Versão integral da edição n.º 2 do quinzenário “O Centro”, que se publica em Coimbra. Director: Jorge Castilho. 28.04.2006.
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1. CAFÉ TURISMO Doçaria Conventual do Lorvão
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DIRECTOR JORGE CASTILHO
ANO I N.º 2 (II série) De 26 de Abril a 09 de Maio de 2006 1 (IVA INCLUÍDO)
CONSIDERA BOAVENTURA SOUSA SANTOS
25 de Abril
em risco de se apagar
PÁG. 3
MEMÓRIAS DA REVOLUÇÃO NA FIGUEIRA DA FOZ
Armas uniram Jaime Gama
e Dinis de Almeida
— REVELA CORONEL GÓIS MOÇO
PÁG. 4 e 5
NA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Cavaco propõe
compromisso civico
PÁG. 2
AFIRMA MINISTRO ALERTA CRÓNICA
DUX VETERANORUM DA SAÚDE PRESIDIU NOVO PRESIDENTE DE VIAGENS
“A praxe 15 milhões Olivais Senegal:
académica para nova só consegue património
de Coimbra unidade sobreviver da humanidade
é um modo de produção se tiver de origem
de estar” de antibióticos apoios portuguesa
PÁG. 8 e 9 PÁG. 11 PÁG. 20 e 21 PÁG. 23
2. 2 DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006
EDITORIAL
Comemorações te enfadonhas.
E também pouco se sentem estimu-
lados pelas manifestações mais ou
menos folclóricas das comemorações
missor, especialmente numa altura de
crise como a que vivemos.
Importa, por isso, fazer uma nova
revolução. Desta vez não pela calada
ditas populares. da noite, mas antes em plena luz do
é não só uma tentação, mas igualmen- Para eles (os que em 1974 não ti- dia. De todos os dias, usando as “ar-
te uma obrigação. nham nascido ou eram ainda crian- mas” que a Democracia colocou ao al-
Se mais não fora, para homenagear ças), a chamada “Revolução dos Cra- cance dos cidadãos, para com elas
os militares que tanto arriscaram nu- vos” quase se reduz a uma sequência derrubar certos poderes mesquinhos e
ma Revolução que o Mundo olhou de imagens desgarradas, a preto e alguns tiranetes que por aí pululam,
com surpresa e considerou exemplar branco, que as televisões ciclicamente, com arrogância e impunidade.
Jorge Castilho (derrubar um poderoso regime ditato- por esta época, vão buscar aos arqui- Para tal combate, fácil será mobili-
rial por força de um movimento mili- vos, e onde aparecem uns indivíduos zar, de forma consequente, o generoso
tar, sem derramamento de sangue, era mais ou menos cabeludos e barbudos, idealismo dos mais jovens.
Ontem passaram 32 anos. coisa nunca vista). aos magotes, a proferirem inflamadas
E para quem viveu de perto, inten- Mas também para deixar preito de frases, num linguajar estereotipado e E não haverá melhor forma de co-
samente, esses extraordinários mo- reconhecimento a tantos outros Ho- cujo nexo não é hoje fácil de entender. memorar o 25 de Abril e de honrar os
mentos de mudança (que começaram mens e Mulheres que ao longo de que lutaram para legar aos vindouros
por tensas horas de angústia e depois quase meio século, corajosamente, lu- À Liberdade, como a outras coisas, uma sociedade mais justa e mais fra-
se estenderam por dias de sucessivas taram pela Liberdade, arrostando com só se lhe reconhece o justo valor (que terna.
explosões de inenarráveis sentimen- as consequências de tamanha ousadia é imenso!), quando dela se é privado.
tos, por meses de vertiginosas trans- (alguns pagaram tal atrevimento com Não surpreende, por isso, que a ****
formações e por conturbados anos de a própria vida, muitos outros com a maioria destes jovens pouco se identi- Foi muito gratificante a forma co-
adaptação...) é quase irreprimível a prisão e represálias de diversa índo- fique com manifestações que classifi- mo o público acolheu a primeira edi-
vontade de evocar o passado. le). cam de saudosistas, chegando a desa- ção do jornal “Centro”.
De retornar a essa madrugada, e a bafar (como a muitos tenho ouvido...): Até nós chegaram mensagens de
tudo quanto dela se gerou... Contudo, cada ano que passa, vai “Já não há pachorra para tanto 25 de desvanecedora simpatia, constituindo
E deixar que a memória nos sirva sendo menor o número dos que ade- Abril!”. um estímulo para enfrentar as dificul-
alguns dos episódios mais marcantes, rem às celebrações. A apreciação é injusta. dades e tentarmos fazer mais e me-
permitindo-nos saborear pormenores Sobretudo aos mais jovens falta a Mas, infelizmente, compreensível. lhor.
que o tempo não conseguiu ainda paciência para ouvir infindáveis e re- Não é com meras evocações do pas- Para todos quantos nos concedem o
apagar. petitivos discursos em sessões muito sado que às novas gerações se alimen- seu apoio vai, muito sincera, a nossa
Esse regresso a 25 de Abril de 1974 solenes, para eles compreensivelmen- ta a legítima avidez de um futuro pro- gratidão.
Cavaco Silva propõe “compromisso cívico”
O Presidente da República Cavaco possível identificar os problemas mais numa encruzilhada entre o passado e o Como crescem os milhares de crianças
Silva escolheu o combate às desigual- graves e substituir o combate ideoló- futuro, continua a ser um país forte- portuguesas? Será que estamos a tra-
dades sociais como tema central do gico por uma ordenação de priorida- mente marcado pelo dualismo do seu tar bem as novas gerações?”, questio-
seu discurso de ontem (terça-feira) na des, metas e acções”. desenvolvimento”, lembrando as desi- nou.
sessão solene do 25 de Abril, propon- “A elaboração do próximo Plano de gualdades entre o interior e o litoral e, Por outro lado, a par do papel do
do um “compromisso cívico” alargado Acção Nacional para a Inclusão pode sobretudo, as desigualdades sociais. Estado, o Presidente da República
para cumprir essa tarefa. ser aproveitada para uma mobilização “Muito progredimos na moderniza- lembrou que “não chega exigir mais
“Quero propor um compromisso cí- geral, uma verdadeira campanha em ção da economia e na afirmação de no- medidas e mais dinheiro”.
vico, um compromisso para a inclusão prol da inclusão social”, sugeriu. vos estilos de vida, mas ficámos muito “Concretizar essa ambição de justi-
social, um compromisso que envolva Lembrando que, apesar de Portugal aquém na concretização dessa ambi- ça social, que não tem de ser remetida
não só as forças políticas, mas que con- já ter conseguido concretizar o sonho ção de uma sociedade com maior jus- para o plano das utopias, passa por ca-
gregue as instituições nacionais, as au- da Revolução de Abril de ter “um Por- tiça social”, lamentou, sublinhando da um de nós (Ó) Temos de romper
tarquias, as organizações da sociedade tugal livre e mais próspero”, o país es- que Portugal é o país da União Euro- com o conformismo e o comodismo de
civil, dos sindicatos às associações cívi- tá ainda longe de realizar o outro de- peia que apresenta maior desigualda- relegar para o Estado a única solução
cas e às instituições de solidariedade”, sígnio determinado no 25 de Abril – de na distribuição dos rendimentos. do problema”, apelou.
afirmou Cavaco Silva, no seu primeiro dia que Cavaco Silva considera ser a O Presidente da República deixou Na sua intervenção, Cavaco Silva
discurso como chefe de Estado na ses- “data fundadora do regime democrá- ainda mensagens especiais a sectores começou por evocar a memória do 25
são solene do 25 de Abril. tico” – e que é “a aspiração de maior que considera mais frágeis, como os de Abril: “Há 32 anos, Portugal mar-
Para o Presidente da República, “é justiça social”. idosos, as crianças vítimas de abusos e cou encontro com o futuro”.
“Os portugueses esperam dos políti- as mulheres vítimas de violência do- O Presidente da República associou
cos, que livre e democraticamente ele- méstica. as comemorações 25 de Abril de 1974,
geram, que estejam à altura dessa exi- “É entre a população mais idosa “quando um povo sob o impulso de
gência, que se empenhem em dar uma que encontramos as mais preocupan- um punhado de militares tomou nas
nova esperança aos mais desfavoreci- tes situações de exclusão”, disse. mãos os seu próprio destino”, a outras
Director: Jorge Castilho dos da nossa sociedade, que cooperem Por esse motivo, Cavaco Silva de- duas datas: ao 25 de Abril de 1975,
(Carteira Profissional n.º 99) no sentido de mais facilmente poderem fende que “o esforço que o Estado tem quando se realizam as primeiras elei-
Propriedade: AUDIMPRENSA superar as dificuldades e naturais di- vindo a realizar para atenuar os efei- ções livres, e a 25 de Abril de 1976, da-
NIF: 501 863 109 vergências ideológicas”, apelou. tos deste quadro social tem de ser con- ta em que entrou em vigor a Constitui-
Na única referência à situação do tinuado”. ção da República Portuguesa.
Sócios: Jorge Castilho e Irene Castilho
país no seu curto discurso de oito pá- “Não é moralmente legítimo pedir “São estas três datas hoje assinala-
Inscrito na DGCS sob o n.º 120 930 ginas, Cavaco Silva salientou que “a mais sacrifícios a quem viveu uma vi- das que conferem sentido de futuro e
Composição e montagem: melhoria da justiça social, o combate à da inteira de privação”, alertou. de modernidade à nossa democracia”,
AUDIMPRENSA - Rua da Sofia, 95, 3.º pobreza e à exclusão exigem que o Sobre as crianças, Cavaco Silva evo- afirmou.
3000-390 Coimbra - Telefone: 239 854 150 país volte a ganhar a batalha do inves- cou o célebre cartaz da Revolução em No final, o discurso de Cavaco Silva
Fax: 239 854 154 timento, do crescimento económico, que uma criança coloca um cravo no foi aplaudido de pé pelas bancadas do
e-mail: centro.jornal@gmail.com da criação de riqueza, sem que o so- cano de uma espingarda. PS, PSD e CDS-PP, enquanto PCP, BE e
Impressão: CIC - CORAZE nho continuará adiado”. “A carga simbólica desse cartaz é Verdes permaneceram sentados sem
Oliveira de Azeméis Cavaco Silva sublinhou que, 32 anos iniludível e vale a pena questionar- aplaudir a intervenção do Presidente da
Tiragem: 10.000 exemplares após a revolução, “Portugal continua mos: como cresceu aquela criança? República.
3. DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006 ENTREVISTA 3
BOAVENTURA SOUSA SANTOS CONSIDERA ERRADAS AS POLÍTICAS EDUCATIVAS
SOBRE O DIA DA LIBERDADE
“Existe o risco
do 25 de Abril se apagar”
JOÃO PAULO HENRIQUES vens aprendam como se conquistou es-
te bem que hoje temos e aceitamos co-
O 25 de Abril é falado por todos os mo normal”. O investigador não tem
portugueses. Ainda assim, por diferen- dúvidas que são muitos os portugueses
tes motivos. Para muitos, trata-se de que não conseguem dizer o nome de
um feriado nacional e corresponde a uma das pessoas envolvidas no 25 de
mais um dia sem trabalhar. Para outros, Abril de 1974.
é muito mais do que isso, uma vez que Director do único centro do país de-
significa o dia em que o país ganhou o dicado, especificamente, à documenta-
direito à liberdade e teve acesso à de- ção sobre o 25 de Abril, o professor ca-
mocracia. tedrático da Faculdade de Economia da
Boaventura Sousa Santos, director do UC explica que “o Centro não se limita
Centro de Estudos Sociais e do Centro a recolher documentação escrita como
de Documentação 25 de Abril da Uni- já estivesse produzida, mas também
versidade de Coimbra (UC), garante produz material”, acrescentando que
que “existe o risco do 25 de Abril se tem “uma forte actividade pedagógica
apagar com o passar dos anos e ser, ca- junto das escolas e das autarquias”.
da vez mais, ignorada”. As razões para Uma das iniciativas inovadoras do
tal esquecimento dos portugueses vão Centro de Documentação 25 de Abril
muito além da falta de memória das ge- da UC, que se debate com a falta de es-
rações mais novas. paço, trata-se do projecto da história
“Há alguns sinais de que as nossas oral, em que são gravadas em vídeo en-
autoridades políticas estão interessadas trevistas a militares e civis activos no
em minimizar a data. Querem que período do 25 de Abril, que relatam a
aconteça o mesmo que ao 5 de Outubro, sua perspectiva dos acontecimentos.
que se transformou num feriado sem Alguns testemunhos (Costa Gomes,
nenhuma vivência”, lamenta o investi- Vasco Gonçalves e Otelo de Saraiva de
gador, que pensa que o 25 de Abril po- Carvalho) foram, entretanto, publica-
de ser utilizado de acordo com a sua dos em livro.
inspiração inicial que passou pela “fun- Apesar da concorrência ser forte, são
dação da democracia em Portugal e muitos os documentos importantes que
criação de condições para o exercício de fazem parte do espólio do centro uni-
uma cidadania livre”. versitário, que garante a qualidade do
As políticas educativas erradas em tratamento técnico e a isenção política.
torno do Dia da Liberdade são aponta- Por exemplo, o plano de operações do
das como grande contributo para a fal- 25 de Abril, documento usado por Ote-
ta de memória colectiva dos portugue- lo Saraiva de Carvalho para liderar as
ses. Boaventura Sousa Santos está operações, e as actas originais de reu-
preocupado. Por isso, afirma que, nes- niões do Conselho de Ministros estão
te momento, “não é o facto dos estu- em Coimbra.
dantes das escolas não conhecerem o Melo Antunes, major culto, idealista
25 de Abril, mas o dos seus pais tão Boaventura Sousa Santos é o director do Centro de Documentação e ideólogo do Movimento das Forças
pouco conhecerem e até muitos profes- 25 de Abril da Universidade de Coimbra Armadas, foi a figura que mais impres-
sores”. sionou Boaventura Sousa Santos. “Era
Segundo o director do Centro de Do- nal do plano de estudos o que fez com Leccionar o 25 de Abril a todos os jo- um homem muito erudito, tinha uma
cumentação 25 de Abril da UC, institui- que, durante muito tempo, nunca se vens e em todas as escolas a diferentes cultura geral e política muito grande, ti-
ção criada em 1984, “transformámos a chegasse a estudar o 25 de Abril e os níveis de complexidade é apontado co- nha uma compreensão profunda da so-
data num tema de estudos sociais ou de que não tivessem essas disciplinas nun- mo o caminho a seguir, para que, afir- ciedade portuguesa e era um gosto falar
história e, muitas vezes, colocado no fi- ca tiveram nenhuma informação”. ma Boaventura Sousa Santos, “os jo- com ele”, conclui o investigador.
Civis apanhados de surpresa DVD inova 25 de Abril
No dia 25 de Abril de 1974, Boa- do estava a barbear-me”, lembra, O último trabalho do Centro de Trata–se de um material inova-
ventura Sousa Santos viveu os mes- acrescentando, de pronto, que “vi- Documentação 25 de Abril da Uni- dor que usa as melhores tecnologias
mos sentimentos de milhares de ci- via, nessa altura muito perto da an- versidade de Coimbra é um DVD interactivas e em que o pessoal téc-
vis portugueses, que não contavam tiga casa da PIDE [Polícia Interna- interactivo, feito em parceria com o nico e pedagógico do centro respon-
com a revolução naquele dia. “Fui cional e de Defesa do Estado]”. Ministério da Educação, com o títu- de a 32 perguntas que os alunos das
apanhado de surpresa”, confiden- Boaventura Sousa Santos saiu de lo “25 de Abril: 32 anos, 32 pergun- escolas básicas do Centro do país
cia o investigador da Universidade casa e foi à Faculdade de Economia tas”. “É, talvez, o mais importante entenderam fazer. As respostas são
de Coimbra, que recua, agora, 32 ver o que se tinha passado. Aí, deu de todos os que realizamos até ago- dadas com animação, podendo os
anos para recordar a data. conta que estava uma revolução na ra”, assegura Boaventura Sousa jovens fazer jogos da glória, puzz-
“Ouvi a notícia de manhã quan- rua. Santos. les, karaoke e escrever histórias.
4. 4 REPORTAGEM 25 DE ABRIL DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006
FIGUEIRA DA FOZ ESTEVE NO CENTRO DA REVOLUÇÃO DE ABRIL
Dinis de Almeida e Jaime Gama
unidos pela mesma causa
Que ligação haverá entre a Revolu-
ção de 25 de Abril de 1974, Dinis de Al-
meida, o fogoso militar do RALIS e das
“Chaimites”, e Jaime Gama, o tranquilo
político que é hoje Presidente da As-
sembleia da República? Poucos saberão
esclarecer esta questão. Contudo, ela
tem uma resposta simples: a Figueira
da Foz.
De facto, foi na Figueira da Foz que,
nessa madrugada de há 32 anos, o aca-
so juntou o então capitão Dinis de Al-
meida com um jovem aspirante milicia-
no chamado Jaime Gama.
Quem nos faz esta revelação é o coro-
nel Góis Moço, Presidente da Associa-
ção 25 de Abril na Região Centro, e um
dos capitães que integraram o Movi-
mento que, de forma exemplar, derru-
bou uma Ditadura de quase meio sécu-
lo.
REVOLUÇÃO TAMBÉM
GERMINOU EM ANGOLA
Góis Moço cumpria uma comissão
de serviço militar em Angola, como ca-
pitão, em 1973. Foi nesse ano que os jo-
vens capitães reagiram à publicação de
uma lei que os penalizava e prejudicava
a sua progressão na carreira.
Em Portugal e nas colónias (então
chamadas “províncias ultramarinas”),
onde as Forças Armadas portuguesas
lutavam contra os movimentos inde-
pendentistas, os militares começaram Coronel Góis Moço
a reunir para debater a forma de reagir
contra essa lei que consideravam in- res da sociedade portuguesa). uma reunião de grande importância to) e o RAP 3 (Regimento de Artilharia
justa. em que participaram oficiais colocados Pesada).
Mas a verdade é que essa reacção OPÇÃO PELA LUTA ARMADA em várias unidades da Região e dele-
corporativa rapidamente foi evoluindo gados do Movimento vindos de Lis- DINIS DE ALMEIDA E JAIME GAMA
para uma análise política da situação Góis Moço lembra que foi numa reu- boa.
em que o País vivia, com muitos dos nião em Cascais que se resolveu fazer Os oficiais foram–se juntando no De acordo com os planos, logo que a
militares a chegarem à conclusão de uma consulta aos delegados do Movi- Café Internacional (que então existia rádio transmitiu a canção “E depois do
que importava pôr termo a um regime mento dos Capitães para decidir de que próximo da Estação Nova) e dali se- adeus”, de Paulo de Carvalho (sinal
ditatorial que oprimia Portugal há dé- forma actuar: se reivindicando por es- guiram, em aparente passeio, até ao que o Movimento ia ser desencadeado),
cadas. crito, ou se adoptando método mais ra- outro lado da ponte. E foi na penum- os oficiais revoltosos começaram a
No caso concreto de Góis Moço, foi dical. E a verdade é que a maioria de- bra da margem esquerda do rio Mon- aprontar os soldados para avançar ru-
em Agosto de 1973 que participou, num fendeu o recurso à acção armada, como dego, frente ao Estádio Universitário, mo aos objectivos previamente traça-
hotel de Luanda, na primeira reunião única forma de alterar a situação que se que esse grupo de oficiais da Região dos.
de capitães que debateram esta situa- vivia. Centro foram informados de que a E quando a rádio transmitiu para to-
ção. Algum tempo depois, em Março de partir desse instante deveriam entrar do o País a canção de Zeca Afonso
Em finais desse mês Góis Moço re- 1974, de forma inesperada, uma coluna em prevenção rigorosa, pois a acção “Grândola vila morena” (proibida pela
gressou a Portugal, tendo sido colocado militar sai do quartel das Caldas da Rai- armada poderia acontecer a qualquer censura do regime vigente), ao início da
na Escola Central de Sargentos, em nha em direcção a Lisboa, numa tentati- momento. Os militares regressaram às madrugada do dia 25 de Abril, os co-
Águeda, mas continuando a tomar par- va de golpe mal articulada e que viria a suas unidades, começando a preparar- mandantes das unidades foram detidos
te nos debates que os jovens capitães fo- ser anulada pelas forças do regime. -se, de forma discreta, para quando e as colunas militares começaram a
ram fazendo, discretamente, por todo o Esse golpe falhado revelou-se, contu- chegasse a ordem de avançar. avançar.
País, e onde ganhava cada vez mais do, de grande importância, não só por- Góis Moço conta que no dia 24 de No RAP 3 Dinis de Almeida começa-
consistência a ideia arrojada de que era que serviu para analisar a forma como a Abril se deslocou a Águeda um emis- va a assumir protagonismo, tendo sido
necessário mudar o regime. Ditadura a ele reagiu, mas também por- sário do Movimento com os planos da ele a deter o comandante, juntamente
As reuniões eram feitas de forma que disseminou pelo País a ideia de que operação (que seria comandada desde com o então furriel miliciano Jorge Dias
discreta, para não alertar as chefias a ansiada mudança começava a tomar Lisboa, como é sabido, por Otelo Sarai- (hoje um reputado fotógrafo na Figuei-
fiéis ao regime e para iludir também o forma. va de Carvalho). ra da Foz) e o próprio Góis Moço, que
tentacular aparelho da PIDE (a que Góis Moço e outros oficiais da Esco- ficou na unidade a assegurar o coman-
Marcelo Caetano, ao suceder a Sala- REUNIÃO EM COIMBRA la de Sargentos deveriam dirigir-se à do, enquanto uma companhia saía para
zar, mudara o nome para Direcção- NA MARGEM DO MONDEGO Figueira da Foz, onde estavam aquar- se juntar à do CICA.
-Geral de Segurança, mas que conti- teladas duas unidades de grande im- Ora no CICA quem estava de oficial
nuava a ser uma polícia política des- No início de Abril de 1974, em de- portância para o Movimento: o CICA 2 de dia era o aspirante miliciano Jaime
pótica e infiltrada em todos os secto- terminada noite, decorreu em Coimbra (Centro de Instrução de Condução Au- Gama, que depressa aderiu ao Movi-
5. DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006 REPORTAGEM 25 DE ABRIL 5
mento (vindo depois a ter papel impor- LIBERTAÇÃO DE PENICHE
tante, já como civil, na construção da E AVANÇO PARA LISBOA
Democracia, tendo sido Ministro de go-
vernos do Partido Socialista e acabando Mas voltemos à madrugada do 25 de
por chegar agora a Presidente da As- Abril, relatada por Góis Moço.
sembleia da República, a segunda figu- Para a Figueira da Foz convergiram,
ra na hierarquia do Estado democráti- de acordo com o plano de operações,
co). uma companhia vinda de Aveiro e ou-
Góis Moço, na informal conversa tra de Viseu.
com o “Centro”, aproveita para subli- Juntamente com as duas companhias
nhar a importância da adesão dos mili- da Figueira da Foz (uma do RAP e ou-
cianos para o êxito do Movimento do 25 tra do CICA), formou–se o chamado
de Abril. Agrupamento do Norte, que rumou ao
Sul para vir a ter importante papel no pessoas se mantivessem em suas casas,
desfecho vitorioso da Revolução. já que se temia que houvesse confron-
A primeira missão desta coluna mili- tos com forças fiéis ao regime, o que po-
tar era muito delicado: tomar o Forte de deria causar vítimas.
Peniche, para libertar largas dezenas de A verdade é que, felizmente, essa deso-
presos políticos ali encerrados pela po- bediência, que se traduziu em incontrolá-
lícia política. veis manifestações de alegria por todo o
E assim aconteceu, felizmente sem País, acabaria por ser um bom reforço pa-
necessidade de uso da força, embora se ra o êxito dos militares revoltosos.
tivessem vivido horas de grande tensão Alguns deles assumiram grande pro-
(aliás, mais tarde os presos libertados tagonismo nos dias que se seguiram.
viriam a relatar a angústia que sentiram Foi o caso de Dinis de Almeida, que no
por não saber que tipo de golpe estava RALIS assumiu papel determinante,
em marcha, pois alguns chegaram a te- nomeadamente num estranho contra-
mer que fosse uma acção de forças da -golpe protagonizado por tropas para-
ultra-direita). quedistas.
Depois a coluna militar seguiu para Outros, depois de cumpridas as ar-
Lisboa, onde viria a controlar a zona de riscadas missões (que exigiram muita
Monsanto, de grande importância es- coragem, pois se a Revolução tivesse fa-
tratégica. lhado muitos teriam morrido ou visto o
seu futuro comprometido), regressaram
ADESÃO POPULAR aos quartéis para prosseguir a sua car-
reira, sem qualquer espécie de privilé-
O que aconteceu de seguida, é bem gios.
conhecido. Assim se fez uma Revolução exem-
Por todo o País a população saiu à plar, que viria a proporcionar a Portu-
rua, contrariando os apelos do Movi- gal o regime democrático em que hoje
mento das Forças Armadas para que as vivemos.
Vasco Lourenço crítico no Algarve, o tenente-coronel Vasco
Lourenço referiu que a ideia surgiu de
Abril, refere-se que ao longo de 30 anos
de poder democrático “nem sempre es-
alguns sócios da associação, que consi- tiveram na primeira linha das preocu-
Vasco Lourenço, um dos mais desta- própria autonomia”, ironizou. deraram apropriado comemorar Abril pações dos vários responsáveis os valo-
cados elementos do Movimento dos “Não sei o que é que lhes passou pe- no Algarve no ano em que passam 30 res que sempre os devem nortear”.
Capitães e actual Presidente da Asso- la cabeça”, disse Vasco Lourenço, recor- anos de poder democrático, devido à “Pelo contrário, assumiram por ve-
ciação 25 de Abril, classificou como dando que, durante vários anos, o pre- aprovação da Constituição pós-revolu- zes um papel determinante posições co-
“deplorável e lamentável” o facto da sidente do Governo Regional da Madei- cionária, a 02 de Abril de 1976. mo a luta pelo poder, os interesses cor-
Madeira não comemorar oficialmente a ra, Alberto João Jardim, enviou sempre Considerando que alguns dos desíg- porativos ou a corrupção, verdadeiro
Revolução dos Cravos, considerando uma carta para a associação a saudar e nios da Revolução estão por cumprir, cancro da democracia”, lamenta a men-
que foi a Revolução que criou condi- homenagear os capitães de Abril por- Vasco Lourenço referiu que ainda faz sagem.
ções para a autonomia política do ar- que tinham possibilitado a autonomia. sentido lutar, lamentando que em maté- O documento censura ainda “a tenta-
quipélago. Vasco Lourenço atribuiu o que se ria de justiça social se estejam “a verifi- tiva do poder económico controlar o
Vasco Lourenço falou aos jornalistas passa este ano a “lutas pragmáticas e car alguns retrocessos”. poder político, a falta de democracia in-
durante o jantar comemorativo do 25 conjunturais”, mas lamentou a não co- “Faz sentido lutar contra os que, em terna nos partidos políticos, elementos
de Abril de 1974, promovido pela asso- memoração oficial, considerando-a “in- nome da segurança ou de outras coisas essenciais da democracia política, os
ciação a que preside, que este ano de- compreensível e altamente condená- do género começam a pôr em causa al- egoísmos e as fraquezas humanas”.
correu em Quarteira, Algarve. vel”. gumas liberdades, contra os que que- Apelando à democracia participati-
“Quando se comemoram 30 anos das O jantar anual da associação decor- rem menos política e mais defesa dos va, pois “a cidadania não se compadece
primeiras eleições para as autonomias, reu num salão do parque aquático direitos instalados, contra aqueles que com ausência, com abstenção, com
nomeadamente para a autonomia da Aquashow, em Semino, próximo de nos querem atirar para novas guerras e alheamento”, a mensagem garante que
Madeira, aparece o Governo Regional e Quarteira, com a presença de cerca de contra os que põem em causa os valores a participação cívica “deve ter perma-
a Assembleia Regional a dizer que não 900 pessoas. de Abril”, enunciou. nentemente presente a memória do
há que comemorar os 30 anos da sua Sobre as razões das comemorações Na mensagem da Associação 25 de passado, a razão de ser do 25 de Abril”.
6. 6 CITAÇÕES DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006
breviventes, reza a história. Mas conve- O percurso é circular e tem quase
nhamos que a maioria se limitou a pas- sempre os suspeitos do costume: Go-
sar pelo cargo, sem deixar, boa ou má, verno, sindicatos, patrões, ordens pro-
GRIPE DAS AVES
uma marca saliente. fissionais, associações e, claro, fica sem-
(...) Ao contrário de alguns dos seus pre bem, para ilustrar, ouvir a famosa “Já não há pachorra para a gripe das
antecessores, Sócrates não era ninguém, vox populi, transformada muitas vezes aves” - foi assim que começou, no jor-
ou quase, antes de ser primeiro–minis- em padrão da vontade geral, errada- nal 24 Horas, na semana passada, uma
tro. Chegou lá por uma, para ele, feliz mente. série de artigos assinados pela bióloga e
sucessão de factos e acontecimentos fo- Os jornais, a televisão e a rádio estão escritora Clara Pinto Correia. Apesar
ra da sua vontade. Estava a jeito, o que cada vez mais a ser apenas eco de de- das polémicas em que se envolveu nos
já é um talento. Mas só depois de ter clarações de reacções e de contra–reac- últimos anos, Clara é reconhecidamen-
iniciado as suas funções é que começou ções. O exemplo mais caricato é ser no- te uma cientista de mérito, professora
a dar sinais do que queria e ao que vi- tícia o co–mentário de um comentador universitária, e tem um extenso traba-
itações nha. Muito pouco, por enquanto. Não sobre o comentário do comentador de lho desenvolvido em Portugal e nos Es-
se lhe conhece pensamento, nem hori- outro programa! Será isto jornalismo? tados Unidos. Ora, o que Clara afirma -
zonte. Não parece ser de direita nem de Porque andamos todos atrás uns dos corroborando e desenvolvendo infor-
esquerda. Fez questão de ser secretário- outros? Um jornal avança com um te- mações que já circulam na Internet há
“A LÍNGUA –geral do PS, mas já se percebeu que ma, a rádio segue, a televisão completa, meses - é ba–sicamente o seguinte: a pa-
não morre de amores pelo partido, o ou vice- -versa - a ordem pouco impor- ranóia generalizada sobre a gripe das
É O QUE NOS UNE” qual, por sua vez, lhe paga com o mes- ta. É uma tarefa quase inglória desco- aves resulta de uma inteligente mani-
mo carinho. brir algo diferente nos jornais, na rádio pulação da indústria farmacêutica, e tu-
Domingo de Ramos, cidade de São (...) Mestre em escaramuças, não se e na televisão. Estamos todos quase do começa - e acaba - em Do–nald
Paulo, meio–dia, um sol a pique, pau- lhe conhece talento para a grande bata- sempre à volta do mesmo. Rumsfeld, secretário de Estado da De-
listas, de diversas idades, classes sociais lha. É abrasivo, eventualmente vingati- Para que serve uma autoridade regu- –fesa de George Bush, que é accionista
e raças, fazem fila para comprar o bilhe- vo. Gosta de quem o corteja, detesta ser ladora ou lei para nos controlar quando da empresa que tem a patente do medi-
te de acesso ao Museu da Língua Portu- contrariado”. já so–mos nós que nos policiamos, im- camento Tamiflu. A gripe das aves, diz
guesa, recentemente inaugurado e ins- placavelmente, uns aos outros? Há qua- a bióloga, é uma “doença duvidosa”
talado no edifício da estação da Luz. António Barreto se uma agenda obrigatória para todos que “não causou mais do que umas
As grandes faixas afirmam perem- (Público, 16/04/06) os jornalistas. Quem controlar a dita cem mortes” - “morre mais gente com a
ptoriamente que “a língua é o que nos agenda controla o que inevitavelmente gripe vulgar”. Clara não apenas denun-
une”. Deve ser porque acreditam que será notícia. cia a presumível tramóia como é taxati-
assim é que ali estão disciplinados, pa- Numa altura de crise económica e de va na afirmação: “Tudo isto (...) para
cientes, alegres, gastando as horas de BISPO LAMENTA valores, será talvez altura de nós pró- combater uma pandemia que está há
domingo e os reais do bolso, compran- TROCA DO GNT prios fazermos esta reflexão e conse- nove anos para acontecer e já se perce-
do um picoli ou um guaraná que a fa- quentemente inverter o caminho. O pri- beu que não vai acontecer nunca.”
mosa “economia paralela” põe à dispo- meiro a ter coragem de esquecer o (...)
sição da fila, com rápido e eficaz senti- Não deixo de notar o grande silêncio monstro das audiências e das tiragens O que me incomoda é, uma vez mais,
do de negócio. dos nossos canais televisivos e da co- pode ganhar a batalha! a forma como se pratica o jornalismo
Também lá estou. Unida por maioria municação social escrita, no tocante à entre nós. Debaixo da agenda que as
de razão. Curiosa e interessada mais Semana Santa, à excepção de dois ou João Adelino Faria instituições determinam, com pouca
ainda, se possível, por ter lido de rajada três momentos litúrgicos focados. A lai- - jornalista da SIC imaginação, com pouca ousadia. Eu
três autores lusófonos, fascinada com a cidade não é impeditiva da liberdade (DN) gostava de perceber se a Clara tem ra-
riqueza que trazem à minha (nossa) lín- de informar, seja qual for o ângulo de zão ou não - e não é com crónicas que lá
gua, que assim vai ganhando sons, visão. Já o sabemos. Magras alusões aos chego, é com jornalismo. Mas ninguém
cheiros, formas, uma plástica riquíssi- acontecimentos e às palavras proferi- quer saber do assunto, e eu fico na mes-
ma sem nunca perder a matricial gesta- das. ATESTADO ma. Ou melhor: fico a pensar que a Cla-
ção: Nélida, Chico Buarque, Pepetela, Encontrei algumas do Cardeal–Pa- DE IMBECILIDADE ra, provavelmente, tem razão. E nesse
Vozes do deserto, Budapest, Os Preda- triarca, do Bispo do Porto e, mais redu- caso, “nas tintas” para a gripe...
dores. zidas ainda, do Arcebispo de Braga.
(...) Não tiro conclusões. Mas o facto não A abertura do novo Casino Lisboa, Pedro Rolo Duarte
Mas uma coisa observei: Estados po- me foi alheio. E a propósito: a TV Cabo, com o Parque Mayer a despencar e a (DN 19ABR06)
derosos nunca deixaram de privilegiar num dos seus canais, fez referência a apodrecer, é uma pouca–vergonha e
o “império da língua”, ou seja, sempre um exorcista, como um outro di*rio de um atestado de imbecilidade passado a
utilizaram como grande prioridade a Lisboa ostentava grossa publicidade ao todos os lisboetas. Eu não duvido de
língua, considerada um soft–power e, «exorcismo que cura a alma», com lu- que o senhor Stanley Ho tenha inunda- O FOOTING...
também por isso, um investimento de gar e hor*rios definidos... É o que “está do a Câmara de Lisboa com muitos mi-
enorme eficácia. Porque será então que a dar”... lhões de euros, que serão canalizados A mediatização da política pode e
nós, Estado pouco poderoso, despreza- Lamento o desaparecimento do canal para as mais diversas actividades, algu- deve ser um instrumento essencial na
mos este precioso instrumento? GNT da TV Cabo, por todas as razões e mas delas meritórias. A questão, contu- divulgação e compreensão das opções
mais uma: o espaço deixado foi con- do, é outra. Existia um compromisso feitas pelo Governo, sobretudo quando
Maria José Nogueira Pinto quistado pela IURD. E, no linguajar explícito entre quem há um par de anos essas escolhas impõem a todos nós ele-
DN 21/04/06 brasileiro, já “deu” para ver o que se governava Lisboa (o inesquecível San- vados sacrifícios. Mas quantidade não
pretende. Só nos faltava mais “esta”... tana) e os lisboetas - o casino iria ser significa qualidade. Por isso, não teria
construído pela única e exclusiva razão sido melhor se, das 333 medidas anun-
D. Januário Torgal Ferreira - de que não havia outra forma de finan- ciadas - que diabo de capicua -, nos fos-
BARRETO RETRATA Bispo das Forças Armadas ciar a reconversão do Parque Mayer e sem apenas referidas aquelas que, no
SÓCRATES (In http://castrense.ecclesia.pt) os avultados honorários do arquitecto futuro, nos irão trazer maiores benefí-
Frank Gehry. Findo todo este tempo, cios?
Gehry transformou–se no turista mais
“Dei comigo, nesta semana de Pai- caro de Lisboa e as ruínas do Capitólio E, já agora, porque não explicar me-
xão, a passar em revista as três décadas O PERCURSO contrastam agora com as luzes de néon lhor a todos nós as verdadeiras razões
de democracia, olhando em particular do novo casino. É moralmente obsceno: desta pomposa ida a Angola, em lugar
para o papel dos primeiros–ministros. CIRCULAR seria o mesmo que eu pedir ao meu de mostrar as imagens do footing do
A primeira observação, inesperada, foi avôzinho para adiantar parte da heran- nosso Primeiro, nas quais, possivel-
a de que se trata de uma profissão de Há quanto tempo não damos notí- ça de forma a tapar um buraco no telha- mente, só os seus familiares estarão in-
risco. Ou antes, de cargo associado a cias? Há quanto tempo nós, jornalistas, do e acabar a gastar o dinheiro em de- teressados?
uma curta esperança de vida. Dos ca- corremos quase obsessivamente, todos corações para a sala.
torze que desempenharam estas fun- os dias, para escutar mais uma reacção Helena Sacadura Cabral
ções, sete já morreram. Metade. Ainda sobre uma declaração feita por um mi- João Miguel Tavares (DN 21/04/06)
por cima, relativamente novos. Dos êxi- nistro, político, advogado, juiz ou pro- (DN 21/04/06)
tos ou fracassos deles, falecidos os so- curador?
7. DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006 CITAÇÕES 7
AUTOFAGIA duas origens: por um lado, o declínio líder do partido conservador UMP da a coligação que encabeçava. E tinha
MEDIÁTICA demográfico dos “indígenas europeus” (União para um Movimento Popular). toda a razão.
(presumo que se pudesse dizer, dos
“brancos”...), que evolui em paralelo Ana Navarro Pedro, Paris Vasco Graça Moura
O programa da manhã seguinte vol- com o crescente afluxo de pessoas (Público, 16/04/06) (DN 19ABR06)
tou à carga, com um especial “a tragé- oriundas de outras paragens ao conti-
dia da TVI”. Mas a pièce de résistance nente europeu (genericamente designa-
veio na terça, com a transmissão inte- dos por “imigrantes”); por outro, a que-
gral da missa de corpo presente e da- bra acentuada do espírito religioso dos
VILLEPIN
quela espécie de funeral de autógrafos europeus autóctones, de par com a pro- FOI LIXADO TELEGRÁFICAS
que levou milhares a Runa. Raras vezes funda religiosidade que marca essas co-
se terá assistido a um tão acabado munidades imigrantes, designadamen-
exemplo de autofagia mediática e de te as muçulmanas. O desastrado Villepin foi lixado mui- “Numa altura em que a palavra de
canibalismo sentimental como nesta ex- Este é o verdadeiro dilema da Igreja to à puridade pelo inenarrável Chirac e ordem é reformar o sistema, os deputa-
ponenciação do impacto de uma morte de Bento XVI: encontrar, do ponto de não teve nada de solidamente implan- dos põem em causa o Parlamento com
“da casa”. É certo que, no seu afã de vista doutrinário e pastoral, o ponto de tado no sítio que o levasse a pedir a de- leviandade caricata”.
evidenciar ser sempre possível descer equilíbrio entre a tolerância perante as missão. É certo que, não obstante as Emídio Rangel (Correio da Ma-
mais baixo, a TV portuguesa tem de- demais religiões (o diálogo ecuménico suas fascinações napoleónicas, Villepin nhã, 15/04/06)
monstrado que a náusea de ontem é a no próprio espaço europeu) e ao mes- não podia, à imagem de Bonaparte,
normalidade de hoje. E que se pode mo tempo combater a “a–religiosida- mandar disparar umas salvas de ca- “Um optimista pode ser um pessi-
sempre argumentar ser anacrónico eli- de” e o relativismo de valores nas socie- nhão contra a populaça apinhada nas mista mal informado”.
tismo defender que o que vale para dades europeus, uma tarefa a que o pre- Tulherias. Mas, com Chirac e o seu pri- Raul Solnado
Amália não se aplica a um actor es- decessor do actual Papa chamou “a ree- meiro–ministro, a autoridade do Estado (“Prós e Contras”, RTP 1, 17/04/06)
treante de novela adolescente. Ou até vangelização da Europa”. escusava bem de ficar reduzida a uns
dizer (como já se disse), que a “culpa” ridículos disparos de pólvora seca. A “Se os recursos científicos e técnicos,
reside na família e no padre, que autori- António Vitorino França afunda–se em desprestígio. económicos e financeiros fossem colo-
zaram as câmaras no templo. Como (DN 21/04/06) Oxalá não arraste consigo a Europa. cados ao serviço de todos, este mundo
quem diz: a natureza da TV é mostrar, Em Itália, o execrável Berlusconi não entrava, de facto, em processo de res-
explorar, devassar, vender. Ai de quem era afinal tão execrável como isso para surreição, abria as portas do paraíso,
não lhe souber resistir. Ai de quem não nada menos de metade do eleitorado. Ia donde nos expulsamos todos os dias de
seguir o exemplo da Junta de Freguesia FRANÇA: MULHER ganhando as eleições contra a criatura mil maneiras”.
de Runa, que interditou a tomada de NA PRESIDÊNCIA? mais enfadonha e inoperante que existe Frei Bento Domingues
imagens no cemitério. Ai de quem não hoje à face da Terra, o sr. Prodi. Mas, ao (Público, 16/04/06)
saiba reconhecer limites e impô–los. E que tudo indica, este ganhou e vai for-
ai de quem ainda acredite no bom sen- “Pela primeira vez na História de mar governo. Simplesmente esse gover- “Se a riqueza de um País se avaliasse
so e na auto–regulação. França, as sondagens dizem que uma no vai fazer tudo menos governar. Não pelas viagens ao Brasil, Cuba, Repúbli-
mulher tem hipóteses de ser eleita Pre- apenas pela dimensão da oposição de ca Dominicana, então Portugal estaria
Fernanda Câncio sidente da República, dentro de um centro–direita e de direita. Mas tam- muito melhor posicionado nos rankin-
(DN 22ABR06) ano. No mundo machista da política bém, e sobretudo, pela instabilidade na- gs internacionais”.
francesa, a popularidade da socialista tural da nova coligação, autêntico saco Judite de Sousa
Ségolène Royal na corrida ao Eliseu é de gatos em que nenhum entendimento (Jornal de Notícias, 15/04/06)
uma verdadeira revolução. pela positiva será possível. Quando, no
“REEVANGELIZAÇÃO Os inquéritos de opinião entecipam último debate, Prodi afirmou que Ber-
DA EUROPA” já uma segunda volta em jeito de duelo lusconi se agarrava aos números como “Os jornais portugueses hoje não re-
entre as duas vedetas políticas do mo- um bêbedo se agarra a um lampião, flectem a realidade portuguesa”
Com efeito, os desafios que hoje se mento. ‘Ségo contra Sarko’, ou seja, Ni- Berlusconi retorquiu que, por sua vez, Baptista Bastos
colocam aos valores da Europa são de colas Sarkozy, o ministro do Interior, e Prodi estava no papel de idiota útil da- (Herman SIC 23/04/06)
LENDO O LE MONDE DIPLOMATIQUE, JUNTO AO MONDEGO...
Tudo isto me parece um pouco sinis- nistro dos Negócios Estrangeiros, sem- a laser ou jacto de tinta, e depois prosai- que há mais?
tro, mas encaixa muito bem. Os artigos pre com o mesmo ar enfadado, com a camente copiadas. Algures ainda de- Quando vamos a uma livraria “uni-
sobre a defunta lei do CPE, a começar arrogância da pequena nobreza rural vem ser feitas em tipo de chumbo, aper- versitária”, o que é que encontramos?
pelo editorial de Ramonet, dão o tom às perante um mundo que não fosse galo- tado nas caixas a cordel, e com os filetes Um deserto. Os livros estrangeiros são
aguas. À minha volta fala–se brasileiro, –franco–francês, agora passado para o para ocupar espaço. Província pura, o praticamente inexistentes, com ex-
língua dos empregados de restaurante “inimigo”, que ele mais que tudo des- que em si não é mal nenhum, não fosse cepção do Stiglitz e outros livros de eco-
em Portugal, produto da globalização. prezava. Apanhado na sua própria me- ser esta a terra da “Lusa Atenas”. nomia básicos, para dar a impressão de
À minha frente, umas jovens senhoras, dicina, com a esquerda alter–mundialis- ser uma livraria moderna e “cosmopoli-
de grandes anéis de casadas, uma das ta do Le Monde Deplomatique a agitar José Pacheco Pereira ta”. Não se trata de dizer que só o que
quais é dona de uma boutique, mos- a tricolor. (blog “abrupto”, 10.04.2006) não está em português é que é bom,
tram umas às outras um produto novo: Coimbra por trás. Sempre achei que mas antes que aquilo que se escreve
uns colares gigantescos de madeira, devia haver algo de muito errado numa noutras línguas é muito mais (e melhor)
iguais a milhares de outros, mas com cidade em que os estudantes gostam de UM DOS MUITOS do que aquilo que é possível traduzir
uns “elefantezinhos” e uns “coraçõezi- andar vestidos à padre. Passam alguns, COMENTÁRIOS: para a língua materna.
nhos” dependurados (elas falam em di- negros e poeirentos. Uma cidade cujas O retrato das livrarias em Portugal
minutivos). “São bons para a tua loja”. livrarias na baixa são inimagináveis de é a revelação de um país que vive ape-
Susto e pavor. provincianas, escuras, mal abastecidas, O que escreveu sobre Coimbra (e es- nas consigo próprio, culpando–se de tu-
Ramonet fala em aumentativos. Ele quase sem livros estrangeiros. Apenas o pecificamente sobre as livrarias em do e, na ausência de “concorrência” ou
acha que a França, sua sociedade, sua Direito é rei e senhor, tudo o resto leva à Coimbra) podia ser também a descrição comparação, se acha natural e parado-
economia, e sua cultura são gloriosas e pergunta: como pode uma cidade uni- de Lisboa. Claro que há mais livrarias e xalmente o melhor. O retrato do provin-
que agora a “direita” e o “liberalismo” a versitária ter livrarias assim? Tudo tris- claro que existem pérolas esquecidas na cianismo luso é também esta incapaci-
rebaixam no seu valor. Toda esta con- te, baço, esquecido da “modernidade” baixa, habitadas por senhores nobres dade de nos medirmos realisticamente
versa de “declínio” e “crise” da França é como agora se diz. Mal por mal, prefiro que parecem esquecidos do tempo que com o resto do mundo, e o panorama
uma cedência ao “inimigo”, diz Ramo- ver as notícias necrológicas ainda cola- passa lá fora (o que talvez seja a razão das nossas livrarias é um espelho disso
net, ou seja ao imperialismo americano das nas paredes como nas aldeias e vi- de tanto prazer quando os visitamos), mesmo.
e o liberalismo económico anglo–saxó- las do Norte. É certo que me parecem mas na realidade, tirando estas livrarias
nico. Pobre Villepin, que eu conheci Mi- ser feitas já em computador e impressas e alfarrabistas que vivem do hábito, o João Lopes
8. 8 ENTREVISTA DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006
JOÃO LUÍS JESUS LEMBRA QUE A TRADIÇÃO ACADÉMICA NÃO SE RESUME
À CHEGADA DOS CALOIROS
“A praxe é um modo de estar”
Foi na Sala Sr. Xico, no primeiro piso assistir às aulas, em conciliar horários,
da sede da Associação Académica sendo uma questão que a própria uni-
de Coimbra, que João Luís Jesus rece- versidade deve equacionar. Em relação
beu o jornal Centro, depois de aceite aos colegas, não me parece que exista
o repto para conversar sobre as tradi- qualquer sentimento de exclusão, bem
ções académicas de um forma geral. pelo contrário, uma vez que é frequente
O Dux Veteranorum aponta a praxe facultarem os apontamentos e darem
como uma forma de estar e de sentir todo o tipo de apoio aos trabalhadores.
a universidade e espera que toda
a cidade de Coimbra diga “presente” SEM MARGEM PARA ERROS
na Queima das Fitas 2006
A Queima das Fitas 2005 ficou en-
António José Ferreira (texto) sombrada por alguns problemas...
Nuno Cardoso (fotos) Houve alguns problemas, azares
com alguns negócios, algumas decisões
COMO DEFINE A PRAXE? que se vieram a revelar pouco acertadas
A praxe académica é fundamental- e, de facto, as coisas não aconteceram
mente um modo de estar, que deve ser como estava inicialmente previsto. Há
o mais digno possível. É uma cultura riscos que é necessário enfrentar e se te-
própria dos estudantes e de uma comu- mos tido sempre a sorte de as coisas
nidade. Internamente existem relações correrem bem, no ano passado tivemos
entre os diferentes estudantes, de acor- azar. O fundamental é aprendermos
do com o número de matrículas e, por com os erros, para que não se repitam.
exemplo, se já usaram insígnias pes- E este ano estamos a ter uma postura de
soais ou não. Mas o principal é ter em acordo com esse pressuposto, estabele-
conta que a praxe e o seguir a tradição cendo margens de risco bem menores
académica é um modo de estar e uma para as decisões que tomamos. Por
integração dentro de uma comunidade exemplo, se no ano passado essa mar-
com tradições e com uma identidade e gem de risco era de quarenta por cento,
uma mística muito próprias, numa ins- este ano não ultrapassa os vinte. Não
tituição que tem mais de 700 anos de podemos sujeitar-nos a ter um único
história. Não é só a brincadeira por azar, pois há dívidas do ano passado
brincadeira com o “caloiro”, o que para que vão ser pagas com a Queima deste
mim não chega sequer a dez por cento ano. É esse o compromisso.
do que é a praxe, mas é toda a envol-
vência da academia coimbrã: a Queima DE QUE FORMA ESSES PROBLEMAS CONDI-
das Fitas, o fado, o cortejo, o comprar o CIONARAM A ORGANIZAÇÃO DESTE ANO?
nabo na Latada, a cerimónia de imposi- Não houve restrições orçamentais,
ção de insígnias na pasta, etc, etc. Tudo O Dux Veteranorum da Academia de Coimbra espera que toda a cidade se até porque é impossível realizar dinhei-
isto não tem nada a ver com caloiros e é envolva em torno da Queima das Fitas de 2006 ro se não houver investimento. A Quei-
uma parte muito vistosa e bonita das ma foi organizada nos mesmos moldes
tradições. Felizmente que os estudantes a pagar com a mesma moeda por algo e não foi pelos maus resultados do ano
ainda têm muito orgulho em todos es- que lhe fizeram. O espírito da praxe não TEM HAVIDO EVOLUÇÃO NA PRAXE? passado que esta organização ficou
tes aspectos. Por exemplo, no último deve ser esse. Há regras e tem de haver Há uma evolução natural. Há coisas condicionada em termos de grupos ou
ano, em usarem as fitas assinadas pela essa sensibilidade por parte de quem que se faziam há 40 anos e que neste actividades. Pelo contrário, a Queima
família, pelos amigos, pelos professo- está a “praxar”. momento estão banidas. Por exemplo o procura sempre melhorar de um ano
res, etc, de acordo com as regras estabe- “canelão”, que era extremamente vio- para o outro e esta foi pensada para ser
lecidas. Tudo isto é praxe e tradição e HÁ RELATOS DE ALGUNS ABUSOS NO ACTO lento. As tradições devem manter os uma boa Queima, independentemente
pensar–se que elas se resumem ao iní- DE “PRAXAR”, QUE FOGEM A ESSE ESPÍRITO mesmos princípios, de modo a que não do problema financeiro que vem do ano
cio do ano, com a recepção aos caloiros, A QUE SE REFERE. A QUEM DEVE PERTEN- se perca a identidade, mas devem adap- anterior. Portanto não é por falta de in-
considero que se trata de uma visão CER A “FISCALIZAÇÃO” DA PRAXE? AO tar-se à evolução natural da sociedade, vestimento que esta Queima pode ser,
muito redutora, pelo menos no que CONSELHO DE VETERANOS? até porque a prática da tradição é feita de forma alguma, criticada.
concerne à Universidade de Coimbra. A praxe auto fiscaliza-se, no sentido por gerações diferentes, que vão mu-
em que a hierarquia que está acima po- dando de acordo com a sua formação QUE MOMENTOS ESPERA QUE SEJAM OS
EM RELAÇÃO AOS “CALOIROS”, A PRAXE É de interferir com a de baixo, anulando ao longo dos tempos. MAIS ALTOS DA QUEIMA?
SOBRETUDO UMA FORMA DE INTEGRAÇÃO ordens ou acções delineadas pelas hie- Na primeira noite vamos ter a Mela-
NA UNIVERSIDADE E NA ACADEMIA? rarquias inferiores. Isso permite um au- TODOS OS ESTUDANTES DEVEM OBEDECER nie C. Espero que dê um grande concer-
É uma forma de integração e deve to controle entre os estudantes das di- À PRAXE ACADÉMICA E VIVER AS TRADI- to e que o pessoal adira, não só os estu-
ser só isso. O “caloiro” está na hierar- versas hierarquias. Por exemplo, se um ÇÕES E COSTUMES ACADÉMICOS, MAS A dantes mas a cidade de uma forma ge-
quia mais baixa da praxe, mas também “quintanista” ou “quartanista” for a REALIDADE É QUE, POR VEZES, OS TRABA- ral. Mas o momento alto, para não va-
tem alguns direitos em termos praxísti- passar na rua e vir um “semiputo” a fa- LHADORES-ESTUDANTES SE SENTEM UM riar, será quase de certeza o cortejo dos
cos. E há algo que nunca se deve esque- zer asneiras numa brincadeira com um POUCO DESENQUADRADOS DE TODO ESTE “quartanistas”, no dia 9 de Maio. É
cer: é que independentemente de ser a “caloiro”, pode dizer-lhe para parar e PROCESSO... sempre o momento mais importante da
“besta”, segundo a praxe, o “caloiro” dizer ao “caloiro” que só faz se quiser e Isso terá que ser a própria pessoa a Queima, dê lá por onde der. Espero que
não deixa de ser um colega e um estu- que pode ir embora. E o “semiputo” le- sentir e decidir. Independentemente do esteja assim um “tempinho” como o de
dante do ensino superior. E o objectivo va “nas orelhas”, para aprender a fazer tipo de vínculo que tem, o trabalhador- hoje, com a chamada “chuvinha molha-
deve ser integrá-lo numa comunidade, as coisas bem feitas. Há portanto uma -estudante é estudante e portanto igual -tolos”, que cai sempre muito bem no
num espírito, e não afastá-lo. Ou seja, auto-regulação. Ao Conselho de Vetera- aos outros. Para a praxe não interessa se dia do cortejo porque nos poupa muitos
deve-se brincar com ele mas de modo nos compete fazer com que as normas é trabalhador ou não, pois tem tal e problemas e diminui o risco de incên-
que ele também se esteja a divertir. Por- sejam bem conhecidas por todos, de qual os mesmos direitos que os outros e dio nos carros.
que se assim não acontecer, deixa de ser modo a que toda a gente conheça as re- ninguém questiona essa situação. Se ca-
praxe e passa a ser mais um “ressabian- gras e as aplique e faça aplicar devida- lhar não se sente de facto tão enquadra- O CORTEJO É SEMPRE UM MOMENTO DE
ço” de quem o está a “praxar”, se calhar mente. do, mas pelas dificuldades que tem em ALGUMA CRÍTICA SOCIAL. NUM MOMENTO
9. DE 26 DE ABRIL A 09 DE MAIO DE 2006
ENTREVISTA 9
EM QUE A COMUNIDADE ESTUDANTIL VOL- a imaginação ande cada vez a ficar mais das pelos conimbricenses em geral, pa- sam um pouco, nomeadamente quan-
TA A ESTAR NA RUA, COM NOVAS LUTAS, O fraca. Tem havido sátira, é certo, mas ra o que contribuem os preços, que não do com os copos pensam que podem
QUE ESPERA EM RELAÇÃO A ESSE ASPECTO? não de uma forma tão acutilante como estão demasiado “puxados”. Pagar 16 fazer tudo e não podem, mas se por-
O primeiro cortejo realizou-se em antigamente. euros para a ouvir a Melanie C e 15 em ventura decidíssemos não realizar a
1899, no Centenário da Sebenta, preci- todos os outros dias, com boas bandas, Queima, toda a cidade ia sentir a falta
samente com o objectivo de sátira à so- FESTA DA CIDADE parece-me francamente acessível. De- desta festa. Que é de todos! E toda a
ciedade. Esse é, desde o início, um dos pois há toda a animação das tendas do cidade ia pedir, em clamor, para que
objectivos primários do cortejo, e que se A QUEIMA DAS FITAS É UMA FESTA DE TO- parque, com um espírito e uma mística realizássemos a Queima. Ou seja, os
manteve durante o período da censura, DA A CIDADE DE COIMBRA? muito próprios, e onde todos são bem- estudantes fazem umas “maluquices”
no qual as coisas tinham de ser escritas A Queima é uma festa de estudantes -vindos. que por vezes causam algumas dores
de uma forma muito especial. Todos os e para estudantes, mas também para to- de cabeça aos “futricas”, que não gos-
anos, todos os carros levam alusões sa- da a cidade de Coimbra. A prova disso ACTUALMENTE COMO SE PROCESSAM AS tam de certos abusos, mas se os estu-
tíricas, normalmente direccionadas à é que as actividades desportivas e cul- RELAÇÕES ENTRE ESTUDANTES E “FUTRI- dantes param de fazer isso a cidade es-
sua faculdade ou área de acção. E este turais, que já começaram, envolvem to- CAS”? tranha e quase que pede para voltarem
cortejo não vai certamente fugir à regra da a cidade. As noites do parque tam- É uma relação de amor-ódio. É ver- ao “estado normal” e à animação que
embora, infelizmente, nos últimos anos bém são normalmente muito frequenta- dade que por vezes os estudantes abu- lhes é característica.
ACTUAL DUX VETERANORUM VAI EM SEIS ANOS DE MANDATO
Capa
A sucessão tranquila e batina
João Luís Jesus, finalista do curso de Actualmente é muito raro ver um es-
Engenharia Electrotécnica e Computa- tudante usar a capa e batina todos os
dores, foi eleito Dux Veteranorum em dias...
2000. Ao cabo de seis anos de mandato O uso generalizado da capa e batina
e a par com o desejo de concluir o cur- limita–se a três/quatro ocasiões duran-
so, confessa que “a sucessão já está a te o ano e, de facto, são poucos os estu-
ser pensada há algum tempo”, subli- dantes que a usam mais regularmente.
nhando que as “pessoas não se devem Regra geral usam no início do ano, na
agarrar aos lugares, até porque cada Latada, na Queima e depois também
geração de estudantes acrescenta algo em acontecimentos pontuais, como por
de novo e faz evoluir a praxe”. Além exemplo eleições. Digamos que é um
disso, reforçando a ideia de que a su- uso sazonal. Houve uma massificação
cessão poderá justificar-se dentro de muito grande do uso da capa e batina,
um breve período, João Luís Jesus con- quase toda a gente tem, mas são pou-
sidera estarem cumpridos alguns dos cos os que a usam regularmente.
objectivos a que se propôs, entre os
quais “a revisão da praxe e a melhoria QUAL A OPINIÃO DO DUX VETERANORUM
da imagem do Conselho de Veteranos SOBRE ESTA QUESTÃO?
junto dos estudantes, de modo a não É mais uma questão que se enquadra
parecerem aqueles ‘gajos’ maus que no que disse no início, que a praxe é
perseguem os estudantes, mas antes e uma maneira de estar. Não se pode
unicamente estudantes veteranos que obrigar ninguém a usar capa e batina.
percebem algo mais sobre a praxe e aju- Os estudantes é que têm de se sentir
dam a fazer cumpri-la”. bem e ter orgulho em usá-la. Mas já as-
sisti várias vezes aparecer alguém de
capa e batina num dia “normal” e o
JOÃO LUÍS JESUS EXPLICA ALGUNS CONCEITOS pessoal “olhar de lado” e perguntar o
que aconteceu para estar assim vestido.
Ou seja, tem que haver sempre um
Veterano é diferente de cábula motivo especial para se usar a capa e
batina e são muito poucos os que a
usam porque se sentem bem e gostam
de usar. É uma questão de os estudan-
Para melhor compreensão desta entre- Forma como o Conselho de Veteranos tes entrarem no espírito do que é a pra-
vista e da forma como, na prática, se pro- se enquadra na Queima das Fitas: “O xe e da identidade própria da academia
cessam as relações das diversas hierar- Conselho de Veteranos é uma das entida- de Coimbra.
quias de estudantes da Universidade de des supervisoras da Queima das Fitas e
Coimbra com as tradições académicas, so- tem sempre um elemento na Comissão
licitámos ao Dux Veteranorum a definição Organizadora, que é por inerência o Dux
de alguns dos conceitos mais importantes. Veteranorum”.
Dux Veteranorum: “O Dux Veterano- O que é um veterano?: “Ao contrário
rum, ou chefe dos veteranos, traduzindo do que regra geral se pensa, que os vete-
do latim, é um veterano eleito pelos ou- ranos são os cábulas que andam por aqui
tros veteranos numa reunião convocada há muitos anos sem fazer nenhum, um es-
para o efeito. Não é necessariamente o tudante para atingir o estatuto de vetera-
aluno mais velho da Universidade, e nes- no tem de estar obrigatoriamente no final
te caso concreto eu não sou o aluno mais do curso e ter mais matrículas do que as
velho, mas aquele que entre os candidatos necessárias para o concluir. Portanto não
obtém a maioria absoluta dos votos na basta ter mais do que as matrículas nor-
reunião de eleição”. mais do curso para ser considerado vete-
Conselho de Veteranos (ou Magnum rano. Por exemplo, um aluno que tenha
Concilium Veteranorum): “O Conselho 10 matrículas mas que esteja no primeiro
de Veteranos é uma reunião de veteranos, ano, não é veterano. Ou seja, como manda
presidida pelo Dux Veteranorum, que de- a praxe, todo e qualquer veterano ou está
libera sobre todas as questões que tenham no último ou no penúltimo ano, portanto
a ver com a tradição académica dos estu- quase a acabar, e já usou insígnias pes-
dantes da Universidade de Coimbra”. soais”.