SlideShare une entreprise Scribd logo
1  sur  15
Télécharger pour lire hors ligne
Aconteceu no
Século Vinte
   Romance
Daniel de Carvalho




Aconteceu no
Século Vinte
     Romance




      São Paulo 2011
Copyright © 2011 by Editora Baraúna SE Ltda

                                         Capa
                                      LuizDeLuca

                          Projeto Gráfico e Diagramação
                                  Alline Benitez

                                  Parecer Literário
                                  Vanise Macedo

                                Revisão gramatical
                                  Priscila Loiola

                                        Imagens
                                      Corel Gallery


               CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
         SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
_________________________________________
 C322a

 Carvalho, Daniel de
   Aconteceu no século vinte : romance / Daniel de Carvalho. - São Paulo : Baraúna,
 2010.

   ISBN 978-85-7923-135-3

   1. Romance brasileiro. I.Título.

 10-0611.                     CDD: 869.93
                               CDU: 821.134.3(81)-3

 08.02.10 18.02.10                                                         017574

_________________________________________
                                Impresso no Brasil
                                 Printed in Brazil

   DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA
                  www.EditoraBarauna.com.br

                         Rua Januário Miraglia, 88
               CEP 04547-020 Vila Nova Conceição São Paulo SP
                            Tel.: 11 3167.4261

                           www.editorabarauna.com.br
                           www.livrariabarauna.com.br
Aconteceu no Século Vinte




     Dedico este romance Aconteceu no Século Vinte à minha
querida esposa Neusa.

     Daniel de Carvalho
     Setembro de 2007
     Piracicaba - SP




                              5
Daniel de Carvalho




        6
Aconteceu no Século Vinte




                                1



                     TEMPESTADE


     Janeiro de 1970
     Cidade de São Paulo
     Um bairro da periferia

      ESTAVA TÃO QUENTE naquele dia, às quatro horas da
tarde, que a cidade mais parecia um grande forno. O sol ainda
ardia insistentemente no céu azul desprovido de nuvens. O
calor estava insuportável. Aquele calor causticante que queima
e arde na pele. Numa ladeira de terra, cheia de terrenos baldios
e casas empoeiradas, crianças descalças e suadas brincavam rui-
dosamente correndo de um lado para outro sem se importar
com aquela fornalha. Cães corriam e ladravam misturando-se
às crianças em grande algazarra. Era possível ver as radiações
de calor emanando do cimento quente das calçadas e das te-
lhas de barro que cobriam as pequenas casas. Estava abafado!
O ar totalmente parado. Nenhum vento, nenhuma brisa para
refrescar. Os ramos das árvores, sem movimento, lembravam
a paisagem inerte de uma pintura. Casas, árvores, capim, tudo
estava coberto por uma fina camada de pó proveniente da ter-
ra estorricada. Algumas donas de casa cuidavam do quintal,



                                7
Daniel de Carvalho

outras lavavam roupas, e outras conversavam preguiçosamente
junto às cercas, removendo constantemente, com as costas da
mão, o suor acumulado na testa.

      Um homem de aparência esquisita vinha descendo a ladei-
ra. Caminhava aos tropeços de forma vacilante. Alheio ao intenso
calor e a tudo que o rodeava, seu caminhar era indeciso e des-
compassado. Cada vez que seus calcanhares tocavam o solo, ele
contorcia o rosto sentindo dolorosos trancos no peito. Seus pas-
sos se alternavam entre vagarosos, como de um zumbi, e rápidos,
como de quem foge de alguma coisa. Não conseguia caminhar
em linha reta. Ora descambava para a esquerda, ora para a direita,
suportando com dificuldade o peso do corpo. Nem as mulheres
que conversavam em frente de suas casas, nem as crianças na rua,
tinham percebido até então a estranha figura daquele homem.

      O límpido azul do céu vinha cedendo espaço para nu-
vens negras que se formavam ameaçadoramente. Uma brisa
morna começou então a soprar timidamente. Brisa que aos
poucos foi se tornando mais forte e mais fria.
      — Parece que vamos ter chuva! — comentou, olhando
para o céu e bocejando longamente, uma dona de casa que
conversava na cerca com sua vizinha.
      — É melhor recolher a roupa do varal! — lembrou a
vizinha.
      — Vem pra dentro, João! — gritou outra senhora, cha-
mando o filho que brincava na rua.
      Percebendo que o tempo estava prestes a mudar, as mulhe-
res da vizinhança apressaram-se a chamar os filhos para entrar.

     Aquele homem continuava descendo a rua como se
nada mais existisse no mundo além dele mesmo. Seu sem-



                                8
Aconteceu no Século Vinte

blante ausente não revelava seu estado interior, exceto pelas
constantes caretas de dor e de sofrimento físico. Seu olhar
focalizava somente o horizonte. As crianças notaram sua pre-
sença e pararam de brincar para observá-lo. Curiosas, tenta-
ram falar com ele. Nenhuma resposta! Talvez ele nem tivesse
tomado conhecimento delas.
      O ventou passou a rugir furiosamente sacudindo portas
e janelas, ameaçando derrubar e arrastar tudo que encontrasse
pela frente. As mães, apreensivas com o temporal iminente, sa-
íam à rua insistindo com os filhos para que entrassem. Então,
elas perceberam aquele homem que parecia doente ou alcooli-
zado. Uma delas aproximou-se:
      — O senhor precisa de ajuda?
      Esperou por uma resposta que não veio. Insistiu e nada!
O homem continuou seu caminho ignorando-a por completo.
Como o tempo começou a piorar rapidamente, a mulher deu de
ombros e voltou correndo para sua casa. Aos poucos, as crianças
também foram se recolhendo, até que a rua ficou deserta. Exce-
to pela presença daquele indivíduo que a tudo ignorava.

      O vento começou a soprar com maior violência. Nuvens
negras tomaram conta do céu e escureceu rapidamente. Fortes
rajadas de vento atingiam as casas e a vegetação ameaçando
romper vidraças e arrancar os galhos das árvores. A poeira da
rua era arremessada com força contra casas, árvores e arbustos.
Rodamoinhos se formavam aqui e acolá carregando consigo
folhas e detritos para todos os lados.
      As poucas janelas que ainda estavam abertas começaram
a ser fechadas rapidamente. Os moradores se davam conta da
fúria da tempestade que se armava lá fora. Mas nada disso pa-
recia afetar aquele homem. Ele mantinha sua sofrida caminha-
da hesitante e irregular.



                                9
Daniel de Carvalho

       Se alguém ainda o estivesse observando, teria a impressão de
que lhe era indiferente ir para frente, para os lados, parar ou prosse-
guir, ir mais depressa ou mais devagar. Teria a impressão de que ele
soubesse para onde desejava ir. Nem, se desejava ir a algum lugar!

      As rajadas de vento foram se tornando cada vez mais aterra-
doras. O atrito contra as casas e outras barreiras naturais produzia
assobios fantasmagóricos como o choro de almas penadas. Janelas
e portas eram sacudidas assustadoramente. Vibravam tanto, que
as pessoas temiam que suas casas fossem arrancadas do chão.
      As roupas de um varal, que a dona de casa não tivera
tempo de recolher, agitavam-se furiosamente contorcendo-se
e embaraçando-se umas às outras. Desesperada, a mulher saiu
e tentou recolhê-las. O vento quase a arrastava para longe. Os
fortes jatos de poeira machucavam-lhe o rosto, os braços e as
pernas. Seus cabelos esvoaçam enquanto ela tentava, em vão,
tirar algumas peças do varal. Os pegadores não aguentavam
mais a pressão e as peças se soltavam voando para longe em
ziguezague. A mulher, atordoada, desistiu e voltou lutando
contra o vento, até conseguir entrar e trancar a porta.

      A fortíssima ventania não conseguia deter o homem,
apenas dificultava ainda mais sua marcha. Ele estava impas-
sível à fúria do vento e da poeira que chicoteavam seu rosto.
Seus lábios, narinas, cabelos e sobrancelhas estavam cobertos
de pó. Sentia o gosto da terra em sua garganta. Mas nada disso
impedia sua marcha!
      A natureza parecia ter ficado de mal com os homens. Es-
curecera por completo. Não eram ainda cinco da tarde e já pa-
recia noite. Dentro das casas, o silêncio era total. Estavam com
medo! Ninguém se aventurava a abrir portas ou janelas para ver
o que acontecia lá fora. Um repentino e violento estalo sacudiu



                                  10
Aconteceu no Século Vinte

toda a região. O barulho da trovoada, seguido pelo clarão do
relâmpago, foi alarmante. Os moradores das casas se agacharam
instantaneamente e permaneceram encolhidos até entenderem
o que tinha acontecido. Com os corações disparados, se olha-
vam assustados sem dizer uma só palavra. O trovão fora conco-
mitante com o intenso clarão do relâmpago, o que indicava que
a descarga elétrica ocorrera muito próxima do local.
       Lá fora, o homem deteve-se por uma fração de segundo,
sem procurar, entretanto, proteger-se ou localizar de onde vie-
ra o estrondo. Continuou sua marcha, indiferente e cambale-
ante. Suas faces estavam rígidas. Os olhos vidrados e o olhar
perdido. Nenhuma expressão! Nada!... Nada que revelasse o
que se passava em seu íntimo.
       Os raios começaram a riscar freneticamente o céu em to-
das as direções, seguidos pelo ribombar das trovoadas. A chuva
finalmente desabou nervosa com toda a força que a natureza lhe
permitia. Foi um aguaceiro indescritível. Uma tormenta! Sugeria
um ajustar de contas entre o céu e a terra. De repente, um curto-
circuito num transformador e a consequente queda da energia
elétrica deixaram o bairro mergulhado em total escuridão.
       A estranha figura não dava a mínima demonstração de pre-
tender abrigar-se. Estava com a roupa encharcada. Tinha seus pas-
sos ainda mais dificultados pela lama que se formava. Era apenas
um corpo se locomovendo na escuridão sob o violento temporal.
Mas no interior daquele corpo ocorria uma tormenta ainda mais
forte. Tão forte, que a fúria da natureza não conseguia incomodá-
lo. Seu tormento era muito superior que a tormenta externa!
       Um segundo estrondo metálico, mais forte que o primei-
ro, pareceu ter acabado com o mundo. Por alguns segundos,
ficou tão claro como o dia, e o cenário se mostrou arrasador.
Casas destelhadas, cercas caídas, árvores arrancadas como se
fossem de brinquedo. A rua estava coberta de lama misturada



                                11
Daniel de Carvalho

com galhos, folhas e detritos de toda espécie.
      Veio um terceiro estrondo que finalmente deteve o ho-
mem. Seu corpo se contorceu em profunda angústia. Seus pas-
sos começaram a tender mais para o lado esquerdo, até que suas
pernas roçaram um pequeno barranco que servia como meio-
fio. Perdeu o equilíbrio. Esforçou-se para permanecer de pé, mas
as rajadas de água e vento o empurravam furiosamente como
se quisessem liquidar de vez com o duelo. Seus joelhos não su-
portaram. Caiu de quatro e suas mãos escorregaram na enxur-
rada que corria turbulenta pelo meio-fio. Ficou com metade do
corpo imerso na corredeira. Tentou ainda levantar-se, e com
indescritível esforço, colocou-se de pé. Mas por pouco tempo.
Ao tentar reiniciar a caminhada um tremor alucinatório tomou
conta de seu corpo. Os nervos da face começaram a repuxar. Sua
testa franziu e seus olhos se arregalaram ante uma dor insupor-
tável. A tormenta externa somou-se à interna e ele finalmente
tombou. Caiu de vez! Não levantou mais. Ficou inerte junto
ao meio-fio. A turbulenta enxurrada aumentou de intensidade
passando ruidosamente por cima de seu corpo formando um
grande leque de água barrenta. Até que o encobriu totalmente.
Já não se poderia distinguir o homem sob a água e a lama.

      Depois de quatro horas de temporal, a intensidade da
chuva começou a diminuir. Já eram onze da noite, quando
finalmente parou de chover. A ladeira terminava numa várzea
que ficou totalmente inundada. O dia seguinte seria um trans-
torno para toda a cidade. Dificilmente, os moradores daquela
rua conseguiriam transpor a várzea para irem ao trabalho. Mas
a chuva passou de vez. Cessaram os relâmpagos e as trovoadas.
A natureza deu-se por satisfeita. A iluminação elétrica foi res-
tabelecida. Todos finalmente puderam dormir mais tranqui-
los. O dia seguinte amanheceu lindo e ensolarado!



                              12
Aconteceu no Século Vinte




                                2



                   MARIA FUMAÇA


     Janeiro de 1945
     Cidade de São Paulo
     Bairro de Santana

      ERA UMA SEXTA-FEIRA. O fim de tarde estava deli-
cioso, com Sol ameno e uma brisa refrescante. A Rua Alfredo
Pujol estava com pouco tráfego naquele horário. De vez em
quando, passava um automóvel ou um daqueles ônibus azuis
da CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos).
Bem no meio da rua, sobre o leito de macadame, destacavam-
se os trilhos do trem que separavam as duas mãos de direção.
      O jovem Edmundo e seu filho Jeremias, de cinco anos,
caminhavam pela calçada conversando animadamente. Era no-
tório o grande afeto que envolvia aquelas duas criaturas. Jere-
mias prestava atenção a todos os detalhes da rua e das casas.
O menino observava, com curiosidade, as pessoas com quem
eles cruzavam e as mulheres debruçadas nos peitoris das janelas.
Fazia mil perguntas a Edmundo, que nem conseguia responder
a uma das perguntas, e lá vinha outra. Era a vivacidade típica de
uma criança que está começando a conhecer o mundo.



                                13
Daniel de Carvalho

      Repentinamente, um apito forte e agudo fez o menino es-
tremecer. Jeremias estancou assustado. Voltou-se e viu, com os
olhos arregalados e a respiração contida, aquilo que se aproxima-
va! Apertou a mão do pai como quem pede proteção. Seu coração
estava disparado. Tentava entender o que era aquela “coisa”.
      — Pai! Que quê é aquilo que vem vindo lá no meio da rua?
      — Ahh! Aquilo? — respondeu Edmundo sorrindo. — É
o trem. É a Maria Fumaça!
      Jeremias, que nunca passara pela Rua Alfredo Pujol e
nunca vira um trem, continuava tenso e imóvel, olhando com
um misto de medo e curiosidade para aquela coisa barulhenta
e espalhafatosa que se aproximava.
      — Vamos andando, Jeremias — disse Edmundo.
      Mas Jeremias estava hipnotizado e resistia ao leve esforço
do pai em puxá-lo para que continuassem a caminhar. Vendo
que Jeremias estava tão interessado, Edmundo esperou que o
trem passasse por eles.
      — Pai! Ele vai passar aqui perto!!! — exclamou Jeremias
apreensivo sem tirar os olhos da enorme composição que se
aproximava soltando grande coluna de fumaça.
      A máquina apitou outra vez ao passar por Edmundo e Je-
remias, reduzindo a velocidade e começando a fazer uma curva
totalmente à direita, como se estivesse envolvendo ameaçado-
ramente o atônito Jeremias.
      — O que quê o trem tá fazendo, pai?
      — Está parando para os soldados que vêm da cidade,
descerem.
      Jeremias não tirava os olhos do trem enquanto bombar-
deava Edmundo com perguntas. Estava muito impressionado.
Como lhe parecia imponente e assustadora a grande máquina
de ferro que suava cuspindo brasas e exalando vapor! Ele nun-
ca vira uma cena impressionante como aquela.



                               14
Aconteceu no Século Vinte

      As pessoas começaram a saltar das plataformas dos vagões
de madeira, mesmo antes de o trem parar por completo.
      Jeremias suspirou mais descontraído.
      — Pra onde os soldados vão?
      — Para aquele Quartel do Exército — respondeu Ed-
mundo apontando para o outro lado da rua.
      Parados perto da locomotiva, Jeremias sentia o calor da cal-
deira, o cheiro da fumaça da lenha e o cheiro do vapor. A Maria
Fumaça voltou a apitar enquanto os rangidos do atrito de ferro com
ferro acompanhavam o vagaroso reinício do movimento do trem.

      — Agora vamos, Jeremias! — voltou a insistir Edmundo,
puxando levemente a mão do menino.
      Mas Jeremias só cedeu e voltou a caminhar depois que
viu o último vagão desaparecer numa curva mais adiante.
      — Prá onde o trem tá indo agora, pai?
      — A próxima estação é a de Santa Teresinha. Depois ele pas-
sa por muitas outras até chegar à última, que é a da Cantareira.
      — Aqui também é uma estação? — perguntou Jeremias
observando todos aqueles soldados atravessando a rua e en-
trando no quartel.
      — Aqui não é bem uma estação. É só uma parada conhe-
cida como a Parada do Quartel.

      A essa altura, os dois já estavam começando a descer a ín-
greme e curta ladeira que se iniciava bem em frente ao quartel.
      — Você não está curioso para conhecer a nossa nova casa?
— perguntou Edmundo, acariciando os cabelos negros do filho.
      A família de Jeremias tinha se mudado para uma nova
casa no dia anterior. Durante a mudança, o menino ficara com
seus avós, onde seu pai fora buscá-lo naquela tarde.
      — A casa é bonita, pai?



                                 15

Contenu connexe

Tendances

Candace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredos
Candace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredosCandace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredos
Candace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredosAndreia
 
09. twisted [retorcidas]
09. twisted [retorcidas]09. twisted [retorcidas]
09. twisted [retorcidas]Talles Lisboa
 
09 pretty little liars retorcidas - (vol.9) - sara shepard
09 pretty little liars   retorcidas - (vol.9) - sara shepard09 pretty little liars   retorcidas - (vol.9) - sara shepard
09 pretty little liars retorcidas - (vol.9) - sara shepardEucclydes2Pinnheiro
 
Share me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdf
Share me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdfShare me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdf
Share me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdfDaniela Klagenberg
 
13 pretty little liars esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard
13 pretty little liars   esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard13 pretty little liars   esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard
13 pretty little liars esmagadas - (vol. 13) - sarah shepardEucclydes2Pinnheiro
 
Tempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdf
Tempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdfTempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdf
Tempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdfDaniela Klagenberg
 
Uma janela no tempo lm - degustação
Uma janela no tempo   lm - degustaçãoUma janela no tempo   lm - degustação
Uma janela no tempo lm - degustaçãoLorena de Macedo
 
Thoughtless thoughtless-01-s-c-stephens
Thoughtless thoughtless-01-s-c-stephensThoughtless thoughtless-01-s-c-stephens
Thoughtless thoughtless-01-s-c-stephensLudmila Moreira
 
Chris wooding a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)
Chris wooding   a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)Chris wooding   a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)
Chris wooding a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)Ariovaldo Cunha
 
Perfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULO
Perfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULOPerfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULO
Perfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULOlucas_vinicius2012
 
15 pretty little liars tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard
15 pretty little liars   tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard15 pretty little liars   tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard
15 pretty little liars tóxicas - (vol. 15) - sarah shepardEucclydes2Pinnheiro
 
E Agora Sinha
E Agora SinhaE Agora Sinha
E Agora SinhaJNR
 
Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...
Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...
Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...Seduc MT
 

Tendances (20)

Candace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredos
Candace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredosCandace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredos
Candace camp trilogia dos aincourt 01 a mansão dos segredos
 
01 louco amor
01 louco amor01 louco amor
01 louco amor
 
"Perfeição" - cap. 23
"Perfeição" - cap. 23"Perfeição" - cap. 23
"Perfeição" - cap. 23
 
09. twisted [retorcidas]
09. twisted [retorcidas]09. twisted [retorcidas]
09. twisted [retorcidas]
 
O pacto
O pactoO pacto
O pacto
 
Paginaçao
PaginaçaoPaginaçao
Paginaçao
 
09 pretty little liars retorcidas - (vol.9) - sara shepard
09 pretty little liars   retorcidas - (vol.9) - sara shepard09 pretty little liars   retorcidas - (vol.9) - sara shepard
09 pretty little liars retorcidas - (vol.9) - sara shepard
 
Share me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdf
Share me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdfShare me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdf
Share me - Sole Regret Series #3.5 Olivia Cunning.pdf
 
13 pretty little liars esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard
13 pretty little liars   esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard13 pretty little liars   esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard
13 pretty little liars esmagadas - (vol. 13) - sarah shepard
 
Conto-meu tio jules
Conto-meu tio julesConto-meu tio jules
Conto-meu tio jules
 
Tempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdf
Tempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdfTempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdf
Tempt me - Sole Regret Series #2 Olivia Cunning.pdf
 
Uma janela no tempo lm - degustação
Uma janela no tempo   lm - degustaçãoUma janela no tempo   lm - degustação
Uma janela no tempo lm - degustação
 
Thoughtless thoughtless-01-s-c-stephens
Thoughtless thoughtless-01-s-c-stephensThoughtless thoughtless-01-s-c-stephens
Thoughtless thoughtless-01-s-c-stephens
 
Chris wooding a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)
Chris wooding   a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)Chris wooding   a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)
Chris wooding a teia do mundo 01 - os tecedores de saramyr (2)
 
Obama
ObamaObama
Obama
 
Perfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULO
Perfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULOPerfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULO
Perfeição - Capítulo 69 - PENÚLTIMO CAPÍTULO
 
15 pretty little liars tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard
15 pretty little liars   tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard15 pretty little liars   tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard
15 pretty little liars tóxicas - (vol. 15) - sarah shepard
 
Capítulo 3
Capítulo 3Capítulo 3
Capítulo 3
 
E Agora Sinha
E Agora SinhaE Agora Sinha
E Agora Sinha
 
Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...
Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...
Sonetos . Produção Textual de Alunos do 8° ano do Ensino Fundamental da Escol...
 

En vedette

US Lesson Plan for January 21-24, 2014
US Lesson Plan for January 21-24, 2014US Lesson Plan for January 21-24, 2014
US Lesson Plan for January 21-24, 2014e038458
 
Past perfect + p. p continuous + future perfect
Past perfect + p. p continuous + future perfectPast perfect + p. p continuous + future perfect
Past perfect + p. p continuous + future perfectMaribel Espinoza
 
Alimentacao em tempo de Gripe
Alimentacao em tempo de GripeAlimentacao em tempo de Gripe
Alimentacao em tempo de Gripenuno.jose.duarte
 
Minutes of discussions and meetings - 1
Minutes of discussions and meetings - 1Minutes of discussions and meetings - 1
Minutes of discussions and meetings - 1Parnyan
 
Dr João Lima Aprendizagem Informal
Dr João Lima Aprendizagem InformalDr João Lima Aprendizagem Informal
Dr João Lima Aprendizagem Informalnuno.jose.duarte
 

En vedette (7)

US Lesson Plan for January 21-24, 2014
US Lesson Plan for January 21-24, 2014US Lesson Plan for January 21-24, 2014
US Lesson Plan for January 21-24, 2014
 
ñLkfhertgkjehrtghrtg
ñLkfhertgkjehrtghrtgñLkfhertgkjehrtghrtg
ñLkfhertgkjehrtghrtg
 
Past perfect + p. p continuous + future perfect
Past perfect + p. p continuous + future perfectPast perfect + p. p continuous + future perfect
Past perfect + p. p continuous + future perfect
 
Alimentacao em tempo de Gripe
Alimentacao em tempo de GripeAlimentacao em tempo de Gripe
Alimentacao em tempo de Gripe
 
Primeiroquimica
PrimeiroquimicaPrimeiroquimica
Primeiroquimica
 
Minutes of discussions and meetings - 1
Minutes of discussions and meetings - 1Minutes of discussions and meetings - 1
Minutes of discussions and meetings - 1
 
Dr João Lima Aprendizagem Informal
Dr João Lima Aprendizagem InformalDr João Lima Aprendizagem Informal
Dr João Lima Aprendizagem Informal
 

Similaire à Aconteceu no Século Vinte

Similaire à Aconteceu no Século Vinte (20)

Revista subversa 3ª ed.
Revista subversa 3ª ed.Revista subversa 3ª ed.
Revista subversa 3ª ed.
 
Amor, conto de Clarice Lispector
Amor, conto de Clarice LispectorAmor, conto de Clarice Lispector
Amor, conto de Clarice Lispector
 
Questoes olimpiada de lingua portuguesa
Questoes olimpiada de lingua portuguesaQuestoes olimpiada de lingua portuguesa
Questoes olimpiada de lingua portuguesa
 
Tigana trecho
Tigana trechoTigana trecho
Tigana trecho
 
Tigana trecho
Tigana trechoTigana trecho
Tigana trecho
 
Amostra do livro "Uma janela para nove irmãos"
Amostra do livro "Uma janela para nove irmãos"Amostra do livro "Uma janela para nove irmãos"
Amostra do livro "Uma janela para nove irmãos"
 
O resgate, Trecho
O resgate, TrechoO resgate, Trecho
O resgate, Trecho
 
Resgate, o trecho
Resgate, o trechoResgate, o trecho
Resgate, o trecho
 
O Resgate Trecho
O Resgate TrechoO Resgate Trecho
O Resgate Trecho
 
Acre e-book #22 (julho, agosto, setembro 2021)
Acre e-book #22 (julho, agosto, setembro 2021)Acre e-book #22 (julho, agosto, setembro 2021)
Acre e-book #22 (julho, agosto, setembro 2021)
 
Tijolo de seguranca carlos heitor cony
Tijolo de seguranca   carlos heitor conyTijolo de seguranca   carlos heitor cony
Tijolo de seguranca carlos heitor cony
 
esau.pdf
esau.pdfesau.pdf
esau.pdf
 
André carneiro a escuridao
André carneiro   a escuridaoAndré carneiro   a escuridao
André carneiro a escuridao
 
QU4RTO DESAMP4RO
QU4RTO DESAMP4ROQU4RTO DESAMP4RO
QU4RTO DESAMP4RO
 
Ana e eu
Ana e euAna e eu
Ana e eu
 
AGRISSÊNIOR NOTÍCIAS - Nº 625 an 20 junho_2017
AGRISSÊNIOR NOTÍCIAS - Nº 625 an 20 junho_2017AGRISSÊNIOR NOTÍCIAS - Nº 625 an 20 junho_2017
AGRISSÊNIOR NOTÍCIAS - Nº 625 an 20 junho_2017
 
A Ira de Nasi - primeiro capítulo
A Ira de Nasi - primeiro capítuloA Ira de Nasi - primeiro capítulo
A Ira de Nasi - primeiro capítulo
 
Literaturapiauiense 2.1
Literaturapiauiense 2.1Literaturapiauiense 2.1
Literaturapiauiense 2.1
 
Literatura Piauiense
Literatura PiauienseLiteratura Piauiense
Literatura Piauiense
 
Revista subversa 6ª ed.
Revista subversa 6ª ed.Revista subversa 6ª ed.
Revista subversa 6ª ed.
 

Plus de Alexandrina Oliveira (18)

Dia da caca_trecho
Dia da caca_trechoDia da caca_trecho
Dia da caca_trecho
 
Primeiroquimica
PrimeiroquimicaPrimeiroquimica
Primeiroquimica
 
Viking - Daniel de Carvalho
Viking - Daniel de CarvalhoViking - Daniel de Carvalho
Viking - Daniel de Carvalho
 
A rosa entre espinhos
A rosa entre espinhosA rosa entre espinhos
A rosa entre espinhos
 
Glimmerglass o encontro de dois mundos
Glimmerglass   o encontro de dois mundosGlimmerglass   o encontro de dois mundos
Glimmerglass o encontro de dois mundos
 
A insígnia de claymor prólogo
A insígnia de claymor   prólogoA insígnia de claymor   prólogo
A insígnia de claymor prólogo
 
A insígnia de claymor prólogo
A insígnia de claymor   prólogoA insígnia de claymor   prólogo
A insígnia de claymor prólogo
 
A Insígnia de Claymor - Prólogo
A Insígnia de Claymor -  PrólogoA Insígnia de Claymor -  Prólogo
A Insígnia de Claymor - Prólogo
 
Capítulo 1 casa glass
Capítulo 1   casa glassCapítulo 1   casa glass
Capítulo 1 casa glass
 
Capítulo 1 - Casa Glass
Capítulo 1 - Casa GlassCapítulo 1 - Casa Glass
Capítulo 1 - Casa Glass
 
Capítulo 1 - Casa Glass
Capítulo 1 - Casa GlassCapítulo 1 - Casa Glass
Capítulo 1 - Casa Glass
 
Os sete selos luiza salazar
Os sete selos   luiza salazarOs sete selos   luiza salazar
Os sete selos luiza salazar
 
Os Sete Selos - Luiza Salazar
Os Sete Selos - Luiza SalazarOs Sete Selos - Luiza Salazar
Os Sete Selos - Luiza Salazar
 
Aden stone contra o reino das bruxas
Aden stone contra o reino das bruxasAden stone contra o reino das bruxas
Aden stone contra o reino das bruxas
 
Entrevista editada final
Entrevista editada finalEntrevista editada final
Entrevista editada final
 
Entrevista editada final
Entrevista editada finalEntrevista editada final
Entrevista editada final
 
Instintos crueis capitulo 1
Instintos crueis   capitulo 1Instintos crueis   capitulo 1
Instintos crueis capitulo 1
 
Vila Citrus - Daniel de Carvalho
Vila Citrus - Daniel de CarvalhoVila Citrus - Daniel de Carvalho
Vila Citrus - Daniel de Carvalho
 

Dernier

“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptxthaisamaral9365923
 
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdfGuia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdfEyshilaKelly1
 
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEMCOMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEMVanessaCavalcante37
 
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdfJorge Andrade
 
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfWilliam J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfAdrianaCunha84
 
Slides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptxSlides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
Bullying - Texto e cruzadinha
Bullying        -     Texto e cruzadinhaBullying        -     Texto e cruzadinha
Bullying - Texto e cruzadinhaMary Alvarenga
 
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.Susana Stoffel
 
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolaresALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolaresLilianPiola
 
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdfSimulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdfEditoraEnovus
 
Pedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptx
Pedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptxPedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptx
Pedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptxleandropereira983288
 
Programa de Intervenção com Habilidades Motoras
Programa de Intervenção com Habilidades MotorasPrograma de Intervenção com Habilidades Motoras
Programa de Intervenção com Habilidades MotorasCassio Meira Jr.
 
Slides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptxSlides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)
Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)
Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)Mary Alvarenga
 
Aula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologia
Aula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologiaAula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologia
Aula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologiaaulasgege
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduraAdryan Luiz
 
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASBCRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASBAline Santana
 
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADOactivIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADOcarolinacespedes23
 
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptxAD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptxkarinedarozabatista
 
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdfBRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdfHenrique Pontes
 

Dernier (20)

“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
 
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdfGuia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
 
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEMCOMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
 
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
 
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfWilliam J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
 
Slides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptxSlides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, Betel, Ordenança quanto à contribuição financeira, 2Tr24.pptx
 
Bullying - Texto e cruzadinha
Bullying        -     Texto e cruzadinhaBullying        -     Texto e cruzadinha
Bullying - Texto e cruzadinha
 
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
 
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolaresALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
 
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdfSimulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
 
Pedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptx
Pedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptxPedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptx
Pedologia- Geografia - Geologia - aula_01.pptx
 
Programa de Intervenção com Habilidades Motoras
Programa de Intervenção com Habilidades MotorasPrograma de Intervenção com Habilidades Motoras
Programa de Intervenção com Habilidades Motoras
 
Slides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptxSlides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptx
Slides Lição 4, CPAD, Como se Conduzir na Caminhada, 2Tr24.pptx
 
Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)
Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)
Grupo Tribalhista - Música Velha Infância (cruzadinha e caça palavras)
 
Aula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologia
Aula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologiaAula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologia
Aula - 1º Ano - Émile Durkheim - Um dos clássicos da sociologia
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditadura
 
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASBCRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
 
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADOactivIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
 
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptxAD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
 
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdfBRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
 

Aconteceu no Século Vinte

  • 2.
  • 3. Daniel de Carvalho Aconteceu no Século Vinte Romance São Paulo 2011
  • 4. Copyright © 2011 by Editora Baraúna SE Ltda Capa LuizDeLuca Projeto Gráfico e Diagramação Alline Benitez Parecer Literário Vanise Macedo Revisão gramatical Priscila Loiola Imagens Corel Gallery CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ _________________________________________ C322a Carvalho, Daniel de Aconteceu no século vinte : romance / Daniel de Carvalho. - São Paulo : Baraúna, 2010. ISBN 978-85-7923-135-3 1. Romance brasileiro. I.Título. 10-0611. CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3 08.02.10 18.02.10 017574 _________________________________________ Impresso no Brasil Printed in Brazil DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br Rua Januário Miraglia, 88 CEP 04547-020 Vila Nova Conceição São Paulo SP Tel.: 11 3167.4261 www.editorabarauna.com.br www.livrariabarauna.com.br
  • 5. Aconteceu no Século Vinte Dedico este romance Aconteceu no Século Vinte à minha querida esposa Neusa. Daniel de Carvalho Setembro de 2007 Piracicaba - SP 5
  • 7. Aconteceu no Século Vinte 1 TEMPESTADE Janeiro de 1970 Cidade de São Paulo Um bairro da periferia ESTAVA TÃO QUENTE naquele dia, às quatro horas da tarde, que a cidade mais parecia um grande forno. O sol ainda ardia insistentemente no céu azul desprovido de nuvens. O calor estava insuportável. Aquele calor causticante que queima e arde na pele. Numa ladeira de terra, cheia de terrenos baldios e casas empoeiradas, crianças descalças e suadas brincavam rui- dosamente correndo de um lado para outro sem se importar com aquela fornalha. Cães corriam e ladravam misturando-se às crianças em grande algazarra. Era possível ver as radiações de calor emanando do cimento quente das calçadas e das te- lhas de barro que cobriam as pequenas casas. Estava abafado! O ar totalmente parado. Nenhum vento, nenhuma brisa para refrescar. Os ramos das árvores, sem movimento, lembravam a paisagem inerte de uma pintura. Casas, árvores, capim, tudo estava coberto por uma fina camada de pó proveniente da ter- ra estorricada. Algumas donas de casa cuidavam do quintal, 7
  • 8. Daniel de Carvalho outras lavavam roupas, e outras conversavam preguiçosamente junto às cercas, removendo constantemente, com as costas da mão, o suor acumulado na testa. Um homem de aparência esquisita vinha descendo a ladei- ra. Caminhava aos tropeços de forma vacilante. Alheio ao intenso calor e a tudo que o rodeava, seu caminhar era indeciso e des- compassado. Cada vez que seus calcanhares tocavam o solo, ele contorcia o rosto sentindo dolorosos trancos no peito. Seus pas- sos se alternavam entre vagarosos, como de um zumbi, e rápidos, como de quem foge de alguma coisa. Não conseguia caminhar em linha reta. Ora descambava para a esquerda, ora para a direita, suportando com dificuldade o peso do corpo. Nem as mulheres que conversavam em frente de suas casas, nem as crianças na rua, tinham percebido até então a estranha figura daquele homem. O límpido azul do céu vinha cedendo espaço para nu- vens negras que se formavam ameaçadoramente. Uma brisa morna começou então a soprar timidamente. Brisa que aos poucos foi se tornando mais forte e mais fria. — Parece que vamos ter chuva! — comentou, olhando para o céu e bocejando longamente, uma dona de casa que conversava na cerca com sua vizinha. — É melhor recolher a roupa do varal! — lembrou a vizinha. — Vem pra dentro, João! — gritou outra senhora, cha- mando o filho que brincava na rua. Percebendo que o tempo estava prestes a mudar, as mulhe- res da vizinhança apressaram-se a chamar os filhos para entrar. Aquele homem continuava descendo a rua como se nada mais existisse no mundo além dele mesmo. Seu sem- 8
  • 9. Aconteceu no Século Vinte blante ausente não revelava seu estado interior, exceto pelas constantes caretas de dor e de sofrimento físico. Seu olhar focalizava somente o horizonte. As crianças notaram sua pre- sença e pararam de brincar para observá-lo. Curiosas, tenta- ram falar com ele. Nenhuma resposta! Talvez ele nem tivesse tomado conhecimento delas. O ventou passou a rugir furiosamente sacudindo portas e janelas, ameaçando derrubar e arrastar tudo que encontrasse pela frente. As mães, apreensivas com o temporal iminente, sa- íam à rua insistindo com os filhos para que entrassem. Então, elas perceberam aquele homem que parecia doente ou alcooli- zado. Uma delas aproximou-se: — O senhor precisa de ajuda? Esperou por uma resposta que não veio. Insistiu e nada! O homem continuou seu caminho ignorando-a por completo. Como o tempo começou a piorar rapidamente, a mulher deu de ombros e voltou correndo para sua casa. Aos poucos, as crianças também foram se recolhendo, até que a rua ficou deserta. Exce- to pela presença daquele indivíduo que a tudo ignorava. O vento começou a soprar com maior violência. Nuvens negras tomaram conta do céu e escureceu rapidamente. Fortes rajadas de vento atingiam as casas e a vegetação ameaçando romper vidraças e arrancar os galhos das árvores. A poeira da rua era arremessada com força contra casas, árvores e arbustos. Rodamoinhos se formavam aqui e acolá carregando consigo folhas e detritos para todos os lados. As poucas janelas que ainda estavam abertas começaram a ser fechadas rapidamente. Os moradores se davam conta da fúria da tempestade que se armava lá fora. Mas nada disso pa- recia afetar aquele homem. Ele mantinha sua sofrida caminha- da hesitante e irregular. 9
  • 10. Daniel de Carvalho Se alguém ainda o estivesse observando, teria a impressão de que lhe era indiferente ir para frente, para os lados, parar ou prosse- guir, ir mais depressa ou mais devagar. Teria a impressão de que ele soubesse para onde desejava ir. Nem, se desejava ir a algum lugar! As rajadas de vento foram se tornando cada vez mais aterra- doras. O atrito contra as casas e outras barreiras naturais produzia assobios fantasmagóricos como o choro de almas penadas. Janelas e portas eram sacudidas assustadoramente. Vibravam tanto, que as pessoas temiam que suas casas fossem arrancadas do chão. As roupas de um varal, que a dona de casa não tivera tempo de recolher, agitavam-se furiosamente contorcendo-se e embaraçando-se umas às outras. Desesperada, a mulher saiu e tentou recolhê-las. O vento quase a arrastava para longe. Os fortes jatos de poeira machucavam-lhe o rosto, os braços e as pernas. Seus cabelos esvoaçam enquanto ela tentava, em vão, tirar algumas peças do varal. Os pegadores não aguentavam mais a pressão e as peças se soltavam voando para longe em ziguezague. A mulher, atordoada, desistiu e voltou lutando contra o vento, até conseguir entrar e trancar a porta. A fortíssima ventania não conseguia deter o homem, apenas dificultava ainda mais sua marcha. Ele estava impas- sível à fúria do vento e da poeira que chicoteavam seu rosto. Seus lábios, narinas, cabelos e sobrancelhas estavam cobertos de pó. Sentia o gosto da terra em sua garganta. Mas nada disso impedia sua marcha! A natureza parecia ter ficado de mal com os homens. Es- curecera por completo. Não eram ainda cinco da tarde e já pa- recia noite. Dentro das casas, o silêncio era total. Estavam com medo! Ninguém se aventurava a abrir portas ou janelas para ver o que acontecia lá fora. Um repentino e violento estalo sacudiu 10
  • 11. Aconteceu no Século Vinte toda a região. O barulho da trovoada, seguido pelo clarão do relâmpago, foi alarmante. Os moradores das casas se agacharam instantaneamente e permaneceram encolhidos até entenderem o que tinha acontecido. Com os corações disparados, se olha- vam assustados sem dizer uma só palavra. O trovão fora conco- mitante com o intenso clarão do relâmpago, o que indicava que a descarga elétrica ocorrera muito próxima do local. Lá fora, o homem deteve-se por uma fração de segundo, sem procurar, entretanto, proteger-se ou localizar de onde vie- ra o estrondo. Continuou sua marcha, indiferente e cambale- ante. Suas faces estavam rígidas. Os olhos vidrados e o olhar perdido. Nenhuma expressão! Nada!... Nada que revelasse o que se passava em seu íntimo. Os raios começaram a riscar freneticamente o céu em to- das as direções, seguidos pelo ribombar das trovoadas. A chuva finalmente desabou nervosa com toda a força que a natureza lhe permitia. Foi um aguaceiro indescritível. Uma tormenta! Sugeria um ajustar de contas entre o céu e a terra. De repente, um curto- circuito num transformador e a consequente queda da energia elétrica deixaram o bairro mergulhado em total escuridão. A estranha figura não dava a mínima demonstração de pre- tender abrigar-se. Estava com a roupa encharcada. Tinha seus pas- sos ainda mais dificultados pela lama que se formava. Era apenas um corpo se locomovendo na escuridão sob o violento temporal. Mas no interior daquele corpo ocorria uma tormenta ainda mais forte. Tão forte, que a fúria da natureza não conseguia incomodá- lo. Seu tormento era muito superior que a tormenta externa! Um segundo estrondo metálico, mais forte que o primei- ro, pareceu ter acabado com o mundo. Por alguns segundos, ficou tão claro como o dia, e o cenário se mostrou arrasador. Casas destelhadas, cercas caídas, árvores arrancadas como se fossem de brinquedo. A rua estava coberta de lama misturada 11
  • 12. Daniel de Carvalho com galhos, folhas e detritos de toda espécie. Veio um terceiro estrondo que finalmente deteve o ho- mem. Seu corpo se contorceu em profunda angústia. Seus pas- sos começaram a tender mais para o lado esquerdo, até que suas pernas roçaram um pequeno barranco que servia como meio- fio. Perdeu o equilíbrio. Esforçou-se para permanecer de pé, mas as rajadas de água e vento o empurravam furiosamente como se quisessem liquidar de vez com o duelo. Seus joelhos não su- portaram. Caiu de quatro e suas mãos escorregaram na enxur- rada que corria turbulenta pelo meio-fio. Ficou com metade do corpo imerso na corredeira. Tentou ainda levantar-se, e com indescritível esforço, colocou-se de pé. Mas por pouco tempo. Ao tentar reiniciar a caminhada um tremor alucinatório tomou conta de seu corpo. Os nervos da face começaram a repuxar. Sua testa franziu e seus olhos se arregalaram ante uma dor insupor- tável. A tormenta externa somou-se à interna e ele finalmente tombou. Caiu de vez! Não levantou mais. Ficou inerte junto ao meio-fio. A turbulenta enxurrada aumentou de intensidade passando ruidosamente por cima de seu corpo formando um grande leque de água barrenta. Até que o encobriu totalmente. Já não se poderia distinguir o homem sob a água e a lama. Depois de quatro horas de temporal, a intensidade da chuva começou a diminuir. Já eram onze da noite, quando finalmente parou de chover. A ladeira terminava numa várzea que ficou totalmente inundada. O dia seguinte seria um trans- torno para toda a cidade. Dificilmente, os moradores daquela rua conseguiriam transpor a várzea para irem ao trabalho. Mas a chuva passou de vez. Cessaram os relâmpagos e as trovoadas. A natureza deu-se por satisfeita. A iluminação elétrica foi res- tabelecida. Todos finalmente puderam dormir mais tranqui- los. O dia seguinte amanheceu lindo e ensolarado! 12
  • 13. Aconteceu no Século Vinte 2 MARIA FUMAÇA Janeiro de 1945 Cidade de São Paulo Bairro de Santana ERA UMA SEXTA-FEIRA. O fim de tarde estava deli- cioso, com Sol ameno e uma brisa refrescante. A Rua Alfredo Pujol estava com pouco tráfego naquele horário. De vez em quando, passava um automóvel ou um daqueles ônibus azuis da CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos). Bem no meio da rua, sobre o leito de macadame, destacavam- se os trilhos do trem que separavam as duas mãos de direção. O jovem Edmundo e seu filho Jeremias, de cinco anos, caminhavam pela calçada conversando animadamente. Era no- tório o grande afeto que envolvia aquelas duas criaturas. Jere- mias prestava atenção a todos os detalhes da rua e das casas. O menino observava, com curiosidade, as pessoas com quem eles cruzavam e as mulheres debruçadas nos peitoris das janelas. Fazia mil perguntas a Edmundo, que nem conseguia responder a uma das perguntas, e lá vinha outra. Era a vivacidade típica de uma criança que está começando a conhecer o mundo. 13
  • 14. Daniel de Carvalho Repentinamente, um apito forte e agudo fez o menino es- tremecer. Jeremias estancou assustado. Voltou-se e viu, com os olhos arregalados e a respiração contida, aquilo que se aproxima- va! Apertou a mão do pai como quem pede proteção. Seu coração estava disparado. Tentava entender o que era aquela “coisa”. — Pai! Que quê é aquilo que vem vindo lá no meio da rua? — Ahh! Aquilo? — respondeu Edmundo sorrindo. — É o trem. É a Maria Fumaça! Jeremias, que nunca passara pela Rua Alfredo Pujol e nunca vira um trem, continuava tenso e imóvel, olhando com um misto de medo e curiosidade para aquela coisa barulhenta e espalhafatosa que se aproximava. — Vamos andando, Jeremias — disse Edmundo. Mas Jeremias estava hipnotizado e resistia ao leve esforço do pai em puxá-lo para que continuassem a caminhar. Vendo que Jeremias estava tão interessado, Edmundo esperou que o trem passasse por eles. — Pai! Ele vai passar aqui perto!!! — exclamou Jeremias apreensivo sem tirar os olhos da enorme composição que se aproximava soltando grande coluna de fumaça. A máquina apitou outra vez ao passar por Edmundo e Je- remias, reduzindo a velocidade e começando a fazer uma curva totalmente à direita, como se estivesse envolvendo ameaçado- ramente o atônito Jeremias. — O que quê o trem tá fazendo, pai? — Está parando para os soldados que vêm da cidade, descerem. Jeremias não tirava os olhos do trem enquanto bombar- deava Edmundo com perguntas. Estava muito impressionado. Como lhe parecia imponente e assustadora a grande máquina de ferro que suava cuspindo brasas e exalando vapor! Ele nun- ca vira uma cena impressionante como aquela. 14
  • 15. Aconteceu no Século Vinte As pessoas começaram a saltar das plataformas dos vagões de madeira, mesmo antes de o trem parar por completo. Jeremias suspirou mais descontraído. — Pra onde os soldados vão? — Para aquele Quartel do Exército — respondeu Ed- mundo apontando para o outro lado da rua. Parados perto da locomotiva, Jeremias sentia o calor da cal- deira, o cheiro da fumaça da lenha e o cheiro do vapor. A Maria Fumaça voltou a apitar enquanto os rangidos do atrito de ferro com ferro acompanhavam o vagaroso reinício do movimento do trem. — Agora vamos, Jeremias! — voltou a insistir Edmundo, puxando levemente a mão do menino. Mas Jeremias só cedeu e voltou a caminhar depois que viu o último vagão desaparecer numa curva mais adiante. — Prá onde o trem tá indo agora, pai? — A próxima estação é a de Santa Teresinha. Depois ele pas- sa por muitas outras até chegar à última, que é a da Cantareira. — Aqui também é uma estação? — perguntou Jeremias observando todos aqueles soldados atravessando a rua e en- trando no quartel. — Aqui não é bem uma estação. É só uma parada conhe- cida como a Parada do Quartel. A essa altura, os dois já estavam começando a descer a ín- greme e curta ladeira que se iniciava bem em frente ao quartel. — Você não está curioso para conhecer a nossa nova casa? — perguntou Edmundo, acariciando os cabelos negros do filho. A família de Jeremias tinha se mudado para uma nova casa no dia anterior. Durante a mudança, o menino ficara com seus avós, onde seu pai fora buscá-lo naquela tarde. — A casa é bonita, pai? 15