Este documento faz uma revisão da literatura sobre o sucesso do tratamento endodôntico associado ao uso de medicação intracanal. A medicação à base de hidróxido de cálcio e clorexidina tem eficácia antimicrobiana comprovada, porém estudos demonstram que o sucesso a longo prazo não depende necessariamente do uso de medicação intracanal. A escolha do profissional deve levar em conta as evidências científicas mais atuais.
1. MEDICAÇÃO INTRACANAL E
SUCESSO ENDODÔNTICO
(Revisão de Literatura )
MARQUES, Maria Eduarda Pinto Galdino 1; LOPES, André Coelho;
SILVA, Lília Machado de Andrade 1; INOJOSA ,Inês de Fátima de A.
J. 2
1 Graduandos em Odontologia da Universidade Federal de Alagoas; ² Dra. em Endodontia e professora Adjunto
IV da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de AL
2. Introdução
• A eliminação dos microrganismos de canais radiculares infectados é uma
constante preocupação e o principal objetivo da fase de limpeza . No
entanto, após a instrumentação de dentes com necrose pulpar infecciosa
este não é alcançado em sua plenitude, pelo fato da
mesma propiciar uma redução ao invés da eliminação da microbiota do
sistema de canais. Assim, o emprego de uma medicação intracanal com
propriedades antimicrobianas entre as sessões de tratamento visa, dentre
outros objetivos, reduzir ao máximo o número de microrganismos que
sobreviveram ao preparo químico mecânico, na expectativa de que seu
uso leve a um aumento da incidência do sucesso endodôntico.
3. Dentre estes, o hidróxido de cálcio (HC) e a clorexidina (CLX), por
apresentarem atividade antimicrobiana cientificamente
comprovada, têm merecido destaque no uso clínico. Entretanto, nos
últimos tempos a necessidade da medicação intracanal com
exclusiva finalidade antimicrobiana é motivo de controvérsias
quando correlacionada ao sucesso endodôntico (1,2).
Diante disto, este trabalho realizou uma revisão de literatura
baseada em evidências clínicas, objetivando correlacionar o
sucesso endodôntico com o uso da medicação intracanal, além
de informar quais os tipos e formas de associações do HC e da
CLX mais eficazes como medicamento tópico antimicrobiano na
prática endodôntica.
4. Revisão de Literatura
• Atualmente com o advento de técnicas de microbiologia
molecular , diversos estudos clínicos comprovam que o emprego
da medicação intracanal em forma de pasta de HC associada a
veículos biologicamente ativos (paramonoclorofenolcanforado –
PMCC-ou clx a 2% líquida ou gel ) ou inativos (água destilada,
propilenoglicol) , eleva significativamente a redução da
microbiota após o preparo químico mecânico de canais de
dentes com lesão perirradicular.
5. Revisão de Literatura
• Em relação ao sucesso, estudos in vivo demonstram que a longo prazo os
índices obtidos são similares quando se compara tratamentos
realizados em sessão única com os que utilizam medicação intracanal,
afirmando que a escolha de protocolos terapêuticos que propiciam
estratégias antimicrobianas, como emprego da patência foraminal,
diâmetro apical adequado, irrigação frequente e abundante com
substância química dotada de atividade antimicrobiana , seguido da
obturação na mesma sessão, são capazes de obter percentuais de êxito
similares e sem diferenças significativas quando comparados aos dos
protocolos que preconizam , dentre as estratégias antimicrobianas, o
emprego da medicação intracanal entre sessões (Tabela 1) (3-6).
6. Tabela 1-Sucesso Sessão Única Ca(OH)2 Ca(OH)2/
x Medicação (HC) Clorexid.
(Evidência
Clínica)
Parede s-Vieyra , 141/ 146 121/136
Jimenez E (96.57%)a (88.97%)a
( 2012)5 Pasta de HC
2 anos após
Penesis V A et al 22/33 (67%)a 21/30 (70%) a
(2008) 4 HC / Clx líquida a 2%
1 ano após
Siqueira Jr. et al 75/100
( 2008)6 (75%)
1-4 anos após HC / PMCC
Molander et al 32/49 30/40
(2007)3 (65%) a (75%) a
2 anos após Pasta de HC
7. Revisão de Literatura
• Entretanto, ao analisar in vivo a condição microbiológica do
sistema de canais de raízes mesiais de molares inferiores
tratados em sessão única e em duas sessões empregando
medicação por 7 dias (HC e água destilada) , concluiu-se
mediante os resultados que para maximizar a redução
microbiana é necessário o emprego de uma medicação
tópica antimicrobiana antes da obturação do canal radicular
(Tabela 2 e Figuras 1 e 2) (7).
8. Tabela 2- Histomicrobiologia de canais tratados em 1 2
sessão única e com pasta de HC /água destilada . Sessão Sessões
Estudo in vivo Jorge Veral et al (2012)7 n % n %
Total de dentes tratados 6 100 7 100
Dentes com microorganismos residuais 6 100 5 71
Canais MV com microorganismos residuais 3 50 1 14
Canais ML com microorganismos residuais 4 67 2 29
Dentes com microorganismos residuais em istmus 5 83 4 57
Dentes com microorganismos residuais nos túbulos 5 83 0 0
dentinários nas proximidades do canal principal
Dentes com microorganismos residuais nas 4 67 2 29
ramificações apicais
9. FIGURA 1 SESSÃO ÚNICA. (A)
Primeiro molar inferior de paciente
de 30 anos (B) Radiografia após
obturação . (C) Radiografia após
extração. (D)Dente diafanizado . (E)
Corte em terço médio na linha 1
(D). Istmo amplo contendo material
de obturação entre os canais e
extensão lingual do CML (seta)
(Brown & Brenn stain; ×16). (F)
Detalhe do CML. Massa de debris
necróticos colonizados por
bactérias ocupam a porção central
do canal junto com material
obturador. ( ×50; ×400). (G)
Detalhe do istmo (E) (×50). (H)
Aumento da area indicada pela seta
superior em (G). Biofime cobrindo
a dentina de istmo (×400). (I)
Aumento da area oposta a parede
do istmo indicado na seta inferior
em (G). Além do biofilme na parede
dentinária , bactérias colonizando
túbulos de dentina (×400). 7
10. FIGURA 2 SESSÕES.(A).Primeiro
molar inferior (B) Radiografia pós
obturação. (C) Diafanização .Os 2
canais unem-se . (D) Corte terço
médio linha 1 em (C)].Canais
preparados com presença de
istmo. Aumento da área do istmo
visto na seta. Biofilme bacteriano
cobre área irregular (Brown &
Brenn stain; ×16; ×400). (E) Corte
entre terço médio e apical na linha
2 em (C) (×16). (F) Aumento do
CML . As paredes estão limpas e
sem bactérias (×50). (G) Corte
realizado na linha 3 em (C), apical
à união (×16). (H) Detalhe do
canal. Grande parte do canal está
coberto por debris (, ×50). (I)
Aumento da área indicada na seta
em H . Os debris estão cobertos
pelo material obturador
remanescente , não sendo
observado bactérias (×400). 7
11. Revisão de Literatura
• O veículo pode influenciar na capacidade de ação do
HC bem como na sua dissociação iônica e difusão.
Veículos aquosos proporcionam melhor ação
antimicrobiana e biológica, por permitir maior velocidade
de dissociação e difusão.
• Com anestésico a estabilização ocorre em menor
tempo, apresentando elevado pH e a melhor relação
entre tempo de estabilização e liberação de hidroxilas .
12. Revisão de Literatura
• Pastas com soro fisiológico e água destilada
apresentam maior pH e maior concentração iônica,
porém elevado tempo de estabilização.
• O óleo de oliva proporciona os menores índices de pH.
No entanto, a pasta de HC /PMCC apresenta maior
espectro de atividade antimicrobiana e maior raio de
atuação quando comparada as pastas em veículos
biologicamente inertes (8) .
13. Revisão de Literatura
• Uma pasta a base de gel de CLX 0,2-2%/HC vem
sendo utilizada com bons resultados clínicos. No
entanto, devido à estrutura molecular da CLX e aos
níveis elevados de pH promovidos pelo HC , há indícios
de risco sistêmico na sua utilização por causa da
provável decomposição da clorexidina em radicais livres
e para-cloroanilina que está classificada como possível
agente carcinogênico em humanos pela IARC (9).
14. Considerações Finais
• A escolha pelo uso e tipo de medicação tópica
na terapia endodôntica radical nos dias atuais
depende do conhecimento das evidências
científicas e do bom senso clínico do
profissional que não permite que a mente
permaneça fechada às novas tendências
clínicas.
15. Referências Bibliográficas
• 1. Siqueira Jr, Magalhaes Karen, Roças Isabela. Bacterial Reduction in Infected Canals Root Canals Treated With 2.5% NaOCl as an
Irrigant and Calcium Hydroxide/Camphorated Paramonochlorophenol Paste as an Intracanal Dressing J Endod 2007;33:667–672)
• 2. Siqueira Jr, Roças Isabela. In vivo antimicrobial effects of endodontic treatment procedures as assessed by molecular microbiologic
techniques. J Endod 2011 37(3):304-10
• 3-Molander A, Warfvinge J, Reit C, Kvist T. Clinical and radiographic evaluation of one and two-visit endodontic treatment of
asymptomatic necrotic teeth with apical periodontitis: a randomized clinical trial. J Endod 2007;33:1145– 8.
• 4-Penesis et al. Outcome of One-visit and Two-visit EndodonticTreatment of Necrotic Teeth with Apical Periodontitis: A Randomized
Controlled Trial with One-year Evaluation JEndod 2008;34:251–257
• 5-Paredes-Vieyra J, Enriquez FJJ Success Rate of Single- versus Two-visit Root Canal Treatment of Teeth with Apical Periodontitis: A
Randomized Controlled Trial Endod 2012;38:1164–1169
• 6-Siqueira Jr JF , Roças IN, Riche FNSJ , Provenzano JC,Clinical outcome of the endodontic treatment of teeth with apical periodontitis
using an antimicrobial protocol Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 2008;106:757-62
• 7-Vera J, Siqueira Jr, Ricucci D, Loghin S, Fernandes N, Flores B, Cruz AG . One- versus Two-visit Endodontic Treatment of Teeth with
Apical Periodontitis: A Histobacteriologic Study J Endod 2012;38:1040–1052)
• 8-Lopes Helio, Siqueira Jr , Roças Isabela. Medicação intra-canal IN: Endodontia Biologia e Técnica . 3 ed. Guanabara Koogan : Rio de
Janeiro .2010
• 9- Barbin, Eduardo Luiz. Análise Clínica da Clorexidina misturada ou não ao Hidróxido de Cálcio. Tese de Doutorado, apresentada à
Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FORP-USP). Ribeirão Preto, 2008