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UNIVERSIDADE PUBLICA
EM TEMPOS DE EXPANSAO
Thiago Ingrassia Pereira
ORGANIZADOR)
UNIVERSIDADE PUBLICA
EM TEMPOS DE EXPANSAO
Entre o vivido e o pensado
Erechim, 2014
© Os autores - Todos os direitos reservados - 2014
COLEÇÃO DEBATES DO PRÁXIS
Coordenação:
Thiago Ingrassia Pereira – UFFS
Conselho Editorial:
Jaime José Zitkoski – UFRGS
Leandro Raizer – IFRS
Bianca de Freitas Linhares – UFPel
Rafael Arenhaldt – Colégio de Aplicação (UFRGS)
Giovani Forgiarini Aiub – IFRS
Vilmar Alves Pereira – FURG
Mauro Meirelles – UNILASALLE
Douglas Santos Alves – UFFS
Luís Fernando Santos Corrêa da Silva – UFFS
Revisão:
Zoraia Aguiar Bittencourt – UFFS
GRUPO PRÁXIS
Licenciaturas
Modalidade Conexões de Saberes
http://petconexoesdesaberes-uffs.blogspot.com.br/
Universidade Federal da Fronteira Sul
Campus Erechim – RS
Apoio
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
U58 Universidade Pública em Tempos de Expansão – Entre o Vivido e o
Pensado / Organizador: Thiago Ingrassia Pereira. – Erechim :
Evangraf, 2014.
112 p.
ISBN 978-85-7727-601-1
1. PET Conexões. 2. Saberes. 3. Educação Popular. 4. Acesso ao
Ensino Superior. 5. Formação Docente. 6. Escola Pública. I. Pereira,
Thiago Ingrassia.
CDU 378
CDD 378
(Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo – CRB 10/1507)
SUMÁRIO
PREFÁCIO
Luís Fernando Santos Corrêa da Silva................................................7
ABRINDO O DIÁLOGO
Thiago Ingrassia Pereira..................................................................11
PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS CAMPUS ERECHIM
Marcelo Luis Ronsoni.......................................................................17
LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO: ESTUDANTES DO
CURSO DE PEDAGOGIA ENTRAM NO DEBATE SOBRE A
PRODUTIVIDADE DO TRABALHO COM TEXTOS NA UNIVERSIDADE
Zoraia Aguiar Bittencourt e Suzana Schwartz.................................33
METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA
Douglas Santos Alves......................................................................49
A PESQUISA COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NO GRUPO
PRÁXIS – PET/CONEXÕES DE SABERES
Thiago Ingrassia Pereira..................................................................61
DA ESCOLA PARA A UNIVERSIDADE: O NOVO PERFIL DO
ESTUDANTE DO ENSINO SUPERIOR
Fernanda May.................................................................................75
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
6
DESIGUALDADES ESCOLARES E SEUS REFLEXOS PARA A
DIVERSIDADE ÉTNICA E DE COR NA UFFS CAMPUS ERECHIM
Joviana Vedana da Rosa..................................................................87
EDUCAÇÃO SUPERIOR E SUAS INTERFACES: OS DESAFIOS DA
CLASSE TRABALHADORA
Daniel Gutierrez............................................................................101
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
7
PREFÁCIO
PREFÁCIO
Luís Fernando Santos Corrêa da Silva1
	
Diante das possibilidades de definição da universidade, institui-
ção formativa que produz e difunde saberes, me agrada a possibili-
dade de pensá-la como lugar permeado por desafios. Todos nós, que
cotidianamente dedicamos parte significativa do nosso tempo e de
nossas vidas ao “fazer universitário”, estamos imbuídos de desafios,
sejam eles individuais ou coletivamente partilhados. Nos corredores e
nas salas das instituições universitárias, estão configurados desafios
múltiplos, impostos ou autoimpostos a todos que participam desses
espaços.
Como elemento carregado de relevância, um dos grandes desa-
fios do presente é o de afirmar a universidade como espaço inclusivo,
seja de segmentos sociais ou de pessoas. Por outro lado, o debate
sobre a inclusão de grupos sociais excluídos do ensino superior ocorre
em paralelo com outro debate caro à instituição universidade, que
evoca a importância da formação com qualidade. Diga-se de pas-
sagem, o conceito de qualidade está em permanente disputa, visto
que é passível de mudança ao longo do tempo e, desse modo, não
é sequer desejável que seja entendido como fixo em determinado
patamar ou, então, naturalizado a partir de condições pregressas. Em
resumo, o imperativo posto como desafio contemporâneo pressupõe
a criação de mecanismos inclusivos na educação superior em paralelo
à qualificação da formação e dos processos internos às instituições.
1 Professor da área de Sociologia e Ciência Política e Coordenador Acadêmico da Universidade
Federal da Fronteira Sul (UFFS), Campus Erechim/RS. E-mail: luisfernando@uffs.edu.br
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
8
PREFÁCIO
No quadro da universidade que se constrói de desafios, que se
pretende inclusiva e que procura produzir formação por meio de pa-
drões elevados de qualidade, começa a emergir a superação de uma
realidade que, para alguns, parecia intransponível: a ruptura com o
modelo elitista de acesso ao ensino superior e ao saber especializado,
sobretudo nos cursos mais valorizados socialmente. Esse processo,
recente na história do Brasil, tem se tornado possível mediante o in-
gresso dos estudantes da escola pública, dos negros, dos indígenas
e dos filhos dos pequenos agricultores em espaços acadêmicos antes
destinados a alguns poucos afortunados, que rompiam com trajetó-
rias familiares de exclusão do ensino superior.
A criação de novas universidades públicas, a expansão dos cursos
e das vagas oferecidas em universidades consolidadas e o surgimento
de políticas públicas como o Prouni têm contribuído de modo consi-
derável para o aumento da oferta de educação superior no país. Na
última década foram implantados campi universitários em regiões his-
toricamente desassistidas pela educação superior pública, o que pro-
porcionou maior democratização do acesso, mesmo que problemas
relacionados à expansão possam ser identificados com certa facilidade.
Contudo, do desafio da criação de novas instituições de ensino e
da inclusão das classes populares na universidade emergem novos de-
safios, afinal há um novo cenário que se instaura, no qual os atores e as
estruturas são significativamente diferentes. Por exemplo, não somente
os estudantes possuem perfil diferente daquele que até pouco tempo
predominava nas universidades federais, mas também o perfil docente
sofreu significativa modificação. A maioria dos novos docentes do en-
sino superior é composta por jovens, alguns sem experiência docente
pregressa e muitos que ainda buscam a formação em nível de douto-
rado. Tais características, distintas daquelas encontradas em universi-
dades consolidadas, em nada desmerecem os novos docentes, mas
certamente impõem desafios antes não colocados em larga escala2
.
2 Para exemplificar os desafios e a complexidade do novo contexto do qual falo, recordo de
uma estudante que me procurou na coordenação acadêmica do Campus Erechim da UFFS para
manifestar contrariedade ao posicionamento de sua turma em relação à qualidade das aulas de
um professor. Segundo sua percepção, o professor também estava em processo de formação,
visto que mencionou em sala de aula que não tinha experiência docente pregressa e havia con-
cluído sua formação pouco antes de ingressar na carreira do magistério superior.
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
9
PREFÁCIO
Neste contexto, diversos questionamentos surgem como tentati-
va de melhor compreender essa nova realidade: Qual o perfil socio-
demográfico dos novos estudantes do ensino superior? Quais suas
expectativas em relação ao ensino superior? As políticas de perma-
nência até então vigentes são adequadas para essa nova realidade?
Como qualificar a formação dos estudantes das licenciaturas? Que
desafios estão colocados no processo de inclusão do estudante tra-
balhador? Sobre essas e outras questões se debruçam os autores
dos capítulos que compõem o presente livro, organizado por Thiago
Ingrassia Pereira.
Desde a chegada em Erechim, em março de 2010, compartilho
com Thiago Ingrassia Pereira o desafio da implantação de um cam-
pus universitário no município. Nossa proximidade, que decorre de
interesses profissionais partilhados, mas também de uma amizade
que iniciou em Porto Alegre, nos tempos do curso de graduação em
Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFR-
GS, permite que eu ateste sua autodefinição mais recorrente: Thiago
Ingrassia Pereira é um operário.
Como operário que dedica seus esforços para a causa da educa-
ção popular, seu principal compromisso ético, o organizador dessa
obra nos brinda com o segundo livro gestado no grupo PET – Cone-
xões de Saberes, da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus
Erechim, do qual é tutor desde dezembro de 2010. O livro, que está
organizado em capítulos, conta com a participação de professores,
em sua maioria da UFFS, de um técnico-administrativo em educa-
ção e de estudantes vinculados ao Programa, e tem como objetivo
a socialização dos resultados de pesquisas e estudos realizados nos
últimos dois anos.
Além de possibilitar a divulgação das atividades realizadas no
interior do PET – Conexões de Saberes, o livro possui conotação for-
mativa inegável, visto que permite a estudantes de graduação o aces-
so à publicação de textos acadêmicos, fato relativamente raro nesta
etapa de formação. Por sinal, a prática da escrita acadêmica, muitas
vezes relegada a um segundo plano nos currículos dos cursos de
graduação, se constitui em ferramenta fundamental no processo de
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
10
PREFÁCIO
construção de formação universitária, bem como é o meio por exce-
lência da divulgação científica mais ampla.
O livro não pretende esgotar as temáticas sobre as quais se de-
bruça, mas sem dúvida contribuirá consideravelmente para as dis-
cussões sobre o novo cenário do ensino superior no país, mais espe-
cificamente ao analisar o caso da UFFS, uma das novas instituições
federais de ensino superior, que, em setembro de 2013, alcançou
quatro anos de existência. Como a UFFS se pretende pública e po-
pular, aspecto que é manifestado em documentos como o Projeto
Pedagógico Institucional, estudos sobre as condições de inserção dos
estudantes no ensino superior são fundamentais, visto que podem
inclusive subsidiar o desenvolvimento de políticas de combate à eva-
são, qualificação dos processos internos, avaliação das políticas de
assistência estudantil, entre outros aspectos.
Por fim, cabe manifestar que os desafios e as tensões são per-
manentes em uma universidade tão recente como a UFFS. Como é
próprio de instituições em implantação, nas quais se inserem pessoas
com as mais diversas trajetórias de vida, percursos formativos e visões
de mundo, há projetos de universidade em disputa. Cabe à comuni-
dade universitária fazer suas escolhas.
Contudo, dificilmente será possível construir uma universidade
de excelência sem a adoção de critérios de justiça. No atual estado
da arte da universidade brasileira, a promoção de critérios de justiça
significa romper com a supremacia do mérito, elemento fundamen-
tal de diferenciação social na modernidade, o qual, se adotado em
forma pura, desvinculado das suas condições sociais de produção,
implica em efeitos nocivos para a maioria da população, que ajuda a
sustentar a estrutura de Estado que dá suporte à universidade pública
com trabalho e impostos, mas dela está apartada.
Em âmbito local, se possibilitar o acesso das classes populares
ao ensino superior está na raiz da criação da UFFS, nos cabe agora
garantir permanência e formação qualificada. Esse é o nosso desa-
fio, partilhado coletivamente, mas também compromisso pessoal dos
que assumem a causa da educação pública. Refletir sobre tais aspec-
tos é o intuito primordial da obra que agora inicia. Que permaneçam
vivos nossos desafios!
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
11
ABRINDO O DIÁLOGO
ABRINDO O DIÁLOGO
A produção coletiva do conhecimento é um compromisso polí-
tico que assumimos no Grupo Práxis. O conceito que intitula nosso
grupo de trabalho indica a relação sinérgica entre teoria e prática, ou
seja, sugere um conhecimento aplicado que se constrói em diálogo
com sujeitos sociais concretos. Por isso, construímos essa coletânea
de textos, com o objetivo de compartilhar nossas experiências de en-
sino, pesquisa e extensão durante os anos de 2012 e 2013.
Nosso grupo do Programa de Educação Tutorial (PET) iniciou suas
atividades na UFFS Campus Erechim (RS) em dezembro de 2010. So-
mos um grupo PET na modalidade Conexões de Saberes, o que colo-
ca o desafio de produzirmos conhecimento a partir das experiências
dos sujeitos que constituem o Programa. Dessa forma, nossos bolsis-
tas são estudantes universitários de cursos de Licenciatura do turno
da noite. Todos estudaram em escola pública na educação básica e
fazem parte das primeiras gerações de suas famílias a cursarem o
ensino superior, em especial, o público.
O principal tema de pesquisa que articula as ações do Práxis é a
democratização do acesso ao ensino superior público. Trabalhamos a
partir dos princípios teóricos e práticos do campo da Educação Popu-
lar. Isso significa que assumimos plenamente a dimensão política do
ato educativo. O desdobramento metodológico dessa base teórica é
a pesquisa participante, modalidade de produção do conhecimento
na qual ocorre o estabelecimento de relações horizontais entre pes-
soas que, em diálogo, designam o mundo.
Nesse sentido, a temática transversal de nosso grupo é a forma-
ção docente e a escola pública. Não dissociamos a discussão sobre a
universidade da escola. Pelo contrário: são nas escolas públicas da re-
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
12
ABRINDO O DIÁLOGO
gião de abrangência da UFFS/Erechim que desenvolvemos nossas ati-
vidades de extensão. Nossa ação “Quero entrar na UFFS” se constitui
em palestras, debates e oficinas nas escolas públicas estaduais que
ofertam ensino médio regular e na modalidade Educação de Jovens
e Adultos (EJA) da 15ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE)
do Rio Grande do Sul. De um total de 50 escolas em 41 municípios
do norte gaúcho, nosso projeto de extensão, considerando o período
2011-2013, já esteve em 28 municípios e em mais de 30 escolas.
Nossa presença nas escolas objetiva levar informações aos estu-
dantes do ensino médio sobre a UFFS e as demais políticas de acesso
ao ensino superior (PROUNI, UAB, Lei de Cotas, SISU, FIES), proble-
matizando o significado em termos culturais e de projeto de vida
(trabalho) que representa a continuidade dos estudos na graduação.
Além dessa dimensão informativa, buscamos ouvir os estudantes so-
bre suas concepções de universidade, sobre seus projetos futuros e
sobre os condicionantes sociais que interferem na tomada de deci-
são. Não é simples morar em um município pequeno e de base agrí-
cola e ir para a universidade. Mesmo não pagando mensalidade, há
custos de transporte, alimentação, moradia, livros e outras questões
pertinentes à manutenção da vida.
Além disso, percebemos um aspecto subjetivo importante: o
apoio dos grupos sociais de referência (em especial a família) nem
sempre é positivo em se tratando de continuar a estudar. A necessi-
dade do trabalho remunerado é um fato relevante, tanto pela neces-
sidade material imediata, como por uma noção moral que constrói o
sentido de pertencimento social. Em outras palavras: trabalhar é mais
importante do que estudar.
Contraditoriamente, sabemos que anos de estudo se relacionam
com maiores ganhos financeiros no mercado de trabalho. Contudo,
por ainda ser algo novo na região, a universidade pública, diferente
do verificado em outras cidades em que já se encontra mais enrai-
zada, ainda não desperta essa valorização subjetiva que poderia ser
fator importante de incentivo para os concluintes do ensino médio.
Por isso, nossa atividade de extensão está implicada com outra
ação que passamos a desenvolver em 2012: a pesquisa sobre o per-
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
13
ABRINDO O DIÁLOGO
fil dos calouros da UFFS/Erechim. Muito se fala sobre a expansão
(interiorização) da universidade pública, seja pela criação de novas
unidades de universidades já existentes, seja pela criação de institui-
ções novas. A UFFS inicia suas atividades letivas em março de 2010
em Erechim e nas cidades de Chapecó – SC (onde fica sua reitoria),
Laranjeiras do Sul e Realeza – PR e Cerro Largo – RS. Em 2013 passa
a operar com um Campus universitário em Passo Fundo – RS.
Assim, foi nossa intenção saber um pouco mais sobre o aluno
que estava ingressando em nosso Campus. Nossa pesquisa foi realiza-
da por meio de um questionário autoaplicável e respondido pelos ca-
louros que ingressaram nos oito cursos1
de graduação ofertados em
2012. A aplicação dos questionários foi realizada nas salas de aula e
procurou se constituir em um censo com essa população. Neste pro-
cesso seletivo, a UFFS trabalhou com a nota do Exame Nacional do
Ensino Médio (ENEM) e uma bonificação para quem cursou o ensino
médio em escola pública. O chamado “fator escola pública” foi2
uma
política afirmativa da universidade desde seu primeiro processo seleti-
vo em 2010, objetivando o ingresso de maior número de estudantes
provenientes da escola pública. Se o aluno tivesse cursado os três
anos do ensino médio em escola pública, receberia uma bonificação
de 30% sobre sua nota do ENEM. Tal iniciativa produziu interessan-
te cenário nunca visto nas universidades federais brasileiras: mais de
90% dos estudantes da UFFS em seus primeiros anos de atividades
tinham sido alunos de escolas públicas no ensino médio.
Para além dos números, queríamos saber mais sobre essas pes-
soas que passavam a fazer parte da nossa universidade. Nesse sen-
tido, nosso grupo de bolsistas se envolveu nesta pesquisa e passou
a produzir reflexões sobre o processo de expansão atual do ensino
superior público a partir da realidade da UFFS/Erechim, que, em últi-
ma instância, é a sua própria realidade. Junto à atividade do “Quero
1 UFFS/Erechim – Cursos integrais (manhã e tarde): Bacharelados em Agronomia (ênfase em
Agroecologia), Arquitetura e Urbanismo e Engenharia Ambiental. Cursos noturnos: Licenciatu-
ras em Ciências Sociais, Filosofia, História, Pedagogia e Geografia.
2 A partir do processo seletivo 2013, a UFFS adotou a orientação da Lei de Cotas (Lei nº
12.711/2012) e modificou sua política de ingresso. Em 2014, a universidade entrou no Sistema
de Seleção Unificada – SISU.
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
14
ABRINDO O DIÁLOGO
entrar na UFFS” e às leituras e diálogos do nosso grupo de estudos,
passamos a compartilhar nossas ideias em fóruns de iniciação cientí-
fica e seminários.
Nesse sentido, este livro é parte do que vivemos e pensamos e,
também, das parceiras que constituímos ao longo dessa caminhada de
três anos do nosso grupo PET. Os capítulos que integram essa coletânea
representam cerca de um ano e meio de trabalho entre 2012 e 2013.
Se discutir o acesso à UFFS é algo fundamental na vida da nova
universidade, não menos importante é avaliarmos a permanência dos
nossos estudantes. Nessa linha, o Pedagogo Marcelo Luis Ronsoni,
presente na construção da UFFS/Erechim desde seus primeiros passos
e colaborador da ação “Quero entrar na UFFS”, reflete, no capítulo
Permanência e evasão de estudantes da UFFS Campus Erechim,
sobre o cenário de ocupação efetiva das vagas em nosso Campus.
Este estudo sobre a evasão na UFFS/Erechim parte de números, mas
vai além: sugere causas e motivos da evasão e apresenta possibilida-
des de enfrentamento desse problema que tem origem tanto externa
(social) como interna (mecanismos institucionais).
Ainda na linha da permanência dos estudantes na universida-
de, a Professora da área de Alfabetização e Língua Portuguesa da
UFFS/Erechim e colaboradora do Práxis, Zoraia Aguiar Bittencourt,
e a Professora da área de Alfabetização da Unipampa/Jaguarão, Su-
zana Schwartz, examinam com estudantes do curso de Licenciatura
em Pedagogia aspectos relacionados à leitura durante a graduação.
O capítulo Leitura no ensino superior noturno: estudantes do
curso de pedagogia entram no debate sobre a produtividade
do trabalho com textos na universidade apresenta um diagnósti-
co sobre as causas do baixo acompanhamento das leituras por parte
dos alunos, que nós, professores de cursos noturnos, percebemos,
mas, muitas vezes, não entendemos. Ao examinar a percepção das
estudantes sobre as leituras exigidas pelo curso de graduação, as
autoras reúnem subsídios importantes para que os docentes universi-
tários possam qualificar essa prática em suas aulas.
O próximo capítulo intitula-se Metodologia de ensino em
pesquisa social quantitativa e seu autor, Professor Douglas San-
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
15
ABRINDO O DIÁLOGO
tos Alves, da área de Ciência Política da UFFS/Erechim, apresenta
argumentos que justificam a importância do domínio de técnicas de
pesquisa quantitativa na formação de professores em nível superior.
Nesse texto, encontramos um autor preocupado com a qualidade da
formação dos licenciandos na universidade. Por isso, ele nos apresen-
ta argumentos que superam a dicotomia quantitativo x qualitativo
na pesquisa social, sugerindo que o ensino superior possa, de fato,
formar sujeitos aptos a construir conhecimento a partir da realidade
que os cerca. Vale destacar que o Prof. Douglas assessorou a pesqui-
sa sobre o perfil dos calouros desenvolvida por nós do PET.
Na sequência, escrevi o capítulo A pesquisa como princípio
educativo no Grupo Práxis – PET/Conexões de Saberes, buscan-
do compartilhar algumas premissas políticas e pedagógicas de nossas
ações no PET. Ao retomar as atividades do nosso grupo, dialogo com
autores de referência sobre Pesquisa Participante e Educação Popular.
Ao pensar sobre o nosso PET, de certa forma, promovo um debate so-
bre a universidade no Brasil, problematizando seu papel na produção
do conhecimento (Para quê? Para quem? Como?).
Depois de apresentarmos reflexões sobre aspectos da perma-
nência na UFFS/Erechim e sobre o princípio educativo da pesquisa
em nosso grupo PET, temos três capítulos escritos por bolsistas com
base na análise dos dados da pesquisa sobre o perfil dos calouros da
UFFS/Erechim 2012. Fernanda May, bolsista decana do Práxis, dis-
cute a relação entre a escola pública e a universidade, destacando a
presença majoritária de estudantes provenientes da escola pública na
UFFS. No capítulo Da escola para a universidade: o novo perfil do
estudante do ensino superior, a autora aborda a questão do perfil
dos calouros da UFFS/Erechim e apresenta reflexões sobre o desa-
fio de reinvenção da universidade (e da escola) em uma perspectiva
emancipatória.
O debate sobre a questão étnica é o tema do capítulo Desi-
gualdades escolares e seus reflexos para a diversidade étnica
e de cor na UFFS Campus Erechim, de autoria de Joviana Vedana
da Rosa. Preocupada com a desigualdade de acesso à universidade
para a população não branca, a bolsista apresenta um mapeamento
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
16
ABRINDO O DIÁLOGO
da situação demográfica da região de influência da UFFS/Erechim,
relacionando com o perfil dos calouros 2012. Nesse sentido, proble-
matiza o pequeno percentual de negros e indígenas na universidade,
provocando o debate sobre as ações afirmativas e a política de cotas.
Daniel Gutierrez apresenta importante reflexão no capítulo Edu-
cação superior e suas interfaces: os desafios da classe trabalha-
dora. Neste texto, o bolsista parte da discussão teórica sobre classe
social e examina dados do perfil dos calouros 2012 da UFFS/Erechim,
apontando para os desafios que as classes populares enfrentam ao
conciliarem trabalho e estudo. Por isso, os cursos noturnos que pos-
suem a maior quantidade de estudantes trabalhadores necessitam de
um tratamento especial na questão da permanência desses trabalha-
dores que estudam.
Dessa forma, compartilhamos nossas produções teóricas, que
partem de nossas ações de extensão, ensino e pesquisa. Esse é o
segundo livro produzido pelo nosso PET em três anos de existência
na UFFS/Erechim. O financiamento é da verba de custeio proveniente
do FNDE. Agradeço ao apoio da Pró-Reitoria de Graduação da UFFS e
ao Comitê Local de Acompanhamento e Avaliação (CLAA) pela asses-
soria qualificada, bem como à Coordenação Acadêmica do Campus
Erechim. Também, agradeço aos colegas docentes da UFFS/Erechim
que colaboram com nosso PET, aos professores e alunos das escolas
públicas do Alto Uruguai e, principalmente, aos bolsistas que coti-
dianamente produzem essa experiência alegre e rigorosa do grupo
Práxis.
Erechim, janeiro de 2014.
5º ano da UFFS
Thiago Ingrassia Pereira
Tutor PET/Conexões de Saberes
Práxis (Licenciaturas)
UFFS/Erechim
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
17
PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES 
DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES
DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
Marcelo Luis Ronsoni1
	
O presente capítulo tem o objetivo de apresentar alguns dados
relativos à evasão de estudantes do ensino superior, tendo como re-
corte a experiência da Universidade Federal da Fronteira Sul/Campus
Erechim. A UFFS é uma instituição multicampi, criada em 2009 e
que iniciou as atividades acadêmicas em 2010. A cidade de Erechim,
localizada no norte do Estado do RS, recebeu um campus desta uni-
versidade e conta atualmente com oito cursos de graduação e apro-
ximadamente 1.200 estudantes.
Este trabalho toma como referência os dados sobre a evasão pro-
duzida neste campus e procura analisá-los de forma ampla, dentro do
novo contexto do ensino superior brasileiro. Diante do cenário da ex-
pansão da oferta de vagas no ensino superior público e da demanda
cada vez mais crescente em oportunizar às pessoas de camadas po-
pulares o acesso a este nível de ensino, a UFFS utilizou como critério
nos processos seletivos de 2010, 2011 e 2012 o resultado do Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem), acrescido de um índice relaciona-
do ao tempo de formação do candidato em escolas públicas. Este
índice possibilitou que cerca de 95% dos estudantes que ingressaram
nestes anos fossem estudantes que cursaram o ensino médio em
escolas públicas.
1 Pedagogo da Universidade Federal da Fronteira Sul/Campus Erechim. E-mail: marcelo.uffs@
gmail.com
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
18
PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES 
DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
Além disso, a maioria destes estudantes faz parte da primeira
geração das famílias que ingressam no ensino superior, justamente
por ser público. A renda per capita média de 75% destes estudantes
é entre 1 e 3 salários mínimos. Isto faz com que o perfil dos estudan-
tes, especialmente dos cursos ofertados no período noturno, seja de
trabalhadores, pela necessidade de obter ou complementar a renda
familiar.
É deste contexto social e econômico que discutimos a evasão
nos cursos de graduação da UFFS/Campus Erechim. Inicialmen-
te apresentamos brevemente as ações de assistência estudantil
desenvolvidas por esta universidade por entender que uma assis-
tência ao estudante qualificada, além de um conjunto de outras
ações, permite a permanência no curso e na instituição. A seguir
caracterizamos o entendimento sobre evasão aplicado neste traba-
lho e apresentamos tabelas com dados objetivos obtidos nos três
primeiros anos de atuação da universidade no Campus Erechim,
seguido de análises dos fatores que repercutem nos índices de
evasão observados.
Política de Assistência Estudantil no Ensino Superior
Público
Diante do elevado índice de evasão de estudantes de nível su-
perior, o Ministério da Educação (MEC) criou a Comissão Especial de
Estudos sobre a Evasão nas Universidades Públicas Brasileiras, em me-
ados da década de 1990. Os estudos desta Comissão demonstraram
que cerca de 40% dos ingressantes nas universidades abandonavam
os cursos antes de concluí-los. Isto evidenciou um sistema ineficiente
e oneroso. De acordo com a Secretaria de Educação Superior (SESu),
o custo estimado com a evasão no sistema federal chegava a 486 mi-
lhões ao ano, valor que, segundo Curi (1998), correspondia a 9% do
orçamento anual das instituições federais. Por conseguinte, a União
Nacional dos Estudantes (UNE), em 2004, apresentou um manifesto
em defesa da construção de um plano nacional de assistência estu-
dantil, reforçando a ideia de que o acesso ao ensino superior não
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
19
PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES 
DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
pode ser dissociado da permanência dos estudantes nas instituições
de ensino.
Para tanto, o MEC, por meio da Associação Nacional dos Dirigen-
tes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES), aprovou,
em 2007, o Plano Nacional de Assistência Estudantil, que apresenta
as diretrizes norteadoras para a definição de programas e projetos de
ações assistenciais estudantis, elaborado após pesquisas realizadas
pelo órgão de assessoramento denominado Fórum Nacional de Pró-
-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE, 2001).
Esse Plano instituiu, no âmbito da SESu, no Ministério da Educa-
ção, o Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), Porta-
ria Normativa n° 39, de 12 de dezembro de 2007, como estratégia
de combate às desigualdades sociais e regionais, bem como busca
auxiliar a ampliação e a democratização das condições de acesso e
permanência dos estudantes com insuficiência de condições finan-
ceiras no ensino superior público federal, vinculados aos cursos de
graduação presenciais, levando-os a desenvolverem suas plenitudes
acadêmicas.
A esse respeito, Nilma Lino Gomes (2009), ao discutir a implan-
tação de ações afirmativas e ações voltadas para a assistência estu-
dantil, ressalta que a permanência na instituição constitui um desafio
para os estudantes das camadas populares que têm acesso ao Ensino
Superior. Para estes estudantes, abrirem-se as portas da universidade
para que eles ingressem nela não é suficiente. É preciso que, através
de políticas de assistência estudantil, sejam garantidas melhores con-
dições materiais e culturais.
A necessária conciliação de trabalho e estudo para determinados
sujeitos das camadas populares que ingressaram nas universidades
pode impedir que estes estudantes vivam a experiência universitária
de forma plena, reduzindo-a a aulas ministradas em horário estabe-
lecido, impossibilitando o envolvimento em atividades extracurricula-
res, como palestras, seminários, teatros, a participação em pesquisas
de iniciação científica, projetos de extensão e monitoria e até mesmo
a participação em conversas desinteressadas mantidas nos espaços
de convivência universitária.
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
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PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES 
DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
Diagnóstico atual da Assistência Estudantil na UFFS
Com vistas à operacionalização dos recursos financeiros garanti-
dos pelo PNAES, a Secretaria Especial de Assuntos Estudantis (SEAE)
assumiu a tarefa fundamental de gestão dos recursos destinados à
UFFS, o que possibilitou a criação de um conjunto de ações que be-
neficiam os estudantes com comprovada vulnerabilidade socioeconô-
mica, visando à integração acadêmica, científica e social.
Em cumprimento às determinações da Portaria Normativa n°
39/07-MEC, do PNAES, a SEAE organizou suas ações em duas áreas
estratégicas: a que visa à permanência do estudante e a de desem-
penho acadêmico, cultural e esportivo. Nota-se ênfase na área estra-
tégica de permanência, por se tratar de ações mais amplas que en-
volvem várias despesas dos estudantes. Assim, esta área contempla
os seguintes auxílios: 1) Auxílio Transporte, que se refere ao auxílio
ao estudante que utiliza o transporte coletivo ou locado no seu des-
locamento da residência para a universidade; 2) Auxilio Moradia, que
se destina ao estudante procedente de outro município ou distrito/
interior da cidade onde o campus está instalado e reside em imóvel
alugado ou pensionato no município em que estuda, em função do
seu ingresso na Universidade; 3) Auxílio Alimentação, que objetiva
proporcionar auxílio financeiro para estudantes procedentes de outro
município ou distrito/interior da cidade onde o campus está instala-
do, antes do ingresso na universidade, e que resida atualmente no
município em que estuda, frequentando curso integral e/ou partici-
pando em projetos de ensino, pesquisa ou extensão; 4) Auxílio Per-
manência, que tem por finalidade minimizar as desigualdades sociais
e contribuir para a permanência e diplomação dos estudantes de gra-
duação em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
No que tange à área estratégica de desempenho acadêmico, cul-
tural e esportivo, têm-se ações ofertadas da seguinte forma: 1) Bolsa
Esporte, que oferece auxílio financeiro para promoção do esporte vol-
tado ao desenvolvimento integral do estudante. Esse programa visa
promover a integração acadêmica e estimular hábitos saudáveis, a
partir da inserção do estudante de graduação em atividades esporti-
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vas, de várias modalidades, participação em competições desportivas
municipais, estaduais e nacionais; 2) Bolsa Cultura, que tem como
objetivo incentivar ações na área da cultura.
Considerando que a UFFS/Campus Erechim tem aproximada-
mente 1.200 estudantes matriculados nos cursos de graduação, no
período de maio a setembro de 2013 constatou-se que a Secretaria
Especial de Assuntos Estudantis concedeu mais de 1.400 benefícios,
contemplando 208 estudantes.
Ainda em fase de construção encontra-se o Restaurante Universi-
tário, importante espaço quando se pensa em política de assistência
estudantil. E está em discussão, por uma comissão criada para este
fim, a implantação da Casa do Estudante Universitário.
Além das bolsas e auxílios destinados aos estudantes pela ver-
ba do PNAES, a instituição oferece uma diversidade e quantidade
considerável de outras bolsas, de programas de ensino, pesquisa e
extensão. São bolsas de monitoria, iniciação científica e iniciação à
extensão. Além destas, existem outras modalidades de bolsas em
programas do Ministério da Educação, como o Programa Institucio-
nal de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) e Programa de Educação
Tutorial (PET). Todos estes programas, apesar de não serem volta-
dos para a assistência estudantil, acabam possibilitando uma vivência
mais ativa da vida universitária e, por conseguinte, permanência no
curso e na instituição.
Evasão: de que conceito estamos falando?
A Comissão Especial de Estudos sobre Evasão do MEC define o
fenômeno da evasão como a saída definitiva do aluno do seu curso
de origem sem concluí-lo. Essa definição é compartilhada por Ristoff
(1999). No entanto, o autor separa evasão de mobilidade, que seria
o fenômeno de migração para outro curso, apontando que um alu-
no que abandona definitivamente um curso pode ter migrado para
outro, o que não constituiria um desligamento da universidade, mas
sim uma transferência interna. Pereira (1995) amplia essa definição
dizendo que a evasão ocorre quando o aluno deixa a universidade
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sem concluir nenhum curso, o que excluiria a opção da mobilidade.
Temos, ainda, a situação do aluno que abandona uma universi-
dade para ingressar em outra, configurando a situação de transferên-
cia externa, o que define a evasão de uma dada universidade, mas
não o desligamento do sistema de ensino superior.
A Comissão Especial (1995) especifica três modalidades de eva-
são como forma de gerar uma precisão conceitual e possibilitar a
comparabilidade dos resultados. São elas:
- 	 evasão do curso: desligamento do curso superior em função
de abandono (não-matrícula), transferência ou reescolha,
trancamento e/ou exclusão por norma institucional;
- 	 evasão da instituição: desligamento da instituição na qual
está matriculado;
- 	 evasão do sistema: abandono definitivo ou temporário do en-
sino superior.
Silva Filho et al. (2007) destacam dois aspectos similares, mas
não idênticos: a “evasão anual média”, que mede a porcentagem dos
alunos matriculados em um curso ou instituição, que no ano seguinte
não se matricularão; e a “evasão total”, que apresenta o número de
alunos matriculados que não concluíram o curso após o seu período
de oferecimento regular.
Neste estudo optou-se por utilizar a evasão do curso e da insti-
tuição nos três primeiros anos de funcionamento da UFFS/Campus
Erechim. Neste sentido, como não há turmas diplomadas, não é pos-
sível calcular a “evasão total”, conforme conceito acima apresentado.
Acompanhamos a evasão semestral média. Esses números, apesar
de não apresentarem os dados do final de um ciclo, apontam para
algumas pistas sobre o tamanho da evasão total que teremos em
nossos cursos.
Dentro da projeção da evasão total, ainda há de se considerar a
retenção, que faz com que estudantes que ingressaram num mesmo
ano/turma não obtenham a diplomação no mesmo semestre.
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Dados da evasão na UFFS/Campus Erechim
Apresentamos abaixo parte do estudo realizado no Campus Ere-
chim. O estudo completo contempla a análise dos dados da evasão
por curso e por semestre, o que permite visualizar a situação de cada
curso e compará-lo a anos/semestres anteriores e com os demais
cursos dentro do campus.
Conforme mencionado anteriormente, nosso cálculo considera
os estudantes que deixam o curso e a instituição a cada semestre.
Não temos ainda dados de um ciclo fechado, pois as primeiras tur-
mas, ingressantes em 2010, não concluíram o curso.
Para facilitar a análise, separamos os dados em duas tabelas:
uma com o quadro da evasão dos cursos integrais (Agronomia, Arqui-
tetura e Urbanismo e Engenharia Ambiental) e outro com os cursos
noturnos (Ciências Sociais, Filosofia, Geografia, História e Pedago-
gia). Cabe ressaltar que os dados abaixo se referem somente aos in-
gressantes pelo processo seletivo anual. As vagas ociosas são oferta-
das em editais de retorno de aluno abandono, transferência interna,
transferência externa e retorno de graduado, duas vezes ao ano.
Quadro 1: Dados evasão cursos integrais da UFFS/Campus Erechim
Curso / Ano ingresso
Vagas
Ofertadas
Matriculados Ativos Diferença Evasão
Agronomia / 2010 50 51 36 15 29,4%
Agronomia / 2011 50 49 39 10 20,4%
Agronomia / 2012 50 52 41 11 21,2%
TOTAL / MÉDIA 150 152 116 36 23,7%
Arquitetura e Urbanismo / 2010 50 43 31 12 27,9%
Arquitetura e Urbanismo / 2011 50 44 36 8 18,2%
Arquitetura e Urbanismo / 2012 50 52 41 11 21,2%
TOTAL / MÉDIA 150 139 108 31 22,4%
Engenharia Ambiental / 2010 50 51 32 19 37,3%
Engenharia Ambiental / 2011 50 50 27 23 46,0%
Engenharia Ambiental / 2012 50 52 37 15 28,8%
TOTAL / MÉDIA 150 153 96 57 37,4%
Fonte: Elaborado pelo autor
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Podemos perceber que nestes cursos a evasão tem ficado abaixo
da média do Campus Erechim, mas, mesmo assim, elevada. Alguns
fatores podem explicar esses índices: a) estes cursos são os mais pro-
curados no campus, já que a concorrência nos processos seletivos é
grande, nesta ordem: Arquitetura e Urbanismo, Engenharia Ambien-
tal e Agronomia; b) o perfil de estudantes destes cursos caracteriza-se
por uma dedicação exclusiva aos estudos, pois o índice de estudantes
trabalhadores destes cursos é baixo; nestes cursos também a vincu-
lação dos estudantes acaba sendo maior, já que os mesmos passam
boa parte de seu tempo na universidade; c) grande parte destes estu-
dantes reside em Erechim e aqueles que são de outros municípios, ao
ingressar na universidade, passam a residir na cidade.
Quadro 2: Dados evasão cursos noturnos da UFFS/Campus Erechim
Curso / Ano ingresso
Vagas
Ofertadas
Matriculados Ativos Diferença Evasão
Ciências Sociais / 2010 50 48 25 23 47,9%
Ciências Sociais / 2011 50 51 24 27 52,9%
Ciências Sociais / 2012 50 53 27 26 49,1%
TOTAL / MÉDIA 150 152 76 76 50,0%
 
Filosofia / 2010 50 40 17 23 57,5%
Filosofia / 2011 50 49 19 30 61,2%
Filosofia / 2012 50 52 29 23 44,2%
TOTAL / MÉDIA 150 141 65 76 54,3%
 
Geografia / 2010 50 49 27 22 44,9%
Geografia / 2011 50 51 23 28 54,9%
Geografia / 2012 50 52 29 23 44,2%
TOTAL / MÉDIA 150 152 79 73 48,0%
 
História / 2010 50 46 21 25 54,3%
História / 2011 50 50 35 15 30,0%
História / 2012 50 50 30 20 40,0%
TOTAL / MÉDIA 150 146 86 60 41,4%
 
Pedagogia / 2010 50 49 35 14 28,6%
Pedagogia / 2011 50 51 35 16 31,4%
Pedagogia / 2012 50 51 42 9 17,6%
TOTAL / MÉDIA 150 151 112 39 25,9%
Fonte: Elaborado pelo autor
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Podemos perceber índices mais elevados de evasão nestes cur-
sos. Nos cursos de Filosofia e Ciências Sociais, a média ultrapassa os
50%. Nos cursos de Geografia e História, a média está acima de 40%
e, no curso de Pedagogia, a média de evasão é quase a metade dos
demais cursos. Existe também uma tendência de elevação desta taxa
de evasão nas turmas 2011 e 2012, pois tendo 2 ou 4 semestres a
menos na instituição do que os ingressantes em 2010, já aponta para
índices potencialmente maiores de evasão.
O perfil destes estudantes caracteriza-se por pessoas que, na
grande maioria, conciliam o estudo com outras atividades, especial-
mente o trabalho. Estudantes estes que só podem estar na universida-
de neste turno e, por consequência, só se dedicam à formação neste
momento. Levantamentos realizados apontam que cerca de 60% dos
estudantes dos cursos noturnos trabalham nos demais turnos. Além
disso, cerca de 30% destes estudantes residem em municípios pró-
ximos a Erechim e percorrem diariamente até 100km para estudar.
Neste contexto a evasão se torna um problema bem mais grave.
O esforço para fazer um curso superior já é grande e a possibilida-
de de abandoná-lo está sempre presente, seja pela dificuldade em
conciliar o estudo com o trabalho, uma eventual reprovação, a carga
elevada de atividades, a falta de tempo para estudar.
Quadro 3: Dados evasão UFFS/Campus Erechim
Campus /
Ano ingresso
Vagas
Ofertadas
Matriculados Ativos Diferença Evasão
Erechim / 2010 400 377 224 153 40,6%
Erechim / 2011 400 395 238 157 39,7%
Erechim / 2012 400 414 276 138 33,3%
TOTAL / MÉDIA 1200 1186 738 448 37,9%
Fonte: Elaborado pelo autor
Considerando-se as vagas ofertadas nos processos seletivos nes-
tes três anos, têm-se 37,9% como índice de evasão média no Campus
Erechim. É um índice que se projeta aumentar até o momento do
encerramento do curso por parte destes estudantes. A evasão total
tende a ser esta ou maior em média no campus. Isto porque a eva-
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são, considerando as vagas ofertadas e preenchidas nos editais de
transferência, é a mesma, pois nem todas as vagas são ofertadas e
poucas são preenchidas e, além disso, sobre estas vagas, incide um
índice de evasão parecido com o do processo seletivo.
Diante disso, constata-se que vagas ociosas certamente trazem
prejuízos à instituição e à sociedade, uma vez que a estrutura e os
docentes estarão trabalhando com metade de sua capacidade, como
em alguns casos visualizados acima.
No caso da UFFS/Campus Erechim, a evasão tem ocorrido es-
sencialmente no primeiro ano do ingresso na universidade. Após o
primeiro ano, a tendência que tem se mostrado é a da permanência,
e da permanência qualificada, pois esta é complementada com as
possibilidades que a instituição oferece, ao mesmo tempo em que o
estudante começa a percebê-las e compreendê-las de outra forma.
Cabe considerar também que estes dados incluem como estu-
dantes ativos as matrículas trancadas, pois é dessa forma que o siste-
ma acadêmico da instituição concebe a ausência destes por até 4 se-
mestres consecutivos. Porém, a experiência tem mostrado, também,
que o trancamento é um dos primeiros passos para a desistência. Na
maior parte das vezes, não se desiste imediatamente, para, assim,
manter a vaga ativa na universidade, mas, em síntese, protela-se uma
ação que, em muitos casos, já é definitiva.
Fatores que levam à evasão
A apresentação de índices sobre evasão deve ser entendida tão
somente como passo inicial de análises que devem buscar identificar
e compreender os fatores que a ocasionam. Tais fatores podem ser
de caráter interno às instituições, específicos à estrutura e dinâmica
de cada curso – ou externos a elas, relacionados a variáveis econômi-
cas, sociais, culturais, ou mesmo individuais que interferem na vida
universitária dos estudantes.
Estes fatores podem ser classificados como os que se relacio-
nam ao próprio estudante, os relacionados ao curso e à instituição
e, finalmente, os fatores socioculturais e econômicos externos. Não é
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PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES 
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possível analisá-los de forma dissociada, pois fatores de uma ordem
interferem necessariamente nos demais. Apenas para visualizá-los
adequadamente, os mesmos estão separados abaixo.
Procuramos realizar o acompanhamento das desistências dos es-
tudantes e, dentre aqueles que formalmente manifestam o interesse
em se desligar da instituição, temos alguns argumentos e justificati-
vas recorrentes, os quais apresentamos a seguir para chamar à refle-
xão, mesmo sumária, sobre tais fatores. Outros fatores apresentados
abaixo decorrem da experiência vivida neste período de análise, que
nos permite apontar causas mais genéricas. Alguns destes fatores são
apresentados no relatório da Comissão Especial de Estudos sobre a
Evasão (1997).
Os fatores vinculados a aspectos pessoais dos estudantes podem
ser considerados como determinantes, em alguns casos, para evasão.
Em outros, contribuem significativamente. O estudante do ensino
superior lida diariamente com a pressão de aprender, de construir
conhecimento, de compreender sentidos e significados para as coisas
mais importantes de sua área de formação. Se não bem preparado
pessoal, física e psicologicamente, pode apresentar dificuldades nes-
ta caminhada.
Fatores relacionados à formação escolar anterior do estudante
podem dificultar sua melhor integração acadêmica ao curso. Não se
deve esquecer, também, que a maioria dos estudantes que ingressa
nos cursos superiores realiza sua escolha profissional muito precoce-
mente, numa faixa de idade que se situa quase que sistematicamente
entre os 16 e os 18 anos de idade. É uma circunstância social que
praticamente obriga o jovem a optar, quase que definitivamente, pela
profissão que deverá influenciar os rumos de sua vida.
Fator igualmente a considerar, ainda relacionado às característi-
cas de cada estudante, é sua capacidade de se adaptar à vida univer-
sitária. Inúmeras vezes, o ingresso em um curso superior é acompa-
nhado de mudança de entorno sociocultural. Esta “nova etapa” inclui
também, em muitos casos, a necessidade de manter-se neste local e
fazer uma inserção prematura no mercado de trabalho, com a con-
sequente incompatibilidade entre horários e dificuldade de uma dedi-
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cação exclusiva. Nos cursos noturnos, especialmente, é significativa a
quantidade de estudantes com essa especificidade. Neste sentido, o
Campus Erechim caracteriza-se, desde sua implantação, por ser uma
universidade de “estudantes trabalhadores”, pois apresenta elevados
percentuais de estudantes que conciliam trabalho e estudo, resultado
da maior oferta de cursos no período noturno.
A dificuldade de conciliar a jornada de trabalho e o horário es-
colar é fator de suma importância na decisão de abandonar o curso
superior. Quando as obrigações profissionais entram em conflito com
os compromissos dos estudos, são estes, na maioria das vezes, que
são adiados.
Somada a esses fatores, destaca-se, ainda, a necessidade de
adaptação do estudante à nova dinâmica acadêmica (regime de cré-
ditos, matrícula por disciplinas e periodização semestral), muito dife-
rente daquela da educação básica. A aparente autonomia imputada
ao estudante no ensino superior, se não bem compreendida, pode
também contribuir para a sua não permanência no curso e na insti-
tuição. Muitos estudantes não se apropriam deste fato e aguardam
que as iniciativas de todas as ações voltadas à sua formação sejam
desencadeadas pela instituição, e não atuam de forma proativa nos
espaços e possibilidades que a instituição proporciona.
Nos fatores internos à instituição, podemos destacar os relativos
às questões acadêmicas, de currículo, didático-pedagógicas, à forma-
ção dos docentes, à assistência estudantil insuficiente e à inadequada
estrutura de apoio ao ensino de graduação.
Porém, no caso da instituição estudada, estes fatores praticamen-
te não aparecem nas justificativas dos estudantes ao desistirem do cur-
so, mas são percebidos pelo autor como fatores que, dentro de um
contexto já não muito favorável à permanência do estudante, afetado
pelos demais fatores expostos, podem contribuir para sua evasão.
A UFFS/Campus Erechim desenvolve suas atividades em espaços
provisórios e não dispõe ainda dos laboratórios didáticos próprios.
Toda a sua estrutura está em construção, e algumas em fase de con-
clusão. Este contexto, apesar de não ser o ideal, proporciona o desen-
volvimento mínimo das atividades com a devida qualidade.
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Muitos docentes não têm experiência do magistério no ensino
superior, e a entrada na instituição consiste no início de sua carreira
como docente. Neste sentido, foi criado o Núcleo de Apoio Pedagó-
gico, que tem como principal atribuição planejar a formação docente
na UFFS.
Alguns cursos não trazem reconhecimento social e retorno eco-
nômico satisfatório ao futuro profissional. São questões ligadas ao
contexto político, econômico e social de nosso país. Se internamente
essas situações forem trabalhadas com pessimismo e conformismo,
a tendência é incentivar nossos alunos a não seguir estas carreiras.
Alia-se a isto o fato de que parcela significativa desses estudantes
faz parte das classes populares, o que faz com que grande parte dos
mesmos tenha que trabalhar nos demais turnos. Finalmente, se, além
disso, o estudante atravessar dificuldades financeiras, a perspectiva
de continuidade de seus estudos universitários torna-se ainda mais
remota.
A inter-relação desses fatores indica que não se deve entender
evasão como fenômeno simplesmente numérico. É fundamental ter
clareza de que por detrás de todo número existe uma história. Nesta
perspectiva, os números surgem tão somente como indicadores cuja
compreensão exige constatações e análises de natureza qualitativa,
que estão sendo implementadas pelo campus em parceria com o
Grupo PET/Conexões de Saberes.
O desempenho acadêmico é processo influenciado por um con-
junto de fatores, não há um único potencializador ou única condicio-
nante. Somente buscando compreender esse processo em sua com-
plexa dimensão é que as universidades adquirirão condições de agir
consistentemente com objetivo de adequar seu trabalho às exigências
atuais e, por consequência, amenizar os desafios a ele relacionados.
Considerações finais
As recentes ações de expansão do Ensino Superior, que, segundo
Ristoff (2008), não podem ser confundidas com democratização, in-
troduziram novas discussões acerca do acesso e da permanência dos
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estudantes das camadas populares e egressos de escolas públicas nas
universidades. Ressaltamos que a democratização do acesso aos ban-
cos das universidades deve vir acompanhada da democratização do
acesso ao conhecimento e do direito à permanência dos estudantes
para que possam concluir seus cursos.
Assim, entendemos a permanência como direito. Direito que
todo estudante proveniente dos meios populares que ingressou na
universidade pública, em seus diferentes cursos e turnos, por quais-
quer meios, deve gozar. Entendemos que a assistência estudantil
efetiva é contributo à permanência, mas não se confunde com ela.
E as disposições individuais do estudante beneficiado por todo um
conjunto de ações, a favor de si, na construção do conhecimento
constituem elemento significativo para a permanência.
Diante do exposto, percebe-se que os recursos do PNAES vêm
proporcionando à UFFS desenvolver ações que atendem os estudan-
tes com insuficiência de condições financeiras, viabilizando a igualda-
de de oportunidades e contribuindo para o êxito do acadêmico.
Porém, como foi dito, a assistência estudantil, em todas as suas
formas, não somente com bolsas e auxílios financeiros, não resolve
o problema da evasão nos cursos superiores. É fundamental que ela
seja mais forte possível, pois, assim, vai contribuir mais significati-
vamente na redução destes números. Cabe à universidade, dentro
daquilo que concebemos como sua autonomia, buscar os elementos
que têm contribuído para a evasão, analisá-los e encaminhar solu-
ções, visando, por um lado, à permanência qualificada de seus es-
tudantes e, por outro, utilizar da melhor forma e com maior retorno
social o dinheiro público nela investido.
Referências
BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR. Diplomação, Retenção
e Evasão em cursos de graduação em Instituições de Ensino Superior
Públicas. Brasília, 1997.
CURI, L. R. L. Folha de São Paulo, Caderno 3, São Paulo, 03 de maio de
1998.
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PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES 
DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
FONAPRACE. Plano Nacional de Assistência Estudantil. 2001.
PEREIRA, J. T. V. Uma contribuição para o entendimento da evasão: um
estudo de caso. São Paulo, SP: UNICAMP, 1995.
RISTOFF, D. Educação superior no Brasil – 10 anos pós-LDB: da expansão à
democratização. In: BITTAR, M.; OLIVEIRA, J. F. de; MOROSINI, M. (Orgs.).
Educação superior no Brasil – 10 anos pós-LDB. Brasília: Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2008. p.39-50.
RISTOFF, D. I. Universidade em foco: Reflexões sobre a educação superior.
Florianópolis, SC: Insular, 1999.
SILVA FILHO, R. L. L. et al. A evasão no Ensino Superior Brasileiro. Cadernos
de Pesquisa, São Paulo, v. 37, n.132, set./dez. 2007.
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DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
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LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO
LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO:
ESTUDANTES DO CURSO DE PEDAGOGIA ENTRAM NO
DEBATE SOBRE A PRODUTIVIDADE DO TRABALHO
COM TEXTOS NA UNIVERSIDADE1
Zoraia Aguiar Bittencourt2
Suzana Schwartz3
Introdução
A leitura nos cursos de graduação está cada vez mais se tornan-
do um desafio para professores e estudantes universitários. A estra-
tégia de solicitar a leitura prévia de textos para as aulas parece ter se
tornado a principal metodologia de trabalho no Ensino Superior. Uma
breve análise dos planos das disciplinas entregues por professores de
diferentes cursos pode referendar essa afirmação. No entanto, essa
metodologia não parece estar atingindo o objetivo a que se propõe,
que é o de subsidiar as aprendizagens que se deseja construir, pois
muitos alunos, na maioria das vezes, não percebem significado na
tarefa e não realizam as leituras solicitadas.
Este procedimento, de solicitar leituras prévias aos estudantes, já
naturalizado nas práticas pedagógicas de muitos professores universi-
1 Este capítulo é uma versão adaptada de trabalho publicado na Revista Leitura. Teoria &
Prática, 2012.
2 Professora Assistente da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Erechim, Curso de
Licenciatura em Pedagogia. E-mail: zoraia.bittencourt@uffs.edu.br
3 Professora Adjunta da Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, Campus Jaguarão,
Curso de Licenciatura em Pedagogia. E-mail: suzana@jsexport.com
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LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO
tários, se baseia em, a partir da listagem dos conteúdos das disciplinas,
escolherem textos que abordem os temas/conteúdos que desejam/
precisam ensinar e que esperam que os alunos aprendam. Neste cená-
rio, frequentemente há uma ausência da leitura solicitada, a qual é vis-
ta por muitos professores como “desleixo”, “desinteresse”, “preguiça”,
“falta de compromisso” dos estudantes. No entanto, seria essa conclu-
são, bastante recorrente em salas de professores universitários, a única
explicação para a não-leitura dos textos solicitados pelos professores?
A hipótese aqui é a de que, para o sucesso desta prática, os
textos precisariam estar articulados com a compreensão leitora dos
alunos e com o prazer de ler para aprender.
Diante desta situação, este artigo apresenta os resultados de
uma pesquisa que buscou investigar com os estudantes os seus mo-
tivos para ler (ou deixar de ler) os textos solicitados pelos professores
e as sugestões que oferecem como forma de modificar essa situação.
Para iniciar esta discussão, cabe explicitar, então, quem são estes
estudantes ingressantes no Ensino Superior brasileiro, especificamen-
te nos cursos de Pedagogia, uma vez que os sujeitos participantes
desta pesquisa são alunos deste curso.
Quem são os alunos dos cursos de Pedagogia no contexto
brasileiro?
As estatísticas indicam que a maioria dos estudantes brasileiros
conclui o Ensino Fundamental e o Ensino Médio lendo sofrivelmente
e sem domínio da linguagem matemática básica (PISA; INEP). Muitos
desses alunos podem ser considerados analfabetos funcionais, pois,
de acordo com o INAF (Indicador de Alfabetismo Funcional, 2011),
apenas 26% da população de 15 a 64 anos é considerada plena-
mente alfabetizada. Esse mesmo estudo aponta que, dos alunos que
completaram o Ensino Médio, apenas 35% atingem o nível pleno de
alfabetismo e, entre os que chegaram ao Ensino Superior, 62% atin-
gem pleno domínio das habilidades de leitura/escrita (INAF, 2011).
Esses dados nos permitem concluir que 38% dos que ingressam no
Ensino Superior não têm pleno domínio dessas habilidades.
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Essa percepção, vivenciada empiricamente em nossa prática co-
tidiana, demanda estudos no sentido de evidenciar como os profes-
sores estão lidando com esses alunos, bem como conhecer como os
alunos estão desenvolvendo estratégias de soluções para as limita-
ções decorrentes do Ensino Fundamental e Médio. 	
A intenção de trazer estes dados aqui, em um estudo sobre pro-
fessores e alunos do Ensino Superior, é a de sinalizar que o Ensino
Fundamental e o Médio não estão dando conta de ensinar aos alunos
habilidades básicas para outras aprendizagens, como a compreensão
e a produção de textos, por exemplo. Considerando-se que parte de
tais egressos do Ensino Médio levam para o Ensino Superior essa séria
defasagem no conhecimento quanto à produção de leitura, cabe exa-
minarmos com que instrumentos e práticas pedagógicas os docentes
têm buscado auxiliar os alunos na superação de suas dificuldades.
	 Outro aspecto que seria importante destacar se refere ao pro-
cesso de escolha profissional desses alunos. Com base nos dados do
ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), o INEP4
(Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) traçou um perfil
dos alunos que manifestaram o desejo de ser professor. As conclu-
sões parciais deste estudo: a) a maioria dos alunos que escolhe essa
profissão é mulher, cursou Ensino Fundamental e Médio em escola
pública, alcançou, em média, pontuação mínima no ENEM, tem ren-
da familiar de até dois salários mínimos, foi educada apenas pela mãe
analfabeta ou com baixo índice de escolaridade. Dentre os jovens de
17 a 20 anos que fizeram o ENEM em 2007, apenas 5,2% manifesta-
ram terem escolhido a profissão de professor de Ensino Fundamental
e Médio. Interessante ressaltar também que o estudo concluiu que os
estudantes com as piores notas ao longo de sua escolaridade são os
que têm probabilidade quase três vezes maior de escolher a carreira
do magistério.
Diante destas informações, o INEP inferiu que “existem evidên-
cias de que a carreira do magistério não está conseguindo atrair os
melhores candidatos” e que é “pouco provável que o país esteja se-
lecionando os professores entre os melhores alunos”. Consequente-
4 Disponível em: <http://www.inep.gov.br>. Acesso em: 15 ago 2013.
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mente, a universidade como agência formadora de professores está
sendo questionada. 	
Outra pesquisa, encomendada pela Fundação Victor Civita à Fun-
dação Carlos Chagas (2009), mostrou que apenas 3% optam de fato
por ser professor, o restante cursa Pedagogia por motivos alheios
ao seu desejo inicial, como, por exemplo, a maior facilidade para o
ingresso, por ser um dos únicos cursos existentes em sua região, ou
pelo preço das mensalidades, no caso de instituição privada.
Esses índices refletem algumas características importantes dos
alunos ingressantes do curso de Pedagogia: sujeitos que não esco-
lheram ser professores, alguns analfabetos funcionais, que não de-
senvolveram o prazer de ler. Percebe-se também que, desde o Ensino
Fundamental, a aprendizagem da leitura e da escrita não acontece
de modo significativo, acabando por desencadear um efeito dominó,
que colabora para que os poucos alunos que conseguem concluir o
Ensino Médio cheguem aos cursos de licenciatura com lacunas impor-
tantes em sua aprendizagem e, consequentemente, na compreensão
leitora. “Eles são vítimas de um currículo escolar pobre, da falta de
professores e da desmotivação dos profissionais da educação” (MA-
SAGÃO, 2011)5
.
Como dito, uma dessas lacunas refere-se às estratégias de leitura
e de compreensão textual, além das que se referem às de produção
de textos, relacionadas aos níveis de alfabetismo que o sujeito possui.
De acordo com informações fornecidas por um estudo realizado pela
Organização Não Governamental Ação Educativa em parceria com
o Instituto Paulo Montenegro, do IBOPE, a cada dez universitários,
dois podem ter problemas em acompanhar o curso devido a dificul-
dades de compreender textos. O estudo analisou jovens de 15 a 24
anos das regiões metropolitanas de Fortaleza, Recife, Salvador, Belo
Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Brasília
(MASAGÃO, 2011).
Tendo apresentado este panorama e um breve perfil dos alunos
dos cursos de Pedagogia no contexto brasileiro, incluindo suas dificul-
5 Disponível em: <http://aprendiz.uol.com.br/content/kekichewre.mmp>. Acesso em: 10
ago 2013.
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dades de ler e de compreender o que leem e as estratégias que vêm
sendo utilizadas sistematicamente pelos professores para trabalhar
os conteúdos de suas disciplinas através da solicitação de leitura de
textos, quais reflexões podem ser encaminhadas sobre a adequação
do uso dos textos nas mais variadas disciplinas, desde o primeiro se-
mestre dos cursos, fator convergente e pouco discutido na prática
docente nos cursos de Pedagogia? Neste sentido, busca-se conhecer
o quadro de desencontro entre o ensino e a aprendizagem, analisan-
do o aluno que o professor deseja que chegue ao Ensino Superior e
o que, de fato, chega, incluindo as relações entre as estratégias6
que
contribuem para a formação do sujeito-aluno-leitor e as que estão
sendo prioritariamente utilizadas na universidade.
Entram nesta discussão, os estudantes do curso de Peda-
gogia...
Não sei dizer o que deveria acontecer exatamente,
mas talvez levar em conta que temos cinco matérias
durante a semana, ou seja, a cada semana temos, no
mínimo, 100 páginas para ler, lembrando que não são
leituras que podem ser feitas de qualquer maneira,
pois exigem atenção redobrada.
Para além do professor universitário que, muitas vezes, tem certa
dificuldade em ministrar suas aulas, já que estas, em sua maioria,
pressupõem a leitura prévia de textos de referência, os quais, como
dito, frequentemente, não são lidos pelos alunos e, quando são lidos,
nem sempre são compreendidos em sua totalidade, há os estudantes
e suas vozes, as quais, na maioria das vezes e por diferentes razões,
não são ouvidas em nossas salas de aula.
Preocupadas em conhecer como essa situação é observada/vi-
venciada pelos próprios estudantes, foi realizada uma pesquisa com
38 alunos do 3º semestre do curso noturno de Licenciatura em Peda-
6 Entendemos por estratégias a capacidade de coordenar esforços e recursos em busca de
metas definidas intencionalmente a serem alcançadas da melhor maneira e no menor espaço
de tempo, priorizando intervenções que nos pareçam mais efetivas.
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gogia do campus Erechim da Universidade Federal da Fronteira Sul.
Para tal, foram entregues questionários contendo duas questões: O
que te faz ler (ou não) os textos solicitados pelos professores das
diferentes disciplinas do curso? e Como acreditas que deveria ser o
trabalho com leitura na universidade?
A partir da análise dos questionários, foi possível observar que há
um distanciamento entre os conhecimentos prévios dos estudantes e
as demandas que lhes são impostas como estratégias de aprendiza-
gem no Ensino Superior. A dificuldade de compreender a linguagem
utilizada nos textos indicados pelos professores se constitui como um
dos principais empecilhos apontados pelos estudantes para a não-lei-
tura destes materiais, uma vez que
essa modalidade de escrita [do discurso científico] tem
o objetivo de divulgar as pesquisas científicas entre os
cientistas; portanto, deve circular dentro de limites mui-
to restritos, atingindo normalmente leitores-especialis-
tas da área, que conhecem o domínio do conhecimen-
to e a metodologia utilizada. Assim, a autora diz que
“como decorrência, o discurso torna-se hermético e im-
penetrável para um leitor não-especialista” (Zamponi,
2005: 169). (BERTOLUCI, 2012)
Nesta dificuldade de leitura, estão implicadas a exigência da
compreensão de palavras que não fazem parte do vocabulário dos
alunos e as próprias características de gêneros textuais (capítulos de
livros ou artigos científicos) que, até então, não faziam parte do rol
das poucas leituras destes estudantes, o que os leva a, “[...] ao in-
vés de ler criticamente, [assumirem] uma postura passiva em relação
aos textos propostos e [serem] incapazes de cumprir as exigências
estabelecidas, provocando nos professores frustração e constantes
reclamações” (COSTA, 2012).
Reclamações estas que, muitas vezes, não consideram que, “ao
ingressar na universidade, os estudantes de Pedagogia (assim como
os de outros cursos) passam a ter contato com um novo mundo de
leituras, muitas vezes desconhecido” (BERTOLUCI, 2012).
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Como podemos observar, estes textos, que não são escritos para
leitores iniciantes, não são compreendidos em sua totalidade pe-
los estudantes, pois prescindem de uma contextualização fornecida
pelos professores, uma vez que estes textos, geralmente, fazem refe-
rência a autores e a fatos dados como conhecidos para o público de
leitores a que são/estão direcionados. “Como decorrência, cria-se um
“jogo de faz-de-conta”: de um lado, professores cobram postura críti-
ca e ativa dos universitários; de outro lado, educandos são forçados a
ostentar uma habilidade de leitura, que, na realidade, não possuem”
(COSTA, 2012).
Sendo assim, orientar os estudantes ingressantes no Ensino Su-
perior é fundamental para que estes possam aprender a ler e a com-
preender estes textos circulantes nos espaços acadêmicos. Neste sen-
tido, Pimenta e Anastasiou (2011, p.240) afirmam que
o inaceitável, entre professores universitários, é estar
acompanhando alunos que entram com certas dificul-
dades e concluem seus cursos, obtendo um diploma
com a nossa conivência, sem terem superado as dificul-
dades inicialmente constatadas, mesmo tendo passado
quatro ou cinco anos na universidade.
Por isso que os docentes, ao fazerem tais afirmações “sobre hábi-
tos de estudo insuficientes, dificuldades de raciocínio e falta de tem-
po para estudar, [precisam compreender] que aprender a estudar é
sempre possível. Muitas vezes falta a orientação básica sobre como
estudar um texto [...]” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2011, p.238). Esta
necessidade de orientação do professor para que haja uma melhor
compreensão dos textos pode ser observada nos depoimentos-apelos
de alguns estudantes participantes desta pesquisa: Alguns professo-
res precisam ler o texto junto com nós, pois são textos muito difíceis
e muito compridos: quando chego no final, não lembro mais nada; E
que entendam que, por mais que a gente leia, às vezes leitura não é
sinônimo de compreensão de texto.
Para estudantes que trabalham 40h semanais e que frequentam
diariamente a universidade no período da noite, considerando que
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muitos também realizam longas jornadas de deslocamento até a uni-
versidade, a falta de tempo é apontada como uma das grandes ra-
zões para a não-leitura dos textos acadêmicos. Para tentar driblar esta
dificuldade e minimamente cumprir com as demandas acadêmicas,
estes alunos adotam práticas que nem sempre resultam em aprendi-
zagem: Leio aos sábados, mas, no dia da aula, já esqueci do assunto.
Esta falta de tempo extraclasse para realizar a leitura dos textos
surge, nesta pesquisa, como a principal causa para a não-leitura. Ela
foi apontada por quase metade dos estudantes pesquisados, o que
mostra que trabalhar e estudar vem se apresentando como um gran-
de obstáculo para estes alunos de classes populares, os quais agora
estão ingressando em cursos de graduação noturnos, tal qual afir-
mam estas estudantes: Porque geralmente o aluno noturno trabalha
diurnamente, não tem tempo de ler e, se começa a ler, gera sono
devido ao cansaço. Então, penso que os cursos noturnos devem ser
repensados na questão da didática adotada; Talvez se entendessem
que meu tempo é muito pouco para leitura, pois trabalhar e estudar
é muito puxado e o desgaste físico e psicológico é grande.
Em pesquisas realizadas em outros estados, como a realizada em
2007 por Bertoluci “com 60 alunos das duas turmas de 1º ano de um
curso noturno de Pedagogia em uma faculdade particular da região
metropolitana de Campinas/SP”, foram encontrados, talvez por tam-
bém se tratarem de estudantes-trabalhadores, resultados similares à
pesquisa aqui apresentada:
Outro grupo de alunos representa justamente aqueles
que não conseguem ler os textos por diferentes razões:
20,59% afirmaram não ter tempo disponível para a re-
alização das leituras; 8,82% não leem devido às difi-
culdades que encontram no processo de compreensão;
5,88% argumentam que há um excesso de textos para
leitura semanalmente e 2,94% apontam falta de recur-
sos financeiros para ter acesso a todos os textos indica-
dos pelos professores. Cabe salientar que os alunos em
questão são, em sua maioria, trabalhadores de jornada
integral, que possuem pequenas “brechas” de tempo
para realizar as leituras e, por esta razão, acabam op-
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tando entre um ou outro texto. É importante que se
ressalte novamente que o fato de os alunos estarem
lendo não garante que estejam realmente entendendo
os textos (BERTOLUCI, 2012).
Além disso, segundo os estudantes pesquisados, os textos soli-
citados são geralmente muito extensos, o que dificulta a compre-
ensão das ideias apresentadas pelos autores, pois é a primeira vez
que se deparam com leituras tão longas. Estas extensas (e, às vezes,
densas) leituras acabam sendo realizadas em horários de intervalo no
trabalho, durante longas viagens de deslocamento dos alunos até o
trabalho, ou ainda após chegarem em casa depois de três turnos fora,
o que leva alguns a terem que vencer o cansaço e o sono, aponta-
dos por um terço dos entrevistados, para conseguir dar conta destas
leituras: Sinceramente, não sei, eu estou em uma universidade, sou
a favor da leitura, porém desejaria a compreensão, porque eu farei o
possível para permanecer no curso. Mas não posso transpor limites
que chegam ao físico, como cansaço, fome e sono.
Os estudantes-trabalhadores, ao se depararem com leituras ex-
tensas, ficam com tempo reduzido para realizar todas as leituras, o
que os faz, muitas vezes, terem que optar por um ou outro texto,
pela leitura solicitada em uma ou em outra disciplina, como afirma
esta estudante: Textos longos e de cinco disciplinas diferentes para
todas as aulas (diariamente) é muito difícil. O meu trabalho exige ati-
vidades extraclasse, planejamento e isso também implica no tempo
disponível de/para leitura.
Com isso, como complicador deste quadro, há o acúmulo de
leituras, uma vez que aqueles alunos que cursam todas as disciplinas
acabam por ter um número muito grande de páginas para dar conta
a cada semana de aulas. Alguns afirmam que também é comum
alguns professores solicitarem a leitura de mais de um texto para a
mesma aula: Acúmulo de textos, sendo que, às vezes, têm mais de
um texto da mesma disciplina para a mesma noite, totalizando a
leitura de muitos textos por semana.
Considerando que, segundo Demo (2008, p.14), “na escola e na
universidade estudar é o que menos se faz, gastando-se o tempo com
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aulas e com provas”, muitos estudantes, então, realizam somente
aquelas leituras que servirão de base para futuras avaliações, como
afirmam nove estudantes participantes da pesquisa em relação aos
motivos que as levam a ler os textos solicitados: Leio somente por
saber que o texto será o tema da aula e que será cobrado em ava-
liações; Leio pela pressão para apresentar o texto em seminários; Só
leio por causa da pressão para responder questões a serem entre-
gues; Normalmente leio para fazer os trabalhos, e não por interesse
próprio; Leio porque o professor pede; Leio por obrigação, pois às
vezes estou muito cansada e preciso ler para responder questões ou
fazer trabalhos (fichamentos, seminários...); Leio somente na sema-
na antes da avaliação para obter uma nota boa.
A velocidade com que as informações veiculam atualmente tam-
bém leva nossos jovens estudantes a não conseguir dedicar um espaço
e um tempo adequados para realizar as leituras acadêmicas, o que
corrobora com uma das principais características contemporâneas da
leitura (e também das práticas de leitura destes nossos alunos traba-
lhadores), que é a de que hoje “leem-se vários livros ao mesmo tempo,
passa-se de uma leitura à outra; cada vez menos momentos específicos
são dedicados à leitura, lê-se nos meios de transporte, fazendo outra
coisa, ouvindo televisão, música, saboreando uma refeição, à espera
de uma consulta médica” (HORELLOU-LAFARGE; SEGRÉ, 2010, p.132).
No entanto, 27 dos 38 estudantes afirmaram que, quando leem
os textos para as aulas, o fazem pelo interesse em “estar por den-
tro” do que será ensinado/aprendido, podendo melhor participar das
aulas, ou ainda, motivados pela curiosidade, o querer aprender, o
interesse pelo assunto estudado. É importante que os professores
escutem o que motiva seus alunos a lerem os textos, já que a iniciati-
va da “escolha de um material que seja acessível ao estudante e, ao
mesmo tempo, que vá desafiá-lo, assim como o acompanhamento
do processo pelo professor, é condição de sucesso nessa estratégia
[estudo de texto]” (ANASTASIOU; ALVES, 2010, p.87).
Outro fator apontado por dois estudantes é o uso que é feito
pelo professor em aula do texto que foi previamente solicitado, pois,
segundo eles, as estratégias propostas a partir destas leituras podem,
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muitas vezes, desmotivar futuras leituras: Se eu ler um texto uma vez
para determinada aula e o professor não utilizar o mesmo, nem co-
mentar o texto para sanar dúvidas, na próxima vez não leio.
Com o objetivo de também apontar possibilidades, a segun-
da questão apresentada aos estudantes solicitou que estes forneces-
sem sugestões de outras estratégias metodológicas que pudessem
complementar/substituir o trabalho com textos na universidade. As
respostas de mais da metade dos estudantes entrevistados iniciam
com a expressão Não sei, o que pode indicar que muitos também
não vislumbram outras formas de trabalhar com textos no ambiente
acadêmico, apesar do fracasso (ou da não produtividade) que essa
prática vem apresentando em diferentes cursos de graduação. Al-
guns afirmam não idealizar novas possibilidades, pois esta tarefa se-
ria exclusiva de seus professores, outros ainda pensam ser tempo
perdido opinar sobre práticas pedagógicas que, até então em sua
trajetória escolar, nunca se preocuparam com o que eles pensam.
Mesmo assim, 28 estudantes arriscaram algumas possibilidades ao
dar sequência às suas respostas, dentre elas: Não sei explicar, mas
creio que uma aula mais dinâmica influencia bastante para que nós
nos interessemos mais; O texto nos proporciona conhecimento, mas
não é a única forma de aprendermos algo. Aulas demonstrativas e
práticas são mais rentáveis e menos cansativas; Os professores po-
deriam utilizar os textos para mais que uma aula, explorá-los melhor,
fazer mais questionamentos orais e escritos a partir dos textos; Usar
os mesmos textos para mais de uma disciplina.
Como observamos nestas sugestões, os alunos têm muito a di-
zer, apesar de não se sentirem legitimados para falar. Eles oferecem
ricas contribuições, as quais, se consideradas/ouvidas por seus pro-
fessores, podem servir como repertório para se (re)pensar as práticas
de leitura no Ensino Superior.
Seria interessante que, ao invés de xerox de capítulos,
poderíamos adotar um livro acessível, onde poderíamos
comprar e utilizar durante o semestre. [...] Não consigo
compreender o contexto destes textos, o que prejudica
o aprendizado e o aproveitamento da matéria.
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Uma sugestão recorrente destes estudantes foi a de que seja
feito pelos professores, anterior às leituras, o marketing do texto a
ser lido, o que significa que o professor demonstre que leu e conhece
o texto (e seu respectivo autor), gostou do que leu e, por estes mo-
tivos, mais legítimos aos sujeitos desta pesquisa, sugere, então, esta
leitura aos alunos. “Também ajudaria neste processo de formação a
motivação para a leitura, se o interesse em ler do aluno e o prazer
das leituras exigidas estivessem no horizonte de preocupações dos
professores formadores” (CORRÊA, 2012). Neste sentido, uma vez
que fica evidente o encantamento do professor pelo texto, os alunos
afirmam que, somente isso, já basta para motivá-los a ficarem curio-
sos pela leitura sugerida (e não exigida). Exemplos disso podem ser
lidos no depoimento abaixo transcrito:
Na aula anterior, comentar elogiando ou criticando o
próximo texto. [...] Trabalhar embasando o texto para
que o estudante sinta que, se não ler, ficará “perdido”.
Somos grandes, o texto deve ser apresentado sem ser
uma obrigação. Ao invés de dizer “Você deve ler”, dizer
“É interessante que você leia”. Dizer quem é o autor
(pedagogo, economista...).
Por fim, é possível observar certa empatia/solidariedade/com-
preensão de alguns alunos em relação às opções metodológicas de
seus professores, o que pode estar demonstrando que acreditam
que é possível (tentar) conciliar suas necessidades e as exigências
curriculares dos próprios professores: Não sei por que, mas, se não
lermos os textos, como serão as aulas?; Não sei, talvez dar menos
textos, mas não sei se eles conseguiriam cumprir com os cronogra-
mas.
Como vimos, existe uma grande distância entre as práticas de lei-
tura propostas pelas universidades e o nível de proficiência de leitura
de seus mais novos alunos. Mas, afinal, o que pode ser feito neste
sentido? Muitos autores buscam apresentar propostas para reverter
essa precariedade da leitura no Ensino Superior. Todos eles afirmam
a necessidade do trabalho dos professores universitários estar voltado
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para uma alfabetização acadêmica7
que seja capaz de servir como
base de leitura de textos até então desconhecidos e que circulam
prioritariamente no meio acadêmico.
Sendo assim, parece estar sob responsabilidade do professor a se-
leção do material didático, dos recursos e das estratégias de ensino que
adotará em sua sala de aula, bem como cabe-lhe compreender que
o aluno ingressante no meio universitário não possui experiências de
leitura de gêneros acadêmicos, cuja complexidade exige do estudante
processo cognitivo diferente do que lhe era exigido no Ensino Básico.
Nesse sentido, é tarefa do docente de Ensino Superior orientar os
estudantes em suas leituras, esclarecendo conceitos e diálogos entre
autores, bem como apontando o que é esperado de sua leitura. A in-
teração entre professor e aluno é tão necessária no meio acadêmico
quanto o fora nos níveis de formação anteriores, já que, por vezes,
num primeiro momento, será sob orientação do professor que o alu-
no terá condições de compreender os sentidos dos textos estudados.
Conclusão
Fazer com que a leitura seja prazerosa, não só um de-
ver. A pessoa tem que gostar, pois assim aprende e
entende melhor o que foi proposto.
A partir da análise dos resultados da pesquisa, é possível afirmar,
então, que os estudantes-sujeitos desta pesquisa, em sua maioria,
não leem os textos por falta de tempo, por sentirem cansaço após um
dia inteiro de trabalho e pelo acúmulo de textos exigidos a cada se-
mana de aulas. O que, majoritariamente, os impulsiona a ler os textos
é realizar atividades avaliativas decorrentes destas leituras, conhecer
o assunto a ser debatido em aula e possuir interesse pela temática.
Suas propostas estão direcionadas, principalmente, para a solicitação
de leitura de textos curtos, atrativos e de fácil compreensão.
7 Tal conceito envolve um conjunto de noções e estratégias necessárias para que o estudante
universitário possa se integrar à cultura discursiva do meio acadêmico, atuando efetivamente
nas produções e análises de textos solicitados em seu processo de aprendizagem (CARLINO,
2005).
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Neste sentido, e corroborando o depoimento que abre esta úl-
tima seção do texto, percebe-se que as sugestões oferecidas pelos
estudantes apontam para algum tipo de articulação do prazer de ler
com as demandas dos professores, o que parece não estar ocorren-
do. Portanto, considerando as sugestões dos estudantes, observa-se
que este quadro só será revertido se e quando o prazer fizer parte
das atividades que envolvem leitura no Ensino Superior e estas estive-
rem em sintonia com a compreensão leitora dos estudantes.
Sendo assim, o reconhecimento das dificuldades relacionadas
com a leitura deveria encaminhar para o uso de outro tipo de estra-
tégia nos primeiros anos da graduação. E isso demandaria que o pro-
fessor diagnosticasse o conhecimento e as experiências prévias dos
alunos e planejasse procedimentos com o objetivo de que os alunos
(re)aprendessem a ler e a estudar.
Uma das maneiras de fazer isso é fazer escolhas que vão ao encon-
tro do perfil dos alunos reais, os quais não tiveram experiências de leitura
de textos científicos no Ensino Fundamental e Médio e precisam não só
vivenciar isso, mas aprender na universidade, com seus professores, a ler
estes novos gêneros. Sendo assim, as conclusões deste estudo apontam
para o uso de estratégias pedagógicas que busquem contribuir para a
compreensão de textos que circulam prioritariamente no meio acadêmi-
co, visando um trabalho produtivo com leitura na universidade.
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METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA
METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL
QUANTITATIVA
Douglas Santos Alves1
Introdução
A formação do cientista social, seja ele bacharel ou licenciado,
passa pela aquisição de um corpus teórico mais ou menos referen-
ciado no meio e pelo domínio do processo de construção de conhe-
cimento científico. A primeira dimensão da formação profissional, a
teórica, não só é largamente aceita como requisito essencial, como
até mesmo naturalizada. A naturalização pode significar um pro-
blema em contextos como o brasileiro e latino-americano, que mais
importam do que produzem teoria social. Já a segunda dimensão,
referente à pesquisa, sofre preconceitos variados que interferem na
formação do profissional de ciências sociais.
A divisão da formação em licenciatura e bacharelado remete a
uma separação entre professores e pesquisadores, na qual os primei-
ros não necessitam dominar as ferramentas ligadas à pesquisa e os
segundos dispensam a formação didático-pedagógica. Em ambos os
casos, ainda, se reproduz outro tipo de preconceito, referente a um
certo antagonismo criado entre abordagens de pesquisa qualitativas
e quantitativas. Em todos os cenários se produz uma formação não
só deficiente, mas que cria as condições necessárias para sua perpe-
1 Professor na UFFS, doutorando em Ciência Política na UFRGS. E-mail:douglas.alves@uffs.
edu.br
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
50
METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA
tuação deficitária. Por um lado, se limita a autonomia do profissional
e do estudante frente ao conhecimento canônico. Por outro, se debi-
lita sua capacidade de crítica, tornando-o refém do conhecimento es-
tabelecido desde os grandes circuitos produtores de pesquisa e teoria
social, em geral Estados Unidos e Europa. Desde esta perspectiva, tor-
na-se fundamental reestabelecer a unidade entre ensino e pesquisa e,
para tanto, desfazer os falsos antagonismos entre métodos e técnicas
quantitativas e qualitativas necessários à pesquisa.
1 A oposição qualitativo-quantitativo e o preconceito com
os números
Por diversos motivos, os métodos quantitativos têm sido vistos
com certo preconceito e mesmo desconfiança pelas ciências sociais
na América Latina (BAQUERO, 2009). O motivo primeiro provavel-
mente está vinculado ao fato de o estudante que opta por um curso
de humanidades acredita que estará escapando, dessa maneira, dos
números. Em geral, os conhecimentos ligados à matemática são vistos
como uma abstração completa, que dificilmente poderão se articular
a qualquer realidade objetiva. Tornam-se, dessa forma, pensamento
mágico, operações sem sentido que produzem resultados através de
procedimentos obscuros e misteriosos. Os números, encarados deste
modo, adquirem aparência fantasmagórica.
Contudo, este preconceito ganha imensa força quando encon-
tra, no interior do meio acadêmico, certas ideias que já se torna-
ram senso comum entre professores e pesquisadores. Dentre elas a
de que métodos e técnicas de pesquisa possuiriam, por si mesmos,
certa carga ideológica e/ou conteúdo epistemológico. Disso decorre
um antagonismo já naturalizado no Brasil e na América Latina entre
pesquisa qualitativa e quantitativa, cujas origens geralmente ficam
despercebidas.
No contexto do pós-guerra, os estudos comparativos entre países
ganharam grande atenção. O complexo industrial militar ligado ao
governo norte-americano passou a financiar direta e indiretamente
centros e institutos de pesquisa social ligados às principais universi-
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
51
METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA
dades dos Estados Unidos (CHILCOTE, 1997). Em um momento mar-
cado pela guerra fria, o interesse em conhecer a realidade dos países
do chamado terceiro mundo se vinculava à necessidade de obter in-
fluência num mundo dividido entre o campo soviético e o capitalis-
ta. A América Latina, neste contexto, tornou-se alvo de interesse de
estudiosos financiados por órgãos como Pentágono, CIA (Agência
Central de Inteligência), FBI (Bureau Federal de Investigações), o De-
partamento de Estado, dentre outros (CHILCOTE, 1997). É preciso
lembrar que neste período ocorriam diversos golpes de Estado na
América Latina e os altos comandos militares latino-americanos pos-
suíam estreitos laços com os EUA.
Também, como resultado da corrida tecnológica e armamentista
do mundo bipolar, foram desenvolvidos os primeiros computadores.
Sua criação permitiu um grande avanço na área da estatística, que
logo foi incorporada às ciências sociais como ferramenta de análise
de dados coletados em larga escala. Assim, estudos quantitativos co-
meçaram a se alastrar, fornecendo dados que permitiam sustentar
análises sobre a realidade dos países que eram disputados como área
de influência pelos dois blocos em conflito na guerra fria.
Os preconceitos e desconfianças que citamos, entretanto, não
podem ser suficientemente explicados por estes motivos, uma vez
que a queda do Muro de Berlin (1989) colocou um suposto ponto
final naquela situação. O fato é que, dentro do campo das ciências
sociais, há uma acirrada disputa epistemológica. As correntes teóri-
cas hegemônicas, principalmente dentro do meio acadêmico norte-
-americano, procuraram tomar como referência as ciências exatas,
buscando sempre regularidades e padrões fixos no interior dos fe-
nômenos sociais. Com o advento da informática e o grande impulso
que isso ocasionou no desenvolvimento da estatística, os estudos de
tipo quantitativo foram imediatamente assimilados pelas linhas mais
conservadoras das ciências sociais daquele país.
No caso da ciência política, é interessante notar que a realização
de pesquisa nesse campo já não se tratava mais de uma atividade
intelectual de um pesquisador isolado refletindo a partir de seus li-
vros e estudos sobre a realidade. Mas passou a se apoiar em grandes
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
52
METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA
aparatos de pesquisa com projetos internacionais e equipamentos até
então caros, exclusivos2
e financiados com somas que chegavam à
cifra de milhões de dólares.
	 Assim, nesse cenário tão peculiar, os métodos quantitativos
acabaram sendo identificados, do ponto de vista político, com inte-
resses geralmente alheios à realidade dos países do então terceiro
mundo. Já do ponto de vista teórico/epistemológico, foram de ime-
diato associados a uma concepção de ciência rígida e conservadora.
Tais elementos combinados serviram de base para um clima de des-
confiança na recepção dos métodos e técnicas quantitativos no Brasil
e América Latina.
2 A estatística como ferramenta de auxílio
As pesquisas quantitativas estão profundamente apoiadas na es-
tatística, porém seria um engano acreditar que esta antecede as ciên-
cias sociais na realização da pesquisa social. Ao contrário, ela deve ser
entendida como mera ferramenta, como auxílio e ponto de apoio. Os
números não podem nos dizer nada se não forem interpretados à luz
das teorias. Mais do que isso, os números não podem ser extraídos
sem antes passarmos pelas teorias.
O processo de construção do conhecimento científico através da
pesquisa está longamente discutido em diversos manuais acadêmi-
cos. Sem reproduzir aqui essa literatura, recordamos simplesmente
que a definição dos métodos e técnicas de coleta de dados constitui
somente uma das diversas etapas da pesquisa científica. Tal escolha,
é preciso reforçar, não é aleatória, mas consequência lógica da elabo-
ração do projeto de pesquisa.
A seleção do instrumental metodológico está, por-
tanto, diretamente relacionada com o problema a ser
estudado; a escolha dependerá de vários fatores rela-
2 Basta recordar que, se hoje os microcomputadores são algo relativamente acessível, nos
anos 1960 eram máquinas gigantescas, ocupando andares inteiros de prédios em salas refrige-
radas e de uso exclusivo militar ou para pesquisa.
UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO
53
METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA
cionados com a pesquisa, ou seja, a natureza dos fenô-
menos, o objeto da pesquisa, os recursos financeiros, a
equipe humana e outros elementos que possam surgir
no campo da investigação. Tanto métodos quanto téc-
nicas devem adequar-se ao problema a ser estudado,
às hipóteses levantadas e que se queira confirmar, ao
tipo de informantes com que se vai entrar em contato.
(MARCONI; LAKATOS, 2010, p.147).
Assim, definir métodos e técnicas é uma escolha arbitrária do
pesquisador, porém não é uma escolha ao acaso: obedece à lógi-
ca geral da pesquisa, desde a formulação do problema. Em última
instância, diz respeito ao meio mais eficaz, dentre uma diversidade
de meios disponíveis, para se levar adiante a investigação. Mais ain-
da, antes de estar ligado a um problema de tipo epistemológico,
está ligada à globalidade do projeto de pesquisa, e mesmo a fatores
bastante concretos, porém nem sempre considerados com a devida
importância, como os recursos financeiros disponíveis, por exemplo.
Além disso, envolvem um exercício muito acurado de manipula-
ção de teorias. Transformar conceitos teóricos, geralmente abstratos
e complexos, em indicadores concretos e verificáveis na realidade
constitui uma condição necessária para a construção de qualquer
questionário (QUIVY; CAMPENHOUDT, 2008). Para tanto, um pro-
fundo domínio das teorias é necessário. Ousamos afirmar que, se isso
vale para uma pesquisa, vale também para quem estuda os resulta-
dos de uma pesquisa. Não só a construção de dados, mas também
sua interpretação exigem a mediação da teoria.
É neste sentido que retomamos a afirmação inicial, da natureza
instrumental da estatística para as ciências sociais. Compreender tal
afirmação impõe a ruptura com os preconceitos e desconfianças.
A escolha de métodos e técnicas quantitativas, uma vez realiza-
das as etapas que antecedem o desenvolvimento da pesquisa, agora
sim, trazem implicações efetivas, mas que já estavam contidas nos
momentos anteriores da investigação. A mais importante delas é a
quantificação. Aí entram as especificidades de cada técnica de coleta
de dados. Em geral, a pesquisa quantitativa possibilita, com uma pre-
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Universidade publica em tempos de expansao (2) (1)

  • 2.
  • 3. Thiago Ingrassia Pereira ORGANIZADOR) UNIVERSIDADE PUBLICA EM TEMPOS DE EXPANSAO Entre o vivido e o pensado Erechim, 2014
  • 4. © Os autores - Todos os direitos reservados - 2014 COLEÇÃO DEBATES DO PRÁXIS Coordenação: Thiago Ingrassia Pereira – UFFS Conselho Editorial: Jaime José Zitkoski – UFRGS Leandro Raizer – IFRS Bianca de Freitas Linhares – UFPel Rafael Arenhaldt – Colégio de Aplicação (UFRGS) Giovani Forgiarini Aiub – IFRS Vilmar Alves Pereira – FURG Mauro Meirelles – UNILASALLE Douglas Santos Alves – UFFS Luís Fernando Santos Corrêa da Silva – UFFS Revisão: Zoraia Aguiar Bittencourt – UFFS GRUPO PRÁXIS Licenciaturas Modalidade Conexões de Saberes http://petconexoesdesaberes-uffs.blogspot.com.br/ Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Erechim – RS Apoio Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) U58 Universidade Pública em Tempos de Expansão – Entre o Vivido e o Pensado / Organizador: Thiago Ingrassia Pereira. – Erechim : Evangraf, 2014. 112 p. ISBN 978-85-7727-601-1 1. PET Conexões. 2. Saberes. 3. Educação Popular. 4. Acesso ao Ensino Superior. 5. Formação Docente. 6. Escola Pública. I. Pereira, Thiago Ingrassia. CDU 378 CDD 378 (Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo – CRB 10/1507)
  • 5. SUMÁRIO PREFÁCIO Luís Fernando Santos Corrêa da Silva................................................7 ABRINDO O DIÁLOGO Thiago Ingrassia Pereira..................................................................11 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS CAMPUS ERECHIM Marcelo Luis Ronsoni.......................................................................17 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO: ESTUDANTES DO CURSO DE PEDAGOGIA ENTRAM NO DEBATE SOBRE A PRODUTIVIDADE DO TRABALHO COM TEXTOS NA UNIVERSIDADE Zoraia Aguiar Bittencourt e Suzana Schwartz.................................33 METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA Douglas Santos Alves......................................................................49 A PESQUISA COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NO GRUPO PRÁXIS – PET/CONEXÕES DE SABERES Thiago Ingrassia Pereira..................................................................61 DA ESCOLA PARA A UNIVERSIDADE: O NOVO PERFIL DO ESTUDANTE DO ENSINO SUPERIOR Fernanda May.................................................................................75
  • 6. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 6 DESIGUALDADES ESCOLARES E SEUS REFLEXOS PARA A DIVERSIDADE ÉTNICA E DE COR NA UFFS CAMPUS ERECHIM Joviana Vedana da Rosa..................................................................87 EDUCAÇÃO SUPERIOR E SUAS INTERFACES: OS DESAFIOS DA CLASSE TRABALHADORA Daniel Gutierrez............................................................................101
  • 7. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 7 PREFÁCIO PREFÁCIO Luís Fernando Santos Corrêa da Silva1 Diante das possibilidades de definição da universidade, institui- ção formativa que produz e difunde saberes, me agrada a possibili- dade de pensá-la como lugar permeado por desafios. Todos nós, que cotidianamente dedicamos parte significativa do nosso tempo e de nossas vidas ao “fazer universitário”, estamos imbuídos de desafios, sejam eles individuais ou coletivamente partilhados. Nos corredores e nas salas das instituições universitárias, estão configurados desafios múltiplos, impostos ou autoimpostos a todos que participam desses espaços. Como elemento carregado de relevância, um dos grandes desa- fios do presente é o de afirmar a universidade como espaço inclusivo, seja de segmentos sociais ou de pessoas. Por outro lado, o debate sobre a inclusão de grupos sociais excluídos do ensino superior ocorre em paralelo com outro debate caro à instituição universidade, que evoca a importância da formação com qualidade. Diga-se de pas- sagem, o conceito de qualidade está em permanente disputa, visto que é passível de mudança ao longo do tempo e, desse modo, não é sequer desejável que seja entendido como fixo em determinado patamar ou, então, naturalizado a partir de condições pregressas. Em resumo, o imperativo posto como desafio contemporâneo pressupõe a criação de mecanismos inclusivos na educação superior em paralelo à qualificação da formação e dos processos internos às instituições. 1 Professor da área de Sociologia e Ciência Política e Coordenador Acadêmico da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Campus Erechim/RS. E-mail: luisfernando@uffs.edu.br
  • 8. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 8 PREFÁCIO No quadro da universidade que se constrói de desafios, que se pretende inclusiva e que procura produzir formação por meio de pa- drões elevados de qualidade, começa a emergir a superação de uma realidade que, para alguns, parecia intransponível: a ruptura com o modelo elitista de acesso ao ensino superior e ao saber especializado, sobretudo nos cursos mais valorizados socialmente. Esse processo, recente na história do Brasil, tem se tornado possível mediante o in- gresso dos estudantes da escola pública, dos negros, dos indígenas e dos filhos dos pequenos agricultores em espaços acadêmicos antes destinados a alguns poucos afortunados, que rompiam com trajetó- rias familiares de exclusão do ensino superior. A criação de novas universidades públicas, a expansão dos cursos e das vagas oferecidas em universidades consolidadas e o surgimento de políticas públicas como o Prouni têm contribuído de modo consi- derável para o aumento da oferta de educação superior no país. Na última década foram implantados campi universitários em regiões his- toricamente desassistidas pela educação superior pública, o que pro- porcionou maior democratização do acesso, mesmo que problemas relacionados à expansão possam ser identificados com certa facilidade. Contudo, do desafio da criação de novas instituições de ensino e da inclusão das classes populares na universidade emergem novos de- safios, afinal há um novo cenário que se instaura, no qual os atores e as estruturas são significativamente diferentes. Por exemplo, não somente os estudantes possuem perfil diferente daquele que até pouco tempo predominava nas universidades federais, mas também o perfil docente sofreu significativa modificação. A maioria dos novos docentes do en- sino superior é composta por jovens, alguns sem experiência docente pregressa e muitos que ainda buscam a formação em nível de douto- rado. Tais características, distintas daquelas encontradas em universi- dades consolidadas, em nada desmerecem os novos docentes, mas certamente impõem desafios antes não colocados em larga escala2 . 2 Para exemplificar os desafios e a complexidade do novo contexto do qual falo, recordo de uma estudante que me procurou na coordenação acadêmica do Campus Erechim da UFFS para manifestar contrariedade ao posicionamento de sua turma em relação à qualidade das aulas de um professor. Segundo sua percepção, o professor também estava em processo de formação, visto que mencionou em sala de aula que não tinha experiência docente pregressa e havia con- cluído sua formação pouco antes de ingressar na carreira do magistério superior.
  • 9. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 9 PREFÁCIO Neste contexto, diversos questionamentos surgem como tentati- va de melhor compreender essa nova realidade: Qual o perfil socio- demográfico dos novos estudantes do ensino superior? Quais suas expectativas em relação ao ensino superior? As políticas de perma- nência até então vigentes são adequadas para essa nova realidade? Como qualificar a formação dos estudantes das licenciaturas? Que desafios estão colocados no processo de inclusão do estudante tra- balhador? Sobre essas e outras questões se debruçam os autores dos capítulos que compõem o presente livro, organizado por Thiago Ingrassia Pereira. Desde a chegada em Erechim, em março de 2010, compartilho com Thiago Ingrassia Pereira o desafio da implantação de um cam- pus universitário no município. Nossa proximidade, que decorre de interesses profissionais partilhados, mas também de uma amizade que iniciou em Porto Alegre, nos tempos do curso de graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFR- GS, permite que eu ateste sua autodefinição mais recorrente: Thiago Ingrassia Pereira é um operário. Como operário que dedica seus esforços para a causa da educa- ção popular, seu principal compromisso ético, o organizador dessa obra nos brinda com o segundo livro gestado no grupo PET – Cone- xões de Saberes, da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Erechim, do qual é tutor desde dezembro de 2010. O livro, que está organizado em capítulos, conta com a participação de professores, em sua maioria da UFFS, de um técnico-administrativo em educa- ção e de estudantes vinculados ao Programa, e tem como objetivo a socialização dos resultados de pesquisas e estudos realizados nos últimos dois anos. Além de possibilitar a divulgação das atividades realizadas no interior do PET – Conexões de Saberes, o livro possui conotação for- mativa inegável, visto que permite a estudantes de graduação o aces- so à publicação de textos acadêmicos, fato relativamente raro nesta etapa de formação. Por sinal, a prática da escrita acadêmica, muitas vezes relegada a um segundo plano nos currículos dos cursos de graduação, se constitui em ferramenta fundamental no processo de
  • 10. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 10 PREFÁCIO construção de formação universitária, bem como é o meio por exce- lência da divulgação científica mais ampla. O livro não pretende esgotar as temáticas sobre as quais se de- bruça, mas sem dúvida contribuirá consideravelmente para as dis- cussões sobre o novo cenário do ensino superior no país, mais espe- cificamente ao analisar o caso da UFFS, uma das novas instituições federais de ensino superior, que, em setembro de 2013, alcançou quatro anos de existência. Como a UFFS se pretende pública e po- pular, aspecto que é manifestado em documentos como o Projeto Pedagógico Institucional, estudos sobre as condições de inserção dos estudantes no ensino superior são fundamentais, visto que podem inclusive subsidiar o desenvolvimento de políticas de combate à eva- são, qualificação dos processos internos, avaliação das políticas de assistência estudantil, entre outros aspectos. Por fim, cabe manifestar que os desafios e as tensões são per- manentes em uma universidade tão recente como a UFFS. Como é próprio de instituições em implantação, nas quais se inserem pessoas com as mais diversas trajetórias de vida, percursos formativos e visões de mundo, há projetos de universidade em disputa. Cabe à comuni- dade universitária fazer suas escolhas. Contudo, dificilmente será possível construir uma universidade de excelência sem a adoção de critérios de justiça. No atual estado da arte da universidade brasileira, a promoção de critérios de justiça significa romper com a supremacia do mérito, elemento fundamen- tal de diferenciação social na modernidade, o qual, se adotado em forma pura, desvinculado das suas condições sociais de produção, implica em efeitos nocivos para a maioria da população, que ajuda a sustentar a estrutura de Estado que dá suporte à universidade pública com trabalho e impostos, mas dela está apartada. Em âmbito local, se possibilitar o acesso das classes populares ao ensino superior está na raiz da criação da UFFS, nos cabe agora garantir permanência e formação qualificada. Esse é o nosso desa- fio, partilhado coletivamente, mas também compromisso pessoal dos que assumem a causa da educação pública. Refletir sobre tais aspec- tos é o intuito primordial da obra que agora inicia. Que permaneçam vivos nossos desafios!
  • 11. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 11 ABRINDO O DIÁLOGO ABRINDO O DIÁLOGO A produção coletiva do conhecimento é um compromisso polí- tico que assumimos no Grupo Práxis. O conceito que intitula nosso grupo de trabalho indica a relação sinérgica entre teoria e prática, ou seja, sugere um conhecimento aplicado que se constrói em diálogo com sujeitos sociais concretos. Por isso, construímos essa coletânea de textos, com o objetivo de compartilhar nossas experiências de en- sino, pesquisa e extensão durante os anos de 2012 e 2013. Nosso grupo do Programa de Educação Tutorial (PET) iniciou suas atividades na UFFS Campus Erechim (RS) em dezembro de 2010. So- mos um grupo PET na modalidade Conexões de Saberes, o que colo- ca o desafio de produzirmos conhecimento a partir das experiências dos sujeitos que constituem o Programa. Dessa forma, nossos bolsis- tas são estudantes universitários de cursos de Licenciatura do turno da noite. Todos estudaram em escola pública na educação básica e fazem parte das primeiras gerações de suas famílias a cursarem o ensino superior, em especial, o público. O principal tema de pesquisa que articula as ações do Práxis é a democratização do acesso ao ensino superior público. Trabalhamos a partir dos princípios teóricos e práticos do campo da Educação Popu- lar. Isso significa que assumimos plenamente a dimensão política do ato educativo. O desdobramento metodológico dessa base teórica é a pesquisa participante, modalidade de produção do conhecimento na qual ocorre o estabelecimento de relações horizontais entre pes- soas que, em diálogo, designam o mundo. Nesse sentido, a temática transversal de nosso grupo é a forma- ção docente e a escola pública. Não dissociamos a discussão sobre a universidade da escola. Pelo contrário: são nas escolas públicas da re-
  • 12. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 12 ABRINDO O DIÁLOGO gião de abrangência da UFFS/Erechim que desenvolvemos nossas ati- vidades de extensão. Nossa ação “Quero entrar na UFFS” se constitui em palestras, debates e oficinas nas escolas públicas estaduais que ofertam ensino médio regular e na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA) da 15ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) do Rio Grande do Sul. De um total de 50 escolas em 41 municípios do norte gaúcho, nosso projeto de extensão, considerando o período 2011-2013, já esteve em 28 municípios e em mais de 30 escolas. Nossa presença nas escolas objetiva levar informações aos estu- dantes do ensino médio sobre a UFFS e as demais políticas de acesso ao ensino superior (PROUNI, UAB, Lei de Cotas, SISU, FIES), proble- matizando o significado em termos culturais e de projeto de vida (trabalho) que representa a continuidade dos estudos na graduação. Além dessa dimensão informativa, buscamos ouvir os estudantes so- bre suas concepções de universidade, sobre seus projetos futuros e sobre os condicionantes sociais que interferem na tomada de deci- são. Não é simples morar em um município pequeno e de base agrí- cola e ir para a universidade. Mesmo não pagando mensalidade, há custos de transporte, alimentação, moradia, livros e outras questões pertinentes à manutenção da vida. Além disso, percebemos um aspecto subjetivo importante: o apoio dos grupos sociais de referência (em especial a família) nem sempre é positivo em se tratando de continuar a estudar. A necessi- dade do trabalho remunerado é um fato relevante, tanto pela neces- sidade material imediata, como por uma noção moral que constrói o sentido de pertencimento social. Em outras palavras: trabalhar é mais importante do que estudar. Contraditoriamente, sabemos que anos de estudo se relacionam com maiores ganhos financeiros no mercado de trabalho. Contudo, por ainda ser algo novo na região, a universidade pública, diferente do verificado em outras cidades em que já se encontra mais enrai- zada, ainda não desperta essa valorização subjetiva que poderia ser fator importante de incentivo para os concluintes do ensino médio. Por isso, nossa atividade de extensão está implicada com outra ação que passamos a desenvolver em 2012: a pesquisa sobre o per-
  • 13. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 13 ABRINDO O DIÁLOGO fil dos calouros da UFFS/Erechim. Muito se fala sobre a expansão (interiorização) da universidade pública, seja pela criação de novas unidades de universidades já existentes, seja pela criação de institui- ções novas. A UFFS inicia suas atividades letivas em março de 2010 em Erechim e nas cidades de Chapecó – SC (onde fica sua reitoria), Laranjeiras do Sul e Realeza – PR e Cerro Largo – RS. Em 2013 passa a operar com um Campus universitário em Passo Fundo – RS. Assim, foi nossa intenção saber um pouco mais sobre o aluno que estava ingressando em nosso Campus. Nossa pesquisa foi realiza- da por meio de um questionário autoaplicável e respondido pelos ca- louros que ingressaram nos oito cursos1 de graduação ofertados em 2012. A aplicação dos questionários foi realizada nas salas de aula e procurou se constituir em um censo com essa população. Neste pro- cesso seletivo, a UFFS trabalhou com a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e uma bonificação para quem cursou o ensino médio em escola pública. O chamado “fator escola pública” foi2 uma política afirmativa da universidade desde seu primeiro processo seleti- vo em 2010, objetivando o ingresso de maior número de estudantes provenientes da escola pública. Se o aluno tivesse cursado os três anos do ensino médio em escola pública, receberia uma bonificação de 30% sobre sua nota do ENEM. Tal iniciativa produziu interessan- te cenário nunca visto nas universidades federais brasileiras: mais de 90% dos estudantes da UFFS em seus primeiros anos de atividades tinham sido alunos de escolas públicas no ensino médio. Para além dos números, queríamos saber mais sobre essas pes- soas que passavam a fazer parte da nossa universidade. Nesse sen- tido, nosso grupo de bolsistas se envolveu nesta pesquisa e passou a produzir reflexões sobre o processo de expansão atual do ensino superior público a partir da realidade da UFFS/Erechim, que, em últi- ma instância, é a sua própria realidade. Junto à atividade do “Quero 1 UFFS/Erechim – Cursos integrais (manhã e tarde): Bacharelados em Agronomia (ênfase em Agroecologia), Arquitetura e Urbanismo e Engenharia Ambiental. Cursos noturnos: Licenciatu- ras em Ciências Sociais, Filosofia, História, Pedagogia e Geografia. 2 A partir do processo seletivo 2013, a UFFS adotou a orientação da Lei de Cotas (Lei nº 12.711/2012) e modificou sua política de ingresso. Em 2014, a universidade entrou no Sistema de Seleção Unificada – SISU.
  • 14. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 14 ABRINDO O DIÁLOGO entrar na UFFS” e às leituras e diálogos do nosso grupo de estudos, passamos a compartilhar nossas ideias em fóruns de iniciação cientí- fica e seminários. Nesse sentido, este livro é parte do que vivemos e pensamos e, também, das parceiras que constituímos ao longo dessa caminhada de três anos do nosso grupo PET. Os capítulos que integram essa coletânea representam cerca de um ano e meio de trabalho entre 2012 e 2013. Se discutir o acesso à UFFS é algo fundamental na vida da nova universidade, não menos importante é avaliarmos a permanência dos nossos estudantes. Nessa linha, o Pedagogo Marcelo Luis Ronsoni, presente na construção da UFFS/Erechim desde seus primeiros passos e colaborador da ação “Quero entrar na UFFS”, reflete, no capítulo Permanência e evasão de estudantes da UFFS Campus Erechim, sobre o cenário de ocupação efetiva das vagas em nosso Campus. Este estudo sobre a evasão na UFFS/Erechim parte de números, mas vai além: sugere causas e motivos da evasão e apresenta possibilida- des de enfrentamento desse problema que tem origem tanto externa (social) como interna (mecanismos institucionais). Ainda na linha da permanência dos estudantes na universida- de, a Professora da área de Alfabetização e Língua Portuguesa da UFFS/Erechim e colaboradora do Práxis, Zoraia Aguiar Bittencourt, e a Professora da área de Alfabetização da Unipampa/Jaguarão, Su- zana Schwartz, examinam com estudantes do curso de Licenciatura em Pedagogia aspectos relacionados à leitura durante a graduação. O capítulo Leitura no ensino superior noturno: estudantes do curso de pedagogia entram no debate sobre a produtividade do trabalho com textos na universidade apresenta um diagnósti- co sobre as causas do baixo acompanhamento das leituras por parte dos alunos, que nós, professores de cursos noturnos, percebemos, mas, muitas vezes, não entendemos. Ao examinar a percepção das estudantes sobre as leituras exigidas pelo curso de graduação, as autoras reúnem subsídios importantes para que os docentes universi- tários possam qualificar essa prática em suas aulas. O próximo capítulo intitula-se Metodologia de ensino em pesquisa social quantitativa e seu autor, Professor Douglas San-
  • 15. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 15 ABRINDO O DIÁLOGO tos Alves, da área de Ciência Política da UFFS/Erechim, apresenta argumentos que justificam a importância do domínio de técnicas de pesquisa quantitativa na formação de professores em nível superior. Nesse texto, encontramos um autor preocupado com a qualidade da formação dos licenciandos na universidade. Por isso, ele nos apresen- ta argumentos que superam a dicotomia quantitativo x qualitativo na pesquisa social, sugerindo que o ensino superior possa, de fato, formar sujeitos aptos a construir conhecimento a partir da realidade que os cerca. Vale destacar que o Prof. Douglas assessorou a pesqui- sa sobre o perfil dos calouros desenvolvida por nós do PET. Na sequência, escrevi o capítulo A pesquisa como princípio educativo no Grupo Práxis – PET/Conexões de Saberes, buscan- do compartilhar algumas premissas políticas e pedagógicas de nossas ações no PET. Ao retomar as atividades do nosso grupo, dialogo com autores de referência sobre Pesquisa Participante e Educação Popular. Ao pensar sobre o nosso PET, de certa forma, promovo um debate so- bre a universidade no Brasil, problematizando seu papel na produção do conhecimento (Para quê? Para quem? Como?). Depois de apresentarmos reflexões sobre aspectos da perma- nência na UFFS/Erechim e sobre o princípio educativo da pesquisa em nosso grupo PET, temos três capítulos escritos por bolsistas com base na análise dos dados da pesquisa sobre o perfil dos calouros da UFFS/Erechim 2012. Fernanda May, bolsista decana do Práxis, dis- cute a relação entre a escola pública e a universidade, destacando a presença majoritária de estudantes provenientes da escola pública na UFFS. No capítulo Da escola para a universidade: o novo perfil do estudante do ensino superior, a autora aborda a questão do perfil dos calouros da UFFS/Erechim e apresenta reflexões sobre o desa- fio de reinvenção da universidade (e da escola) em uma perspectiva emancipatória. O debate sobre a questão étnica é o tema do capítulo Desi- gualdades escolares e seus reflexos para a diversidade étnica e de cor na UFFS Campus Erechim, de autoria de Joviana Vedana da Rosa. Preocupada com a desigualdade de acesso à universidade para a população não branca, a bolsista apresenta um mapeamento
  • 16. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 16 ABRINDO O DIÁLOGO da situação demográfica da região de influência da UFFS/Erechim, relacionando com o perfil dos calouros 2012. Nesse sentido, proble- matiza o pequeno percentual de negros e indígenas na universidade, provocando o debate sobre as ações afirmativas e a política de cotas. Daniel Gutierrez apresenta importante reflexão no capítulo Edu- cação superior e suas interfaces: os desafios da classe trabalha- dora. Neste texto, o bolsista parte da discussão teórica sobre classe social e examina dados do perfil dos calouros 2012 da UFFS/Erechim, apontando para os desafios que as classes populares enfrentam ao conciliarem trabalho e estudo. Por isso, os cursos noturnos que pos- suem a maior quantidade de estudantes trabalhadores necessitam de um tratamento especial na questão da permanência desses trabalha- dores que estudam. Dessa forma, compartilhamos nossas produções teóricas, que partem de nossas ações de extensão, ensino e pesquisa. Esse é o segundo livro produzido pelo nosso PET em três anos de existência na UFFS/Erechim. O financiamento é da verba de custeio proveniente do FNDE. Agradeço ao apoio da Pró-Reitoria de Graduação da UFFS e ao Comitê Local de Acompanhamento e Avaliação (CLAA) pela asses- soria qualificada, bem como à Coordenação Acadêmica do Campus Erechim. Também, agradeço aos colegas docentes da UFFS/Erechim que colaboram com nosso PET, aos professores e alunos das escolas públicas do Alto Uruguai e, principalmente, aos bolsistas que coti- dianamente produzem essa experiência alegre e rigorosa do grupo Práxis. Erechim, janeiro de 2014. 5º ano da UFFS Thiago Ingrassia Pereira Tutor PET/Conexões de Saberes Práxis (Licenciaturas) UFFS/Erechim
  • 17. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 17 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Marcelo Luis Ronsoni1 O presente capítulo tem o objetivo de apresentar alguns dados relativos à evasão de estudantes do ensino superior, tendo como re- corte a experiência da Universidade Federal da Fronteira Sul/Campus Erechim. A UFFS é uma instituição multicampi, criada em 2009 e que iniciou as atividades acadêmicas em 2010. A cidade de Erechim, localizada no norte do Estado do RS, recebeu um campus desta uni- versidade e conta atualmente com oito cursos de graduação e apro- ximadamente 1.200 estudantes. Este trabalho toma como referência os dados sobre a evasão pro- duzida neste campus e procura analisá-los de forma ampla, dentro do novo contexto do ensino superior brasileiro. Diante do cenário da ex- pansão da oferta de vagas no ensino superior público e da demanda cada vez mais crescente em oportunizar às pessoas de camadas po- pulares o acesso a este nível de ensino, a UFFS utilizou como critério nos processos seletivos de 2010, 2011 e 2012 o resultado do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), acrescido de um índice relaciona- do ao tempo de formação do candidato em escolas públicas. Este índice possibilitou que cerca de 95% dos estudantes que ingressaram nestes anos fossem estudantes que cursaram o ensino médio em escolas públicas. 1 Pedagogo da Universidade Federal da Fronteira Sul/Campus Erechim. E-mail: marcelo.uffs@ gmail.com
  • 18. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 18 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Além disso, a maioria destes estudantes faz parte da primeira geração das famílias que ingressam no ensino superior, justamente por ser público. A renda per capita média de 75% destes estudantes é entre 1 e 3 salários mínimos. Isto faz com que o perfil dos estudan- tes, especialmente dos cursos ofertados no período noturno, seja de trabalhadores, pela necessidade de obter ou complementar a renda familiar. É deste contexto social e econômico que discutimos a evasão nos cursos de graduação da UFFS/Campus Erechim. Inicialmen- te apresentamos brevemente as ações de assistência estudantil desenvolvidas por esta universidade por entender que uma assis- tência ao estudante qualificada, além de um conjunto de outras ações, permite a permanência no curso e na instituição. A seguir caracterizamos o entendimento sobre evasão aplicado neste traba- lho e apresentamos tabelas com dados objetivos obtidos nos três primeiros anos de atuação da universidade no Campus Erechim, seguido de análises dos fatores que repercutem nos índices de evasão observados. Política de Assistência Estudantil no Ensino Superior Público Diante do elevado índice de evasão de estudantes de nível su- perior, o Ministério da Educação (MEC) criou a Comissão Especial de Estudos sobre a Evasão nas Universidades Públicas Brasileiras, em me- ados da década de 1990. Os estudos desta Comissão demonstraram que cerca de 40% dos ingressantes nas universidades abandonavam os cursos antes de concluí-los. Isto evidenciou um sistema ineficiente e oneroso. De acordo com a Secretaria de Educação Superior (SESu), o custo estimado com a evasão no sistema federal chegava a 486 mi- lhões ao ano, valor que, segundo Curi (1998), correspondia a 9% do orçamento anual das instituições federais. Por conseguinte, a União Nacional dos Estudantes (UNE), em 2004, apresentou um manifesto em defesa da construção de um plano nacional de assistência estu- dantil, reforçando a ideia de que o acesso ao ensino superior não
  • 19. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 19 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM pode ser dissociado da permanência dos estudantes nas instituições de ensino. Para tanto, o MEC, por meio da Associação Nacional dos Dirigen- tes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES), aprovou, em 2007, o Plano Nacional de Assistência Estudantil, que apresenta as diretrizes norteadoras para a definição de programas e projetos de ações assistenciais estudantis, elaborado após pesquisas realizadas pelo órgão de assessoramento denominado Fórum Nacional de Pró- -Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE, 2001). Esse Plano instituiu, no âmbito da SESu, no Ministério da Educa- ção, o Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), Porta- ria Normativa n° 39, de 12 de dezembro de 2007, como estratégia de combate às desigualdades sociais e regionais, bem como busca auxiliar a ampliação e a democratização das condições de acesso e permanência dos estudantes com insuficiência de condições finan- ceiras no ensino superior público federal, vinculados aos cursos de graduação presenciais, levando-os a desenvolverem suas plenitudes acadêmicas. A esse respeito, Nilma Lino Gomes (2009), ao discutir a implan- tação de ações afirmativas e ações voltadas para a assistência estu- dantil, ressalta que a permanência na instituição constitui um desafio para os estudantes das camadas populares que têm acesso ao Ensino Superior. Para estes estudantes, abrirem-se as portas da universidade para que eles ingressem nela não é suficiente. É preciso que, através de políticas de assistência estudantil, sejam garantidas melhores con- dições materiais e culturais. A necessária conciliação de trabalho e estudo para determinados sujeitos das camadas populares que ingressaram nas universidades pode impedir que estes estudantes vivam a experiência universitária de forma plena, reduzindo-a a aulas ministradas em horário estabe- lecido, impossibilitando o envolvimento em atividades extracurricula- res, como palestras, seminários, teatros, a participação em pesquisas de iniciação científica, projetos de extensão e monitoria e até mesmo a participação em conversas desinteressadas mantidas nos espaços de convivência universitária.
  • 20. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 20 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Diagnóstico atual da Assistência Estudantil na UFFS Com vistas à operacionalização dos recursos financeiros garanti- dos pelo PNAES, a Secretaria Especial de Assuntos Estudantis (SEAE) assumiu a tarefa fundamental de gestão dos recursos destinados à UFFS, o que possibilitou a criação de um conjunto de ações que be- neficiam os estudantes com comprovada vulnerabilidade socioeconô- mica, visando à integração acadêmica, científica e social. Em cumprimento às determinações da Portaria Normativa n° 39/07-MEC, do PNAES, a SEAE organizou suas ações em duas áreas estratégicas: a que visa à permanência do estudante e a de desem- penho acadêmico, cultural e esportivo. Nota-se ênfase na área estra- tégica de permanência, por se tratar de ações mais amplas que en- volvem várias despesas dos estudantes. Assim, esta área contempla os seguintes auxílios: 1) Auxílio Transporte, que se refere ao auxílio ao estudante que utiliza o transporte coletivo ou locado no seu des- locamento da residência para a universidade; 2) Auxilio Moradia, que se destina ao estudante procedente de outro município ou distrito/ interior da cidade onde o campus está instalado e reside em imóvel alugado ou pensionato no município em que estuda, em função do seu ingresso na Universidade; 3) Auxílio Alimentação, que objetiva proporcionar auxílio financeiro para estudantes procedentes de outro município ou distrito/interior da cidade onde o campus está instala- do, antes do ingresso na universidade, e que resida atualmente no município em que estuda, frequentando curso integral e/ou partici- pando em projetos de ensino, pesquisa ou extensão; 4) Auxílio Per- manência, que tem por finalidade minimizar as desigualdades sociais e contribuir para a permanência e diplomação dos estudantes de gra- duação em situação de vulnerabilidade socioeconômica. No que tange à área estratégica de desempenho acadêmico, cul- tural e esportivo, têm-se ações ofertadas da seguinte forma: 1) Bolsa Esporte, que oferece auxílio financeiro para promoção do esporte vol- tado ao desenvolvimento integral do estudante. Esse programa visa promover a integração acadêmica e estimular hábitos saudáveis, a partir da inserção do estudante de graduação em atividades esporti-
  • 21. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 21 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM vas, de várias modalidades, participação em competições desportivas municipais, estaduais e nacionais; 2) Bolsa Cultura, que tem como objetivo incentivar ações na área da cultura. Considerando que a UFFS/Campus Erechim tem aproximada- mente 1.200 estudantes matriculados nos cursos de graduação, no período de maio a setembro de 2013 constatou-se que a Secretaria Especial de Assuntos Estudantis concedeu mais de 1.400 benefícios, contemplando 208 estudantes. Ainda em fase de construção encontra-se o Restaurante Universi- tário, importante espaço quando se pensa em política de assistência estudantil. E está em discussão, por uma comissão criada para este fim, a implantação da Casa do Estudante Universitário. Além das bolsas e auxílios destinados aos estudantes pela ver- ba do PNAES, a instituição oferece uma diversidade e quantidade considerável de outras bolsas, de programas de ensino, pesquisa e extensão. São bolsas de monitoria, iniciação científica e iniciação à extensão. Além destas, existem outras modalidades de bolsas em programas do Ministério da Educação, como o Programa Institucio- nal de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) e Programa de Educação Tutorial (PET). Todos estes programas, apesar de não serem volta- dos para a assistência estudantil, acabam possibilitando uma vivência mais ativa da vida universitária e, por conseguinte, permanência no curso e na instituição. Evasão: de que conceito estamos falando? A Comissão Especial de Estudos sobre Evasão do MEC define o fenômeno da evasão como a saída definitiva do aluno do seu curso de origem sem concluí-lo. Essa definição é compartilhada por Ristoff (1999). No entanto, o autor separa evasão de mobilidade, que seria o fenômeno de migração para outro curso, apontando que um alu- no que abandona definitivamente um curso pode ter migrado para outro, o que não constituiria um desligamento da universidade, mas sim uma transferência interna. Pereira (1995) amplia essa definição dizendo que a evasão ocorre quando o aluno deixa a universidade
  • 22. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 22 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM sem concluir nenhum curso, o que excluiria a opção da mobilidade. Temos, ainda, a situação do aluno que abandona uma universi- dade para ingressar em outra, configurando a situação de transferên- cia externa, o que define a evasão de uma dada universidade, mas não o desligamento do sistema de ensino superior. A Comissão Especial (1995) especifica três modalidades de eva- são como forma de gerar uma precisão conceitual e possibilitar a comparabilidade dos resultados. São elas: - evasão do curso: desligamento do curso superior em função de abandono (não-matrícula), transferência ou reescolha, trancamento e/ou exclusão por norma institucional; - evasão da instituição: desligamento da instituição na qual está matriculado; - evasão do sistema: abandono definitivo ou temporário do en- sino superior. Silva Filho et al. (2007) destacam dois aspectos similares, mas não idênticos: a “evasão anual média”, que mede a porcentagem dos alunos matriculados em um curso ou instituição, que no ano seguinte não se matricularão; e a “evasão total”, que apresenta o número de alunos matriculados que não concluíram o curso após o seu período de oferecimento regular. Neste estudo optou-se por utilizar a evasão do curso e da insti- tuição nos três primeiros anos de funcionamento da UFFS/Campus Erechim. Neste sentido, como não há turmas diplomadas, não é pos- sível calcular a “evasão total”, conforme conceito acima apresentado. Acompanhamos a evasão semestral média. Esses números, apesar de não apresentarem os dados do final de um ciclo, apontam para algumas pistas sobre o tamanho da evasão total que teremos em nossos cursos. Dentro da projeção da evasão total, ainda há de se considerar a retenção, que faz com que estudantes que ingressaram num mesmo ano/turma não obtenham a diplomação no mesmo semestre.
  • 23. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 23 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Dados da evasão na UFFS/Campus Erechim Apresentamos abaixo parte do estudo realizado no Campus Ere- chim. O estudo completo contempla a análise dos dados da evasão por curso e por semestre, o que permite visualizar a situação de cada curso e compará-lo a anos/semestres anteriores e com os demais cursos dentro do campus. Conforme mencionado anteriormente, nosso cálculo considera os estudantes que deixam o curso e a instituição a cada semestre. Não temos ainda dados de um ciclo fechado, pois as primeiras tur- mas, ingressantes em 2010, não concluíram o curso. Para facilitar a análise, separamos os dados em duas tabelas: uma com o quadro da evasão dos cursos integrais (Agronomia, Arqui- tetura e Urbanismo e Engenharia Ambiental) e outro com os cursos noturnos (Ciências Sociais, Filosofia, Geografia, História e Pedago- gia). Cabe ressaltar que os dados abaixo se referem somente aos in- gressantes pelo processo seletivo anual. As vagas ociosas são oferta- das em editais de retorno de aluno abandono, transferência interna, transferência externa e retorno de graduado, duas vezes ao ano. Quadro 1: Dados evasão cursos integrais da UFFS/Campus Erechim Curso / Ano ingresso Vagas Ofertadas Matriculados Ativos Diferença Evasão Agronomia / 2010 50 51 36 15 29,4% Agronomia / 2011 50 49 39 10 20,4% Agronomia / 2012 50 52 41 11 21,2% TOTAL / MÉDIA 150 152 116 36 23,7% Arquitetura e Urbanismo / 2010 50 43 31 12 27,9% Arquitetura e Urbanismo / 2011 50 44 36 8 18,2% Arquitetura e Urbanismo / 2012 50 52 41 11 21,2% TOTAL / MÉDIA 150 139 108 31 22,4% Engenharia Ambiental / 2010 50 51 32 19 37,3% Engenharia Ambiental / 2011 50 50 27 23 46,0% Engenharia Ambiental / 2012 50 52 37 15 28,8% TOTAL / MÉDIA 150 153 96 57 37,4% Fonte: Elaborado pelo autor
  • 24. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 24 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Podemos perceber que nestes cursos a evasão tem ficado abaixo da média do Campus Erechim, mas, mesmo assim, elevada. Alguns fatores podem explicar esses índices: a) estes cursos são os mais pro- curados no campus, já que a concorrência nos processos seletivos é grande, nesta ordem: Arquitetura e Urbanismo, Engenharia Ambien- tal e Agronomia; b) o perfil de estudantes destes cursos caracteriza-se por uma dedicação exclusiva aos estudos, pois o índice de estudantes trabalhadores destes cursos é baixo; nestes cursos também a vincu- lação dos estudantes acaba sendo maior, já que os mesmos passam boa parte de seu tempo na universidade; c) grande parte destes estu- dantes reside em Erechim e aqueles que são de outros municípios, ao ingressar na universidade, passam a residir na cidade. Quadro 2: Dados evasão cursos noturnos da UFFS/Campus Erechim Curso / Ano ingresso Vagas Ofertadas Matriculados Ativos Diferença Evasão Ciências Sociais / 2010 50 48 25 23 47,9% Ciências Sociais / 2011 50 51 24 27 52,9% Ciências Sociais / 2012 50 53 27 26 49,1% TOTAL / MÉDIA 150 152 76 76 50,0%   Filosofia / 2010 50 40 17 23 57,5% Filosofia / 2011 50 49 19 30 61,2% Filosofia / 2012 50 52 29 23 44,2% TOTAL / MÉDIA 150 141 65 76 54,3%   Geografia / 2010 50 49 27 22 44,9% Geografia / 2011 50 51 23 28 54,9% Geografia / 2012 50 52 29 23 44,2% TOTAL / MÉDIA 150 152 79 73 48,0%   História / 2010 50 46 21 25 54,3% História / 2011 50 50 35 15 30,0% História / 2012 50 50 30 20 40,0% TOTAL / MÉDIA 150 146 86 60 41,4%   Pedagogia / 2010 50 49 35 14 28,6% Pedagogia / 2011 50 51 35 16 31,4% Pedagogia / 2012 50 51 42 9 17,6% TOTAL / MÉDIA 150 151 112 39 25,9% Fonte: Elaborado pelo autor
  • 25. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 25 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Podemos perceber índices mais elevados de evasão nestes cur- sos. Nos cursos de Filosofia e Ciências Sociais, a média ultrapassa os 50%. Nos cursos de Geografia e História, a média está acima de 40% e, no curso de Pedagogia, a média de evasão é quase a metade dos demais cursos. Existe também uma tendência de elevação desta taxa de evasão nas turmas 2011 e 2012, pois tendo 2 ou 4 semestres a menos na instituição do que os ingressantes em 2010, já aponta para índices potencialmente maiores de evasão. O perfil destes estudantes caracteriza-se por pessoas que, na grande maioria, conciliam o estudo com outras atividades, especial- mente o trabalho. Estudantes estes que só podem estar na universida- de neste turno e, por consequência, só se dedicam à formação neste momento. Levantamentos realizados apontam que cerca de 60% dos estudantes dos cursos noturnos trabalham nos demais turnos. Além disso, cerca de 30% destes estudantes residem em municípios pró- ximos a Erechim e percorrem diariamente até 100km para estudar. Neste contexto a evasão se torna um problema bem mais grave. O esforço para fazer um curso superior já é grande e a possibilida- de de abandoná-lo está sempre presente, seja pela dificuldade em conciliar o estudo com o trabalho, uma eventual reprovação, a carga elevada de atividades, a falta de tempo para estudar. Quadro 3: Dados evasão UFFS/Campus Erechim Campus / Ano ingresso Vagas Ofertadas Matriculados Ativos Diferença Evasão Erechim / 2010 400 377 224 153 40,6% Erechim / 2011 400 395 238 157 39,7% Erechim / 2012 400 414 276 138 33,3% TOTAL / MÉDIA 1200 1186 738 448 37,9% Fonte: Elaborado pelo autor Considerando-se as vagas ofertadas nos processos seletivos nes- tes três anos, têm-se 37,9% como índice de evasão média no Campus Erechim. É um índice que se projeta aumentar até o momento do encerramento do curso por parte destes estudantes. A evasão total tende a ser esta ou maior em média no campus. Isto porque a eva-
  • 26. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 26 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM são, considerando as vagas ofertadas e preenchidas nos editais de transferência, é a mesma, pois nem todas as vagas são ofertadas e poucas são preenchidas e, além disso, sobre estas vagas, incide um índice de evasão parecido com o do processo seletivo. Diante disso, constata-se que vagas ociosas certamente trazem prejuízos à instituição e à sociedade, uma vez que a estrutura e os docentes estarão trabalhando com metade de sua capacidade, como em alguns casos visualizados acima. No caso da UFFS/Campus Erechim, a evasão tem ocorrido es- sencialmente no primeiro ano do ingresso na universidade. Após o primeiro ano, a tendência que tem se mostrado é a da permanência, e da permanência qualificada, pois esta é complementada com as possibilidades que a instituição oferece, ao mesmo tempo em que o estudante começa a percebê-las e compreendê-las de outra forma. Cabe considerar também que estes dados incluem como estu- dantes ativos as matrículas trancadas, pois é dessa forma que o siste- ma acadêmico da instituição concebe a ausência destes por até 4 se- mestres consecutivos. Porém, a experiência tem mostrado, também, que o trancamento é um dos primeiros passos para a desistência. Na maior parte das vezes, não se desiste imediatamente, para, assim, manter a vaga ativa na universidade, mas, em síntese, protela-se uma ação que, em muitos casos, já é definitiva. Fatores que levam à evasão A apresentação de índices sobre evasão deve ser entendida tão somente como passo inicial de análises que devem buscar identificar e compreender os fatores que a ocasionam. Tais fatores podem ser de caráter interno às instituições, específicos à estrutura e dinâmica de cada curso – ou externos a elas, relacionados a variáveis econômi- cas, sociais, culturais, ou mesmo individuais que interferem na vida universitária dos estudantes. Estes fatores podem ser classificados como os que se relacio- nam ao próprio estudante, os relacionados ao curso e à instituição e, finalmente, os fatores socioculturais e econômicos externos. Não é
  • 27. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 27 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM possível analisá-los de forma dissociada, pois fatores de uma ordem interferem necessariamente nos demais. Apenas para visualizá-los adequadamente, os mesmos estão separados abaixo. Procuramos realizar o acompanhamento das desistências dos es- tudantes e, dentre aqueles que formalmente manifestam o interesse em se desligar da instituição, temos alguns argumentos e justificati- vas recorrentes, os quais apresentamos a seguir para chamar à refle- xão, mesmo sumária, sobre tais fatores. Outros fatores apresentados abaixo decorrem da experiência vivida neste período de análise, que nos permite apontar causas mais genéricas. Alguns destes fatores são apresentados no relatório da Comissão Especial de Estudos sobre a Evasão (1997). Os fatores vinculados a aspectos pessoais dos estudantes podem ser considerados como determinantes, em alguns casos, para evasão. Em outros, contribuem significativamente. O estudante do ensino superior lida diariamente com a pressão de aprender, de construir conhecimento, de compreender sentidos e significados para as coisas mais importantes de sua área de formação. Se não bem preparado pessoal, física e psicologicamente, pode apresentar dificuldades nes- ta caminhada. Fatores relacionados à formação escolar anterior do estudante podem dificultar sua melhor integração acadêmica ao curso. Não se deve esquecer, também, que a maioria dos estudantes que ingressa nos cursos superiores realiza sua escolha profissional muito precoce- mente, numa faixa de idade que se situa quase que sistematicamente entre os 16 e os 18 anos de idade. É uma circunstância social que praticamente obriga o jovem a optar, quase que definitivamente, pela profissão que deverá influenciar os rumos de sua vida. Fator igualmente a considerar, ainda relacionado às característi- cas de cada estudante, é sua capacidade de se adaptar à vida univer- sitária. Inúmeras vezes, o ingresso em um curso superior é acompa- nhado de mudança de entorno sociocultural. Esta “nova etapa” inclui também, em muitos casos, a necessidade de manter-se neste local e fazer uma inserção prematura no mercado de trabalho, com a con- sequente incompatibilidade entre horários e dificuldade de uma dedi-
  • 28. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 28 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM cação exclusiva. Nos cursos noturnos, especialmente, é significativa a quantidade de estudantes com essa especificidade. Neste sentido, o Campus Erechim caracteriza-se, desde sua implantação, por ser uma universidade de “estudantes trabalhadores”, pois apresenta elevados percentuais de estudantes que conciliam trabalho e estudo, resultado da maior oferta de cursos no período noturno. A dificuldade de conciliar a jornada de trabalho e o horário es- colar é fator de suma importância na decisão de abandonar o curso superior. Quando as obrigações profissionais entram em conflito com os compromissos dos estudos, são estes, na maioria das vezes, que são adiados. Somada a esses fatores, destaca-se, ainda, a necessidade de adaptação do estudante à nova dinâmica acadêmica (regime de cré- ditos, matrícula por disciplinas e periodização semestral), muito dife- rente daquela da educação básica. A aparente autonomia imputada ao estudante no ensino superior, se não bem compreendida, pode também contribuir para a sua não permanência no curso e na insti- tuição. Muitos estudantes não se apropriam deste fato e aguardam que as iniciativas de todas as ações voltadas à sua formação sejam desencadeadas pela instituição, e não atuam de forma proativa nos espaços e possibilidades que a instituição proporciona. Nos fatores internos à instituição, podemos destacar os relativos às questões acadêmicas, de currículo, didático-pedagógicas, à forma- ção dos docentes, à assistência estudantil insuficiente e à inadequada estrutura de apoio ao ensino de graduação. Porém, no caso da instituição estudada, estes fatores praticamen- te não aparecem nas justificativas dos estudantes ao desistirem do cur- so, mas são percebidos pelo autor como fatores que, dentro de um contexto já não muito favorável à permanência do estudante, afetado pelos demais fatores expostos, podem contribuir para sua evasão. A UFFS/Campus Erechim desenvolve suas atividades em espaços provisórios e não dispõe ainda dos laboratórios didáticos próprios. Toda a sua estrutura está em construção, e algumas em fase de con- clusão. Este contexto, apesar de não ser o ideal, proporciona o desen- volvimento mínimo das atividades com a devida qualidade.
  • 29. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 29 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM Muitos docentes não têm experiência do magistério no ensino superior, e a entrada na instituição consiste no início de sua carreira como docente. Neste sentido, foi criado o Núcleo de Apoio Pedagó- gico, que tem como principal atribuição planejar a formação docente na UFFS. Alguns cursos não trazem reconhecimento social e retorno eco- nômico satisfatório ao futuro profissional. São questões ligadas ao contexto político, econômico e social de nosso país. Se internamente essas situações forem trabalhadas com pessimismo e conformismo, a tendência é incentivar nossos alunos a não seguir estas carreiras. Alia-se a isto o fato de que parcela significativa desses estudantes faz parte das classes populares, o que faz com que grande parte dos mesmos tenha que trabalhar nos demais turnos. Finalmente, se, além disso, o estudante atravessar dificuldades financeiras, a perspectiva de continuidade de seus estudos universitários torna-se ainda mais remota. A inter-relação desses fatores indica que não se deve entender evasão como fenômeno simplesmente numérico. É fundamental ter clareza de que por detrás de todo número existe uma história. Nesta perspectiva, os números surgem tão somente como indicadores cuja compreensão exige constatações e análises de natureza qualitativa, que estão sendo implementadas pelo campus em parceria com o Grupo PET/Conexões de Saberes. O desempenho acadêmico é processo influenciado por um con- junto de fatores, não há um único potencializador ou única condicio- nante. Somente buscando compreender esse processo em sua com- plexa dimensão é que as universidades adquirirão condições de agir consistentemente com objetivo de adequar seu trabalho às exigências atuais e, por consequência, amenizar os desafios a ele relacionados. Considerações finais As recentes ações de expansão do Ensino Superior, que, segundo Ristoff (2008), não podem ser confundidas com democratização, in- troduziram novas discussões acerca do acesso e da permanência dos
  • 30. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 30 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM estudantes das camadas populares e egressos de escolas públicas nas universidades. Ressaltamos que a democratização do acesso aos ban- cos das universidades deve vir acompanhada da democratização do acesso ao conhecimento e do direito à permanência dos estudantes para que possam concluir seus cursos. Assim, entendemos a permanência como direito. Direito que todo estudante proveniente dos meios populares que ingressou na universidade pública, em seus diferentes cursos e turnos, por quais- quer meios, deve gozar. Entendemos que a assistência estudantil efetiva é contributo à permanência, mas não se confunde com ela. E as disposições individuais do estudante beneficiado por todo um conjunto de ações, a favor de si, na construção do conhecimento constituem elemento significativo para a permanência. Diante do exposto, percebe-se que os recursos do PNAES vêm proporcionando à UFFS desenvolver ações que atendem os estudan- tes com insuficiência de condições financeiras, viabilizando a igualda- de de oportunidades e contribuindo para o êxito do acadêmico. Porém, como foi dito, a assistência estudantil, em todas as suas formas, não somente com bolsas e auxílios financeiros, não resolve o problema da evasão nos cursos superiores. É fundamental que ela seja mais forte possível, pois, assim, vai contribuir mais significati- vamente na redução destes números. Cabe à universidade, dentro daquilo que concebemos como sua autonomia, buscar os elementos que têm contribuído para a evasão, analisá-los e encaminhar solu- ções, visando, por um lado, à permanência qualificada de seus es- tudantes e, por outro, utilizar da melhor forma e com maior retorno social o dinheiro público nela investido. Referências BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR. Diplomação, Retenção e Evasão em cursos de graduação em Instituições de Ensino Superior Públicas. Brasília, 1997. CURI, L. R. L. Folha de São Paulo, Caderno 3, São Paulo, 03 de maio de 1998.
  • 31. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 31 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM FONAPRACE. Plano Nacional de Assistência Estudantil. 2001. PEREIRA, J. T. V. Uma contribuição para o entendimento da evasão: um estudo de caso. São Paulo, SP: UNICAMP, 1995. RISTOFF, D. Educação superior no Brasil – 10 anos pós-LDB: da expansão à democratização. In: BITTAR, M.; OLIVEIRA, J. F. de; MOROSINI, M. (Orgs.). Educação superior no Brasil – 10 anos pós-LDB. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2008. p.39-50. RISTOFF, D. I. Universidade em foco: Reflexões sobre a educação superior. Florianópolis, SC: Insular, 1999. SILVA FILHO, R. L. L. et al. A evasão no Ensino Superior Brasileiro. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 37, n.132, set./dez. 2007.
  • 32. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 32 PERMANÊNCIA E EVASÃO DE ESTUDANTES DA UFFS/CAMPUS ERECHIM
  • 33. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 33 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO: ESTUDANTES DO CURSO DE PEDAGOGIA ENTRAM NO DEBATE SOBRE A PRODUTIVIDADE DO TRABALHO COM TEXTOS NA UNIVERSIDADE1 Zoraia Aguiar Bittencourt2 Suzana Schwartz3 Introdução A leitura nos cursos de graduação está cada vez mais se tornan- do um desafio para professores e estudantes universitários. A estra- tégia de solicitar a leitura prévia de textos para as aulas parece ter se tornado a principal metodologia de trabalho no Ensino Superior. Uma breve análise dos planos das disciplinas entregues por professores de diferentes cursos pode referendar essa afirmação. No entanto, essa metodologia não parece estar atingindo o objetivo a que se propõe, que é o de subsidiar as aprendizagens que se deseja construir, pois muitos alunos, na maioria das vezes, não percebem significado na tarefa e não realizam as leituras solicitadas. Este procedimento, de solicitar leituras prévias aos estudantes, já naturalizado nas práticas pedagógicas de muitos professores universi- 1 Este capítulo é uma versão adaptada de trabalho publicado na Revista Leitura. Teoria & Prática, 2012. 2 Professora Assistente da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Erechim, Curso de Licenciatura em Pedagogia. E-mail: zoraia.bittencourt@uffs.edu.br 3 Professora Adjunta da Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, Campus Jaguarão, Curso de Licenciatura em Pedagogia. E-mail: suzana@jsexport.com
  • 34. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 34 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO tários, se baseia em, a partir da listagem dos conteúdos das disciplinas, escolherem textos que abordem os temas/conteúdos que desejam/ precisam ensinar e que esperam que os alunos aprendam. Neste cená- rio, frequentemente há uma ausência da leitura solicitada, a qual é vis- ta por muitos professores como “desleixo”, “desinteresse”, “preguiça”, “falta de compromisso” dos estudantes. No entanto, seria essa conclu- são, bastante recorrente em salas de professores universitários, a única explicação para a não-leitura dos textos solicitados pelos professores? A hipótese aqui é a de que, para o sucesso desta prática, os textos precisariam estar articulados com a compreensão leitora dos alunos e com o prazer de ler para aprender. Diante desta situação, este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa que buscou investigar com os estudantes os seus mo- tivos para ler (ou deixar de ler) os textos solicitados pelos professores e as sugestões que oferecem como forma de modificar essa situação. Para iniciar esta discussão, cabe explicitar, então, quem são estes estudantes ingressantes no Ensino Superior brasileiro, especificamen- te nos cursos de Pedagogia, uma vez que os sujeitos participantes desta pesquisa são alunos deste curso. Quem são os alunos dos cursos de Pedagogia no contexto brasileiro? As estatísticas indicam que a maioria dos estudantes brasileiros conclui o Ensino Fundamental e o Ensino Médio lendo sofrivelmente e sem domínio da linguagem matemática básica (PISA; INEP). Muitos desses alunos podem ser considerados analfabetos funcionais, pois, de acordo com o INAF (Indicador de Alfabetismo Funcional, 2011), apenas 26% da população de 15 a 64 anos é considerada plena- mente alfabetizada. Esse mesmo estudo aponta que, dos alunos que completaram o Ensino Médio, apenas 35% atingem o nível pleno de alfabetismo e, entre os que chegaram ao Ensino Superior, 62% atin- gem pleno domínio das habilidades de leitura/escrita (INAF, 2011). Esses dados nos permitem concluir que 38% dos que ingressam no Ensino Superior não têm pleno domínio dessas habilidades.
  • 35. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 35 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO Essa percepção, vivenciada empiricamente em nossa prática co- tidiana, demanda estudos no sentido de evidenciar como os profes- sores estão lidando com esses alunos, bem como conhecer como os alunos estão desenvolvendo estratégias de soluções para as limita- ções decorrentes do Ensino Fundamental e Médio. A intenção de trazer estes dados aqui, em um estudo sobre pro- fessores e alunos do Ensino Superior, é a de sinalizar que o Ensino Fundamental e o Médio não estão dando conta de ensinar aos alunos habilidades básicas para outras aprendizagens, como a compreensão e a produção de textos, por exemplo. Considerando-se que parte de tais egressos do Ensino Médio levam para o Ensino Superior essa séria defasagem no conhecimento quanto à produção de leitura, cabe exa- minarmos com que instrumentos e práticas pedagógicas os docentes têm buscado auxiliar os alunos na superação de suas dificuldades. Outro aspecto que seria importante destacar se refere ao pro- cesso de escolha profissional desses alunos. Com base nos dados do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), o INEP4 (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) traçou um perfil dos alunos que manifestaram o desejo de ser professor. As conclu- sões parciais deste estudo: a) a maioria dos alunos que escolhe essa profissão é mulher, cursou Ensino Fundamental e Médio em escola pública, alcançou, em média, pontuação mínima no ENEM, tem ren- da familiar de até dois salários mínimos, foi educada apenas pela mãe analfabeta ou com baixo índice de escolaridade. Dentre os jovens de 17 a 20 anos que fizeram o ENEM em 2007, apenas 5,2% manifesta- ram terem escolhido a profissão de professor de Ensino Fundamental e Médio. Interessante ressaltar também que o estudo concluiu que os estudantes com as piores notas ao longo de sua escolaridade são os que têm probabilidade quase três vezes maior de escolher a carreira do magistério. Diante destas informações, o INEP inferiu que “existem evidên- cias de que a carreira do magistério não está conseguindo atrair os melhores candidatos” e que é “pouco provável que o país esteja se- lecionando os professores entre os melhores alunos”. Consequente- 4 Disponível em: <http://www.inep.gov.br>. Acesso em: 15 ago 2013.
  • 36. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 36 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO mente, a universidade como agência formadora de professores está sendo questionada. Outra pesquisa, encomendada pela Fundação Victor Civita à Fun- dação Carlos Chagas (2009), mostrou que apenas 3% optam de fato por ser professor, o restante cursa Pedagogia por motivos alheios ao seu desejo inicial, como, por exemplo, a maior facilidade para o ingresso, por ser um dos únicos cursos existentes em sua região, ou pelo preço das mensalidades, no caso de instituição privada. Esses índices refletem algumas características importantes dos alunos ingressantes do curso de Pedagogia: sujeitos que não esco- lheram ser professores, alguns analfabetos funcionais, que não de- senvolveram o prazer de ler. Percebe-se também que, desde o Ensino Fundamental, a aprendizagem da leitura e da escrita não acontece de modo significativo, acabando por desencadear um efeito dominó, que colabora para que os poucos alunos que conseguem concluir o Ensino Médio cheguem aos cursos de licenciatura com lacunas impor- tantes em sua aprendizagem e, consequentemente, na compreensão leitora. “Eles são vítimas de um currículo escolar pobre, da falta de professores e da desmotivação dos profissionais da educação” (MA- SAGÃO, 2011)5 . Como dito, uma dessas lacunas refere-se às estratégias de leitura e de compreensão textual, além das que se referem às de produção de textos, relacionadas aos níveis de alfabetismo que o sujeito possui. De acordo com informações fornecidas por um estudo realizado pela Organização Não Governamental Ação Educativa em parceria com o Instituto Paulo Montenegro, do IBOPE, a cada dez universitários, dois podem ter problemas em acompanhar o curso devido a dificul- dades de compreender textos. O estudo analisou jovens de 15 a 24 anos das regiões metropolitanas de Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Brasília (MASAGÃO, 2011). Tendo apresentado este panorama e um breve perfil dos alunos dos cursos de Pedagogia no contexto brasileiro, incluindo suas dificul- 5 Disponível em: <http://aprendiz.uol.com.br/content/kekichewre.mmp>. Acesso em: 10 ago 2013.
  • 37. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 37 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO dades de ler e de compreender o que leem e as estratégias que vêm sendo utilizadas sistematicamente pelos professores para trabalhar os conteúdos de suas disciplinas através da solicitação de leitura de textos, quais reflexões podem ser encaminhadas sobre a adequação do uso dos textos nas mais variadas disciplinas, desde o primeiro se- mestre dos cursos, fator convergente e pouco discutido na prática docente nos cursos de Pedagogia? Neste sentido, busca-se conhecer o quadro de desencontro entre o ensino e a aprendizagem, analisan- do o aluno que o professor deseja que chegue ao Ensino Superior e o que, de fato, chega, incluindo as relações entre as estratégias6 que contribuem para a formação do sujeito-aluno-leitor e as que estão sendo prioritariamente utilizadas na universidade. Entram nesta discussão, os estudantes do curso de Peda- gogia... Não sei dizer o que deveria acontecer exatamente, mas talvez levar em conta que temos cinco matérias durante a semana, ou seja, a cada semana temos, no mínimo, 100 páginas para ler, lembrando que não são leituras que podem ser feitas de qualquer maneira, pois exigem atenção redobrada. Para além do professor universitário que, muitas vezes, tem certa dificuldade em ministrar suas aulas, já que estas, em sua maioria, pressupõem a leitura prévia de textos de referência, os quais, como dito, frequentemente, não são lidos pelos alunos e, quando são lidos, nem sempre são compreendidos em sua totalidade, há os estudantes e suas vozes, as quais, na maioria das vezes e por diferentes razões, não são ouvidas em nossas salas de aula. Preocupadas em conhecer como essa situação é observada/vi- venciada pelos próprios estudantes, foi realizada uma pesquisa com 38 alunos do 3º semestre do curso noturno de Licenciatura em Peda- 6 Entendemos por estratégias a capacidade de coordenar esforços e recursos em busca de metas definidas intencionalmente a serem alcançadas da melhor maneira e no menor espaço de tempo, priorizando intervenções que nos pareçam mais efetivas.
  • 38. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 38 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO gogia do campus Erechim da Universidade Federal da Fronteira Sul. Para tal, foram entregues questionários contendo duas questões: O que te faz ler (ou não) os textos solicitados pelos professores das diferentes disciplinas do curso? e Como acreditas que deveria ser o trabalho com leitura na universidade? A partir da análise dos questionários, foi possível observar que há um distanciamento entre os conhecimentos prévios dos estudantes e as demandas que lhes são impostas como estratégias de aprendiza- gem no Ensino Superior. A dificuldade de compreender a linguagem utilizada nos textos indicados pelos professores se constitui como um dos principais empecilhos apontados pelos estudantes para a não-lei- tura destes materiais, uma vez que essa modalidade de escrita [do discurso científico] tem o objetivo de divulgar as pesquisas científicas entre os cientistas; portanto, deve circular dentro de limites mui- to restritos, atingindo normalmente leitores-especialis- tas da área, que conhecem o domínio do conhecimen- to e a metodologia utilizada. Assim, a autora diz que “como decorrência, o discurso torna-se hermético e im- penetrável para um leitor não-especialista” (Zamponi, 2005: 169). (BERTOLUCI, 2012) Nesta dificuldade de leitura, estão implicadas a exigência da compreensão de palavras que não fazem parte do vocabulário dos alunos e as próprias características de gêneros textuais (capítulos de livros ou artigos científicos) que, até então, não faziam parte do rol das poucas leituras destes estudantes, o que os leva a, “[...] ao in- vés de ler criticamente, [assumirem] uma postura passiva em relação aos textos propostos e [serem] incapazes de cumprir as exigências estabelecidas, provocando nos professores frustração e constantes reclamações” (COSTA, 2012). Reclamações estas que, muitas vezes, não consideram que, “ao ingressar na universidade, os estudantes de Pedagogia (assim como os de outros cursos) passam a ter contato com um novo mundo de leituras, muitas vezes desconhecido” (BERTOLUCI, 2012).
  • 39. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 39 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO Como podemos observar, estes textos, que não são escritos para leitores iniciantes, não são compreendidos em sua totalidade pe- los estudantes, pois prescindem de uma contextualização fornecida pelos professores, uma vez que estes textos, geralmente, fazem refe- rência a autores e a fatos dados como conhecidos para o público de leitores a que são/estão direcionados. “Como decorrência, cria-se um “jogo de faz-de-conta”: de um lado, professores cobram postura críti- ca e ativa dos universitários; de outro lado, educandos são forçados a ostentar uma habilidade de leitura, que, na realidade, não possuem” (COSTA, 2012). Sendo assim, orientar os estudantes ingressantes no Ensino Su- perior é fundamental para que estes possam aprender a ler e a com- preender estes textos circulantes nos espaços acadêmicos. Neste sen- tido, Pimenta e Anastasiou (2011, p.240) afirmam que o inaceitável, entre professores universitários, é estar acompanhando alunos que entram com certas dificul- dades e concluem seus cursos, obtendo um diploma com a nossa conivência, sem terem superado as dificul- dades inicialmente constatadas, mesmo tendo passado quatro ou cinco anos na universidade. Por isso que os docentes, ao fazerem tais afirmações “sobre hábi- tos de estudo insuficientes, dificuldades de raciocínio e falta de tem- po para estudar, [precisam compreender] que aprender a estudar é sempre possível. Muitas vezes falta a orientação básica sobre como estudar um texto [...]” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2011, p.238). Esta necessidade de orientação do professor para que haja uma melhor compreensão dos textos pode ser observada nos depoimentos-apelos de alguns estudantes participantes desta pesquisa: Alguns professo- res precisam ler o texto junto com nós, pois são textos muito difíceis e muito compridos: quando chego no final, não lembro mais nada; E que entendam que, por mais que a gente leia, às vezes leitura não é sinônimo de compreensão de texto. Para estudantes que trabalham 40h semanais e que frequentam diariamente a universidade no período da noite, considerando que
  • 40. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 40 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO muitos também realizam longas jornadas de deslocamento até a uni- versidade, a falta de tempo é apontada como uma das grandes ra- zões para a não-leitura dos textos acadêmicos. Para tentar driblar esta dificuldade e minimamente cumprir com as demandas acadêmicas, estes alunos adotam práticas que nem sempre resultam em aprendi- zagem: Leio aos sábados, mas, no dia da aula, já esqueci do assunto. Esta falta de tempo extraclasse para realizar a leitura dos textos surge, nesta pesquisa, como a principal causa para a não-leitura. Ela foi apontada por quase metade dos estudantes pesquisados, o que mostra que trabalhar e estudar vem se apresentando como um gran- de obstáculo para estes alunos de classes populares, os quais agora estão ingressando em cursos de graduação noturnos, tal qual afir- mam estas estudantes: Porque geralmente o aluno noturno trabalha diurnamente, não tem tempo de ler e, se começa a ler, gera sono devido ao cansaço. Então, penso que os cursos noturnos devem ser repensados na questão da didática adotada; Talvez se entendessem que meu tempo é muito pouco para leitura, pois trabalhar e estudar é muito puxado e o desgaste físico e psicológico é grande. Em pesquisas realizadas em outros estados, como a realizada em 2007 por Bertoluci “com 60 alunos das duas turmas de 1º ano de um curso noturno de Pedagogia em uma faculdade particular da região metropolitana de Campinas/SP”, foram encontrados, talvez por tam- bém se tratarem de estudantes-trabalhadores, resultados similares à pesquisa aqui apresentada: Outro grupo de alunos representa justamente aqueles que não conseguem ler os textos por diferentes razões: 20,59% afirmaram não ter tempo disponível para a re- alização das leituras; 8,82% não leem devido às difi- culdades que encontram no processo de compreensão; 5,88% argumentam que há um excesso de textos para leitura semanalmente e 2,94% apontam falta de recur- sos financeiros para ter acesso a todos os textos indica- dos pelos professores. Cabe salientar que os alunos em questão são, em sua maioria, trabalhadores de jornada integral, que possuem pequenas “brechas” de tempo para realizar as leituras e, por esta razão, acabam op-
  • 41. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 41 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO tando entre um ou outro texto. É importante que se ressalte novamente que o fato de os alunos estarem lendo não garante que estejam realmente entendendo os textos (BERTOLUCI, 2012). Além disso, segundo os estudantes pesquisados, os textos soli- citados são geralmente muito extensos, o que dificulta a compre- ensão das ideias apresentadas pelos autores, pois é a primeira vez que se deparam com leituras tão longas. Estas extensas (e, às vezes, densas) leituras acabam sendo realizadas em horários de intervalo no trabalho, durante longas viagens de deslocamento dos alunos até o trabalho, ou ainda após chegarem em casa depois de três turnos fora, o que leva alguns a terem que vencer o cansaço e o sono, aponta- dos por um terço dos entrevistados, para conseguir dar conta destas leituras: Sinceramente, não sei, eu estou em uma universidade, sou a favor da leitura, porém desejaria a compreensão, porque eu farei o possível para permanecer no curso. Mas não posso transpor limites que chegam ao físico, como cansaço, fome e sono. Os estudantes-trabalhadores, ao se depararem com leituras ex- tensas, ficam com tempo reduzido para realizar todas as leituras, o que os faz, muitas vezes, terem que optar por um ou outro texto, pela leitura solicitada em uma ou em outra disciplina, como afirma esta estudante: Textos longos e de cinco disciplinas diferentes para todas as aulas (diariamente) é muito difícil. O meu trabalho exige ati- vidades extraclasse, planejamento e isso também implica no tempo disponível de/para leitura. Com isso, como complicador deste quadro, há o acúmulo de leituras, uma vez que aqueles alunos que cursam todas as disciplinas acabam por ter um número muito grande de páginas para dar conta a cada semana de aulas. Alguns afirmam que também é comum alguns professores solicitarem a leitura de mais de um texto para a mesma aula: Acúmulo de textos, sendo que, às vezes, têm mais de um texto da mesma disciplina para a mesma noite, totalizando a leitura de muitos textos por semana. Considerando que, segundo Demo (2008, p.14), “na escola e na universidade estudar é o que menos se faz, gastando-se o tempo com
  • 42. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 42 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO aulas e com provas”, muitos estudantes, então, realizam somente aquelas leituras que servirão de base para futuras avaliações, como afirmam nove estudantes participantes da pesquisa em relação aos motivos que as levam a ler os textos solicitados: Leio somente por saber que o texto será o tema da aula e que será cobrado em ava- liações; Leio pela pressão para apresentar o texto em seminários; Só leio por causa da pressão para responder questões a serem entre- gues; Normalmente leio para fazer os trabalhos, e não por interesse próprio; Leio porque o professor pede; Leio por obrigação, pois às vezes estou muito cansada e preciso ler para responder questões ou fazer trabalhos (fichamentos, seminários...); Leio somente na sema- na antes da avaliação para obter uma nota boa. A velocidade com que as informações veiculam atualmente tam- bém leva nossos jovens estudantes a não conseguir dedicar um espaço e um tempo adequados para realizar as leituras acadêmicas, o que corrobora com uma das principais características contemporâneas da leitura (e também das práticas de leitura destes nossos alunos traba- lhadores), que é a de que hoje “leem-se vários livros ao mesmo tempo, passa-se de uma leitura à outra; cada vez menos momentos específicos são dedicados à leitura, lê-se nos meios de transporte, fazendo outra coisa, ouvindo televisão, música, saboreando uma refeição, à espera de uma consulta médica” (HORELLOU-LAFARGE; SEGRÉ, 2010, p.132). No entanto, 27 dos 38 estudantes afirmaram que, quando leem os textos para as aulas, o fazem pelo interesse em “estar por den- tro” do que será ensinado/aprendido, podendo melhor participar das aulas, ou ainda, motivados pela curiosidade, o querer aprender, o interesse pelo assunto estudado. É importante que os professores escutem o que motiva seus alunos a lerem os textos, já que a iniciati- va da “escolha de um material que seja acessível ao estudante e, ao mesmo tempo, que vá desafiá-lo, assim como o acompanhamento do processo pelo professor, é condição de sucesso nessa estratégia [estudo de texto]” (ANASTASIOU; ALVES, 2010, p.87). Outro fator apontado por dois estudantes é o uso que é feito pelo professor em aula do texto que foi previamente solicitado, pois, segundo eles, as estratégias propostas a partir destas leituras podem,
  • 43. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 43 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO muitas vezes, desmotivar futuras leituras: Se eu ler um texto uma vez para determinada aula e o professor não utilizar o mesmo, nem co- mentar o texto para sanar dúvidas, na próxima vez não leio. Com o objetivo de também apontar possibilidades, a segun- da questão apresentada aos estudantes solicitou que estes forneces- sem sugestões de outras estratégias metodológicas que pudessem complementar/substituir o trabalho com textos na universidade. As respostas de mais da metade dos estudantes entrevistados iniciam com a expressão Não sei, o que pode indicar que muitos também não vislumbram outras formas de trabalhar com textos no ambiente acadêmico, apesar do fracasso (ou da não produtividade) que essa prática vem apresentando em diferentes cursos de graduação. Al- guns afirmam não idealizar novas possibilidades, pois esta tarefa se- ria exclusiva de seus professores, outros ainda pensam ser tempo perdido opinar sobre práticas pedagógicas que, até então em sua trajetória escolar, nunca se preocuparam com o que eles pensam. Mesmo assim, 28 estudantes arriscaram algumas possibilidades ao dar sequência às suas respostas, dentre elas: Não sei explicar, mas creio que uma aula mais dinâmica influencia bastante para que nós nos interessemos mais; O texto nos proporciona conhecimento, mas não é a única forma de aprendermos algo. Aulas demonstrativas e práticas são mais rentáveis e menos cansativas; Os professores po- deriam utilizar os textos para mais que uma aula, explorá-los melhor, fazer mais questionamentos orais e escritos a partir dos textos; Usar os mesmos textos para mais de uma disciplina. Como observamos nestas sugestões, os alunos têm muito a di- zer, apesar de não se sentirem legitimados para falar. Eles oferecem ricas contribuições, as quais, se consideradas/ouvidas por seus pro- fessores, podem servir como repertório para se (re)pensar as práticas de leitura no Ensino Superior. Seria interessante que, ao invés de xerox de capítulos, poderíamos adotar um livro acessível, onde poderíamos comprar e utilizar durante o semestre. [...] Não consigo compreender o contexto destes textos, o que prejudica o aprendizado e o aproveitamento da matéria.
  • 44. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 44 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO Uma sugestão recorrente destes estudantes foi a de que seja feito pelos professores, anterior às leituras, o marketing do texto a ser lido, o que significa que o professor demonstre que leu e conhece o texto (e seu respectivo autor), gostou do que leu e, por estes mo- tivos, mais legítimos aos sujeitos desta pesquisa, sugere, então, esta leitura aos alunos. “Também ajudaria neste processo de formação a motivação para a leitura, se o interesse em ler do aluno e o prazer das leituras exigidas estivessem no horizonte de preocupações dos professores formadores” (CORRÊA, 2012). Neste sentido, uma vez que fica evidente o encantamento do professor pelo texto, os alunos afirmam que, somente isso, já basta para motivá-los a ficarem curio- sos pela leitura sugerida (e não exigida). Exemplos disso podem ser lidos no depoimento abaixo transcrito: Na aula anterior, comentar elogiando ou criticando o próximo texto. [...] Trabalhar embasando o texto para que o estudante sinta que, se não ler, ficará “perdido”. Somos grandes, o texto deve ser apresentado sem ser uma obrigação. Ao invés de dizer “Você deve ler”, dizer “É interessante que você leia”. Dizer quem é o autor (pedagogo, economista...). Por fim, é possível observar certa empatia/solidariedade/com- preensão de alguns alunos em relação às opções metodológicas de seus professores, o que pode estar demonstrando que acreditam que é possível (tentar) conciliar suas necessidades e as exigências curriculares dos próprios professores: Não sei por que, mas, se não lermos os textos, como serão as aulas?; Não sei, talvez dar menos textos, mas não sei se eles conseguiriam cumprir com os cronogra- mas. Como vimos, existe uma grande distância entre as práticas de lei- tura propostas pelas universidades e o nível de proficiência de leitura de seus mais novos alunos. Mas, afinal, o que pode ser feito neste sentido? Muitos autores buscam apresentar propostas para reverter essa precariedade da leitura no Ensino Superior. Todos eles afirmam a necessidade do trabalho dos professores universitários estar voltado
  • 45. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 45 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO para uma alfabetização acadêmica7 que seja capaz de servir como base de leitura de textos até então desconhecidos e que circulam prioritariamente no meio acadêmico. Sendo assim, parece estar sob responsabilidade do professor a se- leção do material didático, dos recursos e das estratégias de ensino que adotará em sua sala de aula, bem como cabe-lhe compreender que o aluno ingressante no meio universitário não possui experiências de leitura de gêneros acadêmicos, cuja complexidade exige do estudante processo cognitivo diferente do que lhe era exigido no Ensino Básico. Nesse sentido, é tarefa do docente de Ensino Superior orientar os estudantes em suas leituras, esclarecendo conceitos e diálogos entre autores, bem como apontando o que é esperado de sua leitura. A in- teração entre professor e aluno é tão necessária no meio acadêmico quanto o fora nos níveis de formação anteriores, já que, por vezes, num primeiro momento, será sob orientação do professor que o alu- no terá condições de compreender os sentidos dos textos estudados. Conclusão Fazer com que a leitura seja prazerosa, não só um de- ver. A pessoa tem que gostar, pois assim aprende e entende melhor o que foi proposto. A partir da análise dos resultados da pesquisa, é possível afirmar, então, que os estudantes-sujeitos desta pesquisa, em sua maioria, não leem os textos por falta de tempo, por sentirem cansaço após um dia inteiro de trabalho e pelo acúmulo de textos exigidos a cada se- mana de aulas. O que, majoritariamente, os impulsiona a ler os textos é realizar atividades avaliativas decorrentes destas leituras, conhecer o assunto a ser debatido em aula e possuir interesse pela temática. Suas propostas estão direcionadas, principalmente, para a solicitação de leitura de textos curtos, atrativos e de fácil compreensão. 7 Tal conceito envolve um conjunto de noções e estratégias necessárias para que o estudante universitário possa se integrar à cultura discursiva do meio acadêmico, atuando efetivamente nas produções e análises de textos solicitados em seu processo de aprendizagem (CARLINO, 2005).
  • 46. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 46 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO Neste sentido, e corroborando o depoimento que abre esta úl- tima seção do texto, percebe-se que as sugestões oferecidas pelos estudantes apontam para algum tipo de articulação do prazer de ler com as demandas dos professores, o que parece não estar ocorren- do. Portanto, considerando as sugestões dos estudantes, observa-se que este quadro só será revertido se e quando o prazer fizer parte das atividades que envolvem leitura no Ensino Superior e estas estive- rem em sintonia com a compreensão leitora dos estudantes. Sendo assim, o reconhecimento das dificuldades relacionadas com a leitura deveria encaminhar para o uso de outro tipo de estra- tégia nos primeiros anos da graduação. E isso demandaria que o pro- fessor diagnosticasse o conhecimento e as experiências prévias dos alunos e planejasse procedimentos com o objetivo de que os alunos (re)aprendessem a ler e a estudar. Uma das maneiras de fazer isso é fazer escolhas que vão ao encon- tro do perfil dos alunos reais, os quais não tiveram experiências de leitura de textos científicos no Ensino Fundamental e Médio e precisam não só vivenciar isso, mas aprender na universidade, com seus professores, a ler estes novos gêneros. Sendo assim, as conclusões deste estudo apontam para o uso de estratégias pedagógicas que busquem contribuir para a compreensão de textos que circulam prioritariamente no meio acadêmi- co, visando um trabalho produtivo com leitura na universidade. Referências ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. (orgs.). Processos de Ensinagem na Universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. 9. ed. Joinville, SC: UNIVILLE, 2010. BERTOLUCI, K. N. Letramento acadêmico: leitura(s) em um curso de pedago- gia. Ao pé da letra. Revista dos alunos da graduação em Letras. Disponível em: <http://www.revistaaopedaletra.net/.../Vol-11.2-Kaluana-Nunes-Berto- luci.pdf>. Acesso em: 10 mar 2012. CARLINO, P. Escribir, leer y aprender en la universidad: una introducción a la alfabetización académica. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2005.
  • 47. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 47 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO CORRÊA, P. M. Leitura acadêmica na formação de professores no curso de pedagogia. Disponível em: <http://www.anped.org.br/app/webroo- t/34reuniao/.../GT10-1042%20int.pdf>. Acesso em: 10 mar 2012. COSTA, M. S. S. Práticas de leitura dos acadêmicos do oitavo bloco do curso de pedagogia período 2008.2 da Universidade Federal do Piauí. Interciên- cias, Teresina, PI, v. 2, n. 1, jan./jun., 2010. Disponível em: <http://www. uespi.br/.../Práticas-de-leitura-dos-acadêmicos-do-oitavo-brloco...>. Acesso em: 10 mar 2012. DEMO, P. Metodologia para quem quer aprender. São Paulo: Atlas, 2008. GIL, A. C. Didática do Ensino Superior. 1. ed. 6. reimpr. São Paulo: Atlas, 2011. HORELLOU-LAFARGE, C.; SEGRÉ, M. Sociologia da Leitura. Tradução de Mauro Gama. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2010. OLIVEIRA, A. A. Práticas de leitura de estudantes do curso de pedago- gia/UFMT. Disponível em: <http://www.alb.com.br/arquivo-morto/edico- es_anteriores/.../sm12ss01_05.pdf>. Acesso em: 10 mar 2012. PIMENTA, S. G.; ANASTASIOU, L. G. C. Docência no Ensino Superior. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2011. SILVA, E. T. Elementos de pedagogia da leitura. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
  • 48. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 48 LEITURA NO ENSINO SUPERIOR NOTURNO
  • 49. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 49 METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA Douglas Santos Alves1 Introdução A formação do cientista social, seja ele bacharel ou licenciado, passa pela aquisição de um corpus teórico mais ou menos referen- ciado no meio e pelo domínio do processo de construção de conhe- cimento científico. A primeira dimensão da formação profissional, a teórica, não só é largamente aceita como requisito essencial, como até mesmo naturalizada. A naturalização pode significar um pro- blema em contextos como o brasileiro e latino-americano, que mais importam do que produzem teoria social. Já a segunda dimensão, referente à pesquisa, sofre preconceitos variados que interferem na formação do profissional de ciências sociais. A divisão da formação em licenciatura e bacharelado remete a uma separação entre professores e pesquisadores, na qual os primei- ros não necessitam dominar as ferramentas ligadas à pesquisa e os segundos dispensam a formação didático-pedagógica. Em ambos os casos, ainda, se reproduz outro tipo de preconceito, referente a um certo antagonismo criado entre abordagens de pesquisa qualitativas e quantitativas. Em todos os cenários se produz uma formação não só deficiente, mas que cria as condições necessárias para sua perpe- 1 Professor na UFFS, doutorando em Ciência Política na UFRGS. E-mail:douglas.alves@uffs. edu.br
  • 50. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 50 METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA tuação deficitária. Por um lado, se limita a autonomia do profissional e do estudante frente ao conhecimento canônico. Por outro, se debi- lita sua capacidade de crítica, tornando-o refém do conhecimento es- tabelecido desde os grandes circuitos produtores de pesquisa e teoria social, em geral Estados Unidos e Europa. Desde esta perspectiva, tor- na-se fundamental reestabelecer a unidade entre ensino e pesquisa e, para tanto, desfazer os falsos antagonismos entre métodos e técnicas quantitativas e qualitativas necessários à pesquisa. 1 A oposição qualitativo-quantitativo e o preconceito com os números Por diversos motivos, os métodos quantitativos têm sido vistos com certo preconceito e mesmo desconfiança pelas ciências sociais na América Latina (BAQUERO, 2009). O motivo primeiro provavel- mente está vinculado ao fato de o estudante que opta por um curso de humanidades acredita que estará escapando, dessa maneira, dos números. Em geral, os conhecimentos ligados à matemática são vistos como uma abstração completa, que dificilmente poderão se articular a qualquer realidade objetiva. Tornam-se, dessa forma, pensamento mágico, operações sem sentido que produzem resultados através de procedimentos obscuros e misteriosos. Os números, encarados deste modo, adquirem aparência fantasmagórica. Contudo, este preconceito ganha imensa força quando encon- tra, no interior do meio acadêmico, certas ideias que já se torna- ram senso comum entre professores e pesquisadores. Dentre elas a de que métodos e técnicas de pesquisa possuiriam, por si mesmos, certa carga ideológica e/ou conteúdo epistemológico. Disso decorre um antagonismo já naturalizado no Brasil e na América Latina entre pesquisa qualitativa e quantitativa, cujas origens geralmente ficam despercebidas. No contexto do pós-guerra, os estudos comparativos entre países ganharam grande atenção. O complexo industrial militar ligado ao governo norte-americano passou a financiar direta e indiretamente centros e institutos de pesquisa social ligados às principais universi-
  • 51. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 51 METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA dades dos Estados Unidos (CHILCOTE, 1997). Em um momento mar- cado pela guerra fria, o interesse em conhecer a realidade dos países do chamado terceiro mundo se vinculava à necessidade de obter in- fluência num mundo dividido entre o campo soviético e o capitalis- ta. A América Latina, neste contexto, tornou-se alvo de interesse de estudiosos financiados por órgãos como Pentágono, CIA (Agência Central de Inteligência), FBI (Bureau Federal de Investigações), o De- partamento de Estado, dentre outros (CHILCOTE, 1997). É preciso lembrar que neste período ocorriam diversos golpes de Estado na América Latina e os altos comandos militares latino-americanos pos- suíam estreitos laços com os EUA. Também, como resultado da corrida tecnológica e armamentista do mundo bipolar, foram desenvolvidos os primeiros computadores. Sua criação permitiu um grande avanço na área da estatística, que logo foi incorporada às ciências sociais como ferramenta de análise de dados coletados em larga escala. Assim, estudos quantitativos co- meçaram a se alastrar, fornecendo dados que permitiam sustentar análises sobre a realidade dos países que eram disputados como área de influência pelos dois blocos em conflito na guerra fria. Os preconceitos e desconfianças que citamos, entretanto, não podem ser suficientemente explicados por estes motivos, uma vez que a queda do Muro de Berlin (1989) colocou um suposto ponto final naquela situação. O fato é que, dentro do campo das ciências sociais, há uma acirrada disputa epistemológica. As correntes teóri- cas hegemônicas, principalmente dentro do meio acadêmico norte- -americano, procuraram tomar como referência as ciências exatas, buscando sempre regularidades e padrões fixos no interior dos fe- nômenos sociais. Com o advento da informática e o grande impulso que isso ocasionou no desenvolvimento da estatística, os estudos de tipo quantitativo foram imediatamente assimilados pelas linhas mais conservadoras das ciências sociais daquele país. No caso da ciência política, é interessante notar que a realização de pesquisa nesse campo já não se tratava mais de uma atividade intelectual de um pesquisador isolado refletindo a partir de seus li- vros e estudos sobre a realidade. Mas passou a se apoiar em grandes
  • 52. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 52 METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA aparatos de pesquisa com projetos internacionais e equipamentos até então caros, exclusivos2 e financiados com somas que chegavam à cifra de milhões de dólares. Assim, nesse cenário tão peculiar, os métodos quantitativos acabaram sendo identificados, do ponto de vista político, com inte- resses geralmente alheios à realidade dos países do então terceiro mundo. Já do ponto de vista teórico/epistemológico, foram de ime- diato associados a uma concepção de ciência rígida e conservadora. Tais elementos combinados serviram de base para um clima de des- confiança na recepção dos métodos e técnicas quantitativos no Brasil e América Latina. 2 A estatística como ferramenta de auxílio As pesquisas quantitativas estão profundamente apoiadas na es- tatística, porém seria um engano acreditar que esta antecede as ciên- cias sociais na realização da pesquisa social. Ao contrário, ela deve ser entendida como mera ferramenta, como auxílio e ponto de apoio. Os números não podem nos dizer nada se não forem interpretados à luz das teorias. Mais do que isso, os números não podem ser extraídos sem antes passarmos pelas teorias. O processo de construção do conhecimento científico através da pesquisa está longamente discutido em diversos manuais acadêmi- cos. Sem reproduzir aqui essa literatura, recordamos simplesmente que a definição dos métodos e técnicas de coleta de dados constitui somente uma das diversas etapas da pesquisa científica. Tal escolha, é preciso reforçar, não é aleatória, mas consequência lógica da elabo- ração do projeto de pesquisa. A seleção do instrumental metodológico está, por- tanto, diretamente relacionada com o problema a ser estudado; a escolha dependerá de vários fatores rela- 2 Basta recordar que, se hoje os microcomputadores são algo relativamente acessível, nos anos 1960 eram máquinas gigantescas, ocupando andares inteiros de prédios em salas refrige- radas e de uso exclusivo militar ou para pesquisa.
  • 53. UNIVERSIDADE PÚBLICA EM TEMPOS DE EXPANSÃO 53 METODOLOGIA DE ENSINO EM PESQUISA SOCIAL QUANTITATIVA cionados com a pesquisa, ou seja, a natureza dos fenô- menos, o objeto da pesquisa, os recursos financeiros, a equipe humana e outros elementos que possam surgir no campo da investigação. Tanto métodos quanto téc- nicas devem adequar-se ao problema a ser estudado, às hipóteses levantadas e que se queira confirmar, ao tipo de informantes com que se vai entrar em contato. (MARCONI; LAKATOS, 2010, p.147). Assim, definir métodos e técnicas é uma escolha arbitrária do pesquisador, porém não é uma escolha ao acaso: obedece à lógi- ca geral da pesquisa, desde a formulação do problema. Em última instância, diz respeito ao meio mais eficaz, dentre uma diversidade de meios disponíveis, para se levar adiante a investigação. Mais ain- da, antes de estar ligado a um problema de tipo epistemológico, está ligada à globalidade do projeto de pesquisa, e mesmo a fatores bastante concretos, porém nem sempre considerados com a devida importância, como os recursos financeiros disponíveis, por exemplo. Além disso, envolvem um exercício muito acurado de manipula- ção de teorias. Transformar conceitos teóricos, geralmente abstratos e complexos, em indicadores concretos e verificáveis na realidade constitui uma condição necessária para a construção de qualquer questionário (QUIVY; CAMPENHOUDT, 2008). Para tanto, um pro- fundo domínio das teorias é necessário. Ousamos afirmar que, se isso vale para uma pesquisa, vale também para quem estuda os resulta- dos de uma pesquisa. Não só a construção de dados, mas também sua interpretação exigem a mediação da teoria. É neste sentido que retomamos a afirmação inicial, da natureza instrumental da estatística para as ciências sociais. Compreender tal afirmação impõe a ruptura com os preconceitos e desconfianças. A escolha de métodos e técnicas quantitativas, uma vez realiza- das as etapas que antecedem o desenvolvimento da pesquisa, agora sim, trazem implicações efetivas, mas que já estavam contidas nos momentos anteriores da investigação. A mais importante delas é a quantificação. Aí entram as especificidades de cada técnica de coleta de dados. Em geral, a pesquisa quantitativa possibilita, com uma pre-