No início do século XIX, a população mundial crescia rapidamente, mas a expectativa de vida era curta devido a doenças endêmicas. A pobreza generalizada piorava as condições de vida, especialmente para os mais pobres. Com o avanço da Revolução Industrial, importantes invenções melhoraram a qualidade de vida, embora a miséria ainda fosse generalizada. A industrialização se expandiu para outros países como França e Alemanha, desafiando o monopólio inglês.
1. N
o inicio do século XIX a população
mundial se encontrava em ritmo ace
lerado de crescimento. No planeta já
viviam quase 1 bilhão de habitantes, concentrados na
Eurásia, mas já se espalhando por outras regiões. Os
índices de natalidade aumentavam a cada ano, mas tei-
mosamente, os índices de mortalidade indicavam que
a expectativa de vida era muito curta. Na França, em
1815, a população mais jovem representava 40% do
total de habitantes, enquanto os mais velhos significa-
vam apenas 7%. As doenças endêmicas continuavam
ceifandovidasquenãoconseguiamdriblarosmalefícios
do cólera, do tifo, peste bubônica e outras enfermida-
des.
Na maioria das casas, a umidade era um estí-
mulo à propagação da tuberculose e doenças de ori-
gem pulmonar. De todas as doenças, o cólera parecia
ser a mais devastadora pois os remédios eram inúteis
para combatê-la. A natalidade era bem maior do que
nos séculos anteriores, mas é bem verdade, que nem
todos tinham chance de sobreviver por muito tempo.
A pobreza generalizada acentuava as dificuldades da
população mais humilde, tornando a vida dos mais
pobres, um verdadeiro inferno.
Os cronistas do século XIX deixaram um regis-
tro descrevendo um mundo desigual, aonde poucos ti-
nham muito e muitos não tinham nada. Cientistas fa-
mosos como o pastor Malthus, alegavam que a pobre-
za era responsabilidade dos pobres, que não paravam
de gerar filhos. Sua teoria teve muitos seguidores que
assim podiam justificar a miséria e a desigualdade soci-
al.
As dificuldades sociais forneceram o combustí-
vel para as revoluções de 1830 e 1848, porém aos pou-
cos os homens foram aprendendo a contornar os pro-
blemas, ou pelo menos, diminui-los o que já era grande
coisa. No desenrolar da Revolução Industrial, impor-
tantes descobertas modificaram as estatísticas de mor-
talidade em favor de uma melhoria na qualidade de vida.
Com efeito, as grandes descobertas do século XIX
embora não tenham acabado com a miséria, tornaram a
vida mais fácil com suas inúmeras invenções.
No plano das grandes invenções, em meados do
século XIX, muitas indústrias utilizariam o aço, que era
mais barato, mais maleável e mais resistente que o fer-
ro. No mesmo período, a descoberta da eletricidade
deixaria para trás a energia a vapor, tornando-se a fonte
de energia preponderante nas indústrias.
“Época de 1900, bela época; que
orgulho de ser burguês e que orgulho de
ser europeu. Em redor das mesas de tampo
verde de Londres, de Paris ou de Berlim
decide-se o destino do planeta. Passeiam-
se as árvores da borracha da Amazônia,
Malásia, extinguem-se na miséria os jazigos
enormes do Alto Hoang-Ho, constrói-se em
algumas semanas uma cidade mineira ao
norte do Alto Vaal. Mobilizadas pelo vapor,
as riquezas planetárias são deslocadas,
“dum extremo do mundo ao outro extremo”,
como diz Le Bateauivre, por ordens que o
telégrafo transmite em alguns minutos. De
decisões dos conselhos de administração
de Londres, de Paris ou de Berlim depende
a vida de milhões de seres que não se
apercebem que o seu direito à felicidade se
mede nas cotações das três bolsas mais
ruidosas, recintos no estilo de templos, onde
se travam as grandes batalhas das ambições
financeiras desenfreadas. E as capitais
financeiras da Europa não desdenham
nenhum pormenor, fixam o preço do bonde
no Rio de Janeiro ou da hora de trabalho de
um trabalhador em Hong-Kong. Nunca tal
poderio estivera reunido em tão poucas mãos
num tão limitado canto da Terra. É o apogeu
dos burgueses da Europa” 1
Multidões
invadem o
Palácio de
Cristal em Nova
York na feira
realizada em
1854 para
comemorar a
variedade e
abundâncias dos
bens
manufaturados
na América.
2. CapitalismoeImperialismo
Telégrafo e telefone encurtaram o mundo, pos-
sibilitando a comunicação mais eficiente entre as na-
ções e os continentes. Na ciência, o
benefício das invenções permitiu a
cura de terríveis doenças
endêmicas.
“Para o próspero mundo
industrial do final do século XIX, o
progresso vinha banhado pelo bri-
lho da luz elétrica. Luzindo nos arcos
voltaicos teatrais, inundando campos de esportes, ilu-
minando os debates parlamentares e acrescentando
prestígio e glamour às lojas de departamentos e resi-
dências, a eletricidade trouxe uma nova força para a
vida das pessoas que prometia mudar o mundo de
maneira jamais sonhada” 2
As ferrovias continuavam sendo a vitrine da in-
dústria. Por onde os trens passavam, o progresso che-
gava logo atrás, com a criação de novos empregos e o
crescimento das cidades. Segundo estimativas, a Euro-
pa possuía 105.000 km construídos, os EUA, 95.000
km. O sistema ferroviário mundial empregava 2 milhões
de pessoas, sem contar os empregos indiretos. No que
diz respeito à oferta de empregos, a indústria ferroviá-
ria representava no final do século XIX, o que a indús-
tria automobilística representa nos dias de hoje. A Re-
volução Industrial preparava-se para um grande salto
se irradiando por outros países, tirando da Inglaterra o
monopólio desfrutado até então.
Com efeito, a Revolução Industrial até 1820-
1830 era um fenômeno restrito à Inglaterra. Nas déca-
das anteriores, os ingleses controlaram a produção
mundial abastecendo até países inimigos. A estrutura
da indústria na primeira fase ainda era tipicamente
familiar, restringindo o crescimento de capital a in-
teresses e riscos individuais.Apesar de enormes
em relação ao período, hoje, as indústrias de
1830 seriam comparadas a galpões de fundo de
quintal.
Mas é lógico que o “boom” representado pela
Revolução Industrial não iria parar, nem estagnar no
tempo. Deve-se levar em conta, que o crescimento
demográfico implicava no aumento da produção, exi-
gindo das máquinas e homens o trabalho em ritmo
acelerado.
OS TRUSTES E OS CARTÉISOS TRUSTES E OS CARTÉISOS TRUSTES E OS CARTÉISOS TRUSTES E OS CARTÉISOS TRUSTES E OS CARTÉIS
Com o avanço das comunicações o mundo fi-
cou bem menor, pois muito rapidamente se cruzava os
cinco oceanos. O desenvolvimento dos transportes
transformou as ferrovias em artérias, que circulavam
o continente europeu e outros países em desenvolvi-
mento, levando o símbolo do progresso. Mudou tam-
bém a natureza da indústria, com a expansão do mer-
cado de ações e a investimento de capital, através das
Bolsas de Valores e das sociedades anônimas.
Na queda de braço da concorrência, as indús-
trias menores foram eliminadas por não terem força
para derrubar o grande capital. Em alguns casos, nem
ao menos entraram na competição. Essa nova realida-
de provocou a formação dos conhecidos trustes e
cartéis, que hoje monopolizam a produção e o comér-
cio mundial. Os trustes assumiram proporções gigan-
tescas, controlando várias fases da produção, desde a
matéria-prima até o produto final. Não se restringiam
a um único país e como observamos na realidade atu-
al, não havia fronteiras para as grandes empresas, que
em sua versão moderna, se materializam nas gigantes-
cas multinacionais.
Em um anúncio
americano do
início do século,
uma senhora
elegante tenta ligar
a imagem da
Coca-Cola aos
padrões da moda.
Bolsa de algodão
em New Orleans,
pintada por de
Degas.
3. CapitalismoeImperialismo
Arespeito da concorrência John Rockfeller Jr.,
numa conferência nos EUA, dizia “A rosa American
Beauty só pode ser produzida com todo o seu esplen-
dor e fragrância, sacrificando-se os primeiros botões
que nascem à sua volta.”
No mesmo contexto os cartéis desempenharam
uma estrutura de acordo voltada para a barganha, onde
diferentes empresas determinavam o preço igual de
uma mercadoria. Proporcionalmente os preços se man-
tinham iguais, ressalvando-se a peculiaridade de cada
país em custos adicionais de mão-de-obra, impostos
etc. Como afirma Léo Huberman, “com o crescimento
do monopólio, a oferta e a procura não se ajustaram
- foram ajustadas. Com o crescimento do monopólio,
os preços não se estabeleceram através da concor-
rência no mercado livre - o mercado deixou de ser
livre e os preços foram fixados.”
Outro sinal dos novos tempos era a associa-
ção das grandes indústrias com o capital bancário,
visando um lastro seguro para os investimentos. Com
a expansão do mercado de ações, os capitalistas
liberaram expressivas linhas de crédito, disponíveis
apenas nos grandes bancos. Com freqüência os
banqueiros adquiriam ações das empresas em
crescimento, tornando-se co-participantes de próspe-
ros negócios. Por tudo isso, o capitalismo mudou a
nomenclatura de Industrial para Monopolista e Finan-
ceiro.
OS CONCORRENTES DAOS CONCORRENTES DAOS CONCORRENTES DAOS CONCORRENTES DAOS CONCORRENTES DA
INGLATERRAINGLATERRAINGLATERRAINGLATERRAINGLATERRA
A partir da segunda década do século XIX, os
ingleses tiveram novos parceiros na produção industri-
al. A França no começo do século livrou-se do fardo
das restrições feudais e do mercantilismo. Após a Re-
volução de 1830, o país teve sua fase de maior prospe-
ridade, vinculada aos investimentos de poderosos ban-
queiros ligados ao governo. A partir de 1850, adota-
ram-se medidas de proteção à indústria interna visando
o crescimento industrial. Entretanto, apesar das reser-
vas de carvão de Alsácia e Lorena, a França ainda im-
portava boa parte das matérias-primas básicas da in-
dústria
De outro lado, após a unificação em 1870, a Ale-
manha seguiria a Inglaterra em ritmo extremamente
acelerado. Afinal, desde 1830, bem antes da unidade
política, os alemães haviam eliminado as barreiras al-
fandegárias, após a criação do Zollverein, — mercado
comum dos estados germânicos. Com a mudança, as
indústrias alemãs decolaram à todo vapor, contando
com a ajuda das imensas reservas de carvão do vale do
Ruhr, responsáveis por 50% do carvão consumido in-
ternamente. Com a expansão da indústria química, os
alemães deram goleada nos concorrentes e, até hoje,
têm posição de destaque no panorama mundial.
Com a ascensão do ministro Bismarck, em 1860,
a Prússia apostou na articulação de uma política de
exaltação nacionalista, que levou os prussianos a reali-
zarem duas guerras contra o débil reino da Dinamarca e
o fraco império Áustro-Húngaro. As sucessivas vitóri-
as alemãs ressaltaram o ego nacionalista, unindo os
Estados germânicos mais resistentes. Em 1870, no maior
lance de sua carreira de grande líder e diplomata, o gê-
nio Bismarck declarou guerra à França. A vitória alemã
foi obtida com um “passeio” que levou as tropas
germânicas a desfilarem em triunfo pelas ruas de Paris.
A derrota humilhou a França gerando uma série crise
interna, culminando na renúncia de Napoleão III, que
governava o país desde 1848.
“À frente de um grupo de oficiais do exército, o
rei Guilherme i e seu chefe de estado-maior, general
Von Moltke, observam manobras militares. Lingüísta
talentoso, mas taciturno, Moltke foi certa vez descrito
como sendo silencioso em sete línguas.
“A rosa American Beauty
só pode ser produzida com
todo o seu esplendor e fra-
grância, sacrificando-se os
primeiros botões que nascem à
sua volta.”
OTempo da História
1830 - 1848
REVOLUÇÕES
LIBERAIS
NA
FRANÇA
EUA
FIM DA
GUERRA
DE
SECESSÃO
UNIFICAÇÃO
DA
ALEMANHA
E
ITÁLIA
1850
EXPANSÃO
IMPERIALISTA
1878
PARTILHA
DA
ÁFRICA
JAPÃO
REVOLUÇÃO
‘MEIJI
1870
4. CapitalismoeImperialismo
Percebendo que o uso de ferrovias iria trans-
formar a condição das guerras, permitindo que gran-
des quantidades de tropas fossem rapidamente mobi-
lizadas e supridas. Moltke fez do exército prussiano a
mais eficiente força militar da Europa, coordenada
por uma equipe de estrategistas capazes e equipada
com canhões leves e carregáveis pela culatra”.3
No restante da Europa, Rússia, Itália, Áustria-
Hungria e Holanda tiveram níveis de desenvolvimento
bem inferiores aos de Inglaterra, Alemanha e França.
No geral, dependiam bastante dos investimentos
externos, como é o caso da Rússia. Os russos tiveram a
industrialização bastante dependente do capital francês
além de restrita a pouquíssimas cidades. A Itália tinha
uma vigorosa indústria, porém restrita ao norte, pois o
resto do país estava mergulhado num atraso que
lembrava a época feudal. O império Áustro-Húngaro
era uma colcha de retalhos de várias nacionalidades
distintas.
Fora da Europa, observa-se o crescimento de
EUA e Japão. Os EUA deram a grande arrancada, após
a Guerra de Secessão, quando houve a unificação do
mercado interno e a adoção de medidas de proteção à
indústria. Os EUA eram uma espécie de Eldorado, atra-
indo imigrantes que não paravam de chegar. Boa parte
desses imigrantes era altamente qualificada para o tra-
balho, e fugiam do fantasma do desemprego nas indús-
trias européias. Enquanto a rede ferroviária norte-ame-
ricana, se alastrava em todo o território, a indústria pe-
sada já ostentava o primeiro lugar mundial em produ-
ção de ferro, carvão, cobre, aço e alumínio.
O Japão entrou para o grupo de países
desenvolvidos em 1868 com a Revolução Meiji. Até
essemomento,eradifícilimaginarqueseriaumapotência
industrial. A revolução destruiu a herança feudal e co-
locou um ponto final no controle político dos Shoguns.
A burguesia japonesa com apoio estrangeiro, deu um
golpe derrubando o shogunato substituindo-o pela mo-
narquia parlamentar de perfil autoritário.
Daí em diante, os japoneses combinaram com
muita habilidade: concentração de recursos adminis-
trados pelo Estado; mão-de-obra numerosa e muito
capital disponível. Ajudando o crescimento da econo-
mia, o Estado implementava as indústrias e depois
transferia o controle acionista aos investidores parti-
culares. Na verdade, a transferência de recursos privi-
legiou pouquíssimos grupos, tornando a economia ja-
ponesa monopólio de alguns trustes.
PROTECIONISMO E VÁLVULA DEPROTECIONISMO E VÁLVULA DEPROTECIONISMO E VÁLVULA DEPROTECIONISMO E VÁLVULA DEPROTECIONISMO E VÁLVULA DE
ESCAPEESCAPEESCAPEESCAPEESCAPE.
Voltando ao continente europeu, paradoxalmen-
te, o crescimento do capitalismo veio conjugado com
uma grande crise. A explicação para o fenômeno, se
deve ao modelo de crescimento, pois ocorria grande
acúmulo de capital em prejuízo dos baixíssimos salári-
os da massa trabalhadora. A curto ou médio prazo, as
mercadorias sobravam nas prateleiras, não havendo
quem as comprasse. De outro lado, a concorrência de
vários países no processo produtivo, estrangulou o
mercado europeu tornando-o pequeno para o ritmo
frenético de produção. Era possível encontrar novas
perspectivas para o escoamento do grande capital?
Os monopolistas estavam na situação interna
de regular a oferta para estabelecer a procura, e foi o
que fizeram. Era uma prática comercial inteligente,
que lhes proporcionou altos lucros. Mas deixara uma
boa parte da capacidade produtiva de suas fábricas
parada, e essa situação tende sempre a dar aos capi-
tães da indústria uma dor de cabeça. Não queriam
fazer apenas mercadorias para vender internamente.
Queriam usar suas fábricas permanentemente para
produzir o máximo de mercadorias. Para tanto, ti-
nham de vendê-las fora do país. Tinham de encontrar
mercados estrangeiros que absorvessem os exceden-
tes de suas indústrias.
Onde encontrá-los? Podiam tentar despejar
suas mercadorias noutras nações ricas, como a In-
glaterra fizera durante anos. Mas as altas tarifas pro-
tetoras aumentavam cada vez mais, e atrás delas os
concorrentes haviam podido controlar o mercado dos
respectivos países. Vejamos essa queixa de Jules Ferry,
primeiro-ministro francês em 1885: “O que falta às
nossas indústrias, o que lhes falta cada vez mais, são
mercados. Por quê? Porque... a Alemanha se está pro-
tegendo com barreiras; porque, além do oceano, os
Estados Unidos da América se tornaram protecionis-
tas, e a um grau extremo.”
Nações como a Alemanha e os Estados Uni-
dos já não eram um mercado livre para as mercadori-
as de outros países — elas mesmas estavam concor-
rendo em busca dos mercados mundiais. A situação
era séria. Dentro das grandes indústrias, a capacida-
de de produzir superava a capacidade de consumir.
Todas tinham um excedente de mercadorias manufa-
turadas, para as quais necessitavam encontrar mer-
cados externos. Onde encontrá-los? A resposta é o
Neocolonialismo. 4
Cena de ônibus
(tela de W. Joy):
a humilhação do
pobre ante a
prosperidade e
segurança da
classe média
em ascensão.
5. CapitalismoeImperialismo
A
lém desses fatores citados por Leo
Huberman, identificamos ainda a ne
cessidade do capital bancário “expor-
tar” o excedente para não gerar uma crise de graves
proporções. Dessa forma, as áreas colonizadas rece-
beriam investimentos em diversos setores, sobretudo
construção de ferrovias, portos e obras de grande por-
te. Esses investimentos criaram um emaranhado de
empréstimos que terminariam arrasando a frágil eco-
nomia das áreas ocupadas.
É bom lembrar que essa difícil situação não atin-
gia apenas as áreas colonizadas, mas também áreas
que haviam obtido sua independência, como é o caso
daAmérica Latina. Por tudo isso, os historiadores dis-
tinguem o colonialismo do século XIX, considerando-
o bem diferente do colonialismo do século XVI, da
época das Grandes Navegações. No século XIX o
Neocolonialismo visava a obtenção de matérias-primas
vitais para o desenvolvimento do capitalismo, como
ferro, cobre, petróleo etc. Além disso, não houve
utilização de mão-de-obra escrava, pois entrava em
choque com a necessidade de mercado consumidor.
Em 1916, Lênin, no livro Imperialismo, Etapa
Superior do Capitalismo, definiu esse processo como
“uma fase do capitalismo em desenvolvimento, con-
solidando a dominação dos monopólios e do capital
financeiro, aumentando a prática de exportação de
capitais, iniciando a partilha do mundo pelos trustes
internacionais repartindo
toda a terra entre os pa-
íses capitalistas mais
importantes”.
Mesmo assim,
vários intelectuais da
época procuraram jus-
tificar o Imperialismo
como algo natural, fruto
da superioridade do homem branco que se impunha
aos homens inferiores. Para justificar essa absurda
teoria recorreu-se a Darwin, alegando-se que a luta
pela sobrevivência no reino animal, também existia na
sociedade e na relação entre os homens. Os mais fortes
naturalmente dominariam os mais fracos, subjugando
os menos aptos. Algumas obras enfatizavam o dever
dos “povos civilizados” explorar as riquezas naturais
das áreas colonizadas em benefício de toda a humani-
dade, tirando-as do monopólio exclusivo dos “povos
inferiores”. Para eles, a dominação imperialista visava
o bem de toda a humanidade!
“Em um livro publicado em 1931, Grandeza y
servidumbres coloniales, Sarrault expôs seus argumen-
tos com fria e cega convicção. Vejamos alguns tre-
chos: “Em nome do direito de viver da humanidade, a
colonização, agenda da civilização, deverá tomar a
seu encargo a valorização e a circulação das rique-
zas que possuidores fracos detenham sem benefício
para eles próprios e para os demais. Age-se, assim,
para o bem de todos. A Europa não abandonará, ab-
solutamente, sua autoridade colonial. Apesar de al-
guns perigos e de algumas servidões que a Europa
deve suportar e de algumas compulsões para abdicar
que recebe, não deve desertar de sua linha colonial.
Ela está no comando e no comando deve permanecer.
Eu nego com todas minhas forças e repúdio com toda
a energia de meu coração
todas as tendências que
procuram, tanto para a
Europa como para meu
país, o despejo da tutela
ocidental nas colônias.”
5
Como não poderia
deixar de ser, religiosos
católicos e protestantes se
engajaramnaexpansãoim-
perialista, funcionando
como suporte ideológico e
moral da colonização.
Atrás das ferrovias e das
expedições colonizadoras,
havia sempre um
missionário cristão para
levar a “palavra de Deus”
aos “povos selvagens e
ateus”. A “vontade divi-
na” impregnou a coloniza-
ção, que foi justificada pela “missão civilizadora e cris-
tã”.
Na colonização existiram diferentes formas de
dominação. Nas colônias de enraizamento as áreas co-
lonizadas ficavam sob controle direto dos países impe-
rialistas. Nessa situação, desaparecia qualquer autono-
mia das regiões conquistadas e o governo era exercido
pelo país dominador, como era o caso da Indochina,
colonizada pelos franceses, Índia, dominada pelos in-
gleses, e de muitas áreas do continente africano. Nas
colônias de enquadramento o governo local perma-
necia sob controle indireto do país dominador, a exemplo
do Egito, que ficou subordinado à Inglaterra após a
construção do canal de Suez.
A Era do
Imperialismo
Pintado por Louis
Sontag em 1895, o
bairro de Bowery
em Nova York,
pulsa de vida, com
as luzes elétricas
banindo a
escuridão das
calçadas lotadas.
6. CapitalismoeImperialismo
PARTILHA DA ÁFRICAPARTILHA DA ÁFRICAPARTILHA DA ÁFRICAPARTILHA DA ÁFRICAPARTILHA DA ÁFRICA
A ocupação do continente africano teve início
em 1830, quando Carlos X da França, invadiu o território
da atualArgélia, mas foi no final do século que houve a
fase mais acirrada da disputa. Em 1884, a Conferência
de Berlim reuniu todas as potências européias quando
se fez a Partilha da África, com vantagens para ingleses
e franceses, que ocuparam a maior parte do território
africano.
Os franceses se estabeleceram na região noro-
este, oeste e centro da África.Ainda hoje, vários países
desa região estão subordinados às imposições france-
sas. No leste da África, o limite da área francesa fazia
fronteira com o Sudão Anglo-Egípcio. Nessa região,
quase estourou uma guerra em 1898, pois os franceses
procuraram explorar a rebeldia dos muçulmanos do
Sudão, jogando-os contra os ingleses.
A Inglaterra dominou regiões no nordeste e no
sul da África.Aprimeira vítima foi o Egito, que estava
na mira dos europeus para a construção do canal de
Suez. Aobra monumental era impossível de ser reali-
zada com recursos egípcios. Convencido “espontane-
amente” o governo egípcio contraiu empréstimos, que
não teve a menor condição de pagar. As ações da
Companhia do Canal de Suez foram leiloadas e, num
lance ousadíssimo, um consórcio inglês obteve a mai-
or parte dessas ações colocando o Egito na órbita de
influencia inglesa.
Na África do Sul os ingleses enfrentaram a re-
ação dos bôeres – descendentes de holandeses, que há
muitos séculos viviam no local. O problema é que fo-
ram descobertas grandes reservas de ouro e diamante
nas terras dos colonos holandeses, que obviamente não
aceitavam entregar essas riqquezasaos ingleses de
“mão beijada”. Em 1899, as tropas inglesas atacaram
os colonos começando a Guerra dos Bôeres que se
prolongou até 1902.
No meio da confusão, entraram em cena os
temíveis guerreiros zulus impondo baixas nos dois
lados. Como não conseguiu vencer o inimigo, a
Inglaterra foi obrigada a fazer concessões aos brancos
holandeses. No final os brancos (africânderes) conse-
guiram autonomia e preservaram interesses no
comércio do ouro e diamante. Os negros da África do
Sul, tiveram todos os direitos negados, tornando-se
os reais perdedores. Mais tarde foi implantado o regime
de segregação racial - Apartheid - que durante muitas
décadas marginalizou os negros da África do Sul.
O IMPERIALISMO NA ÁSIAO IMPERIALISMO NA ÁSIAO IMPERIALISMO NA ÁSIAO IMPERIALISMO NA ÁSIAO IMPERIALISMO NA ÁSIA
Na Ásia os europeus tiveram grande dificulda-
de em estabelecer o domínio sobre os países da re-
gião. Os obstáculos iniciais fizeram as potências euro-
péias pressionarem por liberdade de comércio nos prin-
cipais portos e privilégios para os cidadãos europeus.
O governo imperial da China conseguia, até 1830, re-
sistir à pressão da Inglaterra. Daí em diante, os ingle-
ses começaram a despejar em território chinês, quanti-
dades exorbitantes de ópio, produzidas na Índia. Numa
reação firme o imperador protestou ameaçando pren-
der os residentes ingleses.
“”Assumi o fardo do homem branco,
Enviai os melhores dos vossos filhos,
Condenai vossos filhos ao exílio
Para que sejam os servidores dos seus cativos,
Para que velem, pesadamente ajezados.
Os povos sublevados e selvagens,
Povos recém-dominados, inquietos. Meio
demônio meio infantis.
Assumi o fardo do homem branco
Tudo que fizerdes ou deixardes
Servirá a esses povos silenciosos e
consumidos,
Para pesar vossas mercadorias e vós mesmos.”
-Rudyard Kipling. Poeta hindu.
A África
colonizada antes
da I Guerra
Mundial
7. CapitalismoeImperialismo
AInglaterranãodeuame-
nor bola e na primeira chance
invadiram a China com o auxílio
de tropas de outros países. Tra-
vou-seaGuerradoÓpio,emtrês
etapas,de1840a1860.Nofinal,a
China foi derrotada e obrigada a
assinar o Tratado de Nanquim,
permitindo a abertura dos portos
chineses aos países estrangeiros.
Para derrotar a China foi
necessária a união de várias po-
tências. A Inglaterra recebeu o
maior prêmio, que foi o porto de
Hong-Kong, recentemente de-
volvida à China depois de longa
negociação. Mais uma vez a In-
glaterra exercia o papel de rei do
imperialismo, obtendo 70% do comércio e 40% da dívi-
da chinesa. Dessa vez a Alemanha recebeu algumas
regiões, deixando para a França as províncias meridio-
nais.
“Por seu lado, os alemães, apesar do atraso
com que entraram na partilha colonial, haviam con-
seguido firmar solidariamente seu comércio e os in-
vestimentos. Detinham 28% das obrigações do go-
verno chinês e o investimento direto de 17% em 1902;
ocupavam o terceiro lugar depois dos russos e ingle-
ses. Concorriam, com sucesso, no vale do rio Iang-
tsé e os banqueiros alemães agiam em estreita cola-
boração para construir duas ferrovias em Chaotung;
o direito de explorar minas num raio de 17 quilôme-
tros de cada lado destas ferrovias; e a prioridade para
fornecer conhecimentos práticos, capital e arrenda-
mento do porto de Kiaustschau por 99 anos. Para a
Alemanha era importante conservar a integridade do
país e quando decidiu ocupar militarmente este porto
em 1897, para reprimir o assassinato de missionári-
os alemães, o fez para compensar a base britânica de
Hong Kong.” 7
No caso da Índia,
desde o século XVI se esta-
beleceram relações comerci-
ais com os hindus, com base
na venda de especiarias que
tinham alto valor nas feiras
européias. Por muito tempo
os navios fizeram o longo
trajeto, levando para a Eu-
ropa uma quantidade enor-
me de mercadorias. No sé-
culoXIXosinglesesabriram
os olhos para as imensas
possibilidades de exploração
do território hindu. O solo e
o clima eram excelentes para
o plantio do algodão, que
havia se tornado a matéria-
prima essencial da indústria
têxtil inglesa.
Alegando uma suposta ajuda para a contenção
de revoltas das populações insatisfeitas com o domínio
imperial hindu, os ingleses foram entrando de mansinho
e quando os indianos acordaram, havia na Índia um gran-
de contingente militar inglês. O esquema de dominação
se deu com a anuência dos marajás corruptos que se
aproveitaram da parceria com a Inglaterra. A passivi-
dade religiosa hindu serviu de estímulo à aceitação do
domínio imperialista, apesar de alguns nativos reagirem
na Revolta dos Sipaios, em 1857, que foi sufocada bru-
talmente pelas tropas inglesas. Com a derrota dos naci-
onalistas estabeleceu-se a Companhia das Índias Orien-
tais que monopolizou a produção e o comercio do al-
godão.
As manufaturas têxteis que existiam no país fo-
ram proibidas em detrimento da compra de tecidos in-
gleses. Na Índia os ingleses construíram centenas de
quilômetros de ferrovias, estruturando a maior malha
ferroviária do mundo. Implementaram também pontes,
portos, rede elétrica e hospitais maquiando perversa-
mente o sistema de dominação, pois apesar do desen-
volvimento, a dívida com a Inglaterra transfigurou a
Índia tornando-a completamente dependente da econo-
mia inglesa.
...Afirmo (...) que esta política colonial é um sistema concebido, definido e limitado do seguinte modo
repousa sobre uma tríplice base econômica, humanitária e política (...) A questão colonial é, para os países
voltados a uma grande exportação pela própria natureza de sua indústria, como o nosso, uma questão de
salvação. No tempo em que vivemos e na crise que atravessam todas as indústrias européias, a fundação de
uma colônia é a criação de uma válvula de escape (...).
É preciso dizer abertamente que as raças superiores têm direitos sobre as raças inferiores (...) porque
têm um dever para com elas — o dever de civilizá-las (...). Afirmo que a política colonial da França, que nos tem
levado (...) a Saigon, na Cochinchina, à Tunísia e a Madagascar inspira-se numa verdade sobre a qual é preciso
atrair um instante vossa atenção (...).
Senhores, na Europa tal como ela é feita, nessa concorrência de tantos rivais que vemos crescer em
torno de nós, quer pelo aperfeiçoamento militar ou marítimo, quer pelo desenvolvimento prodigioso de uma
população que cresce incessantemente; na Europa, ou antes, num universo assim feito, a política de
recolhimento ou de abstenção é simplesmente o grande caminho da decadência (...).” 6
Guerra dos
Boers na África
do Sul
8. CapitalismoeImperialismo
“O imperialismo deixou um legado de profun-
da animosidade entre os povos. Os argumentos eco-
nômicos apresentados em favor da expansão imperial
- a necessidade de matérias-primas, mercados e luga-
res de investimento - não resistem à análise. A maior
parte das áreas reivindicadas pelos europeus e ameri-
canos não eram fontes lucrativas de matérias-primas,
nem eram bastante ricas para se constituírem em bom
mercados. Europeus e americanos negociavam e in-
vestiam principalmente entre si. É possível que em-
presas individuais obtivessem lucros, mas é certo que
a maioria das colônias não foi lucrativa para os con-
tribuintes ocidentais.
A maior parte delas não atraiu a população
excedente dos países metropolitanos - as Américas fo-
ram o grande objetivo dos emigrantes europeus. O
nacionalismo agressivo, inclusive a luta pelas conquis-
tas diplomáticas e militares, distantes de perigosos
campos de conflito na Europa, parece ter sido uma
das mais vigorosas forças por trás da atividade impe-
rial. (...) O imperialismo tem sido uma fonte de gran-
de amargura, não só pela exploração econômica mas
pelo racismo e pela brutal indiferença por outras cul-
turas. E hoje, em toda parte onde os europeus e os
americanos gostariam de estabelecer contatos nas áre-
as da economia e da política encontram nações, não
povos, grupos ou indivíduos dispares - nações que o
imperialismo criou ou às quais pelo menos deu a cons-
ciência de serem nações.” 8
1 In. Morazé, Charles - Os Burgueses e a Con-
quista do Mundo - Edições Cosmos. Pág. 7.
2 In. Parker Geoffrey. Op. Cit. Pág. 35.
3 In. Parker, Geoffrey. Op. Cit. Pág. 47.
4 In. Huberman, Léo. História da Riqueza do
Homem. Zahar Editores. Pág. 128.
5 In. Bruit, Hector. O Imperialismo.Atual Edi-
tora. Pág. 11.
6 Discurso de Jules Ferry, citado por Henri
Brunschwig, Mythes et Réalites de L’Impérialisme
Colonial Français — A. Colin, Paris, 1960, pág. 74-
75.
7 In. Bruit, Hector. Op. Cit. Pág. 56.
8 In. Perry, Marvin. Civilização Ocidental.
Uma História Concisa. Martins Fontes Editora. Pág.
608.
Roupas em frangalhos e potes quebrados espalham-se pelo Bibighar,
local em Cawnpore no qual duzentas mulheres e crianças britânicas foram
massacradas pelos amotinados indianos em junho de 1857. Essa atrocidade
inflamou os ingleses que nos estágios finais do motim, vingaram-se dos rebeldes
com igual ferocidade.