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Tuberculose                                                        Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004



Guia de Vigilância
Epidemiológica
Apresentação
           A tuberculose continua a merecer especial atenção dos profissionais
       de saúde e da sociedade como um todo. Apesar de já existirem recursos
       tecnológicos capazes de promover seu controle, ainda não há perspec-
       tiva de obter-se, em futuro próximo, sua erradicação, a não ser que
       novas vacinas ou tratamentos sejam descobertos. Além disso, a associa-
       ção da tuberculose com a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (aids)
       representa um novo desafio em escala mundial.
           Esse Guia de Vigilância da Tuberculose, que agora publicamos, é
       uma contribuição para a melhoria das atividades de prevenção, diag-
       nóstico e tratamento dos casos de tuberculose e para a organização dos
       serviços de saúde do SUS.
           Os profissionais de saúde podem contar com as orientações aqui
       reunidas para as ações de vigilância epidemiológica, nos aspectos de
       coleta, processamento, análise e interpretação dos dados; na adoção de
       medidas de controle apropriadas; e na avaliação da eficácia e efetivida-
       de.
           Desta forma, seu uso por médicos, enfermeiros, auxiliares, laborato-
       ristas, sanitaristas e todos os profissionais envolvidos na rede de assis-
       tência e controle da tuberculose, nas três esferas de governo que ge-
       renciam o Sistema Único de Saúde (SUS), contribuirá significativamente
       para implementar o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica com
       o objetivo de ampliar o controle da tuberculose do país, doença de
       grande magnitude, transcendência e vulnerabilidade, contribuindo com
       a melhoria da saúde de nossa população.
                                      JARBAS BARBOSA DA SILVA JR.
                             Diretor do Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi)/FUNASA




                                                                                                                        5 #%
II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




         I. Introdução
             O Plano Nacional de Controle da Tuberculose,      correm para o agravamento do quadro – a epide-
         lançado pelo Ministro da Saúde, em 1999, define       mia de aids e a multirresistência às drogas.
         a tuberculose como prioridade entre as políticas          Este cenário faz com que a expressão epide-
         governamentais de saúde, estabelece diretrizes para   miológica da tuberculose no Brasil, neste final de
         as ações e fixa metas para o alcance de seus obje-    século – com estimativas de prevalência de 50
         tivos.                                                milhões de infectados e, anualmente, com o sur-
             Recentemente, em 2001, foram revistas as me-      gimento de 130.000 novos casos e com o registro
         tas e lançado o “Plano de Mobilização para Con-       de 6.000 óbitos – configure, em termos relativos,
         trole da Tuberculose e eliminação da Hanseníase”.     uma situação mais grave do que a apresentada
                                                               por outros países latino-americanos como Argen-
             Este Plano dá continuidade à política de go-
                                                               tina, Chile, Colômbia, Venezuela, Cuba e México.
         verno que, a partir dos anos trinta, confiou o com-
                                                               Apesar dos alcances do Programa – descoberta de
         bate à tuberculose a sucessivas entidades públi-
                                                               70% dos casos estimados e cura de 75% dos pa-
         cas: Serviço Nacional de Tuberculose, Divisão
                                                               cientes tratados – esta situação se manteve está-
         Nacional de Tuberculose, Divisão Nacional de
                                                               vel na década de 1990.
         Pneumologia Sanitária, até a atual Coordenação
                                                                   Esta edição do Guia de vigilância, do Ministé-
         Nacional de Pneumologia Sanitária.
                                                               rio da Saúde, compreende duas seções principais:
             O Programa Nacional de Controle da Tubercu-       a primeira apresenta a descrição das técnicas e
         lose, um conjunto de ações descentralizadas, está     estratégias essenciais utilizadas no controle da
         sob a responsabilidade de diferentes setores do       tuberculose, apresentando, inclusive, um novo
         Ministério da Saúde – Área Técnica de Pneumolo-       capítulo sobre Biossegurança; a segunda trata da
         gia Sanitária, coordenações macrorregionais, Fun-     estrutura e da operacionalização do Programa, uma
         dação Nacional de Saúde, Centro de Referência         visão inovadora, inserida nos diferentes níveis da
         Prof. Hélio Fraga – e das secretarias estaduais e     rede de serviços do Sistema Único de Saúde.
         municipais de Saúde, com atribuições e funções            Em seu trabalho, levou-se em conta não só o
         definidas pelo Plano.                                 que estava expresso no 4o Manual de Normas para
             O problema da tuberculose no Brasil reflete o     o controle OATB, como também importantes con-
         estágio de desenvolvimento social do país, onde       tribuições do I Consenso Brasileiro de Tuberculo-
         os determinantes do estado de pobreza, as fra-        se, de 1997, uma ação da Coordenação Nacional
         quezas de organização do sistema de saúde e as        de Pneumologia Sanitária, em parceria com a So-
         deficiências de gestão limitam a ação da tecnolo-     ciedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia; do
         gia e, por conseqüência, inibem a queda susten-       Seminário de Tuberculose do Ministério da Saúde,
         tada das doenças marcadas pelo contexto social.       de 1998, e da Coordenação Nacional de Doenças
         No caso da tuberculose, duas novas causas con-        Sexualmente Transmissíveis e Aids.




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Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




II. Normas Técnicas
1. PROCURA DE CASOS
    Denomina-se “Caso de Tuberculose” todo in-        ritários para essa ação. Também incluem-se nessa
divíduo com diagnóstico confirmado por bacilos-       categoria os imunodeprimidos por uso de medi-
copia ou cultura e aquele em que o médico, com        camentos ou por doenças imunossupressoras.
base nos dados clínico-epidemiológicos e no re-           Em infectados pelo HIV, principalmente aque-
sultado de exames complementares, firma o diag-       les na fase avançada de imunodepressão (nível
nóstico de Tuberculose. “Caso Novo” é o doente        sérico de CD4 inferior a 200 cels/mm3 ou linfóci-
com tuberculose que nunca usou ou usou por            tos inferior a 1.000 cels/mm3), deve-se suspeitar
menos de um mês drogas antituberculosas.              de tuberculose na presença de qualquer sintoma
    A procura de casos é um conceito programáti-      respiratório e quadros de febre de origem indeter-
co que compreende tanto os métodos de diag-           minada. A justificativa para essa conduta deve-se
nóstico como as ações organizadas para operacio-      à alta freqüência de manifestações atípicas de tu-
nalizá-los, envolvendo os serviços e a comunidade.    berculose e à ocorrência de outras doenças respi-
Estas ações estão voltadas para os grupos com         ratórias causadas por agentes oportunistas.
maior probabilidade de apresentar tuberculose,
quais sejam: sintomáticos respiratórios (pessoas      2. DIAGNÓSTICO
com tosse e expectoração por três semanas ou
mais); contatos de casos de tuberculose; suspei-         O diagnóstico da tuberculose, além da avalia-
tos radiológicos; pessoas com doenças e/ou em         ção clínica, deverá estar fundamentado nos méto-
condição social que predisponham à tuberculose.       dos a seguir.
Os contatos, definidos como toda pessoa, parente
ou não, que coabita com um doente de tubercu-         2.1. Bacteriológico
lose, constituem um grupo para o qual se reco-           A pesquisa bacteriológica é método de impor-
menda uma atitude de busca ativa.                     tância fundamental, tanto para o diagnóstico como
    Os locais ideais para se organizar a procura de   para o controle de tratamento, e será usado na
casos são os serviços de saúde, públicos ou priva-    ordem de prioridade abaixo detalhada:
dos. Nestas instituições – postos, centros de saú-
de, ambulatórios e hospitais – realizar busca ativa       Exame microscópico direto do escarro
de sintomáticos respiratórios deve ser uma atitude        A baciloscopia direta do escarro é método
permanente e incorporada à rotina de atividades       fundamental porque permite descobrir as fontes
de todos os membros das equipes de saúde.             mais importantes de infecção: os casos bacilífe-
    Nas áreas onde as ações já estão organizadas,     ros. Por ser um método simples e seguro, deve ser
a visita domiciliar periódica do agente de saúde      realizado por todo laboratório público de saúde e
deve incluir a detecção de casos entre sintomáti-     pelos laboratórios privados tecnicamente habilita-
cos respiratórios e contatos, principalmente de       dos.
casos bacilíferos e crianças. Quando necessário,          Recomenda-se para o diagnóstico a coleta de
deve-se referenciá-los ao serviço de saúde.           duas amostras de escarro: uma, por ocasião da
    Atenção especial deve ser dada a populações       primeira consulta, e outra, independentemente do
de maior risco de adoecimento, representadas so-      resultado da primeira, na manhã do dia seguinte,
bretudo por residentes em comunidades fechadas,       ao despertar. Se for necessária uma terceira amos-
como presídios, manicômios, abrigos e asilos. Nes-    tra, aproveita-se para coletá-la no momento da
sas comunidades, justifica-se a busca ativa perió-    entrega da segunda.
dica de casos. Indivíduos das categorias alcoóli-         O exame baciloscópico deve ser solicitado, por
cos, usuários de drogas, mendigos, e trabalhadores    ordem de prioridade, aos pacientes que:
de saúde e outros em situações especiais em que           • procurem o serviço de saúde por queixas
haja contato próximo com paciente portador de         respiratórias ou por qualquer outro motivo, mas
tuberculose pulmonar bacilífera, são também prio-     que, espontaneamente ou em resposta ao profis-


                                                                                                                         5 #'
II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




         sional de saúde, informem ter tosse e expectora-         O exame radiológico, em pacientes com baci-
         ção há três semanas ou mais;                          loscopia positiva, tem como função principal a
             • apresentem alterações radiológicas pulmo-       exclusão de doença pulmonar associada, que ne-
         nares.                                                cessite de tratamento concomitante, além de per-
             Recomenda-se, ainda, o controle de qualidade      mitir avaliação da evolução radiológica dos pa-
         das baciloscopias. Para este fim, os laboratórios     cientes, sobretudo naqueles que não responderem
         de âmbito local deverão guardar todas as lâminas      à quimioterapia.
         examinadas, positivas e negativas, para enviá-las,       Os resultados dos exames radiológicos do tó-
         se solicitado, ao laboratório supervisor.             rax deverão obedecer à seguinte classificação:
                                                                  • Normal – os que não apresentam imagens
             Cultura para micobactéria
                                                               patológicas nos campos pulmonares.
             A cultura é indicada para os suspeitos de tu-        • Seqüela – os que apresentam imagens su-
         berculose pulmonar persistentemente negativos ao      gestivas de lesões cicatriciais.
         exame direto e para o diagnóstico de formas ex-          • Suspeito – os que apresentam imagens su-
         trapulmonares como meningoencefálica, renal,          gestivas de tuberculose.
         pleural, óssea ou ganglionar. A cultura também está      • Outras doenças – os que apresentam ima-
         indicada nos casos de suspeita de resistência bac-    gens sugestivas de pneumopatia não tuberculosa.
         teriana às drogas, seguida do teste de sensibilida-
         de.
             Nos casos de suspeita de infecção por mico-       2.3. Prova tuberculínica
         bactérias não tuberculosas, notadamente nos pa-
                                                                   Indicada como método auxiliar no diagnóstico
         cientes HIV positivos ou com aids, deverá ser rea-
                                                               da tuberculose, a prova tuberculínica positiva, iso-
         lizada a tipificação do bacilo.
                                                               ladamente, indica apenas infecção e não é sufi-
                                                               ciente para o diagnóstico da tuberculose doença.
         2.2. Radiológico
                                                                   No Brasil, a tuberculina usada é o PPD RT23,
             O exame radiológico é auxiliar no diagnóstico     aplicada por via intradérmica no terço médio da
         da tuberculose, justificando-se sua utilização nos    face anterior do antebraço esquerdo, na dose de
         casos suspeitos. Nesses pacientes, o exame radio-     0,1ml, equivalente a 2UT (unidades de tuberculi-
         lógico permite a seleção de portadores de ima-        na), cujo resultado guarda equivalência com 5UT
         gens sugestivas de tuberculose ou de outra pato-      de PPD-S, utilizada em alguns países. Deve ser
         logia, sendo indispensável submetê-los a exame        conservada em temperatura entre 4oC e 8 oC, não
         bacteriológico para se fazer um diagnóstico cor-      devendo ser congelada ou exposta à luz solar di-
         reto, já que não é aceitável, exceto em crianças, o   reta.
         diagnóstico de tuberculose pulmonar sem investi-          A técnica de aplicação e o material utilizado
         gação do agente causal pela baciloscopia de es-       são padronizados pela Organização Mundial de
         carro.                                                Saúde (OMS) e têm especificações semelhantes às
             Em suspeitos radiológicos de tuberculose pul-     usadas para a vacinação BCG.
         monar com baciloscopia direta negativa, deve-se           A leitura da prova tuberculínica é realizada 72
         afastar a possibilidade de outras doenças, reco-      a 96 horas após a aplicação, medindo-se, com ré-
         mendando-se, ainda, a cultura para micobactéria.      gua milimetrada, o maior diâmetro transverso da
             O estudo radiológico tem, ainda, importante       área de endurecimento palpável. O resultado, re-
         papel na diferenciação de formas de tuberculose       gistrado em milímetros, classifica-se como:
         de apresentação atípica e no diagnóstico de ou-           • 0mm a 4mm – não reator – indivíduo não
         tras pneumopatias no paciente portador de HIV/        infectado pelo M. tuberculosis ou com hipersen-
         aids ou de outras situações de imunossupressão.       sibilidade reduzida.
             No diagnóstico de probabilidade, deve-se le-          • 5mm a 9mm – reator fraco – indivíduo va-
         var em conta que o erro causa atraso na identifi-     cinado com BCG ou infectado pelo M. tuberculo-
         cação da verdadeira doença, acarretando ao doente     sis ou por outras micobactérias.
         sofrimento físico, psicológico, econômico e so-           • 10mm ou mais – reator forte – indivíduo
         cial.                                                 infectado pelo M. tuberculosis, que pode estar


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Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




doente ou não, e indivíduos vacinados com BCG        2.5. Outros métodos de diagnóstico
nos últimos dois anos.
                                                         Além da bacteriologia, da radiologia, da prova
    Algumas circunstâncias podem interferir no re-
                                                     tuberculínica e da histopatologia, existem, desen-
sultado das provas tuberculínicas, como, por exem-
                                                     volvidas ou em desenvolvimento, outras metodo-
plo:
                                                     logias diagnósticas. Entretanto, pelo alto custo
   Portadores de doenças imunodepressoras:           destes métodos, e pela ausência de provas consis-
   Sarcoidose.                                       tentes quanto à sensibilidade, especificidade e
   Aids.                                             valores preditivos, eles não devem ser usados in-
   Neoplasias de cabeça e pescoço.                   discriminadamente. Esses fatos não permitem sua
   Doenças linfoproliferativas.                      utilização em substituição aos métodos conven-
   Outras neoplasias.                                cionais, devendo-se restringir seu uso, como au-
                                                     xílio diagnóstico para a tuberculose, aos serviços
   Situações com imunodepressão transitória:         de referência, serviços especializados ou institui-
   Vacinação com vírus vivos.                        ções de pesquisa.
   Gravidez.
   Tratamentos com corticosteróides e drogas            • Hemocultura
imunodepressoras.                                       Está indicada em pacientes portadores do HIV
   Crianças com menos de dois meses de vida.         ou com aids e que haja suspeita de doença mico-
   Idade acima de 65 anos.                           bacteriana disseminada.
    Todos os indivíduos infectados pelo HIV de-
vem ser submetidos à prova tuberculínica. Nesses        • Detecção da produção de CO2
casos, considera-se reator aquele que apresenta          Método radiométrico: utiliza a produção de gás
endurecimento de 5mm ou mais, e não reator aque-     carbônico pelo bacilo em crescimento, para a de-
le com endurecimento entre 0mm e 4mm. Pacien-        tecção de sua presença nos meios de cultura em
tes portadores do HIV ou com aids, inicialmente      que se inoculou o espécime clínico. Como no meio
não reatores, deverão ter sua prova tuberculínica    de cultura se adicionam nutrientes com carbono
repetida, após melhora clínica com o uso de anti-    marcado isotopicamente, o CO2 produzido terá
retrovirais.                                         também o carbono radioativo, que poderá ser iden-
    Recomenda-se a prova tuberculínica, como         tificado por equipamento específico para esse fim.
parte do exame médico, a todos os profissionais      O método permite também a realização de teste
dos serviços de saúde, por ocasião de sua admis-     de sensibilidade a drogas num tempo mais curto
são.                                                 que o habitual, o que constitui sua grande vanta-
    Nos indivíduos vacinados com BCG, sobretudo      gem sobre os métodos convencionais. Uma varia-
nos imunizados há até dois anos, a prova tuber-      ção deste método detecta a produção do gás, por
culínica deve ser interpretada com cautela, pois,    um sistema de sensores ópticos, e não por emis-
em geral, apresenta reações de tamanho médio,        são de carbono marcado.
embora possa alcançar 10mm ou mais segundo a
vacina utilizada.                                        • Detecção de consumo de O 2
                                                         Mycobacteria Growth Indicator Tube (MGIT)
                                                         Este método utiliza tubos de ensaio com meios
2.4. Histopatológico
                                                     líquidos de cultura, onde existe uma base de sili-
    É um método empregado principalmente na          cone impregnada com rutênio, metal que emite
investigação das formas extrapulmonares. A lesão     luminescências na ausência de O2. Se há cresci-
apresenta-se como um granuloma, geralmente           mento bacteriano, há também consumo de O2 e o
com necrose de caseificação e infiltrado histioci-   rutênio emitirá luminescências possíveis de serem
tário de células multinucleadas. Como esta apre-     detectadas com luz ultravioleta. O resultado é ob-
sentação ocorre em outras doenças, o achado de       tido num tempo mais curto que a cultura conven-
BAAR na lesão é fundamental para auxiliar o diag-    cional e pode-se, também, realizar teste de sensi-
nóstico de tuberculose.                              bilidade.


                                                                                                                        5 $
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Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




            • Sorológico                                         cidos de diagnóstico baseados em amplificação do
            Consiste na detecção de anticorpos produzi-          alvo são:
         dos pelo organismo, contra componentes do M.                • Reação em cadeia da polimerase (PCR).
         tuberculosis. São utilizados antígenos purificados          • Amplificação mediada por transcrição (TMA).
         ou clonados, em metodologias que se baseiam em              • Amplificação baseada na seqüência de áci-
         reações antígeno-anticorpo. São métodos muito           dos nucléicos (NASBA).
         rápidos, mas que têm o inconveniente de, em fun-            • Amplificação por transferência de fita (SDA).
         ção da baixa especificidade dos antígenos dispo-            A reação em cadeia da polimerase, no momen-
         níveis, revelar reações cruzadas com outros ger-        to o teste mais usado, permite a detecção de quan-
         mes, além de outras circunstâncias que alteram os       tidades mínimas de material genético, sendo o pre-
         resultados. Além disso, ainda não é possível, com       cursor dos métodos baseados na biologia
         absoluta segurança, identificar os doentes dos          molecular.
         apenas infectados ou vacinados.                             O Food and Drug Administration (FDA) ameri-
                                                                 cano aprovou, recentemente, o uso de dois testes
             • Marcadores biológicos                             de detecção direta do M. tuberculosis em espéci-
                                                                 mes clínicos. Um deles, baseado na detecção do
             Há dois marcadores com importância clínica:
                                                                 DNA do bacilo, usa a tecnologia da PCR ou outra
             a) A adenosinadeaminase (ADA), uma enzima           como a reação isotérmica que detecta RNAr. Estes
         presente em várias células, particularmente no lin-     testes foram aprovados para uso em pacientes com
         fócito ativado, como observado na tuberculose. A        baciloscopia positiva, sem tratamento nos últimos
         determinação do aumento da atividade da ADA no          12 meses, e apenas em espécimes respiratórios,
         líquido pleural, sobretudo se associado a alguns        circunstâncias em que mostraram melhor rendi-
         parâmetros como idade ( 45 anos), predomínio           mento quanto à sua acurácia. Não se aplicam,
         de linfócitos (acima de 80%) e proteína alta (ex-       portanto, à nossa rotina de diagnóstico, pois não
         sudato), é indicadora de pleurite tuberculosa. É        substituem os métodos convencionais de detec-
         método colorimétrico, de fácil execução em qual-        ção do bacilo.
         quer laboratório que disponha de um espectrofo-             Nenhum novo teste ou kil para diagnóstico da
         tômetro, podendo, à luz dos conhecimentos dis-          tuberculose pulmonar ou extrapulmonar deve ser
         poníveis, autorizar o início do tratamento para         usado na rotina, sem que ele esteja validado por
         suspeita de tuberculose pleural, onde não seja          instituição credenciada pelo Ministério da Saúde.
         possível a biópsia. Ressalte-se que o método a ser
         utilizado deve ser o de Giusti, feito no laboratório,   2.6. Classificação dos doentes de
         que é o mais utilizado no país.
                                                                 tuberculose
             b) Ácido tubérculo-esteárico, um metabólito de
         bacilo, cuja taxa aumentada, no líquor, indica a           Tuberculose pulmonar positiva – quando
         presença de meningoencefalite por tuberculose.             apresentam:
         Sua importância em outros fluidos ainda está sen-          • duas baciloscopias diretas positivas;
         do estudada. O inconveniente para sua utilização           • uma baciloscopia direta positiva e cultura
         rotineira é o alto custo do equipamento necessá-        positiva;
         rio para sua determinação.                                 • uma baciloscopia direta positiva e imagem
                                                                 radiológica sugestiva de tuberculose;
             • Técnicas de biologia molecular                       • duas ou mais baciloscopias diretas negati-
                                                                 vas e cultura positiva;
             Partindo-se do pressuposto de que o genoma
                                                                    Em caso de uma baciloscopia positiva e outra
         de qualquer organismo é o que de mais específico
                                                                 negativa, encaminhar para outros exames; não
         existe para sua identificação, as técnicas de biolo-
                                                                 havendo disponibilidade de meios, iniciar trata-
         gia molecular passaram a ser utilizadas para o diag-
                                                                 mento de prova.
         nóstico de diversas doenças, inclusive para tuber-
         culose, com a vantagem de poderem oferecer o               Tuberculose pulmonar negativa – quando
         resultado num tempo muito curto (algumas ho-               apresentam:
         ras). Desta forma, desenvolveram-se várias técni-          • duas baciloscopias negativas, com imagem
         cas para esta finalidade. Os métodos mais conhe-        radiológica sugestiva e achados clínicos ou ou-

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Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




tros exames complementares que permitam ao                                  antibioticoterapia inespecífica. Quando a ra-
médico efetuar o diagnóstico de tuberculose.                                diologia do tórax revela regressão da lesão, ele
Atenção: Antes de se optar por um diagnóstico de                            deve ser classificado como portador de infec-
   tuberculose pulmonar sem confirmação bacte-                              ção inespecífica; nos doentes adultos com sin-
   riológica (tuberculose pulmonar de probabili-                            tomatologia crônica, deve-se afastar a possibi-
   dade), devem ser afastados os quadros agu-                               lidade de doença pulmonar obstrutiva crônica,
   dos, especialmente os que apresentem febre.                              câncer de pulmão, micoses pulmonares, outras
   Nesses casos, o doente será reavaliado após 7                            pneumopatias crônicas e infecção pelo HIV ou
   a 15 dias de tratamento sintomático ou com                               aids.

                                         Classificação da tuberculose pulmonar
                                           segundo a bacteriologia do escarro

                  Critério segundo                       Resultado da                    Critério segundo a
               baciloscopia e cultura             Baciloscopia           Cultura            baciloscopia

              Pulmonar positiva                          +                  NR       Baciloscopia   positiva
              Pulmonar positiva                          +                  +        Baciloscopia   positiva
              Pulmonar positiva                           –                 +        Baciloscopia   negativa
              Pulmonar negativa                           –                 NR       Baciloscopia   negativa
              Pulmonar negativa                           –                  –       Baciloscopia   negativa
              Pulmonar não realizada                     NR                 NR       Baciloscopia   não realizada
              legenda: (+) positiva; (–) negativa; (NR) não realizada.


    Tuberculose extrapulmonar                                            mes comuns. Há predomínio da localização pul-
    A tuberculose pode ainda se expressar por for-                       monar sobre as demais formas de tuberculose, isto
mas disseminadas como a miliar ou extrapulmona-                          é, as formas extrapulmonares.
res (classificadas segundo a localização: pleural,                           Os achados radiográficos mais sugestivos da
ganglionar periférica, osteoarticular, geniturinária,                    tuberculose são: adenomegalias hilares e/ou pa-
meningoencefálica e assim por diante), com base                          ratraqueais (gânglios mediastínicos aumentados de
nos achados clínicos e em exames complementa-                            volume); pneumonias com qualquer aspecto ra-
res que permitam ao médico diagnosticar tuber-                           diológico, de evolução lenta, às vezes associadas
culose.                                                                  a adenomegalias mediastínicas, ou que cavitam
                                                                         durante a evolução; infiltrado nodular difuso (pa-
2.7. Diagnóstico da tuberculose na                                       drão miliar). Sempre deve ser feito o diagnóstico
criança e no adolescente                                                 diferencial com tuberculose, em crianças com
                                                                         pneumonia de evolução lenta, isto é, quando o
    Pulmonar                                                             paciente vem sendo tratado com antibióticos para
    O diagnóstico, na prática, segundo um sistema                        germes comuns sem apresentar melhora após duas
de contagem de pontos, está sumariado no qua-                            semanas.
dro da pág. 14*, baseado em similares publicados                             A história de contágio com adulto tuberculo-
na literatura nas últimas décadas.                                       so, bacilífero ou não, deve ser valorizada, princi-
    As manifestações clínicas podem ser variadas.                        palmente nas crianças até a idade escolar.
O dado que chama atenção na maioria dos casos                                O teste tuberculínico pode ser interpretado
é a febre, habitualmente moderada, persistente por                       como sugestivo de infecção pelo M. tuberculosis
mais de 15 dias e freqüentemente vespertina. São                         quando superior a 10mm em crianças não vacina-
comuns irritabilidade, tosse, perda de peso, sudo-                       das com BCG ou vacinadas há mais de dois anos;
rese noturna, às vezes profusa; a hemoptise é rara.                      ou superior a 15mm em crianças vacinadas com
Muitas vezes, a suspeita de tuberculose é feita em                       BCG há menos de dois anos. No caso de crianças
casos de pneumonia que não vêm apresentando                              que receberam revacinação BCG, esta interpreta-
melhora com o uso de antimicrobianos para ger-                           ção é indiscutível.


                                                                                                                                            5 $!
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Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




             Em crianças até cinco anos que estejam inter-      3. TRATAMENTO
         nadas para investigação de tuberculose, pode ser
         tentada a realização de cultura para M. tuberculo-     3.1. Princípios básicos
         sis em espécime de lavado gástrico. Em serviços            A tuberculose é uma doença grave, porém curá-
         ambulatoriais, o lavado gástrico não é recomen-        vel em praticamente 100% dos casos novos, des-
         dado. O exame de escarro (baciloscopia e cultu-        de que obedecidos os princípios da moderna qui-
         ra), em geral, só é possível a partir dos cinco ou     mioterapia.
         seis anos.                                                 A associação medicamentosa adequada, as do-
             Dependendo do quadro clínico-radiológico           ses corretas e o uso por tempo suficiente, com
         apresentado pela criança, podem ser necessários        supervisão da tomada dos medicamentos, são os
         outros métodos diagnósticos, tais como broncos-        meios para evitar a persistência bacteriana e o
         copia, punções e até mesmo biópsia pulmonar por        desenvolvimento de resistência às drogas, asse-
         toracotomia. Nestas condições, além de exame           gurando, assim, a cura do paciente.
         bacteriológico, pode-se proceder a exame cito ou           O tratamento dos bacilíferos é a atividade prio-
         histopatológico, para aumentar a chance de posi-       ritária de controle da tuberculose, uma vez que
         tividade.                                              permite anular rapidamente as maiores fontes de
              Extrapulmonar                                     infecção.
                                                                    O tratamento para caso suspeito de tuberculo-
             Algumas localizações extrapulmonares da tu-
                                                                se sem comprovação bacteriológica deve ser ini-
         berculose são mais freqüentes na infância, como
                                                                ciado após tentativa de tratamento inespecífico,
         gânglios periféricos, pleura, ossos e meninges.
                                                                com antibiótico de largo espectro, sem melhora
             A tuberculose do aparelho digestivo (peritoni-
                                                                dos sintomas. Uma vez iniciado o tratamento, ele
         te e intestinal), a pericardite, a geniturinária e a
                                                                não deve ser interrompido, salvo após uma rigo-
         cutânea são mais raras.
                                                                rosa revisão clínica e laboratorial que determine
             A tuberculose ganglionar periférica acomete
                                                                mudanças de diagnóstico.
         com freqüência as cadeias cervicais e é geralmen-
                                                                    Compete aos serviços de saúde prover os meios
         te unilateral, com adenomegalias de evolução len-
                                                                necessários para garantir que todo indivíduo com
         ta, superior a três semanas. Os gânglios têm con-
                                                                diagnóstico de tuberculose venha a ser, sem atra-
         sistência endurecida e podem fistulizar (escrófula
                                                                so, adequadamente tratado.
         ou escrofuloderma). É comum a suspeita de tu-
         berculose em casos de adenomegalia que não res-
         ponderam ao uso de antibióticos.                       3.2. Regimes de tratamento
             A meningoencefalite tuberculosa costuma cur-
         sar com fase prodrômica de uma a oito semanas,             O tratamento será desenvolvido sob regime
         quase sempre com febre, irritabilidade, paralisia      ambulatorial, supervisionado, com pelo menos três
         de pares cranianos e pode evoluir com sinais clí-      observações semanais da tomada dos medicamen-
         nicos de hipertensão intracraniana, como vômi-         tos nos primeiros dois meses e uma observação
         tos, letargia e rigidez de nuca. O líquor é claro,     por semana até o seu final.
         com glicose baixa e predomínio de mononuclea-              A supervisão poderá ser realizada de forma di-
         res. O teste tuberculínico pode ser não reator, pois   reta na unidade, no local de trabalho e na resi-
         a forma é anérgica.                                    dência do paciente por meio de visitador sanitário
             A forma osteoarticular mais encontrada situa-      ou agente comunitário de saúde. A unidade de
         se na coluna vertebral, constituindo-se no Mal de      saúde pode identificar líderes comunitários ou res-
         Pott. Cursa com dor no segmento atingido e posi-       ponsáveis familiares que auxiliem na supervisão
         ção antálgica nas lesões cervicais e torácicas, pa-    do tratamento.
         raplegias e gibosidade.                                    Nas formas pulmonar negativa e extrapulmo-
                                                                nar (exceto a meningoencefálica), o regime pode-
            Tuberculose pulmonar + extrapulmonar                rá ser ou não supervisionado. Neste caso, devem
            A tuberculose pode comprometer, ao mesmo            ser adotadas medidas estimuladoras da adesão dos
         tempo, mais de um órgão no sistema em um mes-          pacientes ao tratamento e utilizados métodos de
         mo paciente.                                           verificação do uso correto das drogas.


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Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




                                                QUADRO
          Diagnóstico de tuberculose pulmonar em crianças e adolescentes negativos à baciloscopia

              Quadro clínico-radiológico                               Contato com             Teste tuberculíni-             Estado
                                                                          adulto                co* e vacinação             nutricional
                                                                        tuberculoso                   BCG

Febre ou sintomas como:          Adenomegalia hilar ou             Próximo, nos últi-          Vacinados há mais          Desnutrição
tosse, adinamia, expec-          padrão miliar                     mos 2 anos                  de 2 anos                  grave ou peso
toração, emagrecimento,          • Condensação ou infil-                                       • menor de 5mm             abaixo do per-
sudorese  2 semanas               trado (com ou sem                     Adicionar                    0 pts               centil 10 Sis-
                                   escavação) inalterado                  10 pts               • 5mm a 9mm                van**
        Adicionar                   2 semanas                                                     Adicionar
         15 pts                  • Condensação ou infil-                                              5 pts                  Adicionar
                                   trado (com ou sem                                           • 10mm a 14mm                   5 pts
                                   escavação)  2 sema-                                            Adicionar
                                   nas evoluindo com                                                 10 pts
                                   piora ou sem melhora                                        • 15mm ou mais
                                   com antibióticos para                                           Adicionar
                                   germes comuns                                                     15 pts

                                          Adicionar
                                           15 pts

Assintomático ou com             Condensação ou infiltra-                                      Vacinados há me-
sintomas  2 semanas             do de qualquer tipo  2                                       nos de 2 anos
                                 semanas                                                       • menor de 10mm
           0 pts                                                                                      0 pts
                                          Adicionar                                            • 10mm a 14mm
                                            5 pts                                                  Adicionar
                                                                                                      5 pts
                                                                                               • 15mm ou mais
                                                                                                   Adicionar
                                                                                                     15 pts

Infecção respiratória            Radiografia normal                Ocasional ou                Não vacinados              Peso igual ou
com melhora após uso de                                            negativo                    • menor de 5mm             acima do per-
antibióticos para ger-                     Subtrair                                                  0 pts                centil 10
mes comuns ou sem an-                       5 pts                           0 pts              • 5mm a 9mm
tibióticos                                                                                         Adicionar                    0 pts
                                                                                                     5 pts
         Subtrair                                                                              • 10mm ou mais
          10 pts                                                                                   Adicionar
                                                                                                    15 pts

Legenda: pts = pontos; Esta interpretação não se aplica a revacinados em BCG; ** SISVAN – Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (MS/
1997).




Interpretação:         Maior ou igual a 40 pontos                   30 a 35 pontos                 Igual ou inferior a 25 pontos
                       Diagnóstico muito provável                 Diagnóstico possível              Diagnóstico pouco provável


Fontes: Stegen G., Jones K., Kaplan P. (1969) Pediatr 42:260-3; Tijidai O et al (1986 Tubercle 67:269-81; Crofton J et al (1992), Londres.
Mcmillan p; 29., adaptado por Sant’Anna C.C.



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II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




            A hospitalização é admitida somente em casos                     Situação                    Esquema
         especiais e de acordo com as seguintes priorida-                                                indicado
         des:
                                                               Caso novo sem tratamento anterior       Esquema I
            • Meningoencefalite.                               (VT) ou caso novo c/ trat. anterior     (Básico)
            • Indicações cirúrgicas em decorrência da tu-      e cura há mais de 5 anos
               berculose.
                                                               Com tratamento anterior:                Esquema I R
            • Complicações graves da tuberculose.              Recidiva após cura com o Esquema I      (Reforçado)
            • Intolerância medicamentosa incontrolável em      Retorno após abandono do Esquema I
               ambulatório.
                                                               Tuberculose meningoencefálica           Esquema II
            • Intercorrências clínicas e/ou cirúrgicas gra-
               ves.                                            Falência dos Esquemas I ou I R          Esquema III
            • Estado geral que não permita tratamento em
               ambulatório.                                        Para efeito de indicação de esquemas terapêu-
            • Em casos sociais, como ausência de residên-      ticos, consideram-se sem tratamento anterior ou
               cia fixa ou grupos com maior possibilidade      virgem de tratamento (VT) os pacientes que nun-
               de abandono, especialmente se for um caso       ca se submeteram à quimioterapia antituberculo-
               de retratamento ou falência.                    sa, ou a fizeram por apenas 30 dias.
            O período de internação deve ser reduzido o            Define-se como tratamento anterior (retrata-
         mínimo possível, devendo limitar-se ao tempo          mento) a prescrição de um esquema de drogas
         suficiente apenas para atender às razões que de-      para o doente já tratado por mais de 30 dias e a
         terminaram sua indicação, independentemente do        menos que cinco anos, que venha a necessitar de
         resultado do exame bacteriológico, procurando-        nova terapia por recidiva após cura (RC) ou retor-
         se não estendê-lo além da primeira fase do trata-     no após abandono (RA).
         mento.                                                    Considera-se recidiva o doente de tuberculose
                                                               que já se tratou anteriormente e recebeu alta por
         3.3. Esquemas de tratamento                           cura, desde que o intervalo entre a data da cura e
                                                               a data do diagnóstico da recidiva não ultrapassem
             Em todos os esquemas, a medicação é de uso        cinco anos. Se esse intervalo exceder cinco anos,
         diário e deverá ser administrada de preferência em    o caso é considerado como caso novo e o trata-
         uma única tomada.                                     mento preconizado é o Esquema I.
             Esquemas de tratamento intermitente, com              O paciente que retorna ao sistema após abando-
         doses adequadas a este tipo de regime, sempre         no deve ter a atividade de sua doença confirmada
         supervisionados, poderão ser utilizados após a fase   por nova investigação diagnóstica por bacilosco-
         inicial diária, sob a responsabilidade das coorde-    pia e cultura, antes da reintrodução do retrata-
         nações estaduais.                                     mento.
             Atenção especial deve ser dada ao tratamento          Entende-se por falência a persistência da posi-
         dos grupos considerados de alto risco de toxici-      tividade do escarro ao final do tratamento. São
         dade, constituído por pessoas com mais de 60          também classificados como caso de falência os
         anos, em mau estado geral, alcoolistas, infectadas    doentes que, no início do tratamento, são forte-
         pelo HIV, em uso concomitante de drogas anti-         mente positivos (++ ou +++) e mantêm essa situa-
         convulsivas e pessoas que manifestem alterações       ção até o 4o mês, ou aqueles com positividade
         hepáticas. A rifampicina interfere na ação dos con-   inicial seguida de negativação e nova positividade
         traceptivos orais, devendo as mulheres em uso         por dois meses consecutivos, a partir do 4o mês
         desse medicamento receber orientação para utili-      de tratamento. O aparecimento de poucos bacilos
         zar outros métodos anticoncepcionais.                 no exame direto do escarro, na altura do quinto
             Em crianças menores de cinco anos, que apre-      ou sexto mês, isoladamente, não significa, neces-
         sentem dificuldade para ingerir os comprimidos,       sariamente, falência do esquema, em especial se
         recomenda-se o uso das drogas em forma de xa-         acompanhado de melhora clínico-radiológica.
         rope ou suspensão.                                    Neste caso, o paciente será seguido com exames
             Segundo a situação do caso, os esquemas a         bacteriológicos. O tratamento, se preciso, será pro-
         serem adotados são:                                   longado por mais três meses, período em que o

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Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




caso deve ser redefinido ou concluído. Em pa-                       multirresistente (TBMR) e encaminhados para uni-
cientes com escarro negativo e evolução clínico-                    dades de referência capacitadas para o acompanha-
radiológica insatisfatória, o prolongamento do tra-                 mento deste tipo de pacientes. Nessas unidades,
tamento por mais três meses pode ser uma opção                      serão indicados regimes especiais, com esquemas
para evitar mudanças precipitadas para esquemas                     mais adequados de drogas alternativas, segundo
mais prolongados e de menor eficácia. Sempre que                    orientação dos peritos em quimioterapia da Coor-
possível, deve-se consultar uma unidade de refe-                    denação Nacional de Pneumologia Sanitária e Cen-
rência antes de se decidir por este prolongamento.                  tro de Referência Professor Hélio Fraga. Para estes
    Recomenda-se a realização de cultura e de teste                 pacientes será obrigatório o teste de sensibilida-
de sensibilidade às drogas previamente ao início                    de. Recomenda-se para os casos mais graves ou
de quimioterapia nos casos com critérios de fa-                     de difícil adesão a internação em hospitais ou
lência.                                                             enfermarias especialmente preparadas para esta
    O Esquema III deve ser realizado preferencial-                  situação. As drogas deverão ser fornecidas pelo
mente em unidades mais complexas. Sempre que                        Ministério da Saúde, sob estrita vigilância, de acor-
possível, deve-se realizar o teste de sensibilidade                 do com a demanda informada pelas Direções Es-
às drogas no início do tratamento para definir cla-                 taduais do Programa, responsáveis pela organiza-
ramente a possibilidade de sucesso deste Esque-                     ção de assistência aos portadores de TBMR.
ma ou sua modificação.                                                  Os quadros seguintes mostram os esquemas
    Casos de falência do Esquema III devem ser                      propostos com suas indicações gerais e específi-
considerados como portadores de tuberculose                         cas, dosagens e observações.




                                     Esquema I (Básico) 2RH/4RH
         Indicado nos casos novos de todas as formas de tuberculose pulmonar e extrapulmonar

         Fases do                   Drogas                                       Peso do doente
       tratamento                                    Até 20kg          Mais de 20kg           Mais de 35kg            Mais de
                                                                        e até 35kg             e até 45kg              45kg
                                                     mg/kg/dia             mg/dia                 mg/dia               mg/dia
         1a fase                       R                 10                 0300                    0450                   0600
     (2 meses – RHZ)                   H                 10                 0200                    0300                   0400
                                       Z                 35                 1000                    1500                   2000
         2a fase                       R                 10                 0300                    0450                   0600
     (4 meses – RH)                    H                 10                 0200                    0300                   0400
     Siglas: Rifampicina = R – Isoniazida = H – Pirazinamida = Z – Etambutol = E – Estreptomicina = S – Etionamida = Et.

     Observações: a) As drogas deverão ser administradas preferencialmente em jejum, em uma única
                     tomada ou, em caso de intolerância digestiva, junto com uma refeição.
                        b) O tratamento das formas extrapulmonares (exceto a meningoencefálica) terá a
                           duração de seis meses. Em casos individualizados cuja evolução clínica inicial não
                           tenha sido satisfatória, com a colaboração de especialistas das áreas, o tempo de
                           tratamento poderá ser prolongado, na sua segunda fase, por mais três meses
                           (2RHZ/7RH). As condutas particulares a essa situação são apresentadas no quadro
                           referente ao Esquema II (página seguinte).
                        c) No tratamento da associação tuberculose e HIV, independentemente da fase de
                           evolução da infecção viral, o tratamento será de seis meses.



                                                                                                                                            5 $%
II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




                                Esquema I R (esquema básico reforçado em etambutol) 2RHZE/4RHE
                         Iniciado nos casos de recidiva após cura ou retorno após abandono do Esquema I

                       Fases do                 Drogas                                 Peso do doente
                     tratamento                                 Até 20kg      Mais de 20kg         Mais de 35kg      Mais de
                                                                               e até 35kg           e até 45kg        45kg
                                                                mg/kg/dia        mg/dia                mg/dia        mg/dia
                     1 fase
                         a
                                                  R                10                0300               0450          0600
                (2 meses – RHZE)                  H                10                0200               0300          0400
                                                  Z                35                1000               1500          2000
                                                  E                25                0600               0800          1200
                     2a fase                      R                10                0300               0450          0600
                 (4 meses – RHE)                  H                10                0200               0300          0400
                                                  E                25                0600               0800          1200
                Observações: a) Os casos de recidiva de esquemas alternativos por toxicidade ao Esquema I devem
                                ser avaliados para prescrição de Esquema Individualizado.
                                     b) O paciente que apresentar alteração da visão deverá ser encaminhado para uma
                                        unidade de referência, com o objetivo de avaliar o uso do etambutol.




                                                           Esquema II – 2RHZ/7RH
                                           Indicado para a forma meningoencefálica da tuberculose

             Fases do              Drogas          Doses para                         Peso do doente                     Dose
           tratamento                               todas as            Mais de 20kg        Mais de 35kg   Mais de      máxima
                                                     idades              até 35kg            até 45kg       45kg
                                                   mg/kg/dia
                                                                            mg/dia            mg/dia       mg/dia
              1a fase                  R              10 a 20               0.300              0.450       0.600         0.600
             (2 meses)                 H              10 a 20               0.200              0.300       0.400         0.400
                RHZ                    Z                35                  1.000              1.500       2.000         2.000
              2a fase                  R              10 a 20               0.300              0.450       0.600         0.600
             (7 meses)                 H              10 a 20               0.200              0.300       0.400         0.400
                RH
           Observações: a) Nos casos de concomitância entre tuberculose meningoencefálica e qualquer outra locali-
                           zação, usar o Esquema II.
                                b) Nos casos de tuberculose meningoencefálica em qualquer idade, recomenda-se o uso de
                                   corticosteróides (prednisona, dexametasona ou outros) por um período de um a quatro
                                   meses, no início do tratamento.
                                c) Na criança, a prednisona é administrada na dose de 1 a 2mg/kg de peso corporal, até a
                                   dose máxima de 30mg/dia. No caso de se utilizar outro corticosteróide, aplicar a tabela de
                                   equivalência entre eles.
                                d) A fisioterapia na tuberculose meningoencefálica deverá ser iniciada o mais cedo possível.



5 $
Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




                                  Esquema III – 3SZEEt/9EEt
          Indicado nos casos de falência de tratamento com Esquema I e Esquema IR

     Fases do            Drogas                              Peso do doente
   tratamento                          Até 20kg      Mais de 20kg       Mais de 35kg            Mais de
                                                      e até 35kg         e até 45kg              45kg
                                      mg/kg/dia          mg/dia             mg/dia              mg/dia
     1 fase
      a
                           S              20             0.500                1.000              1.000
(3 meses – SZEEt)          Z              35             1.000                1.500              2.000
                           E              25             0.600                0.800              1.200
                           Et             12             0.250                0.500              0.750
    2a fase                E              25             0.600                0.800              1.200
(9 meses – EEt)            Et             12             0.250                0.500              0.750
Observações: a) A estreptomicina deve ser usada por via intramuscular (IM). Em situações espe-
                ciais, pode ser aplicada por via endovenosa (EV), diluída a 50 ou 100ml de soro
                fisiológico correndo por um mínimo de meia hora.
                b) Em casos especiais com dificuldades de aceitação de droga injetável ou para
                   facilitar seu uso supervisionado na Unidade de Saúde, o regime de uso da estrep-
                   tomicina pode ser alterado para aplicações de 2a a 6a-feira por dois meses e duas
                   vezes por semana por mais quatro meses.
                c) Em pessoas maiores de 60 anos, a estreptomicina deve ser administrada na dose de
                   500mg/dia.




3.4. Tratamento da tuberculose                               Um esquema alternativo, com regime de cinco
multirresistente – TBMR                                  drogas e 18 meses de duração, é objeto de uma
                                                         experiência multicêntrica que se desenvolve, há
   Os pacientes que não se curam após tratamen-          quatro anos, sob a coordenação do Centro de Re-
to com os esquemas padronizados pelo MS, por-            ferência Prof. Hélio Fraga, visando a estabelecer
tadores, em geral, de bacilos resistentes a mais de      experiência brasileira neste campo, que possa sub-
duas drogas, incluindo R e H, constituem um gru-         sidiar a eventual adoção de um esquema para
po de doentes classificados no Consenso Brasilei-        TBMR. Até aqui, foram tratados cerca de 350 pa-
ro de Tuberculose, em 1997, como portadores de           cientes, com uma taxa média de 60% de resulta-
tuberculose multirresistente (TBMR). A este grupo        dos favoráveis.
são agregados os pacientes que apresentam resis-             O tratamento da TBMR será supervisionado,
tência primária a R, H e a outras drogas utilizadas,     preferencialmente, com o paciente hospitalizado
geralmente a S e/ou E.                                   na fase inicial, e iniciado após resultado do teste
   Estes pacientes e seus familiares serão atendi-       de sensibilidade, devendo-se estimular interven-
dos por equipe multiprofissional especializada, em       ções como visita domiciliar e oferecer incentivos
Centros de Referência que cumpram as normas de           para o fornecimento de cesta básica e transporte
biossegurança e sejam credenciados, para este fim,       urbano.
pelas coordenadorias municipais e estaduais de               Como critério de alta se exige que, após duas
tuberculose. Lá receberão, gratuitamente, o esque-       culturas negativas sucessivas para micobactérias,
ma medicamentoso alternativo disponibilizado pelo        o paciente permaneça fazendo uso diário das dro-
Ministério da Saúde, composto por uma combina-           gas pelo menos por 12 meses, cumprindo um tempo
ção das seguintes drogas, de acordo com o resul-         total de tratamento igual ou superior a 18 meses.
tado do teste de sensibilidade: amicacina, ofloxa-           Para acompanhar a tendência e controlar o
cina, terizidona, etambutol e clofazimina.               problema da TBMR, estabeleceu-se um sistema de


                                                                                                                             5 $'
II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




         vigilância epidemiológica, controlado pelo Centro       vidual de Notificação de Caso de TBMR, oriunda
         de Referência Prof. Hélio Fraga. O controle impli-      das secretarias estaduais de saúde, e a confirmação
         ca armazenamento dos medicamentos em uso e              dos dados pelo critério de “Caso de TBMR” pelo
         sua liberação contra o recebimento da Ficha Indi-       teste de sensibilidade. (Ver Fluxograma abaixo).

                                               Vigilância Epidemiológica da TBMR

                                                             Nível local (PS/CS/H)
                        Suspeita de TBMR
                                                                Encaminhar para confirmação
                                                                bacteriológica/acompanhamento


                     Centro de Referência
                     Municipal, Estadual ou                              Lacen
                            Federal                                    Cultura / TS




                                                      SES/SMS/CR


                                                                        Notificação              VE
              Este sistema é independente
              da notificação Sinan que
              encerra o caso como TBMR                                                                      CRPHF(*)

                                                                        (*) • envia o tratamento trimestral mediante controle
                                                                           • armazena cepas dos Lacens e outros laboratórios



         3.5. Tratamento da tuberculose associada                comuns. Estudos recentes mostram que o risco de
         ao HIV                                                  adoecimento por tuberculose em indivíduos HIV+
                                                                 reduziu-se em aproximadamente 10 vezes; e que
             A conduta dos casos de tuberculose associada        a taxa de ocorrência de casos de tuberculose em
         com infecção pelo HIV, em indivíduos adultos e          pacientes atendidos pelos serviços especializados
         adolescentes, vem sendo estabelecida pela Área          em DST/aids no Brasil apresentou uma redução de
         Técnica de Pneumologia Sanitária e Coordenação          até 75%, quando comparada aos índices encon-
         Nacional de DST e Aids. A seguir reproduz-se a          trados antes do advento da terapia anti-retroviral
         última atualização das recomendações elaboradas         combinada.
         com a participação do Comitê Assessor para Co-              A rifampicina (RMP) é considerada uma das
         Infecção HIV-Tuberculose.                               principais drogas no tratamento da tuberculose.
             Com o uso disseminado da terapia anti-retro-        Esquemas que incluem a sua utilização apresen-
         viral combinada potente, após o advento dos Inibi-      tam taxa de sucesso terapêutico da ordem de 95%,
         dores da Protease (IP) e Inibidores da Transcriptase    quando adequadamente utilizados. Contudo, a
         Reversa Não-Nucleosídeos (ITRNN), a morbimor-           utilização concomitante da RMP com a maioria
         talidade relacionada ao HIV sofreu profundas trans-     dos IP e/ou ITRNN promove importante interação
         formações, com mudança radical na ocorrência e          farmacológica no sistema microssomal hepático e
         no prognóstico das complicações oportunistas mais       da parede intestinal, podendo provocar redução


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Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




significativa dos níveis séricos desses anti-retrovi-       Apesar de ser considerada uma doença opor-
rais e, conseqüentemente, aumentar o risco de           tunista, a tuberculose de ocorrência típica, com
desenvolvimento de resistência do HIV ao esque-         padrão clínico-radiológico de acometimento api-
ma anti-retroviral em uso. A utilização de esque-       cal, não caracteriza necessariamente comprome-
mas alternativos para o tratamento da tuberculose       timento significativo da imunidade ou falha da
sem RMP, apesar de eficaz do ponto de vista bac-        terapia anti-retroviral porventura instituída. O adoe-
teriológico, tem-se mostrado com efetividade te-        cimento por tuberculose, freqüentemente, promove
rapêutica global reduzida pela maior complexida-        o fenômeno de transativação heteróloga do HIV,
de do esquema, maior dificuldade de adesão ao           com elevação da carga viral em pacientes HIV+ e
uso de medicação injetável (estreptomicina) e tem-      diminuição da contagem de células T-CD4+, am-
po mais prolongado de tratamento. Nessas situa-         bas transitórias e dependentes da atividade da
ções, pode haver prejuízo para o paciente co-in-        doença. Isso dificulta a interpretação desses parâ-
fectado, tanto pela não utilização de IP e/ou ITRNN     metros para início e/ou seleção de esquema anti-
no esquema anti-retroviral, como pela não inclu-        retroviral, na vigência de tuberculose ativa sem
são da RMP no esquema antituberculose.                  tratamento específico. Estudos recentes sugerem,
    Entretanto, estudos farmacocinéticos sugerem        ainda, que o tratamento isolado da tuberculose
que a RMP pode ser utilizada concomitantemente          em pacientes co-infectados pelo HIV e que não
com alguns anti-retrovirais em pacientes HIV+ com       estão em uso de ARV reduz, por si só, a carga viral
tuberculose, desde que estes pacientes sejam tra-       plasmática. Assim, considerando-se que a terapia
tados com esquemas que contenham efavirenz              anti-retroviral não é uma emergência médica, su-
(EFZ) ou a associação saquinavir + ritonavir (SQV/      gere-se aguardar a estabilização do quadro clíni-
RTV), sem necessidade de ajuste nas dosagens            co. Idealmente, procede-se a uma avaliação da
habituais. Até o presente momento, embora alguns        contagem das células T-CD4+ e quantificação da
estudos de menor porte recomendem aumento da            carga viral após 30 e 60 dias do início da terapia
dose de EFZ para 800mg/dia, a literatura carece         antituberculosa, utilizando-se tais parâmetros para
de análises que avaliem a toxicidade ou a eficácia      indicar a terapia anti-retroviral.
clínica do EFZ nesta dosagem, em associação com             Para a escolha do esquema anti-retroviral, deve-
outras drogas anti-retrovirais. Portanto, não está      se também avaliar o risco de intolerância, toxici-
autorizado o seu uso de rotina nessa posologia.         dade e capacidade de adesão do paciente ao tra-
Alguns estudos recentes sugerem, em algumas si-         tamento, considerando a possibilidade de utilização
tuações, que o uso do ritonavir em sua posologia        de esquemas menos complexos; ou mesmo a pos-
convencional (1.200mg/dia) e como único IP do           tergação do seu início, naqueles pacientes com
esquema anti-retroviral pode ser considerado como       quadro de imunodeficiência menos grave. Entre-
opção de utilização concomitante com a RMP,             tanto, em pacientes com sinais (principalmente
embora investigações farmacocinéticas conclusi-         clínicos) de imunodeficiência mais grave, deve-se
vas e avaliação do risco de hepatotoxicidade com        considerar o uso mais precoce da terapia anti-re-
essa associação ainda não estejam disponíveis.          troviral, devido ao risco elevado de morte. Pacien-
Ademais, recomenda-se que o uso dessas associa-         tes com contagem de células T-CD4+  350/mm3
ções em pacientes portadores da co-infecção HIV/        não devem iniciar terapia anti-retroviral na vigên-
tuberculose seja feito de forma criteriosa, com a       cia de doença tuberculosa. Entretanto, sugere-se,
orientação e/ou supervisão de profissional médi-        para melhor definição da conduta, uma reavalia-
co com experiência no tratamento de ambas as            ção clínico-imunológica após 30-60 dias do iní-
doenças e com cuidadoso acompanhamento clí-             cio do tratamento da tuberculose.
nico-laboratorial. Deve-se ter especial atenção para        Pacientes em uso de esquema anti-retroviral
a possibilidade de falha no tratamento da tuber-        incompatível com RMP poderão ter esse esquema
culose, falha no tratamento anti-retroviral, reações    modificado para possibilitar o tratamento da tu-
paradoxais da tuberculose e efeitos colaterais e/       berculose e da infecção pelo HIV com esquemas
ou tóxicos, específicos ou sinérgicos, causados         antituberculose e anti-retroviral potentes, não ca-
pela associação das drogas anti-retrovirais e anti-     racterizando esta mudança uma falha terapêutica
tuberculose utilizadas nessa situação.                  ao esquema ARV anteriormente em uso, e sim uma


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II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




         adequação deste último tratamento antitubercu-         pacientes HIV+. Sugere-se iniciar a terapia antitu-
         loso. Essa substituição do esquema, após o térmi-      berculose, aguardar a estabilização clínica do qua-
         no do tratamento para tuberculose, não invalida a      dro e depois utilizar esses exames na avaliação da
         reintrodução ou uso futuro do esquema anti-re-         indicação de terapia anti-retroviral. Para a escolha
         troviral previamente utilizado. Pacientes portado-     da opção de tratamento deve-se também avaliar o
         res de tuberculose com indicação de uso do es-         risco de toxicidade e a capacidade de adesão do
         quema I (R+H+Z por seis meses), mas que não            paciente para ambos os tratamentos, consideran-
         possam utilizar algum dos esquemas anti-retrovi-       do a possibilidade de utilizar esquemas anti-retro-
         rais compatíveis com RMP, deverão ser tratados         virais menos complexos ou mesmo a postergação
         para tuberculose durante 12 meses com esquema          do início do tratamento anti-retroviral naqueles
         alternativo de tratamento da tuberculose para pa-      pacientes com quadros de imunodeficiência me-
         cientes com intolerância ou contra-indicação para      nos graves.
         uso da RMP, recomendado pela Coordenação Na-               3. Nessa situação, alguns autores consideram
         cional de Pneumologia Sanitária/Ministério da Saú-     a possibilidade de se iniciar tratamento anti-retro-
         de, e iniciar ou substituir o tratamento anti-retro-   viral, pois há risco de progressão mais rápida da
         viral pelo esquema considerado mais adequado do        imunodeficiência causada pelo HIV, devendo ser
         ponto de vista imunológico e virológico.               avaliados os parâmetros clínicos e laboratoriais
             O uso concomitante de abacavir (ABC) e ou-         específicos (contagem de células T-CD4+ e carga
         tros Inibidores da Transcriptase Reversa de Nucleo-    viral) com maior freqüência. Quanto mais próxima
         sídeos (ITRN) com RMP não está contra-indicado         de 200 células/mm3 for a contagem de células T-
         do ponto de vista farmacológico, pois não existe       CD4+ e/ou maior a carga viral (particularmente se
         nenhuma interação entre as drogas desse grupo           100.000 cópias/ml), mais forte será a indicação
         farmacológico com a RMP, não necessitando, por-        para início da terapia anti-retroviral. É importante
         tanto, de nenhum ajuste posológico.                    considerar a motivação do paciente e a probabili-
             É importante considerar que a adesão adequa-       dade de adesão, antes de se iniciar o tratamento.
         da a ambos os esquemas, antituberculose e anti-            4. Pacientes com tuberculose e indicação de
         retroviral, tomados de forma concomitante, é um        uso do esquema I (E-1), mas que não possam uti-
         grande desafio para o paciente, devido à elevada       lizar algum dos esquemas anti-retrovirais compa-
         quantidade de comprimidos/cápsulas a serem in-         tíveis com rifampicina, deverão ser tratados para
         geridas ao dia e à ocorrência de efeitos colaterais,   tuberculose durante 12 meses com esquema para
         particularmente nas primeiras semanas de trata-        pacientes com intolerância ou contra-indicação
         mento. Portanto, deve-se considerar, sempre que        para uso de rifampicina recomendado pelo Minis-
         possível, o adiamento do início do tratamento anti-    tério da Saúde (dois meses iniciais com H+Z+S+E,
         retroviral em pacientes com co-infecção HIV/tu-        seguidos de 10 meses com H+E [2HEZS/10HE]).
         berculose, particularmente naqueles que apresen-           5. A experiência clínica com o uso do abacavir
         tam quadros de imunodeficiência menos graves           em indivíduos HIV+ com tuberculose é limitada.
         do ponto de vista clínico-laboratorial. A indicação    Para pacientes sintomáticos ou assintomáticos com
         de início de terapia anti-retroviral em pacientes      imunodeficiência mais grave (contagem de célu-
         com co-infecção HIV/tuberculose deve seguir os         las T-CD4+  200 células/mm3) e/ou carga viral
         mesmos parâmetros clínicos e imunovirológicos          elevada ( 100.000 cópias/ml), alguns especialis-
         estabelecidos para pacientes HIV+ sem tuberculo-       tas recomendam utilizar preferencialmente esque-
         se em atividade, recentemente atualizados no do-       mas anti-retrovirais mais potentes, contendo ITR-
         cumento “Recomendações para Terapia Anti-retro-        NN ou IP. O uso concomitante de abacavir e outros
         viral em Adultos e Adolescentes – 2001”, do            Inibidores da Transcriptase Reversa de Nucleosídeos
         Ministério da Saúde (ver quadro I).                    (ITRN) com RMP não estão contra-indicados, pois
             1. Dois meses iniciais com R+H+Z, seguidos de      não existe nenhuma interação farmacológica com
         quatro meses com R+H (2RHZ/4RH).                       os medicamentos antituberculose descritos até o
             2. O adoecimento por tuberculose, freqüen-         momento.
         temente, promove a elevação da carga viral e a             6. Nessas situações, não há dados que permi-
         diminuição da contagem de células T-CD4+ em            tam escolher entre esquemas com ITRNN ou IP.


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                                                  QUADRO I
                        Recomendações terapêuticas para pacientes HIV+ com tuberculose

       Característica da situação                                                  Recomendação
Paciente HIV+, virgem de tratamento                Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (E-
para tuberculose, com contagem de cé-              1) (1) recomendado pelo Ministério da Saúde, aguardar estabilidade
lulas T-CD4+ e carga viral não dispo-              clínica e depois realizar contagem de células T-CD4 e de carga viral
níveis.                                            para avaliação da necessidade de terapia anti-retroviral(2).
Paciente HIV+, virgem de tratamento                Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1)
para tuberculose, com contagem de cé-              recomendado pelo Ministério da Saúde, e não iniciar terapia anti-
lulas T-CD4+ acima de 350 células/mm3              retroviral(3). Entretanto, sugere-se uma reavaliação clínico-imunoló-
(após estabilização do quadro clínico              gica após 30-60 dias do início do tratamento da tuberculose, para
de tuberculose(2)).                                melhor definição da conduta.
Paciente HIV+, virgem de tratamento                Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1)
para tuberculose, com contagem de cé-              recomendado pelo Ministério da Saúde, e, caso indicado, iniciar ou
lulas T-CD4+ entre 200 e 350 células/              substituir o tratamento anti-retroviral por um dos seguintes esquemas
mm3 e carga viral para HIV  100.000               compatíveis com uso concomitante da RMP (4):
cópias/ml (após estabilização do qua-              • ZDV + 3TC + ABC(5)
dro clínico de tuberculose(2)).                    • 2 ITRN + EFZ(6,8)
                                                   • 2 ITRN + SQV/RTV(6)
Paciente HIV+, virgem de tratamento                Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1)
para tuberculose, com contagem de cé-              recomendado pelo Ministério da Saúde, e, caso indicado, iniciar ou
lulas T-CD4+ entre 200 e 350 células/              substituir o tratamento anti-retroviral por um dos seguintes esquemas
mm3 e carga viral para HIV  100.000               compatíveis com uso concomitante de RMP(4):
cópias/ml (após estabilização do qua-              • ZVD + 3TC + ABC(5)
dro clínico de tuberculose(2)).                    • 2 ITRN + EFZ(6,8)
                                                   • 2 ITRN + SQV/RTV(6)
Paciente HIV+, virgem de tratamento                Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1)
para tuberculose, com contagem de cé-              recomendado pelo Ministério da Saúde, e, caso indicado, iniciar ou
lulas T-CD4+ abaixo de 200 células/                substituir o tratamento anti-retroviral por um dos seguintes esquemas
mm3 (após estabilização do quadro clí-             compatíveis com uso concomitante de RMP(4):
nico de tuberculose(2)).                           • 2 ITRN + EFZ(6,8)
                                                   • 2 ITRN + SQV/RTV(6)
Paciente HIV+ com meningoencefalite                Tratar a tuberculose durante nove meses, utilizando o Esquema II (7)
tuberculosa.                                       recomendado pelo Ministério da Saúde, e iniciar ou substituir a tera-
                                                   pia anti-retroviral por esquemas compatíveis com uso concomitante
                                                   de RMP, a serem escolhidos conforme parâmetros de contagem de
                                                   células T-CD4+ e carga viral para pacientes HIV+ virgens de trata-
                                                   mento para tuberculose(2,4,5,6,8).
Paciente HIV+ em situação de retrata-              Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I Re-
mento para tuberculose.                            forçado – IR(9) recomendado pelo Ministério da Saúde, e iniciar ou
                                                   substituir a terapia anti-retroviral por esquemas compatíveis com uso
                                                   concomitante de RMP, a serem escolhidos conforme parâmetros de
                                                   contagem de células T-CD4+ e carga viral para pacientes HIV+ vir-
                                                   gens de tratamento para tuberculose (2,4,5,6,7,8,10).
Paciente HIV+ em situação de falha a               Tratar a tuberculose durante 12 meses, utilizando o Esquema III(11)
tratamento anterior para tuberculose.              recomendado pelo Ministério da Saúde, e iniciar ou substituir o tra-
                                                   tamento anti-retroviral pelo esquema considerado mais adequado do
                                                   ponto de vista imunológico e virológico(2,4,5,6,7,8,10).
Paciente HIV+ com tuberculose multi-               Encaminhar aos serviços de referência em tuberculose, para avaliação
droga-resistente.                                  de especialista e uso de esquemas especiais.
Siglas: ZDV = Zidovudina; 3TC = Lamivudina; ABC = Abacavir; EFZ = Efavirenz; RTV = Ritonavir; SQV = Saquinavir; ITRN = Inibidor da
Transcriptase Reversa Análogo de Nucleosídeo; ITRNN = Inibidor da Transcriptase Reversa Não-Análogo de Nucleosídeo; IP = Inibidores da
Protease.



                                                                                                                                            5 %!
II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




         Entretanto, o uso de ritonavir associado a drogas         b) Realização mensal da baciloscopia de con-
         antituberculose utilizadas no esquema I (E-1) apre-   trole, sendo indispensáveis as dos 2o, 4o e 6o me-
         senta risco aumentado de hepatotoxicidade. Su-        ses, nos Esquemas I e Esquema I R e nos 3 o, 6 o, 9o
         gere-se monitorar cuidadosamente as transamina-       e 12o meses, no caso dos Esquemas III e especiais.
         ses e outras provas de função hepática do paciente        Quando o paciente referir que não tem expec-
         durante o tratamento; e não iniciar o uso de es-      toração, o auxiliar deve orientá-lo sobre como obter
         quema com esse anti-retroviral associado ao es-       a amostra de escarro e fazer com que ele tente,
         quema I (E-1), caso os níveis basais dessas enzi-     repetidamente, em sua presença, fornecer mate-
         mas hepáticas estejam três vezes acima dos valores    rial para exame. Nessa situação, o escarro pode
         de referência.                                        ser induzido pela inalação de solução salina a 9%
             7. Dois meses iniciais com R+H+Z, seguidos de     por 15 minutos, seguido por tapotagem.
         sete meses com R+H (2RHZ/7RH). Observar que               c) Acompanhamento clínico visando à identi-
         doses mais elevadas de rifampicina e isoniazida       ficação de queixas e de sintomas que possam ava-
         são recomendadas nessa situação.                      liar a evolução da doença com a introdução dos
             8. O efavirenz é contra-indicado durante a ges-   medicamentos e a detecção de manifestações ad-
         tação. Não há dados conclusivos sobre a seguran-      versas com seu uso.
         ça do abacavir na gravidez.                               Nas unidades com recursos de exame radioló-
             9. Dois meses iniciais com R+H+Z+E, seguidos      gico, este pode ser utilizado periodicamente para
         de quatro meses com R+H+E (2RHZE/4RHE).               acompanhar a regressão ou o agravamento das
                                                               lesões na forma pulmonar da doença, em especial
             10. Recomenda-se monitorar rigorosamente a
                                                               na ausência de expectoração.
         adesão (tratamento supervisionado) e coletar ma-
         terial para teste de sensibilidade aos medicamen-
                                                               3.7. Reações adversas ao uso de drogas
         tos antituberculose.
                                                               antituberculose
             11. Três meses iniciais com S+Et+E+Z, segui-
         dos de nove meses com Et+E (3SEtEZ/9EtE).                 A maioria dos pacientes submetidos ao trata-
                                                               mento de tuberculose consegue completar o tem-
         3.6. Controle do tratamento                           po recomendado sem sentir qualquer efeito cola-
                                                               teral relevante. Os fatores relacionados às reações
            O controle do tratamento consiste na aplica-       são multifatoriais; todavia, os maiores determinan-
         ção de meios que permitam o acompanhamento            tes destas reações se referem à dose, aos horários
         da evolução da doença e utilização correta dos        de administração da medicação, à idade, ao esta-
         medicamentos.                                         do nutricional, ao alcoolismo, às condições da
            Condições básicas para o êxito do tratamen-        função hepática e renal e à co-infecção pelo HIV.
            to                                                     Intolerância gástrica, manifestações cutâneas
            a) Adesão do paciente, principalmente por seu      variadas, icterícia e dores articulares são os efeitos
               conhecimento sobre                              mais descritos durante o tratamento com o Esque-
                                                               ma I. Os pacientes devem ser advertidos sobre es-
            • A doença.
                                                               tas possibilidades e, caso se manifestem, orienta-
            • A duração do tratamento prescrito.               dos a procurar imediatamente o médico. O paciente
            • A importância da regularidade no uso das         que apresente algum destes para-efeitos deve ter
               drogas.                                         consulta de controle aprazada para, no máximo,
            • As graves conseqüências advindas da inter-       duas semanas e a conduta está sumariada no quadro
               rupção ou do abandono do tratamento.            a seguir, conforme a classificação: efeitos menores
            Essa é uma atividade de educação para o tra-       e efeitos maiores. Os efeitos menores ocorrem en-
         tamento que deve ser desenvolvida durante as          tre 5% e 20% dos casos e são assim classificados
         consultas e entrevistas, tanto iniciais como subse-   os que não implicam modificação imediata do es-
         qüentes. Na oportunidade, a equipe de saúde, além     quema padronizado; os efeitos maiores que impli-
         de conscientizar o paciente da importância de sua     cam interrupção ou alteração do tratamento e são
         colaboração no tratamento, estabelece com ele         menos freqüentes em torno de 2%, podendo che-
         uma relação de cooperação mútua.                      gar a 8% em serviços especializados.


5 %
Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004




Efeitos menores

                     Efeito                       Droga                        Conduta
  Irritação gástrica (náusea, vômito)          Rifampicina      Reformular os horários de
  Epigastralgia e dor abdominal                Isoniazida       administração da medicação
                                               Pirazinamida     Avaliar a função hepática
  Artralgia ou Artrite                         Pirazinamida     Medicar com ácido acetilsalicílico
                                               Isoniazida
  Neuropatia periférica                        Isoniazida       Medicar com piridoxina (vit B6)
  (queimação das extremidades)                 Etambutol
  Cefaléia e mudança de comportamento          Isoniazida       Orientar
  (euforia, insônia, ansiedade e sonolência)
  Suor e urina de cor laranja                  Rifampicina      Orientar
  Prurido cutâneo                              Isoniazida       Medicar com anti-histamínico
                                               Rifampicina
  Hiperuricemia (com ou sem sintomas)          Pirazinamida     Orientar (dieta hipopurínica)
                                               Etambutol
  Febre                                        Rifampicina      Orientar
                                               Isoniazida




Efeitos maiores

                     Efeito                       Droga                        Conduta
  Exantemas                                    Estreptomicina   Suspender o tratamento
                                               Rifampicina      Reintroduzir o tratamento droga
                                                                a droga após resolução
                                                                Substituir o esquema nos casos
                                                                graves ou reincidentes
  Hipoacusia                                   Estreptomicina   Suspender a droga e substituí-la
                                                                pela melhor opção
  Vertigem e nistagmo                          Estreptomicina   Suspender a droga e substituí-la
                                                                pela melhor opção
  Psicose, crise convulsiva, encefalopatia     Isoniazida       Substituir por estreptomicina +
  tóxica e coma                                                 etambutol
  Neurite óptica                               Etambutol        Substituir
                                               Isoniazida
  Hepatotoxicidade (vômitos, alteração das     Todas as         Suspender o tratamento
  provas de função hepática, hepatite)         drogas           temporariamente até resolução
  Trombocitopenia, leucopenia, eosinofilia,    Rifampicina      Dependendo da gravidade,
  anemia hemolítica, agranulocitose,           Isoniazida       suspender o tratamento e
  vasculite                                                     reavaliar o esquema de
                                                                tratamento
  Nefrite intersticial                         Rifampicina      Suspender o tratamento
                                               principalmente
                                               intermitente
  Rabdomiólise com mioglobulinúria e           Pirazinamida     Suspender o tratamento
  insuficiência renal



                                                                                                                       5 %#
II Consenso Brasileiro de Tuberculose
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004




            Irritação gástrica                                  seu valor normal, com início de sintomas ou logo
            Todas as drogas usadas no tratamento de tu-         que a icterícia se manifeste, encaminhando o doen-
         berculose podem causar irritação gástrica. A iso-      te a um serviço de maior poder resolutivo para
         niazida combinada com a rifampicina e com a pi-        acompanhamento clínico e laboratorial, além da
         razinamida são as drogas mais freqüentemente           adequação do tratamento, caso seja necessário.
         implicadas com irritação gástrica. São referidas       Se, após a interrupção do tratamento, houver re-
         náuseas, pirose, epigastralgia que, na maioria das     dução dos níveis séricos das enzimas hepáticas e
         vezes, ocorrem na primeira fase do tratamento.         resolução dos sintomas, indica-se a reintrodução
                                                                do Esquema I, da seguinte maneira:
             Conduta
                                                                    • Icterícia sem aumento sérico das enzimas
             a) Suspender as drogas por 48 a 72 horas, re-      hepáticas – iniciar o tratamento com rifampicina,
         comendando o uso de sintomáticos. Controlados          acrescentar isoniazida e, por último, pirazinamida,
         os sintomas, reiniciar o tratamento, indicando a       com intervalo de três dias entre elas.
         administração da pirazinamida após o almoço e              • Icterícia com aumento sérico das enzimas
         da rifampicina combinada com a isoniazida após         hepáticas – iniciar o tratamento com isoniazida,
         o desjejum.                                            acrescentar rifampicina e, por último, pirazinami-
             b) Havendo novas queixas, suspender todas as       da, com intervalo de três dias entre elas, ou subs-
         drogas por mais 24 horas e reiniciar o tratamento:     tituir o Esquema I por um esquema alternativo:
         uma droga a cada 48 horas, na seguinte ordem:          estreptomicina/etambutol/isoniazida (SEH) ou es-
         pirazinamida, isoniazida e finalmente rifampicina.     treptomicina/etambutol/ofloxacina (SEO), ambos
             c) Quando não houver resolução das queixas         por um período mínimo de 12 meses de trata-
         e nesta fase já tiver sido identificada a droga res-   mento.
         ponsável pelos sintomas, proceder à modificação
         do esquema, conforme o quadro seguinte.                    Hiperuricemia e artralgia
                                                                    A hiperuricemia é causa de graves problemas
         3.8. Substituição de drogas diante de                  renais: nefrolitíase, nefropatia por uratos ou por
         efeitos adversos                                       ácido úrico que podem evoluir com insuficiência
                                                                renal.
            Substituição da pirazinamida – 2 RHE/4 RH
            Substituição da isoniazida – 2RESZ/4 RE                 A hiperuricemia assintomática é um efeito ad-
            Substituição da rifampicina – 2 SEHZ/10 HE          verso, freqüente durante o uso da pirazinamida e
            Atenção: ao estimar o tempo total de trata-         em menor freqüência com o uso do etambutol,
         mento antituberculose, considerar todo o tempo         sendo, nestes casos, a gota uma manifestação rara.
         de tratamento, inclusive aquele que antecedeu às           As artralgias, quando não relacionadas à hiper-
         queixas de intolerância.                               uricemia, são freqüentemente associadas ao uso
                                                                da pirazinamida.
             Hepatotoxicidade
                                                                    A artrite é descrita com uso de isoniazida; no
             As drogas usadas nos esquemas de tratamento        entanto, não se caracteriza como efeito adverso
         da tuberculose apresentam interações entre si e        comum.
         com outras drogas que aumentam o risco de he-
         patotoxicidade. Em pequeno percentual dos pa-              Conduta
         cientes, observa-se, nos dois primeiros meses de           Na presença de hiperuricemia, deve-se fazer
         tratamento, elevação assintomática dos níveis sé-      orientação dietética (dieta hipopurínica).
         ricos das enzimas hepáticas, seguida de normali-           A artralgia e a artrite costumam responder ao
         zação espontânea, sem qualquer manifestação clí-       uso de antiinflamatórios não hormonais.
         nica e sem necessidade de interrupção ou alteração
         do esquema terapêutico. É importante considerar           Manifestações neurológicas e psiquiátricas
         o peso do paciente quando se indicar a dose do             A neuropatia periférica é associada ao uso da
         medicamento.                                           isoniazida em cerca de 17% dos pacientes que
             O tratamento só deverá ser interrompido quan-      utilizam doses maiores de 300mg/dia e em menor
         do os valores das enzimas atingirem três vezes o       freqüência ao uso do etambutol.


5 %$
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Tuberculose guia de vigilancia epidemiologica]

  • 1. Tuberculose Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 Guia de Vigilância Epidemiológica Apresentação A tuberculose continua a merecer especial atenção dos profissionais de saúde e da sociedade como um todo. Apesar de já existirem recursos tecnológicos capazes de promover seu controle, ainda não há perspec- tiva de obter-se, em futuro próximo, sua erradicação, a não ser que novas vacinas ou tratamentos sejam descobertos. Além disso, a associa- ção da tuberculose com a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (aids) representa um novo desafio em escala mundial. Esse Guia de Vigilância da Tuberculose, que agora publicamos, é uma contribuição para a melhoria das atividades de prevenção, diag- nóstico e tratamento dos casos de tuberculose e para a organização dos serviços de saúde do SUS. Os profissionais de saúde podem contar com as orientações aqui reunidas para as ações de vigilância epidemiológica, nos aspectos de coleta, processamento, análise e interpretação dos dados; na adoção de medidas de controle apropriadas; e na avaliação da eficácia e efetivida- de. Desta forma, seu uso por médicos, enfermeiros, auxiliares, laborato- ristas, sanitaristas e todos os profissionais envolvidos na rede de assis- tência e controle da tuberculose, nas três esferas de governo que ge- renciam o Sistema Único de Saúde (SUS), contribuirá significativamente para implementar o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica com o objetivo de ampliar o controle da tuberculose do país, doença de grande magnitude, transcendência e vulnerabilidade, contribuindo com a melhoria da saúde de nossa população. JARBAS BARBOSA DA SILVA JR. Diretor do Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi)/FUNASA 5 #%
  • 2. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 I. Introdução O Plano Nacional de Controle da Tuberculose, correm para o agravamento do quadro – a epide- lançado pelo Ministro da Saúde, em 1999, define mia de aids e a multirresistência às drogas. a tuberculose como prioridade entre as políticas Este cenário faz com que a expressão epide- governamentais de saúde, estabelece diretrizes para miológica da tuberculose no Brasil, neste final de as ações e fixa metas para o alcance de seus obje- século – com estimativas de prevalência de 50 tivos. milhões de infectados e, anualmente, com o sur- Recentemente, em 2001, foram revistas as me- gimento de 130.000 novos casos e com o registro tas e lançado o “Plano de Mobilização para Con- de 6.000 óbitos – configure, em termos relativos, trole da Tuberculose e eliminação da Hanseníase”. uma situação mais grave do que a apresentada por outros países latino-americanos como Argen- Este Plano dá continuidade à política de go- tina, Chile, Colômbia, Venezuela, Cuba e México. verno que, a partir dos anos trinta, confiou o com- Apesar dos alcances do Programa – descoberta de bate à tuberculose a sucessivas entidades públi- 70% dos casos estimados e cura de 75% dos pa- cas: Serviço Nacional de Tuberculose, Divisão cientes tratados – esta situação se manteve está- Nacional de Tuberculose, Divisão Nacional de vel na década de 1990. Pneumologia Sanitária, até a atual Coordenação Esta edição do Guia de vigilância, do Ministé- Nacional de Pneumologia Sanitária. rio da Saúde, compreende duas seções principais: O Programa Nacional de Controle da Tubercu- a primeira apresenta a descrição das técnicas e lose, um conjunto de ações descentralizadas, está estratégias essenciais utilizadas no controle da sob a responsabilidade de diferentes setores do tuberculose, apresentando, inclusive, um novo Ministério da Saúde – Área Técnica de Pneumolo- capítulo sobre Biossegurança; a segunda trata da gia Sanitária, coordenações macrorregionais, Fun- estrutura e da operacionalização do Programa, uma dação Nacional de Saúde, Centro de Referência visão inovadora, inserida nos diferentes níveis da Prof. Hélio Fraga – e das secretarias estaduais e rede de serviços do Sistema Único de Saúde. municipais de Saúde, com atribuições e funções Em seu trabalho, levou-se em conta não só o definidas pelo Plano. que estava expresso no 4o Manual de Normas para O problema da tuberculose no Brasil reflete o o controle OATB, como também importantes con- estágio de desenvolvimento social do país, onde tribuições do I Consenso Brasileiro de Tuberculo- os determinantes do estado de pobreza, as fra- se, de 1997, uma ação da Coordenação Nacional quezas de organização do sistema de saúde e as de Pneumologia Sanitária, em parceria com a So- deficiências de gestão limitam a ação da tecnolo- ciedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia; do gia e, por conseqüência, inibem a queda susten- Seminário de Tuberculose do Ministério da Saúde, tada das doenças marcadas pelo contexto social. de 1998, e da Coordenação Nacional de Doenças No caso da tuberculose, duas novas causas con- Sexualmente Transmissíveis e Aids. 5 #&
  • 3. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 II. Normas Técnicas 1. PROCURA DE CASOS Denomina-se “Caso de Tuberculose” todo in- ritários para essa ação. Também incluem-se nessa divíduo com diagnóstico confirmado por bacilos- categoria os imunodeprimidos por uso de medi- copia ou cultura e aquele em que o médico, com camentos ou por doenças imunossupressoras. base nos dados clínico-epidemiológicos e no re- Em infectados pelo HIV, principalmente aque- sultado de exames complementares, firma o diag- les na fase avançada de imunodepressão (nível nóstico de Tuberculose. “Caso Novo” é o doente sérico de CD4 inferior a 200 cels/mm3 ou linfóci- com tuberculose que nunca usou ou usou por tos inferior a 1.000 cels/mm3), deve-se suspeitar menos de um mês drogas antituberculosas. de tuberculose na presença de qualquer sintoma A procura de casos é um conceito programáti- respiratório e quadros de febre de origem indeter- co que compreende tanto os métodos de diag- minada. A justificativa para essa conduta deve-se nóstico como as ações organizadas para operacio- à alta freqüência de manifestações atípicas de tu- nalizá-los, envolvendo os serviços e a comunidade. berculose e à ocorrência de outras doenças respi- Estas ações estão voltadas para os grupos com ratórias causadas por agentes oportunistas. maior probabilidade de apresentar tuberculose, quais sejam: sintomáticos respiratórios (pessoas 2. DIAGNÓSTICO com tosse e expectoração por três semanas ou mais); contatos de casos de tuberculose; suspei- O diagnóstico da tuberculose, além da avalia- tos radiológicos; pessoas com doenças e/ou em ção clínica, deverá estar fundamentado nos méto- condição social que predisponham à tuberculose. dos a seguir. Os contatos, definidos como toda pessoa, parente ou não, que coabita com um doente de tubercu- 2.1. Bacteriológico lose, constituem um grupo para o qual se reco- A pesquisa bacteriológica é método de impor- menda uma atitude de busca ativa. tância fundamental, tanto para o diagnóstico como Os locais ideais para se organizar a procura de para o controle de tratamento, e será usado na casos são os serviços de saúde, públicos ou priva- ordem de prioridade abaixo detalhada: dos. Nestas instituições – postos, centros de saú- de, ambulatórios e hospitais – realizar busca ativa Exame microscópico direto do escarro de sintomáticos respiratórios deve ser uma atitude A baciloscopia direta do escarro é método permanente e incorporada à rotina de atividades fundamental porque permite descobrir as fontes de todos os membros das equipes de saúde. mais importantes de infecção: os casos bacilífe- Nas áreas onde as ações já estão organizadas, ros. Por ser um método simples e seguro, deve ser a visita domiciliar periódica do agente de saúde realizado por todo laboratório público de saúde e deve incluir a detecção de casos entre sintomáti- pelos laboratórios privados tecnicamente habilita- cos respiratórios e contatos, principalmente de dos. casos bacilíferos e crianças. Quando necessário, Recomenda-se para o diagnóstico a coleta de deve-se referenciá-los ao serviço de saúde. duas amostras de escarro: uma, por ocasião da Atenção especial deve ser dada a populações primeira consulta, e outra, independentemente do de maior risco de adoecimento, representadas so- resultado da primeira, na manhã do dia seguinte, bretudo por residentes em comunidades fechadas, ao despertar. Se for necessária uma terceira amos- como presídios, manicômios, abrigos e asilos. Nes- tra, aproveita-se para coletá-la no momento da sas comunidades, justifica-se a busca ativa perió- entrega da segunda. dica de casos. Indivíduos das categorias alcoóli- O exame baciloscópico deve ser solicitado, por cos, usuários de drogas, mendigos, e trabalhadores ordem de prioridade, aos pacientes que: de saúde e outros em situações especiais em que • procurem o serviço de saúde por queixas haja contato próximo com paciente portador de respiratórias ou por qualquer outro motivo, mas tuberculose pulmonar bacilífera, são também prio- que, espontaneamente ou em resposta ao profis- 5 #'
  • 4. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 sional de saúde, informem ter tosse e expectora- O exame radiológico, em pacientes com baci- ção há três semanas ou mais; loscopia positiva, tem como função principal a • apresentem alterações radiológicas pulmo- exclusão de doença pulmonar associada, que ne- nares. cessite de tratamento concomitante, além de per- Recomenda-se, ainda, o controle de qualidade mitir avaliação da evolução radiológica dos pa- das baciloscopias. Para este fim, os laboratórios cientes, sobretudo naqueles que não responderem de âmbito local deverão guardar todas as lâminas à quimioterapia. examinadas, positivas e negativas, para enviá-las, Os resultados dos exames radiológicos do tó- se solicitado, ao laboratório supervisor. rax deverão obedecer à seguinte classificação: • Normal – os que não apresentam imagens Cultura para micobactéria patológicas nos campos pulmonares. A cultura é indicada para os suspeitos de tu- • Seqüela – os que apresentam imagens su- berculose pulmonar persistentemente negativos ao gestivas de lesões cicatriciais. exame direto e para o diagnóstico de formas ex- • Suspeito – os que apresentam imagens su- trapulmonares como meningoencefálica, renal, gestivas de tuberculose. pleural, óssea ou ganglionar. A cultura também está • Outras doenças – os que apresentam ima- indicada nos casos de suspeita de resistência bac- gens sugestivas de pneumopatia não tuberculosa. teriana às drogas, seguida do teste de sensibilida- de. Nos casos de suspeita de infecção por mico- 2.3. Prova tuberculínica bactérias não tuberculosas, notadamente nos pa- Indicada como método auxiliar no diagnóstico cientes HIV positivos ou com aids, deverá ser rea- da tuberculose, a prova tuberculínica positiva, iso- lizada a tipificação do bacilo. ladamente, indica apenas infecção e não é sufi- ciente para o diagnóstico da tuberculose doença. 2.2. Radiológico No Brasil, a tuberculina usada é o PPD RT23, O exame radiológico é auxiliar no diagnóstico aplicada por via intradérmica no terço médio da da tuberculose, justificando-se sua utilização nos face anterior do antebraço esquerdo, na dose de casos suspeitos. Nesses pacientes, o exame radio- 0,1ml, equivalente a 2UT (unidades de tuberculi- lógico permite a seleção de portadores de ima- na), cujo resultado guarda equivalência com 5UT gens sugestivas de tuberculose ou de outra pato- de PPD-S, utilizada em alguns países. Deve ser logia, sendo indispensável submetê-los a exame conservada em temperatura entre 4oC e 8 oC, não bacteriológico para se fazer um diagnóstico cor- devendo ser congelada ou exposta à luz solar di- reto, já que não é aceitável, exceto em crianças, o reta. diagnóstico de tuberculose pulmonar sem investi- A técnica de aplicação e o material utilizado gação do agente causal pela baciloscopia de es- são padronizados pela Organização Mundial de carro. Saúde (OMS) e têm especificações semelhantes às Em suspeitos radiológicos de tuberculose pul- usadas para a vacinação BCG. monar com baciloscopia direta negativa, deve-se A leitura da prova tuberculínica é realizada 72 afastar a possibilidade de outras doenças, reco- a 96 horas após a aplicação, medindo-se, com ré- mendando-se, ainda, a cultura para micobactéria. gua milimetrada, o maior diâmetro transverso da O estudo radiológico tem, ainda, importante área de endurecimento palpável. O resultado, re- papel na diferenciação de formas de tuberculose gistrado em milímetros, classifica-se como: de apresentação atípica e no diagnóstico de ou- • 0mm a 4mm – não reator – indivíduo não tras pneumopatias no paciente portador de HIV/ infectado pelo M. tuberculosis ou com hipersen- aids ou de outras situações de imunossupressão. sibilidade reduzida. No diagnóstico de probabilidade, deve-se le- • 5mm a 9mm – reator fraco – indivíduo va- var em conta que o erro causa atraso na identifi- cinado com BCG ou infectado pelo M. tuberculo- cação da verdadeira doença, acarretando ao doente sis ou por outras micobactérias. sofrimento físico, psicológico, econômico e so- • 10mm ou mais – reator forte – indivíduo cial. infectado pelo M. tuberculosis, que pode estar 5 $
  • 5. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 doente ou não, e indivíduos vacinados com BCG 2.5. Outros métodos de diagnóstico nos últimos dois anos. Além da bacteriologia, da radiologia, da prova Algumas circunstâncias podem interferir no re- tuberculínica e da histopatologia, existem, desen- sultado das provas tuberculínicas, como, por exem- volvidas ou em desenvolvimento, outras metodo- plo: logias diagnósticas. Entretanto, pelo alto custo Portadores de doenças imunodepressoras: destes métodos, e pela ausência de provas consis- Sarcoidose. tentes quanto à sensibilidade, especificidade e Aids. valores preditivos, eles não devem ser usados in- Neoplasias de cabeça e pescoço. discriminadamente. Esses fatos não permitem sua Doenças linfoproliferativas. utilização em substituição aos métodos conven- Outras neoplasias. cionais, devendo-se restringir seu uso, como au- xílio diagnóstico para a tuberculose, aos serviços Situações com imunodepressão transitória: de referência, serviços especializados ou institui- Vacinação com vírus vivos. ções de pesquisa. Gravidez. Tratamentos com corticosteróides e drogas • Hemocultura imunodepressoras. Está indicada em pacientes portadores do HIV Crianças com menos de dois meses de vida. ou com aids e que haja suspeita de doença mico- Idade acima de 65 anos. bacteriana disseminada. Todos os indivíduos infectados pelo HIV de- vem ser submetidos à prova tuberculínica. Nesses • Detecção da produção de CO2 casos, considera-se reator aquele que apresenta Método radiométrico: utiliza a produção de gás endurecimento de 5mm ou mais, e não reator aque- carbônico pelo bacilo em crescimento, para a de- le com endurecimento entre 0mm e 4mm. Pacien- tecção de sua presença nos meios de cultura em tes portadores do HIV ou com aids, inicialmente que se inoculou o espécime clínico. Como no meio não reatores, deverão ter sua prova tuberculínica de cultura se adicionam nutrientes com carbono repetida, após melhora clínica com o uso de anti- marcado isotopicamente, o CO2 produzido terá retrovirais. também o carbono radioativo, que poderá ser iden- Recomenda-se a prova tuberculínica, como tificado por equipamento específico para esse fim. parte do exame médico, a todos os profissionais O método permite também a realização de teste dos serviços de saúde, por ocasião de sua admis- de sensibilidade a drogas num tempo mais curto são. que o habitual, o que constitui sua grande vanta- Nos indivíduos vacinados com BCG, sobretudo gem sobre os métodos convencionais. Uma varia- nos imunizados há até dois anos, a prova tuber- ção deste método detecta a produção do gás, por culínica deve ser interpretada com cautela, pois, um sistema de sensores ópticos, e não por emis- em geral, apresenta reações de tamanho médio, são de carbono marcado. embora possa alcançar 10mm ou mais segundo a vacina utilizada. • Detecção de consumo de O 2 Mycobacteria Growth Indicator Tube (MGIT) Este método utiliza tubos de ensaio com meios 2.4. Histopatológico líquidos de cultura, onde existe uma base de sili- É um método empregado principalmente na cone impregnada com rutênio, metal que emite investigação das formas extrapulmonares. A lesão luminescências na ausência de O2. Se há cresci- apresenta-se como um granuloma, geralmente mento bacteriano, há também consumo de O2 e o com necrose de caseificação e infiltrado histioci- rutênio emitirá luminescências possíveis de serem tário de células multinucleadas. Como esta apre- detectadas com luz ultravioleta. O resultado é ob- sentação ocorre em outras doenças, o achado de tido num tempo mais curto que a cultura conven- BAAR na lesão é fundamental para auxiliar o diag- cional e pode-se, também, realizar teste de sensi- nóstico de tuberculose. bilidade. 5 $
  • 6. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 • Sorológico cidos de diagnóstico baseados em amplificação do Consiste na detecção de anticorpos produzi- alvo são: dos pelo organismo, contra componentes do M. • Reação em cadeia da polimerase (PCR). tuberculosis. São utilizados antígenos purificados • Amplificação mediada por transcrição (TMA). ou clonados, em metodologias que se baseiam em • Amplificação baseada na seqüência de áci- reações antígeno-anticorpo. São métodos muito dos nucléicos (NASBA). rápidos, mas que têm o inconveniente de, em fun- • Amplificação por transferência de fita (SDA). ção da baixa especificidade dos antígenos dispo- A reação em cadeia da polimerase, no momen- níveis, revelar reações cruzadas com outros ger- to o teste mais usado, permite a detecção de quan- mes, além de outras circunstâncias que alteram os tidades mínimas de material genético, sendo o pre- resultados. Além disso, ainda não é possível, com cursor dos métodos baseados na biologia absoluta segurança, identificar os doentes dos molecular. apenas infectados ou vacinados. O Food and Drug Administration (FDA) ameri- cano aprovou, recentemente, o uso de dois testes • Marcadores biológicos de detecção direta do M. tuberculosis em espéci- mes clínicos. Um deles, baseado na detecção do Há dois marcadores com importância clínica: DNA do bacilo, usa a tecnologia da PCR ou outra a) A adenosinadeaminase (ADA), uma enzima como a reação isotérmica que detecta RNAr. Estes presente em várias células, particularmente no lin- testes foram aprovados para uso em pacientes com fócito ativado, como observado na tuberculose. A baciloscopia positiva, sem tratamento nos últimos determinação do aumento da atividade da ADA no 12 meses, e apenas em espécimes respiratórios, líquido pleural, sobretudo se associado a alguns circunstâncias em que mostraram melhor rendi- parâmetros como idade ( 45 anos), predomínio mento quanto à sua acurácia. Não se aplicam, de linfócitos (acima de 80%) e proteína alta (ex- portanto, à nossa rotina de diagnóstico, pois não sudato), é indicadora de pleurite tuberculosa. É substituem os métodos convencionais de detec- método colorimétrico, de fácil execução em qual- ção do bacilo. quer laboratório que disponha de um espectrofo- Nenhum novo teste ou kil para diagnóstico da tômetro, podendo, à luz dos conhecimentos dis- tuberculose pulmonar ou extrapulmonar deve ser poníveis, autorizar o início do tratamento para usado na rotina, sem que ele esteja validado por suspeita de tuberculose pleural, onde não seja instituição credenciada pelo Ministério da Saúde. possível a biópsia. Ressalte-se que o método a ser utilizado deve ser o de Giusti, feito no laboratório, 2.6. Classificação dos doentes de que é o mais utilizado no país. tuberculose b) Ácido tubérculo-esteárico, um metabólito de bacilo, cuja taxa aumentada, no líquor, indica a Tuberculose pulmonar positiva – quando presença de meningoencefalite por tuberculose. apresentam: Sua importância em outros fluidos ainda está sen- • duas baciloscopias diretas positivas; do estudada. O inconveniente para sua utilização • uma baciloscopia direta positiva e cultura rotineira é o alto custo do equipamento necessá- positiva; rio para sua determinação. • uma baciloscopia direta positiva e imagem radiológica sugestiva de tuberculose; • Técnicas de biologia molecular • duas ou mais baciloscopias diretas negati- vas e cultura positiva; Partindo-se do pressuposto de que o genoma Em caso de uma baciloscopia positiva e outra de qualquer organismo é o que de mais específico negativa, encaminhar para outros exames; não existe para sua identificação, as técnicas de biolo- havendo disponibilidade de meios, iniciar trata- gia molecular passaram a ser utilizadas para o diag- mento de prova. nóstico de diversas doenças, inclusive para tuber- culose, com a vantagem de poderem oferecer o Tuberculose pulmonar negativa – quando resultado num tempo muito curto (algumas ho- apresentam: ras). Desta forma, desenvolveram-se várias técni- • duas baciloscopias negativas, com imagem cas para esta finalidade. Os métodos mais conhe- radiológica sugestiva e achados clínicos ou ou- 5 $
  • 7. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 tros exames complementares que permitam ao antibioticoterapia inespecífica. Quando a ra- médico efetuar o diagnóstico de tuberculose. diologia do tórax revela regressão da lesão, ele Atenção: Antes de se optar por um diagnóstico de deve ser classificado como portador de infec- tuberculose pulmonar sem confirmação bacte- ção inespecífica; nos doentes adultos com sin- riológica (tuberculose pulmonar de probabili- tomatologia crônica, deve-se afastar a possibi- dade), devem ser afastados os quadros agu- lidade de doença pulmonar obstrutiva crônica, dos, especialmente os que apresentem febre. câncer de pulmão, micoses pulmonares, outras Nesses casos, o doente será reavaliado após 7 pneumopatias crônicas e infecção pelo HIV ou a 15 dias de tratamento sintomático ou com aids. Classificação da tuberculose pulmonar segundo a bacteriologia do escarro Critério segundo Resultado da Critério segundo a baciloscopia e cultura Baciloscopia Cultura baciloscopia Pulmonar positiva + NR Baciloscopia positiva Pulmonar positiva + + Baciloscopia positiva Pulmonar positiva – + Baciloscopia negativa Pulmonar negativa – NR Baciloscopia negativa Pulmonar negativa – – Baciloscopia negativa Pulmonar não realizada NR NR Baciloscopia não realizada legenda: (+) positiva; (–) negativa; (NR) não realizada. Tuberculose extrapulmonar mes comuns. Há predomínio da localização pul- A tuberculose pode ainda se expressar por for- monar sobre as demais formas de tuberculose, isto mas disseminadas como a miliar ou extrapulmona- é, as formas extrapulmonares. res (classificadas segundo a localização: pleural, Os achados radiográficos mais sugestivos da ganglionar periférica, osteoarticular, geniturinária, tuberculose são: adenomegalias hilares e/ou pa- meningoencefálica e assim por diante), com base ratraqueais (gânglios mediastínicos aumentados de nos achados clínicos e em exames complementa- volume); pneumonias com qualquer aspecto ra- res que permitam ao médico diagnosticar tuber- diológico, de evolução lenta, às vezes associadas culose. a adenomegalias mediastínicas, ou que cavitam durante a evolução; infiltrado nodular difuso (pa- 2.7. Diagnóstico da tuberculose na drão miliar). Sempre deve ser feito o diagnóstico criança e no adolescente diferencial com tuberculose, em crianças com pneumonia de evolução lenta, isto é, quando o Pulmonar paciente vem sendo tratado com antibióticos para O diagnóstico, na prática, segundo um sistema germes comuns sem apresentar melhora após duas de contagem de pontos, está sumariado no qua- semanas. dro da pág. 14*, baseado em similares publicados A história de contágio com adulto tuberculo- na literatura nas últimas décadas. so, bacilífero ou não, deve ser valorizada, princi- As manifestações clínicas podem ser variadas. palmente nas crianças até a idade escolar. O dado que chama atenção na maioria dos casos O teste tuberculínico pode ser interpretado é a febre, habitualmente moderada, persistente por como sugestivo de infecção pelo M. tuberculosis mais de 15 dias e freqüentemente vespertina. São quando superior a 10mm em crianças não vacina- comuns irritabilidade, tosse, perda de peso, sudo- das com BCG ou vacinadas há mais de dois anos; rese noturna, às vezes profusa; a hemoptise é rara. ou superior a 15mm em crianças vacinadas com Muitas vezes, a suspeita de tuberculose é feita em BCG há menos de dois anos. No caso de crianças casos de pneumonia que não vêm apresentando que receberam revacinação BCG, esta interpreta- melhora com o uso de antimicrobianos para ger- ção é indiscutível. 5 $!
  • 8. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 Em crianças até cinco anos que estejam inter- 3. TRATAMENTO nadas para investigação de tuberculose, pode ser tentada a realização de cultura para M. tuberculo- 3.1. Princípios básicos sis em espécime de lavado gástrico. Em serviços A tuberculose é uma doença grave, porém curá- ambulatoriais, o lavado gástrico não é recomen- vel em praticamente 100% dos casos novos, des- dado. O exame de escarro (baciloscopia e cultu- de que obedecidos os princípios da moderna qui- ra), em geral, só é possível a partir dos cinco ou mioterapia. seis anos. A associação medicamentosa adequada, as do- Dependendo do quadro clínico-radiológico ses corretas e o uso por tempo suficiente, com apresentado pela criança, podem ser necessários supervisão da tomada dos medicamentos, são os outros métodos diagnósticos, tais como broncos- meios para evitar a persistência bacteriana e o copia, punções e até mesmo biópsia pulmonar por desenvolvimento de resistência às drogas, asse- toracotomia. Nestas condições, além de exame gurando, assim, a cura do paciente. bacteriológico, pode-se proceder a exame cito ou O tratamento dos bacilíferos é a atividade prio- histopatológico, para aumentar a chance de posi- ritária de controle da tuberculose, uma vez que tividade. permite anular rapidamente as maiores fontes de Extrapulmonar infecção. O tratamento para caso suspeito de tuberculo- Algumas localizações extrapulmonares da tu- se sem comprovação bacteriológica deve ser ini- berculose são mais freqüentes na infância, como ciado após tentativa de tratamento inespecífico, gânglios periféricos, pleura, ossos e meninges. com antibiótico de largo espectro, sem melhora A tuberculose do aparelho digestivo (peritoni- dos sintomas. Uma vez iniciado o tratamento, ele te e intestinal), a pericardite, a geniturinária e a não deve ser interrompido, salvo após uma rigo- cutânea são mais raras. rosa revisão clínica e laboratorial que determine A tuberculose ganglionar periférica acomete mudanças de diagnóstico. com freqüência as cadeias cervicais e é geralmen- Compete aos serviços de saúde prover os meios te unilateral, com adenomegalias de evolução len- necessários para garantir que todo indivíduo com ta, superior a três semanas. Os gânglios têm con- diagnóstico de tuberculose venha a ser, sem atra- sistência endurecida e podem fistulizar (escrófula so, adequadamente tratado. ou escrofuloderma). É comum a suspeita de tu- berculose em casos de adenomegalia que não res- ponderam ao uso de antibióticos. 3.2. Regimes de tratamento A meningoencefalite tuberculosa costuma cur- sar com fase prodrômica de uma a oito semanas, O tratamento será desenvolvido sob regime quase sempre com febre, irritabilidade, paralisia ambulatorial, supervisionado, com pelo menos três de pares cranianos e pode evoluir com sinais clí- observações semanais da tomada dos medicamen- nicos de hipertensão intracraniana, como vômi- tos nos primeiros dois meses e uma observação tos, letargia e rigidez de nuca. O líquor é claro, por semana até o seu final. com glicose baixa e predomínio de mononuclea- A supervisão poderá ser realizada de forma di- res. O teste tuberculínico pode ser não reator, pois reta na unidade, no local de trabalho e na resi- a forma é anérgica. dência do paciente por meio de visitador sanitário A forma osteoarticular mais encontrada situa- ou agente comunitário de saúde. A unidade de se na coluna vertebral, constituindo-se no Mal de saúde pode identificar líderes comunitários ou res- Pott. Cursa com dor no segmento atingido e posi- ponsáveis familiares que auxiliem na supervisão ção antálgica nas lesões cervicais e torácicas, pa- do tratamento. raplegias e gibosidade. Nas formas pulmonar negativa e extrapulmo- nar (exceto a meningoencefálica), o regime pode- Tuberculose pulmonar + extrapulmonar rá ser ou não supervisionado. Neste caso, devem A tuberculose pode comprometer, ao mesmo ser adotadas medidas estimuladoras da adesão dos tempo, mais de um órgão no sistema em um mes- pacientes ao tratamento e utilizados métodos de mo paciente. verificação do uso correto das drogas. 5 $
  • 9. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 QUADRO Diagnóstico de tuberculose pulmonar em crianças e adolescentes negativos à baciloscopia Quadro clínico-radiológico Contato com Teste tuberculíni- Estado adulto co* e vacinação nutricional tuberculoso BCG Febre ou sintomas como: Adenomegalia hilar ou Próximo, nos últi- Vacinados há mais Desnutrição tosse, adinamia, expec- padrão miliar mos 2 anos de 2 anos grave ou peso toração, emagrecimento, • Condensação ou infil- • menor de 5mm abaixo do per- sudorese 2 semanas trado (com ou sem Adicionar 0 pts centil 10 Sis- escavação) inalterado 10 pts • 5mm a 9mm van** Adicionar 2 semanas Adicionar 15 pts • Condensação ou infil- 5 pts Adicionar trado (com ou sem • 10mm a 14mm 5 pts escavação) 2 sema- Adicionar nas evoluindo com 10 pts piora ou sem melhora • 15mm ou mais com antibióticos para Adicionar germes comuns 15 pts Adicionar 15 pts Assintomático ou com Condensação ou infiltra- Vacinados há me- sintomas 2 semanas do de qualquer tipo 2 nos de 2 anos semanas • menor de 10mm 0 pts 0 pts Adicionar • 10mm a 14mm 5 pts Adicionar 5 pts • 15mm ou mais Adicionar 15 pts Infecção respiratória Radiografia normal Ocasional ou Não vacinados Peso igual ou com melhora após uso de negativo • menor de 5mm acima do per- antibióticos para ger- Subtrair 0 pts centil 10 mes comuns ou sem an- 5 pts 0 pts • 5mm a 9mm tibióticos Adicionar 0 pts 5 pts Subtrair • 10mm ou mais 10 pts Adicionar 15 pts Legenda: pts = pontos; Esta interpretação não se aplica a revacinados em BCG; ** SISVAN – Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (MS/ 1997). Interpretação: Maior ou igual a 40 pontos 30 a 35 pontos Igual ou inferior a 25 pontos Diagnóstico muito provável Diagnóstico possível Diagnóstico pouco provável Fontes: Stegen G., Jones K., Kaplan P. (1969) Pediatr 42:260-3; Tijidai O et al (1986 Tubercle 67:269-81; Crofton J et al (1992), Londres. Mcmillan p; 29., adaptado por Sant’Anna C.C. 5 $#
  • 10. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 A hospitalização é admitida somente em casos Situação Esquema especiais e de acordo com as seguintes priorida- indicado des: Caso novo sem tratamento anterior Esquema I • Meningoencefalite. (VT) ou caso novo c/ trat. anterior (Básico) • Indicações cirúrgicas em decorrência da tu- e cura há mais de 5 anos berculose. Com tratamento anterior: Esquema I R • Complicações graves da tuberculose. Recidiva após cura com o Esquema I (Reforçado) • Intolerância medicamentosa incontrolável em Retorno após abandono do Esquema I ambulatório. Tuberculose meningoencefálica Esquema II • Intercorrências clínicas e/ou cirúrgicas gra- ves. Falência dos Esquemas I ou I R Esquema III • Estado geral que não permita tratamento em ambulatório. Para efeito de indicação de esquemas terapêu- • Em casos sociais, como ausência de residên- ticos, consideram-se sem tratamento anterior ou cia fixa ou grupos com maior possibilidade virgem de tratamento (VT) os pacientes que nun- de abandono, especialmente se for um caso ca se submeteram à quimioterapia antituberculo- de retratamento ou falência. sa, ou a fizeram por apenas 30 dias. O período de internação deve ser reduzido o Define-se como tratamento anterior (retrata- mínimo possível, devendo limitar-se ao tempo mento) a prescrição de um esquema de drogas suficiente apenas para atender às razões que de- para o doente já tratado por mais de 30 dias e a terminaram sua indicação, independentemente do menos que cinco anos, que venha a necessitar de resultado do exame bacteriológico, procurando- nova terapia por recidiva após cura (RC) ou retor- se não estendê-lo além da primeira fase do trata- no após abandono (RA). mento. Considera-se recidiva o doente de tuberculose que já se tratou anteriormente e recebeu alta por 3.3. Esquemas de tratamento cura, desde que o intervalo entre a data da cura e a data do diagnóstico da recidiva não ultrapassem Em todos os esquemas, a medicação é de uso cinco anos. Se esse intervalo exceder cinco anos, diário e deverá ser administrada de preferência em o caso é considerado como caso novo e o trata- uma única tomada. mento preconizado é o Esquema I. Esquemas de tratamento intermitente, com O paciente que retorna ao sistema após abando- doses adequadas a este tipo de regime, sempre no deve ter a atividade de sua doença confirmada supervisionados, poderão ser utilizados após a fase por nova investigação diagnóstica por bacilosco- inicial diária, sob a responsabilidade das coorde- pia e cultura, antes da reintrodução do retrata- nações estaduais. mento. Atenção especial deve ser dada ao tratamento Entende-se por falência a persistência da posi- dos grupos considerados de alto risco de toxici- tividade do escarro ao final do tratamento. São dade, constituído por pessoas com mais de 60 também classificados como caso de falência os anos, em mau estado geral, alcoolistas, infectadas doentes que, no início do tratamento, são forte- pelo HIV, em uso concomitante de drogas anti- mente positivos (++ ou +++) e mantêm essa situa- convulsivas e pessoas que manifestem alterações ção até o 4o mês, ou aqueles com positividade hepáticas. A rifampicina interfere na ação dos con- inicial seguida de negativação e nova positividade traceptivos orais, devendo as mulheres em uso por dois meses consecutivos, a partir do 4o mês desse medicamento receber orientação para utili- de tratamento. O aparecimento de poucos bacilos zar outros métodos anticoncepcionais. no exame direto do escarro, na altura do quinto Em crianças menores de cinco anos, que apre- ou sexto mês, isoladamente, não significa, neces- sentem dificuldade para ingerir os comprimidos, sariamente, falência do esquema, em especial se recomenda-se o uso das drogas em forma de xa- acompanhado de melhora clínico-radiológica. rope ou suspensão. Neste caso, o paciente será seguido com exames Segundo a situação do caso, os esquemas a bacteriológicos. O tratamento, se preciso, será pro- serem adotados são: longado por mais três meses, período em que o 5 $$
  • 11. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 caso deve ser redefinido ou concluído. Em pa- multirresistente (TBMR) e encaminhados para uni- cientes com escarro negativo e evolução clínico- dades de referência capacitadas para o acompanha- radiológica insatisfatória, o prolongamento do tra- mento deste tipo de pacientes. Nessas unidades, tamento por mais três meses pode ser uma opção serão indicados regimes especiais, com esquemas para evitar mudanças precipitadas para esquemas mais adequados de drogas alternativas, segundo mais prolongados e de menor eficácia. Sempre que orientação dos peritos em quimioterapia da Coor- possível, deve-se consultar uma unidade de refe- denação Nacional de Pneumologia Sanitária e Cen- rência antes de se decidir por este prolongamento. tro de Referência Professor Hélio Fraga. Para estes Recomenda-se a realização de cultura e de teste pacientes será obrigatório o teste de sensibilida- de sensibilidade às drogas previamente ao início de. Recomenda-se para os casos mais graves ou de quimioterapia nos casos com critérios de fa- de difícil adesão a internação em hospitais ou lência. enfermarias especialmente preparadas para esta O Esquema III deve ser realizado preferencial- situação. As drogas deverão ser fornecidas pelo mente em unidades mais complexas. Sempre que Ministério da Saúde, sob estrita vigilância, de acor- possível, deve-se realizar o teste de sensibilidade do com a demanda informada pelas Direções Es- às drogas no início do tratamento para definir cla- taduais do Programa, responsáveis pela organiza- ramente a possibilidade de sucesso deste Esque- ção de assistência aos portadores de TBMR. ma ou sua modificação. Os quadros seguintes mostram os esquemas Casos de falência do Esquema III devem ser propostos com suas indicações gerais e específi- considerados como portadores de tuberculose cas, dosagens e observações. Esquema I (Básico) 2RH/4RH Indicado nos casos novos de todas as formas de tuberculose pulmonar e extrapulmonar Fases do Drogas Peso do doente tratamento Até 20kg Mais de 20kg Mais de 35kg Mais de e até 35kg e até 45kg 45kg mg/kg/dia mg/dia mg/dia mg/dia 1a fase R 10 0300 0450 0600 (2 meses – RHZ) H 10 0200 0300 0400 Z 35 1000 1500 2000 2a fase R 10 0300 0450 0600 (4 meses – RH) H 10 0200 0300 0400 Siglas: Rifampicina = R – Isoniazida = H – Pirazinamida = Z – Etambutol = E – Estreptomicina = S – Etionamida = Et. Observações: a) As drogas deverão ser administradas preferencialmente em jejum, em uma única tomada ou, em caso de intolerância digestiva, junto com uma refeição. b) O tratamento das formas extrapulmonares (exceto a meningoencefálica) terá a duração de seis meses. Em casos individualizados cuja evolução clínica inicial não tenha sido satisfatória, com a colaboração de especialistas das áreas, o tempo de tratamento poderá ser prolongado, na sua segunda fase, por mais três meses (2RHZ/7RH). As condutas particulares a essa situação são apresentadas no quadro referente ao Esquema II (página seguinte). c) No tratamento da associação tuberculose e HIV, independentemente da fase de evolução da infecção viral, o tratamento será de seis meses. 5 $%
  • 12. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 Esquema I R (esquema básico reforçado em etambutol) 2RHZE/4RHE Iniciado nos casos de recidiva após cura ou retorno após abandono do Esquema I Fases do Drogas Peso do doente tratamento Até 20kg Mais de 20kg Mais de 35kg Mais de e até 35kg e até 45kg 45kg mg/kg/dia mg/dia mg/dia mg/dia 1 fase a R 10 0300 0450 0600 (2 meses – RHZE) H 10 0200 0300 0400 Z 35 1000 1500 2000 E 25 0600 0800 1200 2a fase R 10 0300 0450 0600 (4 meses – RHE) H 10 0200 0300 0400 E 25 0600 0800 1200 Observações: a) Os casos de recidiva de esquemas alternativos por toxicidade ao Esquema I devem ser avaliados para prescrição de Esquema Individualizado. b) O paciente que apresentar alteração da visão deverá ser encaminhado para uma unidade de referência, com o objetivo de avaliar o uso do etambutol. Esquema II – 2RHZ/7RH Indicado para a forma meningoencefálica da tuberculose Fases do Drogas Doses para Peso do doente Dose tratamento todas as Mais de 20kg Mais de 35kg Mais de máxima idades até 35kg até 45kg 45kg mg/kg/dia mg/dia mg/dia mg/dia 1a fase R 10 a 20 0.300 0.450 0.600 0.600 (2 meses) H 10 a 20 0.200 0.300 0.400 0.400 RHZ Z 35 1.000 1.500 2.000 2.000 2a fase R 10 a 20 0.300 0.450 0.600 0.600 (7 meses) H 10 a 20 0.200 0.300 0.400 0.400 RH Observações: a) Nos casos de concomitância entre tuberculose meningoencefálica e qualquer outra locali- zação, usar o Esquema II. b) Nos casos de tuberculose meningoencefálica em qualquer idade, recomenda-se o uso de corticosteróides (prednisona, dexametasona ou outros) por um período de um a quatro meses, no início do tratamento. c) Na criança, a prednisona é administrada na dose de 1 a 2mg/kg de peso corporal, até a dose máxima de 30mg/dia. No caso de se utilizar outro corticosteróide, aplicar a tabela de equivalência entre eles. d) A fisioterapia na tuberculose meningoencefálica deverá ser iniciada o mais cedo possível. 5 $
  • 13. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 Esquema III – 3SZEEt/9EEt Indicado nos casos de falência de tratamento com Esquema I e Esquema IR Fases do Drogas Peso do doente tratamento Até 20kg Mais de 20kg Mais de 35kg Mais de e até 35kg e até 45kg 45kg mg/kg/dia mg/dia mg/dia mg/dia 1 fase a S 20 0.500 1.000 1.000 (3 meses – SZEEt) Z 35 1.000 1.500 2.000 E 25 0.600 0.800 1.200 Et 12 0.250 0.500 0.750 2a fase E 25 0.600 0.800 1.200 (9 meses – EEt) Et 12 0.250 0.500 0.750 Observações: a) A estreptomicina deve ser usada por via intramuscular (IM). Em situações espe- ciais, pode ser aplicada por via endovenosa (EV), diluída a 50 ou 100ml de soro fisiológico correndo por um mínimo de meia hora. b) Em casos especiais com dificuldades de aceitação de droga injetável ou para facilitar seu uso supervisionado na Unidade de Saúde, o regime de uso da estrep- tomicina pode ser alterado para aplicações de 2a a 6a-feira por dois meses e duas vezes por semana por mais quatro meses. c) Em pessoas maiores de 60 anos, a estreptomicina deve ser administrada na dose de 500mg/dia. 3.4. Tratamento da tuberculose Um esquema alternativo, com regime de cinco multirresistente – TBMR drogas e 18 meses de duração, é objeto de uma experiência multicêntrica que se desenvolve, há Os pacientes que não se curam após tratamen- quatro anos, sob a coordenação do Centro de Re- to com os esquemas padronizados pelo MS, por- ferência Prof. Hélio Fraga, visando a estabelecer tadores, em geral, de bacilos resistentes a mais de experiência brasileira neste campo, que possa sub- duas drogas, incluindo R e H, constituem um gru- sidiar a eventual adoção de um esquema para po de doentes classificados no Consenso Brasilei- TBMR. Até aqui, foram tratados cerca de 350 pa- ro de Tuberculose, em 1997, como portadores de cientes, com uma taxa média de 60% de resulta- tuberculose multirresistente (TBMR). A este grupo dos favoráveis. são agregados os pacientes que apresentam resis- O tratamento da TBMR será supervisionado, tência primária a R, H e a outras drogas utilizadas, preferencialmente, com o paciente hospitalizado geralmente a S e/ou E. na fase inicial, e iniciado após resultado do teste Estes pacientes e seus familiares serão atendi- de sensibilidade, devendo-se estimular interven- dos por equipe multiprofissional especializada, em ções como visita domiciliar e oferecer incentivos Centros de Referência que cumpram as normas de para o fornecimento de cesta básica e transporte biossegurança e sejam credenciados, para este fim, urbano. pelas coordenadorias municipais e estaduais de Como critério de alta se exige que, após duas tuberculose. Lá receberão, gratuitamente, o esque- culturas negativas sucessivas para micobactérias, ma medicamentoso alternativo disponibilizado pelo o paciente permaneça fazendo uso diário das dro- Ministério da Saúde, composto por uma combina- gas pelo menos por 12 meses, cumprindo um tempo ção das seguintes drogas, de acordo com o resul- total de tratamento igual ou superior a 18 meses. tado do teste de sensibilidade: amicacina, ofloxa- Para acompanhar a tendência e controlar o cina, terizidona, etambutol e clofazimina. problema da TBMR, estabeleceu-se um sistema de 5 $'
  • 14. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 vigilância epidemiológica, controlado pelo Centro vidual de Notificação de Caso de TBMR, oriunda de Referência Prof. Hélio Fraga. O controle impli- das secretarias estaduais de saúde, e a confirmação ca armazenamento dos medicamentos em uso e dos dados pelo critério de “Caso de TBMR” pelo sua liberação contra o recebimento da Ficha Indi- teste de sensibilidade. (Ver Fluxograma abaixo). Vigilância Epidemiológica da TBMR Nível local (PS/CS/H) Suspeita de TBMR Encaminhar para confirmação bacteriológica/acompanhamento Centro de Referência Municipal, Estadual ou Lacen Federal Cultura / TS SES/SMS/CR Notificação VE Este sistema é independente da notificação Sinan que encerra o caso como TBMR CRPHF(*) (*) • envia o tratamento trimestral mediante controle • armazena cepas dos Lacens e outros laboratórios 3.5. Tratamento da tuberculose associada comuns. Estudos recentes mostram que o risco de ao HIV adoecimento por tuberculose em indivíduos HIV+ reduziu-se em aproximadamente 10 vezes; e que A conduta dos casos de tuberculose associada a taxa de ocorrência de casos de tuberculose em com infecção pelo HIV, em indivíduos adultos e pacientes atendidos pelos serviços especializados adolescentes, vem sendo estabelecida pela Área em DST/aids no Brasil apresentou uma redução de Técnica de Pneumologia Sanitária e Coordenação até 75%, quando comparada aos índices encon- Nacional de DST e Aids. A seguir reproduz-se a trados antes do advento da terapia anti-retroviral última atualização das recomendações elaboradas combinada. com a participação do Comitê Assessor para Co- A rifampicina (RMP) é considerada uma das Infecção HIV-Tuberculose. principais drogas no tratamento da tuberculose. Com o uso disseminado da terapia anti-retro- Esquemas que incluem a sua utilização apresen- viral combinada potente, após o advento dos Inibi- tam taxa de sucesso terapêutico da ordem de 95%, dores da Protease (IP) e Inibidores da Transcriptase quando adequadamente utilizados. Contudo, a Reversa Não-Nucleosídeos (ITRNN), a morbimor- utilização concomitante da RMP com a maioria talidade relacionada ao HIV sofreu profundas trans- dos IP e/ou ITRNN promove importante interação formações, com mudança radical na ocorrência e farmacológica no sistema microssomal hepático e no prognóstico das complicações oportunistas mais da parede intestinal, podendo provocar redução 5 %
  • 15. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 significativa dos níveis séricos desses anti-retrovi- Apesar de ser considerada uma doença opor- rais e, conseqüentemente, aumentar o risco de tunista, a tuberculose de ocorrência típica, com desenvolvimento de resistência do HIV ao esque- padrão clínico-radiológico de acometimento api- ma anti-retroviral em uso. A utilização de esque- cal, não caracteriza necessariamente comprome- mas alternativos para o tratamento da tuberculose timento significativo da imunidade ou falha da sem RMP, apesar de eficaz do ponto de vista bac- terapia anti-retroviral porventura instituída. O adoe- teriológico, tem-se mostrado com efetividade te- cimento por tuberculose, freqüentemente, promove rapêutica global reduzida pela maior complexida- o fenômeno de transativação heteróloga do HIV, de do esquema, maior dificuldade de adesão ao com elevação da carga viral em pacientes HIV+ e uso de medicação injetável (estreptomicina) e tem- diminuição da contagem de células T-CD4+, am- po mais prolongado de tratamento. Nessas situa- bas transitórias e dependentes da atividade da ções, pode haver prejuízo para o paciente co-in- doença. Isso dificulta a interpretação desses parâ- fectado, tanto pela não utilização de IP e/ou ITRNN metros para início e/ou seleção de esquema anti- no esquema anti-retroviral, como pela não inclu- retroviral, na vigência de tuberculose ativa sem são da RMP no esquema antituberculose. tratamento específico. Estudos recentes sugerem, Entretanto, estudos farmacocinéticos sugerem ainda, que o tratamento isolado da tuberculose que a RMP pode ser utilizada concomitantemente em pacientes co-infectados pelo HIV e que não com alguns anti-retrovirais em pacientes HIV+ com estão em uso de ARV reduz, por si só, a carga viral tuberculose, desde que estes pacientes sejam tra- plasmática. Assim, considerando-se que a terapia tados com esquemas que contenham efavirenz anti-retroviral não é uma emergência médica, su- (EFZ) ou a associação saquinavir + ritonavir (SQV/ gere-se aguardar a estabilização do quadro clíni- RTV), sem necessidade de ajuste nas dosagens co. Idealmente, procede-se a uma avaliação da habituais. Até o presente momento, embora alguns contagem das células T-CD4+ e quantificação da estudos de menor porte recomendem aumento da carga viral após 30 e 60 dias do início da terapia dose de EFZ para 800mg/dia, a literatura carece antituberculosa, utilizando-se tais parâmetros para de análises que avaliem a toxicidade ou a eficácia indicar a terapia anti-retroviral. clínica do EFZ nesta dosagem, em associação com Para a escolha do esquema anti-retroviral, deve- outras drogas anti-retrovirais. Portanto, não está se também avaliar o risco de intolerância, toxici- autorizado o seu uso de rotina nessa posologia. dade e capacidade de adesão do paciente ao tra- Alguns estudos recentes sugerem, em algumas si- tamento, considerando a possibilidade de utilização tuações, que o uso do ritonavir em sua posologia de esquemas menos complexos; ou mesmo a pos- convencional (1.200mg/dia) e como único IP do tergação do seu início, naqueles pacientes com esquema anti-retroviral pode ser considerado como quadro de imunodeficiência menos grave. Entre- opção de utilização concomitante com a RMP, tanto, em pacientes com sinais (principalmente embora investigações farmacocinéticas conclusi- clínicos) de imunodeficiência mais grave, deve-se vas e avaliação do risco de hepatotoxicidade com considerar o uso mais precoce da terapia anti-re- essa associação ainda não estejam disponíveis. troviral, devido ao risco elevado de morte. Pacien- Ademais, recomenda-se que o uso dessas associa- tes com contagem de células T-CD4+ 350/mm3 ções em pacientes portadores da co-infecção HIV/ não devem iniciar terapia anti-retroviral na vigên- tuberculose seja feito de forma criteriosa, com a cia de doença tuberculosa. Entretanto, sugere-se, orientação e/ou supervisão de profissional médi- para melhor definição da conduta, uma reavalia- co com experiência no tratamento de ambas as ção clínico-imunológica após 30-60 dias do iní- doenças e com cuidadoso acompanhamento clí- cio do tratamento da tuberculose. nico-laboratorial. Deve-se ter especial atenção para Pacientes em uso de esquema anti-retroviral a possibilidade de falha no tratamento da tuber- incompatível com RMP poderão ter esse esquema culose, falha no tratamento anti-retroviral, reações modificado para possibilitar o tratamento da tu- paradoxais da tuberculose e efeitos colaterais e/ berculose e da infecção pelo HIV com esquemas ou tóxicos, específicos ou sinérgicos, causados antituberculose e anti-retroviral potentes, não ca- pela associação das drogas anti-retrovirais e anti- racterizando esta mudança uma falha terapêutica tuberculose utilizadas nessa situação. ao esquema ARV anteriormente em uso, e sim uma 5 %
  • 16. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 adequação deste último tratamento antitubercu- pacientes HIV+. Sugere-se iniciar a terapia antitu- loso. Essa substituição do esquema, após o térmi- berculose, aguardar a estabilização clínica do qua- no do tratamento para tuberculose, não invalida a dro e depois utilizar esses exames na avaliação da reintrodução ou uso futuro do esquema anti-re- indicação de terapia anti-retroviral. Para a escolha troviral previamente utilizado. Pacientes portado- da opção de tratamento deve-se também avaliar o res de tuberculose com indicação de uso do es- risco de toxicidade e a capacidade de adesão do quema I (R+H+Z por seis meses), mas que não paciente para ambos os tratamentos, consideran- possam utilizar algum dos esquemas anti-retrovi- do a possibilidade de utilizar esquemas anti-retro- rais compatíveis com RMP, deverão ser tratados virais menos complexos ou mesmo a postergação para tuberculose durante 12 meses com esquema do início do tratamento anti-retroviral naqueles alternativo de tratamento da tuberculose para pa- pacientes com quadros de imunodeficiência me- cientes com intolerância ou contra-indicação para nos graves. uso da RMP, recomendado pela Coordenação Na- 3. Nessa situação, alguns autores consideram cional de Pneumologia Sanitária/Ministério da Saú- a possibilidade de se iniciar tratamento anti-retro- de, e iniciar ou substituir o tratamento anti-retro- viral, pois há risco de progressão mais rápida da viral pelo esquema considerado mais adequado do imunodeficiência causada pelo HIV, devendo ser ponto de vista imunológico e virológico. avaliados os parâmetros clínicos e laboratoriais O uso concomitante de abacavir (ABC) e ou- específicos (contagem de células T-CD4+ e carga tros Inibidores da Transcriptase Reversa de Nucleo- viral) com maior freqüência. Quanto mais próxima sídeos (ITRN) com RMP não está contra-indicado de 200 células/mm3 for a contagem de células T- do ponto de vista farmacológico, pois não existe CD4+ e/ou maior a carga viral (particularmente se nenhuma interação entre as drogas desse grupo 100.000 cópias/ml), mais forte será a indicação farmacológico com a RMP, não necessitando, por- para início da terapia anti-retroviral. É importante tanto, de nenhum ajuste posológico. considerar a motivação do paciente e a probabili- É importante considerar que a adesão adequa- dade de adesão, antes de se iniciar o tratamento. da a ambos os esquemas, antituberculose e anti- 4. Pacientes com tuberculose e indicação de retroviral, tomados de forma concomitante, é um uso do esquema I (E-1), mas que não possam uti- grande desafio para o paciente, devido à elevada lizar algum dos esquemas anti-retrovirais compa- quantidade de comprimidos/cápsulas a serem in- tíveis com rifampicina, deverão ser tratados para geridas ao dia e à ocorrência de efeitos colaterais, tuberculose durante 12 meses com esquema para particularmente nas primeiras semanas de trata- pacientes com intolerância ou contra-indicação mento. Portanto, deve-se considerar, sempre que para uso de rifampicina recomendado pelo Minis- possível, o adiamento do início do tratamento anti- tério da Saúde (dois meses iniciais com H+Z+S+E, retroviral em pacientes com co-infecção HIV/tu- seguidos de 10 meses com H+E [2HEZS/10HE]). berculose, particularmente naqueles que apresen- 5. A experiência clínica com o uso do abacavir tam quadros de imunodeficiência menos graves em indivíduos HIV+ com tuberculose é limitada. do ponto de vista clínico-laboratorial. A indicação Para pacientes sintomáticos ou assintomáticos com de início de terapia anti-retroviral em pacientes imunodeficiência mais grave (contagem de célu- com co-infecção HIV/tuberculose deve seguir os las T-CD4+ 200 células/mm3) e/ou carga viral mesmos parâmetros clínicos e imunovirológicos elevada ( 100.000 cópias/ml), alguns especialis- estabelecidos para pacientes HIV+ sem tuberculo- tas recomendam utilizar preferencialmente esque- se em atividade, recentemente atualizados no do- mas anti-retrovirais mais potentes, contendo ITR- cumento “Recomendações para Terapia Anti-retro- NN ou IP. O uso concomitante de abacavir e outros viral em Adultos e Adolescentes – 2001”, do Inibidores da Transcriptase Reversa de Nucleosídeos Ministério da Saúde (ver quadro I). (ITRN) com RMP não estão contra-indicados, pois 1. Dois meses iniciais com R+H+Z, seguidos de não existe nenhuma interação farmacológica com quatro meses com R+H (2RHZ/4RH). os medicamentos antituberculose descritos até o 2. O adoecimento por tuberculose, freqüen- momento. temente, promove a elevação da carga viral e a 6. Nessas situações, não há dados que permi- diminuição da contagem de células T-CD4+ em tam escolher entre esquemas com ITRNN ou IP. 5 %
  • 17. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 QUADRO I Recomendações terapêuticas para pacientes HIV+ com tuberculose Característica da situação Recomendação Paciente HIV+, virgem de tratamento Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (E- para tuberculose, com contagem de cé- 1) (1) recomendado pelo Ministério da Saúde, aguardar estabilidade lulas T-CD4+ e carga viral não dispo- clínica e depois realizar contagem de células T-CD4 e de carga viral níveis. para avaliação da necessidade de terapia anti-retroviral(2). Paciente HIV+, virgem de tratamento Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1) para tuberculose, com contagem de cé- recomendado pelo Ministério da Saúde, e não iniciar terapia anti- lulas T-CD4+ acima de 350 células/mm3 retroviral(3). Entretanto, sugere-se uma reavaliação clínico-imunoló- (após estabilização do quadro clínico gica após 30-60 dias do início do tratamento da tuberculose, para de tuberculose(2)). melhor definição da conduta. Paciente HIV+, virgem de tratamento Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1) para tuberculose, com contagem de cé- recomendado pelo Ministério da Saúde, e, caso indicado, iniciar ou lulas T-CD4+ entre 200 e 350 células/ substituir o tratamento anti-retroviral por um dos seguintes esquemas mm3 e carga viral para HIV 100.000 compatíveis com uso concomitante da RMP (4): cópias/ml (após estabilização do qua- • ZDV + 3TC + ABC(5) dro clínico de tuberculose(2)). • 2 ITRN + EFZ(6,8) • 2 ITRN + SQV/RTV(6) Paciente HIV+, virgem de tratamento Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1) para tuberculose, com contagem de cé- recomendado pelo Ministério da Saúde, e, caso indicado, iniciar ou lulas T-CD4+ entre 200 e 350 células/ substituir o tratamento anti-retroviral por um dos seguintes esquemas mm3 e carga viral para HIV 100.000 compatíveis com uso concomitante de RMP(4): cópias/ml (após estabilização do qua- • ZVD + 3TC + ABC(5) dro clínico de tuberculose(2)). • 2 ITRN + EFZ(6,8) • 2 ITRN + SQV/RTV(6) Paciente HIV+, virgem de tratamento Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I (1) para tuberculose, com contagem de cé- recomendado pelo Ministério da Saúde, e, caso indicado, iniciar ou lulas T-CD4+ abaixo de 200 células/ substituir o tratamento anti-retroviral por um dos seguintes esquemas mm3 (após estabilização do quadro clí- compatíveis com uso concomitante de RMP(4): nico de tuberculose(2)). • 2 ITRN + EFZ(6,8) • 2 ITRN + SQV/RTV(6) Paciente HIV+ com meningoencefalite Tratar a tuberculose durante nove meses, utilizando o Esquema II (7) tuberculosa. recomendado pelo Ministério da Saúde, e iniciar ou substituir a tera- pia anti-retroviral por esquemas compatíveis com uso concomitante de RMP, a serem escolhidos conforme parâmetros de contagem de células T-CD4+ e carga viral para pacientes HIV+ virgens de trata- mento para tuberculose(2,4,5,6,8). Paciente HIV+ em situação de retrata- Tratar a tuberculose durante seis meses, utilizando o Esquema I Re- mento para tuberculose. forçado – IR(9) recomendado pelo Ministério da Saúde, e iniciar ou substituir a terapia anti-retroviral por esquemas compatíveis com uso concomitante de RMP, a serem escolhidos conforme parâmetros de contagem de células T-CD4+ e carga viral para pacientes HIV+ vir- gens de tratamento para tuberculose (2,4,5,6,7,8,10). Paciente HIV+ em situação de falha a Tratar a tuberculose durante 12 meses, utilizando o Esquema III(11) tratamento anterior para tuberculose. recomendado pelo Ministério da Saúde, e iniciar ou substituir o tra- tamento anti-retroviral pelo esquema considerado mais adequado do ponto de vista imunológico e virológico(2,4,5,6,7,8,10). Paciente HIV+ com tuberculose multi- Encaminhar aos serviços de referência em tuberculose, para avaliação droga-resistente. de especialista e uso de esquemas especiais. Siglas: ZDV = Zidovudina; 3TC = Lamivudina; ABC = Abacavir; EFZ = Efavirenz; RTV = Ritonavir; SQV = Saquinavir; ITRN = Inibidor da Transcriptase Reversa Análogo de Nucleosídeo; ITRNN = Inibidor da Transcriptase Reversa Não-Análogo de Nucleosídeo; IP = Inibidores da Protease. 5 %!
  • 18. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 Entretanto, o uso de ritonavir associado a drogas b) Realização mensal da baciloscopia de con- antituberculose utilizadas no esquema I (E-1) apre- trole, sendo indispensáveis as dos 2o, 4o e 6o me- senta risco aumentado de hepatotoxicidade. Su- ses, nos Esquemas I e Esquema I R e nos 3 o, 6 o, 9o gere-se monitorar cuidadosamente as transamina- e 12o meses, no caso dos Esquemas III e especiais. ses e outras provas de função hepática do paciente Quando o paciente referir que não tem expec- durante o tratamento; e não iniciar o uso de es- toração, o auxiliar deve orientá-lo sobre como obter quema com esse anti-retroviral associado ao es- a amostra de escarro e fazer com que ele tente, quema I (E-1), caso os níveis basais dessas enzi- repetidamente, em sua presença, fornecer mate- mas hepáticas estejam três vezes acima dos valores rial para exame. Nessa situação, o escarro pode de referência. ser induzido pela inalação de solução salina a 9% 7. Dois meses iniciais com R+H+Z, seguidos de por 15 minutos, seguido por tapotagem. sete meses com R+H (2RHZ/7RH). Observar que c) Acompanhamento clínico visando à identi- doses mais elevadas de rifampicina e isoniazida ficação de queixas e de sintomas que possam ava- são recomendadas nessa situação. liar a evolução da doença com a introdução dos 8. O efavirenz é contra-indicado durante a ges- medicamentos e a detecção de manifestações ad- tação. Não há dados conclusivos sobre a seguran- versas com seu uso. ça do abacavir na gravidez. Nas unidades com recursos de exame radioló- 9. Dois meses iniciais com R+H+Z+E, seguidos gico, este pode ser utilizado periodicamente para de quatro meses com R+H+E (2RHZE/4RHE). acompanhar a regressão ou o agravamento das lesões na forma pulmonar da doença, em especial 10. Recomenda-se monitorar rigorosamente a na ausência de expectoração. adesão (tratamento supervisionado) e coletar ma- terial para teste de sensibilidade aos medicamen- 3.7. Reações adversas ao uso de drogas tos antituberculose. antituberculose 11. Três meses iniciais com S+Et+E+Z, segui- dos de nove meses com Et+E (3SEtEZ/9EtE). A maioria dos pacientes submetidos ao trata- mento de tuberculose consegue completar o tem- 3.6. Controle do tratamento po recomendado sem sentir qualquer efeito cola- teral relevante. Os fatores relacionados às reações O controle do tratamento consiste na aplica- são multifatoriais; todavia, os maiores determinan- ção de meios que permitam o acompanhamento tes destas reações se referem à dose, aos horários da evolução da doença e utilização correta dos de administração da medicação, à idade, ao esta- medicamentos. do nutricional, ao alcoolismo, às condições da Condições básicas para o êxito do tratamen- função hepática e renal e à co-infecção pelo HIV. to Intolerância gástrica, manifestações cutâneas a) Adesão do paciente, principalmente por seu variadas, icterícia e dores articulares são os efeitos conhecimento sobre mais descritos durante o tratamento com o Esque- ma I. Os pacientes devem ser advertidos sobre es- • A doença. tas possibilidades e, caso se manifestem, orienta- • A duração do tratamento prescrito. dos a procurar imediatamente o médico. O paciente • A importância da regularidade no uso das que apresente algum destes para-efeitos deve ter drogas. consulta de controle aprazada para, no máximo, • As graves conseqüências advindas da inter- duas semanas e a conduta está sumariada no quadro rupção ou do abandono do tratamento. a seguir, conforme a classificação: efeitos menores Essa é uma atividade de educação para o tra- e efeitos maiores. Os efeitos menores ocorrem en- tamento que deve ser desenvolvida durante as tre 5% e 20% dos casos e são assim classificados consultas e entrevistas, tanto iniciais como subse- os que não implicam modificação imediata do es- qüentes. Na oportunidade, a equipe de saúde, além quema padronizado; os efeitos maiores que impli- de conscientizar o paciente da importância de sua cam interrupção ou alteração do tratamento e são colaboração no tratamento, estabelece com ele menos freqüentes em torno de 2%, podendo che- uma relação de cooperação mútua. gar a 8% em serviços especializados. 5 %
  • 19. Jornal Brasileiro de Pneumologia 30(Supl 1) – Junho de 2004 Efeitos menores Efeito Droga Conduta Irritação gástrica (náusea, vômito) Rifampicina Reformular os horários de Epigastralgia e dor abdominal Isoniazida administração da medicação Pirazinamida Avaliar a função hepática Artralgia ou Artrite Pirazinamida Medicar com ácido acetilsalicílico Isoniazida Neuropatia periférica Isoniazida Medicar com piridoxina (vit B6) (queimação das extremidades) Etambutol Cefaléia e mudança de comportamento Isoniazida Orientar (euforia, insônia, ansiedade e sonolência) Suor e urina de cor laranja Rifampicina Orientar Prurido cutâneo Isoniazida Medicar com anti-histamínico Rifampicina Hiperuricemia (com ou sem sintomas) Pirazinamida Orientar (dieta hipopurínica) Etambutol Febre Rifampicina Orientar Isoniazida Efeitos maiores Efeito Droga Conduta Exantemas Estreptomicina Suspender o tratamento Rifampicina Reintroduzir o tratamento droga a droga após resolução Substituir o esquema nos casos graves ou reincidentes Hipoacusia Estreptomicina Suspender a droga e substituí-la pela melhor opção Vertigem e nistagmo Estreptomicina Suspender a droga e substituí-la pela melhor opção Psicose, crise convulsiva, encefalopatia Isoniazida Substituir por estreptomicina + tóxica e coma etambutol Neurite óptica Etambutol Substituir Isoniazida Hepatotoxicidade (vômitos, alteração das Todas as Suspender o tratamento provas de função hepática, hepatite) drogas temporariamente até resolução Trombocitopenia, leucopenia, eosinofilia, Rifampicina Dependendo da gravidade, anemia hemolítica, agranulocitose, Isoniazida suspender o tratamento e vasculite reavaliar o esquema de tratamento Nefrite intersticial Rifampicina Suspender o tratamento principalmente intermitente Rabdomiólise com mioglobulinúria e Pirazinamida Suspender o tratamento insuficiência renal 5 %#
  • 20. II Consenso Brasileiro de Tuberculose Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004 Irritação gástrica seu valor normal, com início de sintomas ou logo Todas as drogas usadas no tratamento de tu- que a icterícia se manifeste, encaminhando o doen- berculose podem causar irritação gástrica. A iso- te a um serviço de maior poder resolutivo para niazida combinada com a rifampicina e com a pi- acompanhamento clínico e laboratorial, além da razinamida são as drogas mais freqüentemente adequação do tratamento, caso seja necessário. implicadas com irritação gástrica. São referidas Se, após a interrupção do tratamento, houver re- náuseas, pirose, epigastralgia que, na maioria das dução dos níveis séricos das enzimas hepáticas e vezes, ocorrem na primeira fase do tratamento. resolução dos sintomas, indica-se a reintrodução do Esquema I, da seguinte maneira: Conduta • Icterícia sem aumento sérico das enzimas a) Suspender as drogas por 48 a 72 horas, re- hepáticas – iniciar o tratamento com rifampicina, comendando o uso de sintomáticos. Controlados acrescentar isoniazida e, por último, pirazinamida, os sintomas, reiniciar o tratamento, indicando a com intervalo de três dias entre elas. administração da pirazinamida após o almoço e • Icterícia com aumento sérico das enzimas da rifampicina combinada com a isoniazida após hepáticas – iniciar o tratamento com isoniazida, o desjejum. acrescentar rifampicina e, por último, pirazinami- b) Havendo novas queixas, suspender todas as da, com intervalo de três dias entre elas, ou subs- drogas por mais 24 horas e reiniciar o tratamento: tituir o Esquema I por um esquema alternativo: uma droga a cada 48 horas, na seguinte ordem: estreptomicina/etambutol/isoniazida (SEH) ou es- pirazinamida, isoniazida e finalmente rifampicina. treptomicina/etambutol/ofloxacina (SEO), ambos c) Quando não houver resolução das queixas por um período mínimo de 12 meses de trata- e nesta fase já tiver sido identificada a droga res- mento. ponsável pelos sintomas, proceder à modificação do esquema, conforme o quadro seguinte. Hiperuricemia e artralgia A hiperuricemia é causa de graves problemas 3.8. Substituição de drogas diante de renais: nefrolitíase, nefropatia por uratos ou por efeitos adversos ácido úrico que podem evoluir com insuficiência renal. Substituição da pirazinamida – 2 RHE/4 RH Substituição da isoniazida – 2RESZ/4 RE A hiperuricemia assintomática é um efeito ad- Substituição da rifampicina – 2 SEHZ/10 HE verso, freqüente durante o uso da pirazinamida e Atenção: ao estimar o tempo total de trata- em menor freqüência com o uso do etambutol, mento antituberculose, considerar todo o tempo sendo, nestes casos, a gota uma manifestação rara. de tratamento, inclusive aquele que antecedeu às As artralgias, quando não relacionadas à hiper- queixas de intolerância. uricemia, são freqüentemente associadas ao uso da pirazinamida. Hepatotoxicidade A artrite é descrita com uso de isoniazida; no As drogas usadas nos esquemas de tratamento entanto, não se caracteriza como efeito adverso da tuberculose apresentam interações entre si e comum. com outras drogas que aumentam o risco de he- patotoxicidade. Em pequeno percentual dos pa- Conduta cientes, observa-se, nos dois primeiros meses de Na presença de hiperuricemia, deve-se fazer tratamento, elevação assintomática dos níveis sé- orientação dietética (dieta hipopurínica). ricos das enzimas hepáticas, seguida de normali- A artralgia e a artrite costumam responder ao zação espontânea, sem qualquer manifestação clí- uso de antiinflamatórios não hormonais. nica e sem necessidade de interrupção ou alteração do esquema terapêutico. É importante considerar Manifestações neurológicas e psiquiátricas o peso do paciente quando se indicar a dose do A neuropatia periférica é associada ao uso da medicamento. isoniazida em cerca de 17% dos pacientes que O tratamento só deverá ser interrompido quan- utilizam doses maiores de 300mg/dia e em menor do os valores das enzimas atingirem três vezes o freqüência ao uso do etambutol. 5 %$