1. Filosofia
Ano Lectivo: 2007/2008 Ano: 11º Turma: ______
Prof. Joaquim Melro
1. Descrição e interpretação da actividade
Unidade IV cognoscitiva
1.2. Análise comparativa de duas teorias
explicativas do conhecimento: O empirismo de
David Hume e o racionalismo de Descartes
Documento 2
Assunto: O empirismo de David Hume
“INATISMO [RACIONALISMO] OU EMPIRISMO?
De onde vieram os princípios racionais (identidade, não-contradição, terceiro-
excluído e razão suficiente)? De onde veio a capacidade para a intuição (razão intuitiva)
e para o raciocínio (razão discursiva)? Nascemos com eles? Ou nos seriam dados pela
educação e pelo costume? Seriam algo próprio dos seres humanos, constituindo a
natureza deles, ou seriam adquiridos através da experiência?
Durante séculos, a Filosofia ofereceu duas respostas a essas perguntas. A primeira
ficou conhecida como inatismo [RACIONALISMO] e a segunda, como empirismo.
O inatismo afirma que nascemos trazendo em nossa inteligência não só os
princípios racionais, mas também algumas ideias verdadeiras, que, por isso, são ideias
inatas. O empirismo, ao contrário, afirma que a razão, com seus princípios, seus
procedimentos e suas ideias, é adquirida por nós através da experiência. Em grego,
experiência se diz: empeiria - donde, empirismo, conhecimento empírico, isto é,
conhecimento adquirido por meio da experiência.
(...)
O EMPIRISMO
Contrariamente aos defensores do inatismo, os defensores do empirismo afirmam
que a razão, a verdade e as ideias racionais são adquiridos por nós através da
experiência. Antes da experiência, dizem eles, nossa razão é como uma quot;folha em
brancoquot;, onde nada foi escrito; uma quot;tábua rasaquot;, onde nada foi gravado. Somos como
uma cera sem forma e sem nada impresso nela, até que a experiência venha escrever na
folha, gravar na tábua, dar forma à cera.
OS EMPIRISTAS INGLESES
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2. No decorrer da história da Filosofia muitos filósofos defenderam a tese empirista,
mas os mais famosos e conhecidos são os filósofos ingleses dos séculos XVI ao XVIII,
chamados, por isso, de empiristas ingleses: Francis Bacon, John Locke, George
Berkeley e David Hume.
Na verdade, o empirismo é uma característica muito marcante da filosofia inglesa.
Na Idade Média, por exemplo, filósofos importantes como Roger Bacon e Guilherme de
Ockham eram empiristas; em nossos dias, Bertrand Russell foi um empirista.
Que dizem os empiristas?
Nossos conhecimentos começam com a experiência dos sentidos, isto é, com as
sensações. Os objectos exteriores excitam nossos órgãos dos sentidos e vemos cores,
sentimos sabores e odores, ouvimos sons, sentimos a diferença entre o áspero e o liso, o
quente e o frio, etc.
As sensações se reúnem e formam uma percepção; ou seja, percebemos uma única
coisa ou um único objecto que nos chegou por meio de várias e diferentes sensações.
Assim, vejo uma cor vermelha e uma forma arredondada, aspiro um perfume adocicado,
sinto a maciez e digo: quot;Percebo uma rosaquot;. A quot;rosaquot; é o resultado da reunião de várias
sensações diferentes num único objecto de percepção.
As percepções, por sua vez, se combinam ou se associam. A associação pode dar-
se por três motivos: por semelhança, por proximidade ou contiguidade espacial e por
sucessão temporal. A causa da associação das percepções é a repetição. Ou seja, de
tanto algumas sensações se repetirem por semelhança, ou de tanto se repetirem no
mesmo espaço ou próximas umas das outras, ou, enfim, de tanto se repetirem
sucessivamente no tempo, criamos o hábito de associá-las. Essas associações são as
ideias.
As ideias, trazidas pela experiência, isto é, pela sensação, pela percepção e pelo
hábito, são levadas à memória e, de lá, a razão as apanha para formar os pensamentos.
A experiência escreve e grava em nosso espírito as ideias, e a razão irá associá-
las, combiná-las ou separá-las, formando todos os nossos pensamentos. Por isso, David
Hume dirá que a razão é o hábito de associar ideias, seja por semelhança, seja por
diferença.
O exemplo mais importante (por causa das consequências futuras) oferecido por
Hume para mostrar como formamos hábitos racionais é o da origem do princípio da
causalidade (razão suficiente).
A experiência me mostra, todos os dias, que, se eu puser um líquido num
recipiente e levar ao fogo, esse líquido ferverá, saindo do recipiente sob a forma de
vapor. Se o recipiente estiver totalmente fechado e eu o destampar, receberei um bafo de
vapor, como se o recipiente tivesse ficado pequeno para conter o líquido.
A experiência também me mostra, todo o tempo, que se eu puser um objecto
sólido (um pedaço de vela, um pedaço de ferro) no calor do fogo, não só ele se
derreterá, mas também passará a ocupar um espaço muito maior no interior do
recipiente. A experiência também repete constantemente para mim a possibilidade que
tenho de retirar um objecto preso dentro de um outro, se eu aquecer este último, pois,
aquecido, ele solta o que estava preso no seu interior, parecendo alargar-se e aumentar
de tamanho.
Experiências desse tipo, à medida que vão se repetindo sempre da mesma
maneira, vão criando em mim o hábito de associar o calor com certos fatos. Adquiro o
hábito de perceber o calor e, em seguida, um fato igual ou semelhante a outros que já
percebi inúmeras vezes. E isso me leva a dizer: quot;O calor é a causa desses fatosquot;. Como
os fatos são de aumento do volume ou da dimensão dos corpos submetidos ao calor,
acabo concluindo: quot;O calor é a causa da dilatação dos corposquot; e também quot;A dilatação
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3. dos corpos é o efeito do calorquot;. É assim, diz Hume, que nascem as ciências. São elas,
portanto, hábito de associar ideias, em consequência das repetições da experiência.
Ora, ao mostrar como se forma o princípio da causalidade, Hume não está dizendo
apenas que as ideias da razão se originam da experiência, mas está afirmando também
que os próprios princípios da racionalidade são derivados da experiência.
Mais do que isso. A razão pretende, através de seus princípios, seus
procedimentos e suas ideias, alcançar a realidade em seus aspectos universais e
necessários. Em outras palavras, pretende conhecer a realidade tal como é em si mesma,
considerando que o que conhece vale como verdade para todos os tempos e lugares
(universalidade) e indica como as coisas são e como não poderiam, de modo algum, ser
de outra maneira (necessidade).
Ora, Hume torna impossível tanto a universalidade quanto a necessidade
pretendidas pela razão. O universal é apenas um nome ou uma palavra geral que usamos
para nos referirmos à repetição de semelhanças percebidas e associadas. O necessário é
apenas o nome ou uma palavra geral que usamos para nos referirmos à repetição das
percepções sucessivas no tempo. O universal, o necessário, a causalidade são meros
hábitos psíquicos.
(…)
RESUMINDO...
Do lado do inatismo, o problema pode ser formulado da seguinte maneira: como
são inatos, as ideias e os princípios da razão são verdades intemporais que nenhuma
experiência nova poderá modificar.
Ora, a História (social, política, científica e filosófica) mostra que ideias tidas
como verdadeiras e universais não possuíam essa validade e foram substituídas por
outras. Mas, por definição, uma ideia inata é sempre verdadeira e não pode ser
substituída por outra. Se for substituída, então não era uma ideia verdadeira e, não sendo
uma ideia verdadeira, não era inata.
Do lado do empirismo, o problema pode ser formulado da seguinte maneira: a
racionalidade ocidental só foi possível porque a Filosofia e as ciências demonstraram
que a razão é capaz de alcançar a universalidade e a necessidade que governam a
própria realidade, isto é, as leis racionais que governam a Natureza, a sociedade, a
moral, a política.
Ora, a marca própria da experiência é a de ser sempre individual, particular e
subjectiva. Se o conhecimento racional for apenas a generalização e a repetição para
todos os seres humanos de seus estados psicológicos, derivados de suas experiências,
então o que chamamos de Filosofia, de ciência, de ética, etc. são nomes gerais para
hábitos psíquicos e não um conhecimento racional verdadeiro de toda a realidade, tanto
a realidade natural quanto a humana.
Problemas dessa natureza, frequentes na história da Filosofia, suscitam,
periodicamente, o aparecimento de uma corrente filosófica conhecida como cepticismo,
para o qual a razão humana é incapaz de conhecer a realidade e por isso deve renunciar
à verdade. O céptico sempre manifesta explicitamente dúvidas toda vez que a razão
tenha pretensão ao conhecimento verdadeiro do real”.
Adaptação feita a partir de Chauí, M. (2000). A razão: inata ou adquirida? In Convite à
Filosofia. São Paulo: Ed. Ática. Retirado em Janeiro 21, 2009 de
http://www.geocities.com/discursus/javanes/inadqui.html
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