1. F´
ısica Moderna
para iniciados, interessados e aficionados
Ivan S. Oliveira
Ph.D. Oxford
Departamento de Mat´ria Condensada e F´
e ısica Estat´
ıstica
Centro Brasileiro de Pesquisas F´ ısicas
2. Notas do Autor
Escrever um livro sobre f´ ısica moderna como este exige um bocado de
esp´ırito de risco em rela¸˜o ao pr´prio trabalho. Alguns colegas poder˜o
ca o a
achar este esfor¸o fatalmente in´ til, por considerarem quase imposs´
c u ıvel
para o “pedestre comum” compreender as estranhas id´ias da rainha e
das ciˆncias no s´culo XX. Discordo frontalmente; n˜o ´ preciso ser
e e a e
um Villa-Lobos para “arrancar” alguns acordes. A minha motiva¸˜o ca
ao abra¸ar tal empreitada ´ muito simples: tenho certeza que meni-
c e
nos e meninas ao final do ensino m´dio, com um certo esfor¸o, s˜o
e c a
capazes de entender os conceitos da f´ ısica do s´culo XX somente com a
e
matem´tica que j´ aprenderam. Esta certeza nasceu, em parte, do meu
a a
breve conv´ ıvio com alguns destes estudantes no chamado Programa
de Voca¸˜o Cient´
ca ıfica, iniciado na Fiocruz, e adotado no CBPF ao
final de 1997, e em parte devido a um interesse particular por desafios
deste tipo. Ap´s algum tempo trabalhando somente com estudantes de
o
mestrado e doutorado, foi uma agrad´vel surpresa descobrir a curiosi-
a
dade cient´ ıfica, ainda sem v´ ıcios, e o desembara¸o de estudantes t˜o
c a
jovens. Assist´ ı-los apresentando semin´rios ou em frente a um painel,
a
explicando sem cerimˆnia o que aprenderam para uma audiˆncia de ci-
o e
entistas profissionais, foi uma surpresa que me causou grande est´ ımulo.
Contudo, o texto n˜o ´ dirigido somente para alunos do ensino
a e
m´dio, mas tamb´m para todos os que se consideram iniciados, in-
e e
teressados ou aficionados. Dentre estes incluem-se alunos no in´ de ıcio
gradua¸˜o em engenharias, qu´
ca ımica, e qualquer pessoa que tenha in-
teresse em f´ ısica moderna, e que conhe¸a a matem´tica do segundo
c a
grau. Acredito que o texto ser´ particularmente util para professores
a ´
do segundo grau, e alunos dos cursos em licenciatura. Aqui uma cons-
tata¸˜o: o livro n˜o ´ um livro texto no sentido usual, mas tamb´m n˜o
ca a e e a
´ um livro de divulga¸˜o como outros tantos. Tentei atingir um balan¸o
e ca c
entre as duas abordagens. A raz˜o ´ que com pouqu´
a e ıssima matem´tica
a
pode-se ir muito al´m do que se conseguiria sem nenhuma.
e
A matem´tica ´ a linguagem natural da f´
a e ısica. Qualquer pessoa que
deseje conhecer f´ ısica com alguma profundidade, n˜o poder´ ignorar a
a a
matem´tica. A raz˜o ´ t˜o simples quanto fascinante: os fenˆmenos
a a e a o
da Natureza obedecem a equa¸˜es matem´ticas! Um buraco negro ´
co a e
uma solu¸˜o de um conjunto de equa¸˜es matem´ticas; um eco de spins
ca co a
i
3. tamb´m, ondas eletromagn´ticas idem. Podemos lan¸ar sat´lites, ex-
e e c e
trair energia dos n´ cleos dos atomos, conhecer a idade do Universo, ob-
u ´
servar as imagens de um c´rebro humano em funcionamento, ou ainda
e
sonhar com computadores quˆnticos e computadores biol´gicos, gra¸as
a o c
a
` compreens˜o matem´tica que temos dos fenˆmenos naturais.
a a o
Acredito que a abordagem matem´tica utilizada neste texto o torna
a
acess´ a todos aqueles que tenham interesse pela f´
ıvel ısica e seus fasci-
nates problemas no s´culo XX. O leitor precisar´ ter no¸˜o do que seja
e a ca
uma fun¸˜o e conhecer algumas opera¸˜es alg´bricas elementares, ao
ca co e
n´ do que se aprende no segundo grau de nossas boas escolas. Al-
ıvel
guns cap´ ıtulos s˜o mais t´cnicos do que outros, e podem parecer mais
a e
dif´ıceis. Aqueles que n˜o se impressionarem com s´
a ımbolos, e tiverem um
pouco de paciˆncia, n˜o encontrar˜o dificuldades em seguir os argumen-
e a a
tos. Aqueles outros que possu´ ırem apetite especial para matem´tica, a
encontrar˜o material suplementar em alguns dos pain´is inseridos ao
a e
longo do texto. Aos que “odeiam” matem´tica, mas possuem inter-
a
esse por certas areas da f´
´ ısica, recomendo que simplesmente ignorem as
f´rmulas e sigam adiante. O aproveitamento depender´ neste caso do
o a
cap´ ıtulo e da experiˆncia do leitor em achar o “caminho das pedras”!
e
O s´culo XX foi o s´culo da f´
e e ısica. Avan¸os espetaculares na com-
c
preens˜o dos fenˆmenos naturais (se ´ que podemos realmente afir-
a o e
mar que “compreendemos” o que significa o tempo dilatar ou uma
fun¸˜o de onda colapsar!) desaguaram em tecnologias nunca antes
ca
sonhadas, e em discuss˜es filos´ficas t˜o infind´veis quanto interes-
o o a a
santes. Nosso conhecimento sobre a Natureza avan¸a vertiginosamente,
c
e ´ imposs´ dizer como ele, e a tecnologia que dele decorre, v˜o es-
e ıvel a
tar ao final do s´culo XXI! Computadores quˆnticos realizando tele-
e a
porte e calculando com velocidade inimagin´vel, gerando c´digos crip-
a o
togr´ficos indecifr´veis; todas as maravilhas prometidas pela chamada
a a
nanociˆncia decorrente da manipula¸˜o de materiais em escala atˆmica,
e ca o
como circuitos eletrˆnicos moleculares; transporte de energia sem dis-
o
sipa¸˜o em supercondutores; novos dados observacionais sobre a ex-
ca
pans˜o do Universo, desafiando modelos cosmol´gicos; novas teorias
a o
sobre os constituintes elementares da mat´ria. Estas s˜o apenas algu-
e a
mas das tendˆncias mais atuais.
e
Acredito que nossos cursos, tanto introdut´rios quanto intermedi´rios,
o a
devessem “concentrar fogo” sobre essa “nova f´ ısica”, e n˜o estagnar
a
ii
4. sobre conceitos formulados h´ 300 anos que, de certa forma, ficaram
a
“soterrados” no in´ ıcio do s´culo XX. A maioria dos nossos jovens s´
e o
conhece Einstein pela explorada fotografia da careta, e o associam a `
f´rmula E = mc2 . E preciso separar os resultados das suas dedu¸˜es.
o ´ co
Deduzir a express˜o matem´tica E = mc2 como conseq¨ˆncia l´gica de
a a ue o
alguns postulados simples, ´ consideravelmente t´cnico para um estu-
e e
dante em fase inicial. Mas isso n˜o quer dizer que ele n˜o possa com-
a a
preender o que esta f´rmula significa, e quais s˜o as suas implica¸˜es! O
o a co
mesmo se pode dizer sobre a mecˆnica quˆntica, sobre a f´
a a ısica nuclear,
sobre o magnetismo, sobre a supercondutividade, etc. Obviamente n˜o a
´ preciso que um estudante de medicina seja Ph.D. em f´
e ısica para ir
al´m dos bot˜es dos equipamentos, e entender um pouco dos princ´
e o ıpios
da ressonˆncia magn´tica nuclear, fenˆmeno f´
a e o ısico que o auxiliar´ com
a
os seus pacientes!
Resumindo, este livro ´ um laborat´rio. Inevitavelmente muitos
e o
t´picos importantes ficaram de fora, como em qualquer outro livro com
o
um n´ mero manuse´vel de p´ginas. Ao me convencer de que ele n˜o
u a a a
poderia ser um livro texto como os usuais, me senti livre para experi-
mentar um estilo descontra´ ıdo, que em geral funciona nos meus cursos
na p´s-gradua¸˜o do CBPF. Afinal, para um carioca incorrig´ como
o ca ıvel
eu, ficar longe do bom humor e do sarcasmo pode ser sintoma de doen¸a c
grave. Espero que esta combina¸˜o pouco ortodoxa seja util para o
ca ´
leitor.
Ivan S. Oliveira
iii
5. Agradecimentos
Gostaria de agradecer aos seguintes amigos e companheiros de labuta:
Dr. Luis A. C. P. da Mota do Instituto de F´ ısica da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (companheiro infal´ de muita pizza e muita
ıvel
f´
ısica nos g´lidos s´bados de Oxford); ao meu querido amigo Dr. Edi-
e a
som Moreira Jr., do Departamento de Matem´tica e Computa¸˜o do
a ca
Instituto de Ciˆncias da Escola Federal de Engenharia de Itajub´; Dr.
e a
Jos´ Abdalla Helay¨l Neto, do Departamento de Campos e Part´
e e ıculas
do Centro Brasileiro de Pesquisas F´ ısicas, ao ex-aluno, agora amigo e
colaborador, Engenheiro Salvador Barreto Belmonte e ao Dr. Alberto
Passos Guimar˜es, amigo e mentor de longa data, do Departamento
a
de Mat´ria Condensada e F´
e ısica Estat´ıstica do Centro Brasileiro de
Pesquisas F´ ısicas. Checou todas as v´ ırgulas, colocou todas as tremas e
corrigiu todas as crases! Ao meu bom amigo alem˜o, Dr. Stefan Jorda,
a
e ao amigo Dr. Vitor Luiz Bastos de Jesus, a quem pude sugerir algu-
mas id´ias e de quem aprendi outras tantas. Aos colegas do Instituto de
e
F´ısica Gleb Wataghin da UNICAMP, Drs. Marcelo Knobel e Leandro
R. Tessler, pelo encorajamento e incentivo. Quero tamb´m agradecer
e
a
` minha esposa, Dra. Rosinda Martins Oliveira, entusiasmada neuro-
psic´loga. Enquanto muitos autores agradecem as respectivas esposas
o `
pela “compreens˜o”, “paciˆncia”, “est´
a e ımulo”, etc., tenho a sorte de ter
tido o mesmo, e ainda contar com algo mais. Crescemos juntos, e esta-
mos ambos familiarizados com as belezas desta estrada, mas tamb´m e
com seus “buracos” e “ped´gios”. Foi ela quem primeiro leu o livro e
a
fez as primeiras cr´ ıticas e sugest˜es. E gostou!
o
iv
6. .
Para
J´lio e Maur´cio
u ı
meu melhor incentivo
v
7. Ganhadores do Prˆmo Nobel de F´ 1
e ısica
1901. Wilhelm Konrad R¨ntgen - pela descoberta dos raios-X.
o
1902. Hendrik Antoon Lorentz e Pieter Zeeman - pelas suas pesquisas
sobre radia¸˜o.
ca
1903. Antoine Henri Becquerel e Pierre Curie - pela descoberta da
radioatividade espontˆnea.
a
1904. John William Strutt (Lord Rayleigh) - pela descoberta do argˆnio. o
1905. Philipp Eduard Anton von Lenard - pelos seus trabalhos sobre os
raios cat´dicos.
o
1906. Joseph John Thompson - pelos seus trabalhos sobre a condutividade
el´trica dos gases.
e
1907. Albert Abraham Michelson - pelos seus trabalhos com instrumentos
o
´pticos de precis˜o.
a
1908. Gabriel Lippmann - pelos seus trabalhos com cores e fenˆmenos de o
interferˆncia.
e
1909. Guglielmo Marconi e Carl Ferdinand Braun - pelas suas con-
tribui¸˜es ao desenvolvimento do tel´grafo sem fio.
co e
1910. Johannes Diderik van der Waals - pelos seus estudos sobre a equa¸˜o ca
de estados de gases e l´
ıquidos.
1911. Wilhelm Wien - pelos seus estudos sobre radia¸˜o de calor.
ca
1912. Nils Gustaf Dal´n - pela inven¸˜o de reguladores autom´ticos utiliza-
e ca a
dos na ilumina¸˜o de far´is.
ca o
1913. Heike Kamerlingh Onnes - pela liquefa¸˜o do h´lio.
ca e
1914. Max von Laue - pela descoberta da difra¸˜o de raios-X por cristais.
ca
1915. William Henry Bragg e William Lawrence Bragg - pelos seus
estudos sobre a estrutura de cristais utilizando difra¸˜o de raios-X.
ca
1917. Charles Glover Barkla - pela descoberta dos raios-X caracter´ ısticos
dos elementos.
1918. Max Plank - pela descoberta do quantum de energia.
1919. Johannes Stark - pelos seus trabalhos com o Efeito Doppler.
´
1920. Charles-Edounard Guillaume - pelos seus trabalhos em medidas de
precis˜o.
a
1921. Albert Einstein - pelos seus trabalhos em f´ ısica te´rica, em particular
o
pela explica¸˜o do efeito fotoel´trico.
ca e
1922. Niels Bohr - pelas suas investiga¸˜es sobre a estrutura do atomo.
co ´
1923. Robert Andrews Millikan - pelos seus trabalhos sobre a carga ele-
mentar e sobre o efeito fotoel´trico.
e
1924. Karl Manne Georg Siegbhan - pelas suas pesquisas sobre espectro-
scopia de raio-X.
1
Parcialmente compilado de: Fundamentals of Physics, D. Halliday e R. Resnick,
3a. Ed., John Wiley & Sons (Nova Iorque, 1988)
vi
8. 1925. James Frank e Gustav Hertz - pelos seus trabalhos sobre o impacto
de el´trons em ´tomos.
e a
1926. Jean Baptiste Perrin - pelos seus trabalhos sobre a estrutura da
mat´ria.
e
1927. Arthur Holly Compton e Charles Thompson Rees Wilson - pelo
m´todo de condensa¸˜o de vapor para tornar trajet´rias de part´
e ca o ıculas vis´ ıveis.
1928. Owen Willans Richardson - pelos seus trabalhos sobre o efeito ter-
moiˆnico.
o
1929. Louis-Victor de Broglie - pela descoberta da natureza ondulat´ria o
do el´tron.
e
1930. Chandrasekhara Venkata Raman - pelos seus trabalhos sobre es-
palhamento de luz.
1932. Werner Heisenberg - pela cria¸˜o da Mecˆnica Quˆntica.
ca a a
1933. Erwin Schr¨dinger e Paul Adrien Maurice Dirac - pelos seus
o
trabalhos sobre a teoria atˆmica.
o
1935. James Chadwick - pela descoberta do nˆutron. e
1936. Victor Franz Hess e Carl David Anderson - pela descoberta do
p´sitron.
o
1937. Clinton Joseph Davisson e George Paget Thompson - pelos seus
trabalhos sobre a difra¸˜o de el´trons por cristais.
ca e
1938. Enrico Fermi - pela descoberta dos elementos transurˆnicos.a
1939. Ernest Orlando Lawrence - pela inven¸˜o do acelerador c´
ca ıclotron.
1943. Otto Stern - pela descoberta do momento mang´tico do pr´ton.
e o
1944. Isidor Isaac Rabi - pelos seus estudos em ressonˆncia magn´tica
a e
nuclear.
1945. Wolfgang Pauli - pela descoberta do Princ´ ıpio de Exclus˜o.
a
1946. Percy Williams Bridgeman - pelos seus trabalhos em f´ ısica de alta
press˜o.
a
1947. Edward Victor Appleton - pelos seus trabalhos sobre f´ ısica at-
mosf´rica.
e
1948. Patrik Maynard Stuart Blackett - pelas suas descobertas em f´ ısica
nuclear e radia¸˜o c´smica.
ca o
1949. Hideki Yukawa - pela previs˜o te´rica da existˆncia do m´son.
a o e e
1950. Cecil Frank Powel - pelo desenvolvimento de m´todos fotogr´ficos no
e a
estudo de processos nucleares.
1951. John Douglas Cockcroft e Ernest Thomas Sinton Walton - pelos
seus trabalhos sobre a transmuta¸˜o de n´cleos atˆmicos utilizando aceleradores de
ca u o
part´ıculas.
1952. Felix Bloch e Edward Mills Purcell - pelos suas descobertas em
ressonˆncia magn´tica nuclear.
a e
1953. Fritz Zernike - pela inven¸˜o de novas t´cnicas de microscopia.
ca e
1954. Max Born - pela interpreta¸˜o estat´
ca ıstica da fun¸˜o de onda.
ca
1955. Willis Eugene Lamb - pelos seus trabalhos sobre a estrutura fina do
a
´tomo de hidrogˆnio. Polykarp Kush - pela determina¸˜o precisa do momento
e ca
vii
9. magn´tico do el´tron.
e e
1956. William Shockley, John Bardeen e Walter Houser Brattain -
pelos seus trabalhos em semicondutores e transistores.
1957. Chen Ning Yang e Tsung Dao Lee - pelos seus trabalhos sobre as
leis de paridade em part´ ıculas elementares.
cˇ
1958. Pavel Aleksejeviˇ Cerenkov, Il’ja Michajloviˇ Frank e Igor’Evegen’
c
ˇ
eviˇ Tamm - pela descoberta do efeito Cerenkov.
c
1959. Emilio Gino Segr` e Owen Chamberlain - pela descoberta do
e
antipr´ton.
o
1960. Donald Arthur Glaser - pela inven¸˜o da cˆmara de bolhas.
ca a
1961. Robert Hofstadter - pelos seus trabalhos sobre espalhamento de
el´trons por n´ cleos. Rudolf Ludwig M¨ssbauer - pela descoberta do efeito
e u o
M¨ssbauer.
o
1962. Lev Davidoviˇ Landau - pelos seus trabalhos em mat´ria condensada.
c e
1963. Eugene P. Wigner - pelas suas contribui¸˜es ` teoria nuclear e de
co a
part´ ıculas. Maria Geoppert Mayer e J. Hans D. Jensen - pela descoberta da
estrutura de camadas nuclear.
1964. Charles H. Townes, Nikolai G. Basov e Alexander M. Pro-
chorov - pelos seus trabalhos em eletrˆnica quˆntica.
o a
1965. Sin-Itiro Tomonaga, Julian Schwinger e Richard P. Feynman -
pelos seus trabalhos em eletrodinˆmica quˆntica.
a a
1966. Alfred Kastler - pela descoberta e desenvolvimento de m´todos opticos
e ´
para o estudo de ressonˆncias em atomos.
a ´
1967. Hans Albrecht Bethe - pelas suas contribui¸˜es ` teoria das rea¸˜es
co a co
nucleares.
1968. Luis W. Alvarez - pelos seus trabalhos em part´ ıculas elementares.
1969. Murray Gell-Mann - pelos seus trabalhos em part´ ıculas elementares.
1970. Hannes Alv´n - pelos seus trabalhos em magnetohidrodinˆmica. Louis
e a
N´el - pelas suas descobertas sobre antiferromagnetismo e ferrimagnetismo e suas
e
aplica¸˜es ao estado s´lido.
co o
1971. Dennis Gabor - pela descoberta dos princ´ da holografia.
ıos
1972. John Bardeen, Leon N. Cooper e J. Robert Schrieffer - pelo
desenvolvimento da teoria da supercondutividade.
1973. Leo Esaki - pela descoberta do tunelamento em semicondutores. Ivar
Giaever - pela descoberta do tunelamento em supercondutores. Brian D. Joseph-
son - pela descoberta da supercorrente atrav´s de jun¸˜es em supercondutores.
e co
1974. Antony Hewish - pela descoberta dos pulsares. Martin Ryle - pelo
seu trabalho em radio-astronomia.
1975. Aege Bohr, Ben Mottelson e James Rainwater - pelos seus tra-
balhos sobre a estrutura nuclear.
1976. Burton Richter e Samuel Chao Chung Ting - pelas suas descober-
tas de uma part´ ıcula fundamental.
1977. Philip Warren Anderson, Nevill Francis Mott e John Has-
brouck Van Vleck - pelas suas investiga¸˜es em materiais magn´ticos e sistemas
co e
viii
10. desordenados.
1978. Peter L. Kapitza - pelos seus trabalhos em f´ ısica a baixas temper-
aturas. Arno A. Penzias e Robert Woodrow Wilson - pela descoberta da
radia¸˜o de fundo do Universo.
ca
1979. Sheldon Lee Glashow, Abdus Salam e Steven Weinberg - pela
teoria unificada da intera¸˜o eletrofraca.
ca
1980. James W. Cronin e Val L. Fitch - pela descoberta de viola¸˜es em co
princ´ıpios fundamentais de simetria no decaimento de m´sons K.
e
1981. Nicolaas Bloembergen e Arthur Leonard Schawlow - pelas suas
contribui¸˜es ` espectroscopia de laser. Kai M. Siegbahn - pelas suas con-
co a
tribui¸˜es ` espectroscopia de el´tron.
co a e
1982. Kenneth Geddes Wilson - pelos seus estudos sobre fenˆmenos cr´
o ıticos
na mat´ria.
e
1983. Subrehmanyan Chandrasekhar - pelos seus estudos sobre a evolu¸˜o ca
das estrelas. William A. Fowler - pelos seus estudos sobre a forma¸˜o de elemen-
ca
tos qu´ ımicos no Universo.
1984. Carlo Rubia e Simon van der Meer - pelas suas contribui¸˜es ` co a
descoberta das part´ ıculas W e Z.
1985. Klaus von Klitzing - pela descoberta do efeito Hall quˆntico.
a
1986. Ernst Ruska - pela descoberta do microsc´pio eletrˆnico. Gerd Bin-
o o
nig - pela descoberta da varredura de tunelamento. Heinrich Rohrer - pela
inven¸˜o do microsc´pio eletrˆnico por varredura de tunelamento.
ca o o
1987. Karl Alex M¨ ller e J. George Bednorz - pela descoberta dos
u
supercondutores de alta temperatura cr´ ıtica.
1988. Leon M. Lederman, Melvin Schwartz e Jack Steinberger - pelas
suas pesquisas sobre a estrutura dos l´ptons.
e
1989. Norman F. Ramsey, Hans G. Dehmelt e Wolfgang Paul - pelo
desenvolvimento da t´cnica de aprisionamento de ´
e ıons.
1990. Jerome I. Friedman, Henry W. Kendall e Richard E. Taylor -
pelas suas investiga¸˜es sobre o espalhamento inel´stico de el´trons em pr´tons e
co a e o
nˆutrons.
e
1991. Pierre-Gilles de Gennes - pelos seus estudos em cristais l´ ıquidos e
pol´ımeros.
1992. Georges Charpak - pela inven¸˜o de detectores de part´
ca ıculas.
1993. Russell A. Hulse e Joseph H. Taylor Jr. - pela descoberta de um
novo tipo de pulsar.
1994. Bertramin N. Brockhouse e Clifford G. Shull - pelas suas con-
tribui¸˜es ao desenvolvimento de t´cnicas de difra¸˜o de nˆutrons.
co e ca e
1995. Martin L. Perl e Frederick Reines - pelas suas contribui¸˜es ` f´
co a ısica
dos leptons.
1996. David M. Lee, Douglas D. Osheroff e Robert C. Richardson -
pela descoberta da superfluidez no 3 He.
1997. Steven Chu, William D. Phillips e Claude Cohen-Tannoudji -
pelos seus trabalhos sobre as intera¸˜es entre radia¸˜o e mat´ria.
co ca e
ix
11. 1998. Robert C. Laughlin, Horst L. Stoermer e Daniel C. Tsui - pela
descoberta de novas propriedades eletrˆnicas a baixas temperaturas e altos campos
o
magn´ticos.
e
1999. Gerardus ’t Hooft e Martinus J.G. Veltman - pelos seus trabalhos
te´ricos sobre a estrutura e movimento de part´
o ıculas subatˆmicas.
o
2000. Zhores Alferov, Herbert Kroemer e Jack Kilby - por suas pesquisas
em semicondutores que permitiram o desenvolvimento de computadores ultra-r´pidos.
a
x
17. 8.5 Novos Desafios a Relatividade . . . . . . . . . . . . . . . 430
`
8.6 O Universo teve um In´
ıcio?
A Grande Explos˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 438
a
8.7 O Universo ter´ um Fim?
a
O Grande Colapso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 441
9 O Sonho da Unifica¸˜o ca 445
9.1 As Quatro Damas da Cria¸˜o . . . . . . . . . . . .
ca . . . 446
9.2 Newton:
Unifica¸˜o do C´u com a Terra . . . . . . . . . . .
ca e . . . 449
9.3 Maxwell:
Unifica¸˜o da Eletricidade com o Magnetismo
ca
´
e com a Otica F´
ısica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 452
9.4 Part´
ıculas Elementares:
A Ducha C´smica . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
o . . . 453
9.5 Unifica¸˜o Eletrofraca . . . . . . . . . . . . . . . .
ca . . . 464
´ Poss´ Recriar o Universo em um Laborat´rio?
9.6 E ıvel o . . . 468
9.7 Gravita¸˜o: outra Pedra no Caminho! . . . . . . . .
ca . . . 476
9.8 Teorias de Tudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 480
xvi
18. Chapter 1
A F´
ısica at´ 1905: uma Casa
e
de Gigantes
1.1 A Mecˆnica Cl´ssica
a a
No in´ tudo era o caos. Primeiro criou Deus o C´u e a Terra. A Terra
ıcio e
era vazia e sem forma. O Esp´
ırito de Deus pairava sobre as aguas. E
´
Deus disse:
- Haja Luz!
Notando no entanto que nada acontecera, o desapontado Criador
deu um longo suspiro, e balbuciou distra´
ıdo:
- Haja Paciˆncia!
e
Um de seus Arcanjos ent˜o, constrangido com o que ocorrera, cochichou-
a
Lhe algo nos ouvidos. . .
- Ah, sim. Claro! Haja, antes, Espa¸o e Tempo!
c
E depois repetiu animado:
- Haja Luz!
E um aberto sorriso iluminou Sua face.
1
19. 2
O Livro do Gˆnesis descreve de maneira po´tica o momento da
e e
Cria¸˜o do Universo. Embora alguns cientistas ainda discutam se houve
ca
realmente um “in´
ıcio”, as evidˆncias mais recentes apontam para o
e
fato de que o Universo em que vivemos teve seu nascimento em algum
momento, h´ cerca de 15 bilh˜es de anos atr´s. A adultera¸˜o das
a o a ca
primeiras palavras da B´
ıblia feita acima, serve para enfatizar (de forma
bem humorada) o que intuimos a respeito da estrutura mais b´sica do
a
´ ıcil
Universo: o espa¸o e o tempo. E dif´ imaginarmos o espa¸o e o tempo
c c
como objetos f´
ısicos em s´ que foram criados com os outros objetos do
ı,
Universo. O sentimento que temos ´ de que o espa¸o e o tempo devem
e c
ter pre-existido a cria¸˜o das outras coisas.
` ca
No entanto, parece n˜o ser assim. Como veremos ao longo deste
a
livro, a Natureza muitas vezes n˜o corresponde as nossas intui¸˜es
a ` co
ingˆnuas. No primeiro quarto do s´culo XX o edif´ cient´
e e ıcio ıfico cons-
tru´ durante mais de 300 anos por gigantes da Ciˆncia como Galileu
ıdo e
Galilei, Isaac Newton, e James Clerk Maxwell, viu as suas bases ru´
ırem
diante das id´ias revolucion´rias de homens como Albert Einstein, Max
e a
Planck, Niels Bohr, Louis de Broglie, Wolfgang Pauli, Werner Heisen-
berg, Erwin Schr¨dinger, entre outros.
o
Nos dias de hoje estamos habituados a usar computadores, e ouvir
coisas sobre energia nuclear, bombas atˆmicas, buracos negros, tomo-
o
grafia computadorizada, lixo atˆmico, viagens interestelares, etc. Es-
o
tas coisas aparecem em jornais, revistas, romances, filmes, poemas,
etc. Fazem parte do nosso dia-a-dia, e ocupam o centro da produ¸˜o
ca
cient´
ıfica e tecnol´gica dos pa´ industrializados, onde o uso deste co-
o ıses
nhecimento gera riqueza e desenvolvimento. No entanto, muitas vezes
20. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES3
n˜o nos damos conta de que este conhecimento ´ o produto de uma
a e
revolu¸˜o cient´
ca ıfica (talvez a maior da hist´ria da humanidade), que
o
ocorreu h´ menos de 100 anos atr´s! As bases desta revolu¸˜o s˜o duas
a a ca a
ısicas espetaculares: a Teoria da Relatividade e a Mecˆnica
teorias f´ a
´
Quˆntica. E sobre estas duas teorias e suas conseq¨ˆncias de que trata
a ue
este livro. Antes, contudo, para melhor apreciarmos a devasta¸˜o feita
ca
por estes dois furac˜es, ´ necess´rio que nos coloquemos na situa¸˜o
o e a ca
dos f´
ısicos do in´ do s´culo XX, que tiveram que assistir perplexos
ıcio e
ao desabamento do Templo que habitavam.
1.1.1 As Leis do Movimento;
Newton, Espa¸o e Tempo Absolutos
c
O que hoje chamamos de F´
ısica Cl´ssica ´ basicamente o conte´do da
a e u
obra de dois homens: o inglˆs Isaac Newton, e o escocˆs James Clerk
e e
Maxwell. O primeiro unificou as leis da mecˆnica, que descrevem o
a
movimento de objetos sob a a¸˜o de for¸as que sobre ele atuam. O
ca c
segundo unificou as leis que regem os fenˆmenos el´tricos e magn´ticos,
o e e
incluindo a propaga¸˜o de ondas eletromagn´ticas no espa¸o, como on-
ca e c
das de r´dio e a luz. Na f´
a ısica, esses dois monumentos te´ricos s˜o
o a
conhecidos como Mecˆnica Cl´ssica e Eletrodinˆmica Cl´ssica.
a a a a
Nesta se¸˜o vamos revisar os fundamentos da mecˆnica, seus pos-
ca a
tulados, e suas leis do movimento: as trˆs leis de Newton. Na segunda
e
parte deste cap´
ıtulo estudaremos os fenˆmenos eletromagn´ticos. Al-
o e
guns conceitos matem´ticos, como a “derivada” e a “integral” de uma
a
fun¸˜o s˜o introduzidos nos pain´is, por raz˜es de complementaridade.
ca a e o
Ter conhecimento pr´vio destas t´cnicas n˜o ´, contudo, necess´rio para
e e a e a
21. 4
acompanhar o texto.
A obra Philosophiae Naturalis Principia Mathematica, ou Princ´
ıpios
Matem´ticos da Filosofia Natural, publicada em 1687, ´ um marco na
a e
Hist´ria da Ciˆncia, que perpetua o nome de Isaac Newton como um
o e
dos maiores, sen˜o o maior gˆnio cient´
a e ıfico que j´ existiu. Nesta obra,
a
Newton estabelece os fundamentos da mecˆnica. O espa¸o e o tempo
a c
absolutos s˜o conceituados como estruturas est´ticas, homogˆneas, in-
a a e
alter´veis, que nada tˆm a ver com as outras coisas. Para Newton,
a e
as no¸˜es vulgares de espa¸o e tempo que temos decorrem da nossa
co c
experiˆncia de movimento dentro dessa estrutura absoluta.
e
22. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES5
PAINEL I
ˆ
A VIDA E OBRA DE DOIS GENIOS
O inglˆs Isaac Newton nasceu no dia de Natal de 1642, em uma cidade chamada
e
Woolsthorpe ao centro-norte da Inglaterra. No mesmo ano morria o italiano Galileu
Galilei. Newton bacharelou-se pela Universidade de Cambridge em 1665, ano que
retornaria para Woolsthorpe, fugindo da Grande Peste que assolava a Europa. Os
dois anos que se seguiram foram, segundo o pr´prio Newton, os mais f´rteis de sua
o e
vida. Durante este per´
ıodo desenvolveu o C´lculo Diferencial e Integral (que ele
a
denominava c´lculo das flux˜es), fez importantes estudos de ´tica, e come¸ou a sua
a o o c
Teoria da Gravita¸˜o Universal. Tornou-se membro da Royal Society (a academia
ca
de ciˆncias inglesa) em 1672. Sua obra mais importante, o Philosophiae Naturalis
e
Principia Mathematica foi publicada em 1687, com duas edi¸˜es posteriores, em
co
1713 e 1726. Newton morreu em 1727.
James Clerk Maxwell nasceu em Edinburgo, capital da Esc´cia, no dia 13 de
o
junho de 1831, e portanto quase 100 anos ap´s a morte de Newton. Ainda muito
o
jovem j´ revelava aptid˜es especiais para a ciˆncia. Aos 19 anos produziu alguns
a o e
trabalhos originais que foram apresentados a Royal Society de Edinburgo. Em 1847
`
Maxwell ingressou na Universidade de Edinburgo, terminando sua gradua¸˜o em
ca
janeiro de 1854. Seus trabalhos mais importantes sobre Teoria Cin´tica dos Gases e
e
Eletrodinˆmica foram desenvolvidos durante os anos de 1860 e 1865, per´
a ıodo em que
esteve no Kings College, em Londres. Em 1871 tornou-se professor de eletricidade
e magnetismo em Cambridge, onde durante os primeiros anos deu retoques em seu
grande trabalho sobre a eletrodinˆmica. Em 1879 caiu doente e faleceu no dia 5 de
a
novembro, com a idade de apenas 49 anos.
23. 6
A famosa express˜o matem´tica1
a a
F = ma (1.1)
define a rela¸˜o entre a for¸a resultante F que atua sobre um objeto
ca c
de massa m, e a acelera¸˜o a que este adquire sob a a¸˜o da for¸a.
ca ca c
ca a e
Esta equa¸˜o dinˆmica ´ o cora¸˜o da mecˆnica cl´ssica. Ela descreve
ca a a
o movimento de qualquer objeto: pode tanto ser uma bola que rola
ladeira abaixo, quanto o movimento de um planeta em torno do Sol.
A equa¸˜o 1.1 ´ a express˜o matem´tica da conhecida Segunda Lei de
ca e a a
Newton. Newton postulou mais duas leis de movimento. S˜o elas:
a
Primeira Lei: Todo corpo permanece em estado de re-
pouso ou de movimento retil´
ıneo uniforme, a menos que
atuem sobre ele for¸as externas que alterem este estado;
c
Terceira Lei: A toda a¸˜o existe sempre uma rea¸˜o
ca ca
igual em m´dulo, e em sentido contr´rio.
o a
Com essas trˆs Leis, Newton revolucionou o Mundo!
e
´
E importante lembrar que a equa¸˜o 1.1 ´ uma equa¸˜o vetorial.
ca e ca
As quantidades F e a n˜o s˜o n´ meros puros: s˜o vetores, e portanto
a a u a
possuem m´dulo, dire¸˜o e sentido. Vetores, de uma maneira geral, pos-
o ca
suem trˆs componentes, que correspondem `s trˆs dimens˜es do espa¸o.
e a e o c
No caso da for¸a F, por exemplo, representamos essas componentes por
c
Fx , Fy e Fz . Em problemas unidimensionais s´ haver´ uma componente
o a
1
Adotaremos a nota¸˜o em negrito ‘F’, ao inv´s da mais usual ‘F ’, para repre-
ca e
sentar vetores.
24. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES7
e podemos omitir o negrito da nota¸˜o vetorial, observando, contudo,
ca
o sentido do movimento.
25. 8
PAINEL II
QUANTIDADES ESCALARES E VETORIAIS
Em f´
ısica, n´ meros servem para quantificar propriedades relacionadas a objetos ou
u
ao movimento de objetos. Por exemplo, quando afirmamos que um objeto possui
uma massa de 5 kg, associamos ` propriedade de massa, o n´ mero 5, vezes o padr˜o
a u a
quilograma. Algumas propriedades, no entanto, n˜o ficam completamente caracte-
a
rizadas apenas com um n´ mero. Por exemplo, se algu´m disser ‘passou por aqui um
u e
carro a 100 km/h’, nos ocorre a pergunta: ‘em que dire¸˜o?’ Neste caso, somente
ca
o n´ mero ‘100 km/h’ n˜o completa a informa¸˜o. Quantidades que ficam caracte-
u a ca
rizadas apenas por um n´ mero s˜o chamadas escalares, e quantidades associadas a
u a `
dire¸˜es no espa¸o s˜o chamadas vetoriais.
co c a
Vetores possuem m´dulo, dire¸˜o e sentido. Usamos os vetores unit´rios (ou
o ca a
seja, de m´dulo 1, tamb´m chamados de versores) i, j e k, tamb´m chamados de
o e e
vetores de base, para representarmos as 3 dire¸˜es do espa¸o. Com isso podemos
co c
escrever qualquer vetor como uma combina¸˜o dos vetores de base. Por exemplo,
ca
F = Fx i + Fy j + Fz k
representa um vetor F cujas componentes s˜o Fx , Fy e Fz . Embora n˜o seja es-
a a
tritamente necess´rio, os vetores de base s˜o em geral perpendiculares entre si, ou
a a
seja, formam angulos de 90 graus uns com os outros.
ˆ
O m´dulo de um vetor F, representado por |F| ou F , ´ uma medida da inten-
o e
sidade da grandeza f´
ısica que ele representa. O m´dulo ´ dado por:
o e
|F| = 2 2 2
Fx + Fy + Fz
√
Por exemplo, o m´dulo do vetor posi¸˜o r = 3i−2j+5k ´ igual a
o ca e 9 + 4 + 25 ≈ 6, 2
unidades de distˆncia (por exemplo, o metro). O m´dulo do vetor velocidade v =
a o
√
4i + j − 5k ´ 16 + 1 + 25 ≈ 6, 5 unidades de velocidade (por exemplo, kilˆmetros
e o
por hora).
A soma de dois vetores ´ outro vetor cujas componentes s˜o as somas das
e a
componentes dos vetores originais. Se
26. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES9
F1 = F1x i + F1y j + F1z k
e
F2 = F2x i + F2y j + F2z k
ent˜o:
a
F1 + F2 = (F1x + F2x )i + (F1y + F2y )j + (F1z + F2z )k
Por exemplo, se F1 = 3i − 2j + 5k, e F2 = i + 4j − k, ent˜o, F1 + F2 = 4i + 2j + 4k.
a
Graficamente, o vetor soma ´ dado pela diagonal do paralelogramo cujos lados s˜o
e a
formados pelos vetores originais.
A dire¸˜o de um vetor ´ dada pelo vetor unit´rio obtido dividindo-se cada
ca e a
componente do vetor pelo seu m´dulo. Por exemplo, a dire¸˜o de F = 3i − 2j + 5k,
o ca
a qual vamos representar por eF , ´ igual a:
e
3i − 2j + 5k
eF = = 0, 48i − 0, 32j + 0, 81k
6, 2
Note que |eF | = 1, como requer um vetor unit´rio.
a
Existem tipos diferentes de produtos entre vetores. Por exemplo, o produto
escalar, cujo resultado ´ uma quantidade escalar, e o produto vetorial, cujo resultado
e
´ outro vetor, perpendicular aos dois vetores originais. Se F1 e F2 s˜o dois vetores,
e a
e θ o menor ˆngulo entre eles, seu produto escalar ser´ dado por:
a a
F1 · F2 = |F1 ||F2 |cosθ
E o m´dulo do produto vetorial ser´ dado por:
o a
|F1 × F2 | = |F1 ||F2 |senθ
Os produtos escalar e vetorial podem tamb´m ser expressos em termos das
e
componentes dos vetores, sendo o primeiro dado por:
F1 · F2 = F1x F2x + F1y F2y + F1z F2z
27. 10
e o segundo:
F1 × F2 = (F1y F2z − F1z F2y )i + (F1z F2x − F1x F2z )j + (F1x F2y − F1y F2x )k
Essas duas rela¸˜es podem ser obtidas a partir do fato de que os unit´rios i, j e k
co a
possuem as propriedades:
i·i= j·j= k·k =1
i·j= j·k= k·i =0
i × j = k; j × k = i; k × i = j
i×i= j×j= k×k = 0
e notando que o produto vetorial troca de sinal sob uma permuta dos vetores:
i × j = −j × i, etc.
A partir do que foi dito acima, fica f´cil calcular o angulo entre dois vetores;
a ˆ
este ser´ dado pelo angulo entre os vetores unit´rios correspondentes, ou seja:
a ˆ a
cosθ = eF1 · eF2
Por exemplo, se eF1 = 0, 48i − 0, 32j + 0, 81k e eF2 = 0, 24i − 0, 94j + 0, 24k, o angulo
ˆ
entre F1 e F2 ´ igual a:
e
cosθ = 0, 11 + 0, 30 + 0, 19 = 0, 61 ⇒ θ = 52, 4o
28. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES11
A acelera¸˜o a ´ definida como a taxa de varia¸˜o da velocidade v,
ca e ca
por intervalo de tempo. A velocidade, por sua vez ´ definida como a
e
taxa de varia¸˜o da posi¸˜o r do objeto por intervalo de tempo. Neste
ca ca
ponto aparece uma certa dificuldade nessas defini¸˜es. Para exempli-
co
fic´-la, considere uma situa¸˜o simples em que um motorista ´ obrigado
a ca e
a percorrer uma distˆncia de 80 km em 1 hora. Obviamente isto pode
a
ser feito de diversas maneiras. A mais simples consiste em manter uma
velocidade constante, exatamente igual a 80 km/h, e ap´s 1 hora ele
o
ter´ percorrido a distˆncia desejada. Neste caso, n˜o h´ varia¸˜o da
a a a a ca
velocidade durante o percurso, e conseq¨entemente a acelera¸˜o ser´
u ca a
igual a zero.
Uma segunda op¸˜o seria acelerar o carro uniformemente ao longo
ca
do percurso. Por exemplo, se a carro iniciar o movimento com uma ve-
locidade de 20 km/h, e o motorista for capaz de manter uma acelera¸˜o
ca
constante de 120 km/h2 (isto ´, a cada hora a velocidade aumentar de
e
120 km/h), ap´s exatamente 1 hora ele ter´ percorrido os 80 km.
o a
Nesses casos simples (de acelera¸˜o nula ou uniforme), v e a podem
ca
ser definidos por:
r − r0 ∆r
v= = (1.2)
t − t0 ∆t
v − v0 ∆v ∆ ∆r ∆2 r
a= = = ≡ (1.3)
t − t0 ∆t ∆t ∆t (∆t)2
ımbolo ∆2 r foi introduzido para representar ∆(∆r), ou seja, a
onde o s´
varia¸˜o da varia¸˜o da posi¸˜o do objeto2 r0 e t0 s˜o respectivamente
ca ca ca a
2
No presente contexto, a express˜o mais a direita, ∆2 r/∆t2 , deve ser vista como
a
29. 12
a posi¸˜o e o instante iniciais. No nosso exemplo do carro, |∆r| = 80
ca
km, e ∆t = 1 h. Embora estejamos usando unidades do nosso dia-
a-dia para expressar velocidade e distˆncia, no sistema internacional
a
(SI) as unidades de r e v s˜o respectivamente o metro (m) e o metro
a
por segundo (m/s). A acelera¸˜o se mede em metro por segundo ao
ca
quadrado (m/s2 ), e a for¸a em newtons (N=kg · m · s−2 ).
c
Estamos de acordo que estas n˜o s˜o as duas unicas maneiras de se
a a ´
percorrer 80 km em 1 h. De um modo geral, a acelera¸˜o e a velocidade
ca
ir˜o variar de uma forma arbitr´ria com o tempo ao longo do percurso,
a a
e as defini¸˜es 1.2 e 1.3 n˜o ser˜o v´lidas, pois consideram os valores de
co a a a
r e v apenas no in´ e fim do movimento. Newton se deparou com este
ıcio
problema, e para resolvˆ-lo teve que inventar uma nova matem´tica!
e a
Imagine que ao inv´s de medir a varia¸˜o de r e v entre o in´
e ca ıcio
(t0 ) e o fim (t) do movimento, o intervalo de tempo ∆t seja dividido
em 1000 intervalos menores, cada um com 3,6 segundos. Se para cada
um destes sub-intervalos calcularmos as raz˜es dadas por 1.2 e 1.3,
o
teremos uma esp´cie de velocidade e acelera¸˜o “instantˆneas”. Para
e ca a
sermos ainda mais precisos, poder´
ıamos dividir ∆t em 10000 ou em
1000000 de sub-intervalos. Quanto menor for o sub-intervalo, mais as
defini¸˜es 1.2 e 1.3 refletir˜o os valores instantˆneos de v e a. Nada
co a a
nos impede de imaginarmos intervalos infinitamente pequenos de r e t.
Em matem´tica esses intervalos infinitesimais s˜o representados por dr
a a
e dt. Com isso as defini¸˜es 1.2 e 1.3 se tornam:
co
um mero s´ ımbolo matem´tico, e n˜o uma opera¸ao propriamente dita. Somente para
a a c˜
intervalos de tempo muito pequenos de ∆r e ∆t ´ que este “s´
e ımbolo” se transforma
em uma opera¸˜o.
ca
30. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES13
dr
v= (1.4)
dt
dv d2 r
a= = 2 (1.5)
dt dt
O leitor iniciado em matem´tica avan¸ada reconhecer´ imediata-
a c a
mente as express˜es acima como as derivadas dos vetores r e v em
o
rela¸˜o a t (dizemos que a velocidade ´ igual a derivada primeira da
ca e `
posi¸˜o em rela¸˜o ao tempo, e que a acelera¸˜o ´ a sua derivada se-
ca ca ca e
gunda). O leitor n˜o iniciado em C´lculo Diferencial , n˜o precisa se
a a a
preocupar, pois n˜o faremos uso desta ferramenta neste livro (algumas
a
no¸˜es b´sicas s˜o descritas no Painel III). O importante ´ lembrar que
co a a e
as defini¸˜es 1.2 e 1.3 est˜o restritas a situa¸˜es particulares.
co a co
31. 14
PAINEL III
¸˜
DERIVADA DE UMA FUNCAO
Seja r uma fun¸˜o de t: r = r(t). Esta poderia ser, por exemplo, a posi¸˜o
ca ca
de um objeto que se move com o tempo. Como calcular a velocidade do objeto,
tamb´m como fun¸˜o de t? Tomemos dois intervalos de tempo, t e t + ∆t. As
e ca
posi¸˜es correspondentes a esses instantes ser˜o, respectivamente, r(t) e r(t + ∆t).
co a
Por defini¸˜o, a velocidade m´dia neste intervalo ser´:
ca e a
r(t + ∆t) − r(t)
v=
∆t
A derivada de r em rela¸˜o a t ´ definida como o limite da raz˜o acima quando o
ca e a
intervalo de tempo ∆t for infinitamente pequeno, ou seja, ∆t → 0 (lˆ-se ‘delta t
e
tende a zero’). Simbolicamente escrevemos:
dr r(t + ∆t) − r(t)
v= = lim
dt ∆t→0 ∆t
Suponha por exemplo que a fun¸˜o r(t) seja proporcional ao quadrado de t:
ca
r(t) = a0 t2 , onde a0 ´ constante. Ent˜o:
e a
r(t + ∆t) = a0 (t + ∆t)2 = a0 (t2 + ∆t2 + 2t∆t) =
= r(t) + 2a0 ∆t + a0 (∆t)2
Consequentemente:
r(t + ∆t) − r(t) = 2a0 t∆t + a0 ∆t2
Dividindo esta express˜o por ∆t teremos:
a
r(t + ∆t) − r(t)
= 2a0 t + a0 ∆t
∆t
Tomando o limite ∆t → 0, o segundo termo do lado direito se anula e ficamos com:
r(t + ∆t) − r(t)
lim = v(t) = 2a0 t
∆t→0 ∆t
32. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES15
Este processo pode ser repetido para qualquer fun¸˜o, escalar ou vetorial. Pode-
ca
mos, por exemplo, calcular a acelera¸˜o a partir do resultado acima:
ca
d2 r v(t + ∆t) − v(t)
a= 2
= lim = 2a0
dt ∆t→0 ∆t
.
A velocidade instantˆnea em um tempo t ´ obtida dividindo-se o intervalo infinite-
a e
simal δx por δt.
33. 16
Outras quantidades importantes da mecˆnica s˜o o momento linear
a a
(ou quantidade de movimento) p, definido por
p = mv
onde m ´ a massa do objeto, e o momento angular L, definido como o
e
produto vetorial entre r e p, tamb´m chamado de torque do momento
e
linear:
L=r×p
onde o s´
ımbolo ‘×’ representa o produto vetorial. Enquanto p ´ uma
e
medida da quantidade de movimento de transla¸˜o, L ´ uma medida da
ca e
quantidade de movimento de rota¸˜o. Por exemplo, um carro pesando
ca
1 tonelada (1000 kg) se deslocando a 100 km/h (aproximadamente 28
m/s) possui uma quantidade de movimento com m´dulo igual a p =
o
28000 kg m/s. Se ao inv´s do carro fosse um p´ssaro, com apenas 0,5
e a
kg, o m´dulo da quantidade de movimento seria de 14 kg m/s. Se por
o
outro lado o nosso carro estivesse descrevendo uma curva circular com
raio de 50 m, ele teria um momento angular cujo m´dulo seria 1, 4×106
o
kg m2 /s.
A varia¸˜o de p est´ ligada a aplica¸˜o de for¸as externas sobre o
ca a ` ca c
sistema, assim como a varia¸˜o de L est´ ligada a torques externos.
ca a
Portanto, essas quantidades se conservar˜o (ou seja, n˜o mudar˜o com
a a a
o tempo) se n˜o houver for¸as e torques atuando sobre o sistema.
a c
Outra vari´vel dinˆmica importante ´ a energia cin´tica do objeto,
a a e e
definida por:
1 2 p2
T = mv =
2 2m
34. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES17
onde v e p s˜o os m´dulos dos vetores v e p, respectivamente. T ´ uma
a o e
medida da energia associada ao movimento do objeto, e sua unidade
no SI ´ o joule (J). Se houver um campo de for¸as atuando sobre o
e c
objeto, como por exemplo o campo gravitacional (veja adiante), haver´
a
tamb´m uma energia potencial, que representamos genericamente por
e
V.
Ao contr´rio da energia cin´tica, que ´ zero se o objeto estiver
a e e
parado, a energia potencial n˜o se anula para v = 0. Se, por exem-
a
plo, segurarmos uma pedra a uma altura h do solo, sabemos que se a
soltarmos ela cair´. Antes de ser solta, a pedra possu´ uma energia
a ıa
potencial igual a V = mgh, onde m ´ a massa e g a acelera¸˜o da
e ca
gravidade. Ao tocar o solo, h = 0 e consequentemente V = 0, mas a
velocidade nesse instante ser´ m´xima, e portanto a energia cin´tica
a a e
tamb´m ser´ m´xima. O que ocorreu ao soltarmos a pedra foi uma
e a a
transforma¸ao da energia potencial em cin´tica. Usando o fato de que
c˜ e
a energia total se conserva, a velocidade do objeto ao chegar ao solo
pode ser calculada simplesmente igualando as duas formas de energia:
´ ´
ENERGIA CINETICA MAXIMA = ENERGIA POTENCIAL
´
MAXIMA
2
mvmax
= mgh ⇒ vmax = 2gh
2
Por exemplo, se h = 10 m, e g = 10 m/s2 , vmax ≈ 14 m/s, ou aproxi-
madamente 4 km/h.
Note deste resultado que a velocidade m´xima independe da massa
a
da pedra, embora a energia dependa! Ou seja, tanto pode ser uma
35. 18
pedra de 50 g quanto uma de 10 kg que a velocidade ao tocar o solo
ser´ a mesma. Falaremos mais sobre isto adiante.
a
Em qualquer situa¸˜o a energia total do objeto, E, ´ a soma das
ca e
energias cin´tica e potencial:
e
E =T +V
Em uma grande classe de problemas importantes, como o caso da queda
de objetos, a energia total se conserva (note que isso n˜o quer dizer
a
que T e V se conservam separadamente, mas apenas sua soma). Tais
sistemas s˜o chamados de conservativos.
a
1.1.2 Movimento de Objetos sob a A¸˜o de
ca
For¸as Mecˆnicas
c a
Para conhecermos a trajet´ria e a velocidade de um objeto temos que
o
resolver a equa¸˜o 1.1. Um exemplo bem conhecido de aplica¸˜o pr´tica
ca ca a
daquela equa¸˜o ´ o c´lculo da trajet´ria de um proj´til disparado de
ca e a o e
um canh˜o. Podemos tamb´m calcular a velocidade com que gotas
a e
d’´gua caem do c´u em um dia de chuva, as posi¸˜es de uma massa
a e co
oscilando presa a uma mola, a trajet´ria do cometa de Halley, etc.
o
Qualquer que seja o caso, ´ preciso conhecermos a natureza da for¸a
e c
F que comparece em 1.1, e sua forma funcional. Forma funcional ´
e
a express˜o matem´tica que descreve a dependˆncia da for¸a com as
a a e c
vari´veis do problema, como a posi¸˜o, a velocidade, o tempo, etc. Se
a ca
o amigo leitor entender este ponto, j´ ter´ ganho o dia! Matematica-
a a
mente, podemos escrever a for¸a com qualquer forma. Por exemplo,
c
podemos inventar uma for¸a do tipo
c
36. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES19
a
F =√
x
onde x ´ a posi¸˜o do objeto. Podemos inventar o que quisermos:
e ca
F = bx2/7 , −c/x2 , dsen(kx), etc. Formalmente qualquer coisa serve!
F pode tamb´m depender explicitamente da velocidade e do tempo.
e
Matematicamente ´ uma festa! Acontece que para descrevermos os
e
fenˆmenos da Natureza temos que encontrar a F correta para cada um
o
deles. Isso ´ o que faz a diferen¸a. Movimentos de planetas, quedas
e c
de objetos, movimentos de part´
ıculas carregadas em campos eletro-
magn´ticos, etc., obedecem a for¸as com formas funcionais espec´
e c ıficas.
S˜o leis imut´veis estabelecidas pela Natureza. O trabalho do f´
a a ısico
´ precisamente descobrir quais s˜o estas leis a partir da observa¸˜o do
e a ca
movimento causado por elas. Matematicamente este trabalho se traduz
em escrever corretamente o lado esquerdo da equa¸˜o 1.1, e depois re-
ca
solvˆ-la a fim de encontrar os vetores r(t) e v(t) (o que nem sempre ´
e e
poss´
ıvel, mesmo conhecendo-se a lei correta!). O leitor pode estar se
perguntando que m´todos s˜o utilizados para se descobrir a forma fun-
e a
´
cional correta da for¸a em um dado problema. E o an´logo a perguntar
c a
que m´todos Chico Buarque utiliza para escrever os seus versos, ou
e
e
que m´todos Pel´ utilizava para chegar at´ o gol! As vezes ´ poss´
e e ` e ıvel,
atrav´s de experimentos, deduzir uma forma funcional para F em uma
e
dada situa¸˜o. Outras vezes se consegue bons resultados por tentativa
ca
e erro, ou seja, “chuta-se”. Obviamente quanto melhor informado es-
tivermos acerca do problema, maiores ser˜o nossas chances de darmos
a
um bom “chute”. Mas, assim como na m´sica e no futebol, na f´
u ısica
37. 20
haver´ sempre os “Pel´s”, os “Chico Buarques”, e os outros.
a e
O caso mais trivial de movimento ocorre quando a for¸a que atua
c
sobre o objeto ´ nula, ou seja, F = 0. A equa¸˜o 1.1 neste caso se
e ca
torna:
ma = 0
Mas na medida em que m = 0, a unica solu¸˜o poss´
´ ca ıvel para a esta
equa¸˜o ´:
ca e
a=0
Por simplicidade vamos considerar o movimento em 1 dimens˜o e
a
omitir o negrito da nota¸˜o vetorial da acelera¸˜o. Nesse caso escreve-
ca ca
mos:
a=0
Consequentemente, utilizando a defini¸˜o simplificada da acelera¸˜o
ca ca
obtemos:
∆v v − v0
= =0
∆t t − t0
Para que a fra¸˜o se anule, ´ suficiente que o seu numerador se anule.
ca e
Logo:
v − v0 = 0 ⇒ v = v0
ou seja, a velocidade do objeto neste caso permanece igual a sua ve-
`
locidade inicial. Isso quer dizer que se o objeto estiver inicialmente
38. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES21
parado, assim permanecer´ indefinidamente. Se por outro lado o ob-
a
jeto estiver se movendo, continuar´ nesse estado de movimento ad eter-
a
num. Observe que obtivemos matematicamente aquilo que ´ enunciado
e
da primeira lei de Newton! Na literatura secundarista este problema
aparece com o nome - na minha opini˜o excessivamente burocr´tico -
a a
de movimento retil´
ıneo e uniforme, ou MRU.
Podemos levar o c´lculo adiante e obter a posi¸˜o do objeto no
a ca
tempo. Basta escrevermos:
x − x0
v= = v0 ⇒ x = x0 − v0 t0 + v0 t
t − t0
Como sabemos, x0 e v0 s˜o condi¸˜es iniciais arbitr´rias. Seus va-
a co a
lores s˜o obtidos em t0 , o instante do in´ do movimento. Em geral
a ıcio
escolhemos t0 = 0, e a equa¸˜o acima se torna:
ca
x = x0 + v0 t
A prop´sito, temos aqui uma daquelas situa¸˜es embara¸osas que o
o co c
leitor atento j´ deve ter percebido. O que ocorre com a defini¸˜o de v
a ca
acima se fizermos t = t0 ? Em princ´
ıpio dever´
ıamos obter a velocidade
em t = t0 , que por sua vez ´ igual a v0 , j´ que n˜o h´ for¸as atuando
e a a a c
no sistema. Mas vemos que para t = t0 o denominador da express˜o
a
para v se anula. Uma fra¸˜o com denominador muito pequeno ´ um
ca e
n´ mero muito grande. Por exemplo, 1/0, 01 = 100; 1/0, 001 = 1000; e
u
1/0, 0000001 = 1000000. Extrapolando, dizemos que se o denominador
da fra¸˜o tender para zero, a fra¸˜o tender´ para infinito (ocasional-
ca ca a
mente o leitor estar´ lembrado que 1/0 = ∞). Mas, por defini¸˜o, em
a ca
t = t0 , o objeto se encontra exatamente em x = x0 , o que tamb´m
e
39. 22
anula o numerador. Teremos ent˜o o estranho resultado 0/0. Mate-
a
maticamente o resultado da divis˜o de zero por zero ´ indeterminado.
a e
Indeterminado?! Como, se sabemos de in´ que a velocidade ´ cons-
ıcio e
tante e igual a v0 ? Deixo para o leitor o desafio deste paradoxo!
Voltando ao problema, vemos que a posi¸˜o do objeto em um ins-
ca
tante t qualquer pode ser obtida calculando-se a area sob a curva em
´
um gr´fico de v versus t. O problema foi resolvido. Passado e futuro
a
est˜o plenamente determinados! Por exemplo, se x0 = 0, e v0 = 50
a
km/h, em 5 minutos o objeto estar´ a uma distˆncia de 4,2 km da
a a
origem. H´ 100 anos atr´s (ou seja, t = −100 anos), o objeto estava a
a a
−43800000 km da origem, e assim por diante.
Um segundo exemplo, ligeiramente mais complicado, ´ o caso de
e
uma for¸a constante, igual a F0 , atuando sobre o objeto. Teremos
c
neste caso:
F0
ma = F0 ⇒ a =
m
ou seja, a acelera¸˜o tamb´m ´ constante e igual a F0 /m. Vamos ba-
ca e e
tizar de a0 essa quantidade. Usando a defini¸˜o simplificada de a, e
ca
considerando novamente t0 = 0, obtemos a velocidade (que ´ numeri-
e
camente igual a area sob a curva de a versus t):
`´
v = v0 + a0 t
A posi¸˜o ser´ novamente dada pela area sob a curva de v versus t, e
ca a ´
pode ser facilmente obtida:
1
x = x0 + v0 t + a0 t2
2
40. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES23
O exemplo do motorista que deve percorrer 80 km em 1 h, com v0 = 20
km/h, e a0 = 120 km/h2 , pode agora ser trivialmente verificado da
express˜o acima:
a
120
x − x0 = 20 + = 80
2
E o que ocorre no caso geral em que a for¸a ´ uma fun¸˜o arbitr´ria
c e ca a
de t? Ainda aqui podemos interpretar v(t) e x(t) geometricamente
como as areas sob as curvas de a versus t e v versus t, respectivamente.
´
A diferen¸a est´ no fato de que neste caso o c´lculo da ´rea se torna
c a a a
mais complicado.
A t´cnica matem´tica para se calcular areas sob curvas com formas
e a ´
arbitr´rias ´ chamada de integra¸˜o, e foi inventada (“pra variar”) por
a e ca
Newton3
3
Esta t´cnica faz parte do que chamamos atualmente em matem´tica de C´lculo
e a a
Diferencial e Integral, ou simplesmente C´lculo. O C´lculo foi inventado simultane-
a a
amente por Newton e pelo matem´tico alem˜o Gottfried Wilhelm Leibniz.
a a
41. 24
PAINEL IV
¸˜
INTEGRAL DE UMA FUNCAO
´
Seja uma fun¸˜o arbitr´ria f (x). E interessante sabermos calcular a area sob
ca a ´
a curva descrita por f . Somente em situa¸˜es muito simples, como no caso de
co
uma fun¸˜o constante, ou linear, ´ que podemos fazer isso usando as f´rmulas da
ca e o
Geometria Plana. Em um caso geral, para sabermos a area temos que integrar a
´
fun¸˜o.
ca
A integra¸˜o de uma fun¸˜o pode ser visualizada como um processo de soma
ca ca
de ´reas infinitesimais. O intervalo no qual a ´rea ser´ calculada ´ dividido em
a a a e
N subintervalos, cada um com uma largura infinitesimal ∆x. Cada um desses
subintervalos pode ser considerado como um retˆngulo de base ∆x e altura f (x), e
a
portanto possuir´ uma area igual a
a ´
∆S = f (x)∆x
Se somarmos todas as ´reas dos N intervalos, teremos a area total desejada:
a ´
S= f (x)∆x
N
A integral de f (x) ´ definida como o resultado dessa soma quando tomamos o limite
e
∆x → 0, que representamos por dx. Simbolicamente representamos a integral por
(uma esp´cie de ‘S’ esticado):
e
lim f (x)∆x ≡ f (x)dx
∆x→0
N
Matematicamente pode ser demonstrado que a opera¸˜o de integra¸˜o de uma
ca ca
fun¸˜o ´ o inverso da opera¸˜o de deriva¸˜o. Ou seja, se g(x) ´ a fun¸˜o que resulta
ca e ca ca e ca
da deriva¸˜o de f (x),
ca
df (x)
g(x) =
dx
ent˜o, a fun¸˜o f ´ a integral de g:
a ca e
f (x) = g(x)dx
42. CAP´
ITULO 1 - A F´ ´
ISICA ATE 1905: UMA CASA DE GIGANTES25
Considere, por exemplo, a fun¸˜o v(t) = a0 t, a velocidade de um objeto que
ca
se move ao longo do eixo x com acelera¸˜o constante, igual a a0 . A integral desta
ca
fun¸˜o ser´:
ca a
v(t)dt = a0 tdt
Mas como a0 n˜o depende de t, podemos escrever:
a
v(t)dt = a0 tdt
A fun¸˜o a ser integrada ´ portanto f (t) = t. Como esta fun¸˜o ´ igual a derivada
ca e ca e `
da fun¸˜o g(t) = t2 /2, teremos:
ca
1 2
v(t)dt = a0 t
2
Reconhecemos este resultado como a posi¸˜o de um objeto que se move em MRUA,
ca
com velocidade e posi¸˜o iniciais iguais a zero:
ca
1 2
x(t) = v(t)dt = a0 t
2
A integral de uma fun¸˜o entre os pontos a e b ´ numericamente igual ` soma das
ca e a
a
´reas dos trap´zios, como mostrado na figura.
e
43. 26
Um exemplo de for¸a extremamente importante em f´
c ısica ´ aquela
e
em que F ´ proporcional ao deslocamento do objeto, mas atua em
e
sentido contr´rio ao movimento, ou seja:
a
F = −kx
O tipo de movimento que decorre dessa for¸a aparece em v´rios fenˆmenos
c a o
da Natureza, e da´ a sua importˆncia. A solu¸˜o formal da equa¸˜o 1.1
ı a ca ca
nesse caso ´ consideravelmente complexa para ser apresentada aqui,
e
mas podemos conhecer o resultado mesmo sem realizarmos formalmente
os c´lculos.
a
Na express˜o acima, k ´ uma constante positiva chamada de “cons-
a e
tante de for¸a”, ou “constante el´stica”. Sua unidade ´ o newton por
c a e
ıstica intr´
metro (N/m), e ´ uma caracter´
e ınseca do sistema. Por exem-
plo, esse tipo de for¸a ocorre em uma mola que ´ deformada se nela
c e
pendurarmos um objeto de massa m (por exemplo, num dinamˆmetro).
o
k ´ uma caracter´
e ıstica intr´
ınseca da mola, assim como m ´ uma car-
e
acter´
ıstica intr´
ınseca do objeto preso a ela. Quanto mais esticamos a
mola, mais dif´ se torna estic´-la, porque a for¸a F aumenta com a de-
ıcil a c
forma¸˜o x, e portanto tende a restaurar o estado n˜o deformado. Todo
ca a
mundo j´ viu as oscila¸˜es de um objeto preso a uma mola. Se sim-
a co
plesmente pendurarmos o objeto, a mola se deformar´ e ficar´ parada.
a a
Mas se al´m desse ponto esticarmos a mola e a soltarmos, o objeto
e
passa a oscilar em torno da posi¸˜o de equil´
ca ıbrio. Esse movimento de
“vai-vem” ´ descrito pelas fun¸˜es peri´dicas seno e cosseno:
e co o
x(t) = xmax cos(ω0 t)