O documento analisa as estratégias retóricas usadas pelos principais candidatos presidenciais brasileiros em 2010 no Twitter. José Serra se concentrou em conversas não políticas para parecer acessível, enquanto Marina Silva mobilizou simpatizantes emocionalmente. Plínio de Arruda debateu programas e opiniões para conquistar votos por meio do raciocínio lógico.
1. A Retórica nas
conversações dos
presidenciáveis
2010 no Twitter
Por Gabriela da Fonseca
gabrieladafonseca@gmail.com
2. As primeiras reflexões sobre as maneiras mais
eficazes de persuadir um público surgiram na
Grécia Antiga.
A retórica clássica, a arte de bem falar, ou
seja, a arte de falar (ou de escrever) de
modo persuasivo se propunha estudar os
meios discursivos de ação sobre um
auditório, com o intuito de conquistar ou
aumentar sua adesão às teses que se
apresentavam ao seu assentimento.
(PERELMAN, 1997, p. 177)
3. A retórica de Aristóteles comporta três
tipos de meios de persuadir:
O ethos e o pathos: parte afetiva da persuasão, são
elementos da oratória. O ethos é o caráter moral que o
orador deve ter ou parecer ter, para inspirar confiança no
auditório; o pathos é o conjunto de emoções e que o
orador deve suscitar no auditório com o seu discurso.
O logos: parte racional; argumentos utilizados pelo
orador.
A especificidade da retórica aristotélica reside na relação
ethos-pathos-logos.
4. A retórica acabou após o surgimento dos meios de
comunicação?
Ela foi reconfigurada: Assim, “muda o auditório, que
passa a ausente e indefinido; muda o orador, face aos
novos dispositivos técnicos; muda a relação do ouvinte
com o orador”. (SOUSA, 2006)
O logos perde o posto de dimensão privilegiada:
Mesmo se é verdade que, no século XX, mais
concretamente a partir de 1958, autores como Perelman
tenderam a privilegiar o logos [...] a atual “sociedade da
informação” vem trazer para primeiro plano da retórica o
ethos. Indícios disso mesmo são a importância crescente
dada às “marcas”, no domínio econômico/publicitário, e à
“honestidade” dos agentes, no domínio político.
(SERRA, 2008, p. 154)
5. A Internet complexifica esta reconfiguração:
Ivone Ferreira, ao estudar os websites, identifica o ethos
do orador com “a entidade responsável pelo site”, o
pathos seria “conseguido sobretudo recorrendo às
propriedades das cores”, e o logos seria “a junção do
texto com o design da página em que é apresentada”
(2001).
No Twitter, o orador não pode recorrer a cores e design
da página, pois esses detalhes são personalizados pelo
“auditório”. Ele conta apenas com o suporte linguístico
(140 caracteres), para produzir mensagens persuasivas.
6. Sendo assim, analisamos mensagens, especificamente,
conversações estabelecidas entre os candidatos e outros
usuários, por considerarmos esta uma comunicação
persuasiva mais direta, além de ser a ação mais importante
em uma rede social, pois é através das conversações que o
debate político pode ser estabelecido.
Este é um grande problema e significa afinal que se tenta
produzir legitimidade apenas pela exposição, como se a
esfera de visibilidade pública fosse legitimadora de
decisões relativas ao bem comum. [...] é uma evidente
desqualificação da democracia contemporânea pretender
que o debate público seja substituído pela exibição pública.
(GOMES, 2008, p. 138)
Mas toda conversação contribui com o debate público?
7. Metodologia
Recortamos dois momentos distintos da eleição para a
coleta de tweets dos quatro candidatos: de 9 e 16 de
agosto e de 13 a 20 de setembro. Total de 489 tweets.
Selecionamos os tweets classificados como Conversação
a partir de dois critérios: 1. Respostas e perguntas
direcionadas a alguém, contendo ou não @;
2. Questões direcionadas para toda a rede.
Classificamos o conteúdo das conversas em quatro tipos:
1. Conversas sobre programa de governo do candidato e
suas opiniões sobre temas relevantes no cenário político
(logos);
2. Assuntos relacionados à campanha e às eleições,
como agenda de compromissos, materiais de campanha,
comitês, entre outros (pathos);
3. Conversas triviais (pathos + ethos);
4. Agradecimentos (pathos + ethos).
8. Percentuais de
Candidato Total de Tweets Conversaçõ Análise do Conteúdo
es
10 0%
Dilma -
9 0%
41 26,8% 38,9% Campanha, 25% Programa e Opiniões,
Serra
71 35,2% 36,1% Assuntos Diversos
67 40,3%
55% Campanha, 35% Programas e Opiniões, 6,7%
Marina
Assuntos Diversos, 3,3% Agradecimentos.
83 39,7%
134 61,2% 25,2% Campanha; 41,1% Progrmas e Opiniões;
Plinio 13,1% Assuntos Diversos; 20,6%
74 33,8% Agradecimentos.
1º Período 9/08 a 16/08
2º Período 13/09 a 20/09
9. José Serra
Exatamente @elizandra_nando, como diz você esses boatos
são “sem noção”. Aqui você ajuda a conbate-los. (13 de agosto)
Sim @deiasanrafa, comprei O Médico Doente, Borboletas da
Alma e Teoria das Janelas Quebradas. (15 de agosto)
José Serra se destacou por ser aquele que mais tentou uma
aproximação com outros usuários a partir de conversas com
conteúdo não político, comentando assuntos como futebol,
filmes e livros, e falando sobre gostos pessoais. Assim, ele
tentou produzir a sua imagem “na intimidade”, mostrando-se
como uma pessoa simples e acessível. Portanto, as
mensagens dele no Twitter tentaram persuadir, sobretudo, pelo
ethos e pelo pathos.
10. Marina Silva
Oi @renatocenografo Você pode falar com seus conhecidos e
ajudar a mobilizar simpatizantes. (16 de agosto)
@domingosdias @bibicofm @Pitaluga @Limax_ Obrigada pelo
envolvimento. Aqui diz como encontrar material de campanha
http... (20 de setembro)
Das embrionárias, sim http://... RT @fabi_toyama Por que a
Senhora é contra a pesquisa com células tronco? (13 de
agosto)
Já Marina Silva apostou na mobilização da militância e
simpatizantes, convidando os usuários a participarem de
debates e eventos, e oferecendo informações sobre materiais
de campanhas, comitês e agenda de compromissos. Assim, as
suas mensagens persuasivas foram baseadas no pathos, na
tentativa de envolver o seu eleitorado em potencial no Twitter
pela emoção da campanha.
11. Plínio de Arruda
@doydera Não conheço detalhes desse programa. Mas
sustento que o Brasil precisa ter um programa nuclear. (10 de
agosto)
@DjeisaGarcia Legalizar (a maconha) não é liberalizar. É
colocar sob o controle da lei. Peço ler minha proposta no meu
site: plinio50.com.br. (18 de setembro)
@mirelapink A implantação do socialismo é um processo de
muito longo prazo, porque depende da mudança de consciência
da maioria. (18 de setembro)
Plínio tentou ganhar o voto dos seguidores através da
exposição de opiniões e argumentos sobre variados temas, ou
seja, com mensagens nas quais o logos era o elemento
principal. O grande número de conversas do candidato com
este conteúdo se deu também pelo fato dele ter concedido
entrevistas a jornalistas na rede e promovido debates online no
Twitter, com dia e horário previamente marcados.
12. Considerações Finais
O conteúdo das mensagens evidenciou importantes
diferenças na utilização da ferramenta pelos candidatos
e diferentes estratégias de persuasão.
Não basta estabelecer conversações nas redes sociais
para contribuir com o debate público, visto que essas
interações com os cidadãos podem ser “utilizadas”
apenas para construir imagem, ganhar visibilidade e
conquistar empatia. A discussão política exige a troca de
opiniões e argumentos, através de discursos com
dimensão afetiva, mas, principalmente, argumentativa.
13. REFERÊNCIAS
FERREIRA, Ivone. Retórica na época da Internet. 2001.
Disponível em: <www.bocc.ubi.pt>.
GOMES, Wilson; MAIA, Rousiley. Comunicação e
Democracia: Problemas & Perspectivas. São Paulo: Paulus,
2008. p. 293-326.
LEMOS, André. Cibercultura. Alguns pontos para compreender
a nossa época. In: Olhares sobre a Cibercultura. Porto Alegre:
Sulina, 2003, p. 11-23.
PERELMAN, Chaïm. Retóricas. Tradução Maria Ermantina
Galvão G. Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
REBOUL, Olivier. Introdução à Retórica. Tradução Ivone
Castilho Benedetti. ed. 2. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
14. RECUERO, R.; ZAGO, G. Em Busca das “Redes que
Importam”: redes sociais e capital social no Twitter. XVIII
Encontro da Compos, MG, junho de 2009. Disponível em:
<http://www.compos.org.br/data/biblioteca_1016.pdf> Acesso
em: 18 de outubro de 2010.
SERRA, Paulo. Credibilidade e Internet. In: Retórica e
Mediatização: Da escrita à internet. Labcom, 2008. Disponível
em: <www.labcom.ubi.pt>. Acesso em: 4 de maio de 2011.
SOUSA, Américo de. A Retórica na sociedade mediatizada. In:
IX Congresso IBERCOM, Sevilla-Cádiz, 2006. Disponível em:
<www.bocc.ubi.pt>. Acesso em: 4 de maio de 2011.
TRINGALI, Dante. Introdução à Retórica – A Retórica como
Crítica Literária. São Paulo: Duas Cidades, 1988.