionadores. Esses últimos podem ser considerados “targets” complementares, cada vez mais importantes. Por meio de observação in loco, é possível notar que a feira se organiza para atender a três tipos de públicos: o colecionador avançado, o colecionador iniciante e o amante de arte que potencialmente poderá se tornar um colecionador. Nessa última categoria entram a imprensa especializada, os artistas, os estudantes de arte e toda miríade de pessoas interessadas ou que trabalham com arte, mas que ainda não despertaram a necessidade de colecionar. O tratamento é diferenciado para cada “target”, feito de forma cuidadosa e que de nenhuma maneira exclua potenciais consumidores. Segundo um representante da Casa Triângulo (importante galeria com sede na cidade de São Paulo, presente desde a primeira versão da feira), o evento é reconhecido por trazer sempre o melhor da produção de cada artista. As obras mais conhecidas estão bem visíveis, ocupando lugares nobres nos stands e constam no catálogo da feira. Elas são as mais representativas e por isso são mais valorizadas. Nessa sexta edição da feira, a homenagem feita à artista plástica Maria Martins, a principal representante do BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 37 contemporânea.
  • 47. movimento surrealista brasileiro, serve como exemplo. Era de sua autoria a peça mais valiosa exposta na feira: uma escultura estimada em R$ 1,5 milhão. Por representarem o melhor da produção artística, essas obras atraem um público novo ávido e interessado em arte, que começa a aprender a colecionar. Além das obras expressivas e valorizadas, as galerias tem o cuidado de expor trabalhos mais acessíveis, cujos preços variam em função do suporte, dos materiais, do autor e da representatividade diante da produção do artista. Essa exposição de obras diversificadas é racional, feita para criar intencionalmente novos agentes da demanda. Esse “target” precisa sentir e racionalizar o porquê de adquirir obras de arte. Um evento com muitas pessoas falando em valores altos e citando obras conhecidas ajuda nesse processo de familiarização. Um colecionador principiante até pode ter recursos para adquirir uma dessas obras, mas precisa ser treinado no ato de colecionar para conseguir enxergar claramente o investimento e a dedicação necessários quando faz uma aquisição. As obras complementares e mais acessíveis entram então como excelentes opções por estarem no mesmo contexto curatorial (a galeria) das obras mais conhecidas e obviamente por serem relativamente mais acessíveis. Segundo explicação de um representante da Galeria Vermelho (outro expositor importante, com sede na cidade de São Paulo e também presente desde a primeira versão do evento), a “aquisição” é como um contrato que o colecionador faz com o artista. Um casamento de interesses que ganha importância pelos valores envolvidos. Se as obras fossem muito acessíveis e produzidas em grande quantidade seriam descartáveis, tornando-se objetos de desejo puramente decorativos. O valor alto é um seguro que mantém a seriedade das transações no mercado de arte. E o colecionador precisa acreditar no que está adquirindo. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 38 contemporânea.
  • 48. Os altos investimentos são feitos por colecionadores com olhos treinados, ou assessorados por críticos e curadores que ajudam a criar a expectativa da compra, valorizando o desejo de consumo e o status que o novo elemento irá determinar ao se juntar às outras obras da coleção. Em muitas galerias se fala em “namorar a obra antes de comprá-la”. Essa criação de desejo sustenta os altos valores e transforma o ato da compra em algo significativo, distante dos acontecimentos do cotidiano. Por isso todos os agentes evitam falar em “comprar”. No caso de obras de arte o verbo utilizado é “adquirir”. De acordo com depoimento do representante do Instituto Moreira Salles, as fotografias são o suporte ideal para quem está começando a colecionar. As características que tornam a fotografia um suporte racionalmente recomendado são o seu preço acessível e seu aspecto de fácil fruição estética – diferente, por exemplo, de uma instalação ou de uma escultura que necessitam de um apartamento com pé direito de três metros e um alto investimento. Ainda segundo o mesmo representante, geralmente quem adquire obras expressivas e valorizadas normalmente faz outras aquisições menores. Todos os galeristas são prestativos e conseguem em poucas palavras contextualizar as obras dentro do momento de vida do artista e sua importância na história da arte brasileira e/ou mundial. O discurso é geralmente parecido, com mais ou menos envolvimento dependendo do interesse mostrado pelo potencial comprador, mas pode ser resumido da seguinte forma: a) O artista é apresentado e reconhecido como marca. Os atributos que definem o artista e estão presentes na obra em questão são listados e contextualizados para mostrara unicidade da possível aquisição; BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 39 contemporânea.
  • 49. b) A partir disso, segue-se uma cadeia de participações da obra em exposições, salientando o contexto diante de sua significância dentro do mercado de arte; c) Finalmente, em alguns casos de ex-proprietários notórios, o histórico de compradores é citado. Mas não gratuitamente: sempre existe uma narrativa que justifica a unicidade da obra e as razões pelas quais tal artista foi descoberto, tornando a aquisição quase que um romance único onde o final feliz depende apenas da paixão do futuro comprador. A legitimação e o reconhecimento social através da arte. Entre os vários agentes do mercado de arte entrevistados, dois colecionadores ingleses casados e que moram há vinte anos no Brasil, foram os que mais contribuíram para mapear um histórico da criação da demanda por arte no país. Eles salientaram que a arte está ocupando o lugar no imaginário das classes mais altas. Esse imaginário estava dominado pela moda, pelos carros e por outros bens de consumo durante a década de 1990. Em pouco tempo, com a massificação de objetos de luxo, perdeu-se a áurea da exclusividade. Isso, aliado ao acúmulo de capital e ao período de desenvolvimento econômico do país na última década, favoreceu o florescimento de arte como opção de investimento e reconhecimento social. Os artistas brasileiros começaram a ser valorizados, principalmente os do período de ruptura modernista, no qual o Brasil se inseriu no contexto artístico mundial. Por isso, os representantes do Grupo da Família Artística Paulista (artistas de imigração européia que trabalhavam em São Paulo no começo do século XX) são um exemplo de investimentos mais seguro e valorizado no contexto atual. O cultivo do gosto pela arte contemporânea tornou-se símbolo de posição social, de riqueza e, sobretudo, de conhecimento de uma área que requer dedicação e muitos BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 40 contemporânea.
  • 50. recursos disponíveis. Ser reconhecido como um colecionador é salientar sua personalidade através da diferenciação vinda do capital cultural e intelectual adquirido. “Só há prazer em mostrar nossa coleção para quem tem olhos que reconhecem o investimento monetário e intelectual representado pelo nosso conjunto de obras. De certa forma, nossas aquisições nos definem”, eles complementaram no final. 3.2.6 – Professora Dra. Diva Benevides Pinho, economista e estudiosa das artes. A Professora Dra. Diva Pinho é autora de alguns dos livros que serviram para a construção da base teórica desta monografia. Ela gentilmente cedeu alguns de seus livros junto com algumas horas de explicação e comentários a respeito das pesquisas que fez sobre arte como investimento. Professora Diva começou nossa entrevista comentando que seu interesse por arte começou perto dos cinqüenta anos, quando procurava outros assuntos para desenvolver seus estudos. Ao pintar seus quadros, começou a questionar a razão de um Picasso atingir valores milhares de vezes superiores aos seus. Seu interesse voltou então para a valorização da arte e o processo de reconhecimento. É preciso complementar que seus quadros até hoje enfeitam as paredes das salas de professores na Faculdade de Economia da USP. A arte sempre teve sua representação direcionada pela sociedade e pelos eventos históricos que marcaram essa sociedade em questão. Algumas vezes servindo a política, outras vezes servindo a religião, mas sempre gravitando ao redor de eventos importantes e legitimando-os, determinando-os para a posteridade. Com o desenvolvimento das cidades italianas no século XIV, surge a figura do Mecenas, com expoente para a família Medici. Esses agentes, junto com a Igreja e o Estado, foram os principais formadores da demanda de arte até o surgimento da burguesia. Por conta desses novos BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 41 contemporânea.
  • 51. entrantes na demanda por arte, o suporte foi diminuído e a arte passou de grandes murais, tapetes e obras enraizadas na arquitetura espacial para quadros menores e transportáveis. A arte tomou vida e podia passar de um proprietário para outro. Surge o mercado de arte e com ele o “marchand”, o conhecedor do mercado que faz a união da demanda com a oferta. Ainda existem exemplos de mecenatos e as obras para Igrejas, associações e instituições públicas continuam até hoje. Nos anos 30, podemos citar o governo americano financiando artistas que pintavam murais durante o período da grande recessão. Mais tarde esse grupo caracterizou-se como “muralistas”, influenciados diretamente por Diego Rivera (mexicano, que visitou os EUA diversas vezes nesse período). Outro exemplo importante de mecenato, já mencionado nesta monografia, foi Peggy Guggenheim durante o ápice da segunda grande guerra. Ela emigrou vários artistas europeus e ajudou o desenvolvimento de um novo tipo de arte, até então desconhecido nos EUA. Sua influência na sociedade americana permitiu acolher nomes importantes, como Marcel Duchamp e Max Ernest. Em nossa época contemporânea podemos pressupor que há um número de amantes das artes com excedentes econômicos intercambiáveis, o que determina como a produção artística será feita. Segundo a Professora, mesmo com o receio de magoar a liberdade artística e a criatividade, quem determina o a direção do mercado é a demanda. Ou seja, os artistas são famosos porque sua produção foi aceita após um meticuloso julgamento dos agentes demandantes. Algumas vezes esse julgamento acontece muito tarde, como no clássico exemplo de Van Gogh, que jamais vendeu um quadro sequer em toda sua vida e cujas obras são “Blue Chips” do mercado de arte do pós-impressionismo. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 42 contemporânea.
  • 52. Para quem produzir é uma das perguntas determinantes dentro do mercado de arte, mas como os discursos de uma demanda fracionada podem ser unidos a ponto de haver reconhecimentos quase universais dos artistas contemporâneos? Nesse ponto surgem os influenciadores da demanda, representados pela mídia especializada e pelos galeristas. A professora exemplifica que um crítico de arte, assim como um crítico gastronômico ou de qualquer outra atividade, cuja qualidade é determinada através de fatores subjetivos, tem o poder de ascender ou naufragar a carreira e a produção de um determinado artista. Quanto mais importante o crítico e o veículo especializado onde ele manifesta seu julgamento, maior poder de alavancar a credibilidade de um artista ele possui em suas palavras. Já os galeristas funcionam como o primeiro filtro, indicando o que pode ser comercializável ou não, o que pode ser aceito ou não, de acordo com seu conhecimento das necessidades da demanda. Um exemplo interessante pode ser visto logo após os acontecimentos de 11 de setembro de 2001. Durante alguns meses, as artes plásticas embarcaram em representações sóbrias e algumas vezes obscuras. Somente depois da demanda americana conseguir recuperar certa flexibilidade de julgamento próprio, foi possível que artistas pudessem comercializar representações questionadoras e irreverentes do evento. Com exceção de galeristas famosos como Saatchi e Gagosian, a maioria dos agentes do mercado primário acabam por voltar-se a mídia especializada e aos críticos como principal fonte para entender as tendências do mercado e orientar a produção dos artistas que representam. A questão da busca pela inovação constante é inerente aos mercados competitivos. Há evoluções nas formas representativas, pois os artistas devem estar sempre um passo a BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 43 contemporânea.
  • 53. frente da cultura de massa. Esse comportamento é exacerbado no mercado brasileiro, pois arte e conhecimento sobre arte, além de legitimação, são usados também como fator de segmentação entre classes sociais. A profundidade de conhecimento sobre o meio permite maior ou menor fruição e reconhecimento de uma obra contemporânea. Sem referências anteriores e refinamento do gosto, não é possível apreciar em sua totalidade algumas obras mais complexas. Por isso, ao pensar no que a demanda brasileira da nova classe média que surgiu na estabilidade econômica da última década procura, a Professora finaliza indicando que flores, paisagens e elementos bucólicos – praticamente expulsos das representações abstratas modernas – são os pedidos que ela mais ouve quando alguém lhe pede um quadro de sua autoria. 3.2.7 – Rafael Rocha Andrade, empresário e colecionador iniciante. Rafael é um jovem advogado que fez fortuna atuando no mercado de capitais durante a subida dos preços de petróleo no início do século XXI. Ele se define como emergente que já possui os elementos de diferenciação de consumo de luxo e não vê mais valor neles porque se esgotam em si próprios. Então, começou a freqüentar galerias e exposições de arte com o intuito de começar a investir em alguns artistas, assim como fez com o mercado de commodities. Mas apesar de ter o capital e o conhecimento necessários para tal empreitada, Rafael sabe que as perdas e ganhos podem ser muito maiores se o colecionador iniciante não tiver relações fortes com outros agentes do mercado. Ele identifica que o conhecimento dos novos artistas e a capacidade de observar as tendências da arte contemporânea são as principais ferramentas que possui para fazer um bom investimento. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 44 contemporânea.
  • 54. Ele conta que ainda não fez uma grande aquisição. Entretanto é freqüentador da “SP- ARTE Foto”, uma feira de arte focada em fotografia cujos organizadores são os mesmos da SP-ARTE, onde busca fotografias, o suporte que considera ser um bom investimento para um colecionador iniciante. Já adquiriu obras do Instituto Moreira Salles, com destaque para fotos de Otto Stupakoff e Thomaz Farkas. Suas mais ousadas aquisições, em termos de valores investidos, foram Claudia Jaguaribe e Miguel Rio Branco. Rafael pondera que, independentemente da cadeia de legitimação de um artista, espera- se que sua produção mostre algo inovador e disruptivo. Não há criação de novo valor em algo que repete uma fórmula criativa. Por isso, quando o artista novato arrisca, é o salto em que os colecionadores precisam prestar atenção. Um novo suporte, uma forma expressiva diferente, um sistema de leitura que impõe novas interpretações a partir de um contexto social e histórico únicos. Ele cita Ligia Clark e seus “bichos” como uma ruptura que hoje é valorizada. As esculturas, que são carinhosamente chamadas de “bichos”, chegam a valer de 150 a 200 mil reais cada uma. Ainda sobre a cadeia de legitimação, ele complementa dizendo que a real especulação acontece quando um artista tem apenas uma grande sacada e, por conta de sua atuação, acaba por sucumbir à mídia, misturando arte com publicidade sobre a arte. É o caso de Jeff Koons e Vik Muniz, segundo ele. Não que tais artistas não tenham seu valor, mas eles estão supervalorizados e fora de seu radar para futuras aquisições. Por isso prefere voltar-se para quem está começando. De certa forma, ele pondera, o artista precisa atender aos desejos da demanda. Por isso, acredita que um investidor bem sucedido deve observar tanto os artistas quanto todos os outros agentes do mercado para tirar as conclusões da viabilidade de tal artista como investimento. Ao especializar-se num segmento bem definido, como fotografia contemporânea, ele pode diminuir os riscos de seu investimento. E define que seu BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 45 contemporânea.
  • 55. processo de busca é aberto, primeiro gostando do objeto de arte para depois procurar as referências que possam atestar o valor ou a possibilidade de investimento para valorização posterior. Assim, ele espera treinar seu olhar antes de falar de valores. Nos vernissages que freqüenta, ele já sabe o que será exposto antes da abertura. Então, no dia de abertura do evento, ele conversa com os agentes do mercado com conhecimento prévio, buscando o parecer de cada um deles sobre o impacto da exposição na carreira do artista. Rafael cita que qualquer um pode ser um colecionador, mesmo com recursos escassos, dando como exemplo o casal de classe média nova-iorquina que acumulou mais de quatro mil obras num pequeno apartamento em Manhattan. A vida desses colecionadores tornou-se um filme chamado “Herb e Dorothy”, SASAKI (2009). Nesse documentário, o casal é reconhecido por diretores de museus, artistas e outros conhecedores de arte como os maiores colecionadores de arte minimalista americana. Herbert e Dorothy Voguel não eram milionários, ele trabalhava como funcionário dos correios e ela como bibliotecária. Ambos, com a mesma paixão pela arte, começaram a colecionar com o salário dele enquanto ela pagava as despesas gerais em uma Nova Iorque da década de 1960. Segundo Rafael, eles identificaram o ponto de virada de um novo movimento e começaram a entender e colecionar os artistas minimalistas no momento em que eles ainda não eram reconhecidos pela mídia. Alguns exemplos de artistas que foram descobertos e reconhecidos pelos Voguel são Robert Mangold, Lucio Pozzi e James Siena, Todos bastante valorizados no mercado de arte contemporânea por sua contribuição ao movimento Minimalista. Rafael conclui que está educando seu olhar para um dia ter propriedade suficiente para conseguir identificar expoentes de um movimento novo e disruptivo como fizeram o casal retratado nesse documentário. BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 46 contemporânea.
  • 56. 4 – CONCLUSÕES 4.1 – O valor da arte versus a demanda por arte. Arte contemporânea é um assunto que possui interpretações divergentes, pois sua função está em constante transformação, assim como a sociedade para qual ela é produzida. Mesmo assim, há uma unidade quando se olha para quem a arte é produzida. A primeira conclusão que salta aos olhos após o cruzamento das entrevistas com os estudos teóricos é que não importa o suporte, os questionamentos filosóficos ou a necessidade ou não de ruptura com o passado versus a continuidade: em última instância, quem determina o que será produzido é a demanda. Apesar de ser uma afirmação limitadora, que coloca o artista em segundo plano, ela não tira a criatividade e o fator de inovação e expressão pessoal necessários a qualquer tipo de arte. A demanda legitima a arte que lhe interessa, podendo ser algo inovador ou apenas mais uma necessidade de representação que logo será esquecida. Os preços realizados em leilões apenas refletem o gosto sacramentado da demanda, mas não o valor artístico produzido para uma sociedade. Não é porque o preço é caro que o artigo será realmente um ícone dentro da história da arte. Outro argumento plausível: muitas vezes o que é realmente bom não é absorvido imediatamente pela demanda. Há exemplos clássicos, como o caso dos impressionistas no final do século XIX, ou mesmo as vanguardas européias do início do século XX. HUGUES (2008) e LEWIS (2009) separam claramente a arte como representação, síntese de um posicionamento filosófico e cultural, da arte como produto, que apenas responde à expansão de uma demanda não atendida pela escassez inerente à natureza desse produto. Através desses dois críticos, olhando a produção artística após o estouro da bolha especulativa em 2009, é possível ver como a especulação está enraizada no BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de arte 47 contemporânea.