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Edição em 92 tópicos da versão preliminar integral do livro de Augusto de
Franco (2011), FLUZZ: Vida humana e convivência social nos novos mundos
altamente conectados do terceiro milênio




                              20
              (Corresponde ao primeiro tópico do Capítulo 2,
                    intitulado Inumeráveis interworlds)




                    Highly Connected Worlds

Seu mundo-fluzz é sua timeline

O estilhaçamento do mundo único é uma mudança de época jamais
presenciada pelas chamadas civilizações (patriarcais, guerreiras, quer dizer,
hierárquicas). Os padrões de vida e convivência social estão mudando. Isso
significa que você também está mudando. Porque estão mudando seus
relacionamentos recorrentes: sim, seu mundo-fluzz é sua timeline. Não, por
certo, a timeline do Twitter, mas aquela que rola no espaço-tempo dos
fluxos e que não pode ser captada por quaisquer das ferramentas digitais p-
based disponíveis.
Essa mudança é a rede. À medida que aumenta a interatividade da rede na
qual você está imerso, fenômenos surpreendentes começam a acontecer.
Com a queda brusca dos graus de separação, chegará rapidamente o dia
em que você chamará um taxi em uma cidade de dez milhões de habitantes
e o motorista dirá: “O senhor não é o Steven Strogatz, que investiga redes
sociais e que descobriu que o mundo está ficando pequeno mais
rapidamente do que imaginávamos?”.

Isso, é claro, se você for de fato o Steven Strogatz. Mas, de certo modo, se
você é o motorista que se relaciona (ou que se relaciona com quem se
relaciona, ou que se relaciona com quem se relaciona com quem se
relaciona) com Steven Strogatz, sobretudo se ele (ou quem se relaciona
com ele) está na sua timeline e você (ou quem se relaciona com você) na
dele, você será um pouco Steven Strogatz (na medida inversa do seu grau
de separação dele): eis o ponto! Tal mudança vai muito além do que
imaginávamos porque você está fazendo parte de um organismo capaz de
inteligência e, quem sabe, de outros atributos ou qualidades que sequer
conseguimos imaginar.

Os Highly Connected Worlds tendem a ser organismos humanos coletivos.
Atenção: superorganismos humanos, não organismos super-humanos! Eles
são os campos para o nascimento do ‘indivíduo social’. Steven Strogatz fará
parte de você e você fará parte dele porque ambos farão parte de um
mesmo organismo, não em termos metafóricos, como quando usávamos a
palavra ‘organismo’ para designar o que imaginávamos que fosse ‘a
sociedade’. Não. Trata-se de um organismo mesmo. E humano.

O indivíduo social está nascendo agora. Mas ele já estava presente, como
prefiguração, desde o início, quando se constituíram os primeiros seres
humanos. Para lembrar a bela Canción Tonta de García Lorca (1924), nós,
os humanos, só o éramos enquanto estávamos “bordados en la almohada”
da rede-mãe (1).

O indivíduo-social não pôde se consumar como humanidade enquanto algo
estava impedindo: a escassez de conexões, uma escassez artificialmente
introduzida por modos de regulação não-pluriárquicos. Fluzz não podia
passar. Mas fluzz é empowerfulness. Se fluzz não pode soprar o corpo não
se vivifica.

Essa mudança, todavia, é diferente – e única – em cada mundo. Não, não é
sempre a mesma coisa. Depende de “onde” (ou como) o fluxo (o)corre.
Manoel de Barros (1993) inventou “que um rio que flui entre dois jacintos
carrega mais ternura que um rio que flui entre dois lagartos” (2). Pois é. No



                                     2
limite, você fará seu mundo. Quer dizer, você (ou você e sua timeline – o
que tende a ser a mesma coisa) será o mundo e os mundos serão tantos
quanto as identidades coletivas que forem usinadas por fluzz.

Isso significa que os Highly Connected Worlds tendem a ser inumeráveis,
assim como serão inumeráveis os interworlds, miríades de interfaces
conectando miríades de mundos e “explodindo como uma ramada de
neurônios”, para lembrar um artigo seminal de Pierre Lèvy (1998) (3).

Em termos tecnológico-sociais, o grande desafio hoje, ao contrário do que
reza a metafísica que esse Mark Zuckerberg – o chefe do Facebook – quer
nos empulhar – para torná-la, a sua plataforma proprietária única, a própria
rede e não mais uma ferramenta –, é construir os inumeráveis interworlds
que serão as novas internets.

O Facebook tem mais de 500 milhões de usuários? É ruim. Seria melhor ter
500 mil plataformas com mil usuários cada uma, conversando entre si...
Tudo que não precisamos agora é reeditar a ilusão hierárquica de um
mundo único. Uma sociedade em rede é uma configuração de miríades de
Highly Connected Worlds interagentes. Essa é a única mudança
verdadeiramente sustentável: tudo que é sustentável tem o padrão de rede
porque rede é redundância de processos e abundância (diversidade) de
caminhos.

A mudança-que-é-a-rede é fractal, não unitária. A mudança não é a
emergência de muitos mundos locais (que, de resto, sempre existiram),
mas os múltiplos caminhos (que não puderam existir nas civilizações
hierárquicas) entre o local e o global. E ela não se consumará sem essas
“zonas de transição” que são interworlds.




                                     3
Notas

(1) Cf. LORCA, Frederico Garcia (1924). “Canción Tonta” in Canciones (Obras
Completas I). Madrid: Aguilar, 1978.

(2) BARROS, Manoel (1993). Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2010.

(3) LÉVY, Pierre (1998). “Uma ramada de neurônios” in Folha de São Paulo:
15/11/1998. Cf. ainda Caderno Mais da Folha de S. Paulo: 15/11/2002 (p. 5-3). O
texto está disponível em:

<http://escoladeredes.ning.com/profiles/blogs/uma-ramada-de-neuronios>




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  • 1. Em pílulas Edição em 92 tópicos da versão preliminar integral do livro de Augusto de Franco (2011), FLUZZ: Vida humana e convivência social nos novos mundos altamente conectados do terceiro milênio 20 (Corresponde ao primeiro tópico do Capítulo 2, intitulado Inumeráveis interworlds) Highly Connected Worlds Seu mundo-fluzz é sua timeline O estilhaçamento do mundo único é uma mudança de época jamais presenciada pelas chamadas civilizações (patriarcais, guerreiras, quer dizer, hierárquicas). Os padrões de vida e convivência social estão mudando. Isso significa que você também está mudando. Porque estão mudando seus relacionamentos recorrentes: sim, seu mundo-fluzz é sua timeline. Não, por certo, a timeline do Twitter, mas aquela que rola no espaço-tempo dos fluxos e que não pode ser captada por quaisquer das ferramentas digitais p- based disponíveis.
  • 2. Essa mudança é a rede. À medida que aumenta a interatividade da rede na qual você está imerso, fenômenos surpreendentes começam a acontecer. Com a queda brusca dos graus de separação, chegará rapidamente o dia em que você chamará um taxi em uma cidade de dez milhões de habitantes e o motorista dirá: “O senhor não é o Steven Strogatz, que investiga redes sociais e que descobriu que o mundo está ficando pequeno mais rapidamente do que imaginávamos?”. Isso, é claro, se você for de fato o Steven Strogatz. Mas, de certo modo, se você é o motorista que se relaciona (ou que se relaciona com quem se relaciona, ou que se relaciona com quem se relaciona com quem se relaciona) com Steven Strogatz, sobretudo se ele (ou quem se relaciona com ele) está na sua timeline e você (ou quem se relaciona com você) na dele, você será um pouco Steven Strogatz (na medida inversa do seu grau de separação dele): eis o ponto! Tal mudança vai muito além do que imaginávamos porque você está fazendo parte de um organismo capaz de inteligência e, quem sabe, de outros atributos ou qualidades que sequer conseguimos imaginar. Os Highly Connected Worlds tendem a ser organismos humanos coletivos. Atenção: superorganismos humanos, não organismos super-humanos! Eles são os campos para o nascimento do ‘indivíduo social’. Steven Strogatz fará parte de você e você fará parte dele porque ambos farão parte de um mesmo organismo, não em termos metafóricos, como quando usávamos a palavra ‘organismo’ para designar o que imaginávamos que fosse ‘a sociedade’. Não. Trata-se de um organismo mesmo. E humano. O indivíduo social está nascendo agora. Mas ele já estava presente, como prefiguração, desde o início, quando se constituíram os primeiros seres humanos. Para lembrar a bela Canción Tonta de García Lorca (1924), nós, os humanos, só o éramos enquanto estávamos “bordados en la almohada” da rede-mãe (1). O indivíduo-social não pôde se consumar como humanidade enquanto algo estava impedindo: a escassez de conexões, uma escassez artificialmente introduzida por modos de regulação não-pluriárquicos. Fluzz não podia passar. Mas fluzz é empowerfulness. Se fluzz não pode soprar o corpo não se vivifica. Essa mudança, todavia, é diferente – e única – em cada mundo. Não, não é sempre a mesma coisa. Depende de “onde” (ou como) o fluxo (o)corre. Manoel de Barros (1993) inventou “que um rio que flui entre dois jacintos carrega mais ternura que um rio que flui entre dois lagartos” (2). Pois é. No 2
  • 3. limite, você fará seu mundo. Quer dizer, você (ou você e sua timeline – o que tende a ser a mesma coisa) será o mundo e os mundos serão tantos quanto as identidades coletivas que forem usinadas por fluzz. Isso significa que os Highly Connected Worlds tendem a ser inumeráveis, assim como serão inumeráveis os interworlds, miríades de interfaces conectando miríades de mundos e “explodindo como uma ramada de neurônios”, para lembrar um artigo seminal de Pierre Lèvy (1998) (3). Em termos tecnológico-sociais, o grande desafio hoje, ao contrário do que reza a metafísica que esse Mark Zuckerberg – o chefe do Facebook – quer nos empulhar – para torná-la, a sua plataforma proprietária única, a própria rede e não mais uma ferramenta –, é construir os inumeráveis interworlds que serão as novas internets. O Facebook tem mais de 500 milhões de usuários? É ruim. Seria melhor ter 500 mil plataformas com mil usuários cada uma, conversando entre si... Tudo que não precisamos agora é reeditar a ilusão hierárquica de um mundo único. Uma sociedade em rede é uma configuração de miríades de Highly Connected Worlds interagentes. Essa é a única mudança verdadeiramente sustentável: tudo que é sustentável tem o padrão de rede porque rede é redundância de processos e abundância (diversidade) de caminhos. A mudança-que-é-a-rede é fractal, não unitária. A mudança não é a emergência de muitos mundos locais (que, de resto, sempre existiram), mas os múltiplos caminhos (que não puderam existir nas civilizações hierárquicas) entre o local e o global. E ela não se consumará sem essas “zonas de transição” que são interworlds. 3
  • 4. Notas (1) Cf. LORCA, Frederico Garcia (1924). “Canción Tonta” in Canciones (Obras Completas I). Madrid: Aguilar, 1978. (2) BARROS, Manoel (1993). Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2010. (3) LÉVY, Pierre (1998). “Uma ramada de neurônios” in Folha de São Paulo: 15/11/1998. Cf. ainda Caderno Mais da Folha de S. Paulo: 15/11/2002 (p. 5-3). O texto está disponível em: <http://escoladeredes.ning.com/profiles/blogs/uma-ramada-de-neuronios> 4