1. A diretora da Escola Estadual Jornalista Trajano Chacon permitiu que um terceiro explorasse economicamente equipamentos e espaços da escola, em desacordo com os princípios da administração pública.
2. Uma investigação constatou desvios de recursos, prestações de contas falsas e outras irregularidades cometidas pela diretora e pelo terceiro.
3. O Ministério Público propõe uma ação civil pública por ato de improbidade administrativa contra a diretora e o terceiro
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Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da
Capital.
O Ministério Público do Estado de Pernambuco, representado pelo Promotor
de Justiça que a presente subscreve, no uso de suas atribuições legais em defesa
dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, notadamente do
patrimônio público, diante do que consta das peças de informação em anexo
(Inquérito Civil nº 13/09), na forma e com fundamento nos artigos 37, 127 e
129, III, da Constituição da República combinados com os artigos 1º, inciso IV e
5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública); 1º e 25,
inciso IV, alínea a da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público); 1º, 4º, inciso IV, alínea a, 6º, inciso I, da Lei
Complementar nº 12, de 27 de dezembro de 1994 (Lei Orgânica do Ministério
Público do Estado de Pernambuco), artigos 1º e 17, da Lei de Improbidade
Administrativa e nos dispositivos legais adiante invocados, vem a presença de
Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em desfavor de:
Carmem Maria Soares Galvão, brasileira, divorciada, professora, portadora da
Cédula de Identidade nº 1840653, expedida pela SSP-PE e inscrita no CPF – MF
sob o número 317.899.434-34 e;
José Alberto Alves dos Santos, brasileiro, portador da Cédula de Identidade nº
855.611, expedida pela SSP/PE e inscrito no CPF – MF sob o número
127.171.264-49, pelas razões de fato e de direito adiante aduzidas:
DOS FATOS
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Em face das Denúncias formuladas perante a Central de Denúncias deste
Ministério Público de Pernambuco, remetidas à Secretaria de Educação do
Estado, que instaurou Inquérito Administrativo Disciplinar através da Portaria
SE nº 4173/08, a Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital
instaurou o Procedimento de Investigação Preliminar nº 13/09, posteriormente
convertido no Inquérito Civil nº 13/09.
Com efeito, o referido expediente fazia alusão a possíveis irregularidades e má
gestão da servidora Carmem Maria Soares Galvão como diretora da Escola
Estadual Jornalista Trajano Chacon.
Na conclusão do referido procedimento administrativo ficou evidenciado que a
demandada desviava recursos destinados à referida escola pela Secretaria
Estadual de Educação, elaborava prestações de contas falsas, permitia a
exploração pelo demandado de cantina e de uma máquina xérox no interior da
escola, permitia a colocação de outdoors na parte interna da escola e utilização
do estacionamento da escola em datas de grande movimentação na localidade,
não prestando contas dos recursos percebidos por esta cessão do espaço
público, além de não cumprir sua carga horária.
Por sua vez o demandado se beneficiou das mencionadas irregularidades ao
explorar economicamente a cantina, máquina de xérox e estacionamento da
Escola, além de se beneficiar com a venda do fardamento escolar e confecção
das Carteiras de Estudantes.
Do conjunto probatório, vislumbra-se que a demandada efetivamente
descumpriu normas legais e regulamentares, violando assim os princípios da
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Ouvido perante a Comissão processante, a demandada afirmou que:
“Que ele (josé Alberto) não tinha essa autonomia, que ele cumpria ordens
e/ou determinações da Equipe Gestora, esclarecendo que o Sr. Alberto tinha
as chaves do almoxarifado onde se guardava equipamentos eletrônicos e
materiais de uso escolar, esclarecendo que ele era pai de três alunos na
Escola e nessa época ela não tinha funcionários administrativos suficientes
então convidou o Sr. Alberto para colaborar com a Equipe Gestora;
indagada pala Presidente da Comissão que segundo às fls. 05Dos autos
consta que o Sr. Alberto era o responsável pelo almoxarifado da Escola e que
os materiais desse almoxarifado, como papel de ofício e cola eram vendidos
na cantina e na xérox, responde a Interroganda que isso não acontecia,
esclarecendo que o Sr. Alberto comprava resma de papel em uma copiadora
vizinha a GRE Recife Sil
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“Celebrou Contrato de Concessão de Uso para Exploração do espaço da
cantina, com o Sr. José Alberto Alves dos Santos, após a realização de
assembléia com a participação do corpo docente e membros do Conselho
Escolar. Que também não recebia qualquer pagamento por este aluguel e
que na cláusula III do referido contrato consta que o pagamento será feito
através da prestação de serviços gerais mediante critério da direção. Que
também firmou Contrato de Locação de Espaço publicitário com a
Divulgadora de Anúncios em Geral LTDA. CNPJ nº 10.786.424/0001-87 e
que recebe pelo contrato o valor hoje de R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta
reais).(...) Que com os recursos arrecadados com a colocação de Outdoors na
escola por um período de aproximadamente setembro de 2003 a março de
2008 foi feito o pagamento, a título de ajuda de custo, a 02 (dois) porteiros
que estavam cadastrados como Voluntários “Amigos da Escola”. (...) Que a
GRE Sul tinha conhecimento do Contrato e da destinação dos recursos
oriundos do mesmo. Que quando assumiu a Gestão da Escola foi procurada
por flanelinhas para que fosse autorizada a exploração do estacionamento da
escola pelos mesmos durante a realização de eventos no Parque de Exposição
do Cordeiro. Que não autorizou o uso do estacionamento e que a Escola foi
arrombada e o espaço utilizado indevidamente tendo sido à época prestado
Boletim de Ocorrência junto a Delegacia do Sul, a ROCAM, a CPRM e
Patrulha Escolar quando houvesse festividades no Parque de Exposição do
Cordeiro. Que posteriormente foi decidido pelo Conselho Escolar que o
espaço estacionamento seria explorado quando houvesse eventos no Parque
do Cordeiro. (...) que parte do dinheiro era revertido para a compra de
materiais para a pintura da escola e materiais de expediente.(...)Que o Sr.
José Alberto era o responsável pela cantina, pela xérox, pela venda dos
fardamentos e pela emissão de carteiras de estudantes. Que inquirida se o
Sr. José Alberto detinha em seu poder todas as chaves da escola a Depoente
respondeu que o Sr. José Alberto por estar presente nos três turnos detinha
as chaves (...) Que permitia isso pelo fato do Sr. José Alberto estar sempre
disponível para atender as necessidades dos professores. Que inquirida a
respeito das prestações de contas dos recursos recebidos a Depoente informa
que tudo se encontra em ordem e apenas uma das prestações se encontra
com pendência por estar aguardando receber do Banco do Brasil a
microfilmagem de um cheque. Que sempre documenta todos os passos da
Escola comunicando todas as decisões a GRE Recife Sul.
Por sua vez o demandado José Alberto esclareceu à comissao que:
“ Que não é servidor desta Secretaria, (...) que quando a Gestora ganhou a
eleição houve uma reunião do Conselho com os Professores e a Direção da
necessidade de uma cantina dentro da escola,(...) na época a Gestora enviou
à GRE, solicitando esta autorização, mas que não obteve resposta nem
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positiva nem negativa, sobre a copiadora, o Depoente informa que só em
2006 comprou uma máquina porque teve pagamento facilitado e colocou na
escola para atender as necessidades dos alunos, dos professores e da
Escola(...) que fazia o que a Diretora pedia, como por exemplo ajudar a
manter a disciplina, colocar as crianças e adolescentes para dentro da sala
de aula, fiscalizar o pátio, manutenção da estrutura física da escola, como,
por exemplo, quebra de bomba da água, indagado sobre a emissão das
carteiras de estudantes e por que essaatividade era de responsabilidade
exclusiva do mesmo, respondendo o Depoente que antes dele tomar conta
deste serviço sempre apresentava falta de dinheiro e, tendo a Gestora
Imputada realizado uma reunião pedindo ao Depoente para assumir o setor
de carteira de estudante, a partir de 2004(...) que a Escola alugava o
estacionamento e cobrava uma taxa de R$ 3,00 para os veículos que lá
estacionavam, para onde iria esse dinheiro, informando o Depoente que
essa cobrança de estacionamento existia antes da Gestão da Gestora
Imputada e quando ela assumiu a Gestão ela proibiu, só que começou a
haver na escola arrombamento de portões (...) que recebia uma
remuneração por ser Coordenador da Escola Aberta, indagado qual era o
lucro mensal da cantina e copiadora explorada pelo mesmo, o Depoente
responde que mensalmente a copiadora lhe permitia um lucro de R$ 300 a
R$ 400 e qua na cantina o faturamento era melhor, pois era em torno de
R$150,00 por semana(...).”
Foram ouvidas pela Comissão alunos, professores e membros da comunidade
acerca das condutas praticadas pelos demandados.
Ouvida perante a II Comissão de Inquérito Administativo Disciplinar, a
servidora Marta Maria de Lira, professora lotada na GRE Recife Sul informou:
“ Que não existe nenhuma autorização de abertura de cantina na Gerência
Regional; indaga ainda se a GRE acata ou autoriza a locação de espaços da
escola, gerando receita coma finalidade de pagar pessoas que atuam como
voluntários na Escola, respondendo a Depoente que não existe nenhuma Lei
autorizando o Gestor Escolar, nem o Conselho, locar espaço da escola, que a
Lei do Voluntariado já é sem fins lucrativos.(...) Que não havia
transparência como determina a legislação.(...) Que a Gerência nunca
recebeu prestação de contas referentes a estes recursos (outdoors). Indaga
ainda se existe alguma proibição da GRE para instalações de Outdoors nos
pátios das Escolas da Rede Pública, respondendo a Depoente que existe uma
determinação proibindo os outdoors em espaço público.(...)”
Com efeito, a ré foi indiciada pela II Comissão de Inquérito Disciplinar por ter
infringido os artigos 193, incisos I, II, IV, VII e VIII, e 194, inciso V e XII, da Lei
Estadual nº 6123/68, o Estatuto dos Servidores Públicos do Estado de
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Pernambuco. Concluiram, por fim, que a demandada não possui perfil
funcional para assumir a responsabilidade inerente à função à frente de uma
Escola Pública .
Ante o exposto, observa-se que: demandada – Carmem Maria Soares Galvão –
no exercício da Gestão da Escola Estadual Jornalista Trajano Chacon – permitiu
a terceiros, entre eles o demandado José Alberto Alves dos Santos – utilizarem
equipamentos e espaços daquela entidade, adquiridos com recursos públicos,
tudo em desacordo com os princípios regentes da Administração Pública
também aplicáveis no caso concreto.
DO DIREITO
DO ATO DE IMPROBIDADE QUE ATENTOU CONTRA OS PRINCÍPIOS
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (art. 11º da Lei n. 8.429/92)
A Constituição Federal impõe a todas as pessoas que compõem a administração
pública a submissão aos “princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência.” (CF, art. 37, caput).
Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, “o princípio da legalidade explicita
a subordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência
natural da indisponibilidade do interesse público, noção esta que, conforme foi
visto, informa o caráter da relação de administração”.
Em outra oportunidade, obtempera: “fora da lei, portanto, não há espaço para
atuação regular da Administração. Donde, todos os agentes do Executivo,
desde o que lhe ocupa a cúspede até o mais modesto dos servidores que
detenha algum poder decisório, hão de ter perante a lei - para cumprirem
corretamente seus misteres - a mesma humildade e a mesma obsequiosa
reverência para com os desígnios normativos. É que todos exercem função
administrativa, a dizer, função subalterna à lei, ancilar - que vem de ancilla,
serva, escrava”1
Assim é que, ao gestor público ou aqueles outros sujeitos aos mesmos
regramentos não é possível, ao seu bel prazer e sob o pretexto de formular
contratos de locação, estabelecer primazia de um dado particular sobre as ações
do ente administrativo. É necessário que a atuação do ente público se encontre
em perfeito alinhamento com os princípios estabelecidos no artigo 37 e, em
especial na presente hipótese, os da legalidade, impessoalidade e moralidade.
1 Celso Antonio Bandeira de Mello in “Desvio de Poder”, in RDP 89/24, p. 24. e
“Discricionariedade e Controle Jurisdicional”, Malheiros Editores, 2ª ed., 1993, p. 50.
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No caso concreto, é inafastável a desconformidade dos contratos de locação e
cessão do espaço público com o princípio constitucional da legalidade.
No tocante à impessoalidade, é oportuno relembrar a lição de Hely Lopes
Meirelles, segundo a qual este princípio “referido na Constituição de 1988
(artigo 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual
impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o
fim legal é unicamente aquele que a norma de direito indica expressa ou
virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal”2
No caso sob exame, é incontrastável que a gestora da Escola Estadual Trajano
Chacon concedeu a José Alberto Alves dos Santos a primazia, quando da
formalização e da execução dos referido contrato de concessão de uso dos
espaços da cantina e xérox.
No tocante ao princípio da moralidade é necessário observar o ensinamento de
Maria Sylvia Zanella de Pietro no sentido em que “não é preciso penetrar na
intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isto ocorre
quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de
honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à
boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições. A moralidade exige
proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios
impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens
usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos
cidadãos. Por isso mesmo, a imoralidade salta aos olhos quando a
Administração Pública é pródiga em despesas legais, porém inúteis, como
propaganda ou mordomia, quando a população precisa de assistência médica,
alimentação, moradia, segurança, educação, isso sem falar no mínimo
indispensável à existência digna. Não é preciso, para invalidar despesas desse
tipo, entrar na difícil análise dos fins que inspiraram a autoridade; o ato em si, o
seu objeto, o seu conteúdo, contraria a ética da instituição, afronta a norma de
conduta aceita como legítima pela coletividade administrada. Na aferição da
imoralidade administrativa, é essencial o princípio da razoabilidade”.3
A situação fática embasadora da presente ação civil pública é, por completo,
incompatível com os preceitos morais regentes da Administração Pública. Com
efeito, o citado contrato é tão somente uma tentativa de revestir de legalidade e
legitimidade a utilização de equipamentos públicos, a fim de particular
explorar empresa.
2 Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo brasileiro, 21ª Edição, São Paulo, Malheiros, 1995,
página 82
3
Maria Sylvia Zanella di Pietro, in Discricionariedade administrativa na Constituição de 1998. São
Paulo, Atlas, 1991, pagina 111
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Do princípio da legalidade e da moralidade decorre, também, o princípio da
probidade administrativa, que tem o seguinte sentido, conforme lição de
Wallace Paiva Martins Júnior:
“A adoção do princípio da probidade administrativa no ordenamento jurídico valoriza a
implementação prática do princípio da moralidade administrativa, conferindo à Nação,
ao Estado, ao povo, enfim, um direito público subjetivo a uma Administração Pública
proba e honesta (e a ter agentes públicos com essas mesmas qualidades), através de
meios e instrumentos preventivos e repressivos (ou sancionadores) da improbidade
administrativa. O princípio da probidade administrativa colabora para o direito
administrativo na diminuição da insindicabilidade do ato administrativo discricionário,
para o estabelecimento de uma Administração Pública mais eficiente, na medida em que
se dirige à consecução da noção de bem e melhor administrar (da escolha dos meios mais
adequados, coerentes e proporcionais para a satisfação de seus fins e alcance do interesse
público).” (Probidade Administrativa. 2ª ed., págs. 100/101).
Especificamente neste casos, sustenta aquela autora citada por Decomain que
“ao primeiro tipo de desvio de poder, ou seja, aquela em que o agente
prossegue fim de interesse privado, seja para implementação de desejos e
ambição pessoais ou de terceiros, evidentemente configura-se grave ofensa à
norma jurídico-administrativa de sua competência, porquanto não contente em
se desviar de fim genérico de interesse público, deixa-se o agente guiar, no
exercício de um poder que lhe foi conferido para atuar em nome e
representação do Estado, para fazer valer os altos desígnios desse, por paixões
pessoais, por desejos de favoritismo ou de perseguições, vindo, com isso, não só
a infringir a regra de competência, mas a provocar grave ofensa ao princípio da
igualdade dos administrados perante a Administração, a qual tem a sua gênese
no próprio plano constitucional que consagra a igualdade de todos perante a
lei. Evidentemente, o ato é nulo, invalidade absoluta essa causada pela
desconformidade do ato emanado, em sua finalidade, com aquele fim
imputado ao poder do agente pela norma legal. Há a configuração de desvio de
poder.”
No caso presente, necessário se observar que a então gestora, deliberada e
intencionalmente, privilegiou terceira pessoa, ao contratar sem licitação
permitindo a exploração de atividade econômica dentro da Escola. E tal foi
feito, com a consciência de que seus termos e conteúdo reproduziam fim
proibido à Administração Pública.
A Lei de Improbidade Administrativa prevê hipóteses de comportamentos,
definindo-os como atos de improbidade administrativa, cuja incidência
determina sanções civis aos agentes públicos faltosos, cumulativamente com
sanções penais e administrativas.
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No tocante à delimitação dos sujeitos ativos da improbidade administrativa,
tem-se no artigo 2º que: “reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo
aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por
eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de
investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades
mencionadas no artigo anterior.” Além disto, preceitua o art. 3º que: As
disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não
sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade
ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.
Ante o exposto, observa-se que tanto a demandada Carmem Maria Soares
Galvão, quanto José Alberto Alves dos Santos são sujeitos ativos dos atos de
improbidade administrativa.
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE. RECURSOS FINANCEIROS
DESTINADOS À ESCOLA PÚBLICA. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
PROCEDENCIA DO PEDIDO.
1.O MPDFT detém legitimidade ativa para propor ação de improbidade administrativa
contra ocupantes do cargo de direção em pessoa jurídica de direito privado (APAM -
Associação de Pais, Alunos e Mestres), se incumbida de administrar, além de valores
arrecadados diretamente no mercado aberto, transferências orçamentárias da Secretaria de
Estado de Educação para custeio das escolas públicas, em execução aos programas
governamentais de desenvolvimento do setor (PDDE - Programa Dinheiro Direto na
Escola, FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, e PDRF - Programa de
Descentralização de Recursos Financeiros).
2.O ato ímprobo se caracteriza pelo resultado de dano ao patrimônio público, causado por
quem tinha o dever legal de administrar com honestidade, eficiência e transparência e não
alcança o propósito final. Por isso não há que se perquirir acerca da existência de dolo.
3.Configura ato de improbidade administrativa a movimentação de recursos públicos em
conta bancária particular dos ocupantes de cargo de direção destinados ao custeio das
escolas públicas.
4.Incabível na fase de liquidação de sentença a definição de valores acrescidos ao
patrimônio dos administradores ímprobos, que há de ser procedida no curso do processo,
sob ampla dilação probatória.
5.Recursos conhecidos e desprovidos.(20050110648725APC, Relator SANDOVAL
OLIVEIRA, 4ª Turma Cível, julgado em 06/09/2011, DJ 22/09/2011 p. 121)”
Conforme a adequação legal, em síntese, os atos que caracterizam improbidade
administrativa, segundo os efeitos resultantes, podem ser classificados em três
categorias diversas: a) atos de improbidade administrativa que importam
enriquecimento ilícito (art. 9º); b) atos de improbidade administrativa que
causam prejuízo ao erário (art. 10º); e c) atos de improbidade administrativa
que atentam contra os princípios da administração pública (art. 11º).
Na espécie, a requerida Carmen Maria Soares Galvão, servidora pública,
inscrita sob a matrícula nº 157.868-5, praticou atos de improbidade
administrativa que atentam contra os princípios da administração pública (art.
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11º, caput, da Lei de Improbidade Administrativa):
“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e
notadamente:”
Discorrendo sobre o dever de probidade, Diógenes Gasparini pondera que: “Esse
dever impõe ao agente público o desempenho de suas atribuições sob pautas
que indicam atitudes retas, leais, justas, honestas, notas marcantes da
integridade do caráter do homem. É nesse sentido, do reto, do leal, do justo e
do honesto que deve orientar o desempenho do cargo, função ou emprego
junto ao Estado ou entidade por ele criada, sob pena de ilegitimidade de suas
ações.” (Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 51)
À vista do relatado, têm-se que: a formalização e execução de Contrato de
Concessão e Uso entre a Escola Estadual Jornalista Trajano Chacon e o senhor
José Alberto Alves dos Santos com o intuito de exploração dos serviços da
cantina e xérox locação; da formalização e execução de Contrato de Locação de
Espaço Publicitário entre a Escola Estadual Jornalista Trajano Chacon e a
Divulgadora de Anúncio em Geral, LTDA. com o intuito de instalar 04
tabuletas de outdoor destinadas à divulgação de mensagens publicitárias; a
falta de transparência e prestações de contas devidas pela Gestora desta Escola,
configura-se atos de improbidade administrativa, previstos no artigo 11, Incisos
I, IV e VI da Lei 8.429/92, por parte da gestora daquela Unidade Escolar
Estadual.
DAS SANÇÕES DECORRENTES DA PRÁTICA DE ATO DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
A Constituição Federal ao consagrar o princípio da probidade administrativa e
a Lei n. 8.429/92 ao tipificar as condutas consideradas como ímprobas, não
poderia deixar de cominar sanções para a prática dos atos de improbidade
administrativa.
O parágrafo quarto, do artigo 37, da Constituição Federal prevê as seguintes
sanções, verbis:
“Art. 37 [...] § 4º - Os atos de improbidade administrativa,
importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função
pública, a indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, na
forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal
cabível".
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Já a Lei n. 8.429/92, prevê em seu art. 12, inciso III, as seguintes penas para os
agentes que praticarem ato de improbidade administrativa que importem
enriquecimento ilícito, verbis:
“Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e
administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável
pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações:
II - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver,
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a
cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da
remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o
Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de
pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três
anos.
Assim, têm-se que:
* A demandada Carmen Maria Soares Galvão, na qualidade de gestora da
Escola Estadual Trajano Chacon, de modo livre e consciente, autorizou a
realização dos referidos Contratos e colocou à disposição de terceiro recursos
materiais para o atendimento de seus interesses privados em detrimento das
obrigações para com a coletividade.
* O demandado José Alberto Alves dos Santos também responde por ato de
improbidade administrativa ex vi o disposto no artigo 3º da Lei nº 8.429/9216,
vez que foi beneficiado diretamente através da execução do dito ajuste.
2. DOS PEDIDOS
1. Do Pedido de Mérito
Ante todo o exposto, depois de autuada e recebida a presente petição inicial
com os documentos que a instruem (arts. 282/283 do Código de Processo Civil),
requer o Ministério Público a Vossa Excelência seja julgada procedente a
presente pedido para:
Nos termos art. 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92, para condenar:
a. A demandada Carmem Maria Soares Galvão, na qualidade de Gestora da
Escola Estadual Jornalista Trajano Chacon, suspensão dos direitos políticos de
três a cinco anos, pagamento de multa civil equivalente a cem vezes o valor da
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remuneração percebida e proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo
de três anos;
b. O demandado José Alberto Alves dos Santos, na suspensão dos direitos
políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil e proibição de contratar
com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,
direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual
seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;
c. Sejam os valores relativos às multas civis destinados aos cofres do Estado de
Pernambuco.
2. Dos Requerimentos Finais
Como medida de ordem processual, requer a notificação e posterior citação
para que, querendo, apresentem respostas, no prazo legal, sob pena de
presumirem-se verdadeiros os fatos ora alegados (art. 17 da Lei nº 8.429/1992)
dos demandados:
Carmem Maria Soares Galvão, com endereço na Rua José Felipe Santiago, nº
150, Iputinga, Recife-PE, CEP nº: 50.680.
José Alberto Alves dos Santos, com endereço na Rua Pierre Curie nº 107,
Cordeiro, Recife-PE
A intimação do Estado de Pernambuco, com endereço na Rua do Sol, 147, Santo
Antonio, nesta cidade, na pessoa do seu Procurador-Geral, para que, querendo,
intervenha nos autos no pólo ativo ou passivo desta ação;
Requer, por derradeiro:
1. O recebimento da presente ação sob o rito ordinário;
2. Isenção de custas, emolumentos, honorários e outras despesas na
conformidade do que dispõe o artigo 18 da LACP;
3. Condenação dos Réus no pagamento das custas processuais, honorários
advocatícios, estes calculados à base de 20% (vinte por cento) sobre o valor total
da condenação e demais cominações de direito decorrentes da sucumbência;
4. A produção de todos os meios de prova em direito permitidos.
12. Ministério Público do Estado de Pernambuco
Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital
Rua 1º de Março nº 100 – Santo Antonio – Recife/PE – CEP: 50010-070 – Fone (81) 3182-7273
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Dá à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para efeitos fiscais.
Nestes Termos
P. Deferimento
Recife, 02 de dezembro de 2011
Charles Hamilton Santos Lima
26º Promotor de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital