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Universidade Federal de Pelotas
Faculdade de Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação
Formação Docente e Contemporaneidade
Viviane Maciel da Silva Tavares
Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea
Artigo
Pelotas
2009
2
Viviane Maciel da Silva Tavares
Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea
Artigo apresentado ao Programa de
Pós Graduação em Educação, da
Universidade Federal de Pelotas, como
requisito parcial para a obtenção do grau
de Especialista em Educação. Área de
Concentração: Formação Docente e
Contemporaneidade.
Orientador: Eduardo Rocha
Pelotas
2009
3
Viviane Maciel da Silva Tavares
Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea. 2009.
Artigo (Especialização em Educação) – Universidade Federal de Pelotas.
Programa de Pós-Graduação em Educação. Núcleo de Formação Docente e
Contemporaneidade.
Orientador: Eduardo Rocha
1. DNA. 2. Arte Contemporânea. 3.Química. 4. Bioarte. 5. Educação.
4
Sumário
Simbiose................................................................................................................. 5
Processos Químicos .............................................................................................. 6
Parte I: Formas Duras ............................................................................................ 9
No interior dos Cromossomos – Bioquímica .......................................................... 9
Emparelhamento de bases – a aproximação da fronteira .................................... 13
2218
Pares de Base .............................................................................................. 16
Parte II. Flexibilização da Forma.......................................................................... 20
Replicação Celular ............................................................................................... 20
Parte III: Formas Flexíveis.................................................................................... 24
A Fita Dupla da Molécula ..................................................................................... 24
A bioarte de Kac................................................................................................... 26
Efeito da reação ................................................................................................... 32
Referências .......................................................................................................... 33
5
Simbiose
“relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de
espécies diferentes. Na relação simbiótica, os organismos agem
ativamente em conjunto para proveito mútuo, o que pode acarretar
especializações funcionais de cada espécie envolvida. A simbiose
também é chamada de protocooperação”
Fonte: http://www.todabiologia.com/dicionario/simbiose.htm
Figura 1: Imagem do livro Simbiose
Fonte: http://www.audienciazero.org/eixo/images/stories/imagens/portugal/artecontemporanea/salomeSilva/simbiose/simbiose_02.jpg
6
Processos Químicos
Diários de classe, receitas de bolo, coleções e metodologias são
ferramentas de tradução de processos de produção de sentido. Minha construção
começa em um processo consciente, de uma busca nem tão consciente assim,
por um “algo a mais” ainda não desvendado, ou, não bem elucidado na mente da
pesquisadora.
Este artigo é um relato, a partir de uma perspectiva que busca a
cartografia, de um primeiro encontro pouco confortável, o qual esbarra no
conceito duro, na forma estática, que se preocupa com a ética ao invés da
estética, e que busca pela lógica ao invés da sensação. Como a de deparar-se
com a coelha verde, “Ah brilha no escuro é?!? Por quê??? Com que objetivo???”.
Ou um segundo encontro forçoso, com um que de “Tah! Vamos olhar pra
isso então”, que resulta em borboletas de orquídeas, pelas mãos de uma artista.
Assim, de uma maneira ainda tímida, a cabeça inclina pra que o olhar se
dobre, e dobre também o pensamento. Pensamento agora atravessado por um
movimento novo, que perde a dimensão de Uno ao mesmo tempo em que se
esforça para ganhar dimensão de múltiplo.
É possível pensar cartografias como mapas, desenhos destinados a
representar o espaço, o lugar, seja ele geográfico ou conceitual. Para os
geógrafos cartografia é mapa, é comunicação e análise, seja ela visual, imagética,
fílmica, sonora, ou dos sentidos, das sensações. De localizar e sentir o mundo1
.
Para Gilles Deleuze e Félix Guattari, os indivíduos ou grupos são
atravessados por verdadeiras linhas, fusos e meridianos distintos. Nossa
existência é uma espécie de geografia. Somos corpos cartográficos. Assim como
______________________________
1
“Como forma de comunicação, a cartografia apresenta distorções da realidade, mas toda a
mensagem é uma mensagem distorcida da realidade, nenhuma é isenta. Toda ela é política. O
que precisamos, é saber qual é a política de nossa cartografia, quais as minhas escolhas, meus
caminhos e meus dejetos. In (Rocha, 2008)
7
os mapas geográficos delimitam e registram territórios políticos, econômicos e
culturais, os indivíduos também são registrados e cruzados por linhas. Algumas
dessas linhas são postas do exterior para eles e não se cruzam, ao contrário,
separam-se e demarcam os seus próprios territórios. Outras são produtos do
acaso, mas há outras que devemos inventá-las, traçá-las, efetivamente, na vida.
Devemos inventar nossas próprias linhas de fuga. Mesmo que para alguns
indivíduos ou grupos nunca seja possível construí-las; Outros já as perderam. As
linhas de fuga são “uma questão de cartografia. Elas nos compõem, assim como
compõem nosso mapa. Elas se transformam e podem mesmo penetrar uma na
outra.”2
Todos nós usamos mapas, e os construímos na medida em que nos
localizamos em determinado território. Esta localização nos mapas pressupõe um
encontro, uma experiência, uma experimentação. Leitor e autor do mapa são
sujeitos ativos na comunicação cartográfica, devem lutar para isso. É preciso, na
montagem ou leitura de um mapa, estar à espreita, reparar, espiar, reinventar e,
de alguma forma, sentir a vida que passa por ali.
Carreados por estas linhas de fuga, chegam ao encontro do corpo outros
movimentos como a filosofia da diferença3
e com ela diversos materiais
colecionáveis vão se descortinando pra falar de uma nova tendência de produzir
ciência através da arte contemporânea, compondo assim mais um pontos de
orientação no mapa cartográfico. A professora, química, teórica, lógica, exata,
pesquisadora – molar – vai em busca de novas formas flexíveis e mutáveis,
também teóricas, mas pouco lógicas e nem um pouco exatas de pesquisa –
molecular – que conferem crescimento pessoal e prazer em colecionar, buscar,
conhecer, desvelar.
______________________________
2
DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. (tradução de Aurélio Guerra Neto et alii). Mil platôs:
capitalismo e esquizofrenia, v. 3. Rio de Janeiro: ed.34, 1996.
3
Filosofia da diferença tem como importância o estudo da singularidade e da particularidade que
habita em cada pessoa. Por sua vez, a filosofia da diferença tem como entusiasmo criador os
estudos dos antropólogos, pois se debruçam a estudar o fenômeno da diversidade, da pluralidade,
da singularidade e das diferentes culturas. In: (http://www.overmundo.com.br/overblog/a-filosofia-
da-diferenca)
8
Nesta busca, várias coleções se formaram, dentre as quais podem ser
destacadas:
 Coleção de Filmes – Ficção Científica: A Ilha (2005), AI: Inteligência Artificial
(2001), Gattaca (1997), Jurassic Park (1993), THX 1138 (1967), Efeito borboleta
(2004), 2001 uma odisséia no espaço (1968), Sun shine – alerta solar (2007),
Laranja Mecânica (1971).
 Coleção de Artistas Contemporâneos: Eduardo Kac, Lígia Clark, George
Gessert, Marta de Menezes, Oron Catts, entre outros.
 Coleção de Autores Contemporâneos: Gilles Deleuze, Félix Guattari, Suely
Rolnik, Antonin Artaud, Pamela Champe, Bayardo Torres, Anne Calquelin, entre
outros.
Assim cada uma destas coleções produziu na pesquisadora um novo
encontro. Um encontro que pode dar-se com uma palavra, com uma obra de arte,
com um texto, com uma coisa, com um lugar. Um encontro provoca uma
oscilação no campo subjetivo, um deslocamento intensivo, uma ligeira ou grande
perda de referências, o que Deleuze e Guattari chamaram desterritorialização:
uma irrupção, uma sacudida ou desmoronamento de um território subjetivo, que
ocorre por efeito de pressões causadas pelas forças postas em movimento na
experiência mesma de se estar vivo.
Contagiada pelos perceptos produzidos pela arte contemporânea e pelo
movimento da bioarte que ela produz quando aliada à bioquímica, a professora vê
surgirem afectos em sua prática. De tal sorte que, ainda agora não se encontra de
vez na desordem, mas já permite, aceita e busca, por um pouco menos de ordem
no seu mundo e vê surgir em sua metodologia, menos método e mais cartografia.
Este artigo tem como intenção mostrar os dois lados desta fronteira do
conhecimento, aqui chamadas de formas duras e a partir deles tratar da bioarte,
chamada de forma flexível, enquanto um lugar habitável, como um novo estado
de devir.
9
Parte I: Formas Duras
No interior dos Cromossomos – Bioquímica
Ácido Desoxirribonucléico – DNA – uma estrutura molecular. Uma
descoberta estadunidense e britânica de 7 de Março de 1953, que lhes valeu o
Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1962. Menino para a química é um
polímero de unidades simples de pares de nucleotídeos4
, cuja essência é formada
por açúcares e fosfatos intercalados unidos entre si. Ligados à molécula de
açúcar produz uma seqüência de quatro bases (Adenina, Citosina, Guanina,
Timina) ao longo da molécula de DNA que carrega a informação genética.
Pré-Adolescente para a biologia, dentro da célula, o DNA é organizado numa
estrutura chamada cromossoma5
e o conjunto de cromossomas de uma célula
forma o cariótipo6
. O cariótipo se duplica antes da divisão celular e o seu DNA
dentro do núcleo.
Estas estruturas compactas guiam as interações entre o DNA e outras
proteínas7
, ajudando a controlar que partes do DNA são transcritas. O DNA é
responsável pela transmissão das características hereditárias de cada espécie de
ser vivo, é único e provém de uma recombinação dos códigos dos pais doadores.
_____________________________
4
Nucleotídeos são compostos ricos em energia e que auxiliam os processos metabólicos,
principalmente as biossínteses, na maioria das células. Funcionam ainda como sinais químicos,
respondendo assim a hormônios e outros estímulos extracelulares; eles são também componentes
estruturais de cofatores enzimáticos, intermediários metabólicos e ácidos nucléicos. Os
nucleóticos podem ser considerados os monômeros da DNA/RNA, sendo o polímero, o próprio
DNA/RNA.
5
Cromossoma é uma longa sequência de DNA, que contém vários genes, e outras sequências
de nucleotídeos com funções específicas nas células dos seres vivos.
6
Cariótipo é o conjunto cromossômico ou a constante cromossômica diplóide (2n) de uma
espécie. Representa o número total de cromossomos de uma célula somática (do corpo), as
células somáticas humanas apresentam 46 cromossomas.
7
Proteínas são compostos orgânicos de estrutura complexa, sintetizadas pelos organismos vivos
através da condensação de um grande número de moléculas de alfa-aminoácidos, através de
ligações denominadas ligações peptídicas. As proteínas são os componentes químicos mais
importante do ponto de vista estrutural.
10
Jovem então Bioquímica – de união, de interação – a química da célula. O
DNA dos seres vivos começou a ser manipulado em 1972. Inicialmente introdução
e eliminação de genes8
foram conseguidas apenas em microorganismos, mas
rapidamente passou a ser realizada em organismos mais complexos. O primeiro
mamífero geneticamente modificado surgiu no início dos anos oitenta (1981).
Permição então, para investigar a função e a localização dos genes e as
proteínas características de cada espécie.
Adulto agora é tronco9
, base para o rizoma com o qual se torna possível
formar quaisquer novos organismos, sejam órgãos, tecidos, espécies.
Para Deleuze e Guattari, o rizoma funciona através de encontros e
agenciamentos, como um verdadeiro mapa das multiplicidades, “voltado para uma
experimentação ancorada no real”, aberto, desmontável, reversível, sujeito a
modificações permanentes, sempre com múltiplas entradas (DELEUZE &
GUATTARI, 1995). Assim como as estruturas recombinantes do DNA, onde os
pares de bases nitrogenadas podem ser substituídos, reorganizados,
redistribuídos, mutados, clonados, num copia e cola de pontes de hidrogênio10
rizomáticas.
Ainda segundo os autores, um rizoma não tem nem sujeito nem objeto,
senão unicamente determinações, tamanhos, dimensões, que não podem
aumentar sem que ela mude sua natureza, um sequenciamento genético que
muda sua natureza na medida em que aumentam suas conexões. Em um rizoma
__________________________________________________________
9
Gene é a unidade fundamental da hereditariedade. Cada gene é formado por uma sequência
específica de ácidos nucléicos (DNA e RNA). é um segmento de um cromossomo a que
corresponde um código distinto, uma informação para produzir uma determinada proteína ou
controlar uma característica, por exemplo, a cor dos olhos.
10
Tronco referência as células-tronco, também conhecidas como células-mãe ou células
estaminais, são células que possuem a melhor capacidade de se dividir dando origem a células
semelhantes às progenitoras. As células-tronco dos embriões têm ainda a capacidade de se
transformar, num processo também conhecido por diferenciação celular, em outros tecidos do
corpo, como ossos, nervos, músculos e sangue. Devido a essa característica, as células-tronco
são importantes, principalmente na aplicação terapêutica, sendo potencialmente úteis em terapias
de combate a doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes tipo-1, acidentes
vasculares cerebrais, doenças hematológicas, traumas na medula espinhal e nefropatias.
11
"O rizoma conecta um ponto qualquer com outro ponto
qualquer, e cada um de seus traços não remete
necessariamente a traços de mesma natureza, ele põe
em jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive
estados de não-signos. O rizoma não se deixa reduzir
nem ao Uno nem ao múltiplo... Ele não é feito de
unidades, mas de dimensões, ou antes, de direções
movediças. Não tem começo nem fim, mas sempre um
meio, pelo qual ele cresce e transborda. Ele constitui
multiplicidades" (DELEUZE, 2000)
Figura 2: Representação tridimensional das bases de uma molécula de DNA.
Fomte: http://www.chemicalgraphics.com/paul/images/DNA/gem-dna.jpg
l
12
não há pontos ou posições como ocorre em uma estrutura de árvore, uma raiz.
Em um rizoma só há linhas (DELEUZE & GUATTARI, 1995).
A noção de unidade somente aparece quando se produz em uma
multiplicidade uma tomada de poder pelo significante, um processo de
correspondência de subjetivação. Um rizoma ou multiplicidade11
nunca se deixa
codificar, nunca dispõe de dimensão suplementar ao número de suas linhas, as
multiplicidades se definem por ele afora: pelas linhas abstratas, linhas de fuga ou
de desterritorialização, segundo a qual mudam de natureza ao conectarem-se
com outras (DELEUZE & GUATTARI, 1995).
___________________________________
10
Pontes de hidrogênio são interações que ocorrem entre os íons de hidrogênio e dois ou mais
átomos, de forma que o hidrogênio sirva de "elo" entre os átomos com os quais interage. São as
interações intermoleculares mais intensas, medidas tanto sob o ponto de vista energético quanto
sob o ponto de vista de distâncias inter atômicas, essa ligação se estabelece, sobretudo com os
elementos muito eletronegativos (F;O;N). A ligação intra molecular se faz na mesma molécula e a
intermolecular se faz entre duas moléculas.
11
Multiplicidade para os autores multiplicidades são enunciadas como encontros "A
multiplicidade não deve designar uma combinação de múltiplo e de um, mas, ao contrário, uma
organização própria do múltiplo enquanto tal, que não tem necessidade alguma da unidade para
formar um sistema." (DELEUZE, 1998).
13
Emparelhamento de bases – a aproximação da fronteira
Cada tipo de base numa cadeia forma uma ligação com apenas um tipo de
base na outra cadeia. Este comportamento é designado de complementariedade
de bases. Assim, as purinas12
formam pontes de hidrogênio com pirimidinas13
.
Este arranjo de dois nucleotídeos complementares na dupla hélice é chamado par
de base.
Além das pontes de hidrogênio entre as bases, as duas fitas são mantidas
juntas devido a forças geradas por interações hidrofóbicas14
entre as bases
empilhadas, a qual não é influenciada pela sequência do DNA. Como as pontes
de hidrogênio não são ligações covalentes15
, podem ser quebradas e reunidas
com relativa facilidade. Como resultado desta complementariedade, toda a
informação contida numa das cadeias de DNA está também contida na outra, o
que é fundamental para a replicação do DNA.
Os dois tipos de pares de base formam diferentes números de ligações por
pontes de hidrogênio: A - T (Adenina e Timina) formam duas pontes de hidrogênio
enquanto que G - C (Guanina e Citosina) formam três pontes de hidrogênio.
Desta forma a interação entre Guanina e Citosina é mais forte que Adenina e
Timina. Como resultado, as percentagens de Guanina e de Citosina disponíveis
__________________________________
12
Purinas são compostos orgânicos heterociclícos de bases nitrogenadas compostas por um anel
aromático duplo, são as bases dos ácidos nucleicos, a adenina e a guanina. No DNA estas bases
unem-se às pirimidinas complementares.
13
Pirimidina são compostos orgânicos semelhantes ao benzeno, mas com um anel heterocíclico,
no qual dois átomos de nitrogénio substituem o carbono nas posições 1 e 3. Três das bases dos
ácidos nucleicos, a citosina, a timina e o uracila, são derivados pirimídicos.
14
Hidrofóbicas designam uma qualidade molecular em contato com a água, ou seja, compostos
hidrofóbicos são iminscíveis em água. Como exemplo podemos citar solventes orgânicos de longa
cadeia carbônica em contato com a água.
15
Ligação Covalente é caracterizada pelo compartilhamento de um ou mais pares de Elétrons
entre átomos, causando uma atração mútua entre eles, que mantêm a molécula resultante unida.
Átomos tendem a compartilhar elétrons de modo que suas camadas eletrônicas externas sejam
preenchidas e eles adquiram uma distribuição eletrônica mais estável. Ligações covalentes
normalmente ocorrem entre átomos com eletronegatividades similares e altas.
14
em uma dupla hélice de DNA determinam as forças de interação entre os dois
lados da cadeia de DNA. Conseqüentemente, podemos perceber que uma parte
da dupla cadeia de DNA pode ser separada facilmente, nas porções das
sequências com maior predomínio de A - T, tal como a T-A-T-A-A-T, para facilitar
a abertura da dupla cadeia quando da transcrição16
. Eis os espaços no código.
Espaços no código que se localizam entre um meio caracterizado como
uma superfície fronteiriça a ser conquistada, a superfície que guarda os devires
que se desprenderam do fundo absoluto dos corpos e que estão por se
metamorfosear em acontecimento às coisas, aos objetos, aos códigos, aos
sujeitos. Tal fronteira – a se efetuar, é o sentido-acontecimento que, se chega a
delimitar as duas instâncias, o faz segundo a articulação de suas diferenças. Mais
que delimitá-las, separá-las, ele as conecta pela diferença17
.
“Queremos pensar na diferença em si mesma e a relação do diferente com
o diferente, independente das formas da representação que as conduzem ao
Mesmo e as fazem passar pelo negativo” (DELEUZE, 2006). A filosofia da
diferença se debruça a estudar o fenômeno da diversidade, da pluralidade, da
singularidade e das diferentes culturas, sua presença brota a pedagogia que
___________________________
16
Transcrição é o processo de formação do RNA a partir do DNA. Esse RNA formado é o RNAm
(RNA mensageiro), que tem como função "informar" ao RNAt (RNA transportador) a ordem correta
dos aminoácidos a serem sintetizados em proteínas. O processo é catalisado pela enzima RNA-
polimerase. Os fatores de transcrição (auxiliares da RNA-polimerase) são responsáveis por
romper as pontes de hidrogênio entre as bases nitrogenadas dos dois filamentos de DNA, como
se fosse um zíper. A partir deste momento, a enzima escolhe uma das fitas de DNA como molde
para se construir o RNAm, ligando bases nitrogenadas de RNA (adenina, citosina, uracila e
guanina) à essa fita de DNA. Ao se concluir essas ligações, o processo está completo. A enzima
destaca o filamento de RNA formado a partir do DNA, e volta a unir as duas fitas de DNA.
17
Nas palavras de Deleuze (1998): “As coisas e as proposições acham-se menos em uma
dualidade radical do que de um lado e de outro de uma fronteira representada pelo sentido. Esta
fronteira não os mistura, não os reúne (não há monismo tanto quanto não há dualismo), ela é,
antes, a articulação de sua diferença: corpo/linguagem”. O mirante de Deleuze tornar-se-á cada
vez mais claro: sua fronteira não será aquilo que irá delimitar, restringir, mas o que vai poder
relacionar e articular os diferentes. Essa diferença em si, diferença na estrutura, o que bota a
vazar o pensamento, do que não se pode controlar. A filosofia da diferença originada nos escritos
de Nietzsche, que considerados coletivamente, “ajudaram a moldar o discurso pós-moderno
diretamente, como no caso de Heidegger, Derrida, Foucault, Lyotard, Paul de Man, Deleuze e
Guattari„. In: (PETERS, 2000).
15
respeita e cultiva o encontro dos distintos saberes. Cada ser humano é diferente e
carrega em si um determinado tipo de saber. É na diferença que está a
originalidade do pensamento bioquímico, o verdadeiro sentido e a riqueza de ser
gente e ter consciência dos mecanismos que movimentam o corpo.
Assim, por meio da fronteira, a dualidade aberta no código se estende e se
dissemina em cada um dos ramos: a bioquímica na arte, a arte na bioquímica. No
tocante às coisas, há certamente uma bioarte, o real que lhes constitui, mas há
também o atributo lógico que caracteriza o instante infinitivo de uma
transformação incorporal. Já quanto às proposições, os experimentos e os
movimentos de performace, mas temos também os encontros, que expressam os
acontecimentos (Deleuze, 1998).
16
2218
Pares de Base
Quando se fala em arte contemporânea não é para designar tudo o que é
produzido no momento, e sim aquilo que nos propõe um pensamento sobre a
própria arte ou uma análise crítica da prática visual. “No contemporâneo, a
experiência da desestabilização encontra-se a tal ponto intensificada que ela não
mais se associa à doença; sua generalização a situa no âmbito de uma
normalidade. Essa experiência tende então a ser vivida como fragilidade. O medo
não é mais o de não conseguir configurar-se segundo um certo mapa, pois
múltiplos são os mapas possíveis. O medo agora é de não conseguir reconfigurar-
se de todo, de forma minimamente eficaz.”19
Como dispositivo de pensamento, a arte interroga e atribui novos sentidos
ao se apropriar de imagens e objetos, não só os que fazem parte da história da
arte, mas também as que habitam o cotidiano, por exemplo, a exposição Corpo
Humano: Real e Fascinante, que embora não tenha sido idealizada como uma
exposição de arte e sim como um movimento educacional, acaba por ganhar esta
amplitude, no momento em que causa um encontro, embora desconfortável, em
alguns observadores, ao ponto de ter sido proibida em alguns países.20
O belo contemporâneo não busca mais o novo, nem o espanto, como as
___________________________
18
A Semana de Arte Moderna, também chamada de Semana de 22, ocorreu em São Paulo no
ano de 1922, de 11 a 18 de fevereiro, no Teatro Municipal. Durante os sete dias de exposição,
foram expostos quadros e apresentadas poesias, músicas e palestras sobre a modernidade.
A Semana de Arte Moderna representou uma verdadeira renovação de linguagem, na busca de
experimentação, na liberdade criadora da ruptura com o passado e até corporal, pois a arte
passou então da vanguarda, para o modernismo. O evento marcou época ao apresentar novas
idéias e conceitos artísticos, como a poesia através da declamação, que antes era só escrita; a
música por meio de concertos, que antes só havia cantores sem acompanhamento de orquestras
sinfônicas; e a arte plástica exibida em telas, esculturas e maquetes de arquitetura, com desenhos
arrojados e modernos. O adjetivo "novo" passou a ser marcado em todas estas manifestações que
propunha algo no mínimo curioso e de interesse.
Participaram da Semana nomes consagrados do modernismo brasileiro, como Mário de Andrade,
Oswald de Andrade, Víctor Brecheret, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia, Sérgio Milliet, Heitor Villa-
Lobos entre outros. Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Semana_de_Arte_Moderna
19
Rolnick, Novas figuras do caos: mutações da subjetivação contemporânea. In: Caos e Ordem na
Filosofia e nas Ciências, org. Lucia Santaella e Jorge Albuquerque Vieira. Face e Fapesp, São
Paulo, 1999.
17
vanguardas da primeira metade deste século: propõe o estranhamento ou o
questionamento da linguagem e sua leitura.
A Arte é então um Corpo-vibrátil, sensível aos efeitos da agitação e da
movimentação dos fluxos ambientais que nos atravessam no cotidiano. Corpo no
qual germinam estados intensivos e desconhecidos provocados pelas novas
composições que os fluxos, passeando para cá e para lá, vão fazendo e
desfazendo. De tempos em tempos, estes fluxos avolumam-se a tal ponto que
são capazes de produzir nos corpos uma germinação. Através dela, o corpo não
consegue mais expressar-se em sua atual figura, busca, pois novas formas, de
dizer, ser e conquistar.
Para Deleuze e Guatarri, essas novas formas podem ser chamadas de
conteúdos do corpo, e são substâncias que escorrem sobre tais corpos, partículas
submoleculares e subatômicas, intensidades puras, singularidades livres pré-
físicas e pré-vitais, que vão compor uma matéria, ou plano de consistência ou o
Corpo sem Órgãos, que se mostra como um corpo não-formado, não-organizado,
não-estratificado ou desestratificado, e que podem dar origem a novos e
diferentes formatos.
Na arte contemporânea o artista e obra se fazem simultaneamente, numa
inesgotável heterogênese. É através da criação que o artista opera na
materialidade de seu trabalho: aí se inscrevem as marcas de seu encontro
singular com a possibilidade de sua transmissão: ampliam-se na subjetividade do
receptor as chances de realizar ao seu modo um encontro, aproximar-se de seu
corpo-vibrátil e expor-se às suas exigências de criação.
___________________________
20
Corpo Humano: Real e Fascinante, já percorreu 34 cidades em todo o mundo, tem uma
concepção diferenciada e inédita, desenvolvida em caráter prioritariamente educativo, sob direção
médica do norte-americano Dr. Roy Glover. "Corpo Humano: Real e Fascinante" recorre a 22
corpos e 225 órgãos verdadeiros para revelar - em todos os seus aspectos - o funcionamento do
corpo humano e seus sistemas. Para tanto, faz uso de uma técnica chamada polimerização, em
corpos adultos de homens e mulheres, para obter resultados que evidenciam com absoluta
precisão as variações e diferenças apresentadas por nossa espécie.
Todos os corpos e órgãos exibidos são de indivíduos acometidos de morte natural, que optaram
por participar de um programa de doação de seus próprios corpos em benefício da ciência e da
educação, realizado pela República Popular da China.
18
“Dê-me portanto um corpo: esta é a
fórmula da reversão filosófica. O
corpo não é mais o obstáculo que
separa o pensamento de si mesmo,
aquilo que deve superar para
conseguir pensar. É, ao contrário,
aquilo em que ele mergulha ou deve
mergulhar, para atingir o impensado,
isto é, a vida." Gilles Deleuze
19
A arte é assim um sistema metabólico, em que estão combinados
organismos invisíveis que povoam nosso corpo em sua generosa vida celular;
corrente sanguínea de coragem de enfrentamento do trágico. De acordo com os
contextos históricos, varia o grau de permeabilidade da membrana entre esta
reserva de heterogênese e o resto dos organismos. O tanto que o corpo respira
seus ares, depende do quanto o artista metaboliza sua obra.
De outro lado, nosso corpo espectador tem se agitado mais do que nunca,
novas tecnologias de comunicação e informação, cada indivíduo é
permanentemente habitado por fluxos do planeta inteiro, o que multiplica as
hibridações aguçando consequentemente o engendramento de diferenças que
vibram no corpo. Assim, a disparidade entre a infinitude da produção de
diferenças e a finitude das formas tem se exacerbado cada vez mais, entre a
célula e o organismo não há mais quase intervalo, conforme nos alertava Lygia21
já nos anos sessenta; as formas são hoje mais efêmeras do que nunca. Em
outras palavras: muitos fluxos, muita hibridação, produção de diferença
intensificada é o que os artistas contemporâneos oferecem aos seus
espectadores;
_______________________________________
21
Lygia Clark (Belo Horizonte, 1920 – Rio de Janeiro, 1988) em 1947 dedica-se ao estudo de
escadas e desenhos de seus filhos. No ano de 1952, a artista expõe no Rio de Janeiro obras do
Grupo Frente. Em 1954 dedica-se ao estudo do espaço e da materialidade do ritmo, com a linha-
luz, como módulo construtor do plano. Em 1954, participa com a série “Composições”, da Bienal
de Veneza. Em 1959, integra a I Exposição de Arte Neoconcreta, Clark propõe com a sua obra,
que a pintura não se sustenta mais em seu suporte tradicional. Nas “Unidades, 1959”, moldura e
“espaço pictórico” Clark pinta a moldura da cor da tela, é o que a artista chama de “linha orgânica”.
Destas novas proposições nascem os “Casulos, 1959”, feitos em metal, o material permite que o
plano seja dobrado, dando tridimensionalidade ao plano. Em 1960, Lygia cria a série “Bichos”:
esculturas, feitas em alumínio, com dobradiças, que promovem a articulação das diferentes partes
que compõem o seu “corpo”. Em 1961, ganha o prêmio de melhor escultura na VI Bienal de São
Paulo. Na “Obra Mole, 1964”, “Caminhando, 1963” obteve grande destaque no cenário brasileiro.
Em 1968 apresenta, “A casa é o corpo", uma instalação de oito metros, que permite a passagem
das pessoas por seu interior, para que elas tenham a sensação de penetração, ovulação,
germinação e expulsão do ser vivo. O corpo dessexualizado é apresentado na série “roupa-corpo-
roupa: O Eu e o Tu, 1967”. Em 1972, as proposições “Arquiteturas biológicas, 1969", “Rede de
elástico, 1973", “Baba antropofágica, 1973" e “Relaxação, 1974". “Objetos relacionais": na
dualidade destes objetos (leves/pesados, moles/duros, cheios/vazios), Lygia trabalha o “arquivo de
memórias” dos seus pacientes, os seus medos e fragilidades, através do sensorial. Em 1983 é
publicado o “Livro Obra", que acompanha por meio de textos escritos pela própria artista e de
estruturas manipuláveis, a trajetória da obra de Lygia.
20
Parte II. Flexibilização da Forma
Replicação Celular
As aproximações da Arte e da Ciência não são novas, historicamente vemos
estas tentativas de reprodução e de criação da arte amparadas nos avanços,
descobertas ou nas perspectivas do que busca a ciência. É através da química e
da biologia que o trinômio arte-ciência-tecnologia vem se estreitando,
especialmente ao longo do século XX, dando início a uma trajetória artística.
Essa aproximação fica mais evidente, ao fazermos um breve ensaio pelo
universo cinematográfico, em que nosso personagem DNA, é facilmente
encontrado, a colorir a imaginação de autores e diretores. Deleuze sobre o
cinema nos diz que como uma tabela de Mendeleiev em química, o cinema impõe
novos pontos de vista.
Na produção “The Island” de 2006 (título em português A Ilha), dirigido por
Michael Bay, o autor descreve uma trama em que a empresa de engenharia
genética Merrick Biotech, promete aos seus clientes proporcionar, pelo valor de
US$ 5 milhões a criação de um ser amorfo, insensível, enfim, uma "massa" que
tão somente serviria para produzir órgãos geneticamente idênticos ao do seu
investidor.
Porém, com o avanço das pesquisas demonstra que a perspectiva de
criação de um clone que pudesse servir para transplante somente seria bem
sucedida se este fosse realmente igual ao seu DNA doador, ou seja, um humano
que sente, tem fome, dor e sentimentos como qualquer pessoa.
Estes clones eram mantidos confinados em um complexo secreto de
aparência futurística, sob o pretexto de o planeta Terra ter sido atacado por um
vírus letal, após ter sido recoberto por água. Quando da necessidade de utilização
destes clones, era simulado no complexo um sorteio, através do qual o
beneficiário seria transferido a uma ilha, que supostamente, seria a última porção
de terra habitável no planeta.
21
Uma interessante mescla de ficção científica22
mostra conceitos reais sendo
aproximados de situações hipotéticas, detêm a atenção dos espectadores durante
127 minutos recheados de suspense e ação. A fim de produzir uma atmosfera de
realismo um site foi desenvolvido na internet, no qual é possível consultar a
empresa responsável pela criação dos clones e simular a utilização dos serviços
(figura 4).
Deleuze citando Bergson nos diz que, "Temos visões quase instantâneas da
realidade que passa, e como elas são características desta realidade, basta-nos
alinhá-las ao longo de um devir abstrato, uniforme, invisível, situado no fundo do
aparelho do conhecimento... Percepção, intelecção, linguagem procedem em
geral assim. Quer se trate de pensar o devir, ou de o exprimir ou até de o
percepcionar, o que fazemos é apenas acionar uma espécie de cinematógrafo
interior."
Assim, a agora contemporânea simbiose DNA e Estrutura Molecular se
aceleraram e se complementam. Este engajamento dos artistas no mundo da
pesquisa científica sugere a impossibilidade da segregação DNA e Estrutura
Molecular, como fitas complementares de RNA que se sintetizam para formar um
novo código genético. A denominação que esta nova configuração de código
recebeu é Bioarte, arte biológica, arte genética.
_________________________________________
22
Outras referências de filmes de ficção científica ao longo da história: Dr. Jekyll and Mr. Hyde
(1931 – Rouben Manoulian): Para provar que o bem e o mal convivem nas pessoas, um médico
pesquisador desenvolve uma fórmula que o faz perder o controle de seu lado demoníaco; The
Invisible Man (1933 – James Whale): Um homem descobre a fórmula da invisibilidade e tenta
descobrir seu antídoto, para que possa vendê-la e ficar rico; The Fly (1986 – David Cronemberg):
Ao testar sua recentemente invenção, uma máquina de teletransporte, um cientista acidentalmente
deixa entrar uma mosca na câmara. Quando é mais uma vez materializado, seu corpo sofre
transformações genéticas irreversíveis; Jurassic Park (1993 – Steven Spielberg): Um milionário
vê seu parque de diversões, estrelado por dinossauros recriados por engenharia genética, sair do
controle quando uma falha humana os deixa livres pelo parque; Gattaca (1997 – Andew Niccol):
No futuro, apenas os homens criados geneticamente em laboratórios têm valor. Concebido
biologicamente, Vincent assume a identidade genética de um ex-atleta para conseguir destaque;
A.I. Artificial Intelligence (2001 – Steven Spielberg): No futuro, onde parte das terras foi inundada
pela elevação do nível dos mares e andróides convivem com os seres humanos, um cientista
resolve, após perder seu único filho, criar um robô com todas as características daquele - inclusive
a capacidade de pensar e sentir.
22
Figura 4: Site oficial do filme A Ilha nos EUA
Fonte: http://www.theisland-themovie.com/ - acessado em junho de 2009.
23
Figura 5: Imagem do filme “A Ilha
Fonte: http://img92.imageshack.us/i/ilha1ez4.jpg/
24
Parte III: Formas Flexíveis
A Fita Dupla da Molécula
As pesquisas biológicas circundam o DNA em vários níveis, desde sua
constituição molecular até os organismos populacionais dele derivados. Esta
manipulação de átomos através da introdução de ácidos nucléicos à estrutura
molecular do DNA, para a produção de organismos geneticamente competentes,
tem descortinado um nanouniverso para os amantes das cores e das formas, que
devido à relevância do dilema os têm recebido nas inserções arte/biologia.
Inserções estas que não são apenas emergentes, mas já diversificadas em
obras de um aspecto representativo dos contextos. Pesquisadores constroem
diferentes problemas e propõem diferentes soluções metodológicas, que vão de
performances, a escultura, robótica e bioengenharia. Dentre os artistas
contemporâneos que produzem movimentos na Bioarte, Eduardo Kac é um dos
mais citados.
Nesta movimentação não ocorre uma busca por reconstituir a vida social e
cultural, mas por fazê-lo na própria vida humana, por buscar suas ramificações
em variados sistemas de extensões tecnológicas, sua simulação de vida artificial
e de sua replicação resultante da decifração do genoma, ou seja, a referência a
um conceito que não captura a essência molecular, mas sua atmosfera é capaz
de aguçar potencialidades de efetuar um ritmo e uma sensação em seu
espectador.
A dupla articulação é tão variável que não podemos partir de um modelo
geral, mas apenas de um caso relativamente simples. Deleuze e Guatarri nos
contam que a primeira articulação escolheria ou colheria, nos fluxos-partículas
instáveis, unidades moleculares ou quase moleculares metaestáveis
(substâncias) às quais imporia uma ordem estatística de ligações e sucessões
(formas) (DELEUZE & GUATARRI, 1995).
25
A segunda articulação instauraria estruturas estáveis, compactas e
funcionais (formas) e constituiria os compostos molares onde essas estruturas se
atualizam ao mesmo tempo (substâncias) (DELEUZE & GUATARRI, 1995).
Vê-se que as duas articulações não se dividem em uma para as
substâncias e outra para as formas. As substâncias não passam de matérias
formadas. As formas implicam um código, modos de codificação e descodificação.
As substâncias como matérias formadas se referem a territorialidades, a graus de
territorialização e desterritorialização. Mas há, justamente, código e territorialidade
para cada articulação, cada uma comportando por sua conta, forma e substância.
No momento, podia-se apenas dizer que a cada articulação correspondia um tipo
de segmentaridade ou de multiplicidade: um maleável, sobretudo molecular e
apenas ordenado; outro mais duro, molar e organizado (DELEUZE & GUATARRI,
1995).
Na verdade, embora a primeira articulação não deixasse de apresentar
interações sistemáticas, era sobretudo no nível da segunda que se produziam
fenômenos de centramento, unificação, totalização, integração, hierarquização,
finalização, que formavam uma sobrecodificação. Cada uma das duas
articulações estabelecia relações binárias entre seus próprios segmentos
(DELEUZE & GUATARRI, 1995). Assim nasce a Bioarte, uma fita dupla
indissociável originaria da associação. A força dos signos do universo da Bioarte
em um “ao meu redor” de cores, linhas e idéias que criam pela invenção e
imaginação.
26
A bioarte de Kac
Eduardo Kac nasceu no Rio de Janeiro, formou-se em Comunicação Social
na PUC do Rio de Janeiro. No começo dos anos 80 ele criou uma série de
performances de conteúdo político e de humor em espaços públicos, que
resultaram no livro "Escracho". Produziu a partir de 1983 obras como a
holopoesia, e a holografia digital. Pioneiro da arte digital e transgênica, Kac
concebeu e desenvolveu arte da telepresença com robôs de controle remoto que
interagiam com os participantes, entre outros projetos estão "Ornitorrinco", "Rara
Avis", "A-positivo", "Time Capsule".
Inaugurando a "arte transgênica", Kac apresentou em 1999 a obra
"Genesis". Kac criou um “gene artista” sintético, produzido através de um trecho
do Velho Testamento transcrito para código Morse e depois de código Morse para
DNA. Neste código os traços representam a timina, os pontos a citosina, o espaço
entre as palavras a adenina e o espaço entre as letras a guanina; assim, tem-se
os quatro constituintes fundamentais do DNA, num "alfabeto" genético. A
sentença bíblica diz: "Deixe que o homem domine sobre os peixes do mar, sobre
as aves do céu e sobre todos os seres vivos que se movem na terra" (Gênese 1,
28). O gene foi introduzido em bactérias, que foram postas em placas de Petri. Na
galeria, as placas foram postas sobre uma caixa de luz ultravioleta controlada por
participantes remotos na Web. Ao acionar a luz UV, participantes causam
mutação do código genético e assim mudam o texto contido no corpo das
bactérias. Após a exposição, o gene foi lido e o texto mutante publicado no site de
Kac.
Kac gerou enorme polêmica internacional com sua obra "GFP Bunny"
(2000), que incluiu a criação, através de engenharia genética, de uma coelha com
GFP (figura 6), ou Proteína Fluorescente Verde, sob luz azul a coelha emite luz
verde. Kac chamou atenção para o fato de que a coelha é perfeitamente saudável
e que ele assumia responsabilidade por seu bem estar. Desde o princípio o
objetivo do artista era trazer a coelha para viver com ele e sua família em
Chicago.
27
Figura 6: Alba
Fonte: http://www.labjor.unicamp.br/comciencia/img/divulgacao/ar_cris/1_final.jpg
28
Em 2001 Kac criou sua terceira obra transgênica, "O Oitavo Dia", uma
verdadeira ecologia de seres trasgênicos verdes, todos criados com GFP (figura
7). A obra, que se conectava à Internet de várias formas, ainda incluiu um robô
biológico, o segundo criado por Kac. Em seguida vieram as obras "Move 36"
(2002/04), e a série "Espécime do Segredo sobre Descobertas Maravilhosas"
(2006).
A mais recente obra de Eduardo Kac é chamada "História Natural do
Enigma" é um plantimal, uma nova forma de vida que Kac criou e que ele chama
"Edunia", a flor é um novo tipo de Petunia que Kac inventou e produziu através de
biologia molecular. A Edunia (figura 8) não é encontrada na natureza. Ela tem
veias vermelhas e pétalas cor de rosa. Um gene do artista é expresso em todas
as células de suas veias vermelhas, isto é, o gene de Kac produz uma proteína
somente na rede venosa da flor. O gene foi isolado e sequenciado a partir do
sangue do artista. As pétalas cor de rosa contra as quais as veias vermelhas são
vistas, são evocativas do próprio tom de pele rosada de Kac. O resultado desta
manipulação molecular é uma planta que cria a imagem viva de sangue humano
correndo nas veias de uma flor.
O gene que Kac selecionou de seu próprio genoma é responsável pela
identificação de corpos estranhos, ou seja, nesta obra é precisamente aquilo que
identifica e rejeita o outro que o artista integra no outro, criando assim uma nova
espécie de ser que é parcialmente flor e parcialmente humano. "História Natural
do Enigma" é uma reflexão sobre a contiguidade da vida entre as diferentes
espécies. Usa a vermelhidão do sangue e a vermelhidão das veias da planta
como um marcador do nosso patrimônio comum. Com a combinação do DNA
humano e o da planta em uma nova flor, de uma maneira visualmente dramática
(expressão em vermelho do DNA humano nas veias da flor), Kac faz brotar a
poética da contiguidade da vida entre as diferentes espécies.
Na expectativa de um futuro no qual Edunias sejam acessíveis e plantadas
por toda parte, Kac criou um conjunto de "Edunia Seed Packs" (Pacotes de
Sementes da Edunia), que estão incluídos na exposição. Os "Edunia Seed
29
Figura 7: O Oitavo Dia
Fonte: http://www.upenn.edu/pennnews/photos/704/mice.jpg
30
Packs" contêm as sementes da Edunia e fazem parte da coleção permanente do
Museu de Arte Weisman.
Eduardo Kac demonstra em seu trabalho a simbiose que tentou-se
descrever neste artigo, pois explora de maneira muito interessante toda a
molaridade da bioquímica atrelada a molecularidade da arte contemporânea,
oportunizando que nosso rizoma crie novas linhas de fluxo para compor esta
cartografia. Na bioarte temos uma dupla articulação que traz em si um corpo
híbrido capaz de conter apenas os melhores genes das duas partes.
31
Figura 8: Edunia – híbrido produzido a partir de um gene do artista.
Fonte: http://www.ekac.org/nat.hist.enig.port.html
32
Efeito da reação
Duarte (2005) nos conta sobre o conceito de fronteira em Deleuze e nele o
autor nos diz que fronteiras são sítios de exacerbação e de excesso, onde limites
são ultrapassados, novas dimensões descobertas, e reodenamentos
encaminhados.
Colocando-se neste lugar a professora/pesquisadora tem sua ordem se
perdendo aos poucos, pois habitando a fronteira ao longo destes meses, viu
surgir em seu pensamento espaços de ruptura e conflito, ambientes de
extremidades, crista e culminação, ao limite de precisar ser resgatada as vezes,
pela orientação gentil que diz: não esquece bioquímica é bioquímica, arte é arte e
filosofia é filosofia. Pois a originalidade criada pela via de multiplicação da
experiência produziu fusões de conceitos nem sempre mixáveis.
Nesses espaços de fronteira a imaginação se liberta, são lugares de devir;
“domínio das simbioses que coloca em jogo seres de escalas e reinos
inteiramente diferentes, sem qualquer filiação possível” (Deleuze, 1997), nesta
simbiose foi possível produzir a comunicação entre duas populações
heterogêneas que propagaram, povoaram e produziram um híbrido.
Aos poucos este devir deve involuir. No sentido de “formar um bloco que
corre segundo sua própria linha, „entre‟ os termos postos em jogo, e sob as
relações assinaláveis” (Deleuze, 1997), e neste involuir, nem retorna ao seu
estado inicial, nem segue habitando a instabilidade, mas passa a situar-se em um
novo território, que reconfigura uma prática pedagógica, agora buscando o
contexto ao invés da fórmula, afinal aprender e ensinar química não depende
apenas dos conceitos, dos diagramas e das fórmulas....mas depende também do
valor que cada conteúdo produz no cotidiano do indivíduo. Percebo que o velho
discurso de que “tudo tem química” ganha agora uma nova dimensão, pois prefiro
que meu aluno identifique e traga para a sala de aula uma matéria do jornal, ou
um recorte de revista, do que saiba construir o diagrama de Pauling .
33
Referências
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v. 1.
ARAUJO, Andre Luiz (2006). Corpo e Arte Contemporânea: O mosaico polimorfo
em Farnese de Andrade. http://www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/
anteriores/edicao11/materia03/ - acessado em junho de 2009.
Arte Contemporânea: http://pt.wikipedia.org/wiki/Semana_de_Arte_Moderna -
acessado em maio de 2009.
Associação Nacional de Bioquímicos. História da Bioquímica: Da célula ao
metabolismo. http://www.anbioq.org/node/30 - acessado em maio de 2009.
Corpo - http://luizcarlosgarrocho.blogspot.com/2007/06/deleuze-corpo-como-
reverso-filosfica.html - acessado em maio de 2009.
CRUZ, João Everton (2006). A filosofia da Diferença. disponível para download
em http://www.overmundo.com.br/overblog/a-filosofia-da-diferenca - acessado em
junho de 2009.
DANTAS, A. G. A. Antonin Artaud: Cartógrafo do Abismo. Disponível para
download no site: http://www.eca.usp.br/nucleos/filocom/downloads.html ou
www.eca.usp.br/nucleos/filocom/alex.doc
DELEUZE, Gilles (1997). Crítica e Clínica. 34, v. 1.
DELEUZE, Gilles (1998). Diferença e repetição, Graal, v. 1.
DELEUZE, Gilles (2000). Lógica do sentido. Perspectiva, v. 1.
DELEUZE, Gilles, e GUATTARI, Félix (1995). Mil Platôs: capitalismo e
esquizofrenia. 34, v. 1.
DELEUZE, Gilles, GUATTARI, Félix (1996). Mil Platôs: capitalismo e
esquizofrenia. 34, v. 3.
34
DUARTE, Luis Sérgio (2005). O Conceito de fronteira em Deleuze e Sarduy.
Textos de História/ UnB, v. 13, nº 2.
Eduardo kac - http://www.ekac.org/nat.hist.enig.port.html - acessado em junho de
2009.
Exposição Corpo humano: http://www.corpohumanopoa.com.br/en/directions.php
- acessado em junho de 2009.
Filmes: http://www.espacoacademico.com.br/012/12videos.htm - acessado em
junho de 2009.
Filmes: http://www.loucosporcinema.com.br/ - acessado em maio de 2009.
Lygia Clark: http://www.lygiaclark.org.br/portmenu.htm - acessado em maio de
2009.
MENEZES, Marta (2003). The Artificial Natural: Manipulating Butterfly Wing
Patterns for Artistic Purposes. Leonardo, v. 36, nº1.
Música do DNA: The Secret Life of DNA - DNA Music compositions.
http://www.yourdnasong.com/ - acessado em julho de 2009.
PETERS, Michael (2000). Pós-estruturalismo e filosofia da diferença: uma
introdução. Autêntica, v. 1.
RIFFITHS, WESSLER, LEWONTIN, GESBART, SUZUKI, MILLER (2006).
Introdução à Genética. Guanabara Koogan, v. 8.
ROCHA, Eduardo (2009). Arquiteturas do Abandono: ou uma cartografia nas
fronteiras da arquitetura, da filosofia e da arte [Tese de Doutorado]. Porto Alegre:
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ROCHA, Eduardo (2008). Cartografias Urbanas: método de exploração territorial.
Projectare, v. 2.
ROLNICK, Suely (1996). Lygia Clark e o híbrido arte/clínica. Percurso - Revista de
Psicanálise, v. 8, nº 16.
35
ROLNICK, Suely (1999). Molda-se uma alma contemporânea: o vazio-pleno de
Lygia Clark. In The Experimental Exercise of Freedom: Lygia Clark, Gego,
Mathias Goeritz, Hélio Oiticica and Mira Schendel. The Museum of Contemporary
Art.
ROLNICK, Suely (1999). Novas figuras do caos: mutações da subjetivação
contemporânea. In: Caos e Ordem na Filosofia e nas Ciências, org. Lucia
Santaella e Jorge Albuquerque Vieira. Face e Fapesp, São Paulo.
SANTAELLA, Lucia (2008). Corpo e comunicação: sintoma da cultura. Paulus, v.
3.
Simbiose: http://www.todabiologia.com/dicionario/simbiose.htm - acessado em
julho de 2009.

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Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea

  • 1. Universidade Federal de Pelotas Faculdade de Educação Programa de Pós-Graduação em Educação Formação Docente e Contemporaneidade Viviane Maciel da Silva Tavares Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea Artigo Pelotas 2009
  • 2. 2 Viviane Maciel da Silva Tavares Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea Artigo apresentado ao Programa de Pós Graduação em Educação, da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial para a obtenção do grau de Especialista em Educação. Área de Concentração: Formação Docente e Contemporaneidade. Orientador: Eduardo Rocha Pelotas 2009
  • 3. 3 Viviane Maciel da Silva Tavares Bioquímica e Arte: a simbiose contemporânea. 2009. Artigo (Especialização em Educação) – Universidade Federal de Pelotas. Programa de Pós-Graduação em Educação. Núcleo de Formação Docente e Contemporaneidade. Orientador: Eduardo Rocha 1. DNA. 2. Arte Contemporânea. 3.Química. 4. Bioarte. 5. Educação.
  • 4. 4 Sumário Simbiose................................................................................................................. 5 Processos Químicos .............................................................................................. 6 Parte I: Formas Duras ............................................................................................ 9 No interior dos Cromossomos – Bioquímica .......................................................... 9 Emparelhamento de bases – a aproximação da fronteira .................................... 13 2218 Pares de Base .............................................................................................. 16 Parte II. Flexibilização da Forma.......................................................................... 20 Replicação Celular ............................................................................................... 20 Parte III: Formas Flexíveis.................................................................................... 24 A Fita Dupla da Molécula ..................................................................................... 24 A bioarte de Kac................................................................................................... 26 Efeito da reação ................................................................................................... 32 Referências .......................................................................................................... 33
  • 5. 5 Simbiose “relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de espécies diferentes. Na relação simbiótica, os organismos agem ativamente em conjunto para proveito mútuo, o que pode acarretar especializações funcionais de cada espécie envolvida. A simbiose também é chamada de protocooperação” Fonte: http://www.todabiologia.com/dicionario/simbiose.htm Figura 1: Imagem do livro Simbiose Fonte: http://www.audienciazero.org/eixo/images/stories/imagens/portugal/artecontemporanea/salomeSilva/simbiose/simbiose_02.jpg
  • 6. 6 Processos Químicos Diários de classe, receitas de bolo, coleções e metodologias são ferramentas de tradução de processos de produção de sentido. Minha construção começa em um processo consciente, de uma busca nem tão consciente assim, por um “algo a mais” ainda não desvendado, ou, não bem elucidado na mente da pesquisadora. Este artigo é um relato, a partir de uma perspectiva que busca a cartografia, de um primeiro encontro pouco confortável, o qual esbarra no conceito duro, na forma estática, que se preocupa com a ética ao invés da estética, e que busca pela lógica ao invés da sensação. Como a de deparar-se com a coelha verde, “Ah brilha no escuro é?!? Por quê??? Com que objetivo???”. Ou um segundo encontro forçoso, com um que de “Tah! Vamos olhar pra isso então”, que resulta em borboletas de orquídeas, pelas mãos de uma artista. Assim, de uma maneira ainda tímida, a cabeça inclina pra que o olhar se dobre, e dobre também o pensamento. Pensamento agora atravessado por um movimento novo, que perde a dimensão de Uno ao mesmo tempo em que se esforça para ganhar dimensão de múltiplo. É possível pensar cartografias como mapas, desenhos destinados a representar o espaço, o lugar, seja ele geográfico ou conceitual. Para os geógrafos cartografia é mapa, é comunicação e análise, seja ela visual, imagética, fílmica, sonora, ou dos sentidos, das sensações. De localizar e sentir o mundo1 . Para Gilles Deleuze e Félix Guattari, os indivíduos ou grupos são atravessados por verdadeiras linhas, fusos e meridianos distintos. Nossa existência é uma espécie de geografia. Somos corpos cartográficos. Assim como ______________________________ 1 “Como forma de comunicação, a cartografia apresenta distorções da realidade, mas toda a mensagem é uma mensagem distorcida da realidade, nenhuma é isenta. Toda ela é política. O que precisamos, é saber qual é a política de nossa cartografia, quais as minhas escolhas, meus caminhos e meus dejetos. In (Rocha, 2008)
  • 7. 7 os mapas geográficos delimitam e registram territórios políticos, econômicos e culturais, os indivíduos também são registrados e cruzados por linhas. Algumas dessas linhas são postas do exterior para eles e não se cruzam, ao contrário, separam-se e demarcam os seus próprios territórios. Outras são produtos do acaso, mas há outras que devemos inventá-las, traçá-las, efetivamente, na vida. Devemos inventar nossas próprias linhas de fuga. Mesmo que para alguns indivíduos ou grupos nunca seja possível construí-las; Outros já as perderam. As linhas de fuga são “uma questão de cartografia. Elas nos compõem, assim como compõem nosso mapa. Elas se transformam e podem mesmo penetrar uma na outra.”2 Todos nós usamos mapas, e os construímos na medida em que nos localizamos em determinado território. Esta localização nos mapas pressupõe um encontro, uma experiência, uma experimentação. Leitor e autor do mapa são sujeitos ativos na comunicação cartográfica, devem lutar para isso. É preciso, na montagem ou leitura de um mapa, estar à espreita, reparar, espiar, reinventar e, de alguma forma, sentir a vida que passa por ali. Carreados por estas linhas de fuga, chegam ao encontro do corpo outros movimentos como a filosofia da diferença3 e com ela diversos materiais colecionáveis vão se descortinando pra falar de uma nova tendência de produzir ciência através da arte contemporânea, compondo assim mais um pontos de orientação no mapa cartográfico. A professora, química, teórica, lógica, exata, pesquisadora – molar – vai em busca de novas formas flexíveis e mutáveis, também teóricas, mas pouco lógicas e nem um pouco exatas de pesquisa – molecular – que conferem crescimento pessoal e prazer em colecionar, buscar, conhecer, desvelar. ______________________________ 2 DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. (tradução de Aurélio Guerra Neto et alii). Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia, v. 3. Rio de Janeiro: ed.34, 1996. 3 Filosofia da diferença tem como importância o estudo da singularidade e da particularidade que habita em cada pessoa. Por sua vez, a filosofia da diferença tem como entusiasmo criador os estudos dos antropólogos, pois se debruçam a estudar o fenômeno da diversidade, da pluralidade, da singularidade e das diferentes culturas. In: (http://www.overmundo.com.br/overblog/a-filosofia- da-diferenca)
  • 8. 8 Nesta busca, várias coleções se formaram, dentre as quais podem ser destacadas:  Coleção de Filmes – Ficção Científica: A Ilha (2005), AI: Inteligência Artificial (2001), Gattaca (1997), Jurassic Park (1993), THX 1138 (1967), Efeito borboleta (2004), 2001 uma odisséia no espaço (1968), Sun shine – alerta solar (2007), Laranja Mecânica (1971).  Coleção de Artistas Contemporâneos: Eduardo Kac, Lígia Clark, George Gessert, Marta de Menezes, Oron Catts, entre outros.  Coleção de Autores Contemporâneos: Gilles Deleuze, Félix Guattari, Suely Rolnik, Antonin Artaud, Pamela Champe, Bayardo Torres, Anne Calquelin, entre outros. Assim cada uma destas coleções produziu na pesquisadora um novo encontro. Um encontro que pode dar-se com uma palavra, com uma obra de arte, com um texto, com uma coisa, com um lugar. Um encontro provoca uma oscilação no campo subjetivo, um deslocamento intensivo, uma ligeira ou grande perda de referências, o que Deleuze e Guattari chamaram desterritorialização: uma irrupção, uma sacudida ou desmoronamento de um território subjetivo, que ocorre por efeito de pressões causadas pelas forças postas em movimento na experiência mesma de se estar vivo. Contagiada pelos perceptos produzidos pela arte contemporânea e pelo movimento da bioarte que ela produz quando aliada à bioquímica, a professora vê surgirem afectos em sua prática. De tal sorte que, ainda agora não se encontra de vez na desordem, mas já permite, aceita e busca, por um pouco menos de ordem no seu mundo e vê surgir em sua metodologia, menos método e mais cartografia. Este artigo tem como intenção mostrar os dois lados desta fronteira do conhecimento, aqui chamadas de formas duras e a partir deles tratar da bioarte, chamada de forma flexível, enquanto um lugar habitável, como um novo estado de devir.
  • 9. 9 Parte I: Formas Duras No interior dos Cromossomos – Bioquímica Ácido Desoxirribonucléico – DNA – uma estrutura molecular. Uma descoberta estadunidense e britânica de 7 de Março de 1953, que lhes valeu o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1962. Menino para a química é um polímero de unidades simples de pares de nucleotídeos4 , cuja essência é formada por açúcares e fosfatos intercalados unidos entre si. Ligados à molécula de açúcar produz uma seqüência de quatro bases (Adenina, Citosina, Guanina, Timina) ao longo da molécula de DNA que carrega a informação genética. Pré-Adolescente para a biologia, dentro da célula, o DNA é organizado numa estrutura chamada cromossoma5 e o conjunto de cromossomas de uma célula forma o cariótipo6 . O cariótipo se duplica antes da divisão celular e o seu DNA dentro do núcleo. Estas estruturas compactas guiam as interações entre o DNA e outras proteínas7 , ajudando a controlar que partes do DNA são transcritas. O DNA é responsável pela transmissão das características hereditárias de cada espécie de ser vivo, é único e provém de uma recombinação dos códigos dos pais doadores. _____________________________ 4 Nucleotídeos são compostos ricos em energia e que auxiliam os processos metabólicos, principalmente as biossínteses, na maioria das células. Funcionam ainda como sinais químicos, respondendo assim a hormônios e outros estímulos extracelulares; eles são também componentes estruturais de cofatores enzimáticos, intermediários metabólicos e ácidos nucléicos. Os nucleóticos podem ser considerados os monômeros da DNA/RNA, sendo o polímero, o próprio DNA/RNA. 5 Cromossoma é uma longa sequência de DNA, que contém vários genes, e outras sequências de nucleotídeos com funções específicas nas células dos seres vivos. 6 Cariótipo é o conjunto cromossômico ou a constante cromossômica diplóide (2n) de uma espécie. Representa o número total de cromossomos de uma célula somática (do corpo), as células somáticas humanas apresentam 46 cromossomas. 7 Proteínas são compostos orgânicos de estrutura complexa, sintetizadas pelos organismos vivos através da condensação de um grande número de moléculas de alfa-aminoácidos, através de ligações denominadas ligações peptídicas. As proteínas são os componentes químicos mais importante do ponto de vista estrutural.
  • 10. 10 Jovem então Bioquímica – de união, de interação – a química da célula. O DNA dos seres vivos começou a ser manipulado em 1972. Inicialmente introdução e eliminação de genes8 foram conseguidas apenas em microorganismos, mas rapidamente passou a ser realizada em organismos mais complexos. O primeiro mamífero geneticamente modificado surgiu no início dos anos oitenta (1981). Permição então, para investigar a função e a localização dos genes e as proteínas características de cada espécie. Adulto agora é tronco9 , base para o rizoma com o qual se torna possível formar quaisquer novos organismos, sejam órgãos, tecidos, espécies. Para Deleuze e Guattari, o rizoma funciona através de encontros e agenciamentos, como um verdadeiro mapa das multiplicidades, “voltado para uma experimentação ancorada no real”, aberto, desmontável, reversível, sujeito a modificações permanentes, sempre com múltiplas entradas (DELEUZE & GUATTARI, 1995). Assim como as estruturas recombinantes do DNA, onde os pares de bases nitrogenadas podem ser substituídos, reorganizados, redistribuídos, mutados, clonados, num copia e cola de pontes de hidrogênio10 rizomáticas. Ainda segundo os autores, um rizoma não tem nem sujeito nem objeto, senão unicamente determinações, tamanhos, dimensões, que não podem aumentar sem que ela mude sua natureza, um sequenciamento genético que muda sua natureza na medida em que aumentam suas conexões. Em um rizoma __________________________________________________________ 9 Gene é a unidade fundamental da hereditariedade. Cada gene é formado por uma sequência específica de ácidos nucléicos (DNA e RNA). é um segmento de um cromossomo a que corresponde um código distinto, uma informação para produzir uma determinada proteína ou controlar uma característica, por exemplo, a cor dos olhos. 10 Tronco referência as células-tronco, também conhecidas como células-mãe ou células estaminais, são células que possuem a melhor capacidade de se dividir dando origem a células semelhantes às progenitoras. As células-tronco dos embriões têm ainda a capacidade de se transformar, num processo também conhecido por diferenciação celular, em outros tecidos do corpo, como ossos, nervos, músculos e sangue. Devido a essa característica, as células-tronco são importantes, principalmente na aplicação terapêutica, sendo potencialmente úteis em terapias de combate a doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes tipo-1, acidentes vasculares cerebrais, doenças hematológicas, traumas na medula espinhal e nefropatias.
  • 11. 11 "O rizoma conecta um ponto qualquer com outro ponto qualquer, e cada um de seus traços não remete necessariamente a traços de mesma natureza, ele põe em jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive estados de não-signos. O rizoma não se deixa reduzir nem ao Uno nem ao múltiplo... Ele não é feito de unidades, mas de dimensões, ou antes, de direções movediças. Não tem começo nem fim, mas sempre um meio, pelo qual ele cresce e transborda. Ele constitui multiplicidades" (DELEUZE, 2000) Figura 2: Representação tridimensional das bases de uma molécula de DNA. Fomte: http://www.chemicalgraphics.com/paul/images/DNA/gem-dna.jpg l
  • 12. 12 não há pontos ou posições como ocorre em uma estrutura de árvore, uma raiz. Em um rizoma só há linhas (DELEUZE & GUATTARI, 1995). A noção de unidade somente aparece quando se produz em uma multiplicidade uma tomada de poder pelo significante, um processo de correspondência de subjetivação. Um rizoma ou multiplicidade11 nunca se deixa codificar, nunca dispõe de dimensão suplementar ao número de suas linhas, as multiplicidades se definem por ele afora: pelas linhas abstratas, linhas de fuga ou de desterritorialização, segundo a qual mudam de natureza ao conectarem-se com outras (DELEUZE & GUATTARI, 1995). ___________________________________ 10 Pontes de hidrogênio são interações que ocorrem entre os íons de hidrogênio e dois ou mais átomos, de forma que o hidrogênio sirva de "elo" entre os átomos com os quais interage. São as interações intermoleculares mais intensas, medidas tanto sob o ponto de vista energético quanto sob o ponto de vista de distâncias inter atômicas, essa ligação se estabelece, sobretudo com os elementos muito eletronegativos (F;O;N). A ligação intra molecular se faz na mesma molécula e a intermolecular se faz entre duas moléculas. 11 Multiplicidade para os autores multiplicidades são enunciadas como encontros "A multiplicidade não deve designar uma combinação de múltiplo e de um, mas, ao contrário, uma organização própria do múltiplo enquanto tal, que não tem necessidade alguma da unidade para formar um sistema." (DELEUZE, 1998).
  • 13. 13 Emparelhamento de bases – a aproximação da fronteira Cada tipo de base numa cadeia forma uma ligação com apenas um tipo de base na outra cadeia. Este comportamento é designado de complementariedade de bases. Assim, as purinas12 formam pontes de hidrogênio com pirimidinas13 . Este arranjo de dois nucleotídeos complementares na dupla hélice é chamado par de base. Além das pontes de hidrogênio entre as bases, as duas fitas são mantidas juntas devido a forças geradas por interações hidrofóbicas14 entre as bases empilhadas, a qual não é influenciada pela sequência do DNA. Como as pontes de hidrogênio não são ligações covalentes15 , podem ser quebradas e reunidas com relativa facilidade. Como resultado desta complementariedade, toda a informação contida numa das cadeias de DNA está também contida na outra, o que é fundamental para a replicação do DNA. Os dois tipos de pares de base formam diferentes números de ligações por pontes de hidrogênio: A - T (Adenina e Timina) formam duas pontes de hidrogênio enquanto que G - C (Guanina e Citosina) formam três pontes de hidrogênio. Desta forma a interação entre Guanina e Citosina é mais forte que Adenina e Timina. Como resultado, as percentagens de Guanina e de Citosina disponíveis __________________________________ 12 Purinas são compostos orgânicos heterociclícos de bases nitrogenadas compostas por um anel aromático duplo, são as bases dos ácidos nucleicos, a adenina e a guanina. No DNA estas bases unem-se às pirimidinas complementares. 13 Pirimidina são compostos orgânicos semelhantes ao benzeno, mas com um anel heterocíclico, no qual dois átomos de nitrogénio substituem o carbono nas posições 1 e 3. Três das bases dos ácidos nucleicos, a citosina, a timina e o uracila, são derivados pirimídicos. 14 Hidrofóbicas designam uma qualidade molecular em contato com a água, ou seja, compostos hidrofóbicos são iminscíveis em água. Como exemplo podemos citar solventes orgânicos de longa cadeia carbônica em contato com a água. 15 Ligação Covalente é caracterizada pelo compartilhamento de um ou mais pares de Elétrons entre átomos, causando uma atração mútua entre eles, que mantêm a molécula resultante unida. Átomos tendem a compartilhar elétrons de modo que suas camadas eletrônicas externas sejam preenchidas e eles adquiram uma distribuição eletrônica mais estável. Ligações covalentes normalmente ocorrem entre átomos com eletronegatividades similares e altas.
  • 14. 14 em uma dupla hélice de DNA determinam as forças de interação entre os dois lados da cadeia de DNA. Conseqüentemente, podemos perceber que uma parte da dupla cadeia de DNA pode ser separada facilmente, nas porções das sequências com maior predomínio de A - T, tal como a T-A-T-A-A-T, para facilitar a abertura da dupla cadeia quando da transcrição16 . Eis os espaços no código. Espaços no código que se localizam entre um meio caracterizado como uma superfície fronteiriça a ser conquistada, a superfície que guarda os devires que se desprenderam do fundo absoluto dos corpos e que estão por se metamorfosear em acontecimento às coisas, aos objetos, aos códigos, aos sujeitos. Tal fronteira – a se efetuar, é o sentido-acontecimento que, se chega a delimitar as duas instâncias, o faz segundo a articulação de suas diferenças. Mais que delimitá-las, separá-las, ele as conecta pela diferença17 . “Queremos pensar na diferença em si mesma e a relação do diferente com o diferente, independente das formas da representação que as conduzem ao Mesmo e as fazem passar pelo negativo” (DELEUZE, 2006). A filosofia da diferença se debruça a estudar o fenômeno da diversidade, da pluralidade, da singularidade e das diferentes culturas, sua presença brota a pedagogia que ___________________________ 16 Transcrição é o processo de formação do RNA a partir do DNA. Esse RNA formado é o RNAm (RNA mensageiro), que tem como função "informar" ao RNAt (RNA transportador) a ordem correta dos aminoácidos a serem sintetizados em proteínas. O processo é catalisado pela enzima RNA- polimerase. Os fatores de transcrição (auxiliares da RNA-polimerase) são responsáveis por romper as pontes de hidrogênio entre as bases nitrogenadas dos dois filamentos de DNA, como se fosse um zíper. A partir deste momento, a enzima escolhe uma das fitas de DNA como molde para se construir o RNAm, ligando bases nitrogenadas de RNA (adenina, citosina, uracila e guanina) à essa fita de DNA. Ao se concluir essas ligações, o processo está completo. A enzima destaca o filamento de RNA formado a partir do DNA, e volta a unir as duas fitas de DNA. 17 Nas palavras de Deleuze (1998): “As coisas e as proposições acham-se menos em uma dualidade radical do que de um lado e de outro de uma fronteira representada pelo sentido. Esta fronteira não os mistura, não os reúne (não há monismo tanto quanto não há dualismo), ela é, antes, a articulação de sua diferença: corpo/linguagem”. O mirante de Deleuze tornar-se-á cada vez mais claro: sua fronteira não será aquilo que irá delimitar, restringir, mas o que vai poder relacionar e articular os diferentes. Essa diferença em si, diferença na estrutura, o que bota a vazar o pensamento, do que não se pode controlar. A filosofia da diferença originada nos escritos de Nietzsche, que considerados coletivamente, “ajudaram a moldar o discurso pós-moderno diretamente, como no caso de Heidegger, Derrida, Foucault, Lyotard, Paul de Man, Deleuze e Guattari„. In: (PETERS, 2000).
  • 15. 15 respeita e cultiva o encontro dos distintos saberes. Cada ser humano é diferente e carrega em si um determinado tipo de saber. É na diferença que está a originalidade do pensamento bioquímico, o verdadeiro sentido e a riqueza de ser gente e ter consciência dos mecanismos que movimentam o corpo. Assim, por meio da fronteira, a dualidade aberta no código se estende e se dissemina em cada um dos ramos: a bioquímica na arte, a arte na bioquímica. No tocante às coisas, há certamente uma bioarte, o real que lhes constitui, mas há também o atributo lógico que caracteriza o instante infinitivo de uma transformação incorporal. Já quanto às proposições, os experimentos e os movimentos de performace, mas temos também os encontros, que expressam os acontecimentos (Deleuze, 1998).
  • 16. 16 2218 Pares de Base Quando se fala em arte contemporânea não é para designar tudo o que é produzido no momento, e sim aquilo que nos propõe um pensamento sobre a própria arte ou uma análise crítica da prática visual. “No contemporâneo, a experiência da desestabilização encontra-se a tal ponto intensificada que ela não mais se associa à doença; sua generalização a situa no âmbito de uma normalidade. Essa experiência tende então a ser vivida como fragilidade. O medo não é mais o de não conseguir configurar-se segundo um certo mapa, pois múltiplos são os mapas possíveis. O medo agora é de não conseguir reconfigurar- se de todo, de forma minimamente eficaz.”19 Como dispositivo de pensamento, a arte interroga e atribui novos sentidos ao se apropriar de imagens e objetos, não só os que fazem parte da história da arte, mas também as que habitam o cotidiano, por exemplo, a exposição Corpo Humano: Real e Fascinante, que embora não tenha sido idealizada como uma exposição de arte e sim como um movimento educacional, acaba por ganhar esta amplitude, no momento em que causa um encontro, embora desconfortável, em alguns observadores, ao ponto de ter sido proibida em alguns países.20 O belo contemporâneo não busca mais o novo, nem o espanto, como as ___________________________ 18 A Semana de Arte Moderna, também chamada de Semana de 22, ocorreu em São Paulo no ano de 1922, de 11 a 18 de fevereiro, no Teatro Municipal. Durante os sete dias de exposição, foram expostos quadros e apresentadas poesias, músicas e palestras sobre a modernidade. A Semana de Arte Moderna representou uma verdadeira renovação de linguagem, na busca de experimentação, na liberdade criadora da ruptura com o passado e até corporal, pois a arte passou então da vanguarda, para o modernismo. O evento marcou época ao apresentar novas idéias e conceitos artísticos, como a poesia através da declamação, que antes era só escrita; a música por meio de concertos, que antes só havia cantores sem acompanhamento de orquestras sinfônicas; e a arte plástica exibida em telas, esculturas e maquetes de arquitetura, com desenhos arrojados e modernos. O adjetivo "novo" passou a ser marcado em todas estas manifestações que propunha algo no mínimo curioso e de interesse. Participaram da Semana nomes consagrados do modernismo brasileiro, como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Víctor Brecheret, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia, Sérgio Milliet, Heitor Villa- Lobos entre outros. Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Semana_de_Arte_Moderna 19 Rolnick, Novas figuras do caos: mutações da subjetivação contemporânea. In: Caos e Ordem na Filosofia e nas Ciências, org. Lucia Santaella e Jorge Albuquerque Vieira. Face e Fapesp, São Paulo, 1999.
  • 17. 17 vanguardas da primeira metade deste século: propõe o estranhamento ou o questionamento da linguagem e sua leitura. A Arte é então um Corpo-vibrátil, sensível aos efeitos da agitação e da movimentação dos fluxos ambientais que nos atravessam no cotidiano. Corpo no qual germinam estados intensivos e desconhecidos provocados pelas novas composições que os fluxos, passeando para cá e para lá, vão fazendo e desfazendo. De tempos em tempos, estes fluxos avolumam-se a tal ponto que são capazes de produzir nos corpos uma germinação. Através dela, o corpo não consegue mais expressar-se em sua atual figura, busca, pois novas formas, de dizer, ser e conquistar. Para Deleuze e Guatarri, essas novas formas podem ser chamadas de conteúdos do corpo, e são substâncias que escorrem sobre tais corpos, partículas submoleculares e subatômicas, intensidades puras, singularidades livres pré- físicas e pré-vitais, que vão compor uma matéria, ou plano de consistência ou o Corpo sem Órgãos, que se mostra como um corpo não-formado, não-organizado, não-estratificado ou desestratificado, e que podem dar origem a novos e diferentes formatos. Na arte contemporânea o artista e obra se fazem simultaneamente, numa inesgotável heterogênese. É através da criação que o artista opera na materialidade de seu trabalho: aí se inscrevem as marcas de seu encontro singular com a possibilidade de sua transmissão: ampliam-se na subjetividade do receptor as chances de realizar ao seu modo um encontro, aproximar-se de seu corpo-vibrátil e expor-se às suas exigências de criação. ___________________________ 20 Corpo Humano: Real e Fascinante, já percorreu 34 cidades em todo o mundo, tem uma concepção diferenciada e inédita, desenvolvida em caráter prioritariamente educativo, sob direção médica do norte-americano Dr. Roy Glover. "Corpo Humano: Real e Fascinante" recorre a 22 corpos e 225 órgãos verdadeiros para revelar - em todos os seus aspectos - o funcionamento do corpo humano e seus sistemas. Para tanto, faz uso de uma técnica chamada polimerização, em corpos adultos de homens e mulheres, para obter resultados que evidenciam com absoluta precisão as variações e diferenças apresentadas por nossa espécie. Todos os corpos e órgãos exibidos são de indivíduos acometidos de morte natural, que optaram por participar de um programa de doação de seus próprios corpos em benefício da ciência e da educação, realizado pela República Popular da China.
  • 18. 18 “Dê-me portanto um corpo: esta é a fórmula da reversão filosófica. O corpo não é mais o obstáculo que separa o pensamento de si mesmo, aquilo que deve superar para conseguir pensar. É, ao contrário, aquilo em que ele mergulha ou deve mergulhar, para atingir o impensado, isto é, a vida." Gilles Deleuze
  • 19. 19 A arte é assim um sistema metabólico, em que estão combinados organismos invisíveis que povoam nosso corpo em sua generosa vida celular; corrente sanguínea de coragem de enfrentamento do trágico. De acordo com os contextos históricos, varia o grau de permeabilidade da membrana entre esta reserva de heterogênese e o resto dos organismos. O tanto que o corpo respira seus ares, depende do quanto o artista metaboliza sua obra. De outro lado, nosso corpo espectador tem se agitado mais do que nunca, novas tecnologias de comunicação e informação, cada indivíduo é permanentemente habitado por fluxos do planeta inteiro, o que multiplica as hibridações aguçando consequentemente o engendramento de diferenças que vibram no corpo. Assim, a disparidade entre a infinitude da produção de diferenças e a finitude das formas tem se exacerbado cada vez mais, entre a célula e o organismo não há mais quase intervalo, conforme nos alertava Lygia21 já nos anos sessenta; as formas são hoje mais efêmeras do que nunca. Em outras palavras: muitos fluxos, muita hibridação, produção de diferença intensificada é o que os artistas contemporâneos oferecem aos seus espectadores; _______________________________________ 21 Lygia Clark (Belo Horizonte, 1920 – Rio de Janeiro, 1988) em 1947 dedica-se ao estudo de escadas e desenhos de seus filhos. No ano de 1952, a artista expõe no Rio de Janeiro obras do Grupo Frente. Em 1954 dedica-se ao estudo do espaço e da materialidade do ritmo, com a linha- luz, como módulo construtor do plano. Em 1954, participa com a série “Composições”, da Bienal de Veneza. Em 1959, integra a I Exposição de Arte Neoconcreta, Clark propõe com a sua obra, que a pintura não se sustenta mais em seu suporte tradicional. Nas “Unidades, 1959”, moldura e “espaço pictórico” Clark pinta a moldura da cor da tela, é o que a artista chama de “linha orgânica”. Destas novas proposições nascem os “Casulos, 1959”, feitos em metal, o material permite que o plano seja dobrado, dando tridimensionalidade ao plano. Em 1960, Lygia cria a série “Bichos”: esculturas, feitas em alumínio, com dobradiças, que promovem a articulação das diferentes partes que compõem o seu “corpo”. Em 1961, ganha o prêmio de melhor escultura na VI Bienal de São Paulo. Na “Obra Mole, 1964”, “Caminhando, 1963” obteve grande destaque no cenário brasileiro. Em 1968 apresenta, “A casa é o corpo", uma instalação de oito metros, que permite a passagem das pessoas por seu interior, para que elas tenham a sensação de penetração, ovulação, germinação e expulsão do ser vivo. O corpo dessexualizado é apresentado na série “roupa-corpo- roupa: O Eu e o Tu, 1967”. Em 1972, as proposições “Arquiteturas biológicas, 1969", “Rede de elástico, 1973", “Baba antropofágica, 1973" e “Relaxação, 1974". “Objetos relacionais": na dualidade destes objetos (leves/pesados, moles/duros, cheios/vazios), Lygia trabalha o “arquivo de memórias” dos seus pacientes, os seus medos e fragilidades, através do sensorial. Em 1983 é publicado o “Livro Obra", que acompanha por meio de textos escritos pela própria artista e de estruturas manipuláveis, a trajetória da obra de Lygia.
  • 20. 20 Parte II. Flexibilização da Forma Replicação Celular As aproximações da Arte e da Ciência não são novas, historicamente vemos estas tentativas de reprodução e de criação da arte amparadas nos avanços, descobertas ou nas perspectivas do que busca a ciência. É através da química e da biologia que o trinômio arte-ciência-tecnologia vem se estreitando, especialmente ao longo do século XX, dando início a uma trajetória artística. Essa aproximação fica mais evidente, ao fazermos um breve ensaio pelo universo cinematográfico, em que nosso personagem DNA, é facilmente encontrado, a colorir a imaginação de autores e diretores. Deleuze sobre o cinema nos diz que como uma tabela de Mendeleiev em química, o cinema impõe novos pontos de vista. Na produção “The Island” de 2006 (título em português A Ilha), dirigido por Michael Bay, o autor descreve uma trama em que a empresa de engenharia genética Merrick Biotech, promete aos seus clientes proporcionar, pelo valor de US$ 5 milhões a criação de um ser amorfo, insensível, enfim, uma "massa" que tão somente serviria para produzir órgãos geneticamente idênticos ao do seu investidor. Porém, com o avanço das pesquisas demonstra que a perspectiva de criação de um clone que pudesse servir para transplante somente seria bem sucedida se este fosse realmente igual ao seu DNA doador, ou seja, um humano que sente, tem fome, dor e sentimentos como qualquer pessoa. Estes clones eram mantidos confinados em um complexo secreto de aparência futurística, sob o pretexto de o planeta Terra ter sido atacado por um vírus letal, após ter sido recoberto por água. Quando da necessidade de utilização destes clones, era simulado no complexo um sorteio, através do qual o beneficiário seria transferido a uma ilha, que supostamente, seria a última porção de terra habitável no planeta.
  • 21. 21 Uma interessante mescla de ficção científica22 mostra conceitos reais sendo aproximados de situações hipotéticas, detêm a atenção dos espectadores durante 127 minutos recheados de suspense e ação. A fim de produzir uma atmosfera de realismo um site foi desenvolvido na internet, no qual é possível consultar a empresa responsável pela criação dos clones e simular a utilização dos serviços (figura 4). Deleuze citando Bergson nos diz que, "Temos visões quase instantâneas da realidade que passa, e como elas são características desta realidade, basta-nos alinhá-las ao longo de um devir abstrato, uniforme, invisível, situado no fundo do aparelho do conhecimento... Percepção, intelecção, linguagem procedem em geral assim. Quer se trate de pensar o devir, ou de o exprimir ou até de o percepcionar, o que fazemos é apenas acionar uma espécie de cinematógrafo interior." Assim, a agora contemporânea simbiose DNA e Estrutura Molecular se aceleraram e se complementam. Este engajamento dos artistas no mundo da pesquisa científica sugere a impossibilidade da segregação DNA e Estrutura Molecular, como fitas complementares de RNA que se sintetizam para formar um novo código genético. A denominação que esta nova configuração de código recebeu é Bioarte, arte biológica, arte genética. _________________________________________ 22 Outras referências de filmes de ficção científica ao longo da história: Dr. Jekyll and Mr. Hyde (1931 – Rouben Manoulian): Para provar que o bem e o mal convivem nas pessoas, um médico pesquisador desenvolve uma fórmula que o faz perder o controle de seu lado demoníaco; The Invisible Man (1933 – James Whale): Um homem descobre a fórmula da invisibilidade e tenta descobrir seu antídoto, para que possa vendê-la e ficar rico; The Fly (1986 – David Cronemberg): Ao testar sua recentemente invenção, uma máquina de teletransporte, um cientista acidentalmente deixa entrar uma mosca na câmara. Quando é mais uma vez materializado, seu corpo sofre transformações genéticas irreversíveis; Jurassic Park (1993 – Steven Spielberg): Um milionário vê seu parque de diversões, estrelado por dinossauros recriados por engenharia genética, sair do controle quando uma falha humana os deixa livres pelo parque; Gattaca (1997 – Andew Niccol): No futuro, apenas os homens criados geneticamente em laboratórios têm valor. Concebido biologicamente, Vincent assume a identidade genética de um ex-atleta para conseguir destaque; A.I. Artificial Intelligence (2001 – Steven Spielberg): No futuro, onde parte das terras foi inundada pela elevação do nível dos mares e andróides convivem com os seres humanos, um cientista resolve, após perder seu único filho, criar um robô com todas as características daquele - inclusive a capacidade de pensar e sentir.
  • 22. 22 Figura 4: Site oficial do filme A Ilha nos EUA Fonte: http://www.theisland-themovie.com/ - acessado em junho de 2009.
  • 23. 23 Figura 5: Imagem do filme “A Ilha Fonte: http://img92.imageshack.us/i/ilha1ez4.jpg/
  • 24. 24 Parte III: Formas Flexíveis A Fita Dupla da Molécula As pesquisas biológicas circundam o DNA em vários níveis, desde sua constituição molecular até os organismos populacionais dele derivados. Esta manipulação de átomos através da introdução de ácidos nucléicos à estrutura molecular do DNA, para a produção de organismos geneticamente competentes, tem descortinado um nanouniverso para os amantes das cores e das formas, que devido à relevância do dilema os têm recebido nas inserções arte/biologia. Inserções estas que não são apenas emergentes, mas já diversificadas em obras de um aspecto representativo dos contextos. Pesquisadores constroem diferentes problemas e propõem diferentes soluções metodológicas, que vão de performances, a escultura, robótica e bioengenharia. Dentre os artistas contemporâneos que produzem movimentos na Bioarte, Eduardo Kac é um dos mais citados. Nesta movimentação não ocorre uma busca por reconstituir a vida social e cultural, mas por fazê-lo na própria vida humana, por buscar suas ramificações em variados sistemas de extensões tecnológicas, sua simulação de vida artificial e de sua replicação resultante da decifração do genoma, ou seja, a referência a um conceito que não captura a essência molecular, mas sua atmosfera é capaz de aguçar potencialidades de efetuar um ritmo e uma sensação em seu espectador. A dupla articulação é tão variável que não podemos partir de um modelo geral, mas apenas de um caso relativamente simples. Deleuze e Guatarri nos contam que a primeira articulação escolheria ou colheria, nos fluxos-partículas instáveis, unidades moleculares ou quase moleculares metaestáveis (substâncias) às quais imporia uma ordem estatística de ligações e sucessões (formas) (DELEUZE & GUATARRI, 1995).
  • 25. 25 A segunda articulação instauraria estruturas estáveis, compactas e funcionais (formas) e constituiria os compostos molares onde essas estruturas se atualizam ao mesmo tempo (substâncias) (DELEUZE & GUATARRI, 1995). Vê-se que as duas articulações não se dividem em uma para as substâncias e outra para as formas. As substâncias não passam de matérias formadas. As formas implicam um código, modos de codificação e descodificação. As substâncias como matérias formadas se referem a territorialidades, a graus de territorialização e desterritorialização. Mas há, justamente, código e territorialidade para cada articulação, cada uma comportando por sua conta, forma e substância. No momento, podia-se apenas dizer que a cada articulação correspondia um tipo de segmentaridade ou de multiplicidade: um maleável, sobretudo molecular e apenas ordenado; outro mais duro, molar e organizado (DELEUZE & GUATARRI, 1995). Na verdade, embora a primeira articulação não deixasse de apresentar interações sistemáticas, era sobretudo no nível da segunda que se produziam fenômenos de centramento, unificação, totalização, integração, hierarquização, finalização, que formavam uma sobrecodificação. Cada uma das duas articulações estabelecia relações binárias entre seus próprios segmentos (DELEUZE & GUATARRI, 1995). Assim nasce a Bioarte, uma fita dupla indissociável originaria da associação. A força dos signos do universo da Bioarte em um “ao meu redor” de cores, linhas e idéias que criam pela invenção e imaginação.
  • 26. 26 A bioarte de Kac Eduardo Kac nasceu no Rio de Janeiro, formou-se em Comunicação Social na PUC do Rio de Janeiro. No começo dos anos 80 ele criou uma série de performances de conteúdo político e de humor em espaços públicos, que resultaram no livro "Escracho". Produziu a partir de 1983 obras como a holopoesia, e a holografia digital. Pioneiro da arte digital e transgênica, Kac concebeu e desenvolveu arte da telepresença com robôs de controle remoto que interagiam com os participantes, entre outros projetos estão "Ornitorrinco", "Rara Avis", "A-positivo", "Time Capsule". Inaugurando a "arte transgênica", Kac apresentou em 1999 a obra "Genesis". Kac criou um “gene artista” sintético, produzido através de um trecho do Velho Testamento transcrito para código Morse e depois de código Morse para DNA. Neste código os traços representam a timina, os pontos a citosina, o espaço entre as palavras a adenina e o espaço entre as letras a guanina; assim, tem-se os quatro constituintes fundamentais do DNA, num "alfabeto" genético. A sentença bíblica diz: "Deixe que o homem domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os seres vivos que se movem na terra" (Gênese 1, 28). O gene foi introduzido em bactérias, que foram postas em placas de Petri. Na galeria, as placas foram postas sobre uma caixa de luz ultravioleta controlada por participantes remotos na Web. Ao acionar a luz UV, participantes causam mutação do código genético e assim mudam o texto contido no corpo das bactérias. Após a exposição, o gene foi lido e o texto mutante publicado no site de Kac. Kac gerou enorme polêmica internacional com sua obra "GFP Bunny" (2000), que incluiu a criação, através de engenharia genética, de uma coelha com GFP (figura 6), ou Proteína Fluorescente Verde, sob luz azul a coelha emite luz verde. Kac chamou atenção para o fato de que a coelha é perfeitamente saudável e que ele assumia responsabilidade por seu bem estar. Desde o princípio o objetivo do artista era trazer a coelha para viver com ele e sua família em Chicago.
  • 27. 27 Figura 6: Alba Fonte: http://www.labjor.unicamp.br/comciencia/img/divulgacao/ar_cris/1_final.jpg
  • 28. 28 Em 2001 Kac criou sua terceira obra transgênica, "O Oitavo Dia", uma verdadeira ecologia de seres trasgênicos verdes, todos criados com GFP (figura 7). A obra, que se conectava à Internet de várias formas, ainda incluiu um robô biológico, o segundo criado por Kac. Em seguida vieram as obras "Move 36" (2002/04), e a série "Espécime do Segredo sobre Descobertas Maravilhosas" (2006). A mais recente obra de Eduardo Kac é chamada "História Natural do Enigma" é um plantimal, uma nova forma de vida que Kac criou e que ele chama "Edunia", a flor é um novo tipo de Petunia que Kac inventou e produziu através de biologia molecular. A Edunia (figura 8) não é encontrada na natureza. Ela tem veias vermelhas e pétalas cor de rosa. Um gene do artista é expresso em todas as células de suas veias vermelhas, isto é, o gene de Kac produz uma proteína somente na rede venosa da flor. O gene foi isolado e sequenciado a partir do sangue do artista. As pétalas cor de rosa contra as quais as veias vermelhas são vistas, são evocativas do próprio tom de pele rosada de Kac. O resultado desta manipulação molecular é uma planta que cria a imagem viva de sangue humano correndo nas veias de uma flor. O gene que Kac selecionou de seu próprio genoma é responsável pela identificação de corpos estranhos, ou seja, nesta obra é precisamente aquilo que identifica e rejeita o outro que o artista integra no outro, criando assim uma nova espécie de ser que é parcialmente flor e parcialmente humano. "História Natural do Enigma" é uma reflexão sobre a contiguidade da vida entre as diferentes espécies. Usa a vermelhidão do sangue e a vermelhidão das veias da planta como um marcador do nosso patrimônio comum. Com a combinação do DNA humano e o da planta em uma nova flor, de uma maneira visualmente dramática (expressão em vermelho do DNA humano nas veias da flor), Kac faz brotar a poética da contiguidade da vida entre as diferentes espécies. Na expectativa de um futuro no qual Edunias sejam acessíveis e plantadas por toda parte, Kac criou um conjunto de "Edunia Seed Packs" (Pacotes de Sementes da Edunia), que estão incluídos na exposição. Os "Edunia Seed
  • 29. 29 Figura 7: O Oitavo Dia Fonte: http://www.upenn.edu/pennnews/photos/704/mice.jpg
  • 30. 30 Packs" contêm as sementes da Edunia e fazem parte da coleção permanente do Museu de Arte Weisman. Eduardo Kac demonstra em seu trabalho a simbiose que tentou-se descrever neste artigo, pois explora de maneira muito interessante toda a molaridade da bioquímica atrelada a molecularidade da arte contemporânea, oportunizando que nosso rizoma crie novas linhas de fluxo para compor esta cartografia. Na bioarte temos uma dupla articulação que traz em si um corpo híbrido capaz de conter apenas os melhores genes das duas partes.
  • 31. 31 Figura 8: Edunia – híbrido produzido a partir de um gene do artista. Fonte: http://www.ekac.org/nat.hist.enig.port.html
  • 32. 32 Efeito da reação Duarte (2005) nos conta sobre o conceito de fronteira em Deleuze e nele o autor nos diz que fronteiras são sítios de exacerbação e de excesso, onde limites são ultrapassados, novas dimensões descobertas, e reodenamentos encaminhados. Colocando-se neste lugar a professora/pesquisadora tem sua ordem se perdendo aos poucos, pois habitando a fronteira ao longo destes meses, viu surgir em seu pensamento espaços de ruptura e conflito, ambientes de extremidades, crista e culminação, ao limite de precisar ser resgatada as vezes, pela orientação gentil que diz: não esquece bioquímica é bioquímica, arte é arte e filosofia é filosofia. Pois a originalidade criada pela via de multiplicação da experiência produziu fusões de conceitos nem sempre mixáveis. Nesses espaços de fronteira a imaginação se liberta, são lugares de devir; “domínio das simbioses que coloca em jogo seres de escalas e reinos inteiramente diferentes, sem qualquer filiação possível” (Deleuze, 1997), nesta simbiose foi possível produzir a comunicação entre duas populações heterogêneas que propagaram, povoaram e produziram um híbrido. Aos poucos este devir deve involuir. No sentido de “formar um bloco que corre segundo sua própria linha, „entre‟ os termos postos em jogo, e sob as relações assinaláveis” (Deleuze, 1997), e neste involuir, nem retorna ao seu estado inicial, nem segue habitando a instabilidade, mas passa a situar-se em um novo território, que reconfigura uma prática pedagógica, agora buscando o contexto ao invés da fórmula, afinal aprender e ensinar química não depende apenas dos conceitos, dos diagramas e das fórmulas....mas depende também do valor que cada conteúdo produz no cotidiano do indivíduo. Percebo que o velho discurso de que “tudo tem química” ganha agora uma nova dimensão, pois prefiro que meu aluno identifique e traga para a sala de aula uma matéria do jornal, ou um recorte de revista, do que saiba construir o diagrama de Pauling .
  • 33. 33 Referências AMABIS, José Mariano, MARTHO, Gilberto Rodriges (2004). Biologia. Moderna, v. 1. ARAUJO, Andre Luiz (2006). Corpo e Arte Contemporânea: O mosaico polimorfo em Farnese de Andrade. http://www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/ anteriores/edicao11/materia03/ - acessado em junho de 2009. Arte Contemporânea: http://pt.wikipedia.org/wiki/Semana_de_Arte_Moderna - acessado em maio de 2009. Associação Nacional de Bioquímicos. História da Bioquímica: Da célula ao metabolismo. http://www.anbioq.org/node/30 - acessado em maio de 2009. Corpo - http://luizcarlosgarrocho.blogspot.com/2007/06/deleuze-corpo-como- reverso-filosfica.html - acessado em maio de 2009. CRUZ, João Everton (2006). A filosofia da Diferença. disponível para download em http://www.overmundo.com.br/overblog/a-filosofia-da-diferenca - acessado em junho de 2009. DANTAS, A. G. A. Antonin Artaud: Cartógrafo do Abismo. Disponível para download no site: http://www.eca.usp.br/nucleos/filocom/downloads.html ou www.eca.usp.br/nucleos/filocom/alex.doc DELEUZE, Gilles (1997). Crítica e Clínica. 34, v. 1. DELEUZE, Gilles (1998). Diferença e repetição, Graal, v. 1. DELEUZE, Gilles (2000). Lógica do sentido. Perspectiva, v. 1. DELEUZE, Gilles, e GUATTARI, Félix (1995). Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. 34, v. 1. DELEUZE, Gilles, GUATTARI, Félix (1996). Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. 34, v. 3.
  • 34. 34 DUARTE, Luis Sérgio (2005). O Conceito de fronteira em Deleuze e Sarduy. Textos de História/ UnB, v. 13, nº 2. Eduardo kac - http://www.ekac.org/nat.hist.enig.port.html - acessado em junho de 2009. Exposição Corpo humano: http://www.corpohumanopoa.com.br/en/directions.php - acessado em junho de 2009. Filmes: http://www.espacoacademico.com.br/012/12videos.htm - acessado em junho de 2009. Filmes: http://www.loucosporcinema.com.br/ - acessado em maio de 2009. Lygia Clark: http://www.lygiaclark.org.br/portmenu.htm - acessado em maio de 2009. MENEZES, Marta (2003). The Artificial Natural: Manipulating Butterfly Wing Patterns for Artistic Purposes. Leonardo, v. 36, nº1. Música do DNA: The Secret Life of DNA - DNA Music compositions. http://www.yourdnasong.com/ - acessado em julho de 2009. PETERS, Michael (2000). Pós-estruturalismo e filosofia da diferença: uma introdução. Autêntica, v. 1. RIFFITHS, WESSLER, LEWONTIN, GESBART, SUZUKI, MILLER (2006). Introdução à Genética. Guanabara Koogan, v. 8. ROCHA, Eduardo (2009). Arquiteturas do Abandono: ou uma cartografia nas fronteiras da arquitetura, da filosofia e da arte [Tese de Doutorado]. Porto Alegre: PROPAR|UFRGS. ROCHA, Eduardo (2008). Cartografias Urbanas: método de exploração territorial. Projectare, v. 2. ROLNICK, Suely (1996). Lygia Clark e o híbrido arte/clínica. Percurso - Revista de Psicanálise, v. 8, nº 16.
  • 35. 35 ROLNICK, Suely (1999). Molda-se uma alma contemporânea: o vazio-pleno de Lygia Clark. In The Experimental Exercise of Freedom: Lygia Clark, Gego, Mathias Goeritz, Hélio Oiticica and Mira Schendel. The Museum of Contemporary Art. ROLNICK, Suely (1999). Novas figuras do caos: mutações da subjetivação contemporânea. In: Caos e Ordem na Filosofia e nas Ciências, org. Lucia Santaella e Jorge Albuquerque Vieira. Face e Fapesp, São Paulo. SANTAELLA, Lucia (2008). Corpo e comunicação: sintoma da cultura. Paulus, v. 3. Simbiose: http://www.todabiologia.com/dicionario/simbiose.htm - acessado em julho de 2009.