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Introdução
                       Da série Pílulas Democráticas

                    APRENDER DEMOCRACIA
                 É DESAPRENDER AUTOCRACIA


                            Augusto de Franco




Excertos do original sem-revisão do livro Alfabetização Democrática (Curitiba: Rede de
Participação Política: 2007) republicados em 2010.




No sentido “forte” do conceito, a democracia não é um regime
determinado, não é um modelo aplicável a várias circunstâncias, mas um
movimento ou uma atitude constante de desconstituição de autocracia

Não é possível conceituar democracia sem conceituar autocracia. E não é
possível falar da autocracia sem falar da guerra. Como dizia a letra de uma


                                           1
antiga canção alemã, em uma frase que chegaria a ser cômica se não fosse
trágica: “contra os democratas, somente os soldados ajudam”.

Em virtude de uma conjunção particularíssima – provavelmente fortuita –
de variados fatores, sociedades humanas na Antiguidade lograram abrir
uma brecha na cultura autocrática (patriarcal, hierárquica e guerreira),
ensaiando pactos de convivência estabelecidos em redes de conversações
entre iguais, que aceitavam a legitimidade do outro e valorizavam sua
opinião e não apenas o seu conhecimento técnico ou o seu saber
científico ou filosófico. Registros históricos apontam que isso aconteceu
em cidades gregas, entre os anos 509 e 322 antes da Era Comum, mas não
é improvável que tenha ocorrido também, de modo mais fugaz, em outras
ocasiões e lugares (o relato profético da chamada Assembléia de Siquém,
ocorrida na Palestina entre os séculos 12 e 11 (?) talvez constitua um
indício importante nesse sentido). Assim surgiu a democracia como uma
experiência de conversação em um espaço público, quer dizer, não
privatizado pelo autocrata.

Do ponto de vista dos sistemas autocráticos, amplamente predominantes,
a democracia – para usar uma expressão de Saint-Exupery, empregada em
outro contexto (no livro “Correio Sul”) – foi “um erro no cálculo, uma falha
na armadura...” devidamente corrigida nos dois mil anos seguintes à
experiência dos gregos. Quando os modernos tentaram reinventá-la, só
então se pôde perceber toda a força da tradição autocrática. Nos dois
séculos posteriores às ousadias teóricas de Althusius (1603), Spinoza
(1670) e Rousseau (1762) – que lançaram os fundamentos para a
reinvenção da democracia pelos modernos: a idéia de política como vida
simbiótica da comunidade, a idéia de liberdade como sentido da política e
a idéia de democracia como regime político capaz de materializar o ideal
de liberdade como autonomia –, os pensadores políticos posicionaram-se,
em sua imensa maioria, francamente contra a democracia. O juízo de
Burke (1790), segundo o qual “a democracia é a coisa mais vergonhosa do
mundo”, é emblemático desse ânimo autocratizante que vigorou nos dois
milênios anteriores à época em que reinventamos a democracia.


                                     2
Quando, afinal, a democracia começou a ser reensaiada para valer pelos
modernos, a política tornou-se palco de uma tensão permanente entre
tendências de autocratização e de democratização da democracia.

Nada indica que essa tensão tenha desaparecido na contemporaneidade.
Ainda que este seja um esquema explicativo, pode-se escrever a história
da democracia como a história de um confronto, em que, de um lado,
remanesciam as atitudes míticas, sacerdotais e hierárquicas que
mantinham a tradicionalidade e, de outro, surgiam atitudes utópicas,
proféticas e autônomas que fundaram a modernidade.

A brecha democrática não foi aberta de uma só vez. Ela foi aberta e
fechada várias vezes. E continua, nos últimos dois séculos, sendo alargada
e estreitada de modo intermitente. Desse ponto de vista, o que
chamamos de democratização nada mais é do que o processo de
alargamento dessa brecha.

Muito antes dos gregos, o principal movimento autocratizante foi a
guerra. A guerra já era considerada pelos gregos como uma atividade não-
democrática (a rigor, para eles, era uma realidade apolítica, como
observou genialmente Hannah Arendt: c. 1950, em seus vários estudos
“Sobre o sentido da política”, publicados postumamente) (1). No plano
conceitual, guerra e democracia (ou política praticada ex parte populis)
são originalmente incompatíveis.

Depois dos gregos, a guerra foi o meio universal de acabar com a política
(democrática) ou de estreitar a brecha por ela aberta nos sistemas de
dominação. Guerra como modo de regular conflitos e de alterar a
morfologia e a dinâmica da rede social para se preparar para o conflito
externo (por meio do chamado “estado de guerra”, instalado
internamente) foi o meio pelo qual a tradicionalidade política pôde se
prorrogar, não apenas derrotando inimigos de modo violento, mas
também construindo continuamente tais inimigos com o intuito de
preservar uma morfologia e uma dinâmica social que, erigida em função


                                    3
da guerra, constituiu-se como um complexo cultural. Usando-se uma
metáfora contemporânea, trata-se de um programa (software) que foi
instalado na rede social e adquiriu capacidade de modificar essa rede
(hardware) para se auto-replicar.

A guerra sintetiza o contrário da democracia: nega-se a legitimidade do
outro, desvaloriza-se sua opinião – a ponto de não se permitir sequer o
seu proferimento – e abole-se totalmente os espaços (públicos) onde as
opiniões dos cidadãos possam interagir e se polinizar mutuamente (por
meio da conversação na praça, i. e., no espaço público).

Guerra, por sua própria natureza, impõe mitificação da história,
sacerdotalização do saber e hierarquização das relações sociais. A visão da
história passa a ser orientada pela idéia de que existe um homo hostilis
(inerentemente competitivo) condenado a lutar eternamente para fazer
prevalecer seus interesses (egotistas) sobre os dos demais. A visão do
saber passa a ser orientada pela idéia de que o progresso humano é
conseqüência do avanço tecnológico de um homo faber (fabricante de
ferramentas, que logo serão usadas como armas); e daí a mitificação do
conhecimento técnico, entronizado como critério meritocrático
(sacerdotal porquanto baseado no segredo que introduz opacidade nos
procedimentos e organizado em graus de ordenação, quer dizer, de
capacidade de reproduzir uma determinada ordem). A visão do poder
passa a ser orientada pela idéia de que existem formas de organização
social que seriam “naturais” ou inevitáveis para o estabelecimento
daquele controle social sem o qual a sociedade seria destruída por seus
inimigos externos ou por seus próprios integrantes (na base da bellum
omnium contra omnes estão as idéias de ordem top down, piramidal,
como controle centralizado ou multicentralizado, de fluxo comando-
execução, de disciplina e obediência, enfim, de poder como capacidade de
mandar alguém fazer alguma coisa contra sua vontade). Tudo isso passa a
valer não apenas como repertório de expedientes e providências para
destruir o inimigo externo (ou para não ser por ele destruído), mas
também como norma para reger a vida interna das sociedades, mesmo


                                    4
em tempos de paz (tempos esses que devem ser dedicados à preparação
para a guerra, na linha do “se queres a paz, prepara-te para a guerra”, o
que deixa claro que a guerra é promovida à condição de uma realidade
inexorável ou onipresente). Neste parágrafo talvez estejam reunidos todos
os elementos para uma conceituação da autocracia e, inversamente, da
democracia.

Todavia, é óbvio que por força de suas conseqüências humanas, sociais e
ambientais desastrosas, a guerra não pode ser bem-vista pelos cidadãos.
Sem a guerra como instituição, porém, não há como manter as estruturas
verticais de poder e as normas autocratizantes que a acompanham.
Ademais, com a expansão da democratização, as guerras tendem a se
reduzir; por exemplo, nações democráticas não costumam guerrear entre
si. Essa é a principal contradição que vive a autocracia, visto que ela não
pode subsistir sem a guerra.

Na ausência de guerra, o processo de autocratização seria logo suplantado
pelo processo de democratização. É por isso que, a partir da modernidade,
o ímpeto regressivo das tendências autocratizantes vem se manifestando
não somente na guerra, mas nas concepções e práticas políticas que
tomam a política como uma espécie de ‘continuação da guerra por outros
meios’.

É assim que, na época atual, o grande problema para a política
democrática não é prioritariamente a guerra – conquanto ela continue
sendo promovida por quistos autocráticos instalados em países
democráticos contra países não-democráticos, por países não-
democráticos contra países democráticos e por países não-democráticos
entre si – mas o exercício da política como “arte da guerra” (essa sim,
praticada universalmente como realpolitik).




                                    5
O que se escreveu sobre a democracia

Do ponto de vista do conceito de democracia apresentado acima, é
surpreendente o fato de termos tão pouca reflexão acumulada. É claro
que mais surpreendente ainda é o fato de, depois da experiência dos
gregos, a democracia ter retrocedido, não avançado. E que isso tenha
ocorrido tanto na prática quanto na teoria.

Sobre o tema há, por certo, muitas controvérsias. Alguns tentam
interpretar a República romana como uma versão (latina) da democracia
(grega) (2). Mas, ao que tudo indica, não se trata exatamente da mesma
coisa, visto que o sistema de governo com participação popular dos
romanos não reunia aqueles três atributos – de isonomia, isologia e
isegoria – que caracterizavam o funcionamento da comunidade
(koinomia) política de Atenas e de outras cidades gregas do período
democrático (509-322). Se encararmos a democracia, no seu sentido
“fraco”, apenas como sistema de governo (popular) – e não, em seu
sentido “forte”, como sistema de convivência ou modo de vida
comunitária que, por meio da política praticada ex parte populis, regula a
estrutura e a dinâmica de uma rede social – perceberemos que várias
outras experiências surgiram concomitante e posteriormente à
experiência dos gregos: Roma (do final do século 6 até meados do século
2), governos locais em cidades italianas (como Florença e Veneza, por
exemplo, do início do século 12 até meados do século 14), bem como
outras experiências endógenas de governo que admitiam alguma forma
de assembléia com participação mais ou menos popular (na Inglaterra, na
Escandinávia, nos Países Baixos, na Suiça e em outros pontos ao norte do
Mediterrâneo). De qualquer modo, foram experiências insuficientes
diante da tendência autocrática predominante. Na melhor das hipóteses,
considerando-se a República romana como uma espécie de democracia,
tivemos um interregno autocrático de mil anos (de 130 a. E. C. a 1.100).
Na pior hipótese – que, não por acaso, é a mais precisa e a que faz mais
sentido – esse intervalo foi de mais de dois mil anos (de 322 a. E. C. até o
século 18).

                                     6
Na teoria, ocorreu o mesmo. Além da falta de experiências suficientes de
democracia, tivemos a falta de reflexão teórica sobre o tema. Boa parte da
literatura política – inclusive a maior parte dos escritos sobre democracia
– foi fortemente influenciada por idéias autocráticas. Basta ver que, com
raras exceções, os mais conhecidos pensadores da política que surgiram
desde Platão (e Sócrates, tanto o platônico, quanto o xenofôntico),
passando pelos medievais e até pelos contemporâneos de Thomas
Hobbes e seus sucessores (nas sete ou oito gerações seguintes), eram
contrários à democracia.

Em uma lista inquestionável de duas dezenas de clássicos da política, do
século 5 antes da Era Comum ao final do século 16 (de Platão a Althusius)
não se encontra um só pensador democrático. Talvez com exceção,
parcial, de Aristóteles e do próprio Althusius – posto que não militavam
especialmente contra democracia – a totalidade desses pensadores era
autocrática.

Quando Spinoza afirmou (em 1670) – contrariando Hobbes – que o fim da
política não era a ordem e sim a liberdade, não se fez a luz. Assim como os
antecessores de Spinoza (nos dois milênios anteriores) foram contrários à
democracia de alguma forma, seus sucessores (nos dois séculos seguintes)
quando não se posicionaram abertamente contra a democracia, puseram-
se a relê-la de uma forma que acabou esvaziando o seu conteúdo. Até a
segunda metade do século 18 não houve nenhuma leitura decente da
democracia grega que tivesse resgatado ou preservado seus pressupostos
fundamentais (o seu “gene” ou meme) do ponto de vista do conceito
exposto na seção anterior desta Introdução. Na verdade, de Althusius
(1603) a Stuart Mill (1861) não conhecemos muito mais que meia dúzia de
pensadores políticos que tivesse, desse ponto de vista, contribuído
decisivamente para recuperar e reinterpretar, à luz das condições da
modernidade, os elementos fundamentais da democracia dos antigos (a
liberdade, a igualdade de proferimento e a valorização da opinião e o
exercício da conversação no espaço público).



                                    7
Entre os clássicos da política, do século 6 antes da Era Comum até a
metade do século 20, quer dizer, dos democratas atenienses até Hannah
Arendt, não temos, por incrível que pareça, muitas reflexões sobre a
democracia (no sentido “forte” do conceito). Embora se possa situar o
surgimento da democracia no final do século 6, a partir da reforma de
Clístenes (509), os escritos sobre a democracia só vão aparecer realmente
no século 5. Ésquilo, em “Os Persas” (472), afirma a liberdade dos
atenienses (oposta à servidão daqueles que têm um senhor). Mas é com
Eurípedes, em “As Suplicantes” (422), que surge, pela primeira vez, um
conceito mais acabado de democracia (tomando como modelo Atenas,
com a descrição de alguns de seus mecanismos, como a assembléia
democrática, por exemplo).



Educação para a democracia

Nossas lideranças políticas, nossos empreendedores – inclusive os da área
social – e, por incrível que pareça, nossos inovadores em todos os campos,
até mesmo os que se dedicam ao tema emergente das redes sociais, não
têm formação democrática. Não estou falando dos que ficam na
retaguarda, cumprindo funções burocráticas, mas sim dos que estão na
ponta da inovação, daqueles que estão descobrindo, criando e
experimentando novas maneiras de pensar e de fazer as coisas. A situação
é mais grave do que parece, pois que a maioria desses pioneiros e
desbravadores de caminhos não tem, já não se diria formação, mas, nem
mesmo, alfabetização democrática. Repetimos, assim, em nossas
organizações, quase sempre inconscientemente, a tradição autocrática em
tudo o que diz respeito aos padrões de pensamento, ação e de interação
com o mundo à nossa volta.

Provavelmente isso ocorre porque não temos propriamente uma tradição
democrática. A democracia como regime político ou forma de
administração do Estado foi experimentada, até agora, apenas em
algumas localidades e somente em 7% da nossa história (durante 96

                                    8
minutos, se tomarmos como referência a escala de 24 horas para 6
milênios de experiência civilizacional). De experimentação democrática
foram, na verdade, pouco menos de duzentos anos na antiguidade (509-
322 a. E. C.) e outros duzentos anos na época moderna. Mesmo assim, em
meados do século 19, do total de 37 países, apenas 1 (um) podia ser
considerado como democrático. E há pouco mais de dez anos, quase 70%
de 192 nações do globo ainda não podiam ser consideradas como
democráticas (tomando-se como critério o pleno sufrágio).

Ora, se não há propriamente uma tradição democrática significativa, por
que então não construímos uma? Todas as tradições não se constroem, (é
claro – e até por definição –) ex post, projetando linhas imaginárias de
continuidade, da frente para trás? Todavia, seria possível construir uma
tradição do pensamento democrático? A rigor, talvez não. Mas, se fosse
possível, a linha imaginária de continuidade do pensamento democrático
seria mais ou menos assim:

1) Péricles (e seu think tank ateniense, Protágoras, Aspásia etc.: 449-> 429
a. E. C.)

2) Althusius (1603)

3) Spinoza (1670 -> 1677)

4) Rousseau (1754 -> 1762)

5) Jefferson (e o network da Filadélfia: 1776)

6) "Públius" (os “federalistas” Hamilton, Jay e Madison: 1787 -> 1788)

7) Paine (1791)

8) Tocqueville (1835 -> 1856)



                                      9
9) Thoreau (1849)

10) Mill (1859 -> 1861)

11) Dewey (1927 -> 1939)

12) Arendt (1950 -> 1963)

E depois? Bem, depois vêm os modernos, que são muitos, mas na lista dos
quais não se pode esquecer de Lefort (1981), de Castoriadis (1986), de
Maturana (1985->1993), de Putnam (1993), de Rawls (1993), de Levy
(1994), de Sen (1994->1999)... E, depois ainda, os pluriarquistas e
glocalistas contemporâneos (3). Mas não os deliberacionistas e
participacionistas típicos do século 20, que curiosamente remanescem
neste início do século 21 (4).

Que linha de continuidade seria essa, sugerida pela lista acima? Seria a
linha originária (ou que recupera o genos da democracia): a democracia
não como um regime determinado, mas como um movimento constante
de desconstituição de autocracia. Em outros termos, a democracia como o
contrário da guerra (e da política como continuação da guerra por outros
meios).

Não se pode esquecer que as instituições e os procedimentos
democráticos surgiram propositalmente – na Grécia de Clístenes, Efialtes e
Péricles – para evitar a volta da tirania dos Psistrátidas. Ou seja, quando
surge, a democracia já surge como movimento de desconstituição de
autocracia. Surge como exercício de conversação na praça, quer dizer,
como publicização dos assuntos comuns que haviam sido privatizados
pelo autocrata (surge, assim, coetaneamente com a emersão de uma
esfera pública). Esse é o seu genos. Por isso convém trabalhar com a
"teoria da brecha", sugerida por Maturana: a democracia como uma
brecha que foi aberta (e que, intermitentemente, é aberta e fechada) nos
sistemas de convivência patriarcais e guerreiros da civilização dos


                                    10
predadores. A democracia como uma janela para o simbionte poder
respirar (e aqui vale a pena ver Althusius e sua idéia de simbiose) (5).

Esse roteiro de formação – na verdade, um itinerário de leituras – deveria
fazer parte da educação para a democracia de qualquer pessoa ou de
qualquer comunidade de prática, de aprendizagem e de projeto.

É claro que um programa como esse só pode ser seguido por quem já
adquiriu a condição de autodidata.

Antes disso, nas redes familiares, nas redes comunitárias e nas hierarquias
escolares básicas (a escola fundamental nos seus primeiros anos), a
criança e o jovem deveriam ser introduzidos à democracia por meio de
leituras mais amenas: começando pelo estudo da vida de Péricles e dos
seus relacionamentos e das demais tentativas de experimentação de
processos democráticos ao longo da história. Um bom itinerário aqui seria
estudar as formas de interação política dos cidadãos na Roma dos séculos
6 a 2 antes da Era Comum, nos governos locais de Florença e Veneza dos
séculos 12 a 14 e, em especial, nas assembléias populares européias – na
Inglaterra, na Escandinávia, nos Países Baixos, na Suiça e em outros
pontos ao norte do Mediterrâneo e na Península Ibérica – passando
depois pelas primeiras constituições de governos representativos, pela
Revolução Francesa e seus rebatimentos em todo o mundo ocidental, com
destaque especial para Jefferson e o processo de independência dos
Estados Unidos, para os “federalistas” e para Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão (de 1789). Depois então viria a democracia
realmente existente dos modernos e contemporâneos.

Tudo isso, todavia, não bastaria. No nível fundamental, a educação para a
democracia deveria compreender, além de leituras e debates, jogos e
exercícios de interação democrática e, sobretudo, o engajamento em
atividades comunitárias voluntárias. Na verdade, a educação para a
democracia e a educação para o desenvolvimento (e para o
desenvolvimento local) deveriam vir juntas, como dois aspectos da


                                    11
educação para a sustentabilidade, aos quais deveria se somar a educação
ambiental propriamente dita.



Um itinerário de 40 textos básicos (até o século 20)

A) Sobre a democracia dos gregos

A maior parte da literatura da época antiga disponível, ou é contrária à
democracia (Platão), ou não é grande entusiasta do regime de Péricles
(Aristóteles). Essas duas abordagens, infelizmente, sulcaram o caminho
por onde escorreram quase todas as versões posteriores, que raramente
deram conta de captar o meme democrático original.

Na ausência de qualquer texto autoral de Péricles, é necessário estudar a
sua vida. As fontes são pouquíssimas: “A guerra dos peloponesos” de
Tucídides, a “Vida de Péricles” (nas “Vidas paralelas”) de Plutarco, além, é
claro de “A constituição de Atenas” de Aristóteles (ou a ele atribuída). Dos
antigos, temos ainda apenas algumas referências feitas pelos poetas
cômicos, “A República dos atenienses” (atribuída a Xenofonte ou a um
suposto “Velho Oligarca”) – que não faz referência a Péricles, mas
contradiz o relato de Tucidides na célebre “Oração Fúnebre” que teria sido
pronunciada por Péricles ao final do primeiro ano da Guerra do
Peloponeso – e as “Memoráveis” (sobre os ditos e feitos memoráveis de
Sócrates) de Xenofonte.

De qualquer modo não se pode deixar de ler:

422 Eurípedes: “As Suplicantes”

420? Tucídides: “História da Guerra dos Peloponesos e Atenienses”

400-347 [entre] Platão: “A República”


                                    12
400-347 [entre] Platão: “O Político”

400-347 [entre] Platão: “As Leis”

350-322 [entre] Aristóteles: “A Política”

322? Aristóteles (atribuída): “A Constituição de Atenas”

B) As bases teóricas da reinvenção da democracia pelos
modernos

Depois de longo interregno, Althusius, Spinoza e Rousseau lançaram os
fundamentos para a reinvenção da democracia pelos modernos: a idéia de
política como vida simbiótica da comunidade, a idéia de liberdade como
sentido da política e a idéia de democracia como regime político capaz de
materializar o ideal de liberdade como autonomia. Não se pode, portanto,
deixar de ler:

1603 Althusius: “Política”

1670 Spinoza: “Tratado Teológico-Político”

1677 Spinoza: “Tratado Político”

1754 Rousseau: “Discurso sobre a origem da desigualdade dos homens”

1762 Rousseau: “O contrato social”




                                       13
C) A experimentação moderna de um pensamento realmente
democrático

Sob forte influência de certo pensamento inovador francês, as idéias
democráticas germinaram e se materializaram, todavia, na América. Sobre
essa experimentação não se pode deixar de ler:

1776 Thomas Jefferson et allia: “Declaração de Independência dos Estados
Unidos da América”

1787-1788 “Publios” (Alexander Hamilton, John Jay e James Madison): “O
Federalista” (em especial Madison (1987) em um comentário sobre a
Constituição dos Estados Unidos)

1789 “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”

1791 Thomas Paine: “Direitos do Homem”

1835 Tocqueville: “A Democracia na América”

1849 Thoreau: “Desobediência Civil”

1856 Tocqueville: “O Antigo Regime e a Revolução”

1859 Stuart Mill: “Sobre a Liberdade”

1861 Stuart Mill: “Sobre o Governo Representativo”

D) Dois esforços bem-sucedidos de identificação de aspectos do
genos (ou do meme original) democrático

John Dewey e Hannah Arendt conseguiram identificar o que havia de
original na idéia de democracia: a democracia como modo-de-vida


                                    14
comunitária, essencialmente cooperativo, local, na base da sociedade o no
cotidiano do cidadão e a democracia como sentido da política (ou como a
política propriamente dita). Cabe ler suas principais obras sobre o tema;
pelo menos:

1927 Dewey: “O Público e seus problemas”

1929 Dewey: “Velho e novo individualismo”

1935 Dewey: “Liberalismo e ação social”

1937 Dewey: “A democracia é radical”

1939 Dewey: “Democracia criativa: a tarefa que temos pela frente”

1950 (c.) Hannah Arendt: “O que é a política?”

1951 Hannah Arendt: “As origens do totalitarismo”

1954 Hannah Arendt: “Que é liberdade”

1958 Hannah Arendt: “A condição humana”

1963 Hannah Arendt: “Sobre a revolução”

E) Interpretações e visões democráticas modernas

Restaram-nos as interpretações modernas, que repõem, em parte, o
sentido original da democracia, como, entre outras, a de Claude Lefort e a
de Cornelius Castoriadis, ou que reiventaram tal sentido, como a de
Humberto Maturana. Cabe ler, um pouco mais do que isso:

1981 Lefort: “A invenção democrática: os limites da dominação totalitária”



                                    15
1986 Cornelius Castoriadis: “Sobre ‘O Político’ de Platão” (edição póstuma
(1999) de seminários realizados em 1986)

1988 Humberto Maturana: “Lenguaje, emociones y ética en el quehacer
político”

1993 (?) Humberto Maturana: “La democracia es una obra de arte” (s. /d).

1993 Humberto Maturana: “Amor y Juego: fundamentos olvidados de lo
humano – desde el Patriarcado a la Democracia” (com Gerda Verden-
Zöller)

1993 John Rawls: “O liberalismo político”

1993 Robert Putnam: “Making Democracy Works”

1994 Levy: “A inteligência coletiva”

1998 I. F. Stone: “O julgamento de Sócrates”

1999 Amartya Sen: “Democracia como um valor universal”

1999 Amartya Sen: “Desenvolvimento como liberdade”

É claro que uma lista mais completa de obras políticas que têm a ver com
a democracia (ou com a sua negação) seria bem maior (6), mas – dado o
quadro de analfabetismo atual – talvez seja pedir demais que se leve em
consideração o repositório completo do que se escreveu, nos séculos
passados, sobre a democracia (inclusive pelo avesso).

O itinerário das 40 leituras listadas acima deveria ser parte de qualquer
currículo de educação para a democracia – disciplina que deveria ser
obrigatória nas escolas e universidades, mas não é e tudo indica que não



                                       16
será. Cabe-nos, portanto, propagandeá-lo como um novo programa
autodidático (7).



Um curso autodidático de política democrática

Para quem está interessado na política democrática, imagino que seja
melhor fazer um esforço autodidático para ler as obras fundamentais do
que se matricular em um curso superior de política e ficar assistindo aulas
de professores que reproduzem as modas da época, indicam bibliografias
(em geral fotocópias de partes de textos clássicos, resenhas e análises que
interessam mais aos trabalhos acadêmicos que eles estão fazendo no
momento do que ao aluno) e que, via de regra, não leram, eles próprios, a
maioria dos textos básicos.

Sim, é necessário ler pelo menos uma parte dos textos básicos: alguns
clássicos, com certeza, mas também alguma coisa contemporânea. A lista
completa pode chegar a uns 200 textos (mas não ultrapassará esse
número). Digerir tudo isso é meio impraticável, sobretudo se
considerarmos que não basta ler os textos. O estudante deve procurar se
informar sobre o autor e sobre as circunstâncias em que produziu sua
obra. Deve ler um ou dois artigos de especialistas contextualizando a obra.
E não pode trocar a leitura dos textos (fontes) pela leitura do que
disseram sobre esses textos. Ao contrário do que se pratica nas
academias, é preciso que o estudante vá primeiro beber direto na fonte
para depois fazer o que quiser (ou puder).

Aulas não servem para muita coisa. Se houver um grupo de meia dúzia a
uma dúzia de estudantes interessados e esse grupo puder organizar um
seminário de dez em dez dias sobre cada um dos textos, será o ideal.
Leitura individual (2 a 3 horas por dia), três discussões (de 6 horas cada,
por mês) e pronto. Ou quase.




                                    17
Por último, é bom que o estudante escreva um pequeno artigo (de, no
máximo, uns 5 mil caracteres, pois a capacidade de produzir uma síntese é
um dos indicadores de compreensão) sobre o texto que leu. Não é para
resumir, resenhar, “fichar” ou copiar (ou repetir com outras palavras) o
que disseram o autor ou seus comentadores e críticos. É para descobrir
coisas novas, formar uma opinião própria que tente acrescentar alguma
coisa ao que já foi dito.

A rigor nenhum conhecimento pode ser transferido. O conhecimento é
sempre criado e recriado ou reconstruído; de certo modo, inventado.
Quem não inventa nada, não aprende nada.

Considerando nosso analfabetismo democrático, seria recomendável
começar pelo itinerário proposto acima, que compõe aquela linha
imaginária que tenta recuperar a idéia de democracia (no sentido em que
John Dewey falava da “democracia como idéia”). A partir daí o estudante,
certamente, saberá o que fazer.

A “prova” final de um curso autodidático como esse é escrever alguma
coisa original, inventada. Inventada, sim: não acredite nos que vão dizer
que isso é “assim” ou não pode ser “assado”. Produza, publique sem pedir
autorização a ninguém e depois arque com as conseqüências expondo-se
a crítica.

A árvore se conhece pelos frutos. Não é necessário um fiscal para dizer se
o fruto é bom ou ruim segundo suas concepções e seus gostos. Se as
pessoas puderem chegar até a árvore, colher os frutos e experimentá-los,
saberão se vale a pena comê-los até o fim. Ponto.



Aprender democracia é desaprender autocracia

No entanto, não basta conhecer as reflexões teóricas sobre as diversas
experiências de democracia e as teorias normativas inspiradas por tais

                                    18
reflexões. A democracia não é um regime determinado, não é um modelo
aplicável a várias circunstâncias, mas um movimento ou uma atitude
constante de desconstituição de autocracia. Assim, segundo o conceito
(“forte”) de democracia apresentado por tal itinerário de leituras,
aprender democracia é desaprender autocracia.

Uma das posturas mais importantes na formação de lideranças para o
exercício da política democrática é aprender a perceber os sinais da
mentalidade e das práticas autoritárias e os sintomas dos processos de
autocratização da política. Não se trata apenas de conhecer as teorias e o
que disseram os clássicos da chamada ciência política sobre o assunto.
Trata-se da capacidade de identificar padrões, o que faz parte daqueles
conhecimentos tácitos da “arte” da política que devem ser adquiridos pela
observação atenta da própria experiência e das experiências alheias.

Pequeno ou grande, o poder autoritário se comporta sempre de maneira
semelhante. Não importa se o agente não convencido do valor da
democracia está dirigindo uma pequena ONG de bairro, um partido ou um
governo. Há um padrão de comportamento que se faz presente em todas
as práticas antidemocráticas e que se revela como poder de obstruir,
separar e excluir. Nos casos mais exacerbados, o poder exercido de tal
maneira pode perseguir, prender, torturar e matar, só não o fazendo, em
muitas situações, em virtude da falta de condições para tanto.

Um processo de formação política democrática deveria contemplar o
estudo cuidadoso desse “padrão Darth Vader” (para usar a excelente
metáfora da série “Star Wars”, de George Lucas). Nesse sentido, pode-se
aprender muito lendo, por exemplo, Ryszard Kapuscinski: “Cesarz” (1978),
que foi publicado no Brasil sob o título “O Imperador: a queda de um
autocrata”. Por meio de uma narrativa impressionante, baseada em
entrevistas feitas pelo autor – o jornalista polonês Kapuscinski – com
antigos colaboradores de Hailé Selassié I, ele descreve os bastidores do
palácio do tirano que governou a Etiópia por 44 anos (8). Ou com Simon
Sebag Montefiore: “Stálin: a corte do czar vermelho” (2003), também


                                    19
baseado em entrevistas feitas pelo jornalista Montefiore com os
sobreviventes e os descendentes da era stalinista e em pesquisas em
cartas e outros documentos que só recentemente foram liberados, o livro
descreve a intimidade do poder despótico que até há pouco era meio
desconhecida, revelando a sua face brutal (9). Ou, ainda, com Jung Chang
e Jon Halliday: “Mao: a história desconhecida” (2005), no qual Chang (já
conhecida pelo seu excelente “Cisnes selvagens”) e seu marido Halliday,
empreenderam uma pesquisa monumental para descrever a outra face da
vida de Mao Tse-Tung, que – segundo a palavra dos autores – “durante
décadas deteve o poder absoluto sobre a vida de um quarto da população
mundial e foi responsável por bem mais de 70 milhões de mortes em
tempos de paz, mais do que qualquer outro líder do século 20” (10). Este
último é, de todos, o livro mais impressionante que talvez já tenha sido
escrito sobre as conseqüências maléficas da direção do Estado nas mãos
de um líder determinado a conquistar e a manter o poder a qualquer
custo (11).

Pode-se dizer que as tragédias desses regimes comandados por Selassié,
Stálin e Mao são coisas muito distantes da situação em que vivem os
países democráticos atuais. Mas as coisas não são bem assim. O “padrão
Darth Vader” que se manifestou em alto grau no comportamento desses
três autocratas pode também estar presente em outros líderes, pequenos
ou grandes, muitas vezes não conseguindo se desenvolver em virtude de
circunstâncias ambientais ou institucionais adversas. Tais circunstâncias,
que decorrem de configurações sociais coletivas, quando são favoráveis à
ereção de sistemas de dominação tendem a reforçar e a retroalimentar
atitudes míticas diante da história, sacerdotais diante do saber,
hierárquicas diante do poder e autocráticas diante da política. Toda vez
que a rede social é obstruída, toda vez que se introduzem centralizações
na teia de conexões ou de caminhos que ligam os nodos dessa rede
distribuída, gera-se uma configuração mais favorável ao crescimento e a
manifestação desse poder vertical que está no “DNA” da civilização
patriarcal e guerreira. A democracia, como percebeu Humberto Maturana
(1993), é uma brecha nesse paradigma civilizatório (12).


                                    20
Compreendendo o que pode florescer em ambientes sociais fortemente
centralizados e nos quais os modos de regulação de conflitos não são
democráticos, podemos perceber os sinais e interpretar os sintomas do
processo de autocratização da política onde quer que eles surjam,
inclusive no interior de regimes formalmente democráticos. Pode-se,
inclusive, aprender a detectar as tentativas contemporâneas de
autocratização da democracia, baseadas no uso instrumental da
democracia no sentido “fraco” do conceito (quer dizer, na utilização de
alguns dos mecanismos, instituições e procedimentos da democracia
representativa, como o sistema eleitoral), para enfrear o processo de
democratização das sociedades, seja pela via da protoditadura (que se
caracteriza, fundamentalmente, pela abolição legal ou de facto da
rotatividade democrática), seja pelo emprego da manipulação em larga
escala, como ocorre nas novas vertentes do populismo que vêm sempre
acompanhadas do banditismo de Estado, da corrupção de Estado, da
perversão da política e da degeneração das instituições por meio da
privatização partidária da esfera pública e do aparelhamento da
administração governamental (13).

De qualquer modo, para conhecer o poder vertical – a sua “anatomia” e a
sua “fisiologia”, vamos dizer assim – devemos estudá-lo em estado puro
(ou quase), como ocorreu na Etiópia de Selassié, na União Soviética de
Stálin e na China de Mao. Depois será mais fácil perceber seus indícios em
nosso cotidiano, inclusive quando surgem em uma pequena organização
(14).




                                    21
Notas e referências

(1) Arendt, Hannah (c. 1950). O que é política? (Frags. das “Obras Póstumas” (1992),
compilados por Ursula Ludz). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.

(2) Cf. Dahl, Robert (1998). Sobre a democracia. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 2001.

(3) Isso não deixa de ser um problema na medida em que boa parte dos críticos não-
autocráticos da democracia representativa, que lhe apontam corretamente as
insuficiências e mazelas, procurando superá-las com a adoção de novas formas de
convivência e interação baseadas na abundância dos meios de comunicação
disponíveis em uma sociedade-rede (como os pluriarquistas digitais, por exemplo) não
conseguiu formar um conceito de esfera pública e, para falar a verdade, não conseguiu
sequer vivenciar, em suas experiências comunitárias inovadoras, uma cultura
democrática.

(4) Quase todo pensamento contemporâneo ligado à radicalização da democracia (um
conceito originalmente deweyano, deformado ou pervertido pelo pensamento
marxista, nas suas vertentes leninistas ou gramscianas) e à chamada democracia
deliberativa ou à democracia participativa, representa a negação da “tradição”
democrática como pazeamento (quer dizer, aquela que toma a política como o
contrário da guerra, como percebeu Arendt). A chamada “esquerda democrática” é
composta, em sua maioria, por novos defensores da política como uma continuação da
guerra por outros meios: a fórmula inversa de Clausewitz-Lenin (quer dizer, nos termos
que Arendt julgou ser o dos democratas gregos, da não-política). São, assim, até certo
ponto paradoxalmente, os novos teóricos da autocracia (não da democracia) que a
compõem.

(5) Há uma mistura (um deslizamento epistemológico, se quisermos) entre conceitos
com stati diferentes nos discursos que tentam captar e comparar diversos meanings
da democracia. Aqui tentei resolver esse problema falando de dois sentidos do
conceito de democracia: um "forte" (deweyano) e um "fraco" (dos que tomam a
democracia como forma de administração política do Estado). É, mutatis mutandis, a
mesma diferença entre as visões de soberania de Althusius e Bodin; ou, entre as visões
do sentido da política de Hobbes e de Spinoza. Da visão hobbesiana (ainda
francamente hegemônica, no pensamento político e, sobretudo, naquilo que foi
chamado de Economics) decorre necessariamente uma visão de governo (controle) e
não de liberdade (como em Arendt).


                                         22
(6) Eis uma lista mais completa – até o final do século 20 – contendo cerca de 160
textos (incluindo pontos de vista autocráticos e democráticos sobre a política):

604 (c.) “Tao-te King” de Lao Tzu
500 (c.) Sun Tzu:“A Arte da Guerra”
490 Confúcio: “Os Analectos”
472 Ésquilo: “Os Persas”
422 Eurípedes: “As Suplicantes”
425 Tucídides: “História da Guerra dos Peloponesos e Atenienses”
427-347 Platão: “A República”
427-347 Platão: “O Político”
427-347 Platão: “As Leis”
383-322 Aristóteles: “A Política”
383-322 Aristóteles: “A Constituição de Atenas”
280-234 Han Fei Zi: “A Arte da Política (Os homens e a lei)”
106-43 Cícero: “Da República”
106-43 Cícero: “Das Leis”
106-43 Cícero: “Dos Deveres”
1225-1274 Tomás de Aquino: “Do Governo dos Príncipes”
1312 Dante Alighieri: “Da Monarquia”
1324 Marcílio de Pádua: “Defensor da paz”
1513 Maquiavel: “O Príncipe”
1516 Thomas Morus: “A Utopia”
1519 Maquiavel: “Discursos sobre a primeira década de Tito Livio”
1548 La Boétie: “Discurso da servidão voluntária”
1576 Francesco Guicciardini: “Recordações Políticas e Civis”
1576 Jean Bodin: “Os Seis Livros do Estado (ou da República)”
1589 Giovanni Botero: “A Razão de Estado”
1602 Tommaso Campanella: “A Cidade do Sol”
1603 Althusius: “Política”
1625 Grotius: “Direito da Guerra e da Paz”
1632-1639 (c.) Richelieu: “Testamento político”
1642 Hobbes: “Do Cidadão”
1647 Baltazar Gracián :“A Arte da Prudência”
1651 Hobbes: “Leviatã”
1670 Spinoza: “Tratado Teológico-Político”
1677 Spinoza: “Tratado Político”
1683 Cardeal Mazarin: “Breviário dos Políticos”
1688 Leibniz: “Elementos do Direito Natural”
1690 Locke: “Dois Tratados sobre o Governo”


                                         23
1716 François de Callières: “Como negociar com Príncipes”
1748 Hume: “Investigação sobre o Entendimento Humano”
1749 Montesquieu: “O Espírito das Leis”
1754 Rousseau: “Discurso sobre a origem da desigualdade dos homens”
1762 Rousseau: “O contrato social”
1764 Beccaria: “Dos Delitos e das Penas”
1776 Thomas Jefferson:“Declaração de Independência dos Estados Unidos da América”
1787-1788 “Publios” (Alexander Hamilton, John Jay e James Madison): “O Federalista”
(em especial Madison (1987) em um comentário sobre a Constituição dos Estados
Unidos)
1789 “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”
1789 Bentham: “Introdução aos princípios da moral e da legislação”
1789 Sieyès: “O que é o Terceiro Estado”
1790 Burke: “Reflexões sobre a Revolução Francesa”
1791 Thomas Paine: “Direitos do Homem”
1792 von Humbolt: “Ensaio sobre os limites da atividade do Estado”
1795 Kant: “A paz perpétua”
1797 Kant: “Metafísica dos Costumes”
1808 Ficht: “Discursos à Nação Alemã”
1815 Benjamin Constant: “Princípios da política”
1816 Bentham: “Sofismas Políticos”
1819 Benjamin Constant: “Discurso sobre a Liberdade dos Antigos Comparada com a
dos Modernos”
1821 Hegel: “Princípios de Filosofia do Direito”
1832 Carl von Clausewitz: “Da Guerra”
1835 Tocqueville: “A Democracia na América”
1840 Proudhon: “O que é a Propriedade”
1843 Marx: “A questão judaica”
1843 Marx: “Crítica da filosofia hegeliana do direito”
1849 Thoreau: “Desobediência Civil”
1856 Tocqueville: “O Antigo Regime e a Revolução”
1859 Stuart Mill: “Sobre a Liberdade”
1861 Stuart Mill: “Sobre o Governo Representativo”
1896 Mosca: “Elementos de Ciência Política”
1908 Sorel: “Reflexões sobre a Violência”
1909 Croce: “Filosofia da Prática”
1911 Michels: “Os partidos políticos: ensaios sobre as tendências oligárquicas das
democracias”
1916 Gentile: “Fundamentos da Filosofia do Direito”
1919 Pareto: “As Transformações da Democracia”


                                        24
1922 Weber: “Economia e Sociedade”
1927 Dewey: “O Público e seus Problemas”
1929 Dewey: “Velho e novo individualismo”
1932 Carl Schmitt: “O Conceito do Político”
1935 Dewey: “Liberalismo e ação social”
1937 Dewey: “A democracia é radical”
1937 Horkheimer: “Teoria tradicional e teoria crítica”
1939 Dewey: “Democracia criativa: a tarefa que temos pela frente”
1942 Horkheimer: “O Estado autoritário”
1942 Schumpeter: “Capitalismo, socialismo e democracia”
1944 Hayek: “O caminho da servidão”
1944 Polanyi: “A Grande Transformação”
1945 Kelsen: “Teoria geral do Direito e do Estado”
1947 Gramsci: “Cadernos do Cárcere”
1950 (c.) Hannah Arendt: “O que é a política?”
1951 Hannah Arendt: “As Origens do Totalitarismo”
1954 Hannah Arendt: “Que é liberdade”
1955 Sartori: “Os Fundamentos da Democracia”
1957 Jones: “Athenian Democracy”
1957 Sartori: “Democracia e definição”
1958 Hannah Arendt: “A condição humana”
1961 Jane Jacobs: “Morte e vida das grandes cidades”
1962 Aron: “Paz e guerra entre as nações”
1963 Hannah Arendt: “Sobre a revolução”
1965 Agard: “What Democracy Meant to the Greeks”
1965 Aron: “Democracia e totalitarismo”
1968 Christophersen: “The Meaning of “Democracy” as Used in European Ideologies
from the French to the Russian Revolution”
1969 Berlin: “Quatro ensaios sobre a liberdade”
1973 Macpherson: “Teoria democrática”
1974 Clastres: “A sociedade contra o Estado”
1977 Macpherson: “A democracia liberal e sua época”
1980 Gutman: “Liberal Equality”
1981 Lefort: “A invenção democrática: os limites da dominação totalitária”
1984 Barber: “Strong democracy: participatory politics for a New Age”
1984 Bobbio: “Ética e Política”
1984 Bobbio: “O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo”
1984 Robert Axelrod: “The evolution of cooperation”
1985 Bobbio: “Estado, governo, sociedade: para uma teoria geral da política”
1985 Burnheim: “Is democracy possible? The alternative to electoral politics”


                                      25
1985 Przeworski: “Capitalismo e social democracia”
1986 Cornelius Castoriadis: “Sobre ‘O Político’ de Platão” (edição póstuma (1999) de
seminários realizados em 1986)
1987 Agnes Heller: “Princípios Políticos”
1987 Gutman: “Democratic Education”
1987 Sartori: “A teoria democrática revisitada”
1988 Coleman: “Social Capital in the creation of Human Capital”
1988 Humberto Maturana: “Lenguaje, emociones y ética en el quehacer político”
1989 Robert Dahl: “A democracia e os seus críticos”
1991 Fishkin: “Democracy and deliberation”
1991 Huntington: “A terceira onda”
1991 Morgens Hansen: “The Athenian Democracy in the Age of Demosthenes:
Structure, Principles, and Ideology”
1991 Przeworski: “Democracia e mercado”
1992 Jürgen Habermas: “Direito e democracia entre facticidade e validade”
1993 (?) Humberto Maturana: “La democracia es una obra de arte” (s. /d).
1993 Chantal Mouffe: “The return of the Political”
1993 Guéhenno: “O fim da democracia”
1993 Humberto Maturana: “Amor y Juego: fundamentos olvidados de lo humano –
desde el Patriarcado a la Democracia” (com Gerda Verden-Zöller)
1993 John Rawls: “O liberalismo político”
1993 Robert Putnam: “Making Democracy Works”
1993 Sunstein: “The Partial Constitution”
1994 Andrew Arato & Jean Cohen: “Civil Society and Political Theory”
1994 Hirst: “Associative Democracy: new forms of social and economic governance”
1994 Levy: “A inteligência coletiva”
1996 Bohman: “Public Deliberation”
1996 Budge: “The new challenge of direct democracy”
1996 e ss. Castells: “A Era da Informação: economia, sociedade: A sociedade em rede,
O poder da identidade e Fim de milênio”
1996 David Held: “Models of Democracy”
1996 Joshua Cohen: “Procedure and Substance in Deliberative Democracy”
1996 Jürgen Habermas: “Between Facts and Norms: Contributions to a Discourse
Theory of Law and Democracy”
1996 Nino: “The Constitution of Deliberative Democracy”
1997 Fishkin: “The voice of the people: public opinion and democracy”
1997 O’Donnell: “¿Democracia delegativa? Contrapuntos. Ensayos escogidos sobre
autoritarismo y democratización”
1997 Robert Axelrod: “The complexity of cooperation: agent-based models of
competition and collaboration”


                                        26
1997 Walzer: “On toleration”
1998 Axel Honneth: “Democracia como cooperação reflexiva. John Dewey e a teoria
democrática hoje”
1998 Finley: “O Legado da Grécia”
1998 I. F. Stone: “O julgamento de Sócrates”
1998 Joshua Cohen: “Democracy and Liberty”
1998 Robert Dahl: “Sobre a democracia”
1998 John Holland: “Emergence: from chaos to order”
1999 Amartya Sen: “Democracia como um valor universal”
1999 Amartya Sen: “Desenvolvimento como liberdade”
1999 Claus Offe: “A atual transição da história e algumas opções básicas para as
instituições da sociedade”
1999 Fukuyama: “A grande ruptura: a natureza humana e a reconstituição da ordem
social”
1999 Guéhenno: “O futuro da liberdade”
2000 Chantal Mouffe: “The Democratic Paradox”

(7) Sei que nem sempre é possível, mas minhas experiências passadas e recentes com
projetos coletivos sugerem que seria bom colocar como condição prévia para qualquer
empreendimento conjunto a formação ou, pelo menos, a alfabetização democrática
dos participantes.

(8) Kapuscinski, Ryszard (1978). O Imperador: a queda de um autocrata. São Paulo:
Companhia das Letras, 2005.

(9) Montefiore, Simon Sebag (2003). Stálin: a corte do czar vermelho. São Paulo:
Companhia das Letras, 2006.

(10) Chang, Jung e Halliday, Jon (2005). Mao: a história desconhecida. São Paulo:
Companhia das Letras, 2006.

(11) Sobre isso, valeria a pena conhecer também o livro de Robert Service (2000),
“Lênin, a Biography” (traduzido no Brasil como “Lênin: a biografia definitiva”. Rio de
Janeiro: Difel, 2007).

(12) Cf. Maturana, Humberto & Verden-Zöller, Gerda (1993). Amor y Juego:
fundamentos olvidados de lo humano – desde el Patriarcado a la Democracia.
Santiago: Editorial Instituto de Terapia Cognitiva, 1997.




                                         27
(13) Tal uso da democracia contra a democracia (tomada como regime eleitoral
baseado no voto da maioria), substituindo os clássicos golpes de Estado dos anos 60 e
70 do século passado, constitui hoje a nova ameaça à democracia que precisa ser
estudada. O banditismo de Estado, em sua forma hard, como na Rússia de Putin,
constitui um excelente exemplo da via protoditatorial, mas existem também as formas
brandas. Ainda sobre a via protoditarial russa vale a pena ler: 1) o excelente livro da
jornalista Anna Politkovskaya (2007), recentemente assassinada pelo regime de Putin,
intitulado “Um diário russo” (Rio de Janeiro: Rocco, 2007); 2) “Morte de um
dissidente” (2007), de Alex Goldfarb e Marina Litvinenko (São Paulo: Companhia das
Letras, 2007); e 3) “A era dos assassinos” (2008), de Yuri Felshtinsky e Vladimir
Pribilovski (Rio de Janeiro: Record, 2008).

(14) Existem também algumas obras de ficção que ajudam a compreender a natureza e
perceber as manifestações – explícitas ou implícitas – do poder vertical. Pouca gente
se dá conta de que é possível aprender mais sobre política democrática lendo
atentamente esses livros do que estudando volumosos tratados teóricos sobre
política. Para quem está interessado na "arte" da política democrática é
importantíssimo ler, por exemplo, a série de livros de Frank Herbert, que se inicia com
o clássico "Duna". Um curso prático de política democrática deveria recomendar a
leitura dos seis volumes que compõem essa série: Dune (1965), Dune Messiah (1969),
Children of Dune (1976), God Emperor of Dune (1981), Heretics of Dune (1984) e
Chapterhouse: Dune (1985). Herbert faleceu em 1986, quando estava trabalhando no
sétimo volume da série. Seus livros foram publicados no Brasil pela Nova Fronteira,
com os respectivos títulos: Duna, O Messias de Duna, Os Filhos de Duna, O Imperador-
Deus de Duna, Os Hereges de Duna e As Herdeiras de Duna. Um bom - e além de tudo
prazeroso – exercício de formação política seria tentar desvendar Duna, do ponto de
vista daquelas manifestações do poder vertical que se contrapõem à prática da
democracia - quer dizer, das atitudes míticas diante da história, sacerdotais diante do
saber, hierárquicas diante do poder e autocráticas diante da política – realizando
explorações nesse maravilhoso universo ficcional de Frank Herbert. Existem outras
séries de ficção em que se pode aprender muita coisa que os livros de política não
ensinam. Destaca-se, em especial, essa formidável mitologia de nossos tempos que
consagrou o personagem Darth Vader: a série "Star Wars". Sobre essa série vale a
pena ler Decker, Kevin (2005). “Por qualquer meio necessário: tirania, democracia,
república e império” in Irwin, William (2005). Star Wars e a filosofia: mais poderoso do
que você imagina. São Paulo: Madras, 2005.




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Pilulas Democráticas Introdução

  • 1. Introdução Da série Pílulas Democráticas APRENDER DEMOCRACIA É DESAPRENDER AUTOCRACIA Augusto de Franco Excertos do original sem-revisão do livro Alfabetização Democrática (Curitiba: Rede de Participação Política: 2007) republicados em 2010. No sentido “forte” do conceito, a democracia não é um regime determinado, não é um modelo aplicável a várias circunstâncias, mas um movimento ou uma atitude constante de desconstituição de autocracia Não é possível conceituar democracia sem conceituar autocracia. E não é possível falar da autocracia sem falar da guerra. Como dizia a letra de uma 1
  • 2. antiga canção alemã, em uma frase que chegaria a ser cômica se não fosse trágica: “contra os democratas, somente os soldados ajudam”. Em virtude de uma conjunção particularíssima – provavelmente fortuita – de variados fatores, sociedades humanas na Antiguidade lograram abrir uma brecha na cultura autocrática (patriarcal, hierárquica e guerreira), ensaiando pactos de convivência estabelecidos em redes de conversações entre iguais, que aceitavam a legitimidade do outro e valorizavam sua opinião e não apenas o seu conhecimento técnico ou o seu saber científico ou filosófico. Registros históricos apontam que isso aconteceu em cidades gregas, entre os anos 509 e 322 antes da Era Comum, mas não é improvável que tenha ocorrido também, de modo mais fugaz, em outras ocasiões e lugares (o relato profético da chamada Assembléia de Siquém, ocorrida na Palestina entre os séculos 12 e 11 (?) talvez constitua um indício importante nesse sentido). Assim surgiu a democracia como uma experiência de conversação em um espaço público, quer dizer, não privatizado pelo autocrata. Do ponto de vista dos sistemas autocráticos, amplamente predominantes, a democracia – para usar uma expressão de Saint-Exupery, empregada em outro contexto (no livro “Correio Sul”) – foi “um erro no cálculo, uma falha na armadura...” devidamente corrigida nos dois mil anos seguintes à experiência dos gregos. Quando os modernos tentaram reinventá-la, só então se pôde perceber toda a força da tradição autocrática. Nos dois séculos posteriores às ousadias teóricas de Althusius (1603), Spinoza (1670) e Rousseau (1762) – que lançaram os fundamentos para a reinvenção da democracia pelos modernos: a idéia de política como vida simbiótica da comunidade, a idéia de liberdade como sentido da política e a idéia de democracia como regime político capaz de materializar o ideal de liberdade como autonomia –, os pensadores políticos posicionaram-se, em sua imensa maioria, francamente contra a democracia. O juízo de Burke (1790), segundo o qual “a democracia é a coisa mais vergonhosa do mundo”, é emblemático desse ânimo autocratizante que vigorou nos dois milênios anteriores à época em que reinventamos a democracia. 2
  • 3. Quando, afinal, a democracia começou a ser reensaiada para valer pelos modernos, a política tornou-se palco de uma tensão permanente entre tendências de autocratização e de democratização da democracia. Nada indica que essa tensão tenha desaparecido na contemporaneidade. Ainda que este seja um esquema explicativo, pode-se escrever a história da democracia como a história de um confronto, em que, de um lado, remanesciam as atitudes míticas, sacerdotais e hierárquicas que mantinham a tradicionalidade e, de outro, surgiam atitudes utópicas, proféticas e autônomas que fundaram a modernidade. A brecha democrática não foi aberta de uma só vez. Ela foi aberta e fechada várias vezes. E continua, nos últimos dois séculos, sendo alargada e estreitada de modo intermitente. Desse ponto de vista, o que chamamos de democratização nada mais é do que o processo de alargamento dessa brecha. Muito antes dos gregos, o principal movimento autocratizante foi a guerra. A guerra já era considerada pelos gregos como uma atividade não- democrática (a rigor, para eles, era uma realidade apolítica, como observou genialmente Hannah Arendt: c. 1950, em seus vários estudos “Sobre o sentido da política”, publicados postumamente) (1). No plano conceitual, guerra e democracia (ou política praticada ex parte populis) são originalmente incompatíveis. Depois dos gregos, a guerra foi o meio universal de acabar com a política (democrática) ou de estreitar a brecha por ela aberta nos sistemas de dominação. Guerra como modo de regular conflitos e de alterar a morfologia e a dinâmica da rede social para se preparar para o conflito externo (por meio do chamado “estado de guerra”, instalado internamente) foi o meio pelo qual a tradicionalidade política pôde se prorrogar, não apenas derrotando inimigos de modo violento, mas também construindo continuamente tais inimigos com o intuito de preservar uma morfologia e uma dinâmica social que, erigida em função 3
  • 4. da guerra, constituiu-se como um complexo cultural. Usando-se uma metáfora contemporânea, trata-se de um programa (software) que foi instalado na rede social e adquiriu capacidade de modificar essa rede (hardware) para se auto-replicar. A guerra sintetiza o contrário da democracia: nega-se a legitimidade do outro, desvaloriza-se sua opinião – a ponto de não se permitir sequer o seu proferimento – e abole-se totalmente os espaços (públicos) onde as opiniões dos cidadãos possam interagir e se polinizar mutuamente (por meio da conversação na praça, i. e., no espaço público). Guerra, por sua própria natureza, impõe mitificação da história, sacerdotalização do saber e hierarquização das relações sociais. A visão da história passa a ser orientada pela idéia de que existe um homo hostilis (inerentemente competitivo) condenado a lutar eternamente para fazer prevalecer seus interesses (egotistas) sobre os dos demais. A visão do saber passa a ser orientada pela idéia de que o progresso humano é conseqüência do avanço tecnológico de um homo faber (fabricante de ferramentas, que logo serão usadas como armas); e daí a mitificação do conhecimento técnico, entronizado como critério meritocrático (sacerdotal porquanto baseado no segredo que introduz opacidade nos procedimentos e organizado em graus de ordenação, quer dizer, de capacidade de reproduzir uma determinada ordem). A visão do poder passa a ser orientada pela idéia de que existem formas de organização social que seriam “naturais” ou inevitáveis para o estabelecimento daquele controle social sem o qual a sociedade seria destruída por seus inimigos externos ou por seus próprios integrantes (na base da bellum omnium contra omnes estão as idéias de ordem top down, piramidal, como controle centralizado ou multicentralizado, de fluxo comando- execução, de disciplina e obediência, enfim, de poder como capacidade de mandar alguém fazer alguma coisa contra sua vontade). Tudo isso passa a valer não apenas como repertório de expedientes e providências para destruir o inimigo externo (ou para não ser por ele destruído), mas também como norma para reger a vida interna das sociedades, mesmo 4
  • 5. em tempos de paz (tempos esses que devem ser dedicados à preparação para a guerra, na linha do “se queres a paz, prepara-te para a guerra”, o que deixa claro que a guerra é promovida à condição de uma realidade inexorável ou onipresente). Neste parágrafo talvez estejam reunidos todos os elementos para uma conceituação da autocracia e, inversamente, da democracia. Todavia, é óbvio que por força de suas conseqüências humanas, sociais e ambientais desastrosas, a guerra não pode ser bem-vista pelos cidadãos. Sem a guerra como instituição, porém, não há como manter as estruturas verticais de poder e as normas autocratizantes que a acompanham. Ademais, com a expansão da democratização, as guerras tendem a se reduzir; por exemplo, nações democráticas não costumam guerrear entre si. Essa é a principal contradição que vive a autocracia, visto que ela não pode subsistir sem a guerra. Na ausência de guerra, o processo de autocratização seria logo suplantado pelo processo de democratização. É por isso que, a partir da modernidade, o ímpeto regressivo das tendências autocratizantes vem se manifestando não somente na guerra, mas nas concepções e práticas políticas que tomam a política como uma espécie de ‘continuação da guerra por outros meios’. É assim que, na época atual, o grande problema para a política democrática não é prioritariamente a guerra – conquanto ela continue sendo promovida por quistos autocráticos instalados em países democráticos contra países não-democráticos, por países não- democráticos contra países democráticos e por países não-democráticos entre si – mas o exercício da política como “arte da guerra” (essa sim, praticada universalmente como realpolitik). 5
  • 6. O que se escreveu sobre a democracia Do ponto de vista do conceito de democracia apresentado acima, é surpreendente o fato de termos tão pouca reflexão acumulada. É claro que mais surpreendente ainda é o fato de, depois da experiência dos gregos, a democracia ter retrocedido, não avançado. E que isso tenha ocorrido tanto na prática quanto na teoria. Sobre o tema há, por certo, muitas controvérsias. Alguns tentam interpretar a República romana como uma versão (latina) da democracia (grega) (2). Mas, ao que tudo indica, não se trata exatamente da mesma coisa, visto que o sistema de governo com participação popular dos romanos não reunia aqueles três atributos – de isonomia, isologia e isegoria – que caracterizavam o funcionamento da comunidade (koinomia) política de Atenas e de outras cidades gregas do período democrático (509-322). Se encararmos a democracia, no seu sentido “fraco”, apenas como sistema de governo (popular) – e não, em seu sentido “forte”, como sistema de convivência ou modo de vida comunitária que, por meio da política praticada ex parte populis, regula a estrutura e a dinâmica de uma rede social – perceberemos que várias outras experiências surgiram concomitante e posteriormente à experiência dos gregos: Roma (do final do século 6 até meados do século 2), governos locais em cidades italianas (como Florença e Veneza, por exemplo, do início do século 12 até meados do século 14), bem como outras experiências endógenas de governo que admitiam alguma forma de assembléia com participação mais ou menos popular (na Inglaterra, na Escandinávia, nos Países Baixos, na Suiça e em outros pontos ao norte do Mediterrâneo). De qualquer modo, foram experiências insuficientes diante da tendência autocrática predominante. Na melhor das hipóteses, considerando-se a República romana como uma espécie de democracia, tivemos um interregno autocrático de mil anos (de 130 a. E. C. a 1.100). Na pior hipótese – que, não por acaso, é a mais precisa e a que faz mais sentido – esse intervalo foi de mais de dois mil anos (de 322 a. E. C. até o século 18). 6
  • 7. Na teoria, ocorreu o mesmo. Além da falta de experiências suficientes de democracia, tivemos a falta de reflexão teórica sobre o tema. Boa parte da literatura política – inclusive a maior parte dos escritos sobre democracia – foi fortemente influenciada por idéias autocráticas. Basta ver que, com raras exceções, os mais conhecidos pensadores da política que surgiram desde Platão (e Sócrates, tanto o platônico, quanto o xenofôntico), passando pelos medievais e até pelos contemporâneos de Thomas Hobbes e seus sucessores (nas sete ou oito gerações seguintes), eram contrários à democracia. Em uma lista inquestionável de duas dezenas de clássicos da política, do século 5 antes da Era Comum ao final do século 16 (de Platão a Althusius) não se encontra um só pensador democrático. Talvez com exceção, parcial, de Aristóteles e do próprio Althusius – posto que não militavam especialmente contra democracia – a totalidade desses pensadores era autocrática. Quando Spinoza afirmou (em 1670) – contrariando Hobbes – que o fim da política não era a ordem e sim a liberdade, não se fez a luz. Assim como os antecessores de Spinoza (nos dois milênios anteriores) foram contrários à democracia de alguma forma, seus sucessores (nos dois séculos seguintes) quando não se posicionaram abertamente contra a democracia, puseram- se a relê-la de uma forma que acabou esvaziando o seu conteúdo. Até a segunda metade do século 18 não houve nenhuma leitura decente da democracia grega que tivesse resgatado ou preservado seus pressupostos fundamentais (o seu “gene” ou meme) do ponto de vista do conceito exposto na seção anterior desta Introdução. Na verdade, de Althusius (1603) a Stuart Mill (1861) não conhecemos muito mais que meia dúzia de pensadores políticos que tivesse, desse ponto de vista, contribuído decisivamente para recuperar e reinterpretar, à luz das condições da modernidade, os elementos fundamentais da democracia dos antigos (a liberdade, a igualdade de proferimento e a valorização da opinião e o exercício da conversação no espaço público). 7
  • 8. Entre os clássicos da política, do século 6 antes da Era Comum até a metade do século 20, quer dizer, dos democratas atenienses até Hannah Arendt, não temos, por incrível que pareça, muitas reflexões sobre a democracia (no sentido “forte” do conceito). Embora se possa situar o surgimento da democracia no final do século 6, a partir da reforma de Clístenes (509), os escritos sobre a democracia só vão aparecer realmente no século 5. Ésquilo, em “Os Persas” (472), afirma a liberdade dos atenienses (oposta à servidão daqueles que têm um senhor). Mas é com Eurípedes, em “As Suplicantes” (422), que surge, pela primeira vez, um conceito mais acabado de democracia (tomando como modelo Atenas, com a descrição de alguns de seus mecanismos, como a assembléia democrática, por exemplo). Educação para a democracia Nossas lideranças políticas, nossos empreendedores – inclusive os da área social – e, por incrível que pareça, nossos inovadores em todos os campos, até mesmo os que se dedicam ao tema emergente das redes sociais, não têm formação democrática. Não estou falando dos que ficam na retaguarda, cumprindo funções burocráticas, mas sim dos que estão na ponta da inovação, daqueles que estão descobrindo, criando e experimentando novas maneiras de pensar e de fazer as coisas. A situação é mais grave do que parece, pois que a maioria desses pioneiros e desbravadores de caminhos não tem, já não se diria formação, mas, nem mesmo, alfabetização democrática. Repetimos, assim, em nossas organizações, quase sempre inconscientemente, a tradição autocrática em tudo o que diz respeito aos padrões de pensamento, ação e de interação com o mundo à nossa volta. Provavelmente isso ocorre porque não temos propriamente uma tradição democrática. A democracia como regime político ou forma de administração do Estado foi experimentada, até agora, apenas em algumas localidades e somente em 7% da nossa história (durante 96 8
  • 9. minutos, se tomarmos como referência a escala de 24 horas para 6 milênios de experiência civilizacional). De experimentação democrática foram, na verdade, pouco menos de duzentos anos na antiguidade (509- 322 a. E. C.) e outros duzentos anos na época moderna. Mesmo assim, em meados do século 19, do total de 37 países, apenas 1 (um) podia ser considerado como democrático. E há pouco mais de dez anos, quase 70% de 192 nações do globo ainda não podiam ser consideradas como democráticas (tomando-se como critério o pleno sufrágio). Ora, se não há propriamente uma tradição democrática significativa, por que então não construímos uma? Todas as tradições não se constroem, (é claro – e até por definição –) ex post, projetando linhas imaginárias de continuidade, da frente para trás? Todavia, seria possível construir uma tradição do pensamento democrático? A rigor, talvez não. Mas, se fosse possível, a linha imaginária de continuidade do pensamento democrático seria mais ou menos assim: 1) Péricles (e seu think tank ateniense, Protágoras, Aspásia etc.: 449-> 429 a. E. C.) 2) Althusius (1603) 3) Spinoza (1670 -> 1677) 4) Rousseau (1754 -> 1762) 5) Jefferson (e o network da Filadélfia: 1776) 6) "Públius" (os “federalistas” Hamilton, Jay e Madison: 1787 -> 1788) 7) Paine (1791) 8) Tocqueville (1835 -> 1856) 9
  • 10. 9) Thoreau (1849) 10) Mill (1859 -> 1861) 11) Dewey (1927 -> 1939) 12) Arendt (1950 -> 1963) E depois? Bem, depois vêm os modernos, que são muitos, mas na lista dos quais não se pode esquecer de Lefort (1981), de Castoriadis (1986), de Maturana (1985->1993), de Putnam (1993), de Rawls (1993), de Levy (1994), de Sen (1994->1999)... E, depois ainda, os pluriarquistas e glocalistas contemporâneos (3). Mas não os deliberacionistas e participacionistas típicos do século 20, que curiosamente remanescem neste início do século 21 (4). Que linha de continuidade seria essa, sugerida pela lista acima? Seria a linha originária (ou que recupera o genos da democracia): a democracia não como um regime determinado, mas como um movimento constante de desconstituição de autocracia. Em outros termos, a democracia como o contrário da guerra (e da política como continuação da guerra por outros meios). Não se pode esquecer que as instituições e os procedimentos democráticos surgiram propositalmente – na Grécia de Clístenes, Efialtes e Péricles – para evitar a volta da tirania dos Psistrátidas. Ou seja, quando surge, a democracia já surge como movimento de desconstituição de autocracia. Surge como exercício de conversação na praça, quer dizer, como publicização dos assuntos comuns que haviam sido privatizados pelo autocrata (surge, assim, coetaneamente com a emersão de uma esfera pública). Esse é o seu genos. Por isso convém trabalhar com a "teoria da brecha", sugerida por Maturana: a democracia como uma brecha que foi aberta (e que, intermitentemente, é aberta e fechada) nos sistemas de convivência patriarcais e guerreiros da civilização dos 10
  • 11. predadores. A democracia como uma janela para o simbionte poder respirar (e aqui vale a pena ver Althusius e sua idéia de simbiose) (5). Esse roteiro de formação – na verdade, um itinerário de leituras – deveria fazer parte da educação para a democracia de qualquer pessoa ou de qualquer comunidade de prática, de aprendizagem e de projeto. É claro que um programa como esse só pode ser seguido por quem já adquiriu a condição de autodidata. Antes disso, nas redes familiares, nas redes comunitárias e nas hierarquias escolares básicas (a escola fundamental nos seus primeiros anos), a criança e o jovem deveriam ser introduzidos à democracia por meio de leituras mais amenas: começando pelo estudo da vida de Péricles e dos seus relacionamentos e das demais tentativas de experimentação de processos democráticos ao longo da história. Um bom itinerário aqui seria estudar as formas de interação política dos cidadãos na Roma dos séculos 6 a 2 antes da Era Comum, nos governos locais de Florença e Veneza dos séculos 12 a 14 e, em especial, nas assembléias populares européias – na Inglaterra, na Escandinávia, nos Países Baixos, na Suiça e em outros pontos ao norte do Mediterrâneo e na Península Ibérica – passando depois pelas primeiras constituições de governos representativos, pela Revolução Francesa e seus rebatimentos em todo o mundo ocidental, com destaque especial para Jefferson e o processo de independência dos Estados Unidos, para os “federalistas” e para Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (de 1789). Depois então viria a democracia realmente existente dos modernos e contemporâneos. Tudo isso, todavia, não bastaria. No nível fundamental, a educação para a democracia deveria compreender, além de leituras e debates, jogos e exercícios de interação democrática e, sobretudo, o engajamento em atividades comunitárias voluntárias. Na verdade, a educação para a democracia e a educação para o desenvolvimento (e para o desenvolvimento local) deveriam vir juntas, como dois aspectos da 11
  • 12. educação para a sustentabilidade, aos quais deveria se somar a educação ambiental propriamente dita. Um itinerário de 40 textos básicos (até o século 20) A) Sobre a democracia dos gregos A maior parte da literatura da época antiga disponível, ou é contrária à democracia (Platão), ou não é grande entusiasta do regime de Péricles (Aristóteles). Essas duas abordagens, infelizmente, sulcaram o caminho por onde escorreram quase todas as versões posteriores, que raramente deram conta de captar o meme democrático original. Na ausência de qualquer texto autoral de Péricles, é necessário estudar a sua vida. As fontes são pouquíssimas: “A guerra dos peloponesos” de Tucídides, a “Vida de Péricles” (nas “Vidas paralelas”) de Plutarco, além, é claro de “A constituição de Atenas” de Aristóteles (ou a ele atribuída). Dos antigos, temos ainda apenas algumas referências feitas pelos poetas cômicos, “A República dos atenienses” (atribuída a Xenofonte ou a um suposto “Velho Oligarca”) – que não faz referência a Péricles, mas contradiz o relato de Tucidides na célebre “Oração Fúnebre” que teria sido pronunciada por Péricles ao final do primeiro ano da Guerra do Peloponeso – e as “Memoráveis” (sobre os ditos e feitos memoráveis de Sócrates) de Xenofonte. De qualquer modo não se pode deixar de ler: 422 Eurípedes: “As Suplicantes” 420? Tucídides: “História da Guerra dos Peloponesos e Atenienses” 400-347 [entre] Platão: “A República” 12
  • 13. 400-347 [entre] Platão: “O Político” 400-347 [entre] Platão: “As Leis” 350-322 [entre] Aristóteles: “A Política” 322? Aristóteles (atribuída): “A Constituição de Atenas” B) As bases teóricas da reinvenção da democracia pelos modernos Depois de longo interregno, Althusius, Spinoza e Rousseau lançaram os fundamentos para a reinvenção da democracia pelos modernos: a idéia de política como vida simbiótica da comunidade, a idéia de liberdade como sentido da política e a idéia de democracia como regime político capaz de materializar o ideal de liberdade como autonomia. Não se pode, portanto, deixar de ler: 1603 Althusius: “Política” 1670 Spinoza: “Tratado Teológico-Político” 1677 Spinoza: “Tratado Político” 1754 Rousseau: “Discurso sobre a origem da desigualdade dos homens” 1762 Rousseau: “O contrato social” 13
  • 14. C) A experimentação moderna de um pensamento realmente democrático Sob forte influência de certo pensamento inovador francês, as idéias democráticas germinaram e se materializaram, todavia, na América. Sobre essa experimentação não se pode deixar de ler: 1776 Thomas Jefferson et allia: “Declaração de Independência dos Estados Unidos da América” 1787-1788 “Publios” (Alexander Hamilton, John Jay e James Madison): “O Federalista” (em especial Madison (1987) em um comentário sobre a Constituição dos Estados Unidos) 1789 “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” 1791 Thomas Paine: “Direitos do Homem” 1835 Tocqueville: “A Democracia na América” 1849 Thoreau: “Desobediência Civil” 1856 Tocqueville: “O Antigo Regime e a Revolução” 1859 Stuart Mill: “Sobre a Liberdade” 1861 Stuart Mill: “Sobre o Governo Representativo” D) Dois esforços bem-sucedidos de identificação de aspectos do genos (ou do meme original) democrático John Dewey e Hannah Arendt conseguiram identificar o que havia de original na idéia de democracia: a democracia como modo-de-vida 14
  • 15. comunitária, essencialmente cooperativo, local, na base da sociedade o no cotidiano do cidadão e a democracia como sentido da política (ou como a política propriamente dita). Cabe ler suas principais obras sobre o tema; pelo menos: 1927 Dewey: “O Público e seus problemas” 1929 Dewey: “Velho e novo individualismo” 1935 Dewey: “Liberalismo e ação social” 1937 Dewey: “A democracia é radical” 1939 Dewey: “Democracia criativa: a tarefa que temos pela frente” 1950 (c.) Hannah Arendt: “O que é a política?” 1951 Hannah Arendt: “As origens do totalitarismo” 1954 Hannah Arendt: “Que é liberdade” 1958 Hannah Arendt: “A condição humana” 1963 Hannah Arendt: “Sobre a revolução” E) Interpretações e visões democráticas modernas Restaram-nos as interpretações modernas, que repõem, em parte, o sentido original da democracia, como, entre outras, a de Claude Lefort e a de Cornelius Castoriadis, ou que reiventaram tal sentido, como a de Humberto Maturana. Cabe ler, um pouco mais do que isso: 1981 Lefort: “A invenção democrática: os limites da dominação totalitária” 15
  • 16. 1986 Cornelius Castoriadis: “Sobre ‘O Político’ de Platão” (edição póstuma (1999) de seminários realizados em 1986) 1988 Humberto Maturana: “Lenguaje, emociones y ética en el quehacer político” 1993 (?) Humberto Maturana: “La democracia es una obra de arte” (s. /d). 1993 Humberto Maturana: “Amor y Juego: fundamentos olvidados de lo humano – desde el Patriarcado a la Democracia” (com Gerda Verden- Zöller) 1993 John Rawls: “O liberalismo político” 1993 Robert Putnam: “Making Democracy Works” 1994 Levy: “A inteligência coletiva” 1998 I. F. Stone: “O julgamento de Sócrates” 1999 Amartya Sen: “Democracia como um valor universal” 1999 Amartya Sen: “Desenvolvimento como liberdade” É claro que uma lista mais completa de obras políticas que têm a ver com a democracia (ou com a sua negação) seria bem maior (6), mas – dado o quadro de analfabetismo atual – talvez seja pedir demais que se leve em consideração o repositório completo do que se escreveu, nos séculos passados, sobre a democracia (inclusive pelo avesso). O itinerário das 40 leituras listadas acima deveria ser parte de qualquer currículo de educação para a democracia – disciplina que deveria ser obrigatória nas escolas e universidades, mas não é e tudo indica que não 16
  • 17. será. Cabe-nos, portanto, propagandeá-lo como um novo programa autodidático (7). Um curso autodidático de política democrática Para quem está interessado na política democrática, imagino que seja melhor fazer um esforço autodidático para ler as obras fundamentais do que se matricular em um curso superior de política e ficar assistindo aulas de professores que reproduzem as modas da época, indicam bibliografias (em geral fotocópias de partes de textos clássicos, resenhas e análises que interessam mais aos trabalhos acadêmicos que eles estão fazendo no momento do que ao aluno) e que, via de regra, não leram, eles próprios, a maioria dos textos básicos. Sim, é necessário ler pelo menos uma parte dos textos básicos: alguns clássicos, com certeza, mas também alguma coisa contemporânea. A lista completa pode chegar a uns 200 textos (mas não ultrapassará esse número). Digerir tudo isso é meio impraticável, sobretudo se considerarmos que não basta ler os textos. O estudante deve procurar se informar sobre o autor e sobre as circunstâncias em que produziu sua obra. Deve ler um ou dois artigos de especialistas contextualizando a obra. E não pode trocar a leitura dos textos (fontes) pela leitura do que disseram sobre esses textos. Ao contrário do que se pratica nas academias, é preciso que o estudante vá primeiro beber direto na fonte para depois fazer o que quiser (ou puder). Aulas não servem para muita coisa. Se houver um grupo de meia dúzia a uma dúzia de estudantes interessados e esse grupo puder organizar um seminário de dez em dez dias sobre cada um dos textos, será o ideal. Leitura individual (2 a 3 horas por dia), três discussões (de 6 horas cada, por mês) e pronto. Ou quase. 17
  • 18. Por último, é bom que o estudante escreva um pequeno artigo (de, no máximo, uns 5 mil caracteres, pois a capacidade de produzir uma síntese é um dos indicadores de compreensão) sobre o texto que leu. Não é para resumir, resenhar, “fichar” ou copiar (ou repetir com outras palavras) o que disseram o autor ou seus comentadores e críticos. É para descobrir coisas novas, formar uma opinião própria que tente acrescentar alguma coisa ao que já foi dito. A rigor nenhum conhecimento pode ser transferido. O conhecimento é sempre criado e recriado ou reconstruído; de certo modo, inventado. Quem não inventa nada, não aprende nada. Considerando nosso analfabetismo democrático, seria recomendável começar pelo itinerário proposto acima, que compõe aquela linha imaginária que tenta recuperar a idéia de democracia (no sentido em que John Dewey falava da “democracia como idéia”). A partir daí o estudante, certamente, saberá o que fazer. A “prova” final de um curso autodidático como esse é escrever alguma coisa original, inventada. Inventada, sim: não acredite nos que vão dizer que isso é “assim” ou não pode ser “assado”. Produza, publique sem pedir autorização a ninguém e depois arque com as conseqüências expondo-se a crítica. A árvore se conhece pelos frutos. Não é necessário um fiscal para dizer se o fruto é bom ou ruim segundo suas concepções e seus gostos. Se as pessoas puderem chegar até a árvore, colher os frutos e experimentá-los, saberão se vale a pena comê-los até o fim. Ponto. Aprender democracia é desaprender autocracia No entanto, não basta conhecer as reflexões teóricas sobre as diversas experiências de democracia e as teorias normativas inspiradas por tais 18
  • 19. reflexões. A democracia não é um regime determinado, não é um modelo aplicável a várias circunstâncias, mas um movimento ou uma atitude constante de desconstituição de autocracia. Assim, segundo o conceito (“forte”) de democracia apresentado por tal itinerário de leituras, aprender democracia é desaprender autocracia. Uma das posturas mais importantes na formação de lideranças para o exercício da política democrática é aprender a perceber os sinais da mentalidade e das práticas autoritárias e os sintomas dos processos de autocratização da política. Não se trata apenas de conhecer as teorias e o que disseram os clássicos da chamada ciência política sobre o assunto. Trata-se da capacidade de identificar padrões, o que faz parte daqueles conhecimentos tácitos da “arte” da política que devem ser adquiridos pela observação atenta da própria experiência e das experiências alheias. Pequeno ou grande, o poder autoritário se comporta sempre de maneira semelhante. Não importa se o agente não convencido do valor da democracia está dirigindo uma pequena ONG de bairro, um partido ou um governo. Há um padrão de comportamento que se faz presente em todas as práticas antidemocráticas e que se revela como poder de obstruir, separar e excluir. Nos casos mais exacerbados, o poder exercido de tal maneira pode perseguir, prender, torturar e matar, só não o fazendo, em muitas situações, em virtude da falta de condições para tanto. Um processo de formação política democrática deveria contemplar o estudo cuidadoso desse “padrão Darth Vader” (para usar a excelente metáfora da série “Star Wars”, de George Lucas). Nesse sentido, pode-se aprender muito lendo, por exemplo, Ryszard Kapuscinski: “Cesarz” (1978), que foi publicado no Brasil sob o título “O Imperador: a queda de um autocrata”. Por meio de uma narrativa impressionante, baseada em entrevistas feitas pelo autor – o jornalista polonês Kapuscinski – com antigos colaboradores de Hailé Selassié I, ele descreve os bastidores do palácio do tirano que governou a Etiópia por 44 anos (8). Ou com Simon Sebag Montefiore: “Stálin: a corte do czar vermelho” (2003), também 19
  • 20. baseado em entrevistas feitas pelo jornalista Montefiore com os sobreviventes e os descendentes da era stalinista e em pesquisas em cartas e outros documentos que só recentemente foram liberados, o livro descreve a intimidade do poder despótico que até há pouco era meio desconhecida, revelando a sua face brutal (9). Ou, ainda, com Jung Chang e Jon Halliday: “Mao: a história desconhecida” (2005), no qual Chang (já conhecida pelo seu excelente “Cisnes selvagens”) e seu marido Halliday, empreenderam uma pesquisa monumental para descrever a outra face da vida de Mao Tse-Tung, que – segundo a palavra dos autores – “durante décadas deteve o poder absoluto sobre a vida de um quarto da população mundial e foi responsável por bem mais de 70 milhões de mortes em tempos de paz, mais do que qualquer outro líder do século 20” (10). Este último é, de todos, o livro mais impressionante que talvez já tenha sido escrito sobre as conseqüências maléficas da direção do Estado nas mãos de um líder determinado a conquistar e a manter o poder a qualquer custo (11). Pode-se dizer que as tragédias desses regimes comandados por Selassié, Stálin e Mao são coisas muito distantes da situação em que vivem os países democráticos atuais. Mas as coisas não são bem assim. O “padrão Darth Vader” que se manifestou em alto grau no comportamento desses três autocratas pode também estar presente em outros líderes, pequenos ou grandes, muitas vezes não conseguindo se desenvolver em virtude de circunstâncias ambientais ou institucionais adversas. Tais circunstâncias, que decorrem de configurações sociais coletivas, quando são favoráveis à ereção de sistemas de dominação tendem a reforçar e a retroalimentar atitudes míticas diante da história, sacerdotais diante do saber, hierárquicas diante do poder e autocráticas diante da política. Toda vez que a rede social é obstruída, toda vez que se introduzem centralizações na teia de conexões ou de caminhos que ligam os nodos dessa rede distribuída, gera-se uma configuração mais favorável ao crescimento e a manifestação desse poder vertical que está no “DNA” da civilização patriarcal e guerreira. A democracia, como percebeu Humberto Maturana (1993), é uma brecha nesse paradigma civilizatório (12). 20
  • 21. Compreendendo o que pode florescer em ambientes sociais fortemente centralizados e nos quais os modos de regulação de conflitos não são democráticos, podemos perceber os sinais e interpretar os sintomas do processo de autocratização da política onde quer que eles surjam, inclusive no interior de regimes formalmente democráticos. Pode-se, inclusive, aprender a detectar as tentativas contemporâneas de autocratização da democracia, baseadas no uso instrumental da democracia no sentido “fraco” do conceito (quer dizer, na utilização de alguns dos mecanismos, instituições e procedimentos da democracia representativa, como o sistema eleitoral), para enfrear o processo de democratização das sociedades, seja pela via da protoditadura (que se caracteriza, fundamentalmente, pela abolição legal ou de facto da rotatividade democrática), seja pelo emprego da manipulação em larga escala, como ocorre nas novas vertentes do populismo que vêm sempre acompanhadas do banditismo de Estado, da corrupção de Estado, da perversão da política e da degeneração das instituições por meio da privatização partidária da esfera pública e do aparelhamento da administração governamental (13). De qualquer modo, para conhecer o poder vertical – a sua “anatomia” e a sua “fisiologia”, vamos dizer assim – devemos estudá-lo em estado puro (ou quase), como ocorreu na Etiópia de Selassié, na União Soviética de Stálin e na China de Mao. Depois será mais fácil perceber seus indícios em nosso cotidiano, inclusive quando surgem em uma pequena organização (14). 21
  • 22. Notas e referências (1) Arendt, Hannah (c. 1950). O que é política? (Frags. das “Obras Póstumas” (1992), compilados por Ursula Ludz). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998. (2) Cf. Dahl, Robert (1998). Sobre a democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001. (3) Isso não deixa de ser um problema na medida em que boa parte dos críticos não- autocráticos da democracia representativa, que lhe apontam corretamente as insuficiências e mazelas, procurando superá-las com a adoção de novas formas de convivência e interação baseadas na abundância dos meios de comunicação disponíveis em uma sociedade-rede (como os pluriarquistas digitais, por exemplo) não conseguiu formar um conceito de esfera pública e, para falar a verdade, não conseguiu sequer vivenciar, em suas experiências comunitárias inovadoras, uma cultura democrática. (4) Quase todo pensamento contemporâneo ligado à radicalização da democracia (um conceito originalmente deweyano, deformado ou pervertido pelo pensamento marxista, nas suas vertentes leninistas ou gramscianas) e à chamada democracia deliberativa ou à democracia participativa, representa a negação da “tradição” democrática como pazeamento (quer dizer, aquela que toma a política como o contrário da guerra, como percebeu Arendt). A chamada “esquerda democrática” é composta, em sua maioria, por novos defensores da política como uma continuação da guerra por outros meios: a fórmula inversa de Clausewitz-Lenin (quer dizer, nos termos que Arendt julgou ser o dos democratas gregos, da não-política). São, assim, até certo ponto paradoxalmente, os novos teóricos da autocracia (não da democracia) que a compõem. (5) Há uma mistura (um deslizamento epistemológico, se quisermos) entre conceitos com stati diferentes nos discursos que tentam captar e comparar diversos meanings da democracia. Aqui tentei resolver esse problema falando de dois sentidos do conceito de democracia: um "forte" (deweyano) e um "fraco" (dos que tomam a democracia como forma de administração política do Estado). É, mutatis mutandis, a mesma diferença entre as visões de soberania de Althusius e Bodin; ou, entre as visões do sentido da política de Hobbes e de Spinoza. Da visão hobbesiana (ainda francamente hegemônica, no pensamento político e, sobretudo, naquilo que foi chamado de Economics) decorre necessariamente uma visão de governo (controle) e não de liberdade (como em Arendt). 22
  • 23. (6) Eis uma lista mais completa – até o final do século 20 – contendo cerca de 160 textos (incluindo pontos de vista autocráticos e democráticos sobre a política): 604 (c.) “Tao-te King” de Lao Tzu 500 (c.) Sun Tzu:“A Arte da Guerra” 490 Confúcio: “Os Analectos” 472 Ésquilo: “Os Persas” 422 Eurípedes: “As Suplicantes” 425 Tucídides: “História da Guerra dos Peloponesos e Atenienses” 427-347 Platão: “A República” 427-347 Platão: “O Político” 427-347 Platão: “As Leis” 383-322 Aristóteles: “A Política” 383-322 Aristóteles: “A Constituição de Atenas” 280-234 Han Fei Zi: “A Arte da Política (Os homens e a lei)” 106-43 Cícero: “Da República” 106-43 Cícero: “Das Leis” 106-43 Cícero: “Dos Deveres” 1225-1274 Tomás de Aquino: “Do Governo dos Príncipes” 1312 Dante Alighieri: “Da Monarquia” 1324 Marcílio de Pádua: “Defensor da paz” 1513 Maquiavel: “O Príncipe” 1516 Thomas Morus: “A Utopia” 1519 Maquiavel: “Discursos sobre a primeira década de Tito Livio” 1548 La Boétie: “Discurso da servidão voluntária” 1576 Francesco Guicciardini: “Recordações Políticas e Civis” 1576 Jean Bodin: “Os Seis Livros do Estado (ou da República)” 1589 Giovanni Botero: “A Razão de Estado” 1602 Tommaso Campanella: “A Cidade do Sol” 1603 Althusius: “Política” 1625 Grotius: “Direito da Guerra e da Paz” 1632-1639 (c.) Richelieu: “Testamento político” 1642 Hobbes: “Do Cidadão” 1647 Baltazar Gracián :“A Arte da Prudência” 1651 Hobbes: “Leviatã” 1670 Spinoza: “Tratado Teológico-Político” 1677 Spinoza: “Tratado Político” 1683 Cardeal Mazarin: “Breviário dos Políticos” 1688 Leibniz: “Elementos do Direito Natural” 1690 Locke: “Dois Tratados sobre o Governo” 23
  • 24. 1716 François de Callières: “Como negociar com Príncipes” 1748 Hume: “Investigação sobre o Entendimento Humano” 1749 Montesquieu: “O Espírito das Leis” 1754 Rousseau: “Discurso sobre a origem da desigualdade dos homens” 1762 Rousseau: “O contrato social” 1764 Beccaria: “Dos Delitos e das Penas” 1776 Thomas Jefferson:“Declaração de Independência dos Estados Unidos da América” 1787-1788 “Publios” (Alexander Hamilton, John Jay e James Madison): “O Federalista” (em especial Madison (1987) em um comentário sobre a Constituição dos Estados Unidos) 1789 “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” 1789 Bentham: “Introdução aos princípios da moral e da legislação” 1789 Sieyès: “O que é o Terceiro Estado” 1790 Burke: “Reflexões sobre a Revolução Francesa” 1791 Thomas Paine: “Direitos do Homem” 1792 von Humbolt: “Ensaio sobre os limites da atividade do Estado” 1795 Kant: “A paz perpétua” 1797 Kant: “Metafísica dos Costumes” 1808 Ficht: “Discursos à Nação Alemã” 1815 Benjamin Constant: “Princípios da política” 1816 Bentham: “Sofismas Políticos” 1819 Benjamin Constant: “Discurso sobre a Liberdade dos Antigos Comparada com a dos Modernos” 1821 Hegel: “Princípios de Filosofia do Direito” 1832 Carl von Clausewitz: “Da Guerra” 1835 Tocqueville: “A Democracia na América” 1840 Proudhon: “O que é a Propriedade” 1843 Marx: “A questão judaica” 1843 Marx: “Crítica da filosofia hegeliana do direito” 1849 Thoreau: “Desobediência Civil” 1856 Tocqueville: “O Antigo Regime e a Revolução” 1859 Stuart Mill: “Sobre a Liberdade” 1861 Stuart Mill: “Sobre o Governo Representativo” 1896 Mosca: “Elementos de Ciência Política” 1908 Sorel: “Reflexões sobre a Violência” 1909 Croce: “Filosofia da Prática” 1911 Michels: “Os partidos políticos: ensaios sobre as tendências oligárquicas das democracias” 1916 Gentile: “Fundamentos da Filosofia do Direito” 1919 Pareto: “As Transformações da Democracia” 24
  • 25. 1922 Weber: “Economia e Sociedade” 1927 Dewey: “O Público e seus Problemas” 1929 Dewey: “Velho e novo individualismo” 1932 Carl Schmitt: “O Conceito do Político” 1935 Dewey: “Liberalismo e ação social” 1937 Dewey: “A democracia é radical” 1937 Horkheimer: “Teoria tradicional e teoria crítica” 1939 Dewey: “Democracia criativa: a tarefa que temos pela frente” 1942 Horkheimer: “O Estado autoritário” 1942 Schumpeter: “Capitalismo, socialismo e democracia” 1944 Hayek: “O caminho da servidão” 1944 Polanyi: “A Grande Transformação” 1945 Kelsen: “Teoria geral do Direito e do Estado” 1947 Gramsci: “Cadernos do Cárcere” 1950 (c.) Hannah Arendt: “O que é a política?” 1951 Hannah Arendt: “As Origens do Totalitarismo” 1954 Hannah Arendt: “Que é liberdade” 1955 Sartori: “Os Fundamentos da Democracia” 1957 Jones: “Athenian Democracy” 1957 Sartori: “Democracia e definição” 1958 Hannah Arendt: “A condição humana” 1961 Jane Jacobs: “Morte e vida das grandes cidades” 1962 Aron: “Paz e guerra entre as nações” 1963 Hannah Arendt: “Sobre a revolução” 1965 Agard: “What Democracy Meant to the Greeks” 1965 Aron: “Democracia e totalitarismo” 1968 Christophersen: “The Meaning of “Democracy” as Used in European Ideologies from the French to the Russian Revolution” 1969 Berlin: “Quatro ensaios sobre a liberdade” 1973 Macpherson: “Teoria democrática” 1974 Clastres: “A sociedade contra o Estado” 1977 Macpherson: “A democracia liberal e sua época” 1980 Gutman: “Liberal Equality” 1981 Lefort: “A invenção democrática: os limites da dominação totalitária” 1984 Barber: “Strong democracy: participatory politics for a New Age” 1984 Bobbio: “Ética e Política” 1984 Bobbio: “O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo” 1984 Robert Axelrod: “The evolution of cooperation” 1985 Bobbio: “Estado, governo, sociedade: para uma teoria geral da política” 1985 Burnheim: “Is democracy possible? The alternative to electoral politics” 25
  • 26. 1985 Przeworski: “Capitalismo e social democracia” 1986 Cornelius Castoriadis: “Sobre ‘O Político’ de Platão” (edição póstuma (1999) de seminários realizados em 1986) 1987 Agnes Heller: “Princípios Políticos” 1987 Gutman: “Democratic Education” 1987 Sartori: “A teoria democrática revisitada” 1988 Coleman: “Social Capital in the creation of Human Capital” 1988 Humberto Maturana: “Lenguaje, emociones y ética en el quehacer político” 1989 Robert Dahl: “A democracia e os seus críticos” 1991 Fishkin: “Democracy and deliberation” 1991 Huntington: “A terceira onda” 1991 Morgens Hansen: “The Athenian Democracy in the Age of Demosthenes: Structure, Principles, and Ideology” 1991 Przeworski: “Democracia e mercado” 1992 Jürgen Habermas: “Direito e democracia entre facticidade e validade” 1993 (?) Humberto Maturana: “La democracia es una obra de arte” (s. /d). 1993 Chantal Mouffe: “The return of the Political” 1993 Guéhenno: “O fim da democracia” 1993 Humberto Maturana: “Amor y Juego: fundamentos olvidados de lo humano – desde el Patriarcado a la Democracia” (com Gerda Verden-Zöller) 1993 John Rawls: “O liberalismo político” 1993 Robert Putnam: “Making Democracy Works” 1993 Sunstein: “The Partial Constitution” 1994 Andrew Arato & Jean Cohen: “Civil Society and Political Theory” 1994 Hirst: “Associative Democracy: new forms of social and economic governance” 1994 Levy: “A inteligência coletiva” 1996 Bohman: “Public Deliberation” 1996 Budge: “The new challenge of direct democracy” 1996 e ss. Castells: “A Era da Informação: economia, sociedade: A sociedade em rede, O poder da identidade e Fim de milênio” 1996 David Held: “Models of Democracy” 1996 Joshua Cohen: “Procedure and Substance in Deliberative Democracy” 1996 Jürgen Habermas: “Between Facts and Norms: Contributions to a Discourse Theory of Law and Democracy” 1996 Nino: “The Constitution of Deliberative Democracy” 1997 Fishkin: “The voice of the people: public opinion and democracy” 1997 O’Donnell: “¿Democracia delegativa? Contrapuntos. Ensayos escogidos sobre autoritarismo y democratización” 1997 Robert Axelrod: “The complexity of cooperation: agent-based models of competition and collaboration” 26
  • 27. 1997 Walzer: “On toleration” 1998 Axel Honneth: “Democracia como cooperação reflexiva. John Dewey e a teoria democrática hoje” 1998 Finley: “O Legado da Grécia” 1998 I. F. Stone: “O julgamento de Sócrates” 1998 Joshua Cohen: “Democracy and Liberty” 1998 Robert Dahl: “Sobre a democracia” 1998 John Holland: “Emergence: from chaos to order” 1999 Amartya Sen: “Democracia como um valor universal” 1999 Amartya Sen: “Desenvolvimento como liberdade” 1999 Claus Offe: “A atual transição da história e algumas opções básicas para as instituições da sociedade” 1999 Fukuyama: “A grande ruptura: a natureza humana e a reconstituição da ordem social” 1999 Guéhenno: “O futuro da liberdade” 2000 Chantal Mouffe: “The Democratic Paradox” (7) Sei que nem sempre é possível, mas minhas experiências passadas e recentes com projetos coletivos sugerem que seria bom colocar como condição prévia para qualquer empreendimento conjunto a formação ou, pelo menos, a alfabetização democrática dos participantes. (8) Kapuscinski, Ryszard (1978). O Imperador: a queda de um autocrata. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. (9) Montefiore, Simon Sebag (2003). Stálin: a corte do czar vermelho. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. (10) Chang, Jung e Halliday, Jon (2005). Mao: a história desconhecida. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. (11) Sobre isso, valeria a pena conhecer também o livro de Robert Service (2000), “Lênin, a Biography” (traduzido no Brasil como “Lênin: a biografia definitiva”. Rio de Janeiro: Difel, 2007). (12) Cf. Maturana, Humberto & Verden-Zöller, Gerda (1993). Amor y Juego: fundamentos olvidados de lo humano – desde el Patriarcado a la Democracia. Santiago: Editorial Instituto de Terapia Cognitiva, 1997. 27
  • 28. (13) Tal uso da democracia contra a democracia (tomada como regime eleitoral baseado no voto da maioria), substituindo os clássicos golpes de Estado dos anos 60 e 70 do século passado, constitui hoje a nova ameaça à democracia que precisa ser estudada. O banditismo de Estado, em sua forma hard, como na Rússia de Putin, constitui um excelente exemplo da via protoditatorial, mas existem também as formas brandas. Ainda sobre a via protoditarial russa vale a pena ler: 1) o excelente livro da jornalista Anna Politkovskaya (2007), recentemente assassinada pelo regime de Putin, intitulado “Um diário russo” (Rio de Janeiro: Rocco, 2007); 2) “Morte de um dissidente” (2007), de Alex Goldfarb e Marina Litvinenko (São Paulo: Companhia das Letras, 2007); e 3) “A era dos assassinos” (2008), de Yuri Felshtinsky e Vladimir Pribilovski (Rio de Janeiro: Record, 2008). (14) Existem também algumas obras de ficção que ajudam a compreender a natureza e perceber as manifestações – explícitas ou implícitas – do poder vertical. Pouca gente se dá conta de que é possível aprender mais sobre política democrática lendo atentamente esses livros do que estudando volumosos tratados teóricos sobre política. Para quem está interessado na "arte" da política democrática é importantíssimo ler, por exemplo, a série de livros de Frank Herbert, que se inicia com o clássico "Duna". Um curso prático de política democrática deveria recomendar a leitura dos seis volumes que compõem essa série: Dune (1965), Dune Messiah (1969), Children of Dune (1976), God Emperor of Dune (1981), Heretics of Dune (1984) e Chapterhouse: Dune (1985). Herbert faleceu em 1986, quando estava trabalhando no sétimo volume da série. Seus livros foram publicados no Brasil pela Nova Fronteira, com os respectivos títulos: Duna, O Messias de Duna, Os Filhos de Duna, O Imperador- Deus de Duna, Os Hereges de Duna e As Herdeiras de Duna. Um bom - e além de tudo prazeroso – exercício de formação política seria tentar desvendar Duna, do ponto de vista daquelas manifestações do poder vertical que se contrapõem à prática da democracia - quer dizer, das atitudes míticas diante da história, sacerdotais diante do saber, hierárquicas diante do poder e autocráticas diante da política – realizando explorações nesse maravilhoso universo ficcional de Frank Herbert. Existem outras séries de ficção em que se pode aprender muita coisa que os livros de política não ensinam. Destaca-se, em especial, essa formidável mitologia de nossos tempos que consagrou o personagem Darth Vader: a série "Star Wars". Sobre essa série vale a pena ler Decker, Kevin (2005). “Por qualquer meio necessário: tirania, democracia, república e império” in Irwin, William (2005). Star Wars e a filosofia: mais poderoso do que você imagina. São Paulo: Madras, 2005. 28