2. D O S S I Ê T E M Á T I C O . FEIRAS: MODELO ESGOTADO?
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Num mundo globalizado, o visitante
profissional tanto pode ir a uma
feira em Londres como em Lisboa,
REINVENTAR AS FEIRAS “interessa-lhe é encontrar a feira que
lhe proporcione a solução para o seu
“O modelo não está esgotado”, problema”. Este facto remete para
afirma, peremptoriamente, António a tendência de subsectorização das
Brito, especialista em feiras, detentor feiras, ou seja, a existência de feiras
da certificação CEM (Certified in de menor dimensão, muito mais
Exhibition Management) e director da especializadas. “Esta é a nova realidade
empresa New Events. e a solução para os problemas de
cada um”. E além da solução para o
“As feiras permitem o seu problema, o visitante quer muito
mais do que isso, “quer experiências,
relacionamento humano e são o oportunidade de contactos, formação.
único meio, dentro do marketing “Não há feira que se preze que António Brito. Este tem apenas a obri-
gação de atrair visitantes de qualidade,
mix, que apela aos cinco sentidos”. não tenha um programa paralelo”. cabendo ao expositor transformá-los
em compradores. “Corredores cheios
Enquanto esses dois factores forem Também Mafalda Weinstein, direc- não são sinónimo de sucesso”.
importantes, elas não vão deixar de tora de feiras do IIR Portugal/Angola Além da componente educativa ou
existir, diz o especialista. Mas como (Institute for International Research), formativa, devem ser criados, segundo
tudo na vida também este sector tem uma empresa do Grupo Informa, o fundador da New Events, vários
que sofrer uma evolução, “temos de considera que já “não se trata de vender momentos de networking. O próprio
reinventar o conceito de feiras”. E como espaço, mas de colaborar na maximi- espaço da feira pode ser reinventado.
é que isso pode ser feito? Entendendo a zação do esforço que um participante “Arrisco afirmar que as feiras em
oferta e a procura, refere António Brito. faz para estar presente”. Segundo a Portugal, no que respeita ao contributo
“Têm que existir sinergias entre aquilo experiente directora de feiras “há que que o design pode ter num evento, são
a que eu chamo a trilogia das feiras: ter a consciência de que o objectivo não ainda pouco inovadoras”, diz Pedro
organizador, expositor e visitante. Sem é só investir num stand bonito, mas Figueiredo, especialista em design,
dúvida que as alavancas, os motores, essencialmente numa acção concertada responsável pela pós-graduação em
são os expositores e os visitantes. O de marketing, integrada nos objectivos Design de Eventos da Escola Superior
organizador é um intermediário e um mais latos da feira”. Em relação aos de Artes e Design de Matosinhos. Então
facilitador de negócios”. programas paralelos, de formação e como inovar, e que papel o design deve
O foco principal, hoje em dia, segundo networking, a especialista avisa, “devem ter? “Se pensarmos que os objectos e
o director da New Events, tem que ser o ser organizados com profissionalismo os espaços com que nos confrontamos
visitante, “a qualidade, a qualificação dos para que não sejam apenas mais um no dia-a-dia são desenhados e que a
visitantes e as suas necessidades, é o mais palco para apresentações comerciais dos inovação e as experiências dependem
importante e o que distingue as feiras”. expositores. É indispensável que o seu do design, facilmente se compreende
conteúdo seja focado para o mercado a as mais-valias que as linguagens,
que se destina”. os instrumentos e as metodologias
O papel do organizador de feiras está do design podem ter no âmbito das
alterado. Este tem agora que “criar feiras”, salienta Pedro Figueiredo. Para
novos conceitos, novas formas de ter influência nas feiras, quer do lado
actuação para maximizar o negócio de do expositor, quer do organizador,
expositores e visitantes” e não apenas o design tem que ser uma disciplina
vender metros quadrados. “Se tivermos chamada a intervir desde o plane-
melhores expositores, que saibam amento do evento. “A identidade, a
preparar a feira, que estabeleçam funcionalidade, a interactividade, o
objectivos, façam o follow-up, melhor conforto, a segurança, a inovação, em
para o organizador também”, lembra súmula, as qualidades distintivas de
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instalações, “que impedem as empresas radical de atitude.” que são profissionais. É algo difícil de
privadas de organizar feiras, e trans- O problema dos espaços também evitar enquanto não houver alguma
formaram o negócio no monopólio dos é levantado por António Brito, que entidade ou associação que no fundo
donos do espaço”. Para além disso o salienta igualmente os preços exces- regulamente o sector”. E quem o
problema do calendário que é, segundo sivos de aluguer. “Temos espaços poderia fazer? Segundo o responsável
a especialista, “sobrecarregadíssimo”, que estão completamente fora da da New Events essa tarefa deveria caber
“sendo muitas vezes realizadas feiras no realidade. Ainda não perceberam a uma Associação Portuguesa de Feiras
mesmo sector em simultâneo em Lisboa o que se passa neste país.” O espe- e Congressos “com força, e não de
e no Porto, o que não faz sentido num cialista lamenta também o facto de lobbies”. E devia haver mais regulação.
mercado com a dimensão do nosso”. haver espaços com exclusividade de
Há várias coisas a fazer, portanto, mas fornecedores. Por outro lado, Brito “Há organizadores de feiras que
para Weinstein o mais importante é a considera que este é um sector com
“vontade de alterar o status quo”. “Para demasiados “oportunistas”.“Olham nem empresa têm.”
isso é necessário que todos os envolvidos as feiras como mera oportunidade
no negócio das feiras estejam de acordo de negócio, que é temporal, mas que
de que é necessária uma mudança enquanto dura causa danos naqueles
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TRÊS PERGUNTAS A TRÊS PERGUNTAS A EXPONOR QUER ORGANIZAR
ANTÓNIO BRITO, DIRECTOR MAFALDA WEINSTEIN, FEIRAS EM MOÇAMBIQUE
DA NEW EVENTS DIRECTORA DE FEIRAS DA Com um percurso de longos anos no
sector das feiras em Portugal, Mafalda
IIR PORTUGAL/ANGOLA Weinstein, do IIR Portugal/Angola, tem
“O mercado dos eventos é um uma posição privilegiada na obser-
vação do mercado português, além da
mercado de prima donas” “As feiras na Alemanha são um experiência na organização de feiras
em Angola. Para entrar no mercado
Deveria existir um estatuto de organi- exemplo” angolano é “indispensável fazerem-se
zador profissional de feiras? parcerias com entidades locais, centros
Sim, como existe em muitos países do Onde poderíamos apostar para ter de exposições, hotéis, imprensa, asso-
mundo, onde para se ser organizador é uma feira internacional de referência ciações, e procurar bons fornecedores”,
preciso um grau de exigência mínima. em Portugal? diz Mafalda Weinstein. Em Angola isso
Essa é a “one million dolar question”. não se revelou problemático. A respon-
Esse estatuto deveria ser criado pela Seria muita pretensão da minha parte sável caracteriza da seguinte forma a
Associação Portuguesa de Feiras e achar que tinha a receita para a feira realidade internacional: “Estratégia!
Congressos? de sucesso em Portugal. Acredito que Profissionalismo! Concorrência!
Teria que ser uma entidade que tivesse exista, mas para a encontrar é neces- Competência! Motivação! Resultados!” E
alguma força, também política, porque sário prospecção, estudos, contactos, refere que “a maioria dos organizadores
a indústria de feiras gera milhões e gera etc., e delinear uma estratégia, definir de feiras internacionais são empresas
valor para as cidades. objectivos. E trabalho... muito trabalho. multinacionais como a Informa, a cujos
accionistas têm que apresentar resul-
É impossível fazer uma feira de Consegue identificar uma feira que tados. Há no entanto excepções, como é
eventos com sucesso em Portugal? seja um exemplo a seguir? o caso da Alemanha, em que o mercado
O mercado dos eventos é um mercado Uma feira em Portugal... a Futurália – das feiras está nas mãos das autarquias,
de prima donas em que toda a gente Salão de Oferta Educativa Formação e que vêem nas feiras, como aliás todos
tem a mania que é importante. Querem Empregabilidade. Lá fora há imensas. deveriam ver, um motor da economia”.
promoção, mas não querem pagar para As feiras na Alemanha são um exemplo Em relação a Angola há “muitas oportu-
a ter. Mas não é só aqui, é ao nível global. de eficácia e profissionalismo. nidades de negócio”.
A Portugal Eventos [n.d.r. Feira que Também em Angola está a Exponor,
terminou depois de apenas duas edições] Fazem sentido feiras abertas ao que iniciou a sua experiência fora de
foi um dos projectos mais interessantes público e a profissionais? Como juntar portas em 1998, com a realização de
onde estive envolvido e foi bom para com eficácia estes dois mundos? uma feira em Ourense, Espanha, e outra
todos, menos para quem a organizou. Pode ou não fazer, tudo depende do na Cidade da Praia, Cabo Verde. Um ano
sector e dos objectivos. Se estivermos a mais tarde, surgiram as primeiras feiras
falar de uma feira muito específica na em Maputo (Moçambique) e em São
área da saúde cujo objectivo é apre- Paulo, Brasil. Em 2009, a Associação
sentar novos equipamentos à classe Empresarial de Portugal, detentora da
médica, não faz sentido estar aberta Exponor, firmou um protocolo com a
ao público. Mas se estivermos a falar Feira Internacional de Luanda. Segundo
de uma feira do ambiente ou na área a Exponor, a falta de fornecedores,
da educação, por exemplo, faz sentido de recursos humanos e a burocracia
abrir ao público em geral com o objec- são “problemas bem reais”. “No caso
tivo de promover, divulgar e educar. de Angola, apoiámo-nos bastante no
nosso parceiro local e temos conseguido
minimizá-los.” Os mercados português
e angolano, são “bastante diferentes”.