O documento descreve a jornada de uma garota irlandesa e sua mãe que foram sequestradas e traficadas para trabalhar como escravos em uma fazenda de café no sul da Irlanda. Ao chegarem, os sobreviventes do navio são forçados a vestir trapos e o dono da fazenda escolhe a mãe da garota para ser sua propriedade pessoal, separando-as. A garota é levada para os cafezais sob a proteção de um escravo chamado Rasul.
3. Folhas de
OUTONO A viagem continuava e a cada
minuto nossa angústia aumentava. Não
sabíamos o que seria de nós, isso nos
dava uma sensação de impotência, não
podíamos fazer nada para reverter à
situação.
Passaram-se vários dias, não
sabíamos quantos, pois estávamos sem
noção de tempo naquele lugar, a cada
dia, mais pessoas morriam entre
nós, aquela situação já estava sufocante.
4. Folhas de
OUTONO O navio finalmente atraca, uma
leve e falsa sensação de alivio tomava
meu coração, aquela terrível viagem havia
terminado, mas nosso desconhecido e
temido futuro havia apenas começando.
A porta então é aberta por um
homem franzino e de aparência ruim, ele
ordena para que nós saiamos do navio,
repleto de cadáveres.
5. Folhas de
OUTONO Prontamente, obedecemos à
ordem daquele desconhecido, saímos
daquele navio, e ficamos a espera de
novas ordens. Minha mãe estava
visivelmente abalada, seu olhar estava
fixo no nada, parecia estar morta, seca
por dentro. Lágrimas salgadas saiam de
seus olhos e escorriam por seu angelical
rosto, terminando no chão
desconhecido, já eu, estava tão
assustada, sentindo-me como um bicho
do mato, acuado na presença de
estranhos.
6. Folhas de
OUTONO Após uma longa espera, vimos
no horizonte, um velho e desgastado
caminhão seguir em nossa direção, o
homem franzino então acena, para indicar
nossa localização.
Não demora muito para que o
caminhão chegue até nós, ele estaciona a
beira da praia e dele sai um homem alto e
bastante encorpado, com um chapéu para
se proteger do sol.
7. Folhas de
OUTONO _São eles Riam? – Perguntou
com um estranho sotaque ao homem
esguio, se referindo a nós.
_Sim, estes são os que
sobreviveram – Responde
suavemente, como um empregado
respondendo a seu patrão – O que
fazemos com os que não resistiram? –
Perguntou Riam
8. Folhas de
OUTONO Jogue no mar, ninguém dará
falta – Disse friamente o homem, como se
aquelas vidas perdidas não valessem
nada
Após o dialogo, Riam então
começa a árdua tarefa de descartar
dezenas de cadáveres, os jogando no
mar. O robusto homem de sotaque
estranho nos ordena a entrar em seu
veículo, e seguimos viagem.
9. Folhas de
OUTONO Todos estão perplexos e
paralisados com o que estava
acontecendo, eu era a única criança em
meio a todos. Desde que havíamos
chegado minha mãe não pronunciara
nenhuma única palavra, sua face
permanecia a mesma, seu olhar ainda se
encontrava fixo no nada, algo assustador
para mim.
10. Folhas de
OUTONO Após cerca de quarenta minutos
de viagem, chegamos a uma grande
fazenda, rodeada por cafezais. Descemos
do veículo e somos enfileiradas pelo
robusto homem, que nos ordena que
ficássemos ali, paradas, ele então segue
rumo a uma grande casa, que ficava ao
centro da enorme plantação.
11. Folhas de
OUTONO O sol forte e escaldante indicava
que o inverno já havia terminado, ao
contrario de nossa angústia, que
aumentava a cada milésimo de segundo.
Não demora muito e o homem volta, com
um grande saco em suas mãos, repleto
de panos velhos
_Vamos, vistam isto – Nos
ordena, obedecemos prontamente. Após
isso, ele chama a um homem negro, forte
e alto, que usava os mesmos panos
velhos que nós acabávamos de vestir
12. Folhas de
OUTONO _Levem-nos e ensine o trabalho
– Ordena
_Sim Sr. Mackenzie – Responde
o escravo
_Espere! – Ordena novamente o
senhor Mackenzie – Qual é seu nome? –
Questiona, direcionando a pergunta para
minha mãe
13. Folhas de
OUTONO _Susan, Susan McCraine –
Responde, com a voz trêmula
_Esta não, ela permanecerá
aqui, será minha! – Ordena Mackenzie a
seu súdito
_Sim senhor – Responde o
escravo
14. Folhas de
OUTONO _Susan, Susan McCraine –
Responde, com a voz trêmula
_Esta não, ela permanecerá
aqui, será minha! – Ordena Mackenzie a
seu súdito
_Sim senhor – Responde o
escravo
15. Folhas de
OUTONO No mesmo momento, o
desespero toma conta de minha alma, o
que seria de minha mãe nas mãos
daquele tenebroso homem? Tento
impedir, corro em direção ao horrível
homem, e tento golpeá-lo com socos e
pontapés, mas de nada adianta, pois era
apenas uma garotinha de seis anos.
16. Folhas de
OUTONO
Ele então me golpeia com um rápido tapa
em meu rosto, me jogando ao chão no
mesmo instante. O que mais me chamou
a atenção, foi o desprezo que minha mãe
deu a situação, permaneceu a parte de
tudo, não se impôs e nem me
defendeu, eu estava ali, caída no
chão, esperando por uma ação dela, que
não aconteceu, talvez ela tenha
enlouquecido com o que estava
ocorrendo, era o mais provável.
17. Folhas de
OUTONO O escravo então me pega pelos
braços e me leva rumo aos
outros, seguimos então até os cafezais.
_Você não poderia ter feito
aquilo – Me alertou o escravo, logo após
se apresentar como Rasul, um pobre
africano que foi contrabandeado assim
como a mim e a todos os presentes –
Aqui, são eles que mandão, e nós que
acatamos.
18. Folhas de
OUTONO _O que é isso? Onde estou? –
Pergunto, ainda com os olhos cheios de
água
_Estamos no sul da Irlanda, eles
nos sequestram e nos trazem aqui
ilegalmente, para trabalharmos nos
cafezais – Disse Rasul – É lucrativo para
eles, que economizam com a mão de
obra utilizando o tráfico humano – Explica
novamente Rasul
19. Folhas de
OUTONO O que deveria fazer? Submeter-
me ou lutar para me ver livre daqueles
aproveitadores? Meu único momento de
rebeldia rendeu uma terrível
situação, meu rosto ainda se encontrava
dolorido com a bofetada que levara há
alguns minutos atrás, a única forma de
ainda me ver com vida, era recorrer à
submissão. Começo então a trabalhar nos
cafezais, aquilo não era novo para
mim, confesso que a experiência de
trabalhar na pequena plantação do senhor
coronel me ajudara muito.
20. Folhas de
OUTONO O que poderia fazer? Nada, essa
era a única e absoluta resposta para esta
questão, o que o destino guardava para
mim? Era o que temia, pois este já
mostrou não ser meu amigo.