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PAULO LEMINSKI




    DISTRAÍDOS VENCEREMOS

               2!' edição







          editorabrasiliense
TRANSMATÉRIA        CONTRASENSO

          Nas unidades de Distraídos Venoeremos
     (1983-1987), resultado do impacto da poesia
     de Capriohos e Relaxas (1983) sobre a fina e
     grossa cútis da minha sensibilidade     lírica,
     oalmes bloos ioi-bas oh us d 'un désastre
     obsour, cadeias de Markoff em direção a
I'   uma frase absoluta, arrisco crer ter
     atingido um horizonte longamente
     almejado: a abolição (não da realidade,
     evidentemente)    da referência, através da
     rarefação.
          Seria demais, certamente,   supor que eu
     não precise mais da realidade.
          Seria de menos, todavia, suspeitar
     sequer que a realidade, essa velha senhora,
     possa ser a verdadeira    mãe destes dizeres
     tão calares.



                     É qu~ndo a vida vase.
                 É quando como quase.'
                     Ou não, quem sabe.


                                 Curitiba. janeiro de 1987
1NDICE, ÍCONE E SÍMBOLO

Distraídos venceremos     13
Ais ou menos              65
Kawa cauim                99




                           9
r   AVISO AOS NÁUFRAGOS




         Esta página,   por exemplo,
..   não nasceu para ser lida.
         ,Nasceu para ser pálida,
     Ufi mero plágio da Ilíada,
         alguma coisa que cala,
     folha que volta pro galho,
         muito depois de caída.

         Nasceu para ser praia,
     <1
      uem sabe Andrômeda, Antártida,
         Himalaia, sílaba sentida,
     nasceu para ser última
         a que' não nasceu ainda.

          Palavras traz idas de longe
     pulas águas do Nilo,
          um dia, esta página, papiro,
     V'0'1ter que ser traduzida,
          para o símbolo, para o sânscrito,
     para todos os dialetos da Índia,
          vai ter que dizer bom-dia'
     .tO que só se diz ao pé do ouvido,
          vai ter que ser a brusca pedra
     onde alguém deixou cair o vidro.
          Não é assim que é a vida?

                                              15
A LEI DO QUÃO               MINIFESTO




    Deve ocorrer em breve        ave a raiva desta noite
uma brisa que leve           &I..
                                baita lasca fúria abrupta
    um jeito de chuva             louca besta vaca solta
à última branca de neve.     ..uiva luz que contra o dia
                                  tanto e tarde madrugastes
    Até lá, observe-se
a mais estrita disciplina.      morra a calma desta tarde
    A sombra máxima          morra em ouro
pode vir da luz mínima.          enfim, mais seda     .

                             l morte, essa fraude,
                                 quando próspera

                                 viva e morra sobretudo
                             oete dia, metal vil,
                                 surdo, cego e mudo,
                             nele tudo foi e, se ser foi tudo,
                                 já nem tudo nem sei
                             ne vai saber a primavera
                                 ou se um dia saberei
                             que nem eu saber nem ser nem era




16                                                               17
ADMINIMISTÉRIO




     Vim pelo caminho difícil,        QUàndo o mistério chegar,
a linha que nunca termina,       já vai me encontrar dormindo,
     a linha bate na pedra,           metade dando pro sábado,
a palavra quebra uma esquina,    outra metade, domingo.
     mínima linha vazia,              Não haja som nem silêncio,
a linha, uma vida inteira,        quando o mistério aumentar.
     palavra, palavra minha.          Silêncio é coisa sem senso,
                                 não cesso de observar.
                                      Mistério, algo que, penso,
                                 mais tempo, menos lugar.
                                      Quando o mistério voltar,
                                 meu sono esteja tão solto,
                                      nem haja susto no mundo
                                 que possa me sustentar.

                                     Meia-noite, livro aberto.
                                 Mariposas e mosquitos
                                     pousam no texto incerto.
                                 Seria o branco da folha,
                                     luz que parece objeto?
                                 Quem sabe o cheiro do preto,
                                      que cai ali como um resto?
                                 Ou seria que os insetos
                                      descobriram parentesco
                                 com as letras do alfabeto?

18                                                                  19
DISTÂNCIAS   MÍNIMAS             SAUDOSA AMNÉSIA


                                                     a um amigo que perdeu a memória



    um texto morcego                   Memória é coisa recente;
se guia por ecos                   Até ontem, quem lembrava?
    um texto texto cego                A coisa veio antes,
um eco anti anti anti antigo       ou, antes, foi a palavra?
    um grito na parede rede rede       Ao perder a lembrança,
volta verde verde verde            grande coisa não se perde;
    com mim com com consigo            Nuvens, são sempre brancas.
ouvir é ver se se se se se         O mar? Continua verde.
     ou se se me lhe te sigo?




20                                                                                 21
ICEBERG                             POR UM LINDÉSIMO       DE SEGUNDO




     Uma poesia ártica,                   tudo em mim
claro, é isso que desejo.             anda a mil
     Uma prática pálida,                  tudo assim
três versos de gelo.                  tudo por um fio
     Uma frase-superfície                 tudo feito
onde vida-frase alguma                tudo estivesse. no cio
     não seja mais possível.              tudo pisando macio
Frase, não. Nenhuma.                  tudo psiu
     Uma lira nula,
reduzida ao puro. mínimo,                 tudo em minha volta
     um piscar do espírito,           anda às tontas
a única coisa única.                      como se as coisas
     Mas falo. E, ao falar, provoco   fossem todas
 nuvens de equívocos                      afinal de contas
     (ou enxame de monólogos?).
 Sim, inverno, estamos vivos.




22                                                                           23
PASSE A EXPRESSÃO




    Transar bem todas as ondas
                                      Esses tais artefatos
a Papai do Céu pertence,          que diriam minha angústia,
    fazer as luas redondas
                                      tem umas que vêm fácil,
ou me nascer paranaense.
                                  tem muitas que me custa.
    A nós, gent~, só foi dada
                                      Tem horas que é caco de vidro,
essa maldita capacidade,
                                  meses qua é feito um grito,
    transformar   amor em nada.
                                      tem horas que eu nem duvido,
                                  tem dias que eu acredito.
                                      Então seremos todos gênios
                                  quando as privadas do mundo
                                      vomitarem de volta
                                  todos os papéis higiê:q.icos.




24
                                                                       26
o MÍNIMO DO MÁXIMO         ,'-SIGNO   ASCENDENTE    "-.,




    Tempo lento,                    Nem todo espelho
espaço rápido,                reflita este hieroglifo.
     quanto mais pensá,             Nem todo olho
menos capto.                  decifre esse ideograma.
     Se não pego isso               Se tudo existe
que me passa no íntimo,       para acabar num livro,
     importa muito?                 se tudo enigma
Rapto o ritmo.                a alma de quem ama!
     Espaçotempo ávido,
lento espaçodentro,
     quando me aproximá,
simplesmente    me desfaço,
     apenas o mínimo
em matéria de máximo.




26                                                              27
~

                                                                         91
     ALÉM ALMA                           +   PLENA   PAUSA
     (UMA GRAMA DEPOIS)




    Meu coração lá de longe                  Lugar onde se faz
faz sinal que quer voltar.               o que já foi feito,
    Já no peito trago em bronze:             branco da página,
NÃO TEM VAGA NEM LUGAR.                  soma de todos os textos,   I
    Pra que me serve um negócio              foi-se o tempo
que não cessa de bater?       .          quando, escrevendo,
    Mais me parece um relógio                era preciso
que acaba de enlouquecer.                uma folha isenta.
    Pra que é que eu quero quem chora,
se estou tão bem assim,                       Nenhuma página
    e o vazio que vai lá fora            jamais foi limpa.
cai macio dentro de mim?                      Mesmo a mais Saara, I
                                         ártica, significa.
                                              Nunca houve isso,
                                         uma página em branco.      1



                                              No fundo, todas grita!m,
                                         pálidas de tanto.          I




28                                                                            29
MERD:A   E OURO             O PAR QUE ME PARECE




           Merdaé veneno.               Pesa dentro de mim
       No entanto, não há nada     o idioma que nã.o fiz,
          que seja mais bonito          aquela língua sem. fim
          que uma bela cagada.     feita de ais e de aquis.
      Cagam ricos, cagam padres,        Era uma língua bonita,
       cagam reis e cagam fadas.   música, mais que palavra,
     Não há merda que se compare        alguma coisa de hitita,
        à bosta da pessoa amada.   praia do mar de Java.
                                        Um idioma perfeito,
                                   quase não tinha objeto.
                                        Pronomes do caso reto,
                                   nunca acabavam sujeitos.
                                        Tu40 era seu múltiplo,
                                   verbo, triplo, prolixo.
                                        Gritos eram os únicos.
                                   O resto, ia pro lixo.
                                        Dois leos em cada pardo,
                                   dois saltos em cada pulo,
                                        eu que só via a metade,
                                   silêncio, está tudo duplo.




30                                                                 31
ARTE DO CHÁ                   t   PROEMA




    ainda ontem                        Não há verso,
convidei um amigo                 tudo é prosa,
    para ficar em silêncio             passos de luz
co:rnigo                          num espelho,
                                      verso, ilusão
     ele veio                     de ótica,
meio a esmo                           verde,
    praticamente não disse nada   o sinal vermelho.
e ficou por isso mesmo
                                       Coisa
                                  feita de brisa,
                                       de mágoa
                                  e de calmaria,
                                       dentro
                                  de um tal poema,
                                       qual poesia
                                  pousaria?




32                                                     33
DESENCONTRÁRIOS




    Eu, hoje, aoordei mais oedo       Mandei a palavra rimar,
e, azul, tive uma idéia olara.    ela não me obedeoeu.
    Só existe um segredo.              Falou em mar, em oéu, em rosa,
Tudo está na oara.                em grego, emsilênoio,    em prosa.
                                       Pareoia fora de si,
                                  a sílaba silenoiosa.

                                      Mandei a frase sonhar,
                                  e ela se foi num labirinto.
                                      Fazer poesia, eu sinto, apenas isso.
                                  Dar ordens a um exéroito,
                                       para oonquistar um império extinto.




34                                                                           35
1




     o QUE ,QUER DIZER                                 UM METRO DE GRITO
                                                       (MÁQUINAS LÍQUIDAS)
                         lIara Haroldo de Campos,
                         translator   maximus


   O que quer dizer, diz.                               Leiam-se índices,
Não fica fazendo                                    mil olhos de lince,
   o que, um dia, eu sempre fiz.                        entre meus filmes,
Não fica só querendo, querendo,                     leonardos da vinci.
   coisa que eu nunca quis.                             Abri-vos, arcas, arquivos,
O que quer dizer, diz.                              súmulas de equívocos,
    Só se dizendo num outro                             fechados,
    o que, um dia, se disse,                        para que servem os livros?
um dia, vai ser feliz.
                                                        Livros de vidro,
                                                    discos, issos, aquilos,
                                                        coisas que eu vendo a metro,
                                                    eles me compram aos quilos.
                                                         Líquidas lâminas,
                                                    linhas paralelas,
                                                         quanto me dão
                                                    por minhas idéias?




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CLARO CALAR SOBRE
                               UMA CIDADE SEM RUÍNAS
                                (R UINOGRAMAS)


     sorte no jogo              Em Brasília, admirei.
azar no amor                Não a niemeyer lei,
     de que me serve            a vida das pessoas
sorte no amor               penetrando nos esquemas
     se o amor é um jogo        como a tinta sangue
e o jogo não é meu forte,   no mata borrão,
     meu amor?                  crescendo o vermelho gente,
                            entre pedra e pedra,
                                pela terra a dentro.

                                Em Brasília, admirei.
                            O pequeno restaurante     clandestino,
                                criminoso por estar
                            fora da quadra permitida.
                                Sim, Brasília.
                            Admirei o tempo
                                que já cobre de anos
                            tuas impecáveis matemáticas.

                                Adeus, Cidade.
                            O erro, claro, não a lei.
                                Muito me. admirastes,
                            muito te admirei.



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NOMES A MENOS




                                   Nome mais nome igual a nome,
    Carrego o peso da lua,
                                uns nomes menos; uns nomes mais.
Três paixões mal curadas,
                                   Menos é mais ou menos,
    Um saara de páginas,
                                nem todos os nomes são iguais.
Essa infinita. madrugada.

    Viver de noite                   Uma coisa é a coisa, PaI.' ou ímpar,
                                outra coisa é o nome, par e par,
Me fez senhor do fogo.
                                    retrato da coisa quando límpida,
    A vocês, eu deixo o sono.
                                coisa que as coisas deixam ao passar.
O sonho, não.
    Esse, eu mesmo carrego.
                                    Nome de bicho, nome de mês,
                                                            nome de estrela,
                                nome dos meus amores, nomes animais,
                                    a soma de todos os nomes,
                                nunca vai dar uma coisa, nunca mais.

                                   Cidades passam. Só os nomes vão ficar.
                                Que coisa dói dentro do nome
                                   que não tem nome que conte
                                nem coisa pra se contar?




                                                                               41
40
VOLTA EM ABERTO              O NÁUFRAGO      NÁUGRAFO




    Ambígua volta                    a letra A a
em torno da ambígua ida,        funda no A
    quantas ambigüidades             tlântioo
se pode oometer na vida?        e paoífioo oom
    Quem parte leva um jeito         templo a luta
de quem traz a alma torta.      entre a rápida letra
    Quem bate mais .na porta?        e o ooeano
Quem parte ou quem torna?       lento


                                    assim
                                fundo e me afundo
                                    de todos os náufragos
                                ná ugrafo
                                    o náufrago
                                mais
                                    profundo




 42                                                           43
BEM NO FUNDO                          SEM BUDISMO




    no fundo,. no fundo,                    Poema que é bom
bem lá no fundo,                        a.oaba zero a zero.
    a gente gostaria                        Acaba com.
de ver nossos problemas                 Não como eu quero.
    resolvidos por decreto                  Começa sem.
                                        Com, digamos, certo verso,
    a partir desta data,                    veneno de letra,
aquela mágoa sem remédio                bolero. Ou menos.
    é considerada nula                      Tira daqui, bota dali,
e sobre ela - silêncio perpétuo         um lugar, não caminho.
                                            Prossegue de si.
    extinto por lei todo o remorso,     Heguro morreu de velho,
maldito seja quem olhar pra trás,            e sozinho.
    lá pra trás não há nada,
e nada mais

    mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
    e aos domingos saem todos passear
o problema, sua senhora
    e outros pequenos probleminhas




44                                                                   45
J



                                     o HÓSPEDE DESPERCEBIDO




      o amor, esse sufoco,            Deixei alguém nesta sala
agora há pouco era muito, .       que muito se distinguia
    agora, apenas um sopro            de alguém que ninguém se chamava,
                                  quando eu desaparecia.
    ah, troço de louco,               Comigo se assemelhava,
corações trocando rosas,          mas só na superfície.
    e socos                           Bem lá no fundo, eu, palavra,
                                  não passava de um pastiche.
                                      Uns restos, uns traços, um dia,
                                  meus tios, minhas mães e meus pais
                                      me chamarem de volta pra dentro,
                                  nu ainda não volte jamais.
                                      Mas ali, logo ali, nesse espaço,
                                  In.Ae vai, exemplo de mim,
                                      algo, alguém, mil pedaços,
                                  "lUla início, meio a meio, sem fim.




 46
                                                                          47
AÇO EM FLOR                                   A LUA NO CINEMA


                         para Xoji Sakaguchi,
                         portal amigo entre o
                         Japão 'eo Brasü

                                                    A lua foi ao cinema,
    Quem nunca viu                              passava :um filme engraçado,
que a flor, a faca e a fera                         a história de uma estrela
    tanto fez como tanto faz,                   que não tinha namorado.
e a forte flor que a faca faz
    na fraca carne,                                 Não tinha porque.era apenas
um pouco menos, um pouco mais,                  uma estrela bem pequena,
    quem nunca viu                                  dessas que, quando apagam,
a ternura que vai                               ninguém vai dizer, que penal
    no fio da lâmina samurai,
esse, nunca vai ser capaz.                          Era uma estrela sozinha,
                                                ninguém olhava pra ela,
                                                    e toda a luz que ela tinha
                                                cabia numa janela.

                                                   A lua ficou tão triste
                                                com aquela história de amor,
                                                   que até hoje a lua insiste:
                                                - Amanheça, por favor I




48                                                                                49
l
     ANCH'IO   SON PITTORE




    fra angélico                  podem ficar com a realidade
quando pintava                esse baixo astral
    uma madona cal bambino        em que tudo entra pelo cano
se ajoelhava e rezava
    como se fosse um menino       eu quero viver de verdade
                              eu fico com o cinema americano
   orava diante da obra
como se fosse pecado
   pintar aquela senhora
sem estar ajoelhado

    orava como se a obra
fosse de deus não do homem




60                                                              51
LITOGRA VURA                                     .RIMAS    DA MODA               l



      Mão   de estátua.                         1930            1960       1980
Templo. Coluna. Arco de triunfo.
                                                amor            homem      ama
    Mil duzentos e cinqüenta.
                                                dor             come       cama
Qualquer pedra na Europa
                                                                fome
    é suspeita de ser
mais do que aparenta.

      Felizes as pedras   da minha      terra
que   nunca   foram   senão   pedras.
      Pedras, a lua esfria
e o sol esquenta.




62
                                                                                  63
300.000   KMS POR SEGUNDO




    eu ontem tive a impressão               De que música gostam
 que deus quis falar comigo             os pernilongos?
    não lhe dei ouvidos                     De Schubert., de Wagner,
                                        de Debussy?
     quem sou eu para falar com deus?        Não gostam de nada,
 ele que cuide dos seus assuntos        a julgar por este aqui.
     eu cuido dos meus                       Apenas um solo de silêncio,
                                        tsso sim,
                                             eu ouvi.




64
                                                                           66
PARADA    CARDÍACA




     Essa minha secura
 essa falta de sentimento                             como se eu fosse Júlio plaza

     não tem ninguém que segure
 vem de dentro                       prazer
                                  da pura percepção
      Vem da. zona escura           .-0S sentidos

 donde vem o que sinto            sejam a crítica
      sinto muito                     da razão
 sentir é muito lento




66
                                                                               67
SORTES E CORTES                                                     IMPRECISA         PREMISSA


                                                                     (quantas curitibas   cabem numa s6 Curitiba?)

a linha   clara        a tesoura traça         na folha branca                  Cidades pequenas,
                                                                            como dói esse silêncio,
separa a folha             a folha       da forma         a -forma           cantilenas,   ladainhas,
                                                                         tudo aquilo que nem penso,
um diabo          habita      o branco     do olho    da página                     esse excesso
                                                                         que me faz ver todo o senso,
claro      oculto            entre        as claridades                       ~mprecisa premissa,
                                                                               definitiva preguiça
o vazio passa              e deixa         uma saudade                      com que sobe, indeciso,
                                                                         o mais ou menos do incenso.
                                                                            Vila de Nossa Senhora
                                                                              da Luz dos Pinhais,
                                                                             tende piedade de nós.




68                                                                                                                   69
HARD FEELINGS                                  .   SUJEITO   INDIRETO



                           (a riddle for Manha)


     Oceans,                                          Quem dera eu achasse um jeito
emotions,                                         de fazer tudo perfeito,
     ships, ships,                                    feito a coisa fosse o projeto
and other relationships,                          e tudo já nascesse satisfeito.
     keep us going                                    Quem dera eu visse o outro lado,
through thefog                                    o lado de lá, lado meio,
    and wandering mist.                               onde o triângulo é quadrado
                                                  e o torto parece direito.
    What is it                                         Quem dera um ângulo reto.
that I missed?                                    Já começo a ficar cheio
                                                       de não saber quando eu falto,
                                                  de ser, mim, indireto sujeito.




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PAREÇA   E DESAPAREÇA




     para que Ieda me leia                                  Parece que foi ontem.
 precisa papel de seda                                  Tudo parecia alguma coisa.
     precisa pedra e areia                                  O dia parecia noite.
 para que leia me Ieda                                  E o vinho parecia rosas.
                                                        .   Até parece mentira,
     precisa lenda e certeza                            tudo parecia algu:ma     coisa.
 precisa ser e sereia                                       O tempo parecia     pouco,
      para que apenas       me veja                     e a gente se parecia    muito.
                                                            A dor, sobretudo,
     pena que seja Ieda                                 parecia prazer.
 quem quer você que me leia                                 Parecer era tudo
                                                        que as coisas sabiam     fazer.
                                                            O próximo, eu mesmo.          .

                                                        Tão fácil ser semelhante,
                                                            quando eu tinha um espelho
                                                        pra me servir de exemplo.
                                                            Mas vice versa e vide a. vida.
                                                        Nada se parece com nada.
                                                            A fita não coincide
                                                        Com a tragédia encenada.
                                                            Parece que foi ontem.
                                                        O resto, as próprias coisas contem.


Esse poema já f01 mus1cado duas vezes. Uma por Moraes
Moreira, outra por Itamar Assumpção. Que tal você?
62                                                                                            63
AIS OU MENOS




,
AIS OU MENOS



                          (oração pela descrença)


     Senhor,
.peço poderes sobre o sono,
     esse sol em que me ponho
 a sofrer meus ais ou menos,
     sombra, quem sabe, dentro de um sonho.
     Quero forças para o salto
 do abismo onde me encontro
     ao hiato onde me falto.
     Por dentro de mim, a pedra,
 e, aos pés da pedra,
     essa sombra, pedra que se esfalfa.
     Pedra, letra, estrela à solta,
 sim, quero, viver sem fé,
     levar a vida que falta
 sem nunca saber quem é.




                                                67
VOLÁTEIS                                 ~   COMO PODE?




    Anos andando no mato,                       Soa estranho, esta manhã,
nunca vi um passarinho morto,               tudo o que sempre foi meu, como pode?
    como vi um passarinho nato.                 Como pode que esse som lá fora,
                                            os sons da vida, a voz de todo dia,
    Onde acabam esses vôos?                     pareça ficção científica?
Dissolvem-se no ar, na brisa, no ato?
    São solúveis em água ou em vinho?           Como pode que ,esta palavra,
                                            que já vi mil vezes e mil_vezes disse,
     Quem sabe, uma doença dos olhos.   .       não signifique mais nada,
Ou serão   eternos   os passarinh"os?       a não ser que o dia, a noite, a madrugada,
                                                a não ser que tudo. não é nada disso?

                                                Pode que eu    já não seja mais o mesmo.
                                            Pode a luz, pode    ser, pode céu e pode quanto.
                                                Pode tudo o    que puder poder.
                                            Só não pode ser    tanto.




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ROSA RILKE    RAIMUNDO      CORREIA




    Marginal é quem escreve à margem,       Uma pálpebra,
deixando branca a página                mais uma, mais outras,
    para que a paisagem passe               enfim, dezenas
e deixe tudo claro à sua passagem.      de pálpebras sobre pálpebras
                                            tentando fazer
    Marginal, escrever na entrelinha,   das minhas trevas
sem nunca saber direito                     alguma coisa a mais
    quem veio primeiro,                 que lágrimas
o ovo ou a galin;b.a.




70                                                                               71
TRÊS METADES




               Meio dia,                 impuro. espírito
            um dia e me~o,           raro respiro
        meio dia, meio noite,            o ar que aqui tenta
         metade deste poema          arquiteto
        não sai na fotografia,
                                         um yago vôo
        metade, metade foi-se.
                                                    vampiro
     Mas eis que a terça metade,
       aquela que é menos dose
        de matemática verdade
      do que soco, tiro, ou coice,
         vai e vem como coisa
     de ou, de nem, ou de quase.

        Como se a gente tivesse
     metades que não combinam,
     três partes, destempestades,
        três vezes ou vezes três,
       como se quase, existindo,
         só nos faltasse o talvaz.




72                                                             73
o ATRASO PONTUAL




     ai daqueles                             Ontens e hojes, amores e ódio,
que se amaram sem nenhuma     briga      adianta consultar o relógio?
    aqueles que deixaram                      Nada poderia ter sido feito,
que a mágoa nova                         a não ser no tempo em que foi lógico.
   virasse a chaga antiga                     Ninguém nunca chegou atrasado.
                                         Bênçãos e desgraças
    ai. daqueles que se amaram               vêm sempre no horário.
sem saber que amar é pão feito em casa   Tudo o mais é plágio.
    e que a pedra só não voa                  Acaso é este encontro
porque não quer                          entre o tempo e o espaço
    não porque não.  tem asa                  mais do que um sonho que eu conto
                                         ou mais um poema que eu faço?




74
SEGUNDO CONSTA




    Nem tudo envelhece.              O mundo acabando,
O brilho púrpura,                pOdem ficar tranqüilos.
    sob a água pura,                 Acaba voltando
ah, se eu pudesse.               tudo aquilo.

    Nem tudo,                        Reconstruam tudo
sentir fica.                     segundo a planta do~ meus versos.
    Fica como fica a magnólia,       Vento, eu disse como.
magnífica.                       Nuvem, eu disse quando.
                                     Sol, casa, rua,
                                 reinos, ruínas, anos,
                                     disse como éramos.

                                    Amor, eu disse como.
                                 E como era mesmo?




76
                                                                     77
ASAS E AZARES




   peguei as oinoo estrelas          Voar oom asa ferida?
do oéu uma a uma                 Abram alas quando eu falo.
    elas estrelas não vieram    Que mais foi que fiz na vida?
mas na minha mão           .
                               Fiz, pequeno, quando o tempo
    todas elas                     estava ~odo do meu lado
ainda me perfuma                  e o que se ohama passado,
                                     passatempo, pesadelo,
                                   só me existia nos livros.
                                   Fiz, depois, donQ de mim,
                                   quando tive que esoolher
                                 entre um abismo, o oomeço,
                                    e essa história sem fim.
                                         Asa ferida, asa
                                              ferida,
                                    meu espaço, meu herói.
                               A asa arde . Voar, isso não dói.




78                                                                79
RAZÃO DE SER
                                     DESAP ARECENÇA




    Escrevo. E pronto.                 Nada com nada se assemelha.
Escrevo porque preciso,           Qual seria a diferença
    preciso porque estou tonto.        entre o fogo do meu sangue
Ninguém tem nada com isso.        e esta rosa vermelha?
    Escrevo porque amanhece,           Cada coisa com seu peso,
e as estrelas lá no céu           cada quilômetro, seu quilo.
    lembram letras no papel,           De que é que adianta dizê-Ia,
quando o poema me anoitece.       isto, sim, é como aquilo?
    A aranha tece teias.               Tudo o mais que acontece,
O peixe beija e morde o que vê.   nunca antes sucedeu.
    Eu escrevo apenas.                 E mesmo que sucedesse,
Tem que ter por quê?              acontece que esqueceu.
                                       Coisas não são. parecidas,
                                  nenhum paralelo possível.
                                       Estamos todos sozinhos.
                                  Eu estou, tu estás, eu estive.




80                                                                     81
DIVERSONAGENS SUSPERSAS




    Parece coisa da pedra,        Meu verso, temo, vem do berço.
alguma pedra preciosa,        Não versejo porque eu quero,
    vidro capaz de treva,         versejo quando converso
névoa capaz de prosa.         e converso por conversar.
     Pela pele, .é lírio,         Pra que sirvo senão pra isto,
aquela pura delícia.          pra ser vinte e pra ser visto,
    Mas, por ela, a vida,         pra ser versa e pra ser vice,
a mancha horrível, desliza.   pra ser a'super-superfície
                                  onde o verbo vem ser mais?

                                  Não sirvo pra observar.
                              Verso, persevero e conservo
                                  um susto de quem se perde
                              no exato lugar onde está.

                                  Onde estará meu verso?
                              Em algum lugar de um lugar,
                                  onde o avesso do inverso
                              começa a ver e ficar.
                                  Por mais prosas que eu perverta,
                              não permita Deus que eu perca
                                  meu jeito de versej~r.




82
                                                                     83
NARÁJOW                           PERGUNTE         AO PÓ




       Uma mosca pouse no mapa           cresce a viaa
e    me pouse em Narájow,            cresce o tempo
       a aldeia donde veio               cresce tudo
o    pai do meu pai,      ;,
                                     e vira sempre
       o que veio fazer a América,      esse momento
o    que vai fazer o contrário,
       a Polônia na memória,             cresce o ponto
o    Atlântico na frente,            bem no meio
       o Vístula na veia.                do amor seu centro
                                     assim como
    Que sabe a mosca da ferida           o que a gente sente
que a distância faz na carne viva,   e não diz
    quando um navio sai do porto         cresce dentro
jogando a última partida?

   Onde andou esse mapa
que só agora estende a palma
   para receber essa mosca,
que nele cai, matemática?




84                                                               86
V, DE VIAGEM                     LER PELO NÃO




     Viajar me deixa                   Ler pelo não, quem deral
 a alma rasa,      .           .   Em cada ausência, sentir o cheiro forte
     perto de tudo,                    do corpo que. se foi,
 longe de casa.                    a coisa que se espera.
                                       Ler pelo não, além da letra,
     Em casa, estava a vida,       ver, em cada rima vera, a prima pedra,
 aquela que, na viagem,                onde a forma perdida
     viajava, bela                 procura seus etcéteras.
 e adormecida.                         Desler, tresler, contraler,
                                   enlear-se nos ritmos da matéria,
     A vida viajava                    no fora, ver o dentro e, no dentro, o fora,
mas não viajava eu,                navegar em direção às Índias
     que toda viagem                   e descobrir a América.
 .
é feita só de partida.




86
                                                                                 87



      --   -----
ÚLTIMO AVISO




     Adeus, coisas que nunca tive,                caso alguma coisa me acontecer,
dívidas externas, vaidades terrenas,         informem a família,
     lupas de detetive, adeus.                    foi assim, assim tinha que ser
Adeus, plenitudes     inesperadas,
     sustos, ímpetos e espetáculos, adeus.       tinha que ser dor e dor
Adeus, que lá se vão meus ais.               esse processo de crescer
     Um dia, quem sabe, sejam seus,
como um dia foram dos meus pais.                 tinha que vir dobrado
     Adeus, mamãe, adeus, papai, adeus,      esse medo de não ser
adeus, meus filhos, quem sabe um dia
     todos os filhos serão meus.                 tinha que ser mistério
Adeus, mundo cruel, fábula de papel,         esse meu modo de desaparecer
     sopro de vento, torre de babeI,
adeus, coisas ao léu, adeus.                     um poema, por exemplo,
                                             caso alguma coisa me suceder,
                                                 vá que seja um indício

                                             quem sabe ainda não acabei de escrever




88                                                                                    89
DESPROPÓSITO GERAL                M, DE MEMÓRIA
                                t




      Esse estranho hábito,             Os livros sabem de cor
escrever obras-primas,              milhares de poemas.
      não me veio rápido.               Que memórial
Custou-me rimas.                    Lembrar, assim, vale a pena.
     Umas, paguei caro,                 Vale a pena o desperdício,
liras, vidas, preços máximos.       Ul1sses voltou de Tróia,
     Umas, foi fácil.                   assim como Dante disse,
Outras, nem falo.                   o céu não vale uma história.
     Me lembro duma                     Um dia, o diabo veio
que" desfiz a socos.                seduzir um doutor Fausto.
     Duas, em suma.                     Byron era verdadeiro.
Bati mais um pouco.                 Fernando, pessoa, era falso.
     Esse estranho abuso,               Mallarmé era tão pálido,
adquiri, faz séculos.               mais parecia uma página.
     Aos outros, as músicas.            Rimbaud se mandou pra África,
Eu, senhor, sou todo ecos.          Hemingway de miragens.
                                        Os livros sabem de tudo.
                                    Já sabem deste dilema.
                                        Só não sabem que, no fundo,
                                    ler não passa de uma lenda.




90                                                                      91
ATÉ MAIS                           INCENSO    FOSSE MÚSICA




            Até tu, matéria bruta,                   isso de querer
     até tu, madeira, massa e músculo,           ser exatamente    aquilo
            vodka, fígado e soluço,                  que a gente é
    luz de vela, papel, carvão e nuvem,          ainda vai
  pedra, carne de abacate, água de chuva,             nos levar além
      unha, montanha,    ferro em brasa,
          até vocês sentem saudade,
        queimadura   de primeiro grau,
         vontade de voltar pra casa?

      Argila, esponja, mármore, borracha,
cimento, aço, vidro, vapor, pano e cartilagem,
   tinta, cinza, casca de ovo, grão de areia,
primeiro dia de outono, a palavra primavera,
  número cinco, o tapa na cara, a rima rica,
  a vida nova, a idade média, a força velha,
           até tu, minha cara matéria,
lembra quando a gente era apenas uma idéia?




                                                                              93
92
,


     gardênias e hortênsias                À glória sucede
 não façam nada                        o que sucede à água:
     que me lembre                         por mais água que beba,
 que a este mundo eu pertença      .   qual lhe sacia a sede?
                                            Diverso o   sucesso,
    deixem-me pensar                   basta-lhe. um    verso
que tudo não passa                          para essa   desgraça
   de uma terrível coincidên,cia       que se chama      dar certo.




94
                                                                      95
OBJETO   SUJEITO                   POESIA: 1970



                                     ~I
        você nunca vai saber                  Tudo o que eu faço
      quanto custa uma saudade            alguém em mim que eu desprezo
        o peso agudo no peito                 sempre acha o máximo.
       de carregar uma cidade
          pelo lado de dentro                Mal rabisco,
       como fazer de um verso             não dá mais pra mudar   nada.
           um objeto sujeito                  Já é um clássico.
       como passar do presente
       para o pretérito perfeito
         nunca saber direito

         você nunca vai saber
      o que vem depois de sábado
         quem sabe um século
     muito mais lindo e mais sábio
           quem sabe apenas
           mais um domingo

          você nunca vai saber
            e isso é sabedoria
         nada que valha a pena
       a passagem pra pasárgada
          xanadu ou shangrilá
           quem sabe a chave
               de um poema
                 e olha lá
96                                                                        97
é.-
  KAWA CAUIM
desarranj os florais




                             99


                                  ,'
KAWA




o ideograma de kawa, "rio", em japonês, pictograma de um
fluxo de água corrente, sempre me pareceu representar (na
vertical) o esquema do haikai, o sangue dos três versos
escorrendo na parede da página...
                                   litx
                                   ,..,
                                            ~
                                           ('           101
-   HAI




    Eis que nasce completo
e, ao morrer, morre germe,
    o desejo, analfabeto,
de saber como reger-me,-
    ah, saber como me ajeito
para que eu seja quem fui,
    eis o que nasce perfeito
e, ao crescer , diminui.




                               10~
-- KAI




    Mínimo templo
para um deus pequeno,
    aqui vos guarda,
em vez da dor que peno,
    meu extremo anjo de vanguarda.

    De que máscara
se gaba sua lástima,
    de que vaga
se vangloria sua história,
                                     DESARRANJOS FLORAIS
    saiba quem saiba.

    A mim me basta
a sombra que se deixa,
    o corpo que se afasta.                                 ,
                                                           'n




104
amei em cheio
meio amei-o
    meio não amei-o




                      107
pelos caminhos que ando      meiodia       três cores
um dia vai ser               eu disse vento
   só não sei quando             e caíram todas as flores




108                                                         109
I




    abrindo um antigo caderno             o mar o azul o sábado
foi que eu descobri                   liguei pro céu
    antigamente   eu era eterno           mas dava sempre ocupado




110                                                                 111
~I




      enfim,
                          viu-me,
nu,
                      e passou,
      como vim
                          como um filme




112
11




      era uma vez                noite sem sono
                              o cachorro late
o sol nascente                    um sonho sem dono
    me fecha os olhos
até eu virar   japonês




114                                                   11"
rio do mistério                 choveu
que seria de mim                na carta que você mandou
    se me levassem   a sério?
                                   quem mandou?




116                                                        117
praias      praias      sinais                entre os garotos de bicicleta
um olhar tão longe                           o primeiro vagal ume
   esse olhar ninguém   olha                     de mil novecentos e oitenta     e sete
                               jamais




                                        [.




118                                                                                       119
sombras            primeiro frio do ano
derrubam           fui feliz
    sombras            se não me engano
quando atreva
     está madura

    sombras
o vento leva
    sombra
nenhuma
          dura




120                                           121
retrato de lado       na torre da igreja
retrato de frente      o passarinho pausa
     de mim me faça        pousa assim feito pousasse
ficar diferente        o efeito na causa




122                                                     123
entre                        ano novo
a água                       anos buscando
    e o chá                      um ânimo novo
desab
    rocha
o maracujá




124
                                                 125

                        1
                        'I


              --   --
alvorada                temporal
alvoroço
    troco minha   alma   fazia tempo
por um almoço                 que eu não me sentia
                         tão sentimental




126                                                  127
cortinas de seda         1ua à vista
o vento entra           brilhavas assim
    sem pedir licença        sobre auschwitz?




128                                             129
hoje à noite        tudo dito,
lua alta            nada feito,
    faltei              fito e deito
e ninguem sentiu
    a minha falta




130                                    131
tudo claro        +
    tarde de vento
até as árvores               ainda não era o dia
    querem vir para dentro       era apenas o raio




132                                                    133
Sobre   o AutQ.r


       Paulo Leminski Filho, nascido em Curitiba, Paraná, em 1944. (24 de
agosto, Virgo). Mestiço de polaca com negro, sempre t1veu no Paraná (in-
fância no interior de Santa. Catarina).
       Publicou: Catatau (prosa experimental), em 1976, Curitiba, ed. do au-
tor. Não Fosse Isso e Era Menos / Não Fosse Tanto e Era Quase e Polonaise
(poemas, 1980, Curitiba, ed. do autor). Publicou poemas, com fotos de Ja-
que Pires, no álbum Quarenta Cl1ques, Curitiba, 1979, ed. Etcetera.
       Ex-professor de História e Redação em cursos pré-vestibulares, foi
diretor de criaçãoe redator de publicidade, colaborou no "Folhetim" da Folha
de S. Paulo, resenhou livros de poesia na Veja.
       Poemas e textos publicados em inúmeros órgãos (CorpoEstranho, Mu-
da, Código, Raposa, ete.) de Curitiba, São Paulo, Rio e Ba.h1a.
       Teve seus primeiros poemas publicados na revista Invenção, em 1964,
então, porta-voz da poesia concreta paulista.
       Faixa-preta e professor de judô, viveu em Curitiba com a poeta Alice
Ruiz, com a qual teve duas filhas.
       Foram publicados pela Bras1l1ense: Cruz é Souza (Enca.nto Radical),
1985; Caprichos e Relaxos (Cantadas Literárias), 1985; Matsuó Bashõ (En-
canto Radic81), 1985; Jesus a.C. (Encanto Radical), 1984; Agora é que são
elas (Circo de Letras), 1984; Leon Trotsltl- A paixão segundo a revolução,
1986; todos de sua autoria. Além das traduções de Folhas das folhas da rel-
va, de Wh1tman, 1985; Supermacho, de Alfred Jarry, 1988; Satyricom, de
Petrônio, 1988; Sol e Aço, de Mishima, 1988 e Ma.loneMorre, de Samuel Bec-
kett, 1986. Pela Criar Edições, o livro Anseios Crípticos, 1986 e pela Scipio-
ne, Guerra dentro da gente (infanto-juvenil), além de muitos textos disper-
sos.
       Paulo Leminski morreu no dia 7 de junho de 1989.

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Distraídos Venceremos - Paulo Leminsni

  • 1. PAULO LEMINSKI DISTRAÍDOS VENCEREMOS 2!' edição editorabrasiliense
  • 2. TRANSMATÉRIA CONTRASENSO Nas unidades de Distraídos Venoeremos (1983-1987), resultado do impacto da poesia de Capriohos e Relaxas (1983) sobre a fina e grossa cútis da minha sensibilidade lírica, oalmes bloos ioi-bas oh us d 'un désastre obsour, cadeias de Markoff em direção a I' uma frase absoluta, arrisco crer ter atingido um horizonte longamente almejado: a abolição (não da realidade, evidentemente) da referência, através da rarefação. Seria demais, certamente, supor que eu não precise mais da realidade. Seria de menos, todavia, suspeitar sequer que a realidade, essa velha senhora, possa ser a verdadeira mãe destes dizeres tão calares. É qu~ndo a vida vase. É quando como quase.' Ou não, quem sabe. Curitiba. janeiro de 1987
  • 3. 1NDICE, ÍCONE E SÍMBOLO Distraídos venceremos 13 Ais ou menos 65 Kawa cauim 99 9
  • 4. r AVISO AOS NÁUFRAGOS Esta página, por exemplo, .. não nasceu para ser lida. ,Nasceu para ser pálida, Ufi mero plágio da Ilíada, alguma coisa que cala, folha que volta pro galho, muito depois de caída. Nasceu para ser praia, <1 uem sabe Andrômeda, Antártida, Himalaia, sílaba sentida, nasceu para ser última a que' não nasceu ainda. Palavras traz idas de longe pulas águas do Nilo, um dia, esta página, papiro, V'0'1ter que ser traduzida, para o símbolo, para o sânscrito, para todos os dialetos da Índia, vai ter que dizer bom-dia' .tO que só se diz ao pé do ouvido, vai ter que ser a brusca pedra onde alguém deixou cair o vidro. Não é assim que é a vida? 15
  • 5. A LEI DO QUÃO MINIFESTO Deve ocorrer em breve ave a raiva desta noite uma brisa que leve &I.. baita lasca fúria abrupta um jeito de chuva louca besta vaca solta à última branca de neve. ..uiva luz que contra o dia tanto e tarde madrugastes Até lá, observe-se a mais estrita disciplina. morra a calma desta tarde A sombra máxima morra em ouro pode vir da luz mínima. enfim, mais seda . l morte, essa fraude, quando próspera viva e morra sobretudo oete dia, metal vil, surdo, cego e mudo, nele tudo foi e, se ser foi tudo, já nem tudo nem sei ne vai saber a primavera ou se um dia saberei que nem eu saber nem ser nem era 16 17
  • 6. ADMINIMISTÉRIO Vim pelo caminho difícil, QUàndo o mistério chegar, a linha que nunca termina, já vai me encontrar dormindo, a linha bate na pedra, metade dando pro sábado, a palavra quebra uma esquina, outra metade, domingo. mínima linha vazia, Não haja som nem silêncio, a linha, uma vida inteira, quando o mistério aumentar. palavra, palavra minha. Silêncio é coisa sem senso, não cesso de observar. Mistério, algo que, penso, mais tempo, menos lugar. Quando o mistério voltar, meu sono esteja tão solto, nem haja susto no mundo que possa me sustentar. Meia-noite, livro aberto. Mariposas e mosquitos pousam no texto incerto. Seria o branco da folha, luz que parece objeto? Quem sabe o cheiro do preto, que cai ali como um resto? Ou seria que os insetos descobriram parentesco com as letras do alfabeto? 18 19
  • 7. DISTÂNCIAS MÍNIMAS SAUDOSA AMNÉSIA a um amigo que perdeu a memória um texto morcego Memória é coisa recente; se guia por ecos Até ontem, quem lembrava? um texto texto cego A coisa veio antes, um eco anti anti anti antigo ou, antes, foi a palavra? um grito na parede rede rede Ao perder a lembrança, volta verde verde verde grande coisa não se perde; com mim com com consigo Nuvens, são sempre brancas. ouvir é ver se se se se se O mar? Continua verde. ou se se me lhe te sigo? 20 21
  • 8. ICEBERG POR UM LINDÉSIMO DE SEGUNDO Uma poesia ártica, tudo em mim claro, é isso que desejo. anda a mil Uma prática pálida, tudo assim três versos de gelo. tudo por um fio Uma frase-superfície tudo feito onde vida-frase alguma tudo estivesse. no cio não seja mais possível. tudo pisando macio Frase, não. Nenhuma. tudo psiu Uma lira nula, reduzida ao puro. mínimo, tudo em minha volta um piscar do espírito, anda às tontas a única coisa única. como se as coisas Mas falo. E, ao falar, provoco fossem todas nuvens de equívocos afinal de contas (ou enxame de monólogos?). Sim, inverno, estamos vivos. 22 23
  • 9. PASSE A EXPRESSÃO Transar bem todas as ondas Esses tais artefatos a Papai do Céu pertence, que diriam minha angústia, fazer as luas redondas tem umas que vêm fácil, ou me nascer paranaense. tem muitas que me custa. A nós, gent~, só foi dada Tem horas que é caco de vidro, essa maldita capacidade, meses qua é feito um grito, transformar amor em nada. tem horas que eu nem duvido, tem dias que eu acredito. Então seremos todos gênios quando as privadas do mundo vomitarem de volta todos os papéis higiê:q.icos. 24 26
  • 10. o MÍNIMO DO MÁXIMO ,'-SIGNO ASCENDENTE "-., Tempo lento, Nem todo espelho espaço rápido, reflita este hieroglifo. quanto mais pensá, Nem todo olho menos capto. decifre esse ideograma. Se não pego isso Se tudo existe que me passa no íntimo, para acabar num livro, importa muito? se tudo enigma Rapto o ritmo. a alma de quem ama! Espaçotempo ávido, lento espaçodentro, quando me aproximá, simplesmente me desfaço, apenas o mínimo em matéria de máximo. 26 27
  • 11. ~ 91 ALÉM ALMA + PLENA PAUSA (UMA GRAMA DEPOIS) Meu coração lá de longe Lugar onde se faz faz sinal que quer voltar. o que já foi feito, Já no peito trago em bronze: branco da página, NÃO TEM VAGA NEM LUGAR. soma de todos os textos, I Pra que me serve um negócio foi-se o tempo que não cessa de bater? . quando, escrevendo, Mais me parece um relógio era preciso que acaba de enlouquecer. uma folha isenta. Pra que é que eu quero quem chora, se estou tão bem assim, Nenhuma página e o vazio que vai lá fora jamais foi limpa. cai macio dentro de mim? Mesmo a mais Saara, I ártica, significa. Nunca houve isso, uma página em branco. 1 No fundo, todas grita!m, pálidas de tanto. I 28 29
  • 12. MERD:A E OURO O PAR QUE ME PARECE Merdaé veneno. Pesa dentro de mim No entanto, não há nada o idioma que nã.o fiz, que seja mais bonito aquela língua sem. fim que uma bela cagada. feita de ais e de aquis. Cagam ricos, cagam padres, Era uma língua bonita, cagam reis e cagam fadas. música, mais que palavra, Não há merda que se compare alguma coisa de hitita, à bosta da pessoa amada. praia do mar de Java. Um idioma perfeito, quase não tinha objeto. Pronomes do caso reto, nunca acabavam sujeitos. Tu40 era seu múltiplo, verbo, triplo, prolixo. Gritos eram os únicos. O resto, ia pro lixo. Dois leos em cada pardo, dois saltos em cada pulo, eu que só via a metade, silêncio, está tudo duplo. 30 31
  • 13. ARTE DO CHÁ t PROEMA ainda ontem Não há verso, convidei um amigo tudo é prosa, para ficar em silêncio passos de luz co:rnigo num espelho, verso, ilusão ele veio de ótica, meio a esmo verde, praticamente não disse nada o sinal vermelho. e ficou por isso mesmo Coisa feita de brisa, de mágoa e de calmaria, dentro de um tal poema, qual poesia pousaria? 32 33
  • 14. DESENCONTRÁRIOS Eu, hoje, aoordei mais oedo Mandei a palavra rimar, e, azul, tive uma idéia olara. ela não me obedeoeu. Só existe um segredo. Falou em mar, em oéu, em rosa, Tudo está na oara. em grego, emsilênoio, em prosa. Pareoia fora de si, a sílaba silenoiosa. Mandei a frase sonhar, e ela se foi num labirinto. Fazer poesia, eu sinto, apenas isso. Dar ordens a um exéroito, para oonquistar um império extinto. 34 35
  • 15. 1 o QUE ,QUER DIZER UM METRO DE GRITO (MÁQUINAS LÍQUIDAS) lIara Haroldo de Campos, translator maximus O que quer dizer, diz. Leiam-se índices, Não fica fazendo mil olhos de lince, o que, um dia, eu sempre fiz. entre meus filmes, Não fica só querendo, querendo, leonardos da vinci. coisa que eu nunca quis. Abri-vos, arcas, arquivos, O que quer dizer, diz. súmulas de equívocos, Só se dizendo num outro fechados, o que, um dia, se disse, para que servem os livros? um dia, vai ser feliz. Livros de vidro, discos, issos, aquilos, coisas que eu vendo a metro, eles me compram aos quilos. Líquidas lâminas, linhas paralelas, quanto me dão por minhas idéias? 36 37
  • 16. CLARO CALAR SOBRE UMA CIDADE SEM RUÍNAS (R UINOGRAMAS) sorte no jogo Em Brasília, admirei. azar no amor Não a niemeyer lei, de que me serve a vida das pessoas sorte no amor penetrando nos esquemas se o amor é um jogo como a tinta sangue e o jogo não é meu forte, no mata borrão, meu amor? crescendo o vermelho gente, entre pedra e pedra, pela terra a dentro. Em Brasília, admirei. O pequeno restaurante clandestino, criminoso por estar fora da quadra permitida. Sim, Brasília. Admirei o tempo que já cobre de anos tuas impecáveis matemáticas. Adeus, Cidade. O erro, claro, não a lei. Muito me. admirastes, muito te admirei. 38 39
  • 17. NOMES A MENOS Nome mais nome igual a nome, Carrego o peso da lua, uns nomes menos; uns nomes mais. Três paixões mal curadas, Menos é mais ou menos, Um saara de páginas, nem todos os nomes são iguais. Essa infinita. madrugada. Viver de noite Uma coisa é a coisa, PaI.' ou ímpar, outra coisa é o nome, par e par, Me fez senhor do fogo. retrato da coisa quando límpida, A vocês, eu deixo o sono. coisa que as coisas deixam ao passar. O sonho, não. Esse, eu mesmo carrego. Nome de bicho, nome de mês, nome de estrela, nome dos meus amores, nomes animais, a soma de todos os nomes, nunca vai dar uma coisa, nunca mais. Cidades passam. Só os nomes vão ficar. Que coisa dói dentro do nome que não tem nome que conte nem coisa pra se contar? 41 40
  • 18. VOLTA EM ABERTO O NÁUFRAGO NÁUGRAFO Ambígua volta a letra A a em torno da ambígua ida, funda no A quantas ambigüidades tlântioo se pode oometer na vida? e paoífioo oom Quem parte leva um jeito templo a luta de quem traz a alma torta. entre a rápida letra Quem bate mais .na porta? e o ooeano Quem parte ou quem torna? lento assim fundo e me afundo de todos os náufragos ná ugrafo o náufrago mais profundo 42 43
  • 19. BEM NO FUNDO SEM BUDISMO no fundo,. no fundo, Poema que é bom bem lá no fundo, a.oaba zero a zero. a gente gostaria Acaba com. de ver nossos problemas Não como eu quero. resolvidos por decreto Começa sem. Com, digamos, certo verso, a partir desta data, veneno de letra, aquela mágoa sem remédio bolero. Ou menos. é considerada nula Tira daqui, bota dali, e sobre ela - silêncio perpétuo um lugar, não caminho. Prossegue de si. extinto por lei todo o remorso, Heguro morreu de velho, maldito seja quem olhar pra trás, e sozinho. lá pra trás não há nada, e nada mais mas problemas não se resolvem, problemas têm família grande, e aos domingos saem todos passear o problema, sua senhora e outros pequenos probleminhas 44 45
  • 20. J o HÓSPEDE DESPERCEBIDO o amor, esse sufoco, Deixei alguém nesta sala agora há pouco era muito, . que muito se distinguia agora, apenas um sopro de alguém que ninguém se chamava, quando eu desaparecia. ah, troço de louco, Comigo se assemelhava, corações trocando rosas, mas só na superfície. e socos Bem lá no fundo, eu, palavra, não passava de um pastiche. Uns restos, uns traços, um dia, meus tios, minhas mães e meus pais me chamarem de volta pra dentro, nu ainda não volte jamais. Mas ali, logo ali, nesse espaço, In.Ae vai, exemplo de mim, algo, alguém, mil pedaços, "lUla início, meio a meio, sem fim. 46 47
  • 21. AÇO EM FLOR A LUA NO CINEMA para Xoji Sakaguchi, portal amigo entre o Japão 'eo Brasü A lua foi ao cinema, Quem nunca viu passava :um filme engraçado, que a flor, a faca e a fera a história de uma estrela tanto fez como tanto faz, que não tinha namorado. e a forte flor que a faca faz na fraca carne, Não tinha porque.era apenas um pouco menos, um pouco mais, uma estrela bem pequena, quem nunca viu dessas que, quando apagam, a ternura que vai ninguém vai dizer, que penal no fio da lâmina samurai, esse, nunca vai ser capaz. Era uma estrela sozinha, ninguém olhava pra ela, e toda a luz que ela tinha cabia numa janela. A lua ficou tão triste com aquela história de amor, que até hoje a lua insiste: - Amanheça, por favor I 48 49
  • 22. l ANCH'IO SON PITTORE fra angélico podem ficar com a realidade quando pintava esse baixo astral uma madona cal bambino em que tudo entra pelo cano se ajoelhava e rezava como se fosse um menino eu quero viver de verdade eu fico com o cinema americano orava diante da obra como se fosse pecado pintar aquela senhora sem estar ajoelhado orava como se a obra fosse de deus não do homem 60 51
  • 23. LITOGRA VURA .RIMAS DA MODA l Mão de estátua. 1930 1960 1980 Templo. Coluna. Arco de triunfo. amor homem ama Mil duzentos e cinqüenta. dor come cama Qualquer pedra na Europa fome é suspeita de ser mais do que aparenta. Felizes as pedras da minha terra que nunca foram senão pedras. Pedras, a lua esfria e o sol esquenta. 62 63
  • 24. 300.000 KMS POR SEGUNDO eu ontem tive a impressão De que música gostam que deus quis falar comigo os pernilongos? não lhe dei ouvidos De Schubert., de Wagner, de Debussy? quem sou eu para falar com deus? Não gostam de nada, ele que cuide dos seus assuntos a julgar por este aqui. eu cuido dos meus Apenas um solo de silêncio, tsso sim, eu ouvi. 64 66
  • 25. PARADA CARDÍACA Essa minha secura essa falta de sentimento como se eu fosse Júlio plaza não tem ninguém que segure vem de dentro prazer da pura percepção Vem da. zona escura .-0S sentidos donde vem o que sinto sejam a crítica sinto muito da razão sentir é muito lento 66 67
  • 26. SORTES E CORTES IMPRECISA PREMISSA (quantas curitibas cabem numa s6 Curitiba?) a linha clara a tesoura traça na folha branca Cidades pequenas, como dói esse silêncio, separa a folha a folha da forma a -forma cantilenas, ladainhas, tudo aquilo que nem penso, um diabo habita o branco do olho da página esse excesso que me faz ver todo o senso, claro oculto entre as claridades ~mprecisa premissa, definitiva preguiça o vazio passa e deixa uma saudade com que sobe, indeciso, o mais ou menos do incenso. Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, tende piedade de nós. 68 69
  • 27. HARD FEELINGS . SUJEITO INDIRETO (a riddle for Manha) Oceans, Quem dera eu achasse um jeito emotions, de fazer tudo perfeito, ships, ships, feito a coisa fosse o projeto and other relationships, e tudo já nascesse satisfeito. keep us going Quem dera eu visse o outro lado, through thefog o lado de lá, lado meio, and wandering mist. onde o triângulo é quadrado e o torto parece direito. What is it Quem dera um ângulo reto. that I missed? Já começo a ficar cheio de não saber quando eu falto, de ser, mim, indireto sujeito. 60 61
  • 28. PAREÇA E DESAPAREÇA para que Ieda me leia Parece que foi ontem. precisa papel de seda Tudo parecia alguma coisa. precisa pedra e areia O dia parecia noite. para que leia me Ieda E o vinho parecia rosas. . Até parece mentira, precisa lenda e certeza tudo parecia algu:ma coisa. precisa ser e sereia O tempo parecia pouco, para que apenas me veja e a gente se parecia muito. A dor, sobretudo, pena que seja Ieda parecia prazer. quem quer você que me leia Parecer era tudo que as coisas sabiam fazer. O próximo, eu mesmo. . Tão fácil ser semelhante, quando eu tinha um espelho pra me servir de exemplo. Mas vice versa e vide a. vida. Nada se parece com nada. A fita não coincide Com a tragédia encenada. Parece que foi ontem. O resto, as próprias coisas contem. Esse poema já f01 mus1cado duas vezes. Uma por Moraes Moreira, outra por Itamar Assumpção. Que tal você? 62 63
  • 30. AIS OU MENOS (oração pela descrença) Senhor, .peço poderes sobre o sono, esse sol em que me ponho a sofrer meus ais ou menos, sombra, quem sabe, dentro de um sonho. Quero forças para o salto do abismo onde me encontro ao hiato onde me falto. Por dentro de mim, a pedra, e, aos pés da pedra, essa sombra, pedra que se esfalfa. Pedra, letra, estrela à solta, sim, quero, viver sem fé, levar a vida que falta sem nunca saber quem é. 67
  • 31. VOLÁTEIS ~ COMO PODE? Anos andando no mato, Soa estranho, esta manhã, nunca vi um passarinho morto, tudo o que sempre foi meu, como pode? como vi um passarinho nato. Como pode que esse som lá fora, os sons da vida, a voz de todo dia, Onde acabam esses vôos? pareça ficção científica? Dissolvem-se no ar, na brisa, no ato? São solúveis em água ou em vinho? Como pode que ,esta palavra, que já vi mil vezes e mil_vezes disse, Quem sabe, uma doença dos olhos. . não signifique mais nada, Ou serão eternos os passarinh"os? a não ser que o dia, a noite, a madrugada, a não ser que tudo. não é nada disso? Pode que eu já não seja mais o mesmo. Pode a luz, pode ser, pode céu e pode quanto. Pode tudo o que puder poder. Só não pode ser tanto. 68 69
  • 32. ROSA RILKE RAIMUNDO CORREIA Marginal é quem escreve à margem, Uma pálpebra, deixando branca a página mais uma, mais outras, para que a paisagem passe enfim, dezenas e deixe tudo claro à sua passagem. de pálpebras sobre pálpebras tentando fazer Marginal, escrever na entrelinha, das minhas trevas sem nunca saber direito alguma coisa a mais quem veio primeiro, que lágrimas o ovo ou a galin;b.a. 70 71
  • 33. TRÊS METADES Meio dia, impuro. espírito um dia e me~o, raro respiro meio dia, meio noite, o ar que aqui tenta metade deste poema arquiteto não sai na fotografia, um yago vôo metade, metade foi-se. vampiro Mas eis que a terça metade, aquela que é menos dose de matemática verdade do que soco, tiro, ou coice, vai e vem como coisa de ou, de nem, ou de quase. Como se a gente tivesse metades que não combinam, três partes, destempestades, três vezes ou vezes três, como se quase, existindo, só nos faltasse o talvaz. 72 73
  • 34. o ATRASO PONTUAL ai daqueles Ontens e hojes, amores e ódio, que se amaram sem nenhuma briga adianta consultar o relógio? aqueles que deixaram Nada poderia ter sido feito, que a mágoa nova a não ser no tempo em que foi lógico. virasse a chaga antiga Ninguém nunca chegou atrasado. Bênçãos e desgraças ai. daqueles que se amaram vêm sempre no horário. sem saber que amar é pão feito em casa Tudo o mais é plágio. e que a pedra só não voa Acaso é este encontro porque não quer entre o tempo e o espaço não porque não. tem asa mais do que um sonho que eu conto ou mais um poema que eu faço? 74
  • 35. SEGUNDO CONSTA Nem tudo envelhece. O mundo acabando, O brilho púrpura, pOdem ficar tranqüilos. sob a água pura, Acaba voltando ah, se eu pudesse. tudo aquilo. Nem tudo, Reconstruam tudo sentir fica. segundo a planta do~ meus versos. Fica como fica a magnólia, Vento, eu disse como. magnífica. Nuvem, eu disse quando. Sol, casa, rua, reinos, ruínas, anos, disse como éramos. Amor, eu disse como. E como era mesmo? 76 77
  • 36. ASAS E AZARES peguei as oinoo estrelas Voar oom asa ferida? do oéu uma a uma Abram alas quando eu falo. elas estrelas não vieram Que mais foi que fiz na vida? mas na minha mão . Fiz, pequeno, quando o tempo todas elas estava ~odo do meu lado ainda me perfuma e o que se ohama passado, passatempo, pesadelo, só me existia nos livros. Fiz, depois, donQ de mim, quando tive que esoolher entre um abismo, o oomeço, e essa história sem fim. Asa ferida, asa ferida, meu espaço, meu herói. A asa arde . Voar, isso não dói. 78 79
  • 37. RAZÃO DE SER DESAP ARECENÇA Escrevo. E pronto. Nada com nada se assemelha. Escrevo porque preciso, Qual seria a diferença preciso porque estou tonto. entre o fogo do meu sangue Ninguém tem nada com isso. e esta rosa vermelha? Escrevo porque amanhece, Cada coisa com seu peso, e as estrelas lá no céu cada quilômetro, seu quilo. lembram letras no papel, De que é que adianta dizê-Ia, quando o poema me anoitece. isto, sim, é como aquilo? A aranha tece teias. Tudo o mais que acontece, O peixe beija e morde o que vê. nunca antes sucedeu. Eu escrevo apenas. E mesmo que sucedesse, Tem que ter por quê? acontece que esqueceu. Coisas não são. parecidas, nenhum paralelo possível. Estamos todos sozinhos. Eu estou, tu estás, eu estive. 80 81
  • 38. DIVERSONAGENS SUSPERSAS Parece coisa da pedra, Meu verso, temo, vem do berço. alguma pedra preciosa, Não versejo porque eu quero, vidro capaz de treva, versejo quando converso névoa capaz de prosa. e converso por conversar. Pela pele, .é lírio, Pra que sirvo senão pra isto, aquela pura delícia. pra ser vinte e pra ser visto, Mas, por ela, a vida, pra ser versa e pra ser vice, a mancha horrível, desliza. pra ser a'super-superfície onde o verbo vem ser mais? Não sirvo pra observar. Verso, persevero e conservo um susto de quem se perde no exato lugar onde está. Onde estará meu verso? Em algum lugar de um lugar, onde o avesso do inverso começa a ver e ficar. Por mais prosas que eu perverta, não permita Deus que eu perca meu jeito de versej~r. 82 83
  • 39. NARÁJOW PERGUNTE AO PÓ Uma mosca pouse no mapa cresce a viaa e me pouse em Narájow, cresce o tempo a aldeia donde veio cresce tudo o pai do meu pai, ;, e vira sempre o que veio fazer a América, esse momento o que vai fazer o contrário, a Polônia na memória, cresce o ponto o Atlântico na frente, bem no meio o Vístula na veia. do amor seu centro assim como Que sabe a mosca da ferida o que a gente sente que a distância faz na carne viva, e não diz quando um navio sai do porto cresce dentro jogando a última partida? Onde andou esse mapa que só agora estende a palma para receber essa mosca, que nele cai, matemática? 84 86
  • 40. V, DE VIAGEM LER PELO NÃO Viajar me deixa Ler pelo não, quem deral a alma rasa, . . Em cada ausência, sentir o cheiro forte perto de tudo, do corpo que. se foi, longe de casa. a coisa que se espera. Ler pelo não, além da letra, Em casa, estava a vida, ver, em cada rima vera, a prima pedra, aquela que, na viagem, onde a forma perdida viajava, bela procura seus etcéteras. e adormecida. Desler, tresler, contraler, enlear-se nos ritmos da matéria, A vida viajava no fora, ver o dentro e, no dentro, o fora, mas não viajava eu, navegar em direção às Índias que toda viagem e descobrir a América. . é feita só de partida. 86 87 -- -----
  • 41. ÚLTIMO AVISO Adeus, coisas que nunca tive, caso alguma coisa me acontecer, dívidas externas, vaidades terrenas, informem a família, lupas de detetive, adeus. foi assim, assim tinha que ser Adeus, plenitudes inesperadas, sustos, ímpetos e espetáculos, adeus. tinha que ser dor e dor Adeus, que lá se vão meus ais. esse processo de crescer Um dia, quem sabe, sejam seus, como um dia foram dos meus pais. tinha que vir dobrado Adeus, mamãe, adeus, papai, adeus, esse medo de não ser adeus, meus filhos, quem sabe um dia todos os filhos serão meus. tinha que ser mistério Adeus, mundo cruel, fábula de papel, esse meu modo de desaparecer sopro de vento, torre de babeI, adeus, coisas ao léu, adeus. um poema, por exemplo, caso alguma coisa me suceder, vá que seja um indício quem sabe ainda não acabei de escrever 88 89
  • 42. DESPROPÓSITO GERAL M, DE MEMÓRIA t Esse estranho hábito, Os livros sabem de cor escrever obras-primas, milhares de poemas. não me veio rápido. Que memórial Custou-me rimas. Lembrar, assim, vale a pena. Umas, paguei caro, Vale a pena o desperdício, liras, vidas, preços máximos. Ul1sses voltou de Tróia, Umas, foi fácil. assim como Dante disse, Outras, nem falo. o céu não vale uma história. Me lembro duma Um dia, o diabo veio que" desfiz a socos. seduzir um doutor Fausto. Duas, em suma. Byron era verdadeiro. Bati mais um pouco. Fernando, pessoa, era falso. Esse estranho abuso, Mallarmé era tão pálido, adquiri, faz séculos. mais parecia uma página. Aos outros, as músicas. Rimbaud se mandou pra África, Eu, senhor, sou todo ecos. Hemingway de miragens. Os livros sabem de tudo. Já sabem deste dilema. Só não sabem que, no fundo, ler não passa de uma lenda. 90 91
  • 43. ATÉ MAIS INCENSO FOSSE MÚSICA Até tu, matéria bruta, isso de querer até tu, madeira, massa e músculo, ser exatamente aquilo vodka, fígado e soluço, que a gente é luz de vela, papel, carvão e nuvem, ainda vai pedra, carne de abacate, água de chuva, nos levar além unha, montanha, ferro em brasa, até vocês sentem saudade, queimadura de primeiro grau, vontade de voltar pra casa? Argila, esponja, mármore, borracha, cimento, aço, vidro, vapor, pano e cartilagem, tinta, cinza, casca de ovo, grão de areia, primeiro dia de outono, a palavra primavera, número cinco, o tapa na cara, a rima rica, a vida nova, a idade média, a força velha, até tu, minha cara matéria, lembra quando a gente era apenas uma idéia? 93 92
  • 44. , gardênias e hortênsias À glória sucede não façam nada o que sucede à água: que me lembre por mais água que beba, que a este mundo eu pertença . qual lhe sacia a sede? Diverso o sucesso, deixem-me pensar basta-lhe. um verso que tudo não passa para essa desgraça de uma terrível coincidên,cia que se chama dar certo. 94 95
  • 45. OBJETO SUJEITO POESIA: 1970 ~I você nunca vai saber Tudo o que eu faço quanto custa uma saudade alguém em mim que eu desprezo o peso agudo no peito sempre acha o máximo. de carregar uma cidade pelo lado de dentro Mal rabisco, como fazer de um verso não dá mais pra mudar nada. um objeto sujeito Já é um clássico. como passar do presente para o pretérito perfeito nunca saber direito você nunca vai saber o que vem depois de sábado quem sabe um século muito mais lindo e mais sábio quem sabe apenas mais um domingo você nunca vai saber e isso é sabedoria nada que valha a pena a passagem pra pasárgada xanadu ou shangrilá quem sabe a chave de um poema e olha lá 96 97
  • 46. é.- KAWA CAUIM desarranj os florais 99 ,'
  • 47. KAWA o ideograma de kawa, "rio", em japonês, pictograma de um fluxo de água corrente, sempre me pareceu representar (na vertical) o esquema do haikai, o sangue dos três versos escorrendo na parede da página... litx ,.., ~ (' 101
  • 48. - HAI Eis que nasce completo e, ao morrer, morre germe, o desejo, analfabeto, de saber como reger-me,- ah, saber como me ajeito para que eu seja quem fui, eis o que nasce perfeito e, ao crescer , diminui. 10~
  • 49. -- KAI Mínimo templo para um deus pequeno, aqui vos guarda, em vez da dor que peno, meu extremo anjo de vanguarda. De que máscara se gaba sua lástima, de que vaga se vangloria sua história, DESARRANJOS FLORAIS saiba quem saiba. A mim me basta a sombra que se deixa, o corpo que se afasta. , 'n 104
  • 50. amei em cheio meio amei-o meio não amei-o 107
  • 51. pelos caminhos que ando meiodia três cores um dia vai ser eu disse vento só não sei quando e caíram todas as flores 108 109
  • 52. I abrindo um antigo caderno o mar o azul o sábado foi que eu descobri liguei pro céu antigamente eu era eterno mas dava sempre ocupado 110 111
  • 53. ~I enfim, viu-me, nu, e passou, como vim como um filme 112
  • 54. 11 era uma vez noite sem sono o cachorro late o sol nascente um sonho sem dono me fecha os olhos até eu virar japonês 114 11"
  • 55. rio do mistério choveu que seria de mim na carta que você mandou se me levassem a sério? quem mandou? 116 117
  • 56. praias praias sinais entre os garotos de bicicleta um olhar tão longe o primeiro vagal ume esse olhar ninguém olha de mil novecentos e oitenta e sete jamais [. 118 119
  • 57. sombras primeiro frio do ano derrubam fui feliz sombras se não me engano quando atreva está madura sombras o vento leva sombra nenhuma dura 120 121
  • 58. retrato de lado na torre da igreja retrato de frente o passarinho pausa de mim me faça pousa assim feito pousasse ficar diferente o efeito na causa 122 123
  • 59. entre ano novo a água anos buscando e o chá um ânimo novo desab rocha o maracujá 124 125 1 'I -- --
  • 60. alvorada temporal alvoroço troco minha alma fazia tempo por um almoço que eu não me sentia tão sentimental 126 127
  • 61. cortinas de seda 1ua à vista o vento entra brilhavas assim sem pedir licença sobre auschwitz? 128 129
  • 62. hoje à noite tudo dito, lua alta nada feito, faltei fito e deito e ninguem sentiu a minha falta 130 131
  • 63. tudo claro + tarde de vento até as árvores ainda não era o dia querem vir para dentro era apenas o raio 132 133
  • 64. Sobre o AutQ.r Paulo Leminski Filho, nascido em Curitiba, Paraná, em 1944. (24 de agosto, Virgo). Mestiço de polaca com negro, sempre t1veu no Paraná (in- fância no interior de Santa. Catarina). Publicou: Catatau (prosa experimental), em 1976, Curitiba, ed. do au- tor. Não Fosse Isso e Era Menos / Não Fosse Tanto e Era Quase e Polonaise (poemas, 1980, Curitiba, ed. do autor). Publicou poemas, com fotos de Ja- que Pires, no álbum Quarenta Cl1ques, Curitiba, 1979, ed. Etcetera. Ex-professor de História e Redação em cursos pré-vestibulares, foi diretor de criaçãoe redator de publicidade, colaborou no "Folhetim" da Folha de S. Paulo, resenhou livros de poesia na Veja. Poemas e textos publicados em inúmeros órgãos (CorpoEstranho, Mu- da, Código, Raposa, ete.) de Curitiba, São Paulo, Rio e Ba.h1a. Teve seus primeiros poemas publicados na revista Invenção, em 1964, então, porta-voz da poesia concreta paulista. Faixa-preta e professor de judô, viveu em Curitiba com a poeta Alice Ruiz, com a qual teve duas filhas. Foram publicados pela Bras1l1ense: Cruz é Souza (Enca.nto Radical), 1985; Caprichos e Relaxos (Cantadas Literárias), 1985; Matsuó Bashõ (En- canto Radic81), 1985; Jesus a.C. (Encanto Radical), 1984; Agora é que são elas (Circo de Letras), 1984; Leon Trotsltl- A paixão segundo a revolução, 1986; todos de sua autoria. Além das traduções de Folhas das folhas da rel- va, de Wh1tman, 1985; Supermacho, de Alfred Jarry, 1988; Satyricom, de Petrônio, 1988; Sol e Aço, de Mishima, 1988 e Ma.loneMorre, de Samuel Bec- kett, 1986. Pela Criar Edições, o livro Anseios Crípticos, 1986 e pela Scipio- ne, Guerra dentro da gente (infanto-juvenil), além de muitos textos disper- sos. Paulo Leminski morreu no dia 7 de junho de 1989.