1. Entrevista PAULO PAPALEO
“Nada na vida vem fácil”
GABRIELA GUNDIM E VITOR SILVEIRA
O artista afirma que nunca teve que fazer projetos ou ser amigo de pessoas famosas
para obter sucesso e relata nunca ter tido um produtor que o colocasse na mídia
O
paulista de 23 anos é o atual diretor
“
executivo, artistico, e o produtor
da “Mundo Pensante”, uma pro- Meu trabalho
dutora cultural que ele idealizou. É
fotógrafo, músico e fundador da banda sempre foi
Loungetude46, artista plástico e forma-
do em design pela faculdade Belas Ar- independente. Sempre
tes. Como fotógrafo realizou, em 2010,
uma exposição no SESC Consolação fui minha produtora
chamada “Corpos em Movimento”.
Junto à sua banda fará, neste mês, uma e fiz minhas próprias
”
turnê pela Europa, onde, provavelmen-
te, ocorrerá o lançamento do segundo
álbum da banda, um CD Livro. O mul-
divulgações
tiartista alega que seu trabalho sempre
foi feito de maneira independente, que
sempre foi seu produtor e sempre fez to-
das as divulgações dos seus trabalhos.O
Filho do astrólogo Robson Papaleo
afirma também, que hoje em dia, existe
uma “mídia contaminada”, onde o único
interesse é o dinheiro.
Como você se tornou seu pro-
dutor? Eu nunca fui amiguinho, nem
nunca tive projetos com o filho do
Gilberto Gil, ou com algum filho do
Caetano Veloso para conseguir o su-
cesso de maneira mais fácil. Não diria
que mais fácil, mas por um produto
de questões que, de uma maneira ou
outra, pule algumas etapas. Eu já tive
muitas bandas antes do Loungetu-
de46. Já viajei o Brasil inteiro tocando
com banda de samba rock, tive banda
de reggae com um monte de rastafári,
enfim, não deu certo. Nunca tive um
produtor que fosse um “cara” que
me colocasse de uma maneira muito
direta e objetiva no mercado da mídia.
Por conta de começar do zero, um
trabalho independente. Então eu sem-
pre tive essa necessidade. Sempre fui
minha produtora e sempre fiz minhas
próprias divulgações. A produtora foi
VITOR SILVEIRA
só uma conseqüência disso.
Você e sua banda farão uma tur-
nê na Europa. Qual o segredo
veja/universidade cruzeiro do sul I 03 DE JUNHO, 2011 I 17
2. Entrevista PAULO PAPALEO
de tanto sucesso?Desde o começo
nós da banda fizemos nossa própria
divulgação, tentamos ser indepen-
“Hoje em dia, em Movimento”, no SESC Con-
solação.Qual foi a repercussão
do púbico? Essa exposição foi um
dentes como se nossa produtora fosse
muito grande. Nosso material de apre-
CD não dá dinheiro. convite do SESC Consolação, para
um trabalho de fotografia de mulheres
sentação sempre foi muito alinhado
com nossa proposta. Lançamos um
Uma pessoa que eu estava desenvolvendo. Foi um
trabalho sensacional, que teve uma
CD Livro, mandamos todo material
para uma avaliação em um festival na
que o compra, repercussão muito boa. Foi a primei-
ra experiência que eu tive em fazer
França e acabamos sendo convidados.
Por ter conseguido fechar um show disponibiliza um projeto em grande escala, com
patrocínio, com uma visibilidade tão
nesse festival, conseguimos fechar
outras 19 apresentações pela Europa. todas as músicas grande. Com certeza haverá outras
exposições.
Mas o verdadeiro segredo é pegar
uma panela jogar 7 paulistanos, mexer do álbum Você pretende realizar algu-
bastante, jogar muito trabalho e “sai ma exposição durante este
um bolo”. para ano?Ano passado fiz uma viagem
pela América do Sul e pretendo nesse
Como surgiu a idéia de lançar qualquer um ano ou ano que vem fazer uma expo-
o segundo álbum como um CD sição com esse material que tem algu-
Livro? Todos nós somos artistas gratuitamente mas cenas bem fortes e bonitas, que
visuais. Eu, a cantora e o baixista so-
mos artistas plásticos, eu também sou
designer gráfico, seria um desperdício
na internet ” as pessoas nem imaginam que estão
tão perto da gente. Às vezes pensamos
que precisamos nos deslocar para a
fazermos nosso trabalho só para um Europa para ver uma paisagem bonita,
CD, porque hoje em dia, CD não dá sicais do Loungetude46? Cada mas esquecemos que aqui na América
dinheiro. Uma pessoa que o compra, músico traz um pouco de si. Eu trago do Sul tem coisas maravilhosas, por
disponibiliza todas as músicas do muita coisa do “funk” e do Jazz, muito menos dinheiro e muito mais
álbum para qualquer um gratuitamen- outros integrantes trazem coisas de aprendizado.
te na internet. Então ninguém mais música clássica e da música popular.
compra. Portanto, buscamos agregar Sempre fizemos o processo criativo O que é a Mundo Pensante?
um valor comercial ao nosso traba- muito democraticamente e acaba sen- Aos quinze anos de idade tive a idéia
lho através de outras saídas além da do essa mistura “louca” que a gente só de fazer uma produtora cultural com
música, então colocamos o valor da entende o que é quando já está pronta, meus amigos, aos dezoito anos parti-
arte visual, da peça gráfica, de ser um nunca temos a pretensão de fazer uma cipava de várias bandas. Uma banda
livro. Nós produzimos esse livro com música diferente, acaba sendo diferen- de reggae, outra de samba rock e já
dinheiro do nosso bolso e gravamos te naturalmente. tocava na noite. Criei então, um meio
o CD no nosso próprio estúdio. Nós para divulgar meus trabalhos que
gravamos e fizemos todo o material Seus shows são bem performá- levou o nome de “Mundo Pensante”.
de forma independente. ticos e diferentes. De onde vem Passei a divulgar bandas de amigos,
essa inspiração? No começo coisas relacionadas à arte. Com o tem-
Quando acontecerá o lança- não era uma banda, nós éramos um po esse “meio” foi se tornando uma
mento do CD Livro? Nós o lança- coletivo de arte e tínhamos artistas produtora, mas sem ter um espaço fí-
remos na Europa, durante nossa turnê plásticos e dançarinos, que faziam sico. Em 2009, junto com dois sócios
e o lançamento em São Paulo ficará performances junto com a música. Os consegui uma sede. Agora realizamos
só para o segundo semestre. Enquanto artistas plásticos pintavam enquanto nossos próprios eventos, nossas ações
isso faremos pré-lançamentos aqui na o show acontecia, mas com o tempo e projetos de maneira mais consisten-
capital em shows bem bacanas. a música foi tomando mais corpo e se te, em nossa “casa”.
tornou nosso carro forte. Nos torna-
Como surgiu o nome da ban- mos uma banda com o tempo. Por Qual o público alvo da Mundo
da? A partir do fato de todos sermos sermos multiartistas, sempre tivemos Pensante? Pessoas que busquem
paulistanos e gostarmos muito de São interesse por outras áreas artísticas, arte de um modo geral, porque o
Paulo, nosso tema e proposta para mas atualmente precisamos ser mais paulistano está muito mal acostumado
trabalhar sempre foi a cidade, que banda, por uma questão até de mo- com a arte. Nós vemos uma molecada
está posicionada geograficamente na bilidade e comercialização do nosso que diz gostar de Jazz, mas quando
latitude 23 e longitude 46. trabalho. chega na hora de sair para ver um
programa cultural, não vão. O “cara”
Quais são as referências mu- Você fez a exposição “Corpos gasta cinquenta reais para tomar uma
18 I 03 DE JUNHO, 2011 I veja/universidade cruzeiro do sul
3. cerveja, pagando vinte reais para as-
sistir um um couvert artístico de uma
banda, mas não paga cinquenta reais
“Se hoje, o ‘Restart’ que falta tudo no Brasil culturalmente
falando. Estamos num deserto muito
complicado e os artistas que são bons
para ver um verdadeiro show, por-
que é muito caro.Buscamos clientes
está na televisão se acomodam muito à lei de incentivo
para trabalhar. O pessoal que traba-
corporativos, que contratem artistas
de qualidade para eventos. Já tive-
é porque lha com arte alternativa aqui em São
Paulo e no Brasil é muito acomodado
mos exposições de arte ou grafiteiros
contratados para fazer um trabalho
a TV prioriza a isso. É bom porque tem um dinheiro
do governo que financia e é ruim ao
durante um evento corporativo. São
pessoas que estejam buscando uma o dinheiro mesmo tempo porque fica só nesse
dinheiro. A mídia está totalmente
arte que prioriza a arte mesmo, porque
hoje em dia tem uma arte que prioriza que é gerado contaminada por outras coisas que são
dadas por contatos e indicações. Na
o dinheiro. Se hoje o ‘Restart’ está mídia o que mais importa é o dinhei-
na Televisão é porque a TV prioriza o pelo produto, ro.
dinheiro que é gerado pelo produto e
não pela qualidade que o produto tem. não pela Seu pai influenciou suas esco-
lhas e idealizações? Totalmen-
Todos os cursos que vocês qualidade te. O fato de ter um pai astrólogo
oferecem são realizados aqui me ajudou desde pequeno a ter um
mesmo? Sim, são realizados aqui que o produto incentivo para todas as coisas que
no nosso espaço. Mas não são cur-
sos apenas relacionados à arte, são
também relacionados à filosofia, a
tem ” eu sempre tive tendência, afinidade
e sempre tive um apoio muito com-
preendido nesse sentido. Por ser um
oficinas de criatividade, coisas que, artista desde pequeno, ele sempre me
de uma maneira indireta ou direta, seriam totalmente diferentes do que incentivou a ser mesmo um artista. Eu
contribuem para a arte, para a mente e são atualmente. nunca tive dúvida com relação ao que
para o espírito. eu fosse fazer da minha vida. Sabia
Faltam ações beneficentes no que seria arte. E nesse sentido, talvez
A Mundo Pensante tem parceria Brasil? Com toda certeza. O gover- astrologicamente, tenha me ajudado a
com grandes nomes. Como vo- no fica investindo milhões para sediar só perceber mais minhas idealizações
cês alcançaram esse patamar? uma Copa do Mundo e uma Olimpia- e projetos de vida. Mas meu pai é um
A Hering foi nossa parceira a partir da, mas esquece uma de suas funções pai normal como todos os outros, que
de um evento beneficente, um festival principais, a de melhorar a situação ensina, mas também cobra.
de música que fizemos para arrecadar de vida da população brasileira. Têm
fundos para São Luís do Paraitinga, muitas pessoas que precisam de ajuda, A divulgação dos seus traba-
porque lá houve uma catástrofe que que necessitam de um apoio. Não lhos é toda feita só pela internet
inundou a cidade. Entramos em conta- pode um país tão evoluído ter pessoas e por você?Por enquanto sim. De-
to com a Hering, que apoiou o evento, passando fome, passando sede, ou senvolvemos a divulgação do trabalho
de imediato, ajudando na produção que nem tem uma moradia. É triste através do Facebook, doTwitter e do
e nesse sentido, abrimos um canal ver que, com toda esta situação, os Myspace. Temos um mailing de 150
com eles e até hoje temos um conta- eventos beneficentes são raros. mil e-mails através dos quais faze-
to. Tem a parceria com a faculdade mos divulgação, mas é que mailing é
Belas Artes. Por ser formado na Belas O que é cultura para você? A uma coisa que não se usa, como era
Artes e ter um projeto que dissemina cultura é um consenso que parte dos usado em nossa primeira divulgação
cultura, a faculdade sempre me deu princípios individuais de cada socie- por conta, na qual ficavamos incomo-
maior apoio para divulgar, dentro da dade. No Brasil, temos uma cultura, dando muitas pessoas com spams e
faculdade, meus projetos. o Islã tem outra. Tudo depende dos não queremos ser lembrados assim.
princípios que são inseridos em cada A parte gráfica impressa é uma coisa
Como foi fazer este evento sociedade. A cultura, querendo ou que também estamos deixando um
beneficente para São Luis do não, é poder. Temos que entender pouco de lado, usamos só quando é
Paraitinga? Foi maravilhoso. É tão e penetrar por todos os nichos de muito necessário, por conta de lixo.
bom fazer algo pelo próximo. Lá as conhecimento, sejam eles desde o Não queremos fazer muito lixo e não
pessoas perderam muito, praticamen- Calypso até o Jazz mais específico. tem sentido ficarmos fazendo uma
te tudo, do pouco que tinham. Ajudar Cultura é isso, cultura é geral. produção gráfica com 15 mil flyers,
pessoas é muito gratificante, se cada sendo que só mil serão entregues às
um pensasse em ajudar, cada vez Como você avalia o atual ce- pessoas e metade será jogado fora. A
mais , o próximo o Brasil e o mundo nário cultural brasileiro? Acho gente não quer fazer lixo, não a gente.
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