SlideShare une entreprise Scribd logo
1  sur  24
Télécharger pour lire hors ligne
Esta “esquerda” é a tranquilidade da direita


Sumário



Uma justificação
1 – A sombria realidade que entra por portas e janelas
2 – O continuado empenho da esquerda institucional na conservação do sistema
3 – Para a multidão em Portugal, a esquerda institucional de pouco tem servido
   a) Uma repartição escandalosa do rendimento
   b) O salário médio em Portugal e na Europa
   c) O salário mínimo em Portugal e na Europa
   d) A conflitualidade – o número de greves
   e) A conflitualidade – o número de dias de greve
   f) A conflitualidade – o número de trabalhadores grevistas
   g) Conflitualidade em Portugal (1990/2007)
   h) Votação na esquerda institucional em legislativas
4 - A necessidade de reflexão e mudança de paradigma



--------------------------------------------------------------------------

Uma justificação

A realidade política comporta aspectos estruturais como a economia e as
instituições, bem como elementos subjetivos, como a percepção da realidade por
parte da multidão e, sobretudo, como esta reage e se organiza face à calamitosa
situação que se vive. Como pretensos intérpretes da realidade social, do sentir das
“massas”; como presumidos protagonistas da transformação social, como
iluminados condutores do povo ignaro, os partidos ditos de esquerda assumem um
papel de grande relevo e responsabilidade.

A análise da conduta e da eficácia histórica e actual dessa “esquerda” é uma
necessidade para cuja satisfação contribuimos com este texto. Essa análise
decorre de dois aspetos. Primeiro, da urgente necessidade de uma actuação
transformadora saida da multidão mundial, europeia, ibérica e portuguesa, em
particular, perante a brutalidade do torniquete apertado pelo capitalismo e pelos


Grazia.tanta@gmail.com                                           8/11/ 2011   1
seus mandarins. Em segundo lugar, dada a incorrigível postura de auto-ungidos
lideres da multidão, nunca escondida por essa “esquerda” pouco dada à
tolerância com quem os conteste; ora recorrendo aos poderes estatais, como
órgãos não assumidos do sistema, ora infiltrando pequenos grupos de militantes
provocadores para influenciar, controlar, distorcer ou destruir qualquer movimento
social que, autonomamente, surja na sociedade. Em qualquer das hipóteses, o
sistema capitalista cleptocrático agradece e paga.

É precisamente sobre as propostas e actuações da “esquerda” institucional
portuguesa que aqui nos debruçamos, com a crueza e a frontalidade habituais
que cultivamos.

Pretende-se o reforço de um debate, ainda algo subterrâneo, sobre a
necessidade de construir um movimento social, transformador, plural, gerador de
consensos alargados, não partidarizado e com capacidade para repelir
manipulações partidárias ou outras; e composto por grupos ligados através de um
enxame de redes, pleno de uma heterogeneidade, que represente toda a
multidão, contra o capitalismo, as suas instituições políticas e económicas.


1 – A sombria realidade que entra por portas e janelas


Dizer que a situação social em Portugal é muito grave e que está com as portas
escancaradas para o seu agravamento é uma realidade de difícil desmentido.

As sociedades actuais geraram sistemas complexos de poder, de contornos nem
sempre claros e, bastas vezes, sob a forma de máscara. E em todas essas
vertentes do poder, está ausente a democracia.

   •   Nas empresas vigora o poder do patrão, da administração, dos accionistas,
       actualmente em vias de reforço perante os trabalhadores, através do
       salário, da ameaça de despedimento, da aplicação de sanções;

   •   Nos órgãos da administração pública vigora um espírito hierárquico, vertical,
       que não está aberto a decisões democráticas embora, o seu objecto seja a
       resolução de necessidades colectivas;

   •   Nas prisões, como nas forças policiais e militares, a lógica é a da submissão
       total a uma autoridade bem vincada, com a total ausência de
       democracia;

   •   O poder político não é democrático pois assenta em pequenos grupos (os
       partidos), beneficiários de fórmulas de representação tendencialmente
       excludentes face ao comum das pessoas, sem responsabilidades assumidas
       perante os eleitores, sobretudo em casos de decisões lesivas das pessoas ou
       perante actos corruptos;


Grazia.tanta@gmail.com                       8/11/ 2011                        2
•   O poder judicial é uma mentira absoluta como terceiro poder, como
       autonomia face ao poder executivo, como separado das oligarquias
       partidárias;

   •   O poder sindical promove a mediação, o amortecimento das
       reivindicações populares perante o poder económico e baseia-se numa
       casta de dirigentes profissionalizados defendidos por estatutos que
       bloqueiam alternativas; e, para mais, estão intimamente ligados ao
       subsistema partidário.

Todos estes poderes constituem outras tantas esferas de influência, de controlo
social, de reprodução do modelo político e económico existente – o do domínio
das multinacionais, do sistema financeiro, do capital mafioso. A despeito da luta
interna ao sistema em que se digladiam, aqueles poderes são conservadores e
apenas procuram fazer valer a sua relevância e assegurar privilégios e mordomias.
Em conjunto, prevalece a difusão do pensamento único, da democracia de
mercado e do neoliberalismo, este, enformado pela lógica do individualismo, da
concorrência, da competitividade, da omnisciência do mercado e fantasias afins.

Todo aquele conjunto de poderes é dominado pelo capital financeiro. Em toda a
UE, os Estados são representações do capital financeiro que os controlam e
manipulam. E, portanto, todas as suas instituições, políticas, (governos,
parlamentos) e administrativas se inserem sob o comando do capital financeiro,
que configura a lei e a sua aplicação de acordo com os seus interesses.

O seu domínio dos Estados e do poder político tende a ser mais férreo pois é o
domínio e a determinação do nível da punção fiscal, da redistribuição (regressiva)
dos rendimentos, do embaratecimento do trabalho, que lhes pode permitir evitar
a bancarrota. Essa centralização do poder no capital financeiro revela que, mais
do que nunca, o capitalismo é um sistema global, invasivo, que se incrustra e
desenvolve em todos as instâncias – económicas, políticas, sociais, culturais e
ideológicas.

Dentro da lógica do pensamento único, não há alternativa ao modelo da
chamada democracia de mercado, a que chamam representativa. Essa coisa é
curiosa pois os representantes saem de uma limitada e relativamente fechada
classe política que tende a afastar-se, a segregar-se relativamente à esmagadora
maioria das populações. Esses representantes rodeiam-se de prebendas e
privilégios específicos, determinados por eles próprios. Aos representados somente
é pedido um mandato, uma representação genérica e por periodos alargados,
sem qualquer hipótese real de retirada desse poder de representação, por muitas
falcatruas que cometa o representante, por muito que se distancie do prometido
em campanha.

E pode designar-se por classe política, porque embora no seu seio existam
diferenças ideológicas e desempenhos distintos na esfera política, estão unidos


Grazia.tanta@gmail.com                      8/11/ 2011                       3
pela assunção da sua total legitimidade para a gestão dos interesses coletivos da
multidão, mesmo que a sua representação seja francamente abusiva. Por muito
que se mostrem distanciados no teatro parlamentar, é muito clara a sua unidade
na defesa do sistema de democracia de mercado e dos variados privilégios de
que gozam.

Todas as manifestações de diversidade entre as classe política se inserem
plenamente no seio do sistema, na defesa de alternativas dentro do sistema;
quaisquer expressões de alternativas são tomadas como quiméricas ou,
objectivamente, insusceptíveis de aplicação porque confinadas a um gueto
político e social mantido pelos media, fortemente controlados pelo poder
económico.

Por outro lado, em tempos de capitalismo globalizado, à globalização da
produção e do comércio, corresponde a existência de uma classe política global,
que articula e unifica os grupos nacionais de mandarins, em famílias, mais
marcadas pelas conveniências do capital do que por diferenças ideológicas. É
por isso, que convivem, alegremente, numa chamada Internacional Socialista, os
sociais-democratas nórdicos, o PS português, os racistas do partido trabalhista
israelita e, até há pouco, os regimes de Ben Ali e Mubarak.

Tendo em conta o carácter excludente e invasivo do sistema, qualquer
participação no mesmo insere-se, forçosamente, na lógica do poder, do capital
financeiro, embora constantemente o sistema seja atravessado por contradições
internas. A dificuldade do aproveitamento dessas contradições e disputas internas,
económicas, políticas ou ideológicas, para a satisfação de reivindicações da
multidão é, evidentemente, elevada.

Por um lado, há instituições do sistema (partidos, sindicatos, por exemplo) cuja
função, sendo a integração das contestações ou o desarmamento das lutas da
multidão dentro do sistema, evidenciam, como estratégias de sobrevivência
própria, essa mediação, travestindo-se de opositores do sistema. Por outro lado, o
aproveitamento das possibilidades institucionais para o lançamento e
desenvolvimento de lutas anti-sistémicas, corre sempre o perigo da tentação da
adopção de um minimalismo que favoreça a sua inserção dentro do sistema.

Para a contestação fora do sistema há, em regra, diversas reações do mesmo
para a jugular. Se essa contestação se processa de formas diversificadas
consideradas violentas pelo sistema, está garantido que a reação daquele é a
ilegalização e a repressão particularmente brutal. (1)(2)

Se essa contestação não é tomada como revestindo essas características, as
modalidades que o sistema utiliza para o controlo dessa contestação ou para a
sua domesticação, como atrás se referiu, são diversas: infiltração de membros de
partidos de “esquerda” - ou mesmo das polícias - ou a conivência aberta das
instituições do sistema, ditas de “esquerda” com a polícia, nos casos em que as



Grazia.tanta@gmail.com                      8/11/ 2011                       4
suas funções de mediação e controlo social sejam contestadas ou ameaçadas
de descrédito. (3) (4)


2 – O continuado empenho da esquerda institucional na conservação do sistema


                                        “Onde está a esquerda? Ao fundo, à direita”
                            (frase criada no âmbito do movimento 15 M, nas Puertas del Sol, Madrid)



Em Portugal, para além do enganador bipartidarismo vigente PS/PSD a nível do
governo – empobrecedor do ponto de vista político, material e cultural – e que
serve de coluna vertebral para o sistema político cleptocrático - há ainda a contar
com a área institucional mais à esquerda ou menos à direita, se se preferir. Esta, é
constituida pelo que designamos de Trinómio da Ineficácia, como poderiamos
designar por Trio Aldrabice ou, outra forma pouco simpática para os visados. Esse
trio é constituido do ponto de vista formal pelo conjunto CGTP/PC/BE, por ordem
de relevância e que reproduz, na terra lusitana, a aplicação de uma norma de
controlo social comum no mapa político da Europa.

Na realidade duas daquelas entidades (CGTP/PC) são apenas uma, dada a total
similitude das posições políticas e a larga presença de funcionários e dirigentes
comuns nas respectivas lideranças. Funcionam como “ubus” uma da outra, como
retratado na cultura popular haitiana; o que um diz o outro repete ou completa, à
vez.

   •   O PC é o partido base daquela área esquerda do poder, mesmo quando
       deixou (2009/11) de ser maioritário na AR, no seu confronto com o BE. O seu
       férreo domínio da central sindical e a administração de várias autarquias
       importantes são trunfos importantes dos pontos de vista financeiro e da
       colocação de quadros; no âmbito político, é a presença da CGTP numa
       aldrabice designada por “concertação social”que viabiliza a sua existência.
       O PC detém ainda uma estrutura organizativa fortemente hierárquica e
       autoritária, inserida no corpo social que o dota de um poder político muito
       superior ao do BE e bem para além da sua expressão eleitoral;

   •   O PC dispõe ainda de uma estabilidade estratégica e tática que torna, em
       regra, previsível, a sua actuação, constituindo, portanto um elemento
       central na estabilidade do sistema cleptocrático; o que acontece, com
       base em acordos tácitos desenhados logo a seguir ao 25 de Abril com o
       poder militar. As regulares dissenções não lhe geram danos uma vez que
       entre os militantes domina uma forte fidelidade à direcção, fé nas
       capacidades dos dirigentes, mesmo quando têm divergências pessoais;
       neste sentido, o PC funciona como uma igreja;




Grazia.tanta@gmail.com                           8/11/ 2011                                  5
•   Do ponto de vista ideológico, o PC é uma formação nacionalista, defensora
      de um Estado forte e autoritário, com os sectores estratégicos
      nacionalizados (banca, energia, media…), fórmula decalcada do modelo
      soviético mas, adaptado a regimes de pluralismo político formal. É
      profundamente avesso a manifestações de participação e autonomia
      popular, democracia direta, autogestão, desobediência civil, elegendo
      como inimigos de estimação grupos independentes do seu controlo ou
      anarquistas, não recuando mesmo em se conluiar com a polícia para a sua
      repressão;

  •   Na base desssa estabilidade estratégica está o “Rumo à Vitória”, escrito em
      1964 por Álvaro Cunhal que nele introduziu um conceito chamado de
      “revolução democrática e nacional”. Nesta, o derrube do fascismo sairia da
      luta dos trabalhadores aliados à pequena e média burguesia, contra os
      monopólios lusos que mais beneficiavam do regime.

      Claro que isso não se verificou, durante o fascismo, por várias razões.
      Primeiro, porque quase toda a burguesia portuguesa, no início da década
      de 70 procurava desembaraçar-se do caduco regime fascista por razões
      tão óbvias como, acelerar a ligação à CEE e resolver a questão colonial
      que passara a não ser rentável, para além de todos os inconvenientes de
      ordem política. Por outro lado, havendo essa unidade e sendo muito débil o
      poder real do PC e dos grupos à sua esquerda, a burguesia portuguesa não
      sentia a necessidade de alianças com o “proletariado”;

  •   Essa aliança com a burguesia pequena e média acabou por se verificar
      após o 25 de Abril, em torno dos militares, já não contra os fascistas, mas
      contra os trabalhadores que, “inoportunos” promoveram o afastamento da
      grande burguesia, com saneamentos e, mais tarde, expropriações. Nesse
      processo, que se veio a popularizar com o nome de PREC, os trabalhadores
      procuravam garantir o emprego e melhorar as suas condições de vida,
      tendo passado, naturalmente, a uma procura de modificações profundas
      na ordem democrática de base e de ameaça à ordem capitalista. A luta
      económica rapidamente radicalizou muitos trabalhadores que perceberam
      que o capitalismo só se destrói com a modificação das relações de
      produção e a extinção da propriedade privada da estrutura produtiva. Esse
      processo de expropriação veio a ser totalmente adulterado conforme já
      apontámos em “Nacionalização da banca: Piada ou mistificação?” (5)

  •   Nesse contexto, o PC promoveu em 1974/75 o combate às greves; assaltou
      os sindicatos onde a sua hegemonia não era aceite, fez o que podia para
      extinguir ou controlar as comissões de trabalhadores, favorecendo
      sindicatos verticalizados, anti-democráticos e únicos (lei da unicidade
      sindical); defendeu uma “batalha da produção” sem defender a alteração
      das relações de produção; sabotou quanto lhe foi possível as iniciativas
      autónomas dos trabalhadores procurando sempre a utilização do aparelho
      de Estado e a bajulação dos militares; procurou controlar os grandes meios


Grazia.tanta@gmail.com                     8/11/ 2011                       6
de comunicação (onde aliás o Nobel José Saramago se encheu de
      glória…); colou-se às reivindicações sociais dos assalariados rurais para a
      expropriação dos capitalistas e latifundiários, para aumentar o seu peso no
      xadrês poítico; instou à ilegalização de dois partidos de esquerda que lhe
      eram hostis; enganou vários outras formações políticas, antepassados das
      almas pias que hoje ainda consideram possível uma unidade estratégica
      com o PC, contra o PS/PSD e o mundo dos negócios; e colocou-se a bom
      recato, distanciado, quando se tornou claro que iria haver um golpe militar
      em 25 de Novembro, para estabelecer a velha ordem nas ruas, nas
      empresas e nos quartéis;

  •   Voltamos atrás, aos anos 60 para melhor situar as origens da actual
      actuação do PC. Para concretizar a política de aliança com camadas
      sociais defensoras do capitalismo, ainda que não fascistas, era preciso
      combater e eliminar tendências “esquerdistas”, provenientes de cisão
      dentro do próprio PC. Essas tendências (CMLP/FAP) resultantes da cisão
      ideológica sino-soviética, constituiam, após o apagamento da oposição
      anarquista nos anos 30, um novo desafio político e ideológico à hegemonia
      do PC, na área da esquerda. Para fazer face a esse desafio e quando a
      radicalização provocada pela eternização da guerra colonial incendiava a
      juventude, mormente os estudantes, o PC viu-se na necessidade de editar
      “O radicalismo pequeno-burguês de fachada socialista” (1971). Recorde-se
      que o PC, sendo formalmente contra a guerra, aconselhava os seus
      militantes a não desertarem, a participar na mesma e, se possível, no
      cenário de guerra, fugirem, de preferência com outros soldados e com
      armas… o que, se não fosse uma farsa, seria infantilidade;

  •   Esta outra vertente de diabolização e procura de isolamento de toda a
      oposição mais ou menos de esquerda, constitui ainda hoje peça central da
      inserção do PC na ação política. Consiste na utilização de técnicas
      estalinistas de apagamento da sua visibilidade, da sua repressão física com
      o recurso à ajuda ou colaboração da polícia; são casos bem evidentes, a
      denúncia dos cisionistas dos anos 60 no Avante! ou, a procura de
      controlo/punição de “esquerdistas” batizados de terroristas quando da
      cimeira da Nato, em Novembro de 2010; uma postura em tudo igual à
      lançada por George W Bush após o 11/9 e … adoptada como estratégia
      pela própria NATO (2) (3);

      Nos últimos tempos foi de pasmar os menos observadores da natureza do
      PC, a forma como a CGTP não emitiu qualquer apelo à participação nas
      manifestações de 15 de Outubro, nem noticiou a sua realização em
      Portugal como em mais de 1000 cidades. Na sua lógica, um protesto só é
      genuino se convocado pela CGTP/PC; só é unitário se submetido às ordens
      dos seus funcionários; um protesto internacional não se coaduna com o seu
      nacionalismo; e, mesmo que nos protestos tenham participado muitos
      militantes do partido, estes não têm direito ao aval posterior da sua direção;



Grazia.tanta@gmail.com                       8/11/ 2011                        7
•   O referido “Rumo à Vitória” apresenta uma clara definição da política de
      alianças do partido, que se mantém inalterável desde então; procura uma
      ligação privilegiada à direita, arrogando-se o PC, de permeio, ao monopólio
      da esquerda, a partido auto-ungido como dirigente da “classe operária”.
      Dentro desse parâmetro, procura aumentar o seu peso negocial junto da
      direita, apresentando-se como o regulador da esquerda. Nos anos 60, o
      alvo dessa política de aliança à direita era a “burguesia liberal” que era
      então quase invisível fora dos escritórios de alguns advogados bem
      instalados na vida. Depois do 25 de Abril seguiu-se a vigência dos governos
      provisórios onde o PC participou, ao lado dos militares, do PS e do PPD (que
      passou a PSD, para dar ares de esquerda, como convinha, na batalha
      perdida por Sá Carneiro, na disputa com o PS por um lugar nessa distinta
      estrumeira chamada Internacional Socialista); foi nesse periodo que o
      partido se mostrou muito hábil na construção de credenciais como agente
      essencial do controlo social, cargo que ainda hoje mantém;

  •   Durante alguns anos depois da normalização novembrista de 1975, o PC
      procurou essa aliança com o PS, com a defesa da “maioria de esquerda”.
      Claro que isso nunca se verificou como opção governativa geral, havendo
      apenas a registar pela sua notoriedade a aliança com o PS na câmara de
      Lisboa, pela mão de Sampaio que veio a ceder a presidência ao Soares
      junior; eleitoralmente o PC não ganhou nada com isso, antes pelo contrário
      e, com aquele brilhante “compaire” de coligação, foram ambos derrotados
      pelo impagável Santana (o Lopes);

  •   Essa postura relativamente ao PS, comum ao PC e ao BE, merece alguma
      análise, embora já a tenhamos esboçado a propósito da campanha do
      Alegre (6). A designação de “maioria de esquerda” foi abandonada há
      muitos anos, pouco depois de “estabilização” de 1975.

      Sabendo-se sem capacidade de, autonomamente, chegarem ao poder,
      mesmo através de uma improvável coligação a solo, a esquerda
      institucional aposta numa eventual viabilização de um governo PS,
      dependente do seu apoio e, obtendo como contrapartida, um ministro ou
      secretário de estado e a colocação de alguns “apparatchiks”;

  •   Consideramos essa hipótese bastante remota. Do ponto de vista histórico, o
      PS nunca recorreu a esse apoio para o governo central. Durante o segundo
      governo Guterres, quando este teve exatamente metade dos deputados
      (1999), o PS preferiu o recurso ao deputado do queijo limiano (CDS) do que
      servir-se da bancada do PC ou dos dois deputados do BE, recém-chegado
      ao areópago. E, em 2009, Sócrates, minoritário, preferiu sempre entender-se
      com o seu gêmeo PSD do que com os 31 deputados da ala esquerda da
      AR;

  •   Ainda históricamente, o PS, criado e municiado abundantemente (tal como
      o seu braço sindical, a UGT) pelo SPD alemão, através da Fundação


Grazia.tanta@gmail.com                      8/11/ 2011                       8
Friedrich Ebert, assumiu a liderança da “normalização” capitalista em 1975,
      unificando em seu redor toda a direita. E, em seu torno, acoitaram-se vastos
      sectores conservadores da população, anti-comunistas primários e
      reaccionários de gema. Dito de outro modo, o PS tornou-se, em 1975, um
      partido típico de direita mesmo quando nas suas manifestações se berrava
      ridiculamente “partido socialista, partido marxista”. Já então Mário Soares
      purgara a ala trabalhista e socialista do partido. A esse nascimento
      reaccionário o PS acrescentou a adopção à lógica neoliberal e do
      pensamento único que atingiu o seu apogeu durante o consulado de
      Sócrates;

  •   Perante esta prática e este curriculo do PS, a área esquerda institucional
      recusa-se a assumir o carácter de direita daquela agremiação,
      contentando-se em acusar a sua direção como adoptante de “políticas de
      direita” ou a argumentar com a (natural) existência de gente decente
      como militantes do PS. Entende-se essa ocultação; os partidos da esquerda
      institucional, pretendem estar inseridos dentro do regime cleptocrático e,
      simultaneamente convencerem a multidão sobre a sua intenção de
      transformações radicais que, efectivamente, não desejam. E para esse
      equilíbrio de mentira precisam de branquear o carácter do PS, colocando
      neste e nos seus dirigentes o travão para a transformação social que, afinal,
      é seguro com mãos firmes pelo PC/BE;

  •   O BE tem maior agilidade tática e maior criatividade que o PC e, não
      possuindo o mesmo lastro histórico estalinista torna-se mais atraente para
      sectores intelectuais e urbanos sem simpatias com as fórmulas pesadas e
      hierárquicas do PC. O BE, como nunca pretendeu adoptar a estrutura
      organizativa do PC, pauta-se como uma formação com propósitos
      eleitorais, usando como bandeira um grupo parlamentar activo e com
      algumas capacidades técnicas. Essas características e a hábil montagem
      de uma relação próxima com os media, dão-lhe uma visibilidade superior à
      sua representatividade social e na AR;

  •   Na sua existência de uns escassos doze anos e, passado um periodo inicial
      onde parecia constituir-se como elemento agregador de várias
      sensibilidades anti-sistema, o BE ficou embevecido como os seus sucessos
      eleitorais e a simpatia com que as suas propostas eram encaradas. Esse
      sucesso foi a sua morte anunciada como projeto integrador e mobilizador,
      de lufada de ar fresco na putrefacta ordem política post-25 de Novembro
      de 1975.

  •   Aproveitando-se da constante deriva para a direita do PS e do
      conservadorismo político e tático do PC, os dirigentes do BE pensaram
      constituir um grande partido social-democrata com gente “de esquerda”
      que abandonasse o PS, para mais marcado pela gestão de Sócrates,
      neoliberal e salpicada por casos óbvios de corrupção; pelo menos, para o
      julgamento da multidão. Para o efeito, contava com o conservadorismo do


Grazia.tanta@gmail.com                      8/11/ 2011                        9
PC e a forte vetustez de muitos dos seus militantes, pouco dados a
      devaneios contestatários e reais firmes adeptos da democracia de
      mercado;

  •   Para ganhar credibilidade como gestor público e fazer esquecer a aura de
      agremiação fracturante de esquerda, o BE embrulhou-se na Câmara de
      Lisboa com uma bandeira esfarrapada (o Zé que faz falta) e um acordo
      com o PS que publicamente, ninguém percebeu. Depois veio o encosto ao
      PS com um biombo chamado Alegre pelo meio e o resultado não foi
      animador pois a tal ala “esquerda” do PS, alegremente, preferiu a
      continuidade que dá mordomias e, nada de aventuras com um Alegre que
      não agradava a ninguém, para além do Louçã, seu grande defensor.
      Finalmente o xeque de Junho e a perda de metade dos deputados; uma
      vez mais a esquerda do PS não compareceu à chamada para o
      engrossamento de um partido social-democrata fora de tempo e o
      descontentamento popular assentou arraiais na abstenção ou preferiu
      estupidamente o Passecos, com medo de que as coisas piorassem e por
      ódio ao Sócrates. O recente desaire na Madeira insere-se nessa linha política
      fracassada.

  •   Para o BE, essa criatividade na proposta legislativa mostra-se desastrada na
      tática política. Em 2005, teria sido compreensível, no âmbito eleitoral das
      presidenciais, apoiar Alegre que, então, conseguiu dividir o PS; em 2010,
      quando o PS, no seu íntimo, preferia Cavaco e Alegre evidenciava
      incapacidade e incoerência política, o BE deixou-se arrastar pelo mito do
      milhão de votos do poeta em 2005 e teve uma enorme derrota política;

  •   Internamente, o BE, ao contrário do PC, apresenta uma pluralidade de
      reconhecidas tendências no seu seio, a maior parte, com projetos políticos
      cretácicos (ou “cretínicos”), pouco recomendáveis do ponto de vista da
      multidão e com pouco conteúdo democrático. Porém, é justo referir que a
      maioria dos militantes não se inclui nessas tendências. Vejamos:

         o O PSR é uma seita baseada na sebenta trotskista, integrante de uma
           prática estalinista de procura de controlo de grupos e potenciais
           movimentos sociais que, naturalmente, procuram conter dentro dos
           limites suficientes à manutenção do seu controlo burocrático;

         o Outra seita trotskista com ideário e práticas idênticas ao PSR – e por
           isso mesmo ferozes adversários – dá pelo nome de Ruptura/FER.
           Dentro (e fora) do BE, é um grupo desacreditado devido a um
           radicalismo delirante que, no entanto, atrai alguns jovens;

         o Uma corrente heterogénea designada internamente por “Política XXI”
           abarca várias vagas de “renovadores” do PC que, convertidos à
           social-democracia, anseiam por se deitarem na alcova do PS;
           apresentam um pensamento próximo do PC, sem obediência ao seu


Grazia.tanta@gmail.com                      8/11/ 2011                        10
comité central ou práticas estalinistas de controlo social. Apresenta
             um pendor eleitoral ancorado em figuras de potenciais caciques –
             Miguel Portas, Semedo, Pureza ou Daniel Oliveira;

          o O outro grupo relevante é o da UDP, o único que soube evoluir de um
            marxismo-leninismo    fossilizado, para    posturas  democráticas,
            constituindo o único grupo integrante do BE com alguma produção
            de pensamento; mesmo sem renegar o seu marxismo, o apego à
            intervenção do Estado e ao keynesianismo.

   •   Estes grupos ou tendências constituem as linhas de fractura que se
       alargarão se se mantiver a actual tendência de redução do apoio eleitoral
       e da influência que o BE teve nos primeiros anos da sua existência. Em caso
       de fractura, uns irão acolher-se ao albergue do Largo do Rato, outros
       estiolarão sobre a forma de grupo de estudos e os trotskistas, potenciando o
       seu pendor estalinista dedicar-se-ão ao controlo social, rivalizando entre si
       mas, unidos no ódio a grupos independentes ou anarquistas.


3 – Para a multidão em Portugal, a esquerda institucional de pouco tem servido


Quando se esboroa o resto da autonomia de Portugal enquanto Estado-nação e
essa re-hierarquização se traduz em forte pressão no sentido da degradação da
situação económica dos trabalhadores cabe perguntar; onde está essa esquerda
? Porque razão a multidão se reconhece pouco com as suas propostas e prefere
apoiar partidos de direita nos diversos pleitos eleitorais recentes (presidenciais,
legislativas e na Madeira)? Porque razão no país mais pobre da Europa ocidental
a conflitualidade social é quase inexistente? E porque tendo em conta a
expressão eleitoral da esquerda institucional, ela não se reflete em contestação
social?

Não há um determinismo entre a situação económica da multidão e a
contestação social e, menos ainda a sua organização. No entanto, no caso de
Portugal, há uma responsabilidade enorme da esquerda institucional portuguesa,
conservadora politicamente, com uma acção rotineira, sem iniciativas, sem
objectivos de transformação política, nem interesse na autonomia e criatividade
da multidão; pelo contrário, muito ocupada em reconduzir, em conter a
contestação nas estreitas vias das instituições do sistema, dia a dia mais
cleptocrático, opressor, e repressivo. Em suma, a esquerda institucional tem tido
um papel decisivo nas limitadas respostas da multidão à pulsão empobrecedora
dos governos e do empresariato e que se vem agudizando; e é transparente que
o Trinómio da Ineficácia – PC/CGTP/BE se mantém tíbio e pouco menos que inerte
na actual conjuntura.

Naturalmente, que a responsabilidade pela ausência de respostas adequadas à
ofensiva capitalista não é exclusiva da esquerda institucional, devendo-se


Grazia.tanta@gmail.com                       8/11/ 2011                        11
também às ilusões que a multidão tem tido sobre uma continuidade de padrões
de vida desajustados da estrutura produtiva existente; com a aceitação das
brutais desigualdades na distribuição do rendimento e da riqueza; com a enorme
ingenuidade face às virtualidades da democracia de mercado. E daí que existam
dificuldades de auto-organização, por norma, marcadas pela frieza, pela
sobranceria ou pelo boicote com que essa autonomia é encarada pela esquerda
institucional.

  a) Uma repartição escandalosa do rendimento

O quadro seguinte demonstra, de modo evidente, a perda do rendimento
disponível das famílias, longe de acompanhar, de mostrar paralelismo,
relativamente à evolução global da capitação da produção de riqueza. Dito de
outro modo, se o rendimento das famílias não acompanha o crescimento da
produção de riqueza é porque esta se esvaiu para os bolsos de estratos sociais
muito precisos e não beneficiou a esmagadora maioria das famílias.

Por outro lado, o fosso aumenta com a passagem do tempo e está longe de se
reduzir nos últimos anos, de maiores dificuldades económicas. Desmente,
claramente, a persistente propaganda de que temos de nos sacrificar “todos”.

Poder-se-ia pensar, num modelo vivido, décadas passadas, em alguns países da
Ásia (Coreia do Sul, por exemplo) baseado no sacrifício do bem estar da
população para o desenvolvimento de planos intensivos de capitalização e
construção de uma estrutura produtiva virada para a exportação. Ora a
realidade portuguesa desmente essa hipótese, uma vez que à persistente perda
de rendimento por parte da multidão, não corresponde uma acumulação de
capital produtivo, nem um incremento da exportação, dos pontos de vista
quantitativo e qualitativo. Não há qualquer estratégia desenvolvimentista da
classe política portuguesa nem do seu patronato, nem mesmo qualquer laivo de
nacionalismo, por muito reaccionário que isso seja.




Grazia.tanta@gmail.com                    8/11/ 2011                      12
Evolução da capitação do PIB e do rendimento
                       médio disponível (1992=100)

       240


       220


       200


       180


       160


       140


       120


       100
          92

          93

          94

          95

          96

          97

          98

          99

          00

          01

          02

          03

          04

          05

          06

          07

          08

          09

          10
        19

        19

        19

        19

        19

        19

        19

        19

        20

        20

        20

        20

        20

        20

        20

        20

        20

        20

        20
                   Rendimento médio disponível das famílias    Capitação do PIB

                                                          Fonte primária: Pordata


A situação atrás descrita é o retrato da incipiência da contestação social e da
reivindicação económica não assumida pelos dirigentes políticos da “esquerda”,
nem pelos burocratas sindicais. E revela a alegria contida, não alardeada, pelo
patronato e pelos seus mandarins.

   b) O salário médio em Portugal e na Europa

A comparação da relação entre o salário médio em Portugal e em vários países
da Europa, em 2000 e em 2007 indica uma perda de poder de compra dos
assalariados portugueses face à evolução observada na maioria dos outros países.
Os ganhos comparativos somente se registam para países de alto nivel de vida –
Alemanha, Suécia e Suiça – para além de Malta; aqui, o salário médio português
representava 93.7% do de um maltês em 2000 e 97.9% em 2007.

As perdas relativas do salário médio português tanto se verificam face a países de
elevado rendimento como aqueles cujos níveis de desenvolvimento mais se
aproximam de Portugal, sublinhando-se o caso da Espanha. Note-se a paulatina
aproximação entre os salários portugueses e os da Europa de Leste,
prenunciando, a prazo, a confirmação da tese do processo de
subdesenvolvimento em curso na ocidental praia lusitana.




Grazia.tanta@gmail.com                            8/11/ 2011                        13
Face a esta realidade, que dados mais recentes decerto agudizarão, uma vez
disponíveis, cabe perguntar se ela não reflectirá os amargos frutos de anos de
“concertação social” nos gabinetes alcatifados do poder?

         Relação do salário médio português com o de países europeus
         Evolução 2000/2007                                          ( %)
             Países           2000          2007             Países           2000       2007
         Alemanha                36,7         38,2 Grã-Bretanha                33,5       33,3
         Bélgica                 39,9         39,7 Holanda                     39,6       36,5
         Bulgária              882,4         584,4 Hungria                    302,4      171,4
         Chipre                  78,5         72,0 Luxemburgo                  35,2       33,9
         Dinamarca               30,8         28,9 Malta                       93,7       97,9
         Eslováquia            352,2         182,7 Noruega                     34,9       32,5
         Espanha                 72,4         70,1 Suécia                      39,9       41,6
         Finlândia               46,1         42,5 Suiça                       28,9       32,6
         França                  47,2         47,3
                                                     Chipre, Noruega – 2006; Suiça - 2008
                     ganhos relativos                            perdas relativas
                                                              Fonte primária: Eurostat


  c) O salário mínimo em Portugal e na Europa

Se se proceder a uma análise semelhante à anterior mas, contemplando o salário
mínimo os resultados são semelhantes. Uma coisa é um escasso crescimento do
salário mínimo quando o seu valor é próximo de € 1400 (Bélgica, França, Holanda)
e algo muito distinto, dentro de uma mesma zona económica (euro), é um salário
mínimo como o português, de € 485.

            Relação do salário mínimo português com o de outros países
            Evolução 2000/2007                                        (%)
                    Países        2000      2011           Países         2000     2011
            Bélgica                  34,9     40,0 Hungria                258,3      201,6
            Bulgária              964,6      461,1 Irlanda                  41,3      38,7
            Eslováquia            389,3      178,5 Letónia                449,4      200,7
            Eslovenia                98,6     75,6 Lituania               337,6      244,2
            Espanha                  77,1     75,6 Luxemburgo               31,0      32,2
            Estonia               381,3      203,5   Malta                 73,5       85,1
            EUA                    40,6       60,2   Polónia              197,5      162,3
            França                 36,0       41,5   Rep. Checa           273,3      177,3
            Grã-Bretanha           39,9       49,7   Roménia              941,3      359,9
            Grécia                 71,7       65,6   Turquia              173,9      147,0
            Holanda                33,8       39,7




Grazia.tanta@gmail.com                                  8/11/ 2011                               14
ganhos relativos                    perdas relativas
                                                     Fonte primária: Eurostat


O valor do salário mínimo e os níveis salariais na administração pública têm
funcionado, em Portugal, como um lastro que arrasta para o fundo todo o
espectro salarial e os direitos laborais. Este nivelamento por baixo serve os
interesses do capitalismo em geral e dos patrões lusos em particular, cuja
sobrevivência assenta, exclusivamente, na desvalorização do pagamento do
trabalho e do apoio do Estado à sua existência parasitária, com encomendas,
subsídios e a adequada produção legislativa.

A ideia estratégica dos capitalistas portugueses e dos seus mandarins é a
aproximação aos níveis salariais do leste da Europa, onde o valor do salário
mínimo tem evoluido mais rapidamente que o seu homólogo português.

                            Crescimento do valor do salário
                                mínimo (2001/2011) (%)
                          Bulgária     204 Lituania           101
                          Eslováquia   217 Polónia             77
                          Eslovenia     89 Portugal            45
                          Estonia      172 Rep. Checa         124
                          Hungria       86 Roménia            280
                          Letónia      225 Turquia             72
                                        Fonte primária: Eurostat


   d) A conflitualidade – o número de greves

Não pretendemos proceder a uma análise aprofundada da conflitualidade social
que,    englobará,    greves   não     “oficiais”, paralizações, manifestações,
concentrações e formas criativas que vêm surgindo e que merecem, em regra,
pouca atenção por parte dos media; excepto, quando pretendem adivinhar (ou
desejar) violência para apresentar ao jantar do povinho.

A conflitualidade social na Europa, medida pelo número de greves, não é
elevada e mostra-se decrescente para o conjunto de países com dados sobre o
assunto; e entre estes, para os que apresentam números de maior dimensão. A
entrada no presente século parece ir avolumando uma tendência decrescente.
Entre os paises considerados, somente em Espanha e Itália parece observar-se
uma relativa estabilidade no número de greves.

Vários factores explicarão as tendências observadas até 2008 (sublinhe-se a data,
que exclui os últimos anos em que a crise sistémica mais se tem vindo a verificar);
entre eles, a facilidade da concretização de despedimentos, a precariedade do
emprego, o desemprego continuado, a apatia ou conivência com os patrões de
dirigentes sindicais acomodados e reaccionários, capazes de combater com
violência activistas sindicais ou movimentos grevistas que não controlem.


Grazia.tanta@gmail.com                           8/11/ 2011                     15
Conflitualidade na Europa - número de greves
                      1999     2000     2001     2002     2003      2004      2005     2006        2007       2008
         Dinamarca    1.079    1.081     832     1.349      681       804        534        476      862        335
         Espanha        749     750      737      688       678       708        685        783      752        811
         Finlândia       65      96       84       76       112          84      365         97          91      92
         G-Bretanha     205     226      207      162       138       135        116        158      152        144
         Itália         753     966      746      616       710       745        654        587      667        621
         Portugal       200     250      208      250       170       122        126        155          99      nd
         Soma         3.051    3.369    2.814    3.141    2.489     2.598     2.480    2.256       2.623      2.003
                                                                                              Fonte: Eurostat


   e) A conflitualidade – o número de dias de greve

A consideração do número de dias de greve, designados nas estatísticas por “dias
perdidos”, revela uma irregularidade do movimento grevista e o seu carácter
nacional, quando não sectorial ou local, não coordenado internacionalmente.
Dessa ausência de concertação estratégica beneficiam os capitalistas e os
burocratas sindicais, estes decerto bem mais motivados para outros acertos, com
patrõres e mandarins, nas “concertações sociais” elementos do chamado
“modelo social europeu” que ainda não foram destruidos, por razões que são
óbvias. Sobressaem os valores apresentados pela Espanha em 2002 e 2004, pela
França em 2003, pela Itália em 2004, pela Grã-Bretanha em 2002 e 2007 ou pela
Dinamarca em 2007. Em Portugal, os dias contabilizados como de greve são muito
reduzidos, com um valor mais elevado em 2002.

Conflitualidade na Europa - número de dias de greve (1000)
                       1999     2000      2001      2002          2003
Dinamarca               91,8    124,8      56,0         193,6      55,1
Espanha               1.504,6 3.616,9 1.923,8       4.945,1       792,1
França                1.325,4 2.460,2 1.807,3           990,8 4.388,4
Grã-Bretanha           241,8    498,8     525,1     1.323,3       499,1
Itália                 909,1    884,1 1.026,0       4.861,0 1.961,7
Portugal                67,5     40,6      41,6         108,1      53,4
Soma                  4.140,2 7.625,4 5.379,7 12.421,9 7.749,8


                                                                      2004        2005        2006        2007        2008
                                            Dinamarca                     76,4       51,1         85,9        91,7 1.869,1
                                            Espanha                  4.472,6      951,5       927,7 1.187,7 1.510,2
                                            França                       724,6 1.997,0 1.421,4 1.553,0                     nd
                                            Grã-Bretanha                 904,9    223,8       754,5 1.041,1           758,9


Grazia.tanta@gmail.com                                          8/11/ 2011                                            16
Itália                   698,6      906,9       554,7          929,7    722,7
                                        Portugal                  46,1        27,3         44,2         29,9         nd
                                        Soma                   6.923,2 4.157,6 3.788,5 4.833,0 4.860,9
                                                                                     Fonte: Eurostat


Calculámos para alguns países o número médio de dias de greve por paralização,
relativos a 2008. Esse indicador, adiante evidenciado, é muito distinto, conforme se
refere a países do sul, onde é muito mais baixo, do que nos dois países a norte. Em
Portugal, pela incipiência da contestação social e pela mais baixa dimensão das
empresas, este indicador pode traduzir-se, aproximadamente e, por cada greve,
como efectuada por cem trabalhadores durante três dias.

                   Dinamarca                5579 Itália                          1164
                   Espanha                  1862 Portugal (2007)                  302
                   Grã Bretanha             5270

   f) A conflitualidade – o número de trabalhadores grevistas

Um terceiro elemento conhecido relativamente às greves registadas na Europa
contempla o número de trabalhadores envolvidos. Observa-se, também aqui,
uma irregularidade acentuada, difícil de propiciar a construção de tendências.

O ano de 2002 regista um elevado número de grevistas devido aos contributos da
Itália e da Espanha mas também e, nas devidas proporções, pelos outros países
seleccionados, excepto a França, que se veio a destacar no ano seguinte. Em
Portugal o número de trabalhadores envolvidos em greves é escasso em número
absoluto e mesmo quando se tem em consideração a diferente dimensão
humana dos diversos países, ao efectuar-se um cotejo. Compare-se, por exemplo,
a situação portuguesa de país mais pobre da Europa ocidental com a Espanha
com uma população quatro vezes superior mas um movimento grevista
incomparavelmente superior; e ainda a Dinamarca, com cerca de metade da
população portuguesa, país muito mais rico e que apresenta um movimento
grevista mais de duas vezes superior.

      Conflitualidade na Europa - número de trabalhadores em greve (1000)
                    1999     2000    2001    2002      2003    2004    2005      2006       2007        2008
      Dinamarca        75      76      49        111     44      76        33         79          61       91
      Espanha        1.133   2.067   1.245    4.534     729     556       405        500      497         543
      França          430     819     430        266   1.226    226       883        708      473         nd
      G-Bretanha      141     183     180        943    151     293        93        713      745         511
      Itália          935     687    1.125    5.442    2.561    709       961        467      906         669
      Portugal         34      39      26         80     30      32        22         33          29      nd

      Soma           2.747   3.871   3.055 11.376      4.741   1.892     2.395   2.500      2.712       1.815
                                                                                        Fonte: Eurostat


Grazia.tanta@gmail.com                                   8/11/ 2011                                             17
O cálculo do número médio de trabalhadores por greve em 2008 é baixo,
revelando o seu carácter local, isolado, desligado de qualquer lógica de união de
forças, de protesto colectivo, mesmo a nível nacional.

                         Número trabalhadores/greve
                         Dinamarca      273 Itália          1078
                         Espanha        670 Portugal         295
                         Grã-Bretanha   3550

Por outro lado, o tempo de greve é, em média, curto, pese embora, no caso da
Dinamarca, em 2008, o esforço de cada grevista ter sido particularmente elevado.

                       Número dias greve/trabalhador
                       Dinamarca  20,4 Grã-Bretanha  1,5
                       Espanha    2,8 Itália         1,1
                       França     3,3 Portugal       1,0

Como se denota, em todos estes elementos atrás apresentados, em Portugal a
conflitualidade através de greves é escassa, muito inferior, qualquer que seja o
ângulo de visão, ao que se passa nos outros países europeus que, por sua vez, não
ostentam uma conflitualidade profunda nem alargada.

  g) Conflitualidade em Portugal (1990/2007)

Observe-se, de seguida, a evolução histórica dos indicadores utilizados – número
de greves, trabalhadores envolvidos e dias de trabalho “perdidos” para o periodo
1990/2007, em Portugal.




Grazia.tanta@gmail.com                         8/11/ 2011                   18
Conflitualidade social em Portugal (1990=100)
      160


      140


      120



      100


       80



       60


       40


       20


        0
         90

                91

                       92

                              93

                                     94

                                            95

                                                   96

                                                          97

                                                                 98

                                                                        99

                                                                               00

                                                                                      01

                                                                                             02

                                                                                                    03

                                                                                                           04

                                                                                                                  05

                                                                                                                         06

                                                                                                                                07
       19

              19

                     19

                            19

                                   19

                                          19

                                                 19

                                                        19

                                                               19

                                                                      19

                                                                             20

                                                                                    20

                                                                                           20

                                                                                                  20

                                                                                                         20

                                                                                                                20

                                                                                                                       20

                                                                                                                              20
                                            Grev es            Trab. Env olv idos          Dias "perdidos"



Revela-se no gráfico anterior uma evolução do protesto social a nível laboral
absolutamente antagónica à marcha da perda da relevância do trabalho e dos
trabalhadores na vida económica e na distribuição da riqueza por aqueles
produzida. Depois de uma primeira greve geral em 1988, as centrais sindicais
vêem-se na obrigação de repetir essa mobilização, em 2010 e, brevemente, em 24
deste mês, só depois de quatro PEC’s, da intervenção da “troika” e de medidas
incontestavelmente lesivas da multidão.

Mais vale tarde que nunca, dir-se-á. A questão é saber se os burocratas sindicais
englobam a greve geral numa estratégia de mobilização gradativa e de unidade
dos trabalhadores contra o sistema – hoje, reconhecidamente cleptocrático; ou,
se a mesma não passa de uma satisfação que se dá aos sectores mais atingidos
pela “austeridade” ou para cortar as asas dos mais contestatários, no âmbito de
uma campanha sazonal, igual à de todos os anos e que decorre de outubro a
maio, com pausas em dezembro e pela páscoa. Inclinamo-nos, muito
sinceramente, para o segundo caso.

  h) Votação na esquerda institucional em legislativas

As democracias de mercado têm na sua configuração diversas e cuidadas formas
de perpetuar o poder de oligarquias económicas e políticas; destacando-se aqui


Grazia.tanta@gmail.com                                                       8/11/ 2011                                              19
uma daquelas – o mecanismo eleitoral - em que a multidão é conduzida a
acreditar como democrático e susceptível de promover reais alterações ao statu
quo.

O mecanismo eleitoral encontra-se viciado em muitos aspectos; é a estrutura das
circunscrições eleitorais, o método de Hondt, a hierarquização implícita entre
partidos de poder e os outros, decorativos; é o monopólio eleitoral dos partidos, a
dificuldade de constituição de novos partidos, o apoio financeiro aos partidos do
sistema; é ainda, o pagamento e as mordomias dadas a mandarins para a sua
constituição como casta gestora dos bens públicos, os privilégios mediáticos dos
partidos, como representantes da opinião, etc. E, porque conformados e
beneficiários do sistema, os partidos da esquerda institucional não geram debate
ou denúncia dos mecanismos da democracia de mercado.

Uma análise das eleições legislativas realizadas em Portugal depois do fim do
regime fascista, revela de modo claro, que as mesmas nada mais têm feito que
legitimar e perpetuar o regime cleptocrático presente.

Os catorze actos eleitorais realizados revelam, através do gráfico seguinte, valores
para os votantes no espectro partidário dentro de um intervalo relativamente
estreito – um máximo de 5889 milhares em 1980 e um mínimo de 5307 mil em 1999.
Essa variação é totalmente insensível ao natural aumento da população com
direito a voto – 6321 mil em 1975 e 9624 milhares em 2011; este aumento de 54.4%
está longe de se repercutir no crescimento da participação eleitoral.

O segmento dos eleitores que não manifestam uma opção de voto partidário –
abstencionistas e votantes em branco ou que anularam o voto – cresce
acentuadamente no período considerado – 916 mil em 1975 e 4264 mil este ano. É
certo que o mandarinato tem descurado a fiabilidade do recenseamento
eleitoral, revelando explicitamente a consideração que tem pela democracia,
pela transparência; importa-lhe, decerto muito mais curar das bases de dados
que incluem elementos pessoais para fornecer à suserania norte-americana ou, as
que facilitam a punção fiscal junto da multidão. (7)




Grazia.tanta@gmail.com                       8/11/ 2011                        20
Votações em eleições legislativas (1975-2011)
(1000)

7.000

6.000

5.000

4.000

3.000

2.000

1.000

    0
         1.975 1.976 1.979 1.980 1.983 1.985 1.987 1.991 1.995 1.999 2.002 2.005 2.009 2.011

                    Abstenções, brancos e nulos   Votos em partidos     Esquerda


No entanto, mesmo considerando, a existência de centenas de milhar de eleitores
“fantasmas”, é evidente o aumento do volume de pessoas que se desinteressam
pelos pleitos eleitorais, revelando, dentro da pluralidade de razões para os
comportamentos aqui tipificados, uma descrença ou desinteresse pela paleta das
opções partidárias pelo método vigente para a expressão da vontade popular, se
não mesmo pelo sistema de representação a que designamos por democracia de
mercado.

A adesão das pessoas às propostas da esquerda institucional (conceito que aqui,
como sempre nos nossos textos, exclui o PS) não constitui grande ilustração para os
seus dirigentes e para a estratégia de privilégio da lógica eleitoral praticada
periodicamente, quando o sistema cleptocrático decide encenar uma consulta
popular ao seu desempenho. A coisificação das pessoas, a sua desqualificação
como eleitores, como actores sociais passivos que apenas se pretendem sensíveis
aos discursos inflamados dos profissionais da política da esquerda institucional,
(como dos outros partido) cansa e vai ficando desqualificada na cabeça de
muita gente.

As propostas da esquerda institucional são geralmente estafadas, desajustadas ou
enganosas. Situam-se muito atrás das novas necessidades da multidão e,
portanto, não conseguem entusiasmar nem promover mudanças substantivas nos
desequilíbrios eleitorais. Uma das causas dessa incapacidade resulta da inclusão
das suas propostas em ideologias políticas tomadas como pré-cozinhados prontos
para uma breve passagem no micro-ondas. Há também uma incompreensão das
sociedades actuais pouco dadas à aceitação entusiasta de escatologias


Grazia.tanta@gmail.com                             8/11/ 2011                             21
salvíticas. Por outro lado, os partidos da esquerda institucional continuam a
comportar-se como elites destinadas à condução e enquadramento de gentes
eivadas de fé, esquecendo que a multidão, hoje, engloba enormes segmentos de
gente instruida e qualificada, nem sempre disponível para seguir iluminados gurus.

A esquerda eleitoral, nos primeiros actos eleitorais verificados após o 25 de Abril
revela o seu apogeu absoluto em 1979, com 1.4 M de votantes, correspondentes a
24.1% dos votos dirigidos a partidos. Segue-se, um largo periodo de constante
declínio, que atinge o ponto mais baixo em 2002, com 586 mil sufrágios; esse
declínio foi interrompido em 2005, se se excluir uma ligeira recuperação observada
em 1999. A preponderância do PC, que raras vezes desce abaixo dos 80% dos
votos à esquerda, até 1995, decaiu fortemente nas eleições seguintes, passando
mesmo o peso do partido, em 2002/2005, a situar-se aquém de 50%, marca de
novo ultrapassada, por pouco, nas recentes eleições.

Em 2009 os votos posicionados à esquerda ultrapassam os 1060 milhares (20% dos
dirigidos a partidos), marca que não era atingida desde 1985 e que resulta do
elevado crescimento do BE. O volume dos votantes na esquerda eleitoral
registado em 2011 reconduz a votação aos níveis de 1987 ou 2005 e revela,
provavelmente, que o BE será um epifenómeno típico da primeira década do
século, com um declínio anunciado.

No seu conjunto os votos dirigidos à esquerda, superiores a um milhão até 1985, só
voltam a ultrapassar aquela fasquia em 2009. O cavaquismo, a adesão à UE e o
maná dos fundos comunitários conduziram ao já referido declínio da esquerda
eleitoral, incapaz de perceber a nova situação de consolidação capitalista; o que
volta a acontecer quando da vitória do PSD/CDS em 2002 e recentemente, em
2011. A esquerda institucional, no seu conjunto, é vulnerável à dinâmica da direita
mais reaccionária, não se constituindo em polo de aglutinação eficaz a essa
dinâmica.

Como se pode observar no gráfico acima, não há qualquer evidência de
crescimento sustentado do eleitorado de esquerda. Por outro lado, a progressiva
consolidação da influência do pensamento único neoliberal na sociedade
portuguesa e europeia contamina a esquerda institucional, cujas propostas se
mostram tendencialmente mais conservadoras, mais integradas no pântano da
democracia de mercado, conjunturais e jamais anti-sistémicas. Dir-se-ia que
navega no mesmo barco que carrega o sistema cleptocrático, adequando a sua
agenda em resposta à deriva reaccionária da direita, mormente do PS; e por isso,
nunca é capaz de qualificar aquele gang como uma agremiação de direita.


4 - A necessidade de reflexão e mudança de paradigma

                      “O problema é o sistema; a crise não passa do seu fedor”
                      (texto de uma faixa presente em Lisboa, na manifestação de 15 de outubro)




Grazia.tanta@gmail.com                            8/11/ 2011                                  22
No verão do ano transacto escrevemos “Pensar à esquerda, sem vacas sagradas”
(8). Os pontos aí referidos - o pensamento único, o modelo social europeu, o fim
das nações, União Europeia, o Estado, uma democracia para consumidores, um
autoritarismo crescente, os excedentes de vidas humanas, o militarismo, a deriva
ambiental - continuam a ter toda a atualidade. No entanto, alguns desses ponto
requerem enriquecimento e outros temas deverão ser acrescentados, tendo em
consideração a evolução global e a profunda degenerescência que se vem
observando na vida politica e social.

Quando se fala do pensamento único, a tendência é para o identificar com a
arrogância ganhadora dos arautos da felicidade eterna propiciada pelo
capitalismo de matriz neoliberal após a queda do Muro de Berlim e o
desmoronamento do chamado “bloco soviético”.

A crise que se tornou pública com o processo dos “subprimes” nos EUA mostra-se
tão funda e aguda que vem promovendo o surgimento de novas formas de
gestão capitalista que mereceram da nossa parte um artigo sobre os
“renovadores” do capitalismo, em Dezembro de 2009 (9).

A referida crise não é mais do que uma sequela do funcionamento do primado da
lógica financeira e especulativa sobre a realidade a qual, queira-se ou não, é
constituida por coisas mais palpáveis como produção, emprego, direitos laborais e
políticos, organização social, poupança, investimento, gestão pública, etc. Esse
desvio político e ideológico transformou-se em várias crises - da dívida pública, do
emprego, do empobrecimento generalizado e do euro, para só referir as mais
evidentes ou mediáticas.

Ao agudizar-se, a crise veio promover o reaparecimento de ideias antigas sobre o
capitalismo por parte de dois tipos de políticos ou analistas.

Uns, neoliberais assustados, procuram as adaptações necessárias para continuar –
até à proxima crise – o modelo de acumulação baseado na ampla
desmaterialização da formação de riqueza; é o que fazem os eurocratas, sempre
suspensos dos encontros do parelha Merkel-Sarkozy.

Outros, a que daremos maior relevo no contexto deste texto, envolvem vários tipos
de pessoas. Alguns, com ilusões sobre as virtudes de um capitalismo regulado,
com políticas voluntaristas de um Estado criador de moeda e tentacular,
apresentam-se repletos da esperança de que os banqueiros e os especuladores
lhes dêem uma oportunidade como gestores dos interesses do capital. Outros, de
“esquerda” ditos marxistas, trotskistas ou estalinistas (estes nunca se revelam como
tal) pintalgam-se de keynesianos responsáveis à procura de cooptação pelo
poder, preparando-se para assumir funções de reguladores do controlo da
indignação das multidões roubadas e empobrecidas para salvar o capitalismo.
Enfim, origens e caminhos distintos, com agentes provenientes de áreas políticas
distintas mas, com um só fito – concorrerem ou coligar-se para a salvação do



Grazia.tanta@gmail.com                       8/11/ 2011                        23
capitalismo, para um mais repressivo controlo da multidão – e acederem às
alegrias e privilégios de serem poder.

Em termos globais, não acreditamos que os dedos no ar destes naipes de
ingénuos ou oportunistas em busca do seu bem-estar como gestores da crise e do
controlo social, sirvam de grande coisa para a esmagadora maioria; o seu
principal perigo é o da confusão que geram, as ilusões que alimentam na plebe, o
favor que fazem para a continuidade do sistema. E, nesse contexto, o título que
colocámos para este conjunto de linhas, até poderá ser considerado benévolo.

É preciso evidenciar na fraseologia políticamente correta dos partidos da
chamada esquerda, bem como nos seus comportamentos, os seus verdadeiros
objetivos de controlo social, como órgãos do Estado. E saber aclarar o seu papel
junto da multidão, com relevo para os seus militantes e simpatizantes não
fanatizados. Aquele papel tem de ser claro para todos, tal como a destrinça entre
uma batata e um piano.

-----------------------------------------

Notas:

(1) http://tripnaarcada.blogspot.com/2011/05/violencia-policial-contra-anarquistas.html
(2) http://viasfacto.blogspot.com/2011/05/o-que-vi-em-setubal-durante.html
(3) http://www.slideshare.net/durgarrai/a-misria-da-esquerda-que-anda-por-a-um-case-
      study-a-cimeira-da-nato
(4) Recentemente tem-se assistido à infiltração de grupos enfeudados a forças da dita
    “esquerda” no movimento 15 O, nomeadamente por parte do “M12M” e de outras
    pequenas seitas, como o PSR; esta, através de um prévio domínio que exerce sobre
    alguns pseudo movimentos, com nomes insuspeitos para os incautos.
(5) http://www.slideshare.net/durgarrai/nacionalizao-da-banca-piada-ou-mistificao
(6) http://www.scribd.com/doc/24681888/Esquerda-PS-e-Alegre-%E2%80%93-Confusoes-
      e-premeditacoes-eleitorais
(7) http://www.slideshare.net/durgarrai/um-sistema-eleitoral-falsificado-e-enganador
(8) http://www.slideshare.net/durgarrai/pensar-esquerda-sem-vacas-sagradas
(9) http://www.slideshare.net/durgarrai/a-resposta-capitalista-que-esto-a-preparar-para-
      a-crise




Este e outros textos em:


http://pt.scribd.com/documents#all?sort=date&sort_direction=ascending&page=1

http://www.slideshare.net/durgarrai/documents

www.esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt



Grazia.tanta@gmail.com                         8/11/ 2011                          24

Contenu connexe

Tendances

Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)
Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)
Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)GRAZIA TANTA
 
Rccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_ee
Rccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_eeRccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_ee
Rccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_eeElisio Estanque
 
Fae curitiba ee_cultura de empresa-signed
Fae curitiba ee_cultura de empresa-signedFae curitiba ee_cultura de empresa-signed
Fae curitiba ee_cultura de empresa-signedElisio Estanque
 
Fae curitiba ee_cultura de empresa
Fae curitiba ee_cultura de empresaFae curitiba ee_cultura de empresa
Fae curitiba ee_cultura de empresaElisio Estanque
 
História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...
História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...
História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...A. Rui Teixeira Santos
 
Capitalismo e autoritarismo
Capitalismo e autoritarismoCapitalismo e autoritarismo
Capitalismo e autoritarismoGRAZIA TANTA
 
O sistema partidário português
O sistema partidário  portuguêsO sistema partidário  português
O sistema partidário portuguêsGRAZIA TANTA
 
Mov sociais a nova rebelião da classe media eesne_sup2012
Mov sociais  a nova rebelião da classe media eesne_sup2012Mov sociais  a nova rebelião da classe media eesne_sup2012
Mov sociais a nova rebelião da classe media eesne_sup2012Elisio Estanque
 
Notas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneo
Notas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneoNotas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneo
Notas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneoMaria Amélia Ferracciú Pagotto
 
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013Elisio Estanque
 
Burocracia pública e classe dirigente no brasil
Burocracia pública e classe dirigente no brasilBurocracia pública e classe dirigente no brasil
Burocracia pública e classe dirigente no brasilIranilton Marcolino
 
Estado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundo
Estado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundoEstado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundo
Estado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundoFernando Alcoforado
 
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05Elisio Estanque
 
Revoluçâo e socialismo: notas teóricas
Revoluçâo e socialismo: notas teóricasRevoluçâo e socialismo: notas teóricas
Revoluçâo e socialismo: notas teóricasAlessandro de Moura
 
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17Elisio Estanque
 
Doutrina política novas esquerdas
Doutrina política   novas esquerdasDoutrina política   novas esquerdas
Doutrina política novas esquerdasJosué Machado
 
A História Política do Brasil Contemporâneo
A História Política do Brasil ContemporâneoA História Política do Brasil Contemporâneo
A História Política do Brasil Contemporâneoguest0739d3c
 
Estratégia das Tesouras - 1989
Estratégia das Tesouras - 1989Estratégia das Tesouras - 1989
Estratégia das Tesouras - 1989Professor Belinaso
 
Conflito Social e Welfare State
Conflito Social e Welfare StateConflito Social e Welfare State
Conflito Social e Welfare StateJhose Filho
 

Tendances (20)

Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)
Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)
Um internacionalismo do século xxi, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)
 
Rccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_ee
Rccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_eeRccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_ee
Rccs 103 rebeliao de classe media_pp53-80_ee
 
Fae curitiba ee_cultura de empresa-signed
Fae curitiba ee_cultura de empresa-signedFae curitiba ee_cultura de empresa-signed
Fae curitiba ee_cultura de empresa-signed
 
Fae curitiba ee_cultura de empresa
Fae curitiba ee_cultura de empresaFae curitiba ee_cultura de empresa
Fae curitiba ee_cultura de empresa
 
História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...
História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...
História das privatizações em Portugal: de uma opção ideológica a um instrume...
 
Capitalismo e autoritarismo
Capitalismo e autoritarismoCapitalismo e autoritarismo
Capitalismo e autoritarismo
 
O sistema partidário português
O sistema partidário  portuguêsO sistema partidário  português
O sistema partidário português
 
Mov sociais a nova rebelião da classe media eesne_sup2012
Mov sociais  a nova rebelião da classe media eesne_sup2012Mov sociais  a nova rebelião da classe media eesne_sup2012
Mov sociais a nova rebelião da classe media eesne_sup2012
 
Notas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneo
Notas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneoNotas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneo
Notas criticas sobre_justica_estado_e_direito_no_mundo_contemporaneo
 
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
 
Burocracia pública e classe dirigente no brasil
Burocracia pública e classe dirigente no brasilBurocracia pública e classe dirigente no brasil
Burocracia pública e classe dirigente no brasil
 
Estado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundo
Estado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundoEstado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundo
Estado predador e sociedade sitiada no brasil e no mundo
 
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
 
Revoluçâo e socialismo: notas teóricas
Revoluçâo e socialismo: notas teóricasRevoluçâo e socialismo: notas teóricas
Revoluçâo e socialismo: notas teóricas
 
Welfare state
Welfare stateWelfare state
Welfare state
 
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
 
Doutrina política novas esquerdas
Doutrina política   novas esquerdasDoutrina política   novas esquerdas
Doutrina política novas esquerdas
 
A História Política do Brasil Contemporâneo
A História Política do Brasil ContemporâneoA História Política do Brasil Contemporâneo
A História Política do Brasil Contemporâneo
 
Estratégia das Tesouras - 1989
Estratégia das Tesouras - 1989Estratégia das Tesouras - 1989
Estratégia das Tesouras - 1989
 
Conflito Social e Welfare State
Conflito Social e Welfare StateConflito Social e Welfare State
Conflito Social e Welfare State
 

En vedette

Conceitos De Sociologia politica II
Conceitos De Sociologia politica IIConceitos De Sociologia politica II
Conceitos De Sociologia politica IILaguat
 
As ideologias na_atualidade
As ideologias na_atualidadeAs ideologias na_atualidade
As ideologias na_atualidadeDouglas Gregorio
 
O período democrático ou populista
O período democrático ou populistaO período democrático ou populista
O período democrático ou populistaGilmar Rodrigues
 
Esquerda e direita na sociologia
Esquerda e direita na sociologiaEsquerda e direita na sociologia
Esquerda e direita na sociologiaGustavo Cuin
 
Guerra Fria e as Ditaduras na América Latina
Guerra Fria e as Ditaduras na América LatinaGuerra Fria e as Ditaduras na América Latina
Guerra Fria e as Ditaduras na América Latinaeiprofessor
 
Cap 13 Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a vossa mão direita
Cap 13 Não saiba a vossa mão esquerdao que dê a vossa mão direitaCap 13 Não saiba a vossa mão esquerdao que dê a vossa mão direita
Cap 13 Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a vossa mão direitagmo1973
 
Ditaduras na america latina
Ditaduras na america latinaDitaduras na america latina
Ditaduras na america latinaIsabel Aguiar
 
Populismo e Ditaduras na América Latina
Populismo e Ditaduras na América LatinaPopulismo e Ditaduras na América Latina
Populismo e Ditaduras na América LatinaGilmar Rodrigues
 

En vedette (13)

Conceitos De Sociologia politica II
Conceitos De Sociologia politica IIConceitos De Sociologia politica II
Conceitos De Sociologia politica II
 
Direita x esquerda
Direita x esquerdaDireita x esquerda
Direita x esquerda
 
Esquerda, direita e centro na Sociologia Política
Esquerda, direita e centro na Sociologia Política Esquerda, direita e centro na Sociologia Política
Esquerda, direita e centro na Sociologia Política
 
As ideologias na_atualidade
As ideologias na_atualidadeAs ideologias na_atualidade
As ideologias na_atualidade
 
Direita x Esquerda!
Direita x Esquerda!Direita x Esquerda!
Direita x Esquerda!
 
10. esquerda . direita e centro
10.  esquerda . direita e centro10.  esquerda . direita e centro
10. esquerda . direita e centro
 
Iluminismo
IluminismoIluminismo
Iluminismo
 
O período democrático ou populista
O período democrático ou populistaO período democrático ou populista
O período democrático ou populista
 
Esquerda e direita na sociologia
Esquerda e direita na sociologiaEsquerda e direita na sociologia
Esquerda e direita na sociologia
 
Guerra Fria e as Ditaduras na América Latina
Guerra Fria e as Ditaduras na América LatinaGuerra Fria e as Ditaduras na América Latina
Guerra Fria e as Ditaduras na América Latina
 
Cap 13 Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a vossa mão direita
Cap 13 Não saiba a vossa mão esquerdao que dê a vossa mão direitaCap 13 Não saiba a vossa mão esquerdao que dê a vossa mão direita
Cap 13 Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a vossa mão direita
 
Ditaduras na america latina
Ditaduras na america latinaDitaduras na america latina
Ditaduras na america latina
 
Populismo e Ditaduras na América Latina
Populismo e Ditaduras na América LatinaPopulismo e Ditaduras na América Latina
Populismo e Ditaduras na América Latina
 

Similaire à A esquerda institucional e a realidade social em Portugal

Constituicao e concretizacao da democracia
Constituicao e concretizacao da democraciaConstituicao e concretizacao da democracia
Constituicao e concretizacao da democraciaThiago Almeida
 
Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1
Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1
Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1GRAZIA TANTA
 
Notas sobre a deriva fascizante em curso
Notas sobre a deriva fascizante em cursoNotas sobre a deriva fascizante em curso
Notas sobre a deriva fascizante em cursoGRAZIA TANTA
 
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuroCapitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuroGRAZIA TANTA
 
Para um novo paradigma político; a re criação da democracia
Para um novo paradigma político; a re criação da democraciaPara um novo paradigma político; a re criação da democracia
Para um novo paradigma político; a re criação da democraciaGRAZIA TANTA
 
Democracia america latina
Democracia america latinaDemocracia america latina
Democracia america latinaErica Rabelo
 
A Constituição (CRP) e alguns dos seus princípios oligárquicos
A Constituição (CRP)  e alguns dos seus princípios oligárquicosA Constituição (CRP)  e alguns dos seus princípios oligárquicos
A Constituição (CRP) e alguns dos seus princípios oligárquicosGRAZIA TANTA
 
Catorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdf
Catorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdfCatorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdf
Catorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdfPamela931154
 
Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação 1a parte-
Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação  1a parte-Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação  1a parte-
Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação 1a parte-GRAZIA TANTA
 
Presidente da república – figura dispensável num regime democrático
Presidente da república – figura dispensável num regime democráticoPresidente da república – figura dispensável num regime democrático
Presidente da república – figura dispensável num regime democráticoGRAZIA TANTA
 
A terceira dimensão do poder
A terceira dimensão do poderA terceira dimensão do poder
A terceira dimensão do poderHerbert Schutzer
 
Eleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantes
Eleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantesEleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantes
Eleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantesGRAZIA TANTA
 
Como resgatar a ética e a moral no brasil
Como resgatar a ética e a moral no brasilComo resgatar a ética e a moral no brasil
Como resgatar a ética e a moral no brasilFernando Alcoforado
 
Síntese: por uma democracia de alta intensidade
Síntese: por uma democracia de alta intensidadeSíntese: por uma democracia de alta intensidade
Síntese: por uma democracia de alta intensidadeLívia Willborn
 
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxiGRAZIA TANTA
 
POR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIA
POR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIAPOR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIA
POR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIAaugustodefranco .
 
As últimas eleições autárquicas. observações e comparações
As últimas eleições autárquicas. observações e comparaçõesAs últimas eleições autárquicas. observações e comparações
As últimas eleições autárquicas. observações e comparaçõesGRAZIA TANTA
 

Similaire à A esquerda institucional e a realidade social em Portugal (20)

Constituicao e concretizacao da democracia
Constituicao e concretizacao da democraciaConstituicao e concretizacao da democracia
Constituicao e concretizacao da democracia
 
Aula estado dominação_poder
Aula estado dominação_poderAula estado dominação_poder
Aula estado dominação_poder
 
Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1
Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1
Para uma constituição democrática com caráter de urgência – 1
 
Notas sobre a deriva fascizante em curso
Notas sobre a deriva fascizante em cursoNotas sobre a deriva fascizante em curso
Notas sobre a deriva fascizante em curso
 
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuroCapitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
 
Para um novo paradigma político; a re criação da democracia
Para um novo paradigma político; a re criação da democraciaPara um novo paradigma político; a re criação da democracia
Para um novo paradigma político; a re criação da democracia
 
Democracia america latina
Democracia america latinaDemocracia america latina
Democracia america latina
 
A Constituição (CRP) e alguns dos seus princípios oligárquicos
A Constituição (CRP)  e alguns dos seus princípios oligárquicosA Constituição (CRP)  e alguns dos seus princípios oligárquicos
A Constituição (CRP) e alguns dos seus princípios oligárquicos
 
Catorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdf
Catorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdfCatorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdf
Catorze cartas às esquerdas (Boaventura de S. Santos).pdf
 
Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação 1a parte-
Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação  1a parte-Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação  1a parte-
Sobre a democracia - a democracia e a sua usurpação 1a parte-
 
Programa do psol
Programa do psolPrograma do psol
Programa do psol
 
Programa do psol
Programa do psolPrograma do psol
Programa do psol
 
Presidente da república – figura dispensável num regime democrático
Presidente da república – figura dispensável num regime democráticoPresidente da república – figura dispensável num regime democrático
Presidente da república – figura dispensável num regime democrático
 
A terceira dimensão do poder
A terceira dimensão do poderA terceira dimensão do poder
A terceira dimensão do poder
 
Eleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantes
Eleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantesEleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantes
Eleições autárquicas 2013. no regresso da romaria, tudo como dantes
 
Como resgatar a ética e a moral no brasil
Como resgatar a ética e a moral no brasilComo resgatar a ética e a moral no brasil
Como resgatar a ética e a moral no brasil
 
Síntese: por uma democracia de alta intensidade
Síntese: por uma democracia de alta intensidadeSíntese: por uma democracia de alta intensidade
Síntese: por uma democracia de alta intensidade
 
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
 
POR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIA
POR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIAPOR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIA
POR QUE É NECESSÁRIO REINVENTAR A DEMOCRACIA
 
As últimas eleições autárquicas. observações e comparações
As últimas eleições autárquicas. observações e comparaçõesAs últimas eleições autárquicas. observações e comparações
As últimas eleições autárquicas. observações e comparações
 

Plus de GRAZIA TANTA

Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdfUcrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdfGRAZIA TANTA
 
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.docAs desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.docGRAZIA TANTA
 
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdfBalofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdfGRAZIA TANTA
 
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdfAs balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdfGRAZIA TANTA
 
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdfUnião Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdfGRAZIA TANTA
 
As desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na EuropaAs desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na EuropaGRAZIA TANTA
 
A BideNato flight over
A BideNato flight overA BideNato flight over
A BideNato flight overGRAZIA TANTA
 
Um sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdfUm sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdfGRAZIA TANTA
 
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdfNATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdfGRAZIA TANTA
 
USA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdfUSA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdfGRAZIA TANTA
 
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdfEUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdfGRAZIA TANTA
 
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdfA NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdfGRAZIA TANTA
 
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UENato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UEGRAZIA TANTA
 
Speculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EUSpeculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EUGRAZIA TANTA
 
Eleições em portugal o assalto à marmita
Eleições em portugal   o assalto à marmitaEleições em portugal   o assalto à marmita
Eleições em portugal o assalto à marmitaGRAZIA TANTA
 
Os especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ueOs especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ueGRAZIA TANTA
 
Human beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial systemHuman beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial systemGRAZIA TANTA
 
Seres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiroSeres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiroGRAZIA TANTA
 
Textos de circunstância - 10
Textos de circunstância  - 10Textos de circunstância  - 10
Textos de circunstância - 10GRAZIA TANTA
 
Glasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the looseGlasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the looseGRAZIA TANTA
 

Plus de GRAZIA TANTA (20)

Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdfUcrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
 
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.docAs desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
 
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdfBalofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
 
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdfAs balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
 
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdfUnião Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
 
As desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na EuropaAs desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na Europa
 
A BideNato flight over
A BideNato flight overA BideNato flight over
A BideNato flight over
 
Um sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdfUm sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdf
 
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdfNATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
 
USA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdfUSA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdf
 
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdfEUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
 
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdfA NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
 
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UENato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
 
Speculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EUSpeculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EU
 
Eleições em portugal o assalto à marmita
Eleições em portugal   o assalto à marmitaEleições em portugal   o assalto à marmita
Eleições em portugal o assalto à marmita
 
Os especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ueOs especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ue
 
Human beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial systemHuman beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial system
 
Seres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiroSeres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiro
 
Textos de circunstância - 10
Textos de circunstância  - 10Textos de circunstância  - 10
Textos de circunstância - 10
 
Glasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the looseGlasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the loose
 

A esquerda institucional e a realidade social em Portugal

  • 1. Esta “esquerda” é a tranquilidade da direita Sumário Uma justificação 1 – A sombria realidade que entra por portas e janelas 2 – O continuado empenho da esquerda institucional na conservação do sistema 3 – Para a multidão em Portugal, a esquerda institucional de pouco tem servido a) Uma repartição escandalosa do rendimento b) O salário médio em Portugal e na Europa c) O salário mínimo em Portugal e na Europa d) A conflitualidade – o número de greves e) A conflitualidade – o número de dias de greve f) A conflitualidade – o número de trabalhadores grevistas g) Conflitualidade em Portugal (1990/2007) h) Votação na esquerda institucional em legislativas 4 - A necessidade de reflexão e mudança de paradigma -------------------------------------------------------------------------- Uma justificação A realidade política comporta aspectos estruturais como a economia e as instituições, bem como elementos subjetivos, como a percepção da realidade por parte da multidão e, sobretudo, como esta reage e se organiza face à calamitosa situação que se vive. Como pretensos intérpretes da realidade social, do sentir das “massas”; como presumidos protagonistas da transformação social, como iluminados condutores do povo ignaro, os partidos ditos de esquerda assumem um papel de grande relevo e responsabilidade. A análise da conduta e da eficácia histórica e actual dessa “esquerda” é uma necessidade para cuja satisfação contribuimos com este texto. Essa análise decorre de dois aspetos. Primeiro, da urgente necessidade de uma actuação transformadora saida da multidão mundial, europeia, ibérica e portuguesa, em particular, perante a brutalidade do torniquete apertado pelo capitalismo e pelos Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 1
  • 2. seus mandarins. Em segundo lugar, dada a incorrigível postura de auto-ungidos lideres da multidão, nunca escondida por essa “esquerda” pouco dada à tolerância com quem os conteste; ora recorrendo aos poderes estatais, como órgãos não assumidos do sistema, ora infiltrando pequenos grupos de militantes provocadores para influenciar, controlar, distorcer ou destruir qualquer movimento social que, autonomamente, surja na sociedade. Em qualquer das hipóteses, o sistema capitalista cleptocrático agradece e paga. É precisamente sobre as propostas e actuações da “esquerda” institucional portuguesa que aqui nos debruçamos, com a crueza e a frontalidade habituais que cultivamos. Pretende-se o reforço de um debate, ainda algo subterrâneo, sobre a necessidade de construir um movimento social, transformador, plural, gerador de consensos alargados, não partidarizado e com capacidade para repelir manipulações partidárias ou outras; e composto por grupos ligados através de um enxame de redes, pleno de uma heterogeneidade, que represente toda a multidão, contra o capitalismo, as suas instituições políticas e económicas. 1 – A sombria realidade que entra por portas e janelas Dizer que a situação social em Portugal é muito grave e que está com as portas escancaradas para o seu agravamento é uma realidade de difícil desmentido. As sociedades actuais geraram sistemas complexos de poder, de contornos nem sempre claros e, bastas vezes, sob a forma de máscara. E em todas essas vertentes do poder, está ausente a democracia. • Nas empresas vigora o poder do patrão, da administração, dos accionistas, actualmente em vias de reforço perante os trabalhadores, através do salário, da ameaça de despedimento, da aplicação de sanções; • Nos órgãos da administração pública vigora um espírito hierárquico, vertical, que não está aberto a decisões democráticas embora, o seu objecto seja a resolução de necessidades colectivas; • Nas prisões, como nas forças policiais e militares, a lógica é a da submissão total a uma autoridade bem vincada, com a total ausência de democracia; • O poder político não é democrático pois assenta em pequenos grupos (os partidos), beneficiários de fórmulas de representação tendencialmente excludentes face ao comum das pessoas, sem responsabilidades assumidas perante os eleitores, sobretudo em casos de decisões lesivas das pessoas ou perante actos corruptos; Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 2
  • 3. O poder judicial é uma mentira absoluta como terceiro poder, como autonomia face ao poder executivo, como separado das oligarquias partidárias; • O poder sindical promove a mediação, o amortecimento das reivindicações populares perante o poder económico e baseia-se numa casta de dirigentes profissionalizados defendidos por estatutos que bloqueiam alternativas; e, para mais, estão intimamente ligados ao subsistema partidário. Todos estes poderes constituem outras tantas esferas de influência, de controlo social, de reprodução do modelo político e económico existente – o do domínio das multinacionais, do sistema financeiro, do capital mafioso. A despeito da luta interna ao sistema em que se digladiam, aqueles poderes são conservadores e apenas procuram fazer valer a sua relevância e assegurar privilégios e mordomias. Em conjunto, prevalece a difusão do pensamento único, da democracia de mercado e do neoliberalismo, este, enformado pela lógica do individualismo, da concorrência, da competitividade, da omnisciência do mercado e fantasias afins. Todo aquele conjunto de poderes é dominado pelo capital financeiro. Em toda a UE, os Estados são representações do capital financeiro que os controlam e manipulam. E, portanto, todas as suas instituições, políticas, (governos, parlamentos) e administrativas se inserem sob o comando do capital financeiro, que configura a lei e a sua aplicação de acordo com os seus interesses. O seu domínio dos Estados e do poder político tende a ser mais férreo pois é o domínio e a determinação do nível da punção fiscal, da redistribuição (regressiva) dos rendimentos, do embaratecimento do trabalho, que lhes pode permitir evitar a bancarrota. Essa centralização do poder no capital financeiro revela que, mais do que nunca, o capitalismo é um sistema global, invasivo, que se incrustra e desenvolve em todos as instâncias – económicas, políticas, sociais, culturais e ideológicas. Dentro da lógica do pensamento único, não há alternativa ao modelo da chamada democracia de mercado, a que chamam representativa. Essa coisa é curiosa pois os representantes saem de uma limitada e relativamente fechada classe política que tende a afastar-se, a segregar-se relativamente à esmagadora maioria das populações. Esses representantes rodeiam-se de prebendas e privilégios específicos, determinados por eles próprios. Aos representados somente é pedido um mandato, uma representação genérica e por periodos alargados, sem qualquer hipótese real de retirada desse poder de representação, por muitas falcatruas que cometa o representante, por muito que se distancie do prometido em campanha. E pode designar-se por classe política, porque embora no seu seio existam diferenças ideológicas e desempenhos distintos na esfera política, estão unidos Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 3
  • 4. pela assunção da sua total legitimidade para a gestão dos interesses coletivos da multidão, mesmo que a sua representação seja francamente abusiva. Por muito que se mostrem distanciados no teatro parlamentar, é muito clara a sua unidade na defesa do sistema de democracia de mercado e dos variados privilégios de que gozam. Todas as manifestações de diversidade entre as classe política se inserem plenamente no seio do sistema, na defesa de alternativas dentro do sistema; quaisquer expressões de alternativas são tomadas como quiméricas ou, objectivamente, insusceptíveis de aplicação porque confinadas a um gueto político e social mantido pelos media, fortemente controlados pelo poder económico. Por outro lado, em tempos de capitalismo globalizado, à globalização da produção e do comércio, corresponde a existência de uma classe política global, que articula e unifica os grupos nacionais de mandarins, em famílias, mais marcadas pelas conveniências do capital do que por diferenças ideológicas. É por isso, que convivem, alegremente, numa chamada Internacional Socialista, os sociais-democratas nórdicos, o PS português, os racistas do partido trabalhista israelita e, até há pouco, os regimes de Ben Ali e Mubarak. Tendo em conta o carácter excludente e invasivo do sistema, qualquer participação no mesmo insere-se, forçosamente, na lógica do poder, do capital financeiro, embora constantemente o sistema seja atravessado por contradições internas. A dificuldade do aproveitamento dessas contradições e disputas internas, económicas, políticas ou ideológicas, para a satisfação de reivindicações da multidão é, evidentemente, elevada. Por um lado, há instituições do sistema (partidos, sindicatos, por exemplo) cuja função, sendo a integração das contestações ou o desarmamento das lutas da multidão dentro do sistema, evidenciam, como estratégias de sobrevivência própria, essa mediação, travestindo-se de opositores do sistema. Por outro lado, o aproveitamento das possibilidades institucionais para o lançamento e desenvolvimento de lutas anti-sistémicas, corre sempre o perigo da tentação da adopção de um minimalismo que favoreça a sua inserção dentro do sistema. Para a contestação fora do sistema há, em regra, diversas reações do mesmo para a jugular. Se essa contestação se processa de formas diversificadas consideradas violentas pelo sistema, está garantido que a reação daquele é a ilegalização e a repressão particularmente brutal. (1)(2) Se essa contestação não é tomada como revestindo essas características, as modalidades que o sistema utiliza para o controlo dessa contestação ou para a sua domesticação, como atrás se referiu, são diversas: infiltração de membros de partidos de “esquerda” - ou mesmo das polícias - ou a conivência aberta das instituições do sistema, ditas de “esquerda” com a polícia, nos casos em que as Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 4
  • 5. suas funções de mediação e controlo social sejam contestadas ou ameaçadas de descrédito. (3) (4) 2 – O continuado empenho da esquerda institucional na conservação do sistema “Onde está a esquerda? Ao fundo, à direita” (frase criada no âmbito do movimento 15 M, nas Puertas del Sol, Madrid) Em Portugal, para além do enganador bipartidarismo vigente PS/PSD a nível do governo – empobrecedor do ponto de vista político, material e cultural – e que serve de coluna vertebral para o sistema político cleptocrático - há ainda a contar com a área institucional mais à esquerda ou menos à direita, se se preferir. Esta, é constituida pelo que designamos de Trinómio da Ineficácia, como poderiamos designar por Trio Aldrabice ou, outra forma pouco simpática para os visados. Esse trio é constituido do ponto de vista formal pelo conjunto CGTP/PC/BE, por ordem de relevância e que reproduz, na terra lusitana, a aplicação de uma norma de controlo social comum no mapa político da Europa. Na realidade duas daquelas entidades (CGTP/PC) são apenas uma, dada a total similitude das posições políticas e a larga presença de funcionários e dirigentes comuns nas respectivas lideranças. Funcionam como “ubus” uma da outra, como retratado na cultura popular haitiana; o que um diz o outro repete ou completa, à vez. • O PC é o partido base daquela área esquerda do poder, mesmo quando deixou (2009/11) de ser maioritário na AR, no seu confronto com o BE. O seu férreo domínio da central sindical e a administração de várias autarquias importantes são trunfos importantes dos pontos de vista financeiro e da colocação de quadros; no âmbito político, é a presença da CGTP numa aldrabice designada por “concertação social”que viabiliza a sua existência. O PC detém ainda uma estrutura organizativa fortemente hierárquica e autoritária, inserida no corpo social que o dota de um poder político muito superior ao do BE e bem para além da sua expressão eleitoral; • O PC dispõe ainda de uma estabilidade estratégica e tática que torna, em regra, previsível, a sua actuação, constituindo, portanto um elemento central na estabilidade do sistema cleptocrático; o que acontece, com base em acordos tácitos desenhados logo a seguir ao 25 de Abril com o poder militar. As regulares dissenções não lhe geram danos uma vez que entre os militantes domina uma forte fidelidade à direcção, fé nas capacidades dos dirigentes, mesmo quando têm divergências pessoais; neste sentido, o PC funciona como uma igreja; Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 5
  • 6. Do ponto de vista ideológico, o PC é uma formação nacionalista, defensora de um Estado forte e autoritário, com os sectores estratégicos nacionalizados (banca, energia, media…), fórmula decalcada do modelo soviético mas, adaptado a regimes de pluralismo político formal. É profundamente avesso a manifestações de participação e autonomia popular, democracia direta, autogestão, desobediência civil, elegendo como inimigos de estimação grupos independentes do seu controlo ou anarquistas, não recuando mesmo em se conluiar com a polícia para a sua repressão; • Na base desssa estabilidade estratégica está o “Rumo à Vitória”, escrito em 1964 por Álvaro Cunhal que nele introduziu um conceito chamado de “revolução democrática e nacional”. Nesta, o derrube do fascismo sairia da luta dos trabalhadores aliados à pequena e média burguesia, contra os monopólios lusos que mais beneficiavam do regime. Claro que isso não se verificou, durante o fascismo, por várias razões. Primeiro, porque quase toda a burguesia portuguesa, no início da década de 70 procurava desembaraçar-se do caduco regime fascista por razões tão óbvias como, acelerar a ligação à CEE e resolver a questão colonial que passara a não ser rentável, para além de todos os inconvenientes de ordem política. Por outro lado, havendo essa unidade e sendo muito débil o poder real do PC e dos grupos à sua esquerda, a burguesia portuguesa não sentia a necessidade de alianças com o “proletariado”; • Essa aliança com a burguesia pequena e média acabou por se verificar após o 25 de Abril, em torno dos militares, já não contra os fascistas, mas contra os trabalhadores que, “inoportunos” promoveram o afastamento da grande burguesia, com saneamentos e, mais tarde, expropriações. Nesse processo, que se veio a popularizar com o nome de PREC, os trabalhadores procuravam garantir o emprego e melhorar as suas condições de vida, tendo passado, naturalmente, a uma procura de modificações profundas na ordem democrática de base e de ameaça à ordem capitalista. A luta económica rapidamente radicalizou muitos trabalhadores que perceberam que o capitalismo só se destrói com a modificação das relações de produção e a extinção da propriedade privada da estrutura produtiva. Esse processo de expropriação veio a ser totalmente adulterado conforme já apontámos em “Nacionalização da banca: Piada ou mistificação?” (5) • Nesse contexto, o PC promoveu em 1974/75 o combate às greves; assaltou os sindicatos onde a sua hegemonia não era aceite, fez o que podia para extinguir ou controlar as comissões de trabalhadores, favorecendo sindicatos verticalizados, anti-democráticos e únicos (lei da unicidade sindical); defendeu uma “batalha da produção” sem defender a alteração das relações de produção; sabotou quanto lhe foi possível as iniciativas autónomas dos trabalhadores procurando sempre a utilização do aparelho de Estado e a bajulação dos militares; procurou controlar os grandes meios Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 6
  • 7. de comunicação (onde aliás o Nobel José Saramago se encheu de glória…); colou-se às reivindicações sociais dos assalariados rurais para a expropriação dos capitalistas e latifundiários, para aumentar o seu peso no xadrês poítico; instou à ilegalização de dois partidos de esquerda que lhe eram hostis; enganou vários outras formações políticas, antepassados das almas pias que hoje ainda consideram possível uma unidade estratégica com o PC, contra o PS/PSD e o mundo dos negócios; e colocou-se a bom recato, distanciado, quando se tornou claro que iria haver um golpe militar em 25 de Novembro, para estabelecer a velha ordem nas ruas, nas empresas e nos quartéis; • Voltamos atrás, aos anos 60 para melhor situar as origens da actual actuação do PC. Para concretizar a política de aliança com camadas sociais defensoras do capitalismo, ainda que não fascistas, era preciso combater e eliminar tendências “esquerdistas”, provenientes de cisão dentro do próprio PC. Essas tendências (CMLP/FAP) resultantes da cisão ideológica sino-soviética, constituiam, após o apagamento da oposição anarquista nos anos 30, um novo desafio político e ideológico à hegemonia do PC, na área da esquerda. Para fazer face a esse desafio e quando a radicalização provocada pela eternização da guerra colonial incendiava a juventude, mormente os estudantes, o PC viu-se na necessidade de editar “O radicalismo pequeno-burguês de fachada socialista” (1971). Recorde-se que o PC, sendo formalmente contra a guerra, aconselhava os seus militantes a não desertarem, a participar na mesma e, se possível, no cenário de guerra, fugirem, de preferência com outros soldados e com armas… o que, se não fosse uma farsa, seria infantilidade; • Esta outra vertente de diabolização e procura de isolamento de toda a oposição mais ou menos de esquerda, constitui ainda hoje peça central da inserção do PC na ação política. Consiste na utilização de técnicas estalinistas de apagamento da sua visibilidade, da sua repressão física com o recurso à ajuda ou colaboração da polícia; são casos bem evidentes, a denúncia dos cisionistas dos anos 60 no Avante! ou, a procura de controlo/punição de “esquerdistas” batizados de terroristas quando da cimeira da Nato, em Novembro de 2010; uma postura em tudo igual à lançada por George W Bush após o 11/9 e … adoptada como estratégia pela própria NATO (2) (3); Nos últimos tempos foi de pasmar os menos observadores da natureza do PC, a forma como a CGTP não emitiu qualquer apelo à participação nas manifestações de 15 de Outubro, nem noticiou a sua realização em Portugal como em mais de 1000 cidades. Na sua lógica, um protesto só é genuino se convocado pela CGTP/PC; só é unitário se submetido às ordens dos seus funcionários; um protesto internacional não se coaduna com o seu nacionalismo; e, mesmo que nos protestos tenham participado muitos militantes do partido, estes não têm direito ao aval posterior da sua direção; Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 7
  • 8. O referido “Rumo à Vitória” apresenta uma clara definição da política de alianças do partido, que se mantém inalterável desde então; procura uma ligação privilegiada à direita, arrogando-se o PC, de permeio, ao monopólio da esquerda, a partido auto-ungido como dirigente da “classe operária”. Dentro desse parâmetro, procura aumentar o seu peso negocial junto da direita, apresentando-se como o regulador da esquerda. Nos anos 60, o alvo dessa política de aliança à direita era a “burguesia liberal” que era então quase invisível fora dos escritórios de alguns advogados bem instalados na vida. Depois do 25 de Abril seguiu-se a vigência dos governos provisórios onde o PC participou, ao lado dos militares, do PS e do PPD (que passou a PSD, para dar ares de esquerda, como convinha, na batalha perdida por Sá Carneiro, na disputa com o PS por um lugar nessa distinta estrumeira chamada Internacional Socialista); foi nesse periodo que o partido se mostrou muito hábil na construção de credenciais como agente essencial do controlo social, cargo que ainda hoje mantém; • Durante alguns anos depois da normalização novembrista de 1975, o PC procurou essa aliança com o PS, com a defesa da “maioria de esquerda”. Claro que isso nunca se verificou como opção governativa geral, havendo apenas a registar pela sua notoriedade a aliança com o PS na câmara de Lisboa, pela mão de Sampaio que veio a ceder a presidência ao Soares junior; eleitoralmente o PC não ganhou nada com isso, antes pelo contrário e, com aquele brilhante “compaire” de coligação, foram ambos derrotados pelo impagável Santana (o Lopes); • Essa postura relativamente ao PS, comum ao PC e ao BE, merece alguma análise, embora já a tenhamos esboçado a propósito da campanha do Alegre (6). A designação de “maioria de esquerda” foi abandonada há muitos anos, pouco depois de “estabilização” de 1975. Sabendo-se sem capacidade de, autonomamente, chegarem ao poder, mesmo através de uma improvável coligação a solo, a esquerda institucional aposta numa eventual viabilização de um governo PS, dependente do seu apoio e, obtendo como contrapartida, um ministro ou secretário de estado e a colocação de alguns “apparatchiks”; • Consideramos essa hipótese bastante remota. Do ponto de vista histórico, o PS nunca recorreu a esse apoio para o governo central. Durante o segundo governo Guterres, quando este teve exatamente metade dos deputados (1999), o PS preferiu o recurso ao deputado do queijo limiano (CDS) do que servir-se da bancada do PC ou dos dois deputados do BE, recém-chegado ao areópago. E, em 2009, Sócrates, minoritário, preferiu sempre entender-se com o seu gêmeo PSD do que com os 31 deputados da ala esquerda da AR; • Ainda históricamente, o PS, criado e municiado abundantemente (tal como o seu braço sindical, a UGT) pelo SPD alemão, através da Fundação Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 8
  • 9. Friedrich Ebert, assumiu a liderança da “normalização” capitalista em 1975, unificando em seu redor toda a direita. E, em seu torno, acoitaram-se vastos sectores conservadores da população, anti-comunistas primários e reaccionários de gema. Dito de outro modo, o PS tornou-se, em 1975, um partido típico de direita mesmo quando nas suas manifestações se berrava ridiculamente “partido socialista, partido marxista”. Já então Mário Soares purgara a ala trabalhista e socialista do partido. A esse nascimento reaccionário o PS acrescentou a adopção à lógica neoliberal e do pensamento único que atingiu o seu apogeu durante o consulado de Sócrates; • Perante esta prática e este curriculo do PS, a área esquerda institucional recusa-se a assumir o carácter de direita daquela agremiação, contentando-se em acusar a sua direção como adoptante de “políticas de direita” ou a argumentar com a (natural) existência de gente decente como militantes do PS. Entende-se essa ocultação; os partidos da esquerda institucional, pretendem estar inseridos dentro do regime cleptocrático e, simultaneamente convencerem a multidão sobre a sua intenção de transformações radicais que, efectivamente, não desejam. E para esse equilíbrio de mentira precisam de branquear o carácter do PS, colocando neste e nos seus dirigentes o travão para a transformação social que, afinal, é seguro com mãos firmes pelo PC/BE; • O BE tem maior agilidade tática e maior criatividade que o PC e, não possuindo o mesmo lastro histórico estalinista torna-se mais atraente para sectores intelectuais e urbanos sem simpatias com as fórmulas pesadas e hierárquicas do PC. O BE, como nunca pretendeu adoptar a estrutura organizativa do PC, pauta-se como uma formação com propósitos eleitorais, usando como bandeira um grupo parlamentar activo e com algumas capacidades técnicas. Essas características e a hábil montagem de uma relação próxima com os media, dão-lhe uma visibilidade superior à sua representatividade social e na AR; • Na sua existência de uns escassos doze anos e, passado um periodo inicial onde parecia constituir-se como elemento agregador de várias sensibilidades anti-sistema, o BE ficou embevecido como os seus sucessos eleitorais e a simpatia com que as suas propostas eram encaradas. Esse sucesso foi a sua morte anunciada como projeto integrador e mobilizador, de lufada de ar fresco na putrefacta ordem política post-25 de Novembro de 1975. • Aproveitando-se da constante deriva para a direita do PS e do conservadorismo político e tático do PC, os dirigentes do BE pensaram constituir um grande partido social-democrata com gente “de esquerda” que abandonasse o PS, para mais marcado pela gestão de Sócrates, neoliberal e salpicada por casos óbvios de corrupção; pelo menos, para o julgamento da multidão. Para o efeito, contava com o conservadorismo do Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 9
  • 10. PC e a forte vetustez de muitos dos seus militantes, pouco dados a devaneios contestatários e reais firmes adeptos da democracia de mercado; • Para ganhar credibilidade como gestor público e fazer esquecer a aura de agremiação fracturante de esquerda, o BE embrulhou-se na Câmara de Lisboa com uma bandeira esfarrapada (o Zé que faz falta) e um acordo com o PS que publicamente, ninguém percebeu. Depois veio o encosto ao PS com um biombo chamado Alegre pelo meio e o resultado não foi animador pois a tal ala “esquerda” do PS, alegremente, preferiu a continuidade que dá mordomias e, nada de aventuras com um Alegre que não agradava a ninguém, para além do Louçã, seu grande defensor. Finalmente o xeque de Junho e a perda de metade dos deputados; uma vez mais a esquerda do PS não compareceu à chamada para o engrossamento de um partido social-democrata fora de tempo e o descontentamento popular assentou arraiais na abstenção ou preferiu estupidamente o Passecos, com medo de que as coisas piorassem e por ódio ao Sócrates. O recente desaire na Madeira insere-se nessa linha política fracassada. • Para o BE, essa criatividade na proposta legislativa mostra-se desastrada na tática política. Em 2005, teria sido compreensível, no âmbito eleitoral das presidenciais, apoiar Alegre que, então, conseguiu dividir o PS; em 2010, quando o PS, no seu íntimo, preferia Cavaco e Alegre evidenciava incapacidade e incoerência política, o BE deixou-se arrastar pelo mito do milhão de votos do poeta em 2005 e teve uma enorme derrota política; • Internamente, o BE, ao contrário do PC, apresenta uma pluralidade de reconhecidas tendências no seu seio, a maior parte, com projetos políticos cretácicos (ou “cretínicos”), pouco recomendáveis do ponto de vista da multidão e com pouco conteúdo democrático. Porém, é justo referir que a maioria dos militantes não se inclui nessas tendências. Vejamos: o O PSR é uma seita baseada na sebenta trotskista, integrante de uma prática estalinista de procura de controlo de grupos e potenciais movimentos sociais que, naturalmente, procuram conter dentro dos limites suficientes à manutenção do seu controlo burocrático; o Outra seita trotskista com ideário e práticas idênticas ao PSR – e por isso mesmo ferozes adversários – dá pelo nome de Ruptura/FER. Dentro (e fora) do BE, é um grupo desacreditado devido a um radicalismo delirante que, no entanto, atrai alguns jovens; o Uma corrente heterogénea designada internamente por “Política XXI” abarca várias vagas de “renovadores” do PC que, convertidos à social-democracia, anseiam por se deitarem na alcova do PS; apresentam um pensamento próximo do PC, sem obediência ao seu Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 10
  • 11. comité central ou práticas estalinistas de controlo social. Apresenta um pendor eleitoral ancorado em figuras de potenciais caciques – Miguel Portas, Semedo, Pureza ou Daniel Oliveira; o O outro grupo relevante é o da UDP, o único que soube evoluir de um marxismo-leninismo fossilizado, para posturas democráticas, constituindo o único grupo integrante do BE com alguma produção de pensamento; mesmo sem renegar o seu marxismo, o apego à intervenção do Estado e ao keynesianismo. • Estes grupos ou tendências constituem as linhas de fractura que se alargarão se se mantiver a actual tendência de redução do apoio eleitoral e da influência que o BE teve nos primeiros anos da sua existência. Em caso de fractura, uns irão acolher-se ao albergue do Largo do Rato, outros estiolarão sobre a forma de grupo de estudos e os trotskistas, potenciando o seu pendor estalinista dedicar-se-ão ao controlo social, rivalizando entre si mas, unidos no ódio a grupos independentes ou anarquistas. 3 – Para a multidão em Portugal, a esquerda institucional de pouco tem servido Quando se esboroa o resto da autonomia de Portugal enquanto Estado-nação e essa re-hierarquização se traduz em forte pressão no sentido da degradação da situação económica dos trabalhadores cabe perguntar; onde está essa esquerda ? Porque razão a multidão se reconhece pouco com as suas propostas e prefere apoiar partidos de direita nos diversos pleitos eleitorais recentes (presidenciais, legislativas e na Madeira)? Porque razão no país mais pobre da Europa ocidental a conflitualidade social é quase inexistente? E porque tendo em conta a expressão eleitoral da esquerda institucional, ela não se reflete em contestação social? Não há um determinismo entre a situação económica da multidão e a contestação social e, menos ainda a sua organização. No entanto, no caso de Portugal, há uma responsabilidade enorme da esquerda institucional portuguesa, conservadora politicamente, com uma acção rotineira, sem iniciativas, sem objectivos de transformação política, nem interesse na autonomia e criatividade da multidão; pelo contrário, muito ocupada em reconduzir, em conter a contestação nas estreitas vias das instituições do sistema, dia a dia mais cleptocrático, opressor, e repressivo. Em suma, a esquerda institucional tem tido um papel decisivo nas limitadas respostas da multidão à pulsão empobrecedora dos governos e do empresariato e que se vem agudizando; e é transparente que o Trinómio da Ineficácia – PC/CGTP/BE se mantém tíbio e pouco menos que inerte na actual conjuntura. Naturalmente, que a responsabilidade pela ausência de respostas adequadas à ofensiva capitalista não é exclusiva da esquerda institucional, devendo-se Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 11
  • 12. também às ilusões que a multidão tem tido sobre uma continuidade de padrões de vida desajustados da estrutura produtiva existente; com a aceitação das brutais desigualdades na distribuição do rendimento e da riqueza; com a enorme ingenuidade face às virtualidades da democracia de mercado. E daí que existam dificuldades de auto-organização, por norma, marcadas pela frieza, pela sobranceria ou pelo boicote com que essa autonomia é encarada pela esquerda institucional. a) Uma repartição escandalosa do rendimento O quadro seguinte demonstra, de modo evidente, a perda do rendimento disponível das famílias, longe de acompanhar, de mostrar paralelismo, relativamente à evolução global da capitação da produção de riqueza. Dito de outro modo, se o rendimento das famílias não acompanha o crescimento da produção de riqueza é porque esta se esvaiu para os bolsos de estratos sociais muito precisos e não beneficiou a esmagadora maioria das famílias. Por outro lado, o fosso aumenta com a passagem do tempo e está longe de se reduzir nos últimos anos, de maiores dificuldades económicas. Desmente, claramente, a persistente propaganda de que temos de nos sacrificar “todos”. Poder-se-ia pensar, num modelo vivido, décadas passadas, em alguns países da Ásia (Coreia do Sul, por exemplo) baseado no sacrifício do bem estar da população para o desenvolvimento de planos intensivos de capitalização e construção de uma estrutura produtiva virada para a exportação. Ora a realidade portuguesa desmente essa hipótese, uma vez que à persistente perda de rendimento por parte da multidão, não corresponde uma acumulação de capital produtivo, nem um incremento da exportação, dos pontos de vista quantitativo e qualitativo. Não há qualquer estratégia desenvolvimentista da classe política portuguesa nem do seu patronato, nem mesmo qualquer laivo de nacionalismo, por muito reaccionário que isso seja. Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 12
  • 13. Evolução da capitação do PIB e do rendimento médio disponível (1992=100) 240 220 200 180 160 140 120 100 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 19 19 19 19 19 19 19 19 20 20 20 20 20 20 20 20 20 20 20 Rendimento médio disponível das famílias Capitação do PIB Fonte primária: Pordata A situação atrás descrita é o retrato da incipiência da contestação social e da reivindicação económica não assumida pelos dirigentes políticos da “esquerda”, nem pelos burocratas sindicais. E revela a alegria contida, não alardeada, pelo patronato e pelos seus mandarins. b) O salário médio em Portugal e na Europa A comparação da relação entre o salário médio em Portugal e em vários países da Europa, em 2000 e em 2007 indica uma perda de poder de compra dos assalariados portugueses face à evolução observada na maioria dos outros países. Os ganhos comparativos somente se registam para países de alto nivel de vida – Alemanha, Suécia e Suiça – para além de Malta; aqui, o salário médio português representava 93.7% do de um maltês em 2000 e 97.9% em 2007. As perdas relativas do salário médio português tanto se verificam face a países de elevado rendimento como aqueles cujos níveis de desenvolvimento mais se aproximam de Portugal, sublinhando-se o caso da Espanha. Note-se a paulatina aproximação entre os salários portugueses e os da Europa de Leste, prenunciando, a prazo, a confirmação da tese do processo de subdesenvolvimento em curso na ocidental praia lusitana. Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 13
  • 14. Face a esta realidade, que dados mais recentes decerto agudizarão, uma vez disponíveis, cabe perguntar se ela não reflectirá os amargos frutos de anos de “concertação social” nos gabinetes alcatifados do poder? Relação do salário médio português com o de países europeus Evolução 2000/2007 ( %) Países 2000 2007 Países 2000 2007 Alemanha 36,7 38,2 Grã-Bretanha 33,5 33,3 Bélgica 39,9 39,7 Holanda 39,6 36,5 Bulgária 882,4 584,4 Hungria 302,4 171,4 Chipre 78,5 72,0 Luxemburgo 35,2 33,9 Dinamarca 30,8 28,9 Malta 93,7 97,9 Eslováquia 352,2 182,7 Noruega 34,9 32,5 Espanha 72,4 70,1 Suécia 39,9 41,6 Finlândia 46,1 42,5 Suiça 28,9 32,6 França 47,2 47,3 Chipre, Noruega – 2006; Suiça - 2008 ganhos relativos perdas relativas Fonte primária: Eurostat c) O salário mínimo em Portugal e na Europa Se se proceder a uma análise semelhante à anterior mas, contemplando o salário mínimo os resultados são semelhantes. Uma coisa é um escasso crescimento do salário mínimo quando o seu valor é próximo de € 1400 (Bélgica, França, Holanda) e algo muito distinto, dentro de uma mesma zona económica (euro), é um salário mínimo como o português, de € 485. Relação do salário mínimo português com o de outros países Evolução 2000/2007 (%) Países 2000 2011 Países 2000 2011 Bélgica 34,9 40,0 Hungria 258,3 201,6 Bulgária 964,6 461,1 Irlanda 41,3 38,7 Eslováquia 389,3 178,5 Letónia 449,4 200,7 Eslovenia 98,6 75,6 Lituania 337,6 244,2 Espanha 77,1 75,6 Luxemburgo 31,0 32,2 Estonia 381,3 203,5 Malta 73,5 85,1 EUA 40,6 60,2 Polónia 197,5 162,3 França 36,0 41,5 Rep. Checa 273,3 177,3 Grã-Bretanha 39,9 49,7 Roménia 941,3 359,9 Grécia 71,7 65,6 Turquia 173,9 147,0 Holanda 33,8 39,7 Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 14
  • 15. ganhos relativos perdas relativas Fonte primária: Eurostat O valor do salário mínimo e os níveis salariais na administração pública têm funcionado, em Portugal, como um lastro que arrasta para o fundo todo o espectro salarial e os direitos laborais. Este nivelamento por baixo serve os interesses do capitalismo em geral e dos patrões lusos em particular, cuja sobrevivência assenta, exclusivamente, na desvalorização do pagamento do trabalho e do apoio do Estado à sua existência parasitária, com encomendas, subsídios e a adequada produção legislativa. A ideia estratégica dos capitalistas portugueses e dos seus mandarins é a aproximação aos níveis salariais do leste da Europa, onde o valor do salário mínimo tem evoluido mais rapidamente que o seu homólogo português. Crescimento do valor do salário mínimo (2001/2011) (%) Bulgária 204 Lituania 101 Eslováquia 217 Polónia 77 Eslovenia 89 Portugal 45 Estonia 172 Rep. Checa 124 Hungria 86 Roménia 280 Letónia 225 Turquia 72 Fonte primária: Eurostat d) A conflitualidade – o número de greves Não pretendemos proceder a uma análise aprofundada da conflitualidade social que, englobará, greves não “oficiais”, paralizações, manifestações, concentrações e formas criativas que vêm surgindo e que merecem, em regra, pouca atenção por parte dos media; excepto, quando pretendem adivinhar (ou desejar) violência para apresentar ao jantar do povinho. A conflitualidade social na Europa, medida pelo número de greves, não é elevada e mostra-se decrescente para o conjunto de países com dados sobre o assunto; e entre estes, para os que apresentam números de maior dimensão. A entrada no presente século parece ir avolumando uma tendência decrescente. Entre os paises considerados, somente em Espanha e Itália parece observar-se uma relativa estabilidade no número de greves. Vários factores explicarão as tendências observadas até 2008 (sublinhe-se a data, que exclui os últimos anos em que a crise sistémica mais se tem vindo a verificar); entre eles, a facilidade da concretização de despedimentos, a precariedade do emprego, o desemprego continuado, a apatia ou conivência com os patrões de dirigentes sindicais acomodados e reaccionários, capazes de combater com violência activistas sindicais ou movimentos grevistas que não controlem. Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 15
  • 16. Conflitualidade na Europa - número de greves 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Dinamarca 1.079 1.081 832 1.349 681 804 534 476 862 335 Espanha 749 750 737 688 678 708 685 783 752 811 Finlândia 65 96 84 76 112 84 365 97 91 92 G-Bretanha 205 226 207 162 138 135 116 158 152 144 Itália 753 966 746 616 710 745 654 587 667 621 Portugal 200 250 208 250 170 122 126 155 99 nd Soma 3.051 3.369 2.814 3.141 2.489 2.598 2.480 2.256 2.623 2.003 Fonte: Eurostat e) A conflitualidade – o número de dias de greve A consideração do número de dias de greve, designados nas estatísticas por “dias perdidos”, revela uma irregularidade do movimento grevista e o seu carácter nacional, quando não sectorial ou local, não coordenado internacionalmente. Dessa ausência de concertação estratégica beneficiam os capitalistas e os burocratas sindicais, estes decerto bem mais motivados para outros acertos, com patrõres e mandarins, nas “concertações sociais” elementos do chamado “modelo social europeu” que ainda não foram destruidos, por razões que são óbvias. Sobressaem os valores apresentados pela Espanha em 2002 e 2004, pela França em 2003, pela Itália em 2004, pela Grã-Bretanha em 2002 e 2007 ou pela Dinamarca em 2007. Em Portugal, os dias contabilizados como de greve são muito reduzidos, com um valor mais elevado em 2002. Conflitualidade na Europa - número de dias de greve (1000) 1999 2000 2001 2002 2003 Dinamarca 91,8 124,8 56,0 193,6 55,1 Espanha 1.504,6 3.616,9 1.923,8 4.945,1 792,1 França 1.325,4 2.460,2 1.807,3 990,8 4.388,4 Grã-Bretanha 241,8 498,8 525,1 1.323,3 499,1 Itália 909,1 884,1 1.026,0 4.861,0 1.961,7 Portugal 67,5 40,6 41,6 108,1 53,4 Soma 4.140,2 7.625,4 5.379,7 12.421,9 7.749,8 2004 2005 2006 2007 2008 Dinamarca 76,4 51,1 85,9 91,7 1.869,1 Espanha 4.472,6 951,5 927,7 1.187,7 1.510,2 França 724,6 1.997,0 1.421,4 1.553,0 nd Grã-Bretanha 904,9 223,8 754,5 1.041,1 758,9 Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 16
  • 17. Itália 698,6 906,9 554,7 929,7 722,7 Portugal 46,1 27,3 44,2 29,9 nd Soma 6.923,2 4.157,6 3.788,5 4.833,0 4.860,9 Fonte: Eurostat Calculámos para alguns países o número médio de dias de greve por paralização, relativos a 2008. Esse indicador, adiante evidenciado, é muito distinto, conforme se refere a países do sul, onde é muito mais baixo, do que nos dois países a norte. Em Portugal, pela incipiência da contestação social e pela mais baixa dimensão das empresas, este indicador pode traduzir-se, aproximadamente e, por cada greve, como efectuada por cem trabalhadores durante três dias. Dinamarca 5579 Itália 1164 Espanha 1862 Portugal (2007) 302 Grã Bretanha 5270 f) A conflitualidade – o número de trabalhadores grevistas Um terceiro elemento conhecido relativamente às greves registadas na Europa contempla o número de trabalhadores envolvidos. Observa-se, também aqui, uma irregularidade acentuada, difícil de propiciar a construção de tendências. O ano de 2002 regista um elevado número de grevistas devido aos contributos da Itália e da Espanha mas também e, nas devidas proporções, pelos outros países seleccionados, excepto a França, que se veio a destacar no ano seguinte. Em Portugal o número de trabalhadores envolvidos em greves é escasso em número absoluto e mesmo quando se tem em consideração a diferente dimensão humana dos diversos países, ao efectuar-se um cotejo. Compare-se, por exemplo, a situação portuguesa de país mais pobre da Europa ocidental com a Espanha com uma população quatro vezes superior mas um movimento grevista incomparavelmente superior; e ainda a Dinamarca, com cerca de metade da população portuguesa, país muito mais rico e que apresenta um movimento grevista mais de duas vezes superior. Conflitualidade na Europa - número de trabalhadores em greve (1000) 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Dinamarca 75 76 49 111 44 76 33 79 61 91 Espanha 1.133 2.067 1.245 4.534 729 556 405 500 497 543 França 430 819 430 266 1.226 226 883 708 473 nd G-Bretanha 141 183 180 943 151 293 93 713 745 511 Itália 935 687 1.125 5.442 2.561 709 961 467 906 669 Portugal 34 39 26 80 30 32 22 33 29 nd Soma 2.747 3.871 3.055 11.376 4.741 1.892 2.395 2.500 2.712 1.815 Fonte: Eurostat Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 17
  • 18. O cálculo do número médio de trabalhadores por greve em 2008 é baixo, revelando o seu carácter local, isolado, desligado de qualquer lógica de união de forças, de protesto colectivo, mesmo a nível nacional. Número trabalhadores/greve Dinamarca 273 Itália 1078 Espanha 670 Portugal 295 Grã-Bretanha 3550 Por outro lado, o tempo de greve é, em média, curto, pese embora, no caso da Dinamarca, em 2008, o esforço de cada grevista ter sido particularmente elevado. Número dias greve/trabalhador Dinamarca 20,4 Grã-Bretanha 1,5 Espanha 2,8 Itália 1,1 França 3,3 Portugal 1,0 Como se denota, em todos estes elementos atrás apresentados, em Portugal a conflitualidade através de greves é escassa, muito inferior, qualquer que seja o ângulo de visão, ao que se passa nos outros países europeus que, por sua vez, não ostentam uma conflitualidade profunda nem alargada. g) Conflitualidade em Portugal (1990/2007) Observe-se, de seguida, a evolução histórica dos indicadores utilizados – número de greves, trabalhadores envolvidos e dias de trabalho “perdidos” para o periodo 1990/2007, em Portugal. Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 18
  • 19. Conflitualidade social em Portugal (1990=100) 160 140 120 100 80 60 40 20 0 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 19 19 19 19 19 19 19 19 19 19 20 20 20 20 20 20 20 20 Grev es Trab. Env olv idos Dias "perdidos" Revela-se no gráfico anterior uma evolução do protesto social a nível laboral absolutamente antagónica à marcha da perda da relevância do trabalho e dos trabalhadores na vida económica e na distribuição da riqueza por aqueles produzida. Depois de uma primeira greve geral em 1988, as centrais sindicais vêem-se na obrigação de repetir essa mobilização, em 2010 e, brevemente, em 24 deste mês, só depois de quatro PEC’s, da intervenção da “troika” e de medidas incontestavelmente lesivas da multidão. Mais vale tarde que nunca, dir-se-á. A questão é saber se os burocratas sindicais englobam a greve geral numa estratégia de mobilização gradativa e de unidade dos trabalhadores contra o sistema – hoje, reconhecidamente cleptocrático; ou, se a mesma não passa de uma satisfação que se dá aos sectores mais atingidos pela “austeridade” ou para cortar as asas dos mais contestatários, no âmbito de uma campanha sazonal, igual à de todos os anos e que decorre de outubro a maio, com pausas em dezembro e pela páscoa. Inclinamo-nos, muito sinceramente, para o segundo caso. h) Votação na esquerda institucional em legislativas As democracias de mercado têm na sua configuração diversas e cuidadas formas de perpetuar o poder de oligarquias económicas e políticas; destacando-se aqui Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 19
  • 20. uma daquelas – o mecanismo eleitoral - em que a multidão é conduzida a acreditar como democrático e susceptível de promover reais alterações ao statu quo. O mecanismo eleitoral encontra-se viciado em muitos aspectos; é a estrutura das circunscrições eleitorais, o método de Hondt, a hierarquização implícita entre partidos de poder e os outros, decorativos; é o monopólio eleitoral dos partidos, a dificuldade de constituição de novos partidos, o apoio financeiro aos partidos do sistema; é ainda, o pagamento e as mordomias dadas a mandarins para a sua constituição como casta gestora dos bens públicos, os privilégios mediáticos dos partidos, como representantes da opinião, etc. E, porque conformados e beneficiários do sistema, os partidos da esquerda institucional não geram debate ou denúncia dos mecanismos da democracia de mercado. Uma análise das eleições legislativas realizadas em Portugal depois do fim do regime fascista, revela de modo claro, que as mesmas nada mais têm feito que legitimar e perpetuar o regime cleptocrático presente. Os catorze actos eleitorais realizados revelam, através do gráfico seguinte, valores para os votantes no espectro partidário dentro de um intervalo relativamente estreito – um máximo de 5889 milhares em 1980 e um mínimo de 5307 mil em 1999. Essa variação é totalmente insensível ao natural aumento da população com direito a voto – 6321 mil em 1975 e 9624 milhares em 2011; este aumento de 54.4% está longe de se repercutir no crescimento da participação eleitoral. O segmento dos eleitores que não manifestam uma opção de voto partidário – abstencionistas e votantes em branco ou que anularam o voto – cresce acentuadamente no período considerado – 916 mil em 1975 e 4264 mil este ano. É certo que o mandarinato tem descurado a fiabilidade do recenseamento eleitoral, revelando explicitamente a consideração que tem pela democracia, pela transparência; importa-lhe, decerto muito mais curar das bases de dados que incluem elementos pessoais para fornecer à suserania norte-americana ou, as que facilitam a punção fiscal junto da multidão. (7) Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 20
  • 21. Votações em eleições legislativas (1975-2011) (1000) 7.000 6.000 5.000 4.000 3.000 2.000 1.000 0 1.975 1.976 1.979 1.980 1.983 1.985 1.987 1.991 1.995 1.999 2.002 2.005 2.009 2.011 Abstenções, brancos e nulos Votos em partidos Esquerda No entanto, mesmo considerando, a existência de centenas de milhar de eleitores “fantasmas”, é evidente o aumento do volume de pessoas que se desinteressam pelos pleitos eleitorais, revelando, dentro da pluralidade de razões para os comportamentos aqui tipificados, uma descrença ou desinteresse pela paleta das opções partidárias pelo método vigente para a expressão da vontade popular, se não mesmo pelo sistema de representação a que designamos por democracia de mercado. A adesão das pessoas às propostas da esquerda institucional (conceito que aqui, como sempre nos nossos textos, exclui o PS) não constitui grande ilustração para os seus dirigentes e para a estratégia de privilégio da lógica eleitoral praticada periodicamente, quando o sistema cleptocrático decide encenar uma consulta popular ao seu desempenho. A coisificação das pessoas, a sua desqualificação como eleitores, como actores sociais passivos que apenas se pretendem sensíveis aos discursos inflamados dos profissionais da política da esquerda institucional, (como dos outros partido) cansa e vai ficando desqualificada na cabeça de muita gente. As propostas da esquerda institucional são geralmente estafadas, desajustadas ou enganosas. Situam-se muito atrás das novas necessidades da multidão e, portanto, não conseguem entusiasmar nem promover mudanças substantivas nos desequilíbrios eleitorais. Uma das causas dessa incapacidade resulta da inclusão das suas propostas em ideologias políticas tomadas como pré-cozinhados prontos para uma breve passagem no micro-ondas. Há também uma incompreensão das sociedades actuais pouco dadas à aceitação entusiasta de escatologias Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 21
  • 22. salvíticas. Por outro lado, os partidos da esquerda institucional continuam a comportar-se como elites destinadas à condução e enquadramento de gentes eivadas de fé, esquecendo que a multidão, hoje, engloba enormes segmentos de gente instruida e qualificada, nem sempre disponível para seguir iluminados gurus. A esquerda eleitoral, nos primeiros actos eleitorais verificados após o 25 de Abril revela o seu apogeu absoluto em 1979, com 1.4 M de votantes, correspondentes a 24.1% dos votos dirigidos a partidos. Segue-se, um largo periodo de constante declínio, que atinge o ponto mais baixo em 2002, com 586 mil sufrágios; esse declínio foi interrompido em 2005, se se excluir uma ligeira recuperação observada em 1999. A preponderância do PC, que raras vezes desce abaixo dos 80% dos votos à esquerda, até 1995, decaiu fortemente nas eleições seguintes, passando mesmo o peso do partido, em 2002/2005, a situar-se aquém de 50%, marca de novo ultrapassada, por pouco, nas recentes eleições. Em 2009 os votos posicionados à esquerda ultrapassam os 1060 milhares (20% dos dirigidos a partidos), marca que não era atingida desde 1985 e que resulta do elevado crescimento do BE. O volume dos votantes na esquerda eleitoral registado em 2011 reconduz a votação aos níveis de 1987 ou 2005 e revela, provavelmente, que o BE será um epifenómeno típico da primeira década do século, com um declínio anunciado. No seu conjunto os votos dirigidos à esquerda, superiores a um milhão até 1985, só voltam a ultrapassar aquela fasquia em 2009. O cavaquismo, a adesão à UE e o maná dos fundos comunitários conduziram ao já referido declínio da esquerda eleitoral, incapaz de perceber a nova situação de consolidação capitalista; o que volta a acontecer quando da vitória do PSD/CDS em 2002 e recentemente, em 2011. A esquerda institucional, no seu conjunto, é vulnerável à dinâmica da direita mais reaccionária, não se constituindo em polo de aglutinação eficaz a essa dinâmica. Como se pode observar no gráfico acima, não há qualquer evidência de crescimento sustentado do eleitorado de esquerda. Por outro lado, a progressiva consolidação da influência do pensamento único neoliberal na sociedade portuguesa e europeia contamina a esquerda institucional, cujas propostas se mostram tendencialmente mais conservadoras, mais integradas no pântano da democracia de mercado, conjunturais e jamais anti-sistémicas. Dir-se-ia que navega no mesmo barco que carrega o sistema cleptocrático, adequando a sua agenda em resposta à deriva reaccionária da direita, mormente do PS; e por isso, nunca é capaz de qualificar aquele gang como uma agremiação de direita. 4 - A necessidade de reflexão e mudança de paradigma “O problema é o sistema; a crise não passa do seu fedor” (texto de uma faixa presente em Lisboa, na manifestação de 15 de outubro) Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 22
  • 23. No verão do ano transacto escrevemos “Pensar à esquerda, sem vacas sagradas” (8). Os pontos aí referidos - o pensamento único, o modelo social europeu, o fim das nações, União Europeia, o Estado, uma democracia para consumidores, um autoritarismo crescente, os excedentes de vidas humanas, o militarismo, a deriva ambiental - continuam a ter toda a atualidade. No entanto, alguns desses ponto requerem enriquecimento e outros temas deverão ser acrescentados, tendo em consideração a evolução global e a profunda degenerescência que se vem observando na vida politica e social. Quando se fala do pensamento único, a tendência é para o identificar com a arrogância ganhadora dos arautos da felicidade eterna propiciada pelo capitalismo de matriz neoliberal após a queda do Muro de Berlim e o desmoronamento do chamado “bloco soviético”. A crise que se tornou pública com o processo dos “subprimes” nos EUA mostra-se tão funda e aguda que vem promovendo o surgimento de novas formas de gestão capitalista que mereceram da nossa parte um artigo sobre os “renovadores” do capitalismo, em Dezembro de 2009 (9). A referida crise não é mais do que uma sequela do funcionamento do primado da lógica financeira e especulativa sobre a realidade a qual, queira-se ou não, é constituida por coisas mais palpáveis como produção, emprego, direitos laborais e políticos, organização social, poupança, investimento, gestão pública, etc. Esse desvio político e ideológico transformou-se em várias crises - da dívida pública, do emprego, do empobrecimento generalizado e do euro, para só referir as mais evidentes ou mediáticas. Ao agudizar-se, a crise veio promover o reaparecimento de ideias antigas sobre o capitalismo por parte de dois tipos de políticos ou analistas. Uns, neoliberais assustados, procuram as adaptações necessárias para continuar – até à proxima crise – o modelo de acumulação baseado na ampla desmaterialização da formação de riqueza; é o que fazem os eurocratas, sempre suspensos dos encontros do parelha Merkel-Sarkozy. Outros, a que daremos maior relevo no contexto deste texto, envolvem vários tipos de pessoas. Alguns, com ilusões sobre as virtudes de um capitalismo regulado, com políticas voluntaristas de um Estado criador de moeda e tentacular, apresentam-se repletos da esperança de que os banqueiros e os especuladores lhes dêem uma oportunidade como gestores dos interesses do capital. Outros, de “esquerda” ditos marxistas, trotskistas ou estalinistas (estes nunca se revelam como tal) pintalgam-se de keynesianos responsáveis à procura de cooptação pelo poder, preparando-se para assumir funções de reguladores do controlo da indignação das multidões roubadas e empobrecidas para salvar o capitalismo. Enfim, origens e caminhos distintos, com agentes provenientes de áreas políticas distintas mas, com um só fito – concorrerem ou coligar-se para a salvação do Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 23
  • 24. capitalismo, para um mais repressivo controlo da multidão – e acederem às alegrias e privilégios de serem poder. Em termos globais, não acreditamos que os dedos no ar destes naipes de ingénuos ou oportunistas em busca do seu bem-estar como gestores da crise e do controlo social, sirvam de grande coisa para a esmagadora maioria; o seu principal perigo é o da confusão que geram, as ilusões que alimentam na plebe, o favor que fazem para a continuidade do sistema. E, nesse contexto, o título que colocámos para este conjunto de linhas, até poderá ser considerado benévolo. É preciso evidenciar na fraseologia políticamente correta dos partidos da chamada esquerda, bem como nos seus comportamentos, os seus verdadeiros objetivos de controlo social, como órgãos do Estado. E saber aclarar o seu papel junto da multidão, com relevo para os seus militantes e simpatizantes não fanatizados. Aquele papel tem de ser claro para todos, tal como a destrinça entre uma batata e um piano. ----------------------------------------- Notas: (1) http://tripnaarcada.blogspot.com/2011/05/violencia-policial-contra-anarquistas.html (2) http://viasfacto.blogspot.com/2011/05/o-que-vi-em-setubal-durante.html (3) http://www.slideshare.net/durgarrai/a-misria-da-esquerda-que-anda-por-a-um-case- study-a-cimeira-da-nato (4) Recentemente tem-se assistido à infiltração de grupos enfeudados a forças da dita “esquerda” no movimento 15 O, nomeadamente por parte do “M12M” e de outras pequenas seitas, como o PSR; esta, através de um prévio domínio que exerce sobre alguns pseudo movimentos, com nomes insuspeitos para os incautos. (5) http://www.slideshare.net/durgarrai/nacionalizao-da-banca-piada-ou-mistificao (6) http://www.scribd.com/doc/24681888/Esquerda-PS-e-Alegre-%E2%80%93-Confusoes- e-premeditacoes-eleitorais (7) http://www.slideshare.net/durgarrai/um-sistema-eleitoral-falsificado-e-enganador (8) http://www.slideshare.net/durgarrai/pensar-esquerda-sem-vacas-sagradas (9) http://www.slideshare.net/durgarrai/a-resposta-capitalista-que-esto-a-preparar-para- a-crise Este e outros textos em: http://pt.scribd.com/documents#all?sort=date&sort_direction=ascending&page=1 http://www.slideshare.net/durgarrai/documents www.esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt Grazia.tanta@gmail.com 8/11/ 2011 24