Estudo do Betão dos Caixotões do Cais do Porto da Praia
1. Obra Obra
Figura 1. (Á esquerda) O primeiro Caixotão, apresen-
tando um excelente acabamento da superfície.
A ideia da diferenciação do tipo de formulação, para Na construção dos Caixotões são utilizados aproxi-
esta variante do betão, não é algo que se tenha anuí- madamente 740 m3 de betão. As suas dimensões, em
do recentemente. Facilmente percebemos que, há planta, são de 20,25 m por 10,25 m. A altura de cada
várias dezenas de anos (mais de uma centena), desde Caixotão é de 16,20 m, incluindo a espessura de 0,50 m
a invenção do modo de construção por moldes des- relativa à sua laje. O seu corpo é constituído por 10
lizantes, em 1885 por Carrico, e desde a sua normali- células de 4,55x3,55 m2. As suas paredes exteriores
zação em 1933 nos Estados Unidos, se percebeu que têm uma espessura de 0,45 m, enquanto as interiores
este processo carecia de composições específicas. apresentam 0,25 m. Para o PP2 foi prevista a realiza-
A composição para os Caixotões do Porto da Praia ção de um total de 13 Caixotões.
(PP2*), requisitada pelo Consórcio formado pelas empre- A Metodologia aplicada na Concepção do Betão dos
sas de construção portuguesas, Somague, MSF e Eter- Caixotões é sucintamente descrita na secção 4. deste
mar, foi desenvolvida atendendo ao comportamento artigo.
especificado, concordante com a Metodologia Prescri- As matérias-primas utilizadas encontram-se indicadas
tiva prevista na especificação LNEC E 464. Os principais na secção 3.
requisitos previstos são os indicados no Quadro I. * Segunda Fase da Modernização e Expansão do Porto da Praia.
Estudo do Betão dos Caixotões
Quadro I.
Parâmetros Requisitos Normas/Documentos
do Cais do Porto da Praia
Requisito do Cliente
NP EN 206-1:2007
Classe de resistência à compressão (MPa) C35/45
LNEC E 464: 2007
NP EN 12390-3: 2011
NP EN 206-1:2007
Classe(s) de exposição ambiental (XS3+XA1+XC4) (P) LNEC E 464: 2007
Segunda Fase dos trabalhos de Expansão e Modernização CIRIA C674: 2010
NP EN 206-1:2007
do Porto de Santiago, na República de Cabo Verde Classe de teor de cloretos Cl 0,2 Quadro 2/DNA no DNA 5.2.7
Betão Armado
Requisito do Cliente
Eng.o Luís Saraiva Máxima dimensão do agregado 25 mm NP EN 12620: 2002/A1:2010
NP EN 933-1:2000/A1:2005
NP EN 206-1:2007
NP EN 12350-2: 2009
Classe de abaixamento/ Valor pretendido Abaixamento: (200±30) mm
Abaixamento adequado ao tipo
de peça a conceber
1. Introdução Ligante EN 197-1:2011
Correspondente a: CEM II/B-M(L+P)
Mistura: (Cimento + Pozolana) LNEC E 464: 2007
Apesar de, há várias dezenas de anos, procurarmos específica, pensada para responder adequadamente CEM II/A-L 42,5 R
Tipo de cimento e sua origem EN 197-1:2011
de modo contínuo o desenvolvimento de composi- a diferentes requisitos: Cimentos Cabo Verde
ções de betões de ligantes hidráulicos capazes de, • um clima particular; Pozolanas naturais, provenientes
Adição NP EN 4220:2010
por si só, se adaptarem a uma multiplicidade de tra- • um conjunto de matérias-primas características da de Santo Antão, CABOCEM
balhos de construção, temos verificado que essa pro- ilha de Santiago; NP EN 206-1:2007
Mínima dosagem de ligante 340 kg
cura incessante nos tem conduzido a um paralelo • determinadas particularidades de produção e de LNEC E 464: 2007
oposto. Essa procura de uma composição universal aplicação; NP EN 206-1:2007
Máxima razão água/ligante (em massa) 0,45
tem-nos transportado para um universo muito mais • diversos objectivos técnicos e económicos previa- LNEC E 464: 2007
vasto. Assim, dentro do próprio “reino” do betão, mente traçados. Requisito APEB
temos descoberto diversas novas “espécies” que nos Com efeito, o betão a aplicar na materialização dos Mínima dosagem de água de amassadura 180 a 190 litros Mínima dosagem de água concordante
têm permitido, a cada dia, reinventar este produto de Caixotões, devido ao processo de moldagem das suas com o método de moldagem utilizado
excelência. A composição do betão desenvolvida para paredes, por recurso a moldes deslizantes, carece de Aplicação
Caixotões de Betão Armado, concebidos Requisito do cliente/ Especificações
os Caixotões, a aplicar na expansão do Cais do Porto uma composição própria e distinta das tidas como por recurso a moldes deslizantes de projecto
da Praia, é um exemplo cabal de uma composição “convencionais”. Velocidade de elevação do molde 25 a 30 cm/h Requisito do cliente
20 Betão n.29 Outubro 2012 Outubro 2012 Betão n.29 21
2. Obra Obra
Quadro II. Quadro III.
LNEC E 464 – Prescrições para uma vida útil de projecto de 50 anos Granulometria dos agregados
(relativas à composição do betão) NP EN 933-1:2000
Mínima
Classe dosagem Máxima Mínima Malha do Peneiro Percentagem cumulativa do material passado
de de ligante razão água/ classe de (mm)
exposição (CEM II/B-M(L+P) ligante resistência Série base +1+2 Areia Britada Areia Grossa
Areia Fina Rolada Brita 1 Brita 2
(kg/m3) (Pó de Pedra) Britada
31,5 - - - - 100
(25) - - - - 99,0
Figura 2. Cortes transversal e longitudinal do Caixotão. Retirados da peça XS3 340 0,45 C35/45
desenhada nº 0.1326.06_PF_ES_07_B, do projecto de execução da Consul-
mar, Projectistas e Consultores, Lda.
22,4 - - - - 92,2
20 - - - 100,0 65,0
16 - - - 99,3 17,7
14 - - - 94,1 4,0
3. Materiais utilizados e suas características 12,5 - - - 84,3 1,1
11,2 - - - 68,2 0,8
3.1. Agregados
Os agregados utilizados foram três areias, uma rolada 10 - - - 54,5 0,7
e duas britadas (designadas neste estudo por areia 8 - - - 27,8 0,7
fina rolada, areia fina britada (pó de pedra) e areia
6,3 - - - 15,6 0,6
grossa britada) e duas britas de origem basáltica
(designadas por brita 1 e brita 2). A areia fina natural 5,6 - - 100,0 9,7 0,6
não é oriunda de Cabo Verde, sendo proveniente da 4 100 100 85,5 2,6 0,6
Mauritânia. Todos os agregados bitados são produ-
2 100 97,4 28,8 1,5 0,6
zidos pela Somague-CVC e são provenientes da sua
pedreira localizada na ilha de Santiago. 1 98,1 66,3 9,9 1,3 0,5
No Quadro III estão indicadas as granulometrias dos 0,500 64,8 37,8 5,0 1,2 0,5
agregados (NP EN 933-1). 0,250 47,8 21,1 3,6 1,1 0,5
Figura 3. Extensão do novo Cais. Arranjo geral. Retirado da peça desenhada Por forma a avaliar as características dos agregados,
nº 0.1326.06_PE_ES_78_1,do projecto de execução da Consulmar, Projectis- 0,125 10,2 12,5 3,0 1,1 0,5
tas e Consultores, Lda.
destinados à produção do betão dos Caixotões, foram
avaliadas as suas características geométricas, físicas 0,063
0,8 8,0 2,4 0,9 0,4
e químicas, concordantes com o preconizado nos % de finos (f)
seguintes documentos: Módulo de Finura 1,79 2,65 4,64 6,64 7,78
• Especificação LNEC E 467 (Guia para Utilização de
2. O betão estudado de acordo com a NP EN 206-1 Agregados em Betões de Ligantes Hidráulicos). A
LNEC E 467 estabelece as características mínimas
O betão estudado, de acordo com a NP EN 206-1, tem que os agregados não reciclados, abrangidos pelas
como características principais, entre os requisitos fun- normas NP EN 12620 e NP EN 13055-1, deverão 3.2. Ligante hidráulico Quadro IV.
damentais e adicionais, e de acordo com a termino- respeitar para poderem ser utilizados no fabrico de O ligante hidráulico utilizado na produção do betão
logia utilizada na NP EN 206-1, as indicadas no ponto betões em Portugal, no âmbito da NP EN 206-1. é constituído pela mistura de CEM II/A-L 42,5 R, da Massa Volúmica
1. Introdução. • Na norma NP EN 12620 – Agregados para Betão. empresa Cimentos Cabo Verde, do Grupo Cimpor, e (LNEC E 64:1979)
(g/cm3)
de pozolanas naturais de Santo Antão, moídas pela
NP EN 206-1: C35/45 XS3 Cl 0,2 Dmáx25 VPA (200±30)mm empresa Cabocem. A mistura destes dois constituin-
Cimento e Adições Massa Volúmica
tes foi efectuada em proporções enquadráveis num
*VPA Valor pretendido de abaixamento cimento equivalente CEM II/B-M (L+P). De acordo
com a especificação LNEC E 464 (Metodologia Pres- Cem II/A-L 42,5 R
3,06
Cimentos Cabo Verde
No Quadro seguinte, apresentamos um resumo dos critiva para uma Vida Útil de 50 e de 100 anos face às
requisitos especificados para o betão, no referente Acções Ambientais), para este tipo de cimento (CEM
aos limites da composição e da classe de resistência II/B-M (L+P), os requisitos dos betões (já mencionados Pozolana de Santo Antão 2,16
sob a acção das exposições ambientais definidas para no Quadro IV) são:
o betão em estudo. Classe XS3:
• Mínima dosagem de cimento: 340 kg
• Máxima razão água/cimento: 0,45
• Mínima classe de resistência: C35/45
22 Betão n.29 Outubro 2012 Outubro 2012 Betão n.29 23
3. Obra Obra
A pozolana natural de Santo Antão, de acordo com corpo da composição praticamente formado, depois, gado grosso e subsequente redução no agregado fino, • Selecção apropriada de adjuvantes. Nem todos os
Sousa Coutinho, é um tufo vulcânico ortotraquítico em estádios ulteriores, apenas temos de o engordar a um aumento de 0,1% s.p.c.na dosagem do superplas- adjuvantes, principalmente os de última geração,
e traquítico subsaturado. A utilização de pozolanas ou emagrecer ligeiramente. Estes ajustes depende- tificante e a uma diminuição de 0,2% s.p.c. na quanti- à base de policarboxilatos, são adequados ao pro-
naturais, e principalmente as de Santo Antão, devido rão da experiência adquirida e, assim, poderão ser de dade do adjuvante plastificante. cesso de moldagem mencionado, dado que alguns
à sua excepcional qualidade permitem a: maior ou menor importância. A formulação da composição, a aplicar nos Caixotões conferem o chamado efeito de “pegajosidade”.
• Redução do calor de hidratação, sem prejuízo das do PP2, foi alvo de uma atenção muita cuidada, por Será necessário escolher os produtos que conce-
resistências finais e mesmo das iniciais (no caso con- Numa segunda fase, que muitas vezes é descurada parte dos serviços laboratoriais da APEB. Atendendo dam ao betão fresco uma viscosidade plástica ade-
creto deste estudo); ou tratada de modo menos rigoroso, são realiza- a que as operações de produção e betonagem se quada. Do mesmo modo, dever-se-á seleccionar
• Melhoria do desempenho dos betões, incremen- dos ensaios industriais, durante os quais são simula- desenvolvem em clima quente, bem como à agressi- adjuvantes capazes de, em conjunto com o ligante
tando a sua durabilidade; das as operações reais de deslize, recorrendo a um vidade da envolvente, fruto da exposição ambiental, disponível, perante as condições ambientais, pro-
• Aumento das resistências finais em idades avançadas; molde protótipo. Esta desenrolou-se durante o mês foi prestada a máxima atenção, procurando munir a mover tempos de presa apropriados.
• Diminuição do impacto ambiental; de Março de 2012, nas instalações de produção indus- composição, dentro das matérias-primas disponíveis, • Um betão de elevada trabalhabilidade e isento de
• Minoração do teor de hidróxido de cálcio presente trial da Somague, na cidade da Praia. Pudemos, assim, de características enquadráveis no clima intrínseco de segregação e exsudação (mesmo para dosagens de
na pasta de cimento hidratada, melhorando a resis- verificar a adequabilidade da composição “laborato- Cabo Verde. O clima de Cabo Verde é tropical, carac- água de amassadura na casa dos 190 litros).
tência à acção dos sulfatos, por diminuição da for- rial”, bem como constatar quais os ajustes necessários terizado por amplitudes térmicas reduzidas, apresen-
mação de sulfoaluminato expansivo; nas quantidades ponderais de cada constituinte. Pro- tando valores de temperatura média, ao longo do No respeitante à agressividade do meio ambiente a
• Redução da porosidade; curámos durante a realização destes ensaios confirmar ano, de 25ºC. Durante o período de Agosto a Outu- que o betão dos Caixotões estará sujeito, teremos de
• Produção de betões economicamente mais viáveis; que, para além das características de resistência mecâ- bro a temperatura alcança o seu máximo, atingindo ter em linha de conta duas zonas distintas:
• Prevenção da ocorrência de reacções sílico-alcali- nica, a composição estudada seria capaz de garan- os 30ºC. Assim, foi objectivo primordial o estudo de • A Zona Submersa;
nas, por redução do teor de álcalis e do hidróxido tir um adequado acabamento da superfície do betão, uma composição adequada, não só às características • Zona de Marés, de Rebentação e de Salpicos.
de cálcio na pasta de cimento; bem como rendimentos de avanço da cofragem con- reológicas necessárias e enquadráveis neste tipo de
• Prevenção da ocorrência de reacções sulfáticas cordantes com os ritmos de produção expectáveis e betão, mas também ao tipo de clima, munindo, para
internas (DEF), etc. delineados. A elevada qualidade do betão aparente é tal, a composição de uma quantidade mínima de água Quadro V.
essencial na garantia de um recobrimento adequado de amassadura (efectiva) e de adjuvantes cuidadosa-
3.3. Adjuvantes e homogéneo das armaduras, bem como é sintomá- mente seleccionados. Com base em toda a experiên-
Classes de Exposição – NP EN 206-1; LNEC E 464
O betão estudado contempla a incorporação de dois tico do seu envolvimento apropriado e da tão desejá- cia, em estudos similares em Cabo Verde, designa-
adjuvantes da empresa Sika Portugal, SA: vel aderência aço/betão. Quando há necessidade de damente os afectos aos recentes trabalhos portuários
• Um superplastificante, designado comercialmente providenciar reparações na superfície do betão, seja desenvolvidos ou em decurso, em Santiago, na Boa- Zona de marés,
por Viscocrete 3008, utilizado numa dosagem de porque a composição não apresenta características de vista, na ilha do Sal, e nas do Fogo e da Brava, a dosa- de rebentação Zona submersa Simplificando…
1,0%s.p.l. (sobre o peso do cimento + a dosagem trabalhabilidade adequadas ao fim, ou porque o des- gem mínima de água de amassadura efectiva defi- e de salpicos
total de pozolanas); lize se verifica ou verificou fora do tempo (deverá ocor- nida, para obtenção da consistência desejada, foi de
• Um plastificante retardador de presa, designado por rer entre o início e o fim de presa do betão), mesmo 185 litros (também associada, naturalmente, às carac-
Sikament P190, na dosagem de 0,3% s.p.l. perante a melhor operação de reparação, dificilmente terísticas das matérias-primas constituintes e à matriz
XS3 + XA1 + XC4 XS2 + XA1 + XC1 XS3
Em substituição do plastificante Sikament P190, pode- se alcançará o mesmo nível de protecção de arma- da composição). Atendendo a que escolha dos adju-
rão, no decurso da produção, ser utilizados outros pro- dura, que uma massa homogénea de betão, isenta de vantes é fulcral, depois de efectuada uma escala alar-
dutos similares e de igual função, na mesma dosagem, descontinuidades, é capaz de providenciar. gada de amassaduras laboratoriais e industriais, e
tal como: o Pozzolith 390 N da BASF, o Mapeplast N11 também com base nas opções e na nossa experiên-
da Mapei, o Mira 44 da Grace, etc. Na terceira fase, que se desenvolve durante a opera- cia no estudo de betões em todo o arquipélago de
ção de construção das primeiras peças, são efectua- Cabo Verde, os adjuvantes seleccionados foram o Vis- Apesar do coroamento dos caixotões se situar à cota
4. Cálculo da composição dos os detalhes finais, de modo a adaptar o betão aos cocrete 3008 e o Sikament P190, ambos da empresa +1,70 m (ZH), e da sua altura total ser de 16,20 m,
rendimentos de toda a equipa operacional e à veloci- Sika. O adjuvante Viscocrete 3008 foi especialmente considerou-se, numa perspectiva conservadora e de
4.1. Formulação dade de avanço prevista. Na construção de Caixotões, desenvolvido pela Sika, para a produção de betões lógica óbvia, privilegiando a durabilidade das peças
O desenvolvimento desta composição tão especí- o trabalho e a experiência das equipas de constru- em climas em tudo iguais ao de Cabo Verde. em causa, que toda a sua estrutura estaria sujeita a
fica, devido à complexidade do processo de molda- ção envolvidas, tem permitido concluir que a veloci- Na concepção deste betão específico, perante o mencio- uma exposição condizente com a classe XS3.
gem e ao facto das betonagens decorrerem em con- dade de deslize adequada se deve situar entre os 25 nado, depreende-se facilmente que são factores chave: A composição do betão a empregar nesta estrutura
dições de Clima Quente, desenrolou-se ao longo de a 30 cm/h. Esta última etapa comporta o desenvolvi- • Uma mínima dosagem de finos e sua correcta distri- foi, então, estudada de modo a obter propriedades
três fases distintas. mento da composição “real”, ou seja, a composição buição granulométrica, especificamente as partícu- de resistência química, física e mecânica adequadas
A primeira fase, desenvolvida durante os meses de efectiva. O Eng. Luís Saraiva, da APEB, pôde acompa- las inferiores a 250 mícrons. ao meio em que se insere. Assim, a composição foi
Dezembro de 2011 e Janeiro de 2012, correspondeu nhar de perto a produção dos 3 primeiros Caixotões, • A mínima dosagem de água de amassadura selec- estudada de modo a garantir as características míni-
à estruturação da composição em condições labora- a qual se desenvolveu, no mês de Julho, durante um cionada. Dado que a água de amassadura é respon- mas regulamentares relativas à acção química, de
toriais, a partir de amostras de matérias-primas envia- período de 3 semanas (no PP2 é concebido um Cai- sável pela diminuição do atrito entre as partículas resistência à difusibilidade de cloretos e, também, à
das pela Somague para a nossa unidade laboratorial. xotão por semana, demorando a moldagem das suas sólidas do betão e a superfície interior da cofra- acção abrasiva das ondas (não indicadas na Especifi-
Esta etapa é aquela que corresponde ao desenvol- paredes cerca de 60 horas). As alterações, de minú- gem, durante o deslize, é preferível um excesso de cação LNEC E 464). Observe-se que a classe XA1, no
vimento da composição “laboratorial”. Este estádio cia, relativas à composição previamente estabelecida água de amassadura do que a sua falta. Este facto que à agressividade química respeita, é a prevista pela
é fulcral, ficando delineados os alicerces basilares e validada na segunda fase da concepção, limitaram- assume ainda maior importância quando as betona- LNEC E 464, no caso de betões em contacto com a
da estrutura da composição. Ou seja, ficamos com o -se a uma aumento de 20 kg na dosagem do agre- gens decorrem em locais de Clima Quente. água do mar.
24 Betão n.29 Outubro 2012 Outubro 2012 Betão n.29 25
4. Obra Obra
Figura 9. Aspecto do betão fresco, durante uma betonagem, evidenciando
Figura 5. Molde Protótipo elevada homogeneidade, isenta de qualquer exsudação.
Ensaio de abaixamento realizado junto do local de aplicação.
Figura 8. Os diferentes graus de probabilidade de corrosão das armaduras,
por acção dos cloretos em ambiente marinho
Como um dos parâmetros essenciais de base da
composição, destacamos a incorporação das pozo-
lanas naturais de Santo Antão. A elevada qualidade
desta matéria-prima realça-se, não só nos resultados
Figura 4. Molde Protótipo Figura 6. Pormenor da qualidade da superfície do betão, durante a realização
do ensaio de moldagem por deslize caracterizadores alcançados, como se consubstancia
nos relatos sobre a sua qualidade, tecidos pelo sau-
doso Sr. Eng.º Sousa Coutinho, o grande ícone do
betão em Portugal, que referia num dos seus famo-
Apesar do coroamento dos caixotões se situar à cota sos livros (Fabrico e Propriedades do Betão, Volume
+1,70 m (ZH), e da sua altura total ser de 16,20 m, XS3 I): “Há mesmo pozolanas de qualidade excepcional
considerou-se, numa perspectiva conservadora e de …, (como a de Santo Antão da República de Cabo
lógica óbvia, privilegiando a durabilidade das peças Verde),...” Efectivamente, as extraordinárias caracte-
em causa, que toda a sua estrutura estaria sujeita a rísticas desta pozolana eram bastante conhecidas em
uma exposição condicente com a classe XS3. XS3 Portugal, sendo mesmo prescritas pela APDL, nos
A composição do betão a empregar nesta estrutura seus cadernos de encargos, durante diferentes fases
foi, então, estudada de modo a obter propriedades da construção do Porto de Leixões. Se durante mui-
de resistência química, física e mecânica adequadas tos anos na utilização desta adição primava, por exce-
ao meio em que se insere. Assim, a composição foi lência, a redução do calor de hidratação (característica
estudada de modo a garantir as características míni- necessária, principalmente em betonagens em massa
XS2
mas regulamentares relativas à acção química, de e em climas quentes) e a redução da probabilidade
resistência à difusibilidade de cloretos e, também, à da formação de sulfoaluminato expansivo (redução
acção abrasiva das ondas (não indicadas na Especifi- do ataque por acção dos sulfatos), no presente, a sua
cação LNEC E 464). Observe-se que a classe XA1, no utilização prima, também, pela redução das taxas de
que à agressividade química respeita, é a prevista pela Figura 7. Deterioração de estruturas de betão em contacto com a água do emissão de CO2 (reduzir o impacto ambiental da pro-
mar, de acordo com o CEB, Design Guide for Durable Concrete Structures, 199
LNEC E 464, no caso de betões em contacto com a dução do Cimento Portland). Esta redução do impacto Figura 10. Construção do Caixotão na plataforma, enquanto este ainda não
possui suficiente capacidade de flutuação
água do mar. ambiental é um facto a que, qualquer um de nós, não
pode nem deverá, de futuro, ficar alheio, aquando da
formulação de composições e da especificação das
características dos betões.
26 Betão n.29 Outubro 2012 Outubro 2012 Betão n.29 27
5. Obra Obra
A – Parâmetro que varia com a dosagem de ligante,
As relações apresentadas são caracterizadoras do a forma do agregado e a trabalhabilidade requerida Gráfico I. Tensão de rotura à compressão NP EN 12390-3:2011
betão estudado, constituindo importantes informa- para o betão.
ções sobre o comportamento dos betões. Um outro D – Máxima dimensão do agregado do betão.
parâmetro sempre devidamente analisado é a super- B – Parâmetro que depende da potência de compactação.
fície específica da mistura final. Uma das proprieda- R – Raio médio do molde (zona mais armada). Pratica-
des da pozolana é a condução à obtenção de mis- mente, toma-se R = 1.
turas de menor superfície específica, para a mesma D
consistência.
As ordenadas dos pontos iniciais do segmento de
4.2. Dosagem de cimento e adjuvante recta são 100 (correspondente à abcissa D) e 0 (cor-
As dosagens de cimento e dos adjuvantes utilizadas respondente à abcissa 0,0063 mm).
na composição, bem como a razão água/cimento, Os valores dos parâmetros A e B da nossa curva são:
foram baseadas na experiência da APEB em concep-
ções de betões com materiais constituintes simila- A = 42 (fcm,28) do betão estudado, de acordo com o Quadro
res. Estes parâmetros obedecem aos requisitos para B=2 12 da NP EN 206-1:2007, harmoniza-se com um desen-
Figura 11. Caixotão terminado, a ser rebocado para a sua posição final. a mínima dosagem de cimento, máxima razão água/ volvimento de resistência rápido. O desenvolvimento
A elevada qualidade do betão aparente, sem recurso a operações de
reparação, permite garantir os padrões de durabilidade expectáveis. cimento e mínima classe de resistência a verificar, con- A curva de referência do betão está desenhada no seu rápido, de acordo com o mesmo Quadro, verifica-se
cordantes com as classes de exposição, indicados na Boletim de Composição e tem como coordenadas: quando aos 2 dias de idade é alcançada uma resis-
norma NP EN 206-1 e na especificação LNEC E 464, tência de, no mínimo, 50% da atingida aos 28 dias.
referentes ao betão em estudo. Constate-se, contudo, que esta análise de desenvol-
A formulação da composição destinada à materiali- vimento, segundo a secção 7.2 da NP EN 206-1, deve
zação dos Caixotões do PP2 foi desenvolvida a par- 4.3. Composição do betão, método de Faury, aná- d = 0,0063 mm - Yd = 0% ser realizada mediante ensaio a 20ºC.
tir da realização de diversas amassaduras laboratoriais lise comparativa
experimentais e industriais. Partindo dos dados essen- De entre as várias dezenas de métodos associados à D/2 = 12,5 mm - YD/2 = 82,4% 4.5. Classe de teor de cloretos
ciais de base, foram arbitradas composições com dife- formulação de composição de betões, um dos mais Em relação à classe de teor de cloretos (requisito fun-
D = 25 mm - YD = 100%
rentes relações AG/AF, em massa e em volume, (Agre- generalizados, principalmente no nosso país, é o damental) é necessário ter presente que as especifi-
gado Grosso/ Agregado Fino). Estas relações foram Método de Faury. O Método de Faury integra-se no cações referentes ao teor de cloretos no betão sim-
estipuladas com base nas características de resistên- grupo dos métodos baseados em curvas de referência. 4.4. Resultados das resistências mecânicas – amassa- ples, armado e pré-esforçado (ou que contenha metal
cia e de trabalhabilidade adequadas ao tipo de betão Apenas a genialidade de Faury e do seu mentor Albert duras laboratoriais embebido) estão presentes na secção 5.2.7 da NP EN
alvo de estudo e ao elevado padrão de qualidade final Caquot poderiam conduzir a um método simples e efi- No Quadro VI está indicado o perfil tipo, referente às 206-1, sendo o Quadro 10, no nosso Anexo Nacional,
do acabamento superficial das peças. Obviamente a caz. A título de curiosidade e porque a comparação da tensões de rotura à compressão simples sobre pro- substituído pelo Quadro 2/DNA no DNA 5.2.7.
variação da relação AG/AF será conducente à obten- curva traçada para o nosso betão, mediante a nossa vetes cúbicos (NP EN 12390-3), nas idades alvo de De acordo com a Nota (1) do Quadro referido, as clas-
ção de outras diferentes relações, intimamente ligadas abordagem experimental, com a de Faury faz parte ensaio. Os resultados são referentes a provetes cúbi- ses de teor de cloretos, no caso de betão armado ou
à primeira e não de inferior importância: integrante do nosso próprio método de formulação cos de 150 m de aresta. pré-esforçado, podem deixar de se aplicar se forem
de composições, apresentamos os valores dos parâ- tomadas medida especiais de protecção contra a cor-
metros de Faury para a nossa curva final. A curva de desenvolvimento da resistência à compres- rosão. Ou seja, poder-se-á aplicar, nestas condições,
Relações A curva granulométrica neste método é constituída são tem particular interesse, não só para um adequado a classe Cl 1,0.
por dois segmentos de recta, marcados num gráfico, Segundo a NP EN 206-1, no caso de betão armado
AG/ Agreg. 0,55 volume
cujas ordenadas são centesimais e as abcissas são exposto a um ambiente classificado como XS, a
AG/ AF 1,25 massa proporcionais à raiz quinta da dimensão da malha do
peneiro. Quadro VI.
AG/ AF 1,22 volume
Abaixamento Resistência à compressão NP EN 12390-3 (MPa)
A abcissa do ponto de encontro dos dois segmentos NP EN 12350-2 (mm)
AG/ Agreg. 0,45 volume 1 dia 2 dias 3 dias 7 dias 28 dias
de recta é de D e a sua ordenada é
2 22,5 37,5 41,3 48,8 60,8
200
Agreg. / Lig 4,28 massa 46,3% fcm 28d 61,7% fcm 28d 67,9% fcm 28d 80,3% fcm 28d 100%
AG/ ( AF+Lig) 0,82 massa
onde:
AF/ (argam.) 0,447 volume acompanhamento da produção do betão, permitindo máxima classe de teor de cloretos a verificar é a Cl 0,2.
estimar as resistência aos 28 dias de idade, a partir de No cálculo do teor de cloretos do betão em estudo,
água / finos 0,40 massa resultados em idades mais jovens, mas também para indicado no Boletim de Composição, foram conside-
o utilizador, no caso específico da aplicação final deste rados os seguintes teores máximos de cloretos para
As relações apresentadas correspondem ao betão estudado. betão, programar a cura, a descofragem e a movimen- cada constituinte:
tação das peças.
A razão entre resistência à compressão aos 2 dias de 5. Conclusão
idade (fcm,2) e a resistência à compressão aos 28 dias
28 Betão n.29 Outubro 2012 Outubro 2012 Betão n.29 29
6. Obra
Quadro VII.
Constituintes Teor de cloretos Observações
CEM II/A-L 42,5 R ≤0,1% NP EN 197-1:2001
Pozolana de Santo Antão ≤0,16% Ficha de Produto
Areia Fina ≤0,04% Ensaio
Pó de Pedra ≤0,03% Ensaio
Areia Grossa Britada ≤0,03% Ensaio
Brita 1 ≤0,03% Ensaio
Brita 2 ≤0,03% Ensaio
Viscocrete 3008 ≤0,1% Ficha de produto
Sikament P190 ≤0,1% Ficha de produto
VMA – Água Potável
Água 0,025%
Ficha de Produto (Electra)
Partindo dos parâmetros base especificados para a Agradecimentos
composição do betão dos Caixotões, a composição
formulada não só alcançou, como ultrapassou ampla- Não gostaríamos de terminar este artigo sem agrade-
mente os requisitos mínimos de resistência mecânica cer todo o apoio e interesse manifestado pelas equi-
especificados. pas afectas à produção do betão e à construção dos
Com a razão água/cimento utilizada (0,44) foi alcan- Caixotões. Só com o seu elevado saber e profissio-
çada uma resistência à compressão aos 28 dias de 60,8 nalismo poderíamos chegar a um resultado final de
MPa. Tendo em atenção a secção 9.5 e o Anexo A da qualidade ímpar, entre as demais obras do género.
NP EN 206-1, designadamente a secção A.5 (“Crité- Efectivamente, só com todo o espírito de empreen-
rios para aceitação dos ensaios iniciais”), convém que dedorismo manifestado pelo Consórcio Construtor e
a margem de segurança, relativa ao início de produ- pela empresa de fiscalização afectos ao PP2 se pode-
ção, seja de, pelo menos, 6 MPa a 12 MPa. A compo- ria alcançar resultado tão positivo.
sição estudada ultrapassa estes valores mínimos de
segurança, indicados com base nos valores de desvio A todos os que nos apoiaram, o nosso Muito Obri-
padrão previsíveis em decurso de produção. gado, nomeadamente:
A composição estudada foi desenvolvida, para além
das características mecânicas, tendo, também, em Eng.º Jorge Marques e Sr. Cruz Mata (o nosso inven-
atenção: tor de “zingarelhos”, sem o qual não teria sido pos-
• A obtenção de uma adequada reologia, conduzindo sível testar, previamente, a adequabilidade das com-
a uma mais fácil colocação e compactação do betão; posições ao deslize, recorrendo ao Molde Protótipo
• Um tempo de trabalhabilidade do betão fresco ade- inventado por si) – Somague;
quado às condições higrotérmicas locais e às opera- Eng.º José Domingos e Sr. Rui Ferreira – Somague-
ções de moldagem. -CVC;
• Tempos de presa adequados à velocidade de des- Eng.º Luís Adão e Sr. Câmara – Etermar;
lize necessária. Engº Luís Esteves e sua equipa – Consulgal.
• Elevada qualidade do betão aparente, minorando as
operações de reparação ou de acabamento final da
sua superfície.
Assim, é facilitado todo o processo de produção,
visando a execução adequada à construção dos Cai-
xotões.
A conformidade do betão com a NP EN 206-1 signi-
fica que a avaliação da conformidade prevista na sec-
ção 10 desta Norma, os ensaios iniciais da secção 9.5,
o controlo da produção previsto na secção 9. e o con-
trolo da conformidade (secção 8) são executados pelo
produtor e satisfazem os requisitos.
30 Betão n.29 Outubro 2012