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Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
Centro de Ciências Humanas
LICENCIATURA EM PEDAGOGIA




         ARACI DA SILVA CORRÊA




          ALFABETIZAÇÃO
      Uma perspectiva construtivista




                   Rio das Flôres
                        2012
ARACI DA SILVA CORRÊA




    ALFABETIZAÇÃO
Uma perspectiva construtivista




                 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
                 ao Curso de Licenciatura em Pedagogia do
                 Centro de Ciências Humanas da UNIRIO,
                 como requisito para obtenção do grau de
                 Pedagogo.

                 Orientadora: Márcia Maria e Silva




          Rio das Flôres
               2012
ARACI DA SILVA CORRÊA


    ALFABETIZAÇÃO
Uma perspectiva construtivista




                                       Avaliado por:


              __________________________________
                                           Orientador(a)



              __________________________________
                                     Segundo(a) leitor(a)




              Data da apresentação ___ / ____ / _____




          Rio das Flôres
               2012
DEDICATÓRIA


  Àqueles que acreditam que toda criança
tem direito a uma educação de qualidade.
AGRADECIMENTOS




       A Deus, que me acompanha desde o início desta caminhada e cuja força foi
imprescindível para que eu conseguisse realizar este sonho que há tanto tempo almejava.

       Àquelas cujos ensinamentos e incentivos foram fundamentais para a concretização
deste trabalho e consequentemente de minha realização pessoal e profissional: Margarete de
Barros, Diretora do Pólo Cederj do município de Rio das Flôres; Ana Paula Rocha e
Rosemeri Luiz Cesar, não apenas tutoras, mas amigas que nunca deixaram de acreditar em
minha capacidade.

       À minha família, de cuja companhia, por diversas vezes, precisei abrir mão, aceitando
alguns sacrifícios inevitáveis nesse processo de elaboração teórico-prática.

       Aos amigos, em especial à Ana Beatriz Magalhães Maia, que jamais admitiu que eu
sequer pensasse em abandonar o Curso.

       Finalmente à minha Orientadora, Professora Márcia Maria e Silva, por acreditar em
meu trabalho, pois sem sua orientação e incentivo, dificilmente conseguiria chegar até aqui.
EPÍGRAFE

“As condutas escritas de um aprendiz não são o
mero resultado daquilo que o professor ensina.
Existe um processo de construção desse
conhecimento que nem sempre coincide com aquilo
que está sendo ensinado.”


                    Maria da Graça Azenha
RESUMO




O presente trabalho busca refletir sobre o processo de alfabetização na perspectiva
construtivista bem como sobre meu próprio caminho de construção de conhecimentos nessa
área. Com base nas experiências que adquiri desde o ano de 1987 até hoje, como professora
regente e como assessora pedagógica, ponho-me em diálogo com alguns pesquisadores da
área: Ferreiro & Teberosky, Weisz & Sanches, Mortatti, Coll & Martin, Becker e Azenha .
Trabalho com breves recortes da história da alfabetização e da minha história de professora,
além de buscar um estudo sobre os pressupostos de uma abordagem construtivista da
alfabetização, tomando para isso também a psicogênese da língua escrita lida e vivenciada
também por dentro da sala de aula. A avaliação, o professor e a criança são também
problematizados com o propósito de destacar pontos fundamentais na relação entre o ensino
e a aprendizagem na escola. Este trabalho pretende, acima de tudo, mostrar que é possível
que a criança construa sua aprendizagem enquanto sujeito ativo e que a condição de
professor-pesquisador nos abre muitas possibilidades de aperfeiçoamento teórico-prático.



Palavras-chave: alfabetização, construtivismo
SUMÁRIO


Palavras iniciais................................................................................................9
Histórias de aprendizagem:configuração de um tema de
pesquisa.............................................................................................................14
Delimitando o campo…................................................................................20
Um pouco de história da alfabetização no Brasil. ..............................28
A perspectiva construtivista de alfabetização......................................32
Avaliação e o professor na perspectiva de alfabetização
construtivista....................................................................................................43
Conclusões provisórias................................................................................46
Referências bibliográficas...........................................................................48
10

Palavras iniciais



       Este constitui-se em um Trabalho de Conclusão do Curso de Licenciatura em
Pedagogia do Centro de Ciências Humanas da UNIRIO que visa problematizar            dúvidas
acerca do processo de aquisição do sistema de leitura e escrita, segundo a perspectiva
construtivista.

       Nesse momento, atuo como Assessora Pedagógica na Rede Municipal de Ensino de
Rio das Flôres. Entre 1987 e 2010, atuei como professora regente. No ano de 1987, participei
de um projeto criado através do convênio entre a Prefeitura Municipal de Valença e a
Fundação Educar, cujo objetivo era a alfabetização de adultos. Na época, não acumulava
informações sobre o     funcionamento desse convênio. Apesar disso, considerei que o
importante era participar, uma vez que eu já estava lecionando, mesmo que ainda cursasse
último ano do Curso Normal. O desejo de exercer a profissão era enorme. Para mim era uma
oportunidade de ouro já que me tornar uma educadora sempre fora o meu maior desejo. Não
sabia como iria atuar, porém estava convicta de que aquilo era o que eu realmente queria.
Realizei uma pesquisa na comunidade a fim de conseguir alunos para o projeto. Não tenho
registro do número exato de alunos que participavam.

       Para que os adultos fossem alfabetizados havia um material específico que trazia
palavras geradoras relacionadas ao cotidiano dos mesmos. Hoje sei que se tratava do
chamado método Paulo Freire. Estas palavras eram pesquisadas com os alunos, pois como já
disse estavam relacionadas ao dia a dia dos mesmos. Deste modo, para o pedreiro as palavras
utilizadas poderiam ser, por exemplo, tijolo ou cimento, enquanto que para os agricultores
poderia-se usar enxada, terra etc. Eu não tinha a noção clara de que Freire com o seu método
preocupava-se não apenas com a aquisição de leitura e escrita. A preocupação em fazer o
homem repensar sua história e refletir sobre seu papel dentro da sociedade também estavam
embutidas no método. Eu ainda não trabalhava com este olhar. Na minha concepção, eu
deveria apenas trabalhar aquelas sílabas e ensinar àquelas pessoas a ler e escrever o mínimo
possível. Lembro-me de que uma das senhoras chegou a dizer que queria apenas aprender o
nome do ônibus que precisava tomar para ir para casa. Tomei uma atitude bastante infeliz:
escrevi o nome do ônibus em um papel e dei para ela. Hoje sei que isso daria margem a
11
inúmeras discussões. Poderíamos discutir por exemplo sobre a questão da gratuidade para os
idosos, a maneira como os mesmos são tratados nos transportes públicos, enfim poderia
lançar mão de uma gama de atividades e discussões. Fica claro aqui o quanto é necessário
tornar-se um professor-pesquisador.

       Apesar de a equipe da Secretaria Municipal de Educação proporcionar momentos de
estudos para quem atuava no projeto, eu, com apenas dezessete anos não tinha conhecimento
suficiente para discorrer sobre a metodologia utilizada. Uma coisa era certa: a minha paixão
pelo magistério e o meu encantamento pela profissão tomavam força a partir daquele
momento e reforçava uma certeza que eu trazia comigo desde a infância: era esta profissão
que desejava seguir.

       A partir de 1988 comecei a trabalhar com a 1ª série. Neste período, contava com a
colaboração      de outra professora que também estava iniciando seu trabalho na mesma
escola. Naquela época, não percebia a 1ª série como continuidade da              alfabetização.
Acreditava que nessa etapa os alunos já deveriam dominar habilidades de leitura e escrita.
Quanto a mim, deveria apenas apresentar os conteúdos previstos no planejamento anual.

       Em 1990 a Secretaria Municipal de Educação permitiu que a escola realizasse um
reforço escolar com alguns alunos da 1ª série que ainda não conseguiam ler e escrever. A
mim foi oferecida essa oportunidade e eu a aceitei.

       O trabalho não era fácil. Intuição, observação e experimentação me levavam a planejar
atividades que despertassem o interesse dos alunos      já que não contava com nenhuma
orientação por parte da equipe gestora ou da Secretaria Municipal de Educação. No          ano
seguinte, a direção reservou para mim uma Classe de Alfabetização. Assim comecei a trilhar
o caminho de alfabetizadora.

       No decorrer desse trabalho, recorrerei a momentos de minha história de
alfabetizadora que não só confirmarão a pertinência deste Trabalho de Conclusão de Curso,
mas sustentarão aspectos relevantes no processo de alfabetização das crianças.

       Meus objetivos são:

      discorrer sobre a psicogênese da língua escrita e suas contribuições para o campo da
alfabetização;
12
      analisar cenas do cotidiano da alfabetização à luz dos conhecimentos acumulados
sobre a perspectiva construtivista de alfabetização;

      refletir sobre o professor, a criança e a avaliação na escola e sua relação com o ensino
e a aprendizagem;

       Pautei-me na pesquisa bibliográfica sobre estudos de Ferreiro e Teberosky(1999),
Weisz & Sanches ( 2009 ), Mortatti ( 2006 ), Coll & Martin (2006), Becker (2011) e
Azenha (2009) . Esse estudo está fundamentando uma pesquisa de campo realizada, entre
os meses de agosto e outubro de 2011, em uma turma da Escola Estadual Municipalizada
Formoso, no município de Rio das Flôres . O fato de estar diretamente em contato com a
turma favoreceu a observação das crianças uma vez que fora necessário tornar-me a regente
já que a Secretaria Municipal de Educação não enviara outro professor para a mesma. Ao
chegar na Unidade Escolar fui muito bem recebida pela Direção, Orientação e demais
profissionais. Contudo as considerações feitas sobre os alunos não foram as melhores. Os
mesmos eram considerados indisciplinados e desinteressados. Além disso, dizia-se que a
turma em questão trazia consigo esta fama desde o ano anterior.

       Em conversa com os docentes, durante os intervalos, argumentavam que alguns
alunos “não tinham jeito” devido a seu histórico familiar. O histórico ao qual as professoras
se referiam estava ligado ao fato         de que em casa as crianças não tinham contado
investimento que favorecesse o desenvolvimento do gosto pela leitura e escrita, além de uma
família que pouco participava da rotina escolar de seus filhos. Para "amenizar a situação",
algumas crianças dessa classe eram encaminhadas a                    um serviço de atendimento
especializado. Recebiam suporte psicológico, fonoaudiológico e pedagógico. Essa atitude
não chegava a resolver os problemas relacionados à alfabetização.

                    ...quando a criança é enviada a esses sistemas especializados ( geralmente denominados
                    educação especial) adota-se, com isso, uma atitude semelhante à que se adota frente às
                    crianças realmente “especiais' ou “atípicas” ( os deficientes sensoriais por exemplo).
                    Quer dizer, trata-se a criança como se ela levasse consigo a causa de seu próprio
                    transtorno. A instituição escolar fica livre de responsabilidade. Algo deve haver na
                    própria criança que a leva a fracassar. ( FERREIRO,1993 p. 14)

      Confesso que até então acreditava que o atendimento especializado pudesse resolver
grande parte das dificuldades que os alunos até então apresentavam na leitura e escrita.
Porém não seria essa uma forma de transferir uma responsabilidade que cabe à escola? Há
13
casos em que as crianças realmente necessitam desse tipo de atendimento. Contudo a relação
família-escola e a falta de contato da criança com material escrito não eram suficientes para
encaminhar uma criança para este tipo de atendimento.

       Poderia reescrever aqui todo o trecho do livro de Emília Ferreiro, pois o mesmo traduz
exatamente o que a escola vem fazendo: considerando as crianças com portadores de uma
patologia individual ( imaturidade, falta de coordenação visomotora, etc.)          ou de uma
patologia social ( falta de estímulo no lar, deficiências linguísticas e culturais, etc) para
justificar o fracasso escolar.

       O trabalho com essa turma permitiu que eu observasse as atitudes de alunos,
professores, diretores e orientadora educacional para o desenvolvimento da pesquisa.
Contudo, foram as leituras e o diálogo que me pus a fazer com essas ideias e o cotidiano
escolar que me permitiram realizar uma reflexão acerca de minha própria postura enquanto
educadora e da necessidade da busca pelo referencial teórico que embasasse minha prática
pedagógica.

       Para facilitar o estudo e o entendimento do tema aqui proposto, optei por organizá -lo
em capítulos que além de apresentar, de maneira geral,           concepções do processo de
aquisição da escrita a partir da Proclamação da República, dá um enfoque à alfabetização na
perspectiva construtivista, considerando ser este o objetivo principal deste trabalho.

       Partirei do breve levantamento sobre a querela entre os métodos sintético e analítico,
suas características e    o contexto histórico referente a cada um, procurando, com esse
levantamento sobre aspectos da história da alfabetização no Brasil, contextualizar as práticas
alfabetizadoras na escola, bem como introduzir o que preconiza a perspectiva construtivista
de alfabetização.

        A perspectiva construtivista de alfabetização será discutida a partir da pesquisa de
Ferreiro (1999) e Becker (2011) e outros. Farei um mergulho conceitual e metodológico
possível acerca da alfabetização e do construtivismo.

       Relatarei também, um pouco sobre minha experiência de professora alfabetizadora,
experiências estas que despertaram em mim o interesse pela pesquisa deste tema.
14
       Seguirei com uma delimitação do campo de pesquisa. Aliada à pesquisa de campo
estará a pesquisa     bibliográfica, pois será esta que apresentará sustentação para os
questionamentos aqui levantados .

       A pesquisa bibliográfica citada acima será apresentada a partir de tópicos que tratarão
do construtivismo em sala de aula. Durante esta apresentação farei, como Weisz & Sanches
(2009) que propõem um diálogo entre o ensino e a aprendizagem. Optei por focar sobre
temas como o erro , o conhecimento prévio, a avaliação, o papel do professor e do aluno,
todos estes dentro de uma perspectiva construtivista.

       Este trabalho representa não apenas a oportunidade de adquirir novos conhecimentos
a partir da leitura de estudiosos da área, mas a oportunidade de refletir sobre questões
relacionadas à alfabetização dentro de uma perspectiva construtivista como algo real e
possível.
15

Histórias de aprendizagem: a configuração de um tema de pesquisa

           Se tivesse que parafrasear Weisz e Sanches ( 2009 ), este capítulo teria como título
"Meu batismo de fogo", já que o mesmo relata não apenas a justificativa pela escolha do
tema, mas também um pouco de minha experiência enquanto professora alfabetizadora.

       A escolha do tema deste trabalho surgiu da necessidade que eu, profissional da área de
educação, senti de aprofundar meus conhecimentos sobre a teoria construtivista e as
pesquisas da estudiosa argentina Emília Ferreiro, sobre o processo de aquisição da leitura da
escrita.

       Comecei a atuar no magistério em 1988, período no qual as            ideias de Ferreiro
despontavam no cenário educacional brasileiro. Essa nova concepção acerca do processo de
aquisição de leitura e escrita foi alvo de muitos debates e polêmicas, não ficando, do meu
ponto de vista, clara nem a perspectiva de alfabetização construtivista nem em que se
sustentavam as oposições ou adesões. Também não compreendia em que medida as ações
pedagógicas, reconhecidas como construtivistas na época, sustentavam-se efetivamente
nessa perspectiva. Desejava compreender esse processo de alfabetização construtivista.

       Entre 1987 e 1988, recém-formada, no ambiente de trabalho, ouvia sem entender
algumas indagações a respeito da Psicogênese da Língua Escrita.

       Dentre tantas indagações estavam:

      O construtivismo é um método novo?

      Agora não podemos mais ensinar o ba,be,bi,bo,bu?

      Aquilo que o aluno registra, através da escrita, não deve mais ser corrigido?

      O fato de o aluno construir seu conhecimento descarta a necessidade de planejamento
       do professor?

       Em meio a tantas dúvidas cujas respostas não me traziam esclarecimento de fato,
alguns de nós professores procurávamos respostas em revistas do campo da educação.
Recordo-me que no município de Valença, onde resido e também trabalho, somente a equipe
da Secretaria Municipal de Educação tinha acesso a cursos, porém nem sempre estes
16
conhecimentos eram socializados com os professores da rede. As formações continuadas
ainda não faziam parte da nossa realidade.

       Acredito que a partir daí os equívocos acerca da alfabetização na perspectiva
construtivista foram se tornando uma bola de neve, perdurando até os dias de hoje. A
afirmação de que ainda hoje há práticas alfabetizadoras não muito claras quanto a sua
fundamentação teórica se baseia nas observações que faço, pelo meu interesse de pesquisa,
no contexto da Rede Municipal de Rio das Flôres.

       Ao prestar concurso para este município, no ano de 2000, tive acesso a leituras e
cursos que enriqueceram minha prática pedagógica. Até então os estudos sobre a psicogênese
da língua escrita não estavam incorporados ao meu universo teórico- metodológico.

         Apesar das dúvidas eu continuava alfabetizando de A até Z, apresentando apenas as
sílabas simples como se o aluno não fosse capaz de registrar palavras com o r ou o l
intercalado, por exemplo. Recordo-me que a primeira coisa que fiz foi utilizar um caderno
de caligrafia para “melhorar” minha letra e ensinar aos meus alunos a maneira correta de
desenhá-las. Aliás, ter uma letra bonita, com um contorno perfeito, eram requisitos básicos
para ser uma boa professora alfabetizadora, pelo menos naquela época.

        Quanto à produção escrita, restringia-me a apresentar as sílabas e pedir que os
alunos escrevessem palavras com elas. Quanto às frases mais amplas, estas só poderiam ser
escritas a partir do momento em que os alunos aprendessem e memorizassem as sílabas: do,
da, no e na. Vale ressaltar que havia na cartilha uma sequência a ser seguida, até que se
chegasse nessa etapa. Enquanto isso não acontecia as frases por eles registradas eram: O boi
baba. / A babá é boa. / Bia é a babá.

       Minha preocupação na época era, obviamente, que os alunos aprendessem a ler e
escrever e que tivessem uma letra bem bonita. Para atingir tal objetivo, fazia uso do caderno
de caligrafia. Neste, passava palavras e frases para que fossem copiadas, respeitando as
marcações do caderno. Outro recurso que eu utilizava era pintar as linhas do caderno para
que o aluno soubesse até onde deveria ir a letra maiúscula. Lembro-me de que, nessa época,
descobri que havia o caderno pauta verde. Recordo-me que fiquei encantada com o mesmo,
chegando a indicá-lo para todos os alunos que precisassem melhorar a letra.
17
         Não havia caderno meia pauta na escola, eu sequer sabia de sua existência. Não
conseguia perceber a necessidade de deixar que o aluno experimentasse e registrasse aquilo
que desejasse. Havia também um caderno de ditados. Costumava ditar até 30 palavras e
quando o aluno errava, tinha que copiá-la por várias vezes até o final da linha:

                    O ensino neste domínio continua apegado às práticas mais envelhecidas da escola
                    tradicional, aquelas que supõem que só se aprende algo através da repetição, da
                    memorização, da cópia reiterada de modelos, da mecanização. (FERREIRO,1993,

                    p.22)

    Na 1ª série, que hoje chamamos de 2º ano, a metodologia utilizada era a mesma, com a
inserção de uma gama enorme de conteúdos gramaticais que tínhamos que ensinar até o final
do ano. Quando o aluno ainda não havia dominado a leitura e a escrita ficava em uma turma
com outros que ainda se encontravam no mesmo nível de aprendizagem.

       Geralmente eu ficava com essa turma, pois era a que estava há menos tempo na
escola. Nesse caso, começava apresentando o ba, be, bi, bo, bu. Não entendia por que
aquelas crianças não aprendiam e lançava mão daquilo que acreditava ser o correto. Para
alguns alunos eu passava atividades de cobrir os pontinhos para formar a letra.

       Como, na 1ª série, os alunos tinham que aprender o alfabeto e uma das questões da
prova era “escreva o alfabeto minúsculo" ou "escreva o alfabeto maiúsculo", eu lançava mão
da música Alfabeto da       Xuxa    e pedia que cantassem baixinho durante a prova para
conseguirem escrevê-lo corretamente.

       Com relação à leitura, todos os dias mandava para casa uma lista de palavras que as
crianças deveriam ler para que, no dia seguinte,        pudesse tomar a leitura dos mesmos.
Alfabeto móvel era algo que não fazia parte do meu vocabulário. Porém, eu tinha por hábito
recortar sílabas para que os alunos montassem novas palavras.

       Hoje revejo e problematizo minhas atitudes. Será que as atividades que citei acima
levaram meus alunos a refletir sobre o que liam e escreviam ou apenas faziam com que
apenas memorizassem?

       Acredito que nada tenha sido em vão. Mas certamente, hoje, procuraria agir de outra
forma. Talvez não tivesse uma postura adultocêntrica ( WEISZ & SANCHEZ, 2009, p.19),
18
que contribuía para que parte dos discentes concluíssem o processo de alfabetização,
enquanto outros ficavam para o ano seguinte. Quando faço referência à postura adultocêntrica
quero reforçar o fato de que analisava as situações única e exclusivamente com o meu olhar
,com a perspectiva de alguém que já dominava o conhecimento, estabelecendo qual o melhor
caminho para que ocorresse a aprendizagem, já que como professor, era eu quem dominava
todo o conhecimento (esta era a visão que até então eu tinha).

                    Sâo os adultos que têm dificultado o processo imaginando sequências idealizadas de
                    progressão cumulativa, estimulando modos idealizados de fala que estariam ligados à
                    escrita e construindo definições de “fácil” e “difícil”, que nunca levaram em conta de
                    que maneira se define o fácil e o difícil para o ator principal da aprendizagem : a
                    criança. (FERREIRO, 1993, p.25)


       Esta representa ou não uma postura adultocêntrica, uma atitude, mesmo que
involuntária de alguém que, desprovido de conhecimento científico acumulado não percebe o
aprendiz como elemento ativo na construção do conhecimento.

       No ensino da matemática, às vezes, eu levava os alunos para brincar na amarelinha
que havia desenhada no chão do pátio. Não tinha a mínima ideia do que era material dourado
e para que servia. Mas intuitivamente, utilizava caixinhas que funcionavam como um quadro
valor de lugar. Para o registro as crianças utilizavam números que eram mimeografados e
recortados. Obviamente os resultados não eram os mesmos obtidos caso eu usasse o material
dourado. Porém era um recurso do qual eu lançava mão e acabava , de certa forma, ajudando.
       Em uma reunião com outras professoras para elaborar a prova bimestral, uma delas
chamou minha atenção por que as continhas que eu passava para meus alunos dava um
resultado maior do que os numerais que os mesmos já haviam estudado. Logo, se
estivéssemos estudando números até 150, o resultado das operações não deveria ultrapassar
este numeral. Apesar de lançar mão de recursos lúdicos para apresentar o assunto novo, tinha
dúvidas e muitas ideias, porém faltava-me o referencial teórico.

     O fato é que vínhamos de um período em que o foco era “o que ensinar” e “como
ensinar”. A preocupação era descobrir o método ideal para alfabetizar. O fato de uma criança,
mesmo antes de entrar na escola, fazer uso do lápis para rabiscar era irrelevante, pois eram
consideradas como rabiscos e garatujas. Nada além disso. A partir da inserção da perspectiva
19
construtivista de alfabetização nas escolas, o aluno passa a ser pensado de uma outra maneira:
um protagonista, seu processo cognitivo, sua capacidade de levantar hipóteses.

       À escrita espontânea é dado outro valor. Percebe-se que a criança utiliza estratégias
para representar a escrita. Estas estratégias podem se organizar em diferentes níveis de
aprendizagem, que também serão abordados no decorrer deste trabalho.

      A ideia de que, mesmo antes de saber ler e escrever convencionalmente, a criança é
capaz de elaborar hipóteses sobre o sistema de escrita parecia e parece desacreditada por
parte de alguns docentes, chegando os mesmos a dizer que por culpa do construtivismo a
educação hoje se encontra numa situação caótica.

        Acredito que este pensamento seja consequência da falta de esclarecimento e
aprofundamento do que significa aprender e de que maneira se dá essa aprendizagem.

        Rocha(2003), em seu livro Admirável mundo louco, através da história "Quando a
escola é de vidro", retrata a transição enfrentada pelo sistema educacional na década de 1980.
Alunos vão para a escola e, conforme sua série, têm de inserir-se nos vidros que recebiam. Os
reprovados sofriam a obrigatoriedade de manterem-se no mesmo vidro, mesmo não cabendo
mais, uma vez estavam mais crescidos. Quem não se acomodava tinha que deixar a escola.
Com a chegada de Firuli as coisas começaram a mudar. Ao desafiar o sistema e não entrar em
seu vidro, Firuli leva alunos e professores a experimentar uma nova forma de aprender. A
novidade era sem dúvida desafiadora, mas a coragem para tentar era maior:

                    Num terreno em que, classicamente, e apesar da variedade de enfoques, pensou-se
                    sempre que não podia haver aprendizagem sem um ensino específico, e em que a
                    contribuição do sujeito se considerava como dependente e subsidiária do método de
                    ensino, pudemos descobrir uma linha evolutiva que passa por conflitos cognitivos
                    semelhantes, até nos detalhes do processo, aos conflitos cognitivos constitutivos de
                    outras noções fundamentais. (FERREIRO &TEBEROSKY,1999, p.296)




       Antes da "Psicogênese da língua escrita" tínhamos escolas de vidro que viviam em
busca de um método ideal, através do qual a aprendizagem ocorresse de maneira exitosa. A
partir da Psicogênese quebram-se os vidros. O aluno deixa de ser espectador, aquele que
assiste através dos vidros a um professor que transmite seus conhecimentos, sem ser
interrompido e principalmente sem qualquer possibilidade de              interação. É a partir das
20
pesquisas de Ferreiro & Teberosky que se passa a perceber que para que ocorra aprendizagem
é necessário que a criança passe por conflitos cognitivos, conflitos estes que levarão à
construção do conhecimento.

       Quanto ao Firuli, personagem de Ruth Rocha, podemos atribuir-lhe dois papéis. O
primeiro está relacionado àquele aluno cuja realidade na qual está inserido nos leva a crer,
embora de maneira errônea, que o mesmo não aprenderá de maneira satisfatória. Porém
podemos também nos transformar em “Firulis” e mergulhar nessa nova visão do processo
ensino-aprendizagem, quebrando paradigmas e percebendo os conflitos enfrentados pelas
crianças como parte do processo de construção do conhecimento.

       Penso que este seja o nosso maior desafio: entender como se dá a aprendizagem, de
que forma a interação com o meio influencia nesse desenvolvimento. Não nos basta apenas
experimentar. É preciso conhecer a fundo a perspectiva de alfabetização construtivista,
buscando coerência nas ações pedagógicas, colaborando assim com a aprendizagem do
nosso aluno.
21
Delimitando o campo
            A Unidade Escolar possui um número de aproximadamente 87 alunos. Como o
prédio onde a mesma funciona passará por uma reforma, os alunos foram transferidos para
um local onde há alguns anos funcionava um abrigo para menores, conhecido como
Patronato .

             A parte externa do prédio é bastante ampla. Porém a parte interna não ajuda muito.
A sala, cuja turma que observei e assumi por dois meses, está utilizando, não é nada
atrativa. No chão, os tacos estão soltos. No quadro, há algumas linhas desenhadas para
registrar a partitura de músicas. Portanto, não é possível utilizá-lo totalmente.

           Há por parte da direção e orientação uma preocupação muito grande com a
aprendizagem de todos os alunos. As mesmas chegam a visitar a casa dos alunos faltosos.
Em alguns casos recorrem à Secretaria de Assistência Social, porém as respostas nem sempre
são imediatas. Percebe-se que as mesmas conhecem não apenas os alunos, mas a história de
vida de cada um.

           Atualmente a turma é formada por doze alunos. Inicialmente era composta por vinte
e cinco.

       Além da aprendizagem, a falta de disciplina era apontada como uma das razões pelas
quais o grupo deveria ser dividido. Porém até que se chegasse a esta divisão, os alunos
tiveram nada mais, nada menos que quatro professores. Portanto eu seria a quinta professora
a assumir a turma.

       Ao iniciar o trabalho com os alunos, percebi que havia diferentes níveis de
aprendizagem, sendo necessário a realização de atividades diversificadas que atendessem à
necessidade de cada. Percebi que era necessário traçar uma linha de trabalho, pois já
estávamos no terceiro bimestre e ainda havia muito a ser trabalhado.

     Para iniciar procurei estabelecer uma rotina. Todos os dias era realizada uma leitura
deleite. Esse tipo de leitura é utilizado apenas para que o aluno ouça. Não se tratava de uma
leitura através da qual o professor quisesse explorar a gramática. Eram apresentados textos
narrativos, poesias, parlendas e até mesmo músicas, para que a criança conhecesse diversos
gêneros.
22
       Weisz & Sanchez ( 2009, p.50, 51 ) reforçam a ideia de que todo professor deve levar
todos os seus alunos a vivenciarem diferentes expressões culturais. Se percebemos a criança
como protagonista do processo ensino aprendizagem, obviamente este também atuará como
agente de transformação na comunidade na qual está inserido. Vale lembrar que a escola é
um ponto de manifestação de uma diversidade cultural. Nela encontramos crianças que têm
em suas casas livros de diversos gêneros textuais, crianças que frequentam cinema e teatro.
Mas temos também aquelas que, sem ampla inserção na cultura escrita ou mesmo sem
experiências que os levem para além dos limites de seu bairro ou comunidade, trazem
consigo pouco mais dos conhecimentos transmitidos oralmente pelos mais velhos, por
exemplo, ou ainda os conhecimentos acumulados nessa convivência local, mais restrita Cabe
à escola explorar mais essa         diversidade fazendo com que as crianças partilhem seus
conhecimentos, ampliando seu acesso a conteúdos pertencentes ao mundo da cultura: da
literatura, da ciência, da arte, da informação tecnológica, etc.:

                      Necessitamos que muitos mais tenham a capacidade de dizer-nos por escrito quem são,
                      para manter a diversidade cultural que é parte da riqueza de nosso mundo (...) Não
                      esqueçamos a diversidade cultural. A alfabetização pode e deve contribuir para a
                      compreensão, difusão e enriquecimento de nossa própria diversidade, histórica e atual.
                      (FERREIRO, 1993,p.54)

       Em conjunto com a professora de outra turma, elaborei um projeto com o nome de
“Leituras e gostosuras”. Percebemos que as crianças gostavam de tudo aquilo que se
relacionava à alimentação. Entretanto, sabíamos da necessidade de trabalhar textos
narrativos, poesias, textos instrucionais, enfim,           precisávamos trabalhar com textos de
diferentes gêneros.

       Ao colocar o projeto em prática, não solicitamos dos alunos sugestões de textos ou
filmes a serem trabalhados. E com uma visão apriorista, nós mesmas os selecionamos. Para
nós o foco estava em despertar nos alunos o desejo de aprender a partir daquilo que
apresentávamos. Pergunto-me hoje: Será que a escolha feita pelos alunos traria um resultado
mais positivo do que o obtido?

       Como detonador do projeto, assistimos ao filme "Tá chovendo hambúrguer"
(MILLER & LORD, 2009). Foi trabalhada também a história "A galinha ruiva"
(BREITMAN, 2004). A partir desta história os alunos confeccionaram uma galinha com
23
sucata, além de registrar o passo a passo para a confecção da mesma.    Também,          em
conjunto com a outra professora, procurei realizar atividades fora da escola. Procurávamos
chamar a atenção daqueles que ainda apresentavam certa dispersão. Os resultados nos
pareceram bastante positivos.

       Em curto período de tempo, fui comunicada que ficaria com a turma somente até o
final de setembro, devendo retomar minhas atividades na Secretaria Municipal de Educação.
As crianças receberiam a sexta professora.

             Contudo, apesar do curto período em que tive contato com os discentes (dois
meses), foi possível perceber uma mudança nos alunos. Houve, além de um desenvolvimento
cognitivo, um aumento no interesse pelas atividades. Vale ressaltar que um dos alunos que
participa de atividades na Sala de Recursos, não aceitava realizar nenhuma atividade escrita.
Entretanto, aos poucos, foi se disponibilizando mais...




                                             Figura 1



       Na atividade apresentada na figura 1 a proposta era que o aluno escrevesse qualquer
palavra ou frase que desejasse para que eu pudesse avaliar o nível da escrita. O mesmo
24
negou-se a escrever pois disse que não sabia como fazê-lo. Optou então por fazer um
desenho.




                                           Figura 2

       Na atividade da figura número 2 o aluno já apresentava interesse pelas atividades que
envolviam a escrita. Até então pude perceber que o mesmo encontrava-se no nível
intermediário. Poderia neste momento ter lançado mão de uma atividade que possibilitasse ao
aluno utilizar-se da escrita espontânea, o que infelizmente não aconteceu.




                                      Figura 3

       Na atividade da figura 3, o aluno solicitou à professora que o ajudasse. Demonstra
mais interesse e principalmente segurança.

       Becker(2011), ressalta que o conhecimento      se constitui pela interação do indivíduo
com o meio físico e social. Segundo o próprio autor, construtivismo significa a ideia de que
nada está pronto, portanto o construtivismo não pode ser dado como algo terminado. O ato
de construir é uma constante em nossas vidas. Entretanto o que varia é a “matéria prima” do
fazer de cada um.
25
       Mudamos os hábitos de acordo com a época, estamos sempre inventando e
reinventando, construímos novos conceitos, frutos das experiências que adquirimos no dia a
dia.

       Em Educação a matéria-prima é o conhecimento. Portanto é de suma importância que
o professor conheça a natureza desse conhecimento. O professor precisa também definir que
concepção tem acerca deste conhecimento: empirista , apriorista ou construtivista .

         Se sua concepção seguir um caminho empirista, ele tenderá a apropriar-se de uma
prática que percebe o sujeito como uma folha em branco a ser preenchida a partir das nossas
sensações.

       Ou seja, quando optei por levar textos selecionados somente por mim, foi o mesmo
que considerar as crianças como tábuas rasas. Minha compreensão era que elas não tinham
conhecimento suficiente para escolher textos relacionados ao projeto. De fato o acesso o
material escrito, principalmente contos , realmente não era algo que fizesse parte do dia- a-
dia daquelas crianças. Contudo, sei que poderia disponibilizar o material para que eles
escolhessem.

       Caso opte pelo apriorismo conceberá o conhecimento como algo que está dentro do
próprio sujeito e neste caso o professor tem como função apenas estimular para que estes
conhecimentos aflorem.

       Durante o recreio, conversávamos sobre vários alunos . Porém a conversa acabava
por abranger dois irmãos em especial aos quais chamarei de S.e N. Era comum ter um dos
dois gritando nos corredores da escola. Inclusive ao falar da aprendizagem dos mesmos o
que se dizia era o seguinte: “Os dois têm muita dificuldade.” “Também, a família onde
vivem.” “ O pai bate na mãe.” “ Ela (mãe) não sabe ler nem escrever.” “ Esses meninos têm
algum problema, melhor encaminhá-los para uma avaliação.”

       O interessante é que os meninos tinham um irmão que frequentava o primeiro ano de
escolaridade. Segundo relatos da professora, conseguia desenvolver muito bem todas as
atividades que a mesma propunha. Bem, se todos viviam na mesma casa, por que motivo
apenas os dois ainda não haviam dominado a leitura e a escrita? Se a inteligência é algo
26
genético todos não deveriam estar no mesmo nível? Ou será que apenas um dos irmãos trazia
consigo um certo grau de conhecimento?

       Mais uma vez fica clara a necessidade que temos de nos atualizar, ler e estudar para
entendermos certas atitudes que tomamos. Para tomar conhecimento de que concepção
estamos seguindo.

       A terceira concepção da qual Becker nos fala é a concepção construtivista. Nesta a
criança é concebida como sujeito cultural ativo cuja ação tem as dimensões assimiladora
através da qual produz transformações no mundo objetivo e acomodadora através da qual
produz transformações em si mesmo.

       A partir do momento em que o professor define que concepção tem de conhecimento,
pode nortear seu trabalho, elaborar seu planejamento. Contudo, não se trata aqui de dizer qual
é a melhor concepção. Porém não se pode negar que conhecimento é construção, que não é
dado nos objetos nem tão pouco através da hereditariedade. O indivíduo por si só não tem
como aprimorar seus saberes, ele depende do outro. Vamos pegar um exemplo corriqueiro:
Eu gostaria de aprender a fazer um bolo de chocolate, para tal preciso que alguém me
explique como fazê-lo. Posso ter noção do material usado, porém preciso de orientação para
executar tal tarefa. Posso recorrer à internet, ainda assim dependerei do fato de que alguém
tenha postado esta receita.

       Assim como na vida, na escola, ocorre da mesma forma. O encontro de diferentes
saberes favorece o surgimento de novos saberes. Isso é construtivismo.

        Weisz & Sanches (2009, p. 41), dizem que “o conhecimento se constrói
frequentemente por caminhos diferentes daqueles que o ensino supõe”. É exatamente o que
acontece   com as crianças S. e N. das quais falei anteriormente. Cada irmão possui
características próprias. Cada um terá seu momento de efetivar a aprendizagem. Cabe-nos
portanto respeitar a individualidade de cada um e investir para que ambos tenham a
oportunidade de efetivar sua aprendizagem

       Como educadora, sei que ainda cometo erros, encarados hoje por mim como
construtivos. Procuro criar situações a partir das quais o aluno possa aprender. A partir da
observação para avaliar o nível da escrita na qual os alunos estavam pude elaborar e
27
organizar meu trabalho. A realização de atividades em grupo proporcionou a interação entre
as crianças. Alguns questionamentos eram levantados pelas mesmas durante a leitura deleite.
Os mesmos não eram ouvintes passivos. Participavam e até sugeriam como poderia ser o
final da história.

       Ainda há muito o que aprender. Tudo o que fazemos hoje procurando resolver ou pelo
menos amenizar os problemas relacionados à alfabetização é resultado de nossa própria
história. Afinal, já fomos considerados um povo desprovido de cultura. A este povo, no
período da colonização, era oferecida uma educação com o objetivo de catequizar. Quanto a
arte e a literatura eram voltadas apenas para a elite. Esse modelo de educação já não cabe
mais em nosso contexto. Todos temos direito de acesso a diferentes manifestações culturais.

                     Não é uma pedagogia compensatória que defendo ao dizer que a escola tem um papel
                     equalizador das oportunidades de aprendizagem. Na verdade, o que precisa ser
                     socializado na escola diz respeito, fundamentalmente, a conteúdos pertencentes ao
                     mundo da cultura: da literatura, da ciência, da arte, da informação tecnológica, etc.
                     Todas as crianças têm direito a isso, por que é condição de inserção social.
                     (SANCHEZ e WEISZ,2009,p.49):



       Após a colonização, poucos eram aqueles que tinham acesso ao conhecimento, pois a
escola como instituição, surgiu anos mais tarde. Porém,

                     É difícil falar de alfabetização evitando as posturas dominantes neste campo: por um
                     lado, o discurso oficial e, por outro, o discurso meramente ideologizante, que chamarei
                     "discurso da denúncia". O discurso oficial centra-se nas estatísticas; o outro despreza
                     essas   cifras   tratando   do   desvelar   "a   face   oculta"   da   alfabetização.    (
                     FERREIRO,1993, p.9)




       Temos o conhecimento e mais do que isso, podemos ver nos escritos de nossas
crianças seja na escola ou até mesmo em casa que as características citadas e estudadas por
Ferreiro & Teberosky (1999) em suas pesquisas, ainda prevalecem                         o que reforça a
necessidade de constante aprimoramento por parte de todos aqueles que participam do
processo educativo. Sejam eles professores, orientadores, gestores e por que não aqueles que
fazem as leis relacionadas à educação neste país. Não se trata de um modismo, ou de se
inventar uma nova maneira de alfabetizar. Trata-se de colocar em prática conhecimentos que
28
foram pesquisados, pautando-se as pesquisadoras na observação, indagação e principalmente
nos pressupostos teóricos do grande Jean Piaget.
29
Um pouco de história da alfabetização no Brasil

       Procurando contextualizar as práticas alfabetizadoras ao longo dos anos, recorto
fragmentos da sua história. Durante muito tempo a preocupação com o processo de aquisição
da leitura e escrita esteve vinculada a como ensinar. A preocupação com método adequado,
acaba por deixar de lado o aluno, principal agente desse processo.

       No Brasil, a educação adquiriu caráter sistemático, metódico e intencional, após a
Proclamação da República. Nesse período os ideais positivistas, admirados e divulgados pelos
republicanos consideravam a educação determinante para a formação do cidadão e para o
desenvolvimento político e social do país. Apesar do ideário republicano, percebemos que
desde aquela época o fracasso escolar na alfabetização acontecia, por fatores diversos.

       Tomarei por base a divisão proposta Mortatti ( 2006 ), em seu texto História dos
Métodos de Alfabetização. Quanto a esta divisão dos períodos a história, a autora justifica da
seguinte forma:

                    Analisando, com base em fontes documentais, ocorrido nessa província/estado em
                    relação à questão dos métodos de ensino inicial da leitura e escrita, desde as décadas
                    finais do século XIX, optei por dividir esse período em quatro momentos cruciais,cada
                    um deles caracterizado pela disputa em torno de certas tematizações,normatizações e
                    concretizações relacionadas ao ensino da leitura e escrita e consideradas novas e
                    melhores, em relação ao que, em cada momento,era considerado antigo e tradicional
                    esse sentido.(p. 4)



       Entre 1876 e 1890 o material para leitura era escasso. Vale lembrar que no período
imperial havia salas adaptadas para atender alunos de séries diversas. As atividades de escrita
restringiam-se à cópia de documentos manuscritos explorando: caligrafia, ortografia, ditado e
formação de frases. O método utilizado era o sintético, partindo da "parte" para o
“todo”:Soletração ( nome das letras) ->fônico ( som da letra) -> silabação ( famílias silábicas)

       Ainda hoje, muito de nossa prática pedagógica retrata o que acontecia nesse período.
Apesar de buscarmos novos caminhos, às vezes nos deparamos coma aplicação de atividades
como por exemplo, cópias mecânicas que em nada contribuem para a aprendizagem, ou
melhor, elas até contribuem desde que o objetivo seja a memorização de conceitos.

       No ano de 2000, como já disse, comecei a trabalhar no município de Rio das Flôres.
Foi um ano turbulento para a educação naquele município, pois os professores concursados
30
estavam assumindo a turma no mês de junho ( era a primeira vez que acontecia um concurso
público naquele município), os docentes que não foram aprovados, talvez por insatisfação,
deixaram as turmas desordenadas, sem um registro claro para saber de onde poderíamos
seguir. A equipe da secretaria de Educação não tinha como organizar, propor uma
metodologia de trabalho para a Rede de Ensino, portanto cada professor passou a trabalhar
de acordo com o seu ponto de vista.

         A mim coube uma turma de alfabetização. Não havia uma cartilha a ser seguida. Por
isso, no intuito de acelerar a aprendizagem, lancei mão de uma cartilha chamada Tirando de
letra. Recordo-me que ela apresentava o alfabeto e logo depois o aluno deveria fazer a
junção de todas as consoantes com a vogal a.

         Dessa forma, todas as palavras e frases formadas poderiam ser por exemplo: bala,
faca ou ainda “A fada fala”. As outras palavras eram formadas a partir do momento em que
eram apresentadas as demais vogais.

         Em 1880 surge no Brasil o Método João de Deus ou método da palavração. O ensino
da leitura deveria iniciar-se pela palavra. Depois partiria para a análise dos valores fonéticos
das letras.

         Entre1890 e 1920 há uma disputa entre os defensores do "método João de Deus" e os
defensores dos métodos sintéticos: da soletração, fônico e da silabação. Neste período o

ensino da leitura e da escrita está subordinado às questões de ordem linguística daquela
época.

         Uma nova tradição surge como consequência dessa disputa: o ensinar metodicamente
relacionado com o que ensinar.

         Em meio a todo esses acontecimentos, tem início uma reforma educacional, visível
principalmente no Estado de São Paulo, com a fundação da Escola-Modelo Anexa (à
Normal). Nesta, as normalistas desenvolviam atividades práticas          vinculadas ao método
analítico para o ensino da leitura. Dessa forma acontece a institucionalização do método
analítico, tornando-se obrigatória a sua utilização nas escolas públicas paulistas.
31
       O método analítico partia do "todo". Entretanto havia certa falta de entendimento com
relação a esse "todo". Para alguns o ensino poderia partir da palavra, para outros da sentença,
porém poderia partir também da historieta.

       O processo baseado na historieta ( conjunto de frases relacionadas entre si por meio de
nexos lógicos) foi institucionalizado em 1915,com a publicação do documento "Instruções
práticas para o ensino da leitura pelo methodo analytico".

       Esse segundo momento é marcado pela relação estabelecida entre o como ensinar à
definição das habilidades visuais, auditivas e motoras da criança a quem ensinar. O ensino da
leitura e da escrita antes subordinado às questões de ordem linguística da época,passa então a
subordinar-se às questões de ordem psicológica da criança.

       O período de 1920 a 1970, foi marcado pela "Reforma Sampaio Dória". O maior
objetivo desta reforma foi a reestruturação do ensino elementar de modo a garantir vagas para
as crianças paulistas que ainda se encontravam fora da escola.

       Nesse período, também aumentou a resistência por parte dos professores em utilizar o
método analítico, buscando-se novas propostas de solução para os problemas do ensino e
aprendizagem iniciais da leitura e da escrita.

       Apesar da resistência de alguns docentes, o método analítico continuou a ser utilizado.
Contudo, tentou-se conciliar os métodos analíticos e sintéticos, passando-se a utilizar
métodos mistos ou ecléticos, considerados mais rápidos e eficientes.

       A disputa entre os métodos sintéticos e analíticos foi se diluindo. Porém a discussão
em torno da questão metodológica continuava. Surge então o método global,cuja unidade de
ponto de partida é o texto.

       Somente com o livro "Testes ABC para verificação para maturidade necessária ao
aprendizado da leitura e escrita" (1934),de autoria de M. B.Lourenço Filho, a importância do
método de alfabetização passou a ser considerada tradicional. O foco a partir desse momento
a solução dos problemas de aprendizagem de leitura e escrita.

       Com os resultados dos testes são organizadas turma homogêneas com o objetivo de
que o ensino da leitura e da escrita ocorra de maneira exitosa.
32
       Também a partir dessa época, são utilizadas as atividades do período preparatório
cujas atividades estavam relacionadas a exercícios de coordenação viso-motora e auditivo-
motora, posição de corpo e membros, dentre outros. As cartilhas baseavam-se em métodos
mistos ou ecléticos com os manuais destinados ao professor.

       Como aspectos negativos relacionado aos “Testes ABC”, podemos citar: a visão de
avaliação com o objetivo de medida, o método de ensino subordinado ao nível de maturidade
e à concepção de escrita vinculada        à habilidade caligráfica e ortográfica, devendo ser
ensinada juntamente com a habilidade de leitura.

       Ao observar algumas escolas da Rede Municipal de Ensino na qual atuo como
Assessora   Pedagógica, pude perceber que ainda há por parte de alguns professores a
preocupação em formar turmas homogêneas. A justificativa é a de que isso facilita o trabalho
e o atendimento ao aluno. Mas e a troca de saberes. Só é possível trocar se o outro possui
saberes diferentes do meu e vice versa.

       Weisz & Sanchez (2006) consideram que:

                    … as formas de aprender diferem, que os tempos de aprendizagem também, e que
                    não tem sentido sonhar com os alunos caminhando igualmente em seu processo de
                    construção de conhecimento. (p.106)



       Portanto, estigmatizar os alunos como fracos ou fortes em nada favorece a construção
do conhecimento.

       A partir do início da década de 1980 o fracasso da escola na alfabetização, desvincula-
se da questão metodológica. Chega ao Brasil o pensamento construtivista. Com base nos
estudos de Ferreiro e colaboradores percebeu-se que a aprendizagem está vinculada ao
desenvolvimento infantil. O construtivismo surge não como método, mas parafraseando
Mortatti, como uma "revolução conceitual".

       A partir dessa teoria são realizadas formações continuadas, divulgação de artigos, etc.,
a fim de convencer aos docentes da eficácia da proposta construtivista. Nesse período torna-
se comum a discussão a cerca dos chamados métodos tradicionais e da teoria em questão.
33

A perspectiva construtivista de alfabetização
       Na década de 1990 crescia no Brasil e na América Latina o interesse pelo tema da
alfabetização. Toda essa discussão baseava-se nos estudos de Ferreiro, uma argentina nascida
em 1937, Psicopedagoga de formação, doutorada pela Universidade de Genebra, orientada
por Jean Piaget 1, importante pesquisador suíço cuja preocupação era explicar o modo pelo
qual o homem atinge o conhecimento, em seu livro traduzido no Brasil como Psicogênese da
Língua Escrita, traz à tona um novo paradigma para a interpretação do modo pelo qual a
criança aprende.

       A psicogênese surge não como um novo método para o ensino de leitura e escrita ou
uma forma de classificar as dificuldades de aprendizagem. Sua proposta é fundamentar sob
outra perspectiva implicações sobre processos de aquisição da leitura e da escrita. Ferreiro &
Teberosky (1999) tomam como objeto de estudo os pressupostos epistemológicos de Piaget
para a análise do aprendizado da língua escrita.

       As autoras partem do pressuposto de que "as crianças adquirem conhecimento acerca
da linguagem escrita porque, em interação com este objeto, aplicam a ele esquemas
sucessivamente mais complexos, decorrentes do seu desenvolvimento cognitivo" (Azenha
2006, p. 45).

       Com base na teoria de Piaget, Ferreiro & Teberosky concebem a obtenção do
conhecimento como resultado da atividade do sujeito. Os estímulos não atuam diretamente,
mas são transformados pelos sistemas de assimilação. Através destes o sujeito interpreta o
estímulo e em consequência dessa interpretação a conduta do mesmo se faz compreensível.
                      A teoria de Piaget não é uma teoria particular sobre um domínio particular, mas sim um
                      dado teórico de referência, muito mais vasto, que nos permite compreender de uma
                      maneira nova qualquer processo de aquisição de conhecimento. ( FERREIRO &
                      TEBEROSKY. 1999, p.31).

       A pesquisa de Ferreiro & Teberosky( 1999) foi realizada, durante dois anos com
crianças de diferentes nacionalidades, com idades entre quatro e seis anos, a partir da colheta
de dados com crianças de diferentes meios sociais através de situações experimentais. O
método utilizado foi o de indagação, inspirado no método clínico ou de exploração crítica. A

1                                                                          . Jean Piaget tratou a
Epistemologia Genética, teoria do conhecimento com base no estudo da gênese psicológica do pensamento
humano.
34
análise dos dados, de cunho qualitativo, tinha como objetivo descobrir e interpretar cada
categoria de resposta.

       A psicogênese, assim como a teoria construtivista não são como muitos costumam
chamar, modismo. Características apontadas por Ferreiro & Teberosky são encontradas
também nas crianças como poderemos perceber nos escritos produzidos por crianças da
Escola Estadual Municipalizada do Formoso, local onde realizei grande parte da minha
pesquisa. Portanto, não se trata de um modismo ou de um teste para avaliar o nível de
aprendizagem de cada uma. Se estas características são perceptíveis podemos concluir que é
essencial dar ênfase em quem aprende e o como aprende. E para que esta se desenvolva é
necessário saber que "os processos de construção sempre supõem reconstrução; no entanto, o
que é que se reconstrói? É preciso reconstruir um saber construído em certo domínio para
aplicá-lo a outro(...)" (FERREIRO,1993, p.87).

       As fases da escrita estudas pelas referidas pesquisadoras não devem servir como bula
que traz ou indica as etapas ou procedimentos para a evolução da escrita. Permitem que
educadores possam “organizar “ seu trabalho, planejar suas atividades a fim de favorecer
aprendizagem. Entender como leem e escrevem as crianças que ainda não saibam ler ou
escrever são de fato aspectos importantíssimos abordados por Ferreiro e Teberosky até então
não abordados por outros estudiosos. A partir da mesma o cenário educacional passa por
consideráveis mudanças: o método deixa de ser considerado o principal elemento no
processo de alfabetização, o professor passa a ser colaborador na construção do
conhecimento. Ele participa do processo e não apenas indica o caminho a ser seguido. A
partir da psicogênese acontece algo que vejo como fundamental e que Azenha (2006,p.111)
reforça:
                    Cabe à escola a tarefa social de ensinar. A criança não tem obrigação de transpor
                    sozinha a interação com o objeto que ela não teve a oportunidade de conhecer fora da
                    escola.

       Portanto se faz urgente e necessário pensar políticas públicas que venham a atender de
maneira satisfatória às necessidades destas crianças a fim de erradicar o alto índice de
reprovação nas séries iniciais       causados principalmente por problemas relacionados à
alfabetização. Contudo, este é um tema para uma próxima pesquisa.

       Os exemplos de escrita abaixo oferecem dados para uma classificação. Nestas será
possível comprovar os processos de construção e reconstrução pelos quais as crianças
35
passam até que aprendam a ler e escrever de maneira alfabética. Estes mecanismos foram
apresentados por Ferreiro & Teberosky no livro Psicogênese da Língua Escrita, do meu ponto
de vista, uma importante referência para os professores alfabetizadores pois remete à
observação e à reflexão acerca dos níveis pelos quais a criança passa durante o processo de
aquisição da escrita.

       Durante a realização da pesquisa tive a oportunidade de observar algumas crianças da
escola cujo nome citei inicialmente. Seus escritos retratam os conflitos vividos até que se
chegue a leitura e escrita alfabéticas.

      Nível 1 :Pré -silábico




                                                                              (Ferreiro, 2006)


       Nessa etapa a criança não estabelece vínculo entre a leitura e a escrita. A leitura é
global. Há a utilização de pseudoletras. Para a criança há uma relação entre o nome e o
tamanho daquilo que registram através da escrita. Assim, para escrever por exemplo, girafa
usarão mais letras do que ao escrever telefone. O grupo de crianças por mim observado não
apresentava até então nenhuma criança nesse nível. Por isso recorri ao livro citado acima para
melhor ilustrar o exemplo.


      Nível 2 : Intermediário
36




                        ( atividade realizada pelo aluno Yan, 9 anos)



               A escrita acima foi realizada pelo aluno Yan. O mesmo permaneceu na escola
apenas por dois meses, mais precisamente no terceiro bimestre. Aqui, o aluno encontra-se
em um nível intermediário, pois apesar de fazer uso das letras, o mesmo não sabe o nome
das mesmas. Observe que as letras se repetem em todas as palavras, invertendo-se apenas a
ordem das mesmas. Ao solicitar que o mesmo lesse para mim, era ele quem dava sentido ao
seu texto. Na atividade original, havia desenhos que me permitiam conhecer o que o mesmo
desejava escrever. Observe:




Seria então necessário fazer um trabalho individualizado para que pudesse avançar. O que
infelizmente não aconteceu. Na sala de aula não era tão fácil assim realizar essas atividades
já que havia outros alunos em outros níveis de aprendizagem. O que obviamente não deve
37
servir como justificativa para a retenção ao final do ano letivo, uma vez que essas diferenças
podem favorecer os processos de interação que leve à aprendizagem.

        Yan foi transferido ao final do bimestre. Como estamos em município pequeno, a
orientadora da escola para a qual o mesmo seguiu foi informada de seu desempenho, além de
ter acesso a atividades realizadas pelo mesmo durante o período em que permaneceu na
escola. A mesma nos informou que a professora continuaria a realizar um trabalho
diversificado com o menino.

       Nível silábico:




                          (atividade realizada pelo aluno Valderez, 8 anos)

        A atividade acima foi realizada pelo aluno Valderez. Este aluno é o mesmo que já
citei anteriormente que se negava a realizar qualquer atividade escrita. Vale ressaltar que o
mesmo era considerado imaturo e por isso apresentava um comportamento considerado
inadequado para que o mesmo pudesse aprender. Aqui se encontra a patologia individual
citada por Ferreiro (1993) e a qual já me referi neste trabalho. Cabe aqui mais um texto deste
livro fabuloso e que nos leva a uma constante reflexão:

                    A noção de maturidade abriu um próspero mercado comercial (...) trouxe uma nova
                    clientela para psicólogos e psicopedagogos (...) tem facilitado o trabalho dos
                    professores (...) servido para manter o pré-escolar” assepticamente “isolado da língua
                    escrita (...) prestado para encobrir os fracassos metodológicos (...) discriminar as
                    crianças dos setores marginalizados (...) esta maturidade, definida como algo que o
                    sujeito deve trazer consigo, que é independente das condições de aprendizagem
                    escolar, tem sempre as mesmas consequências. ( FERREIRO. 1993.p.64)

        O fato é que o aluno começou a demonstrar interesse em realizar as atividades e
consequentemente começou a apresentar um desenvolvimento considerável. Neste registro o
38
aluno começa a estabelecer relação entre a pronúncia e partes da palavra.. Observe que o
mesmo está oscilando por isso às vezes utiliza uma letra para representar um som ( p = pa na
palavra pato) Logo, supõe que a escrita representa a fala por isso tenta fonetizar a escrita e
dar valor sonoro às letras.

      Nível 4 :Alfabético




                     (atividade realizada pela aluna Tatiane, 8 anos)

       A aluna acima é aquela que caracteriza o sonho de todos os professores. A família
interage constantemente com a escola, a mesma tem acesso a uma diversidade de textos. Ou
seja,é uma criança que chega à escola sabendo que a escrita serve para escrever coisas
inteligentes, divertidas ou importantes. Ou ainda parafraseando Ferreiro (1993,p.23). Essas
são as que terminam de alfabetizar-se na escola, mas começaram a alfabetizar-se muito antes,
através da possibilidade de entrar em contato, de interagir com a língua escrita.

       Sem dúvida um aluno que chega à escola neste nível facilita bastante o trabalho do
professor. Isto não quer dizer que o mesmo não passará pelos diversos níveis de
aprendizagem. O diferencial estará nas hipóteses .

       Nesta atividade, a aluna Tatiane conseguiu adequar o escrito ao sonoro. Percebemos
aqui que surgem as questões relacionadas à ortografia. A escrita serve não apenas para o seu
entendimento, mas de todos aqueles que têm acesso aos seus escritos, já que percebe que a
escrita tem uma função social.
39
          Seja qual for o nível da escrita, em uma concepção construtivista a criança constrói
seu conhecimento, tendo o professor como mediador, utilizando-se de seus conhecimentos
prévios e fazendo do erro uma estratégia através da qual ampliará seus conhecimentos.

          Mas quem é essa criança? O que ela espera da escola? O que espera de seu professor?

          Antes de responder a esses questionamentos, gostaria de relatar a experiência que tive
ao acompanhar uma turma do 2º ao 5º Ano de Escolaridade da Rede Pública Municipal de
Valença, município no qual iniciei minhas atividades como professora regente. Apesar de não
ter realizado nenhuma pesquisa relacionada a este Trabalho de Conclusão de Curso com esta
turma, acredito que não posso deixar de relatar as experiências pelas quais passei com este
grupo de alunos pois hoje eles são prova de que o trabalho pautado em uma perspectiva
construtivista dá certo. Esta experiência se passou na Escola Municipal Nossa Senhora
Aparecida entre 2004 e 2008. Pode-se considerar que a estrutura da escola é boa. Não havia
material escolar em abundância. Contudo era possível desenvolver um bom trabalho com o
que nos era oferecido. Além disso, os pais na medida do possível também colaboravam
contribuindo com o que se pedia na lista de material escolar distribuída no início do ano
letivo.

          Os alunos da turma em questão frequentavam a escola no período da manhã e à tarde
eram atendidos em uma instituição que recebia crianças cujos pais trabalhavam durante todo
o dia. Esses alunos não tinham horário de estudo fora da escola. Portanto tinham que ser
explorados ao máximo no ambiente escolar. Dentro da sala, eu procurava oferecer diferentes
tipologias textuais ( Cantinho da Leitura ), momentos de produções textuais coletivas e
individuais, realização de experiências,aulas fora do ambiente escolar. Enfim, uma infinidade
de atividades que pudessem auxiliar no processo ensino aprendizagem. Obviamente nunca foi
descartada a necessidade de acompanhamento dos responsáveis. Porém com o apoio da
direção foi possível realizar um ótimo trabalho. Hoje, estes alunos estão no 8º ano. Alguns
mudaram de escola , pois esta oferece até o 9º Ano. A grande maioria continua brilhando. Ou
seja posso dizer que contribui para que eles ampliassem seus horizontes e apesar das
dificuldades não desistissem.

          O que quero dizer exatamente é que ao frequentar uma escola a criança espera que
esta seja capaz de oferecer-lhe a oportunidade de mudar de vida, de sentir-se incluída.
40
Quando em uma turma de vinte e cinco alunos, um ainda não consegue acompanhar é sinal de
que com ele precisam ser adotadas novas estratégias para que o mesmo possa aprender.

       Em relação ao professor é preciso que o aluno perceba que o mesmo está convencido
de que é possível, de fato ensiná-lo.

       Todos as crianças são capazes de aprender. Umas aprendem com mais facilidade,
outras demoram um pouco mais. Porém, todos trazem consigo saberes que na escola se
encontram e possibilitam a construção de novos conhecimentos.

       A aprendizagem na perspectiva construtivista pressupõe o resultado da ação e reflexão
do aprendiz. Ou seja, antes de apresentar o conteúdo de maneira sistemática o professor
precisa conhecer o que as crianças já sabem e o que são capazes de produzir com e sobre
esses saberes. Mas “como suscitar a necessidade na escola, como fazer germinar na criança o
interesse por aquilo que se quer ensinar?” (Weisz & Sanches, 2009, p.30).

       Trata-se de um desafio que, para vencer, o professor deverá utilizar como arma seu
conhecimento e a pesquisa constante. Para receitar um remédio o médico precisa ter
conhecimento dos possíveis efeitos que o mesmo pode causar no organismo de seu paciente.
Da mesma forma, o professor ao elaborar qualquer atividade precisa ter ciência dos efeitos
positivos ou negativos que as mesmas causarão futuramente na vida de seu aluno. Portanto,
não cabe mais no contexto em que vivemos nos limitarmos a ser professores. Mais do que
isso temos que ser pesquisadores.

       É comum ouvirmos dos professores o quanto é importante levar em consideração o
conhecimento prévio dos alunos. Mas o que é conhecimento prévio?

       As pesquisadoras referem-se a esse conhecimento prévio como algo construído pelo
aprendiz, sem a interferência do professor. Mas isso é realmente possível?

                     O conhecimento não é gerado do nada,é uma permanente transformação a partir do
                     conhecimento do que já existe. Essa afirmação – a de que o conhecimento prévio do
                     aprendiz é base de novas aprendizagens – não significa a crença ou defesa de pré –
                     requisitos. Tampouco esse tipo de conhecimento se confunde com a matéria ensinada
                     anteriormente pelo professor. (WEISZ & SANCHES.p. 61)
41
       Para aprender alguma coisa nova            é preciso já saber alguma coisa, não
necessariamente de maneira sistematizada como a escola apresenta ou como pré- requisito
para se adquirirem novas aprendizagens. Aqui cabe muito mais nos lembrarmos de Piaget e
os processos de assimilação, equilibração e acomodação.

       Os processos de assimilação e acomodação          são processos através dos quais   o
indivíduo capta cognitivamente o ambiente e o organiza, ampliando seu conhecimento, ou na
linguagem de Piaget, seus esquemas. Durante esse processo o indivíduo usa as estruturas que
já possui.

       A assimilação e a acomodação estão intimamente ligadas, pois sem a interpretação
ativa de determinado conteúdo (assimilação), não haveria a acomodação das estruturas
psicológicas .

       A partir desse processo de assimilação e acomodação ocorre a equilibração.

       É importante lembrar que estamos constantemente passando pelos processos de
assimilação, acomodação e equilibração, uma vez que aprender faz parte da existência
humana.

       Quando crianças, por exemplo temos um conceito da palavra casa.. Com o passar do
tempo e graças a interação com o meio, vamos adquirindo novos conhecimentos a cerca
não só da palavra casa mas do objeto em si. Ou seja              estes novos saberes estão
constantemente gerando conflitos que nos levarão a formar novos conceitos.

        Azenha (2006), resume essa relação entre os conceitos acima citados quando diz que
"cada nova estrutura constrói-se, portanto,a partir de pequenas mudanças na estrutura já
existente, o que faz do desenvolvimento cognitivo um processo gradativo de avanços em
direção a estruturas qualitativamente superiores" (p. 41).

       Como explicar o fato de alguns alunos apresentarem dificuldade em representar o
algorítimo da adição ou subtração, porém conseguem ajudar seus familiares que trabalham
no comércio. Os mesmos muitas vezes realizam o cálculo mental de maneira rápida e
surpreendente.
42
        Ao buscar estratégias para resolver um problema a criança não utiliza receitas
prontas, propostas em sala de aula.

        Na primeira semana de novembro, a Secretaria Municipal de Educação de Rio das
Flôres promove uma gincana cultural para os alunos do 6º ao 9º ano de escolaridade. Um
fato que chamou minha atenção nesta última gincana foi a estratégia utilizada por um aluno
para escrever uma palavra utilizando treze palitos de fósforos. Enquanto os outros quebravam
a cabeça para formar suas palavras, o mesmo escreveu uma palavra com letras grandes para
que todos os palitos fossem utilizados. Às vezes nos preocupamos em aplicar soluções já
apresentadas ao invés de ousarmos e procurar nossas próprias estratégias. Aqui reporto-me
ao texto de Weizs & Sanchez (2009 p. 35):

                    Uma situação problema se define sempre em relação ao aprendiz. Deve ser uma
                    situação na qual a solução não vá ser buscada na memória, nem a resposta possa ser
                    imediata, pois o aluno precisará mobilizar conhecimentos que já tem e usá-lo de tal
                    forma que acabará construindo uma solução não previamente determinada.




        Estamos sempre criando estratégias, buscando novas soluções para todos os tipos de
problemas. Isso faz parte da alma humana. Graças a essa busca constante o homem descobre
a cura para as doenças, cria novos mecanismos de comunicação entre outras coisas

       Quando se fala em aprendizagem, outro aspecto que nos chama a atenção está
relacionado às crianças oriundas de um ambiente no qual as pessoas têm um grau de
escolaridade menor. Estas crianças já chegam à escola com certa desvantagem com relação

àquelas que ao contrário têm acesso a livros, revistas, internet, etc. Nesse caso caberá a
escola proporcionar situações nas quais estes alunos possam navegar na cultura , na Internet,
na arte, em todas as áreas do conhecimento, em todas as linguagens, em todas as
possibilidades.

       Saliento que apesar de estarem nessa situação, estas crianças também trazem consigo
conhecimentos prévios uma vez que, como já foi dito, estes não devem ser confundidos com
o conteúdo ensinado pelo professor.

       Uma maneira que possibilita a exposição desse conhecimento prévio por parte do
aluno é o trabalho com Pedagogia de Projetos.
43
       Ao elaborar um projeto, o docente utiliza-se de um tema que parte normalmente do
interesse da turma. Na problematização dá oportunidade para que todos participem já que esta
surge dos seguintes questionamentos:

      O que sabemos?

      O que queremos saber?

      O que aprendemos? ( ao final do projeto)

       Quanto aos conteúdos,estes são vinculados ao projeto, sendo trabalhados de maneira
interdisciplinar   atendendo não só a curiosidade dos alunos mas também aos objetivos
propostos pelo professor.
44
Avaliação e o professor na perspectiva de alfabetização construtivista
                     A avaliação precisa ser espelho e lâmpada, não apenas espelho. Precisa não apenas
                     refletir a realidade, mas iluminá-la criando enfoques, perspectivas, mostrando relações,
                     atribuindo significados.2

       Assunto polêmico, a avaliação do processo educativo tem sido amplamente discutida.
Contudo a discussão acerca desse tema precisa partir do pressuposto de que a avaliação não
envolve apenas o aluno, mas também a atuação do professor, além do planejamento e
aplicação das atividades.

       Discutir sobre avaliação nos faz refletir sobre três questões fundamentais nesse
processo. São elas : O que avaliar? Por que avaliar? Como avaliar ?

       Dentro da concepção construtivista a avaliação tem caráter diagnóstico e contínuo.

       Considera-se diagnóstica uma vez que a partir dela é possível tomar decisões que
venham a melhorar a qualidade do ensino.

       A avaliação é também um processo contínuo porque nos permite saber que aptidões
foram adquiridas ou simplesmente, que objetivos foram atingidos.

       Porém, para que esse resultado seja satisfatório é necessário que se leve em conta
tanto os aspectos quantitativos quanto os qualitativos. Além das provas e testes há de se
considerar também a participação e             o desempenho diário dos alunos, assiduidade,
apresentação de trabalhos em grupo ou individual.

       A avaliação não deve ser uma arma da qual o professor dispõe para punir seu aluno.
Weizs & Sanchez ( 2009) retratam muito bem o papel da avaliação ao dizer que:

                     Cabe à escola garantir a aproximação máxima entre o uso social do conhecimento e a
                     forma de tratá-lo didaticamente. Pois se o que se pretende é que os alunos estabeleçam
                     relações entre o que aprendem e o que vivem, não se pode, com o intuito de facilitar a
                     aprendizagem,introduzir dificuldades. Nesse sentido, o papel da escola é criar pontes e
                     não abismos. (p.75)



       Coll & Martin (2006), afirmam que os alunos constroem determinados significados
sobre os conteúdos à medida que, simultaneamente, atribuem-lhes determinados sentidos



2      M.H.Abrams, in Dilvo Ristoff,1995
45
Logo, quando o aluno registra algo que aos nossos olhos parece estar errado, na verdade o
mesmo está buscando meios para chegar à resposta.

       A construção seja ela coletiva ou individual, é uma atividade da qual o docente pode
lançar mão pois além de contribuir para que o aluno aprimore a leitura e a escrita,
possibilitam avaliar que aspectos ainda precisam ser trabalhados para que o aluno obtenha
êxito na aprendizagem.

       A avaliação precisa ser espelho e lâmpada. É espelho quando o professor é capaz de
auto avaliar-se, avaliar seu trabalho. É lâmpada quando oportuniza aos alunos construir e
aprimorar seus conhecimentos. A avaliação não deve funcionar como um instrumento através
do qual é atestada a incapacidade do aluno de aprender.

       Em entrevista concedida ao Jornal do Brasil em 21/07/2000, Cipriano Luckesi faz uma
explanação sobre a diferença entre avaliar e examinar. Quando utilizam-se exclusivamente os
exames, estamos lançando mão de um instrumento            que não leva em conta o estado
psicológico do aluno. Não importa como ele estava antes ou como ficará depois do resultado
obtido em sua prova. O objetivo maior é classificar o aluno em aprovado ou reprovado, a
partir de uma escala classificatória que vai de 0 a 10,o que acaba por excluir o educando já
que grande parte fica de fora uma vez que até mesmo por questões sociais não consegue
acompanhar a minoria.

       Todo trabalho precisa ter um objetivo. E para que esse objetivo seja alcançado, o
trabalho deverá ser direcionado. Neste momento entra em cena o professor.

       É comum ouvirmos que em uma concepção construtivista o professor é o mediador da
aprendizagem. Mas como acontece essa mediação?

       Solé & Coll (2006), destacam que a concepção construtivista oferece ao professor
referencial para analisar e fundamentar as decisões que este precisa tomar no planejamento e
no decorrer do ensino. O planejamento representa o primeiro passo para a mediação, uma vez
que ao planejar supõe-se que o professor já tenha conhecimento de algumas das dificuldades
de seus alunos bem como da capacidade dos mesmos de utilizar conhecimentos prévios para
a resolução de problemas. Essa mediação pressupõe também uma interação entre professor e
aluno, e por que não, uma relação de cumplicidade.
46
          Cabe também ao promover situações que possibilitem a todos os seus alunos ampliar
não só seus conhecimentos, mas também seus horizontes,já que esta é uma forma de inclusão
social.

          Ao professor construtivista cabe também a formação continuada .para que ele possa

                       construir conhecimentos de diferentes naturezas, que lhe permitam ter claros os seus
                       objetivos,selecionar conteúdos pertinentes,enxergar na produção de seus alunos oque
                       eles já sabem e construir estratégias que os levem a conquistar novos patamares de
                       conhecimento” ( WEISZ & SANCHES, 2009.p.53 )



           Weisz & Sanches ( 2009 ) comparam o professor a um diretor de cena ou de
contrarregra, pois cabe a ele montar o andaime a partir do qual a construção do aprendiz será
apoiada. Entretanto para oferecer este apoio, este suporte, é preciso dominar diversas áreas do
conhecimento para que se desenvolva um trabalho pautado na interdisciplinaridade.

          Outro aspecto que penso ser importante destacar é o fato de que aliada à preocupação
com a alfabetização há a preocupação com o professor alfabetizador . Ferreiro (1993) define
isso muito bem quando diz o seguinte:

                      O professor alfabetizador está muito só: em vez de ser considerado como o professor
                      mais importante de toda a escola primária, é considerado como aquele que realiza o
                      trabalho menos técnico e que qualquer outro poderia fazer (...) É o professor com as
                      salas mais superlotadas, de quem se espera um grande espírito de sacrifício, uma
                      atitude” muito maternal “(...) e muita paciência em troca de uma baixa remuneração e
                      muito pouco apoio intelectual. É freqüente que se atribua às aulas de alfabetização
                      precisamente aos professores com menos experiências ou àqueles que são” castigados
                      “por alguma razão. Os professores desejam ser promovidos ao” grau superior “assim
                      como seus alunos. Não é estranho que, nessas condições, ninguém esteja motivado para
                      pensar criticamente sobre sua prática, refugiando-se nas alternativas mais burocráticas..
                      (p.51)
          Não podemos esquecer que além da formação continuada é preciso também que a
sociedade enxergue o professor como profissional essencial que precisa e merece ser
valorizado também no aspecto financeiro e com condições dignas de trabalho.
47
Conclusões provisórias


      Ao iniciar as pesquisas para a realização de um TCC, não temos a ideia de como será
grande o nosso crescimento. A       princípio pensamos apenas o quanto será trabalhoso.
Começamos procurando textos em internet, mas logo depois partimos para os livros, pois as
leituras virtuais tornam-se insuficientes para atender a nossa necessidade de aprender mais.

      E foi assim que tudo começou, tive acesso ao texto de Mortatti que se referia à
história dos métodos de alfabetização no Brasil. No início, não entendi porque este texto fora
me sugerido. Após a leitura do mesmo, pude perceber que tanto tempo após a proclamação
da República, eu ainda continuava preocupada com a metodologia adequada para que as
crianças pudessem aprender a ler e escrever. Sei que não usava apenas o método sintético.
Fazia uma mistura com o método analítico. Focava todo meu planejamento no método, no
ensino. Não tinha conhecimento nem entendimento para perceber que para que a
aprendizagem seja exitosa é preciso que o professor conheça seu aluno, compreenda que ele
passa por níveis de aprendizagem até tornar-se alfabético.

      Outro aspecto que quero destacar é que sempre ouvi vários questionamentos
contrários à perspectiva construtivista. Após esta pesquisa, sinto segurança para afirmar que,
se temos crianças que chegam ao 5º ano de escolaridade sem saber ler ou escrever, não é
culpa da perspectiva construtivista de alfabetização, muito menos por culpa da criança. As
pesquisas de Ferreiro & Teberosky estão aí para provar. Identificamos claramente que os
conflitos citados pelas autoras são comuns às crianças em geral.

      Quero ressaltar também que a alfabetização dentro de uma perspectiva construtivista
não acontece de uma forma solta e desordenada. Há método. Ao professor cabe mediar a
aprendizagem, pois para aprender é preciso que se tenha uma proposta e esta deve ser
elaborada com a colaboração entre professor e aluno. Quanto à correção esta ocorre porém
com outro olhar já que assim como a avaliação não tem caráter punitivo. Através destes
torna-se possível a elaboração de atividades que ajudem o aluno a aprender aquilo que ainda
não conseguiu atingir.

      Se ainda temos tantos analfabetos funcionais é porque faltam políticas que
proporcionem uma educação de qualidade, uma política na qual o professor seja valorizado
48
com salário digno para que possa adquirir livros que contribuam para seu crescimento
profissional. É primordial pensar também nos alunos e oferecer-lhes condições de aprender.
Que suas escolas não sejam como as que existiam no período imperial: uma sala com alunos
agrupados e um professor para dar conta de todos.
          A Educação precisa ser levada a sério. Caso contrário, estaremos sempre procurando
um culpado pelos altos índices de repetência em nossas escolas. Quanto ao construtivismo, é
fato que a ele não cabe mais este papel, pois tudo aquilo que é proposto encontra suporte
teórico nas pesquisas de Ferreiro & Teberosky a partir da orientação do epistemólogo suíço
Piaget.
          Este trabalho procurou discorrer sobre a psicogênese da língua escrita estabelecendo
relação entre a mesma e o cotidiano da alfabetização pois, é partir desta relação que se torna
possível uma análise da perspectiva construtivista de alfabetização. Propôs também uma
reflexão sobre o professor, a criança e a avaliação na escola e sua relação com o ensino e a
aprendizagem.
          Assumir a provisoriedade das conclusões aqui apresentadas é uma indicação do
quanto ainda há por vir nesse caminho de educadora que compreendeu a importância da
pesquisa para aperfeiçoar o fazer-saber.
49
Referências bibliográficas
AZENHA, Maria da Graça..Construtivismo: de Piaget a Emília Ferreiro. 8ª Ed. São Paulo:
Ática, 2006.
BECKER, Fernando. O que é construtivismo?

http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=011. Acesso                           em

20 de setembro de 2011.
BREITMAN,André Koogan. A galinha ruiva. São Paulo:FTD, 2004
COLL, Cesar ( et alli). O construtivismo na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006.
FERREIRO, Emília. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 1993.
____________.; TEBEROSKY, A. Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1999.
MILLER Chris; LORD Phil ( Direção) Tá chovendo hambúrguer ( filme). Título
original: Cloudy with a Chance of Meatballs. EUA, Sony Pictures, 2009. 90min.
MORTATTI, Maria do Rosário Longo. História dos métodos de alfabetização. em

www.portalmec.gov.br , Acesso em 9 de agosto de 2011.
ROCHA, Ruth. Admirável mundo louco. São Paulo: Salamandra, 2006
WEISZ, Telma & SANCHEZ, Ana. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. 2ª
Ed. São Paulo: Ática, 2009.

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Alfabetização construtivista: uma reflexão a partir da prática pedagógica

  • 1. Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro Centro de Ciências Humanas LICENCIATURA EM PEDAGOGIA ARACI DA SILVA CORRÊA ALFABETIZAÇÃO Uma perspectiva construtivista Rio das Flôres 2012
  • 2. ARACI DA SILVA CORRÊA ALFABETIZAÇÃO Uma perspectiva construtivista Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Pedagogia do Centro de Ciências Humanas da UNIRIO, como requisito para obtenção do grau de Pedagogo. Orientadora: Márcia Maria e Silva Rio das Flôres 2012
  • 3. ARACI DA SILVA CORRÊA ALFABETIZAÇÃO Uma perspectiva construtivista Avaliado por: __________________________________ Orientador(a) __________________________________ Segundo(a) leitor(a) Data da apresentação ___ / ____ / _____ Rio das Flôres 2012
  • 4. DEDICATÓRIA Àqueles que acreditam que toda criança tem direito a uma educação de qualidade.
  • 5. AGRADECIMENTOS A Deus, que me acompanha desde o início desta caminhada e cuja força foi imprescindível para que eu conseguisse realizar este sonho que há tanto tempo almejava. Àquelas cujos ensinamentos e incentivos foram fundamentais para a concretização deste trabalho e consequentemente de minha realização pessoal e profissional: Margarete de Barros, Diretora do Pólo Cederj do município de Rio das Flôres; Ana Paula Rocha e Rosemeri Luiz Cesar, não apenas tutoras, mas amigas que nunca deixaram de acreditar em minha capacidade. À minha família, de cuja companhia, por diversas vezes, precisei abrir mão, aceitando alguns sacrifícios inevitáveis nesse processo de elaboração teórico-prática. Aos amigos, em especial à Ana Beatriz Magalhães Maia, que jamais admitiu que eu sequer pensasse em abandonar o Curso. Finalmente à minha Orientadora, Professora Márcia Maria e Silva, por acreditar em meu trabalho, pois sem sua orientação e incentivo, dificilmente conseguiria chegar até aqui.
  • 6. EPÍGRAFE “As condutas escritas de um aprendiz não são o mero resultado daquilo que o professor ensina. Existe um processo de construção desse conhecimento que nem sempre coincide com aquilo que está sendo ensinado.” Maria da Graça Azenha
  • 7. RESUMO O presente trabalho busca refletir sobre o processo de alfabetização na perspectiva construtivista bem como sobre meu próprio caminho de construção de conhecimentos nessa área. Com base nas experiências que adquiri desde o ano de 1987 até hoje, como professora regente e como assessora pedagógica, ponho-me em diálogo com alguns pesquisadores da área: Ferreiro & Teberosky, Weisz & Sanches, Mortatti, Coll & Martin, Becker e Azenha . Trabalho com breves recortes da história da alfabetização e da minha história de professora, além de buscar um estudo sobre os pressupostos de uma abordagem construtivista da alfabetização, tomando para isso também a psicogênese da língua escrita lida e vivenciada também por dentro da sala de aula. A avaliação, o professor e a criança são também problematizados com o propósito de destacar pontos fundamentais na relação entre o ensino e a aprendizagem na escola. Este trabalho pretende, acima de tudo, mostrar que é possível que a criança construa sua aprendizagem enquanto sujeito ativo e que a condição de professor-pesquisador nos abre muitas possibilidades de aperfeiçoamento teórico-prático. Palavras-chave: alfabetização, construtivismo
  • 8. SUMÁRIO Palavras iniciais................................................................................................9 Histórias de aprendizagem:configuração de um tema de pesquisa.............................................................................................................14 Delimitando o campo…................................................................................20 Um pouco de história da alfabetização no Brasil. ..............................28 A perspectiva construtivista de alfabetização......................................32 Avaliação e o professor na perspectiva de alfabetização construtivista....................................................................................................43 Conclusões provisórias................................................................................46 Referências bibliográficas...........................................................................48
  • 9.
  • 10. 10 Palavras iniciais Este constitui-se em um Trabalho de Conclusão do Curso de Licenciatura em Pedagogia do Centro de Ciências Humanas da UNIRIO que visa problematizar dúvidas acerca do processo de aquisição do sistema de leitura e escrita, segundo a perspectiva construtivista. Nesse momento, atuo como Assessora Pedagógica na Rede Municipal de Ensino de Rio das Flôres. Entre 1987 e 2010, atuei como professora regente. No ano de 1987, participei de um projeto criado através do convênio entre a Prefeitura Municipal de Valença e a Fundação Educar, cujo objetivo era a alfabetização de adultos. Na época, não acumulava informações sobre o funcionamento desse convênio. Apesar disso, considerei que o importante era participar, uma vez que eu já estava lecionando, mesmo que ainda cursasse último ano do Curso Normal. O desejo de exercer a profissão era enorme. Para mim era uma oportunidade de ouro já que me tornar uma educadora sempre fora o meu maior desejo. Não sabia como iria atuar, porém estava convicta de que aquilo era o que eu realmente queria. Realizei uma pesquisa na comunidade a fim de conseguir alunos para o projeto. Não tenho registro do número exato de alunos que participavam. Para que os adultos fossem alfabetizados havia um material específico que trazia palavras geradoras relacionadas ao cotidiano dos mesmos. Hoje sei que se tratava do chamado método Paulo Freire. Estas palavras eram pesquisadas com os alunos, pois como já disse estavam relacionadas ao dia a dia dos mesmos. Deste modo, para o pedreiro as palavras utilizadas poderiam ser, por exemplo, tijolo ou cimento, enquanto que para os agricultores poderia-se usar enxada, terra etc. Eu não tinha a noção clara de que Freire com o seu método preocupava-se não apenas com a aquisição de leitura e escrita. A preocupação em fazer o homem repensar sua história e refletir sobre seu papel dentro da sociedade também estavam embutidas no método. Eu ainda não trabalhava com este olhar. Na minha concepção, eu deveria apenas trabalhar aquelas sílabas e ensinar àquelas pessoas a ler e escrever o mínimo possível. Lembro-me de que uma das senhoras chegou a dizer que queria apenas aprender o nome do ônibus que precisava tomar para ir para casa. Tomei uma atitude bastante infeliz: escrevi o nome do ônibus em um papel e dei para ela. Hoje sei que isso daria margem a
  • 11. 11 inúmeras discussões. Poderíamos discutir por exemplo sobre a questão da gratuidade para os idosos, a maneira como os mesmos são tratados nos transportes públicos, enfim poderia lançar mão de uma gama de atividades e discussões. Fica claro aqui o quanto é necessário tornar-se um professor-pesquisador. Apesar de a equipe da Secretaria Municipal de Educação proporcionar momentos de estudos para quem atuava no projeto, eu, com apenas dezessete anos não tinha conhecimento suficiente para discorrer sobre a metodologia utilizada. Uma coisa era certa: a minha paixão pelo magistério e o meu encantamento pela profissão tomavam força a partir daquele momento e reforçava uma certeza que eu trazia comigo desde a infância: era esta profissão que desejava seguir. A partir de 1988 comecei a trabalhar com a 1ª série. Neste período, contava com a colaboração de outra professora que também estava iniciando seu trabalho na mesma escola. Naquela época, não percebia a 1ª série como continuidade da alfabetização. Acreditava que nessa etapa os alunos já deveriam dominar habilidades de leitura e escrita. Quanto a mim, deveria apenas apresentar os conteúdos previstos no planejamento anual. Em 1990 a Secretaria Municipal de Educação permitiu que a escola realizasse um reforço escolar com alguns alunos da 1ª série que ainda não conseguiam ler e escrever. A mim foi oferecida essa oportunidade e eu a aceitei. O trabalho não era fácil. Intuição, observação e experimentação me levavam a planejar atividades que despertassem o interesse dos alunos já que não contava com nenhuma orientação por parte da equipe gestora ou da Secretaria Municipal de Educação. No ano seguinte, a direção reservou para mim uma Classe de Alfabetização. Assim comecei a trilhar o caminho de alfabetizadora. No decorrer desse trabalho, recorrerei a momentos de minha história de alfabetizadora que não só confirmarão a pertinência deste Trabalho de Conclusão de Curso, mas sustentarão aspectos relevantes no processo de alfabetização das crianças. Meus objetivos são:  discorrer sobre a psicogênese da língua escrita e suas contribuições para o campo da alfabetização;
  • 12. 12  analisar cenas do cotidiano da alfabetização à luz dos conhecimentos acumulados sobre a perspectiva construtivista de alfabetização;  refletir sobre o professor, a criança e a avaliação na escola e sua relação com o ensino e a aprendizagem; Pautei-me na pesquisa bibliográfica sobre estudos de Ferreiro e Teberosky(1999), Weisz & Sanches ( 2009 ), Mortatti ( 2006 ), Coll & Martin (2006), Becker (2011) e Azenha (2009) . Esse estudo está fundamentando uma pesquisa de campo realizada, entre os meses de agosto e outubro de 2011, em uma turma da Escola Estadual Municipalizada Formoso, no município de Rio das Flôres . O fato de estar diretamente em contato com a turma favoreceu a observação das crianças uma vez que fora necessário tornar-me a regente já que a Secretaria Municipal de Educação não enviara outro professor para a mesma. Ao chegar na Unidade Escolar fui muito bem recebida pela Direção, Orientação e demais profissionais. Contudo as considerações feitas sobre os alunos não foram as melhores. Os mesmos eram considerados indisciplinados e desinteressados. Além disso, dizia-se que a turma em questão trazia consigo esta fama desde o ano anterior. Em conversa com os docentes, durante os intervalos, argumentavam que alguns alunos “não tinham jeito” devido a seu histórico familiar. O histórico ao qual as professoras se referiam estava ligado ao fato de que em casa as crianças não tinham contado investimento que favorecesse o desenvolvimento do gosto pela leitura e escrita, além de uma família que pouco participava da rotina escolar de seus filhos. Para "amenizar a situação", algumas crianças dessa classe eram encaminhadas a um serviço de atendimento especializado. Recebiam suporte psicológico, fonoaudiológico e pedagógico. Essa atitude não chegava a resolver os problemas relacionados à alfabetização. ...quando a criança é enviada a esses sistemas especializados ( geralmente denominados educação especial) adota-se, com isso, uma atitude semelhante à que se adota frente às crianças realmente “especiais' ou “atípicas” ( os deficientes sensoriais por exemplo). Quer dizer, trata-se a criança como se ela levasse consigo a causa de seu próprio transtorno. A instituição escolar fica livre de responsabilidade. Algo deve haver na própria criança que a leva a fracassar. ( FERREIRO,1993 p. 14) Confesso que até então acreditava que o atendimento especializado pudesse resolver grande parte das dificuldades que os alunos até então apresentavam na leitura e escrita. Porém não seria essa uma forma de transferir uma responsabilidade que cabe à escola? Há
  • 13. 13 casos em que as crianças realmente necessitam desse tipo de atendimento. Contudo a relação família-escola e a falta de contato da criança com material escrito não eram suficientes para encaminhar uma criança para este tipo de atendimento. Poderia reescrever aqui todo o trecho do livro de Emília Ferreiro, pois o mesmo traduz exatamente o que a escola vem fazendo: considerando as crianças com portadores de uma patologia individual ( imaturidade, falta de coordenação visomotora, etc.) ou de uma patologia social ( falta de estímulo no lar, deficiências linguísticas e culturais, etc) para justificar o fracasso escolar. O trabalho com essa turma permitiu que eu observasse as atitudes de alunos, professores, diretores e orientadora educacional para o desenvolvimento da pesquisa. Contudo, foram as leituras e o diálogo que me pus a fazer com essas ideias e o cotidiano escolar que me permitiram realizar uma reflexão acerca de minha própria postura enquanto educadora e da necessidade da busca pelo referencial teórico que embasasse minha prática pedagógica. Para facilitar o estudo e o entendimento do tema aqui proposto, optei por organizá -lo em capítulos que além de apresentar, de maneira geral, concepções do processo de aquisição da escrita a partir da Proclamação da República, dá um enfoque à alfabetização na perspectiva construtivista, considerando ser este o objetivo principal deste trabalho. Partirei do breve levantamento sobre a querela entre os métodos sintético e analítico, suas características e o contexto histórico referente a cada um, procurando, com esse levantamento sobre aspectos da história da alfabetização no Brasil, contextualizar as práticas alfabetizadoras na escola, bem como introduzir o que preconiza a perspectiva construtivista de alfabetização. A perspectiva construtivista de alfabetização será discutida a partir da pesquisa de Ferreiro (1999) e Becker (2011) e outros. Farei um mergulho conceitual e metodológico possível acerca da alfabetização e do construtivismo. Relatarei também, um pouco sobre minha experiência de professora alfabetizadora, experiências estas que despertaram em mim o interesse pela pesquisa deste tema.
  • 14. 14 Seguirei com uma delimitação do campo de pesquisa. Aliada à pesquisa de campo estará a pesquisa bibliográfica, pois será esta que apresentará sustentação para os questionamentos aqui levantados . A pesquisa bibliográfica citada acima será apresentada a partir de tópicos que tratarão do construtivismo em sala de aula. Durante esta apresentação farei, como Weisz & Sanches (2009) que propõem um diálogo entre o ensino e a aprendizagem. Optei por focar sobre temas como o erro , o conhecimento prévio, a avaliação, o papel do professor e do aluno, todos estes dentro de uma perspectiva construtivista. Este trabalho representa não apenas a oportunidade de adquirir novos conhecimentos a partir da leitura de estudiosos da área, mas a oportunidade de refletir sobre questões relacionadas à alfabetização dentro de uma perspectiva construtivista como algo real e possível.
  • 15. 15 Histórias de aprendizagem: a configuração de um tema de pesquisa Se tivesse que parafrasear Weisz e Sanches ( 2009 ), este capítulo teria como título "Meu batismo de fogo", já que o mesmo relata não apenas a justificativa pela escolha do tema, mas também um pouco de minha experiência enquanto professora alfabetizadora. A escolha do tema deste trabalho surgiu da necessidade que eu, profissional da área de educação, senti de aprofundar meus conhecimentos sobre a teoria construtivista e as pesquisas da estudiosa argentina Emília Ferreiro, sobre o processo de aquisição da leitura da escrita. Comecei a atuar no magistério em 1988, período no qual as ideias de Ferreiro despontavam no cenário educacional brasileiro. Essa nova concepção acerca do processo de aquisição de leitura e escrita foi alvo de muitos debates e polêmicas, não ficando, do meu ponto de vista, clara nem a perspectiva de alfabetização construtivista nem em que se sustentavam as oposições ou adesões. Também não compreendia em que medida as ações pedagógicas, reconhecidas como construtivistas na época, sustentavam-se efetivamente nessa perspectiva. Desejava compreender esse processo de alfabetização construtivista. Entre 1987 e 1988, recém-formada, no ambiente de trabalho, ouvia sem entender algumas indagações a respeito da Psicogênese da Língua Escrita. Dentre tantas indagações estavam:  O construtivismo é um método novo?  Agora não podemos mais ensinar o ba,be,bi,bo,bu?  Aquilo que o aluno registra, através da escrita, não deve mais ser corrigido?  O fato de o aluno construir seu conhecimento descarta a necessidade de planejamento do professor? Em meio a tantas dúvidas cujas respostas não me traziam esclarecimento de fato, alguns de nós professores procurávamos respostas em revistas do campo da educação. Recordo-me que no município de Valença, onde resido e também trabalho, somente a equipe da Secretaria Municipal de Educação tinha acesso a cursos, porém nem sempre estes
  • 16. 16 conhecimentos eram socializados com os professores da rede. As formações continuadas ainda não faziam parte da nossa realidade. Acredito que a partir daí os equívocos acerca da alfabetização na perspectiva construtivista foram se tornando uma bola de neve, perdurando até os dias de hoje. A afirmação de que ainda hoje há práticas alfabetizadoras não muito claras quanto a sua fundamentação teórica se baseia nas observações que faço, pelo meu interesse de pesquisa, no contexto da Rede Municipal de Rio das Flôres. Ao prestar concurso para este município, no ano de 2000, tive acesso a leituras e cursos que enriqueceram minha prática pedagógica. Até então os estudos sobre a psicogênese da língua escrita não estavam incorporados ao meu universo teórico- metodológico. Apesar das dúvidas eu continuava alfabetizando de A até Z, apresentando apenas as sílabas simples como se o aluno não fosse capaz de registrar palavras com o r ou o l intercalado, por exemplo. Recordo-me que a primeira coisa que fiz foi utilizar um caderno de caligrafia para “melhorar” minha letra e ensinar aos meus alunos a maneira correta de desenhá-las. Aliás, ter uma letra bonita, com um contorno perfeito, eram requisitos básicos para ser uma boa professora alfabetizadora, pelo menos naquela época. Quanto à produção escrita, restringia-me a apresentar as sílabas e pedir que os alunos escrevessem palavras com elas. Quanto às frases mais amplas, estas só poderiam ser escritas a partir do momento em que os alunos aprendessem e memorizassem as sílabas: do, da, no e na. Vale ressaltar que havia na cartilha uma sequência a ser seguida, até que se chegasse nessa etapa. Enquanto isso não acontecia as frases por eles registradas eram: O boi baba. / A babá é boa. / Bia é a babá. Minha preocupação na época era, obviamente, que os alunos aprendessem a ler e escrever e que tivessem uma letra bem bonita. Para atingir tal objetivo, fazia uso do caderno de caligrafia. Neste, passava palavras e frases para que fossem copiadas, respeitando as marcações do caderno. Outro recurso que eu utilizava era pintar as linhas do caderno para que o aluno soubesse até onde deveria ir a letra maiúscula. Lembro-me de que, nessa época, descobri que havia o caderno pauta verde. Recordo-me que fiquei encantada com o mesmo, chegando a indicá-lo para todos os alunos que precisassem melhorar a letra.
  • 17. 17 Não havia caderno meia pauta na escola, eu sequer sabia de sua existência. Não conseguia perceber a necessidade de deixar que o aluno experimentasse e registrasse aquilo que desejasse. Havia também um caderno de ditados. Costumava ditar até 30 palavras e quando o aluno errava, tinha que copiá-la por várias vezes até o final da linha: O ensino neste domínio continua apegado às práticas mais envelhecidas da escola tradicional, aquelas que supõem que só se aprende algo através da repetição, da memorização, da cópia reiterada de modelos, da mecanização. (FERREIRO,1993, p.22) Na 1ª série, que hoje chamamos de 2º ano, a metodologia utilizada era a mesma, com a inserção de uma gama enorme de conteúdos gramaticais que tínhamos que ensinar até o final do ano. Quando o aluno ainda não havia dominado a leitura e a escrita ficava em uma turma com outros que ainda se encontravam no mesmo nível de aprendizagem. Geralmente eu ficava com essa turma, pois era a que estava há menos tempo na escola. Nesse caso, começava apresentando o ba, be, bi, bo, bu. Não entendia por que aquelas crianças não aprendiam e lançava mão daquilo que acreditava ser o correto. Para alguns alunos eu passava atividades de cobrir os pontinhos para formar a letra. Como, na 1ª série, os alunos tinham que aprender o alfabeto e uma das questões da prova era “escreva o alfabeto minúsculo" ou "escreva o alfabeto maiúsculo", eu lançava mão da música Alfabeto da Xuxa e pedia que cantassem baixinho durante a prova para conseguirem escrevê-lo corretamente. Com relação à leitura, todos os dias mandava para casa uma lista de palavras que as crianças deveriam ler para que, no dia seguinte, pudesse tomar a leitura dos mesmos. Alfabeto móvel era algo que não fazia parte do meu vocabulário. Porém, eu tinha por hábito recortar sílabas para que os alunos montassem novas palavras. Hoje revejo e problematizo minhas atitudes. Será que as atividades que citei acima levaram meus alunos a refletir sobre o que liam e escreviam ou apenas faziam com que apenas memorizassem? Acredito que nada tenha sido em vão. Mas certamente, hoje, procuraria agir de outra forma. Talvez não tivesse uma postura adultocêntrica ( WEISZ & SANCHEZ, 2009, p.19),
  • 18. 18 que contribuía para que parte dos discentes concluíssem o processo de alfabetização, enquanto outros ficavam para o ano seguinte. Quando faço referência à postura adultocêntrica quero reforçar o fato de que analisava as situações única e exclusivamente com o meu olhar ,com a perspectiva de alguém que já dominava o conhecimento, estabelecendo qual o melhor caminho para que ocorresse a aprendizagem, já que como professor, era eu quem dominava todo o conhecimento (esta era a visão que até então eu tinha). Sâo os adultos que têm dificultado o processo imaginando sequências idealizadas de progressão cumulativa, estimulando modos idealizados de fala que estariam ligados à escrita e construindo definições de “fácil” e “difícil”, que nunca levaram em conta de que maneira se define o fácil e o difícil para o ator principal da aprendizagem : a criança. (FERREIRO, 1993, p.25) Esta representa ou não uma postura adultocêntrica, uma atitude, mesmo que involuntária de alguém que, desprovido de conhecimento científico acumulado não percebe o aprendiz como elemento ativo na construção do conhecimento. No ensino da matemática, às vezes, eu levava os alunos para brincar na amarelinha que havia desenhada no chão do pátio. Não tinha a mínima ideia do que era material dourado e para que servia. Mas intuitivamente, utilizava caixinhas que funcionavam como um quadro valor de lugar. Para o registro as crianças utilizavam números que eram mimeografados e recortados. Obviamente os resultados não eram os mesmos obtidos caso eu usasse o material dourado. Porém era um recurso do qual eu lançava mão e acabava , de certa forma, ajudando. Em uma reunião com outras professoras para elaborar a prova bimestral, uma delas chamou minha atenção por que as continhas que eu passava para meus alunos dava um resultado maior do que os numerais que os mesmos já haviam estudado. Logo, se estivéssemos estudando números até 150, o resultado das operações não deveria ultrapassar este numeral. Apesar de lançar mão de recursos lúdicos para apresentar o assunto novo, tinha dúvidas e muitas ideias, porém faltava-me o referencial teórico. O fato é que vínhamos de um período em que o foco era “o que ensinar” e “como ensinar”. A preocupação era descobrir o método ideal para alfabetizar. O fato de uma criança, mesmo antes de entrar na escola, fazer uso do lápis para rabiscar era irrelevante, pois eram consideradas como rabiscos e garatujas. Nada além disso. A partir da inserção da perspectiva
  • 19. 19 construtivista de alfabetização nas escolas, o aluno passa a ser pensado de uma outra maneira: um protagonista, seu processo cognitivo, sua capacidade de levantar hipóteses. À escrita espontânea é dado outro valor. Percebe-se que a criança utiliza estratégias para representar a escrita. Estas estratégias podem se organizar em diferentes níveis de aprendizagem, que também serão abordados no decorrer deste trabalho. A ideia de que, mesmo antes de saber ler e escrever convencionalmente, a criança é capaz de elaborar hipóteses sobre o sistema de escrita parecia e parece desacreditada por parte de alguns docentes, chegando os mesmos a dizer que por culpa do construtivismo a educação hoje se encontra numa situação caótica. Acredito que este pensamento seja consequência da falta de esclarecimento e aprofundamento do que significa aprender e de que maneira se dá essa aprendizagem. Rocha(2003), em seu livro Admirável mundo louco, através da história "Quando a escola é de vidro", retrata a transição enfrentada pelo sistema educacional na década de 1980. Alunos vão para a escola e, conforme sua série, têm de inserir-se nos vidros que recebiam. Os reprovados sofriam a obrigatoriedade de manterem-se no mesmo vidro, mesmo não cabendo mais, uma vez estavam mais crescidos. Quem não se acomodava tinha que deixar a escola. Com a chegada de Firuli as coisas começaram a mudar. Ao desafiar o sistema e não entrar em seu vidro, Firuli leva alunos e professores a experimentar uma nova forma de aprender. A novidade era sem dúvida desafiadora, mas a coragem para tentar era maior: Num terreno em que, classicamente, e apesar da variedade de enfoques, pensou-se sempre que não podia haver aprendizagem sem um ensino específico, e em que a contribuição do sujeito se considerava como dependente e subsidiária do método de ensino, pudemos descobrir uma linha evolutiva que passa por conflitos cognitivos semelhantes, até nos detalhes do processo, aos conflitos cognitivos constitutivos de outras noções fundamentais. (FERREIRO &TEBEROSKY,1999, p.296) Antes da "Psicogênese da língua escrita" tínhamos escolas de vidro que viviam em busca de um método ideal, através do qual a aprendizagem ocorresse de maneira exitosa. A partir da Psicogênese quebram-se os vidros. O aluno deixa de ser espectador, aquele que assiste através dos vidros a um professor que transmite seus conhecimentos, sem ser interrompido e principalmente sem qualquer possibilidade de interação. É a partir das
  • 20. 20 pesquisas de Ferreiro & Teberosky que se passa a perceber que para que ocorra aprendizagem é necessário que a criança passe por conflitos cognitivos, conflitos estes que levarão à construção do conhecimento. Quanto ao Firuli, personagem de Ruth Rocha, podemos atribuir-lhe dois papéis. O primeiro está relacionado àquele aluno cuja realidade na qual está inserido nos leva a crer, embora de maneira errônea, que o mesmo não aprenderá de maneira satisfatória. Porém podemos também nos transformar em “Firulis” e mergulhar nessa nova visão do processo ensino-aprendizagem, quebrando paradigmas e percebendo os conflitos enfrentados pelas crianças como parte do processo de construção do conhecimento. Penso que este seja o nosso maior desafio: entender como se dá a aprendizagem, de que forma a interação com o meio influencia nesse desenvolvimento. Não nos basta apenas experimentar. É preciso conhecer a fundo a perspectiva de alfabetização construtivista, buscando coerência nas ações pedagógicas, colaborando assim com a aprendizagem do nosso aluno.
  • 21. 21 Delimitando o campo A Unidade Escolar possui um número de aproximadamente 87 alunos. Como o prédio onde a mesma funciona passará por uma reforma, os alunos foram transferidos para um local onde há alguns anos funcionava um abrigo para menores, conhecido como Patronato . A parte externa do prédio é bastante ampla. Porém a parte interna não ajuda muito. A sala, cuja turma que observei e assumi por dois meses, está utilizando, não é nada atrativa. No chão, os tacos estão soltos. No quadro, há algumas linhas desenhadas para registrar a partitura de músicas. Portanto, não é possível utilizá-lo totalmente. Há por parte da direção e orientação uma preocupação muito grande com a aprendizagem de todos os alunos. As mesmas chegam a visitar a casa dos alunos faltosos. Em alguns casos recorrem à Secretaria de Assistência Social, porém as respostas nem sempre são imediatas. Percebe-se que as mesmas conhecem não apenas os alunos, mas a história de vida de cada um. Atualmente a turma é formada por doze alunos. Inicialmente era composta por vinte e cinco. Além da aprendizagem, a falta de disciplina era apontada como uma das razões pelas quais o grupo deveria ser dividido. Porém até que se chegasse a esta divisão, os alunos tiveram nada mais, nada menos que quatro professores. Portanto eu seria a quinta professora a assumir a turma. Ao iniciar o trabalho com os alunos, percebi que havia diferentes níveis de aprendizagem, sendo necessário a realização de atividades diversificadas que atendessem à necessidade de cada. Percebi que era necessário traçar uma linha de trabalho, pois já estávamos no terceiro bimestre e ainda havia muito a ser trabalhado. Para iniciar procurei estabelecer uma rotina. Todos os dias era realizada uma leitura deleite. Esse tipo de leitura é utilizado apenas para que o aluno ouça. Não se tratava de uma leitura através da qual o professor quisesse explorar a gramática. Eram apresentados textos narrativos, poesias, parlendas e até mesmo músicas, para que a criança conhecesse diversos gêneros.
  • 22. 22 Weisz & Sanchez ( 2009, p.50, 51 ) reforçam a ideia de que todo professor deve levar todos os seus alunos a vivenciarem diferentes expressões culturais. Se percebemos a criança como protagonista do processo ensino aprendizagem, obviamente este também atuará como agente de transformação na comunidade na qual está inserido. Vale lembrar que a escola é um ponto de manifestação de uma diversidade cultural. Nela encontramos crianças que têm em suas casas livros de diversos gêneros textuais, crianças que frequentam cinema e teatro. Mas temos também aquelas que, sem ampla inserção na cultura escrita ou mesmo sem experiências que os levem para além dos limites de seu bairro ou comunidade, trazem consigo pouco mais dos conhecimentos transmitidos oralmente pelos mais velhos, por exemplo, ou ainda os conhecimentos acumulados nessa convivência local, mais restrita Cabe à escola explorar mais essa diversidade fazendo com que as crianças partilhem seus conhecimentos, ampliando seu acesso a conteúdos pertencentes ao mundo da cultura: da literatura, da ciência, da arte, da informação tecnológica, etc.: Necessitamos que muitos mais tenham a capacidade de dizer-nos por escrito quem são, para manter a diversidade cultural que é parte da riqueza de nosso mundo (...) Não esqueçamos a diversidade cultural. A alfabetização pode e deve contribuir para a compreensão, difusão e enriquecimento de nossa própria diversidade, histórica e atual. (FERREIRO, 1993,p.54) Em conjunto com a professora de outra turma, elaborei um projeto com o nome de “Leituras e gostosuras”. Percebemos que as crianças gostavam de tudo aquilo que se relacionava à alimentação. Entretanto, sabíamos da necessidade de trabalhar textos narrativos, poesias, textos instrucionais, enfim, precisávamos trabalhar com textos de diferentes gêneros. Ao colocar o projeto em prática, não solicitamos dos alunos sugestões de textos ou filmes a serem trabalhados. E com uma visão apriorista, nós mesmas os selecionamos. Para nós o foco estava em despertar nos alunos o desejo de aprender a partir daquilo que apresentávamos. Pergunto-me hoje: Será que a escolha feita pelos alunos traria um resultado mais positivo do que o obtido? Como detonador do projeto, assistimos ao filme "Tá chovendo hambúrguer" (MILLER & LORD, 2009). Foi trabalhada também a história "A galinha ruiva" (BREITMAN, 2004). A partir desta história os alunos confeccionaram uma galinha com
  • 23. 23 sucata, além de registrar o passo a passo para a confecção da mesma. Também, em conjunto com a outra professora, procurei realizar atividades fora da escola. Procurávamos chamar a atenção daqueles que ainda apresentavam certa dispersão. Os resultados nos pareceram bastante positivos. Em curto período de tempo, fui comunicada que ficaria com a turma somente até o final de setembro, devendo retomar minhas atividades na Secretaria Municipal de Educação. As crianças receberiam a sexta professora. Contudo, apesar do curto período em que tive contato com os discentes (dois meses), foi possível perceber uma mudança nos alunos. Houve, além de um desenvolvimento cognitivo, um aumento no interesse pelas atividades. Vale ressaltar que um dos alunos que participa de atividades na Sala de Recursos, não aceitava realizar nenhuma atividade escrita. Entretanto, aos poucos, foi se disponibilizando mais... Figura 1 Na atividade apresentada na figura 1 a proposta era que o aluno escrevesse qualquer palavra ou frase que desejasse para que eu pudesse avaliar o nível da escrita. O mesmo
  • 24. 24 negou-se a escrever pois disse que não sabia como fazê-lo. Optou então por fazer um desenho. Figura 2 Na atividade da figura número 2 o aluno já apresentava interesse pelas atividades que envolviam a escrita. Até então pude perceber que o mesmo encontrava-se no nível intermediário. Poderia neste momento ter lançado mão de uma atividade que possibilitasse ao aluno utilizar-se da escrita espontânea, o que infelizmente não aconteceu. Figura 3 Na atividade da figura 3, o aluno solicitou à professora que o ajudasse. Demonstra mais interesse e principalmente segurança. Becker(2011), ressalta que o conhecimento se constitui pela interação do indivíduo com o meio físico e social. Segundo o próprio autor, construtivismo significa a ideia de que nada está pronto, portanto o construtivismo não pode ser dado como algo terminado. O ato de construir é uma constante em nossas vidas. Entretanto o que varia é a “matéria prima” do fazer de cada um.
  • 25. 25 Mudamos os hábitos de acordo com a época, estamos sempre inventando e reinventando, construímos novos conceitos, frutos das experiências que adquirimos no dia a dia. Em Educação a matéria-prima é o conhecimento. Portanto é de suma importância que o professor conheça a natureza desse conhecimento. O professor precisa também definir que concepção tem acerca deste conhecimento: empirista , apriorista ou construtivista . Se sua concepção seguir um caminho empirista, ele tenderá a apropriar-se de uma prática que percebe o sujeito como uma folha em branco a ser preenchida a partir das nossas sensações. Ou seja, quando optei por levar textos selecionados somente por mim, foi o mesmo que considerar as crianças como tábuas rasas. Minha compreensão era que elas não tinham conhecimento suficiente para escolher textos relacionados ao projeto. De fato o acesso o material escrito, principalmente contos , realmente não era algo que fizesse parte do dia- a- dia daquelas crianças. Contudo, sei que poderia disponibilizar o material para que eles escolhessem. Caso opte pelo apriorismo conceberá o conhecimento como algo que está dentro do próprio sujeito e neste caso o professor tem como função apenas estimular para que estes conhecimentos aflorem. Durante o recreio, conversávamos sobre vários alunos . Porém a conversa acabava por abranger dois irmãos em especial aos quais chamarei de S.e N. Era comum ter um dos dois gritando nos corredores da escola. Inclusive ao falar da aprendizagem dos mesmos o que se dizia era o seguinte: “Os dois têm muita dificuldade.” “Também, a família onde vivem.” “ O pai bate na mãe.” “ Ela (mãe) não sabe ler nem escrever.” “ Esses meninos têm algum problema, melhor encaminhá-los para uma avaliação.” O interessante é que os meninos tinham um irmão que frequentava o primeiro ano de escolaridade. Segundo relatos da professora, conseguia desenvolver muito bem todas as atividades que a mesma propunha. Bem, se todos viviam na mesma casa, por que motivo apenas os dois ainda não haviam dominado a leitura e a escrita? Se a inteligência é algo
  • 26. 26 genético todos não deveriam estar no mesmo nível? Ou será que apenas um dos irmãos trazia consigo um certo grau de conhecimento? Mais uma vez fica clara a necessidade que temos de nos atualizar, ler e estudar para entendermos certas atitudes que tomamos. Para tomar conhecimento de que concepção estamos seguindo. A terceira concepção da qual Becker nos fala é a concepção construtivista. Nesta a criança é concebida como sujeito cultural ativo cuja ação tem as dimensões assimiladora através da qual produz transformações no mundo objetivo e acomodadora através da qual produz transformações em si mesmo. A partir do momento em que o professor define que concepção tem de conhecimento, pode nortear seu trabalho, elaborar seu planejamento. Contudo, não se trata aqui de dizer qual é a melhor concepção. Porém não se pode negar que conhecimento é construção, que não é dado nos objetos nem tão pouco através da hereditariedade. O indivíduo por si só não tem como aprimorar seus saberes, ele depende do outro. Vamos pegar um exemplo corriqueiro: Eu gostaria de aprender a fazer um bolo de chocolate, para tal preciso que alguém me explique como fazê-lo. Posso ter noção do material usado, porém preciso de orientação para executar tal tarefa. Posso recorrer à internet, ainda assim dependerei do fato de que alguém tenha postado esta receita. Assim como na vida, na escola, ocorre da mesma forma. O encontro de diferentes saberes favorece o surgimento de novos saberes. Isso é construtivismo. Weisz & Sanches (2009, p. 41), dizem que “o conhecimento se constrói frequentemente por caminhos diferentes daqueles que o ensino supõe”. É exatamente o que acontece com as crianças S. e N. das quais falei anteriormente. Cada irmão possui características próprias. Cada um terá seu momento de efetivar a aprendizagem. Cabe-nos portanto respeitar a individualidade de cada um e investir para que ambos tenham a oportunidade de efetivar sua aprendizagem Como educadora, sei que ainda cometo erros, encarados hoje por mim como construtivos. Procuro criar situações a partir das quais o aluno possa aprender. A partir da observação para avaliar o nível da escrita na qual os alunos estavam pude elaborar e
  • 27. 27 organizar meu trabalho. A realização de atividades em grupo proporcionou a interação entre as crianças. Alguns questionamentos eram levantados pelas mesmas durante a leitura deleite. Os mesmos não eram ouvintes passivos. Participavam e até sugeriam como poderia ser o final da história. Ainda há muito o que aprender. Tudo o que fazemos hoje procurando resolver ou pelo menos amenizar os problemas relacionados à alfabetização é resultado de nossa própria história. Afinal, já fomos considerados um povo desprovido de cultura. A este povo, no período da colonização, era oferecida uma educação com o objetivo de catequizar. Quanto a arte e a literatura eram voltadas apenas para a elite. Esse modelo de educação já não cabe mais em nosso contexto. Todos temos direito de acesso a diferentes manifestações culturais. Não é uma pedagogia compensatória que defendo ao dizer que a escola tem um papel equalizador das oportunidades de aprendizagem. Na verdade, o que precisa ser socializado na escola diz respeito, fundamentalmente, a conteúdos pertencentes ao mundo da cultura: da literatura, da ciência, da arte, da informação tecnológica, etc. Todas as crianças têm direito a isso, por que é condição de inserção social. (SANCHEZ e WEISZ,2009,p.49): Após a colonização, poucos eram aqueles que tinham acesso ao conhecimento, pois a escola como instituição, surgiu anos mais tarde. Porém, É difícil falar de alfabetização evitando as posturas dominantes neste campo: por um lado, o discurso oficial e, por outro, o discurso meramente ideologizante, que chamarei "discurso da denúncia". O discurso oficial centra-se nas estatísticas; o outro despreza essas cifras tratando do desvelar "a face oculta" da alfabetização. ( FERREIRO,1993, p.9) Temos o conhecimento e mais do que isso, podemos ver nos escritos de nossas crianças seja na escola ou até mesmo em casa que as características citadas e estudadas por Ferreiro & Teberosky (1999) em suas pesquisas, ainda prevalecem o que reforça a necessidade de constante aprimoramento por parte de todos aqueles que participam do processo educativo. Sejam eles professores, orientadores, gestores e por que não aqueles que fazem as leis relacionadas à educação neste país. Não se trata de um modismo, ou de se inventar uma nova maneira de alfabetizar. Trata-se de colocar em prática conhecimentos que
  • 28. 28 foram pesquisados, pautando-se as pesquisadoras na observação, indagação e principalmente nos pressupostos teóricos do grande Jean Piaget.
  • 29. 29 Um pouco de história da alfabetização no Brasil Procurando contextualizar as práticas alfabetizadoras ao longo dos anos, recorto fragmentos da sua história. Durante muito tempo a preocupação com o processo de aquisição da leitura e escrita esteve vinculada a como ensinar. A preocupação com método adequado, acaba por deixar de lado o aluno, principal agente desse processo. No Brasil, a educação adquiriu caráter sistemático, metódico e intencional, após a Proclamação da República. Nesse período os ideais positivistas, admirados e divulgados pelos republicanos consideravam a educação determinante para a formação do cidadão e para o desenvolvimento político e social do país. Apesar do ideário republicano, percebemos que desde aquela época o fracasso escolar na alfabetização acontecia, por fatores diversos. Tomarei por base a divisão proposta Mortatti ( 2006 ), em seu texto História dos Métodos de Alfabetização. Quanto a esta divisão dos períodos a história, a autora justifica da seguinte forma: Analisando, com base em fontes documentais, ocorrido nessa província/estado em relação à questão dos métodos de ensino inicial da leitura e escrita, desde as décadas finais do século XIX, optei por dividir esse período em quatro momentos cruciais,cada um deles caracterizado pela disputa em torno de certas tematizações,normatizações e concretizações relacionadas ao ensino da leitura e escrita e consideradas novas e melhores, em relação ao que, em cada momento,era considerado antigo e tradicional esse sentido.(p. 4) Entre 1876 e 1890 o material para leitura era escasso. Vale lembrar que no período imperial havia salas adaptadas para atender alunos de séries diversas. As atividades de escrita restringiam-se à cópia de documentos manuscritos explorando: caligrafia, ortografia, ditado e formação de frases. O método utilizado era o sintético, partindo da "parte" para o “todo”:Soletração ( nome das letras) ->fônico ( som da letra) -> silabação ( famílias silábicas) Ainda hoje, muito de nossa prática pedagógica retrata o que acontecia nesse período. Apesar de buscarmos novos caminhos, às vezes nos deparamos coma aplicação de atividades como por exemplo, cópias mecânicas que em nada contribuem para a aprendizagem, ou melhor, elas até contribuem desde que o objetivo seja a memorização de conceitos. No ano de 2000, como já disse, comecei a trabalhar no município de Rio das Flôres. Foi um ano turbulento para a educação naquele município, pois os professores concursados
  • 30. 30 estavam assumindo a turma no mês de junho ( era a primeira vez que acontecia um concurso público naquele município), os docentes que não foram aprovados, talvez por insatisfação, deixaram as turmas desordenadas, sem um registro claro para saber de onde poderíamos seguir. A equipe da secretaria de Educação não tinha como organizar, propor uma metodologia de trabalho para a Rede de Ensino, portanto cada professor passou a trabalhar de acordo com o seu ponto de vista. A mim coube uma turma de alfabetização. Não havia uma cartilha a ser seguida. Por isso, no intuito de acelerar a aprendizagem, lancei mão de uma cartilha chamada Tirando de letra. Recordo-me que ela apresentava o alfabeto e logo depois o aluno deveria fazer a junção de todas as consoantes com a vogal a. Dessa forma, todas as palavras e frases formadas poderiam ser por exemplo: bala, faca ou ainda “A fada fala”. As outras palavras eram formadas a partir do momento em que eram apresentadas as demais vogais. Em 1880 surge no Brasil o Método João de Deus ou método da palavração. O ensino da leitura deveria iniciar-se pela palavra. Depois partiria para a análise dos valores fonéticos das letras. Entre1890 e 1920 há uma disputa entre os defensores do "método João de Deus" e os defensores dos métodos sintéticos: da soletração, fônico e da silabação. Neste período o ensino da leitura e da escrita está subordinado às questões de ordem linguística daquela época. Uma nova tradição surge como consequência dessa disputa: o ensinar metodicamente relacionado com o que ensinar. Em meio a todo esses acontecimentos, tem início uma reforma educacional, visível principalmente no Estado de São Paulo, com a fundação da Escola-Modelo Anexa (à Normal). Nesta, as normalistas desenvolviam atividades práticas vinculadas ao método analítico para o ensino da leitura. Dessa forma acontece a institucionalização do método analítico, tornando-se obrigatória a sua utilização nas escolas públicas paulistas.
  • 31. 31 O método analítico partia do "todo". Entretanto havia certa falta de entendimento com relação a esse "todo". Para alguns o ensino poderia partir da palavra, para outros da sentença, porém poderia partir também da historieta. O processo baseado na historieta ( conjunto de frases relacionadas entre si por meio de nexos lógicos) foi institucionalizado em 1915,com a publicação do documento "Instruções práticas para o ensino da leitura pelo methodo analytico". Esse segundo momento é marcado pela relação estabelecida entre o como ensinar à definição das habilidades visuais, auditivas e motoras da criança a quem ensinar. O ensino da leitura e da escrita antes subordinado às questões de ordem linguística da época,passa então a subordinar-se às questões de ordem psicológica da criança. O período de 1920 a 1970, foi marcado pela "Reforma Sampaio Dória". O maior objetivo desta reforma foi a reestruturação do ensino elementar de modo a garantir vagas para as crianças paulistas que ainda se encontravam fora da escola. Nesse período, também aumentou a resistência por parte dos professores em utilizar o método analítico, buscando-se novas propostas de solução para os problemas do ensino e aprendizagem iniciais da leitura e da escrita. Apesar da resistência de alguns docentes, o método analítico continuou a ser utilizado. Contudo, tentou-se conciliar os métodos analíticos e sintéticos, passando-se a utilizar métodos mistos ou ecléticos, considerados mais rápidos e eficientes. A disputa entre os métodos sintéticos e analíticos foi se diluindo. Porém a discussão em torno da questão metodológica continuava. Surge então o método global,cuja unidade de ponto de partida é o texto. Somente com o livro "Testes ABC para verificação para maturidade necessária ao aprendizado da leitura e escrita" (1934),de autoria de M. B.Lourenço Filho, a importância do método de alfabetização passou a ser considerada tradicional. O foco a partir desse momento a solução dos problemas de aprendizagem de leitura e escrita. Com os resultados dos testes são organizadas turma homogêneas com o objetivo de que o ensino da leitura e da escrita ocorra de maneira exitosa.
  • 32. 32 Também a partir dessa época, são utilizadas as atividades do período preparatório cujas atividades estavam relacionadas a exercícios de coordenação viso-motora e auditivo- motora, posição de corpo e membros, dentre outros. As cartilhas baseavam-se em métodos mistos ou ecléticos com os manuais destinados ao professor. Como aspectos negativos relacionado aos “Testes ABC”, podemos citar: a visão de avaliação com o objetivo de medida, o método de ensino subordinado ao nível de maturidade e à concepção de escrita vinculada à habilidade caligráfica e ortográfica, devendo ser ensinada juntamente com a habilidade de leitura. Ao observar algumas escolas da Rede Municipal de Ensino na qual atuo como Assessora Pedagógica, pude perceber que ainda há por parte de alguns professores a preocupação em formar turmas homogêneas. A justificativa é a de que isso facilita o trabalho e o atendimento ao aluno. Mas e a troca de saberes. Só é possível trocar se o outro possui saberes diferentes do meu e vice versa. Weisz & Sanchez (2006) consideram que: … as formas de aprender diferem, que os tempos de aprendizagem também, e que não tem sentido sonhar com os alunos caminhando igualmente em seu processo de construção de conhecimento. (p.106) Portanto, estigmatizar os alunos como fracos ou fortes em nada favorece a construção do conhecimento. A partir do início da década de 1980 o fracasso da escola na alfabetização, desvincula- se da questão metodológica. Chega ao Brasil o pensamento construtivista. Com base nos estudos de Ferreiro e colaboradores percebeu-se que a aprendizagem está vinculada ao desenvolvimento infantil. O construtivismo surge não como método, mas parafraseando Mortatti, como uma "revolução conceitual". A partir dessa teoria são realizadas formações continuadas, divulgação de artigos, etc., a fim de convencer aos docentes da eficácia da proposta construtivista. Nesse período torna- se comum a discussão a cerca dos chamados métodos tradicionais e da teoria em questão.
  • 33. 33 A perspectiva construtivista de alfabetização Na década de 1990 crescia no Brasil e na América Latina o interesse pelo tema da alfabetização. Toda essa discussão baseava-se nos estudos de Ferreiro, uma argentina nascida em 1937, Psicopedagoga de formação, doutorada pela Universidade de Genebra, orientada por Jean Piaget 1, importante pesquisador suíço cuja preocupação era explicar o modo pelo qual o homem atinge o conhecimento, em seu livro traduzido no Brasil como Psicogênese da Língua Escrita, traz à tona um novo paradigma para a interpretação do modo pelo qual a criança aprende. A psicogênese surge não como um novo método para o ensino de leitura e escrita ou uma forma de classificar as dificuldades de aprendizagem. Sua proposta é fundamentar sob outra perspectiva implicações sobre processos de aquisição da leitura e da escrita. Ferreiro & Teberosky (1999) tomam como objeto de estudo os pressupostos epistemológicos de Piaget para a análise do aprendizado da língua escrita. As autoras partem do pressuposto de que "as crianças adquirem conhecimento acerca da linguagem escrita porque, em interação com este objeto, aplicam a ele esquemas sucessivamente mais complexos, decorrentes do seu desenvolvimento cognitivo" (Azenha 2006, p. 45). Com base na teoria de Piaget, Ferreiro & Teberosky concebem a obtenção do conhecimento como resultado da atividade do sujeito. Os estímulos não atuam diretamente, mas são transformados pelos sistemas de assimilação. Através destes o sujeito interpreta o estímulo e em consequência dessa interpretação a conduta do mesmo se faz compreensível. A teoria de Piaget não é uma teoria particular sobre um domínio particular, mas sim um dado teórico de referência, muito mais vasto, que nos permite compreender de uma maneira nova qualquer processo de aquisição de conhecimento. ( FERREIRO & TEBEROSKY. 1999, p.31). A pesquisa de Ferreiro & Teberosky( 1999) foi realizada, durante dois anos com crianças de diferentes nacionalidades, com idades entre quatro e seis anos, a partir da colheta de dados com crianças de diferentes meios sociais através de situações experimentais. O método utilizado foi o de indagação, inspirado no método clínico ou de exploração crítica. A 1 . Jean Piaget tratou a Epistemologia Genética, teoria do conhecimento com base no estudo da gênese psicológica do pensamento humano.
  • 34. 34 análise dos dados, de cunho qualitativo, tinha como objetivo descobrir e interpretar cada categoria de resposta. A psicogênese, assim como a teoria construtivista não são como muitos costumam chamar, modismo. Características apontadas por Ferreiro & Teberosky são encontradas também nas crianças como poderemos perceber nos escritos produzidos por crianças da Escola Estadual Municipalizada do Formoso, local onde realizei grande parte da minha pesquisa. Portanto, não se trata de um modismo ou de um teste para avaliar o nível de aprendizagem de cada uma. Se estas características são perceptíveis podemos concluir que é essencial dar ênfase em quem aprende e o como aprende. E para que esta se desenvolva é necessário saber que "os processos de construção sempre supõem reconstrução; no entanto, o que é que se reconstrói? É preciso reconstruir um saber construído em certo domínio para aplicá-lo a outro(...)" (FERREIRO,1993, p.87). As fases da escrita estudas pelas referidas pesquisadoras não devem servir como bula que traz ou indica as etapas ou procedimentos para a evolução da escrita. Permitem que educadores possam “organizar “ seu trabalho, planejar suas atividades a fim de favorecer aprendizagem. Entender como leem e escrevem as crianças que ainda não saibam ler ou escrever são de fato aspectos importantíssimos abordados por Ferreiro e Teberosky até então não abordados por outros estudiosos. A partir da mesma o cenário educacional passa por consideráveis mudanças: o método deixa de ser considerado o principal elemento no processo de alfabetização, o professor passa a ser colaborador na construção do conhecimento. Ele participa do processo e não apenas indica o caminho a ser seguido. A partir da psicogênese acontece algo que vejo como fundamental e que Azenha (2006,p.111) reforça: Cabe à escola a tarefa social de ensinar. A criança não tem obrigação de transpor sozinha a interação com o objeto que ela não teve a oportunidade de conhecer fora da escola. Portanto se faz urgente e necessário pensar políticas públicas que venham a atender de maneira satisfatória às necessidades destas crianças a fim de erradicar o alto índice de reprovação nas séries iniciais causados principalmente por problemas relacionados à alfabetização. Contudo, este é um tema para uma próxima pesquisa. Os exemplos de escrita abaixo oferecem dados para uma classificação. Nestas será possível comprovar os processos de construção e reconstrução pelos quais as crianças
  • 35. 35 passam até que aprendam a ler e escrever de maneira alfabética. Estes mecanismos foram apresentados por Ferreiro & Teberosky no livro Psicogênese da Língua Escrita, do meu ponto de vista, uma importante referência para os professores alfabetizadores pois remete à observação e à reflexão acerca dos níveis pelos quais a criança passa durante o processo de aquisição da escrita. Durante a realização da pesquisa tive a oportunidade de observar algumas crianças da escola cujo nome citei inicialmente. Seus escritos retratam os conflitos vividos até que se chegue a leitura e escrita alfabéticas.  Nível 1 :Pré -silábico (Ferreiro, 2006) Nessa etapa a criança não estabelece vínculo entre a leitura e a escrita. A leitura é global. Há a utilização de pseudoletras. Para a criança há uma relação entre o nome e o tamanho daquilo que registram através da escrita. Assim, para escrever por exemplo, girafa usarão mais letras do que ao escrever telefone. O grupo de crianças por mim observado não apresentava até então nenhuma criança nesse nível. Por isso recorri ao livro citado acima para melhor ilustrar o exemplo.  Nível 2 : Intermediário
  • 36. 36 ( atividade realizada pelo aluno Yan, 9 anos) A escrita acima foi realizada pelo aluno Yan. O mesmo permaneceu na escola apenas por dois meses, mais precisamente no terceiro bimestre. Aqui, o aluno encontra-se em um nível intermediário, pois apesar de fazer uso das letras, o mesmo não sabe o nome das mesmas. Observe que as letras se repetem em todas as palavras, invertendo-se apenas a ordem das mesmas. Ao solicitar que o mesmo lesse para mim, era ele quem dava sentido ao seu texto. Na atividade original, havia desenhos que me permitiam conhecer o que o mesmo desejava escrever. Observe: Seria então necessário fazer um trabalho individualizado para que pudesse avançar. O que infelizmente não aconteceu. Na sala de aula não era tão fácil assim realizar essas atividades já que havia outros alunos em outros níveis de aprendizagem. O que obviamente não deve
  • 37. 37 servir como justificativa para a retenção ao final do ano letivo, uma vez que essas diferenças podem favorecer os processos de interação que leve à aprendizagem. Yan foi transferido ao final do bimestre. Como estamos em município pequeno, a orientadora da escola para a qual o mesmo seguiu foi informada de seu desempenho, além de ter acesso a atividades realizadas pelo mesmo durante o período em que permaneceu na escola. A mesma nos informou que a professora continuaria a realizar um trabalho diversificado com o menino.  Nível silábico: (atividade realizada pelo aluno Valderez, 8 anos) A atividade acima foi realizada pelo aluno Valderez. Este aluno é o mesmo que já citei anteriormente que se negava a realizar qualquer atividade escrita. Vale ressaltar que o mesmo era considerado imaturo e por isso apresentava um comportamento considerado inadequado para que o mesmo pudesse aprender. Aqui se encontra a patologia individual citada por Ferreiro (1993) e a qual já me referi neste trabalho. Cabe aqui mais um texto deste livro fabuloso e que nos leva a uma constante reflexão: A noção de maturidade abriu um próspero mercado comercial (...) trouxe uma nova clientela para psicólogos e psicopedagogos (...) tem facilitado o trabalho dos professores (...) servido para manter o pré-escolar” assepticamente “isolado da língua escrita (...) prestado para encobrir os fracassos metodológicos (...) discriminar as crianças dos setores marginalizados (...) esta maturidade, definida como algo que o sujeito deve trazer consigo, que é independente das condições de aprendizagem escolar, tem sempre as mesmas consequências. ( FERREIRO. 1993.p.64) O fato é que o aluno começou a demonstrar interesse em realizar as atividades e consequentemente começou a apresentar um desenvolvimento considerável. Neste registro o
  • 38. 38 aluno começa a estabelecer relação entre a pronúncia e partes da palavra.. Observe que o mesmo está oscilando por isso às vezes utiliza uma letra para representar um som ( p = pa na palavra pato) Logo, supõe que a escrita representa a fala por isso tenta fonetizar a escrita e dar valor sonoro às letras.  Nível 4 :Alfabético (atividade realizada pela aluna Tatiane, 8 anos) A aluna acima é aquela que caracteriza o sonho de todos os professores. A família interage constantemente com a escola, a mesma tem acesso a uma diversidade de textos. Ou seja,é uma criança que chega à escola sabendo que a escrita serve para escrever coisas inteligentes, divertidas ou importantes. Ou ainda parafraseando Ferreiro (1993,p.23). Essas são as que terminam de alfabetizar-se na escola, mas começaram a alfabetizar-se muito antes, através da possibilidade de entrar em contato, de interagir com a língua escrita. Sem dúvida um aluno que chega à escola neste nível facilita bastante o trabalho do professor. Isto não quer dizer que o mesmo não passará pelos diversos níveis de aprendizagem. O diferencial estará nas hipóteses . Nesta atividade, a aluna Tatiane conseguiu adequar o escrito ao sonoro. Percebemos aqui que surgem as questões relacionadas à ortografia. A escrita serve não apenas para o seu entendimento, mas de todos aqueles que têm acesso aos seus escritos, já que percebe que a escrita tem uma função social.
  • 39. 39 Seja qual for o nível da escrita, em uma concepção construtivista a criança constrói seu conhecimento, tendo o professor como mediador, utilizando-se de seus conhecimentos prévios e fazendo do erro uma estratégia através da qual ampliará seus conhecimentos. Mas quem é essa criança? O que ela espera da escola? O que espera de seu professor? Antes de responder a esses questionamentos, gostaria de relatar a experiência que tive ao acompanhar uma turma do 2º ao 5º Ano de Escolaridade da Rede Pública Municipal de Valença, município no qual iniciei minhas atividades como professora regente. Apesar de não ter realizado nenhuma pesquisa relacionada a este Trabalho de Conclusão de Curso com esta turma, acredito que não posso deixar de relatar as experiências pelas quais passei com este grupo de alunos pois hoje eles são prova de que o trabalho pautado em uma perspectiva construtivista dá certo. Esta experiência se passou na Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida entre 2004 e 2008. Pode-se considerar que a estrutura da escola é boa. Não havia material escolar em abundância. Contudo era possível desenvolver um bom trabalho com o que nos era oferecido. Além disso, os pais na medida do possível também colaboravam contribuindo com o que se pedia na lista de material escolar distribuída no início do ano letivo. Os alunos da turma em questão frequentavam a escola no período da manhã e à tarde eram atendidos em uma instituição que recebia crianças cujos pais trabalhavam durante todo o dia. Esses alunos não tinham horário de estudo fora da escola. Portanto tinham que ser explorados ao máximo no ambiente escolar. Dentro da sala, eu procurava oferecer diferentes tipologias textuais ( Cantinho da Leitura ), momentos de produções textuais coletivas e individuais, realização de experiências,aulas fora do ambiente escolar. Enfim, uma infinidade de atividades que pudessem auxiliar no processo ensino aprendizagem. Obviamente nunca foi descartada a necessidade de acompanhamento dos responsáveis. Porém com o apoio da direção foi possível realizar um ótimo trabalho. Hoje, estes alunos estão no 8º ano. Alguns mudaram de escola , pois esta oferece até o 9º Ano. A grande maioria continua brilhando. Ou seja posso dizer que contribui para que eles ampliassem seus horizontes e apesar das dificuldades não desistissem. O que quero dizer exatamente é que ao frequentar uma escola a criança espera que esta seja capaz de oferecer-lhe a oportunidade de mudar de vida, de sentir-se incluída.
  • 40. 40 Quando em uma turma de vinte e cinco alunos, um ainda não consegue acompanhar é sinal de que com ele precisam ser adotadas novas estratégias para que o mesmo possa aprender. Em relação ao professor é preciso que o aluno perceba que o mesmo está convencido de que é possível, de fato ensiná-lo. Todos as crianças são capazes de aprender. Umas aprendem com mais facilidade, outras demoram um pouco mais. Porém, todos trazem consigo saberes que na escola se encontram e possibilitam a construção de novos conhecimentos. A aprendizagem na perspectiva construtivista pressupõe o resultado da ação e reflexão do aprendiz. Ou seja, antes de apresentar o conteúdo de maneira sistemática o professor precisa conhecer o que as crianças já sabem e o que são capazes de produzir com e sobre esses saberes. Mas “como suscitar a necessidade na escola, como fazer germinar na criança o interesse por aquilo que se quer ensinar?” (Weisz & Sanches, 2009, p.30). Trata-se de um desafio que, para vencer, o professor deverá utilizar como arma seu conhecimento e a pesquisa constante. Para receitar um remédio o médico precisa ter conhecimento dos possíveis efeitos que o mesmo pode causar no organismo de seu paciente. Da mesma forma, o professor ao elaborar qualquer atividade precisa ter ciência dos efeitos positivos ou negativos que as mesmas causarão futuramente na vida de seu aluno. Portanto, não cabe mais no contexto em que vivemos nos limitarmos a ser professores. Mais do que isso temos que ser pesquisadores. É comum ouvirmos dos professores o quanto é importante levar em consideração o conhecimento prévio dos alunos. Mas o que é conhecimento prévio? As pesquisadoras referem-se a esse conhecimento prévio como algo construído pelo aprendiz, sem a interferência do professor. Mas isso é realmente possível? O conhecimento não é gerado do nada,é uma permanente transformação a partir do conhecimento do que já existe. Essa afirmação – a de que o conhecimento prévio do aprendiz é base de novas aprendizagens – não significa a crença ou defesa de pré – requisitos. Tampouco esse tipo de conhecimento se confunde com a matéria ensinada anteriormente pelo professor. (WEISZ & SANCHES.p. 61)
  • 41. 41 Para aprender alguma coisa nova é preciso já saber alguma coisa, não necessariamente de maneira sistematizada como a escola apresenta ou como pré- requisito para se adquirirem novas aprendizagens. Aqui cabe muito mais nos lembrarmos de Piaget e os processos de assimilação, equilibração e acomodação. Os processos de assimilação e acomodação são processos através dos quais o indivíduo capta cognitivamente o ambiente e o organiza, ampliando seu conhecimento, ou na linguagem de Piaget, seus esquemas. Durante esse processo o indivíduo usa as estruturas que já possui. A assimilação e a acomodação estão intimamente ligadas, pois sem a interpretação ativa de determinado conteúdo (assimilação), não haveria a acomodação das estruturas psicológicas . A partir desse processo de assimilação e acomodação ocorre a equilibração. É importante lembrar que estamos constantemente passando pelos processos de assimilação, acomodação e equilibração, uma vez que aprender faz parte da existência humana. Quando crianças, por exemplo temos um conceito da palavra casa.. Com o passar do tempo e graças a interação com o meio, vamos adquirindo novos conhecimentos a cerca não só da palavra casa mas do objeto em si. Ou seja estes novos saberes estão constantemente gerando conflitos que nos levarão a formar novos conceitos. Azenha (2006), resume essa relação entre os conceitos acima citados quando diz que "cada nova estrutura constrói-se, portanto,a partir de pequenas mudanças na estrutura já existente, o que faz do desenvolvimento cognitivo um processo gradativo de avanços em direção a estruturas qualitativamente superiores" (p. 41). Como explicar o fato de alguns alunos apresentarem dificuldade em representar o algorítimo da adição ou subtração, porém conseguem ajudar seus familiares que trabalham no comércio. Os mesmos muitas vezes realizam o cálculo mental de maneira rápida e surpreendente.
  • 42. 42 Ao buscar estratégias para resolver um problema a criança não utiliza receitas prontas, propostas em sala de aula. Na primeira semana de novembro, a Secretaria Municipal de Educação de Rio das Flôres promove uma gincana cultural para os alunos do 6º ao 9º ano de escolaridade. Um fato que chamou minha atenção nesta última gincana foi a estratégia utilizada por um aluno para escrever uma palavra utilizando treze palitos de fósforos. Enquanto os outros quebravam a cabeça para formar suas palavras, o mesmo escreveu uma palavra com letras grandes para que todos os palitos fossem utilizados. Às vezes nos preocupamos em aplicar soluções já apresentadas ao invés de ousarmos e procurar nossas próprias estratégias. Aqui reporto-me ao texto de Weizs & Sanchez (2009 p. 35): Uma situação problema se define sempre em relação ao aprendiz. Deve ser uma situação na qual a solução não vá ser buscada na memória, nem a resposta possa ser imediata, pois o aluno precisará mobilizar conhecimentos que já tem e usá-lo de tal forma que acabará construindo uma solução não previamente determinada. Estamos sempre criando estratégias, buscando novas soluções para todos os tipos de problemas. Isso faz parte da alma humana. Graças a essa busca constante o homem descobre a cura para as doenças, cria novos mecanismos de comunicação entre outras coisas Quando se fala em aprendizagem, outro aspecto que nos chama a atenção está relacionado às crianças oriundas de um ambiente no qual as pessoas têm um grau de escolaridade menor. Estas crianças já chegam à escola com certa desvantagem com relação àquelas que ao contrário têm acesso a livros, revistas, internet, etc. Nesse caso caberá a escola proporcionar situações nas quais estes alunos possam navegar na cultura , na Internet, na arte, em todas as áreas do conhecimento, em todas as linguagens, em todas as possibilidades. Saliento que apesar de estarem nessa situação, estas crianças também trazem consigo conhecimentos prévios uma vez que, como já foi dito, estes não devem ser confundidos com o conteúdo ensinado pelo professor. Uma maneira que possibilita a exposição desse conhecimento prévio por parte do aluno é o trabalho com Pedagogia de Projetos.
  • 43. 43 Ao elaborar um projeto, o docente utiliza-se de um tema que parte normalmente do interesse da turma. Na problematização dá oportunidade para que todos participem já que esta surge dos seguintes questionamentos:  O que sabemos?  O que queremos saber?  O que aprendemos? ( ao final do projeto) Quanto aos conteúdos,estes são vinculados ao projeto, sendo trabalhados de maneira interdisciplinar atendendo não só a curiosidade dos alunos mas também aos objetivos propostos pelo professor.
  • 44. 44 Avaliação e o professor na perspectiva de alfabetização construtivista A avaliação precisa ser espelho e lâmpada, não apenas espelho. Precisa não apenas refletir a realidade, mas iluminá-la criando enfoques, perspectivas, mostrando relações, atribuindo significados.2 Assunto polêmico, a avaliação do processo educativo tem sido amplamente discutida. Contudo a discussão acerca desse tema precisa partir do pressuposto de que a avaliação não envolve apenas o aluno, mas também a atuação do professor, além do planejamento e aplicação das atividades. Discutir sobre avaliação nos faz refletir sobre três questões fundamentais nesse processo. São elas : O que avaliar? Por que avaliar? Como avaliar ? Dentro da concepção construtivista a avaliação tem caráter diagnóstico e contínuo. Considera-se diagnóstica uma vez que a partir dela é possível tomar decisões que venham a melhorar a qualidade do ensino. A avaliação é também um processo contínuo porque nos permite saber que aptidões foram adquiridas ou simplesmente, que objetivos foram atingidos. Porém, para que esse resultado seja satisfatório é necessário que se leve em conta tanto os aspectos quantitativos quanto os qualitativos. Além das provas e testes há de se considerar também a participação e o desempenho diário dos alunos, assiduidade, apresentação de trabalhos em grupo ou individual. A avaliação não deve ser uma arma da qual o professor dispõe para punir seu aluno. Weizs & Sanchez ( 2009) retratam muito bem o papel da avaliação ao dizer que: Cabe à escola garantir a aproximação máxima entre o uso social do conhecimento e a forma de tratá-lo didaticamente. Pois se o que se pretende é que os alunos estabeleçam relações entre o que aprendem e o que vivem, não se pode, com o intuito de facilitar a aprendizagem,introduzir dificuldades. Nesse sentido, o papel da escola é criar pontes e não abismos. (p.75) Coll & Martin (2006), afirmam que os alunos constroem determinados significados sobre os conteúdos à medida que, simultaneamente, atribuem-lhes determinados sentidos 2 M.H.Abrams, in Dilvo Ristoff,1995
  • 45. 45 Logo, quando o aluno registra algo que aos nossos olhos parece estar errado, na verdade o mesmo está buscando meios para chegar à resposta. A construção seja ela coletiva ou individual, é uma atividade da qual o docente pode lançar mão pois além de contribuir para que o aluno aprimore a leitura e a escrita, possibilitam avaliar que aspectos ainda precisam ser trabalhados para que o aluno obtenha êxito na aprendizagem. A avaliação precisa ser espelho e lâmpada. É espelho quando o professor é capaz de auto avaliar-se, avaliar seu trabalho. É lâmpada quando oportuniza aos alunos construir e aprimorar seus conhecimentos. A avaliação não deve funcionar como um instrumento através do qual é atestada a incapacidade do aluno de aprender. Em entrevista concedida ao Jornal do Brasil em 21/07/2000, Cipriano Luckesi faz uma explanação sobre a diferença entre avaliar e examinar. Quando utilizam-se exclusivamente os exames, estamos lançando mão de um instrumento que não leva em conta o estado psicológico do aluno. Não importa como ele estava antes ou como ficará depois do resultado obtido em sua prova. O objetivo maior é classificar o aluno em aprovado ou reprovado, a partir de uma escala classificatória que vai de 0 a 10,o que acaba por excluir o educando já que grande parte fica de fora uma vez que até mesmo por questões sociais não consegue acompanhar a minoria. Todo trabalho precisa ter um objetivo. E para que esse objetivo seja alcançado, o trabalho deverá ser direcionado. Neste momento entra em cena o professor. É comum ouvirmos que em uma concepção construtivista o professor é o mediador da aprendizagem. Mas como acontece essa mediação? Solé & Coll (2006), destacam que a concepção construtivista oferece ao professor referencial para analisar e fundamentar as decisões que este precisa tomar no planejamento e no decorrer do ensino. O planejamento representa o primeiro passo para a mediação, uma vez que ao planejar supõe-se que o professor já tenha conhecimento de algumas das dificuldades de seus alunos bem como da capacidade dos mesmos de utilizar conhecimentos prévios para a resolução de problemas. Essa mediação pressupõe também uma interação entre professor e aluno, e por que não, uma relação de cumplicidade.
  • 46. 46 Cabe também ao promover situações que possibilitem a todos os seus alunos ampliar não só seus conhecimentos, mas também seus horizontes,já que esta é uma forma de inclusão social. Ao professor construtivista cabe também a formação continuada .para que ele possa construir conhecimentos de diferentes naturezas, que lhe permitam ter claros os seus objetivos,selecionar conteúdos pertinentes,enxergar na produção de seus alunos oque eles já sabem e construir estratégias que os levem a conquistar novos patamares de conhecimento” ( WEISZ & SANCHES, 2009.p.53 ) Weisz & Sanches ( 2009 ) comparam o professor a um diretor de cena ou de contrarregra, pois cabe a ele montar o andaime a partir do qual a construção do aprendiz será apoiada. Entretanto para oferecer este apoio, este suporte, é preciso dominar diversas áreas do conhecimento para que se desenvolva um trabalho pautado na interdisciplinaridade. Outro aspecto que penso ser importante destacar é o fato de que aliada à preocupação com a alfabetização há a preocupação com o professor alfabetizador . Ferreiro (1993) define isso muito bem quando diz o seguinte: O professor alfabetizador está muito só: em vez de ser considerado como o professor mais importante de toda a escola primária, é considerado como aquele que realiza o trabalho menos técnico e que qualquer outro poderia fazer (...) É o professor com as salas mais superlotadas, de quem se espera um grande espírito de sacrifício, uma atitude” muito maternal “(...) e muita paciência em troca de uma baixa remuneração e muito pouco apoio intelectual. É freqüente que se atribua às aulas de alfabetização precisamente aos professores com menos experiências ou àqueles que são” castigados “por alguma razão. Os professores desejam ser promovidos ao” grau superior “assim como seus alunos. Não é estranho que, nessas condições, ninguém esteja motivado para pensar criticamente sobre sua prática, refugiando-se nas alternativas mais burocráticas.. (p.51) Não podemos esquecer que além da formação continuada é preciso também que a sociedade enxergue o professor como profissional essencial que precisa e merece ser valorizado também no aspecto financeiro e com condições dignas de trabalho.
  • 47. 47 Conclusões provisórias Ao iniciar as pesquisas para a realização de um TCC, não temos a ideia de como será grande o nosso crescimento. A princípio pensamos apenas o quanto será trabalhoso. Começamos procurando textos em internet, mas logo depois partimos para os livros, pois as leituras virtuais tornam-se insuficientes para atender a nossa necessidade de aprender mais. E foi assim que tudo começou, tive acesso ao texto de Mortatti que se referia à história dos métodos de alfabetização no Brasil. No início, não entendi porque este texto fora me sugerido. Após a leitura do mesmo, pude perceber que tanto tempo após a proclamação da República, eu ainda continuava preocupada com a metodologia adequada para que as crianças pudessem aprender a ler e escrever. Sei que não usava apenas o método sintético. Fazia uma mistura com o método analítico. Focava todo meu planejamento no método, no ensino. Não tinha conhecimento nem entendimento para perceber que para que a aprendizagem seja exitosa é preciso que o professor conheça seu aluno, compreenda que ele passa por níveis de aprendizagem até tornar-se alfabético. Outro aspecto que quero destacar é que sempre ouvi vários questionamentos contrários à perspectiva construtivista. Após esta pesquisa, sinto segurança para afirmar que, se temos crianças que chegam ao 5º ano de escolaridade sem saber ler ou escrever, não é culpa da perspectiva construtivista de alfabetização, muito menos por culpa da criança. As pesquisas de Ferreiro & Teberosky estão aí para provar. Identificamos claramente que os conflitos citados pelas autoras são comuns às crianças em geral. Quero ressaltar também que a alfabetização dentro de uma perspectiva construtivista não acontece de uma forma solta e desordenada. Há método. Ao professor cabe mediar a aprendizagem, pois para aprender é preciso que se tenha uma proposta e esta deve ser elaborada com a colaboração entre professor e aluno. Quanto à correção esta ocorre porém com outro olhar já que assim como a avaliação não tem caráter punitivo. Através destes torna-se possível a elaboração de atividades que ajudem o aluno a aprender aquilo que ainda não conseguiu atingir. Se ainda temos tantos analfabetos funcionais é porque faltam políticas que proporcionem uma educação de qualidade, uma política na qual o professor seja valorizado
  • 48. 48 com salário digno para que possa adquirir livros que contribuam para seu crescimento profissional. É primordial pensar também nos alunos e oferecer-lhes condições de aprender. Que suas escolas não sejam como as que existiam no período imperial: uma sala com alunos agrupados e um professor para dar conta de todos. A Educação precisa ser levada a sério. Caso contrário, estaremos sempre procurando um culpado pelos altos índices de repetência em nossas escolas. Quanto ao construtivismo, é fato que a ele não cabe mais este papel, pois tudo aquilo que é proposto encontra suporte teórico nas pesquisas de Ferreiro & Teberosky a partir da orientação do epistemólogo suíço Piaget. Este trabalho procurou discorrer sobre a psicogênese da língua escrita estabelecendo relação entre a mesma e o cotidiano da alfabetização pois, é partir desta relação que se torna possível uma análise da perspectiva construtivista de alfabetização. Propôs também uma reflexão sobre o professor, a criança e a avaliação na escola e sua relação com o ensino e a aprendizagem. Assumir a provisoriedade das conclusões aqui apresentadas é uma indicação do quanto ainda há por vir nesse caminho de educadora que compreendeu a importância da pesquisa para aperfeiçoar o fazer-saber.
  • 49. 49 Referências bibliográficas AZENHA, Maria da Graça..Construtivismo: de Piaget a Emília Ferreiro. 8ª Ed. São Paulo: Ática, 2006. BECKER, Fernando. O que é construtivismo? http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=011. Acesso em 20 de setembro de 2011. BREITMAN,André Koogan. A galinha ruiva. São Paulo:FTD, 2004 COLL, Cesar ( et alli). O construtivismo na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006. FERREIRO, Emília. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 1993. ____________.; TEBEROSKY, A. Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. MILLER Chris; LORD Phil ( Direção) Tá chovendo hambúrguer ( filme). Título original: Cloudy with a Chance of Meatballs. EUA, Sony Pictures, 2009. 90min. MORTATTI, Maria do Rosário Longo. História dos métodos de alfabetização. em www.portalmec.gov.br , Acesso em 9 de agosto de 2011. ROCHA, Ruth. Admirável mundo louco. São Paulo: Salamandra, 2006 WEISZ, Telma & SANCHEZ, Ana. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. 2ª Ed. São Paulo: Ática, 2009.