[1] O Pseudo-Dionísio foi um influente teólogo medieval cujos escritos foram dominados pelo neoplatonismo e defendiam uma visão mística e transcendente de Deus. [2] Ele propôs três estágios para a aproximação da alma com Deus - purificação, iluminação e união - e defendia uma hierarquia celestial e eclesiástica. [3] Embora tenha tido grande influência, sua cristologia é criticada por desvalorizar a humanidade de Cristo e por propor uma visão dualista do ser
1. História do Pensamento Cristão
Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita
1. INTRODUÇÃO:
O nome Dionísio Areopagita vem de At. 17.34 (ARA):
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Quando ouviram falar de ressurreição de mortos, uns escarneceram, e
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outros disseram: A respeito disso te ouviremos noutra ocasião. A essa
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altura, Paulo se retirou do meio deles. Houve, porém, alguns homens que
se agregaram a ele e creram; entre eles estava Dionísio, o areopagita, uma
mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros mais.
Este Dionísio foi um dos que se converteram por intermédio do ministério do
Apóstolo Paulo. Naturalmente, o Pseudo Dionísio que trataremos aqui1 não era um
crente do século II, mas um teólogo medieval, que é mais conhecido como Pseudo
Dionísio por ter usado o pseudônimo do discípulo ateniense de Paulo. Seus escritos
circularam por cerca do ano 500 d.C e alguns postulam que ele viveu na Síria ou
perto dela no período medieval. Informações a respeito de sua família, e etc. não
foram encontradas.
Justo Gonzalez afirma que dentro da Idade Média Pseudo Dionísio exerceu
grande influência teológica, seja ela negativa ou positiva (na opinião dele mais
negativa). Ele diz que: “O mais influente teólogo oriental durante o período entre o
quarto e o sexto concílios – „CALCEDÔNIA (451), CONSTANTINPLA II (553),
CONTANTINOPLA III (680-681)‟2 –, foi sem dúvida alguma, o que publicou seus
trabalhos sob o pseudônimo Dionísio, o Areopagita”.
Por muitos séculos os pensadores acreditaram que os escritos do falso
Dionísio vinham do próprio discípulo grego do Apóstolo Paulo. Antes do século XV
não foi questionada a sua autoria o que corroborou para sérias implicações
1
Para esta pesquisa foram utilizadas as seguintes obras: LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1).
São Paulo: Abba Press, 2000, p. 86-88; GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão
(vol. 2). São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 90-93; GONZÁLEZ, Justo L. Dionísio Areopagita.
Dicionário Ilustrado dos Intérpretes da fé. Santo André: Academia Cristã, 2005, p. 220-222.
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BETTENSON, Henry (Ed.) Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: ASTE, 1967, p. 438
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Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita
teológicas na Idade Média, duas muito sérias: 1. A autoridade de seus escritos só
era inferior ao próprio Novo Testamento; 2. Como esse autor era Neoplatonista,
seus escritos contribuíram consideravelmente para a influência neoplatônica na
teologia cristã medieval.
Seu pensamento foi tão forte que muitos teólogos chegaram a pensar que o
neoplatonismo era parte da filosofia própria das Escrituras, o que, naturalmente
invalidava outras correntes filosóficas como o aristotelismo, que foi reintroduzido na
Europa ocidental nos sécs. XII e XIII.
2. O PENSAMENTO DO PSEUDO DIONÍSIO.
Neoplatonismo. Já dissemos que o seu pensamento estava mergulhado no
Neoplatonismo e uma teologia profundamente mística, isso significa a aceitação da
natureza incorpórea, mística e transcendente de Deus que não tem contato com o
mundo e a alma como a realidade última do mesmo em contraste com o seu corpo
explicando a existência do mal. Para o Pseudo Dionísio Deus é totalmente
impossível de ser conhecido. Deus transcende totalmente toda categoria do
pensamento humano.
Obras Principais.
1. Nomes Divinos, discute os nomes bíblicos para Deus e a sua natureza
transcendente;
2. Teologia Mística, discursa sobre a união mística da alma humana com Deus;
3. Hierarquia Celestial, debate a natureza dos anjos, que são divididos em uma
hierarquia de nove coros, três a três (como a Trindade): Serafins, Querubins e
Tronos; Domínios, Virtudes e Poderes; Principados, Arcanjos e Anjos;
4. Hierarquia Eclesiástica, apresenta a igreja como a imagem do mundo celestial
e como ele, como uma hierarquia. Nesta obra Dionísio diz que há três ordens de
ministros: bispo, sacerdote e diácono; e três ordens de níveis mais baixos: monge,
leigo e catecúmeno. Também há três sacramentos: batismo, eucaristia e
confirmação (Crisma); e três estágios para Deus: purificação, iluminação, união.
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3. História do Pensamento Cristão
Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita
“Os Três Caminhos”. É importante ressaltar uma doutrina que o Pseudo
Dionísio formulou chamada de três estágios ou três caminhos. Esta doutrina tinha
como objetivo a aproximação da alma com a transcendência Divina, segue os
estágios:
a) Purificação. A alma é livre de sua impureza.
b) Iluminador. A alma recebe a luz divina.
c) Unificador. A alma é unida a Deus em uma visão estática
(contemplação e abismada) – uma visão que, por causa da absoluta transcendência
de Deus, não é “abrangente”, mas, ao invés, “intuitiva”.
A alma quando passa por estes três estágios é socorrida pelas várias
hierarquias. Elas fazem isso por meio dos sacramentos. Gonzalez afirma de maneira
satírica que: “se esta fosse a totalidade do pensamento do Pseudo Dionísio, seria
difícil chamá-lo de cristão”3.
Humanidade de Cristo. Dionísio também tem uma interpretação
Neoplatonista e muito controvertida a respeito da humanidade de Cristo. Tem-se a
impressão de que ele pensava que a humanidade foi absorvida pela divindade, de
tal forma que, depois da encarnação, não se pode mais falar de uma natureza
humana no salvador.
Por essas e outras razões, Dionísio foi acusado de monofisismo, o que
significa negar totalmente a existência de uma natureza humana em Cristo. Embora
ele mesmo não declare isso, dizer que sua cristologia é muito parecida com essa
idéia tem muito fundamento.
3
; GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão (vol. 2). São Paulo: Cultura Cristã,
2004, p. 92.
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Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita
Abordagem Apofática. Outro aspecto da teologia do Pseudo Dionísio é a
sua abordagem apofática à teologia. Em seu livro Nomes Divinos ele faz a seguinte
declaração:
Deus é maior que toda razão e todo conhecimento e tem sua firme
habitação completamente além da Mente e do Ser... e não pode ser
alcançado por nenhuma percepção, imaginação, conjectura, nome,
discurso, apresentação ou compreensão... É impossível descrever ou
conceber em sua natureza última... Os místicos sendo deificados e unidos,
através do cessar de suas atividades naturais, à Luz que ultrapassa a
Deidade, não pode encontrar mais nenhum método adequado para celebrar
seu louvor do que negá-lo de toda sorte de atributo.4
O que ele quer dizer nesta declaração é que só se pode falar de Deus
apofaticamente, ou seja, em sentido negativo, dizendo o que Deus não é. Quando
você exclui Deus da imanência, de sua relação com o mundo criado sua alma torna-
se una com Deus. Isso pode ser feito através do silêncio da oração que é um
mistério onde a Luz se revela.
3. PSEUDO DIONÍSIO PARA OS DIAS DE HOJE
Para concluirmos quero expor como algumas ideias do Pseudo Dionísio que
julgo serem erradas (aspectos negativos) e em segunda estância seus pontos que
podem ser reaplicáveis aos nossos dias (aspectos positivos).
NEGATIVOS:
1. Sua Cristologia desvaloriza a humanidade de Cristo em detrimento de
sua divindade; o Jesus encarnado é praticamente excluído de sua teologia. Isso,
quer dizer nas entrelinhas que Deus é pouquíssimo pessoal e mais abstrato, o que é
uma contradição da fé judaico-cristã. Um Deus longe do ser humano, é mais uma
ideia que uma Pessoa.
2. Sua proposta de relacionamento com Deus por meio da alma é
completamente neoplatônica e nada tem a ver com a espiritualidade judaico-cristã
que pensa o ser humano integralmente tributado (mente, emoções, corpo, alma,
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LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1). São Paulo: Abba Press, 2000, p. 88.
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5. História do Pensamento Cristão
Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita
relacionamentos, vontade) a Deus. Toda teologia que considera o ser humano
apenas como alma, ou desconsidera a ressurreição escatológica do corpo concorda
com esta visão dualista do ser humano.
3. Seu pessimismo em relação aos atributos de Deus tem mais a ver com
o Mundo Das Idéias (Platão) do que com as Escrituras. A idéia de um Deus
incognoscível é um contra-senso na própria revelação de Deus. A história da fé
mostra o Deus que se revela e se encarna na história.
POSITIVOS:
1. Sua visão transcendente é importante, mas deve manter-se
equilibrada. É saudável uma teologia que diferencia o “ser” do homem em relação ao
“Ser” de Deus. Vivemos dias em que Deus se tornou um ídolo, algo feito por mãos
humanas. Na prática, falar sobre Deus tornou-se algo corriqueiro. E na própria
teologia lemos, vemos e ouvimos sobre “um deus” que vive para responder aos
meus caprichos; lemos também o deus di Teísmo Aberto que abandonou sua
Soberania para ser um deus puramente existencial (ou humano). Em relação a isso
ele está certo: Deus é Deus, nós somos homens. Entretanto, Deus é relacional e
não apenas um Ser plenamente “intocável”.
2. Sua visão de Hierarquia Eclesiástica implica em uma mentoria
espiritual, onde a santidade é vista não como uma busca pessoal-particular, mas
como um anseio coletivo. Porém faço algumas ressalvas:
I. No processo de santificação Deus provê uma hierarquia de pessoas
para nos conduzir a um relacionamento mais profundo com Deus, mas isso não
deve abrir espaço para níveis de superioridade ou inferioridade.
II. Utilização dos sacramentos para o crescimento espiritual dos crentes
com a ressalva do 3° sacramento da confirmação ou Crisma.
Sejam quais forem os demais aspectos positivos ou negativos do Pseudo
Dionísio, o fato é que ele teve uma ampla influência para a idade Média e foi um dos
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6. História do Pensamento Cristão
Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita
resgatadores da filosofia neoplatonista. Na história da Igreja ele foi considerado um
fiel intérprete da mensagem paulina.
Referências Bibliográficas:
BETTENSON, Henry (Ed.) Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: ASTE, 1967.
GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão (vol. 2). São Paulo:
Cultura Cristã, 2004.
GONZÁLEZ, Justo L. (Ed.) Dionísio Areopagita. Dicionário Ilustrado dos
Intérpretes da fé. Santo André: Academia Cristã, 2005.
LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1). São Paulo: Abba Press, 2000.
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