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Jornada dos Cursos de História, Geografia e
Arquitetura: Espaço, História e Globalização
GLOBALIZAÇÃO E ESPAÇO URBANO
Natália Lemos dos Santos1
Paula Valéria Coiado Chamma2
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo analisar a dinâmica da globalização e sua
interferência no espaço urbano. As transformações do espaço público na sociedade
contemporânea apontam mudanças nos estilos de vida, na percepção do tempo e
do espaço e nos usos da cidade. A dicotomia público-privado indica como o espaço
é transformado pelo processo da globalização.
Palavras-chave: Globalização. Espaço público. Espaço privado.
1 INTRODUÇÃO
A maioria dos brasileiros vive hoje em cidades. Até mesmo a população que
não vive nas cidades tem um modo de vida urbano, em diferentes aspectos. Os
modernos meios de comunicação e as facilidades de transporte proporcionadas pelo
processo de globalização diminuem as distâncias e diferenças nas categorias de
espaço urbano e rural.
Grupos sociais que poderiam ter suas necessidades satisfeitas com uma
produção local estabelecem, cada vez mais, uma relação de dependência com
aqueles que são detentores dos meios de produção e de tecnologias. A circulação
de bens e pessoas facilitadas com a mecanização e motorizações diminuíram as
distâncias entre cidades.
1
Aluna do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP.
2
Profª. Drª. do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP.
18
A cidade que se caracterizava pelo local do encontro e da troca, torna-se com
a globalização o local de passagem de pessoas, de serviços, de mercadorias e de
informações.
Na sociedade capitalista, consumir é sinônimo de ascensão social. O espaço
privado ou a propriedade privada é valorizado em detrimento ao espaço público. Ter
a posse de um espaço inacessível ao uso público torna-se sinônimo de poder.
Salvo a minoria privilegiada, as populações urbanas dos países
subdesenvolvidos e em desenvolvimento vivenciam uma situação de subconsumo.
No entanto, as cidades aumentam com a mesma velocidade com que acontece o
isolamento dos cidadãos e a segregação social.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 ESPAÇO PÚBLICO E ESPAÇO PRIVADO
A dicotomia público-privado é manifestada em relação ao espaço desde muito
tempo, antes mesmo de o mundo todo ter ciência dos efeitos da globalização. Com
base em Sennett (1943) verifica-se que já no século XVII o público era usado no
sentido de aberto à observação de qualquer pessoa. O privado significava uma
região protegida da vida, definida pela família e pelos amigos. No Renascimento, a
palavra público significava o bem comum ou o corpo político e gradualmente o
público foi se tornando o espaço da sociabilidade. A expressão “sair em público” era
usada na época e persiste até hoje. No século XVIII, nas cidades de Paris e
Londres, grupos diversos estavam entrando em contato com a sociedade.
De acordo com o termo francês registrado em 1738, o homem público urbano
era designado “cosmopolita”. O cosmopolita era um homem que se movimentava
despreocupadamente em meio à diversidade, que está à vontade em situações sem
nenhum vínculo nem paralelo com aquilo que lhe é familiar. Assim sendo, o público
significava uma vida que se passava fora da vida da família e dos amigos íntimos.
Era o espaço de convivência de grupos sociais diferentes, cujo contato era
inevitável.
Nessa época que surgiram enormes parques urbanos, ruas com passeio para
pedestres, centros sociais como bares, cafés, estalagens, abertura do teatro e ópera
para todos, através da compra de entradas.
19
No século XIX, o capitalismo industrial estimulou a privatização dos espaços.
A família tornou-se cada vez mais o refúgio ideal, com valor moral mais elevado em
relação ao domínio público, pois em público ocorriam violações morais, rompimento
de leis. Era em público que a sociedade experimentava sensações e relações
humanas que não poderiam ser experimentadas em qualquer outro espaço.
Segundo Relph (1987), as paisagens são feitas pelas idéias e pela
construção, e a última década do século XIX estava cheia de idéias sobre a forma
como a sociedade e as cidades evoluiriam no futuro. Uma vaga de inovações
tecnológicas prometia progressos drásticos ao nível do conforto e da saúde,
enquanto as filosofias do socialismo sugeriam que esses progressos estariam em
breve ao alcance de todos.
O domínio público e privado se diferenciava para homens e mulheres da
época. Para as mulheres o público significava o perigo, o risco de perder as virtudes.
Já para o homem o público tinha uma conotação moral diversa, pois podiam “perder-
se em público”
O público e o privado carregam ainda muitas conotações da história. Ferreira
(1986) afirma que o público tem vários significados, entre eles, relativos ou
pertencentes ao povo, à coletividade; relativo a governo; o que é de uso comum; o
que é aberto a qualquer pessoa; o que não é secreto; conjunto de pessoas que
assistem a espetáculos, reuniões; conjunto de pessoas que lêem, vêem ou ouvem
uma obra literária, dramática, musical.
O privado significa o que não é público, o desprovimento, a carência.
Atribuindo-se o conceito de privado ao espaço consideram-se os espaços livres
urbanos, utilizados pelos diferentes grupos sociais. Toda sociedade tem seus
códigos culturais que viabilizam a apropriação dos espaços urbanos, que se
constituem em dois tipos: espaços construídos (casas, lojas, indústrias, igrejas,
bares, escolas) e livres (ruas, vielas, avenidas, becos, largos, praças, jardins, pátios,
quintais, parques, terrenos baldios, praias). Embora o espaço construído seja
fechado ou privado nada impede que seja público. O espaço livre, embora aberto,
pode também ser privado.
Entre essas tipologias dos espaços urbanos se estabelecem as relações de
apropriações. Para Santos, Vogel e Mello (1985):
20
as manifestações sócios-culturais são características de um grupo e que
servem para distingui-lo, em relação a quem é de fora e para seus próprios
membros, sempre estarão referidas ao conceito de “abertura” de espaço. Irão
se dar em locais públicos ou naqueles que, por força de um uso especial,
passarão a ser vistos “como se fossem públicos”. Jogos, reuniões, festas,
encontros, cerimônias e atividades semelhantes que se oponham às idéias de
privacidade e de intimidade, encontram na rua o seu lugar ideal. É aí que
deve estar o que é de todos, de modo que, quando se dão em locais
fechados, fazem-nos sofrer uma transformação. Em contrapartida, quando
são levados à rua ações que tenham sentido particular e restrito, a via pública
como que se fecha.
Na definição de Macedo (1996) espaços livres são todos aqueles não
contidos entre as paredes e tetos dos edifícios construídos pela sociedade para sua
moradia e trabalho. Para ele há divisão nos espaços livres urbanos, que devem ser
classificados em espaços livres de edificação e espaços livres de urbanização. Nos
espaços livres de edificação encontra-se toda sobra de terreno não edificado no lote,
utilizado para quintais ou para jardins. Assim sendo, a morfologia urbana,
particularmente no quarteirão, influi na possibilidade ou não da existência desse
espaço livre. Além disso, o reparcelamento do solo e a propriedade do solo alteram
os lotes, pois as formas de apropriação por diferentes extratos sociais da população
influenciam a concepção dos espaços livres urbanos de edificação.
No Brasil esses espaços livres de edificação se modificaram também através
do tempo, acompanhando a própria evolução das cidades. No período colonial, as
vilas e cidades apresentavam casas térreas e assobradadas construídas no
alinhamento da via pública e sobre os limites laterais do terreno. Já no século XIX as
casas urbanas se afastavam dos terrenos vizinhos laterais, surgindo os jardins
laterais, passando a exigir mudanças nos tipos de lotes. No século XX as casas
urbanas passam a exigir não só o afastamento lateral como o afastamento da rua.
Nos espaços livres de urbanização estão todos os espaços e áreas verdes
urbanas, bem como as áreas de lazer e de circulação. Considera-se espaço verde
toda área urbana ou porção do território ocupada por qualquer tipo de vegetação e
que tenha um valor social, como são as áreas utilizáveis na produção de alimentos e
as áreas de preservação ambiental. Já a área verde é toda e qualquer área que
exista vegetação, como são as praças, jardins e avenidas. Se essa área verde for
destinada prioritariamente ao lazer é considerada área de lazer, mesmo que seja
todo e qualquer espaço livre de edificação, ativo (área de jogos e brincadeiras) ou
passivo (áreas de contemplação). A área de circulação é atribuída aos sistema de
21
comunicação e circulação urbana (ruas, avenidas, rotatórias, rodovias, ferrovias,
hidrovia).
A globalização modificou o conceito de espaço público e privado nas cidades
contemporâneas. O processo de globalização é ao mesmo tempo econômico, social
e cultural e estabelecem uma integração entre os países e as pessoas do mundo
todo. É a expansão do capitalismo gerando novas formas de relações entre as
nações.
2.2 A GLOBALIZAÇÃO E AS MODIFICAÇÕES NO ESPAÇO PÚBLICO
A globalização consiste em um movimento de transnacionalização das
grandes empresas, transformações tecnológicas e científicas, avanços dos meios de
comunicação, dissolução das fronteiras nacionais, diminuição do poder do Estado e
privatizações das estatais.
O processo de globalização teve suas origens na era dos descobrimentos e
das grandes navegações. Fatores históricos, como a queda do muro de Berlim,
fortaleceram o capitalismo, bem como o fim da Guerra Fria. Esse processo foi
intensificado com a formação dos blocos econômicos, que tem como objetivo a
unificação econômica entre países.
No Brasil, como em todo mundo, as cidades os espaços também vistos como
produtos de consumo assistem à deterioração dos espaços públicos, principalmente
da área central. Esses espaços vão sendo abandonados ou degradados,
destinando-se muitas vezes à passagem das pessoas e não à permanência. Soma-
se a isso a falta de incentivo governamental e as diferenças sociais. O resultado é a
morte dos espaços públicos de urbanização, que em geral, dependem dos governos
municipais e do uso adequado por parte da população para sobreviverem.
Os espaços públicos urbanos, principalmente, nos grandes e médios centros
urbanos, são destinados ao uso da população mais carente, para os mais diferentes
fins. Segundo Frúgoli (1995) os homens que se apropriam dos espaços públicos,
adaptando-os e modificando-os às suas necessidades específicas são os chamados
atores sociais de rua. São eles; os desempregados, os engraxates, os ambulantes,
as prostitutas, os idosos e aposentados, os mendigos, os marginais e as crianças de
rua. Para atender suas necessidades os atores de rua subvertem o caráter
democrático da cidade, na medida em que criam um domínio privado no espaço
22
público. Certos atores de ruas demarcam o espaço público com “regras” por eles
estabelecidas, determinam “posses” de “pontos”, estabelecem lideranças e alianças.
Nesses casos, os espaços públicos tornam-se espaços privados.
A conjugação de todos esses fatores faz com que os espaços públicos
urbanos, especialmente os espaços livres estejam cada vez menos utilizados. Os
shoppings centers, de propriedade privada são considerados o edifício símbolo da
globalização, a representação máxima do consumismo. Ele permite o uso
interclasses, com certa predominância dos estratos mais privilegiados e da classe
média. É um espaço privado funcional, de ocupação organizada, seletiva, previsível
e controlada e dá a idéia de proteção contra os males do espaço público. São
cidades dentro das cidades, expressões da centralidade urbana, possibilitando a
ilusão de acesso público e de segurança.
Os shoppings centers transformaram-se em cenários para as relações sociais
como lazer, encontros, ócio, exibição, passeio e principalmente o consumo,
modificando as relações temporais, já que na maioria deles o espaço intramuros
proporcionado isolamento com o exterior, possibilitado pelo sistema de iluminação
artificial e pelo sistema de circulação, refrigeração ou de aquecimento do ar.
Mas os shoppings dão margem a um conjunto de ocupações por parte de
diversos grupos sociais que eventualmente não agradam a grupos de maior poder
aquisitivo, podendo levar a uma nova resignificação na apropriação desse espaço.
2.3 A GLOBALIZAÇÃO E AS MODIFICAÇÕES NO ESPAÇO PRIVADO
É no espaço livre da edificação que se caracteriza o espaço privado, mais
especificamente, no lote. O modelo ideal de lote no mundo globalizado é aquele em
que é possível ter a edificação, com afastamentos laterais e frontais e de preferência
espaço para automóveis.
A impossibilidade sócio-econômica na aquisição de um lote com bom padrão
dimensional por classes de baixo poder aquisitivo faz surgir adaptações e
apropriações indevidas nos espaços livres, criando uma cidade real que difere da
cidade legal. Em quase todas as cidades brasileiras a situação é a mesma, mas
permanece a inexistência de programas de implementação de espaços livres de
edificação, destinado ao lazer, principalmente para as camadas mais carentes da
23
sociedade. Para as camadas de melhor poder aquisitivo, a solução implementada é
a dos condomínios, enfatizando cada vez mais a criação dos espaços privados.
Os condomínios são a resposta rápida para a busca dos espaços livres de
edificação e, ao mesmo tempo, de urbanização, pois neles são implantadas áreas
de lazer, praças, parques, dentro das devidas proporções, mas com a vantagem da
segurança do espaços privados. Eles são a representação da negação do espaço
público. Embora sejam eles espaços organizados para moradia procuram recriar
internamente uma “comunidade”, cuja identificação está principalmente no mesmo
patamar sócio-econômico. São espaços à parte das cidades.
Nas populações de composição social de classe média, as loteadoras
vendem a idéia dos condomínios, embora com menor ostentação. No entanto a
principal motivação para sua implantação é a proteção quanto à violência urbana.
2.4 INFLUÊNCIA DA GLOBALIZAÇÃO NA ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA
As exigências colocadas pela globalização resultaram numa competição
nacional e internacional voltada para atração de investimentos, capitais, atividades
administrativas e comerciais e para o incremento da movimentação turística visando
dinamizar as estruturas econômicas das cidades.
O aumento e a diversificação da produção industrial refletiram diretamente na
organização da indústria da construção e nas mudanças da estrutura dos países
implantando a produção dos bens duráveis, que se tornaram mais acessíveis pela
propagação e facilidade de crédito ao consumidor.
A produção de materiais em larga escala modificou o cotidiano das pessoas,
principalmente das classes média e alta. As inovações tecnológicas do final do
século XIX modificaram a aparência das cidades. O aço estrutural torna possível a
construção de arranha-céus, a eletricidade muda o aspecto da noite e os automóveis
por sua vez também pedem adaptações no desenho urbano. As cidades passam a
precisar de aeroportos e são povoadas por anúncios e comunicação visual de todo o
tipo.
A globalização mudou tudo, tornou o mundo um lugar mais imprevisível, mais
competitivo, eliminou quase que completamente ou enfraqueceu as antigas idéias
culturais e artísticas, tornando a arquitetura um desafio ainda maior. Não se tem
24
mais um contexto limitado para dizer o que é bom ou não e nem é possível rotular
um estilo, pois os rótulos se foram.
A arquitetura foi sempre condicionada pelas contradições dos processos
sócio-econômicos. No século XX construiu-se tanto que o espaço rural se tornou
urbano e com isso foi perdido o equilíbrio de ambiente natural e construído.
O mercado passou à exigir que o arquiteto equilibrasse a relação custo-
benefício de uma obra, tornando a criação um pouco limitada. Por outro lado, a
facilidade de informação e materiais de altíssima tecnologia possibilitam aos
arquitetos a liberdade de criar e pensa. É necessário superar esse momento de
embriaguez de tanta informação e balancear a relação entre possibilidade de
criações e até onde o mercado pode aceitar financeiramente essas criações.
Nos prédios antigos é possível notar o exagero de espaços e abuso de
medidas, pois o mercado oferecia e podia pagar por isso, hoje essa questão de
espaço já está muito mais restrita. A busca pelo imóvel próprio fez com que
houvesse uma supervalorização do mercado imobiliário.
Segundo Relph (1987), a arquitetura se tornou com o tempo, uma forma de
demonstração de status, com isso a vida dos menos favorecidos e dos que não tem
poder é diretamente afetada pelas paisagens, já que pouco alteram seu entorno e
apenas se adaptam. Já os ricos e politicamente poderosos podem alterar em larga
escala as paisagens conforme suas necessidades para exibirem a suposta
superioridade social.
O resultado global é uma paisagem urbana caracterizada, sobretudo pelo seu
trabalho de composição de funções, onde há lugar para tudo e tudo tem um lugar
definido, segundo Alison Ravetz (1983), denomina-a “a cidade segregada”.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A discussão do espaço público e privado apresenta uma dinâmica social com
aceleradas modificações no tempo e no espaço. O que foi público no passado torna-
se privado no presente. O que é privado no momento poderá se tornar público no
futuro. Da Antiguidade à Idade Barroca a representação máxima do espaço público,
ou seja, a praça, foi concebida para a reunião da coletividade. Era a própria imagem
pública facilmente identificada pelo cidadão, onde ele se sentia livre. Nas cidades
reurbanizadas do século XIX, as praças eram deixadas à parte. Valorizava-se os
25
grandes espaços exteriores, que se tornaram impróprios para o uso coletivo. No
modernismo, a arquitetura do vidro prometia oferecer a integração entre o espaço
público e privado.
O encurtamento das distâncias entre as cidades e nações, a melhoria do
sistema de informação e de meios de comunicação, a possibilidade de se trabalhar
em casa e passar maior tempo com a família não facilitou o lazer nos espaços livres
urbanos. A facilidade em reencontrar pessoas, fazer novos contatos, integrar pelo
acesso instantâneo à informação, surpreendeu e construiu uma relação do homem
com o tempo e o espaço.
As vantagens do comércio digital interferiram no espaço da cidade. O
mercado local cedeu lugar ao mercado digital devido à redução dos custos com
pessoal, com as instalações físicas e manutenção, segurança aos usuários. A
internet elimina a presença física nas relações pessoais e comerciais.
Por outro lado, a mundialização dos saberes, a ampliação do conhecimento
das outras culturas em relação ao turismo, gastronomia, moda, arquitetura, música,
cinema possibilitou um avanço cultural na sociedade.
Na atualidade, o fax, o computador, a tv à cabo, os serviços on-line estão
favorecendo a não-distinção entre espaço de moradia e de trabalho, sendo
desnecessário buscar nas ruas as mercadorias. Sendo as cidades o reflexo de seus
cidadãos, é essencial conhecer o comportamento humano para supor os caminhos
futuros do espaço público e privado.
O homem está preocupado cada vez voltado para si próprio, com suas
emoções particulares. Há uma confusão entre vida pública e privada: as pessoas
tratam, em termos de sentimentos pessoais, assuntos públicos, que deveriam ser
tratados dentro dos códigos da impessoalidade. Convivem menos socialmente a
cada dia.
O mundo globalizado tornou-se a metáfora da democracia, onde todos tem
acesso a tudo. Porém aumenta a distância entre os que têm acesso e os que não
têm, por conseqüência aumentam as disparidades sociais
Os espaços livres de uso público privado podem ser reapropriados, com
programas de incentivo por parte dos governantes, estimulando a cidadania e
conscientizando a população na importância de vivenciar sua cidade.
26
A paisagem urbana precisa ser revalorizada, devolvendo a ela o que há de
histórico, de memória, de sociabilidade, de convivência, de identidade e de traço
humano na cidade.
GLOBALIZATION AND URBAN SPACE
ABSTRACT
The present article aims at analyzing the dynamics of globalization and
interference in urban areas. The transformations of the public space in the
contemporary society show changes in life-style, in the perceptions of time and
space, and in the uses of the city. The public-private dichotomy shows how the space
changes in the process of globalization.
Keywords: Globalization. Public space. Private space.
REFERÊNCIAS
ARANTES, O. B. F. O lugar da arquitetura depois dos modernos. São Paulo:
EDUSP; FAPESP, 1993.
FARIA, H. F.; SOUZA, V. Vidadania cultural em São Paulo. Revista Pólis, São
Paulo, n. 28,1997.
REIS FILHO, N. G. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva,
1995.
FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1986.
FRÚGOLI, H. J. São Paulo: espaços públicos e interação social. São Paulo:
Marco Zero, 1995.
MACEDO, S. S. Paisagem Urbana : os espaços livres como elementos de desenho
urbano. Bauru: UNESP, 1996 (Cadernos Paisagem, Paisagens 1 - Uma visão
interdisciplinar sobre o estudo da Paisagem).
SANTOS, C. N. F.; VOGEL, A.; MELLO, M. A. da S. Quando a rua vira casa. São
Paulo: Projeto Arquitetos Associados, 1985.
27
SENNETT, R. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. São Paulo:
Cia das Letras, 1988.
RELPH, E. A Paisagem Urbana Moderna. Rio de Janeiro: Edições 70, 1987.

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Globalização e espaços urbanos

  • 1. 17 Jornada dos Cursos de História, Geografia e Arquitetura: Espaço, História e Globalização GLOBALIZAÇÃO E ESPAÇO URBANO Natália Lemos dos Santos1 Paula Valéria Coiado Chamma2 RESUMO O presente artigo tem por objetivo analisar a dinâmica da globalização e sua interferência no espaço urbano. As transformações do espaço público na sociedade contemporânea apontam mudanças nos estilos de vida, na percepção do tempo e do espaço e nos usos da cidade. A dicotomia público-privado indica como o espaço é transformado pelo processo da globalização. Palavras-chave: Globalização. Espaço público. Espaço privado. 1 INTRODUÇÃO A maioria dos brasileiros vive hoje em cidades. Até mesmo a população que não vive nas cidades tem um modo de vida urbano, em diferentes aspectos. Os modernos meios de comunicação e as facilidades de transporte proporcionadas pelo processo de globalização diminuem as distâncias e diferenças nas categorias de espaço urbano e rural. Grupos sociais que poderiam ter suas necessidades satisfeitas com uma produção local estabelecem, cada vez mais, uma relação de dependência com aqueles que são detentores dos meios de produção e de tecnologias. A circulação de bens e pessoas facilitadas com a mecanização e motorizações diminuíram as distâncias entre cidades. 1 Aluna do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP. 2 Profª. Drª. do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP.
  • 2. 18 A cidade que se caracterizava pelo local do encontro e da troca, torna-se com a globalização o local de passagem de pessoas, de serviços, de mercadorias e de informações. Na sociedade capitalista, consumir é sinônimo de ascensão social. O espaço privado ou a propriedade privada é valorizado em detrimento ao espaço público. Ter a posse de um espaço inacessível ao uso público torna-se sinônimo de poder. Salvo a minoria privilegiada, as populações urbanas dos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento vivenciam uma situação de subconsumo. No entanto, as cidades aumentam com a mesma velocidade com que acontece o isolamento dos cidadãos e a segregação social. 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 ESPAÇO PÚBLICO E ESPAÇO PRIVADO A dicotomia público-privado é manifestada em relação ao espaço desde muito tempo, antes mesmo de o mundo todo ter ciência dos efeitos da globalização. Com base em Sennett (1943) verifica-se que já no século XVII o público era usado no sentido de aberto à observação de qualquer pessoa. O privado significava uma região protegida da vida, definida pela família e pelos amigos. No Renascimento, a palavra público significava o bem comum ou o corpo político e gradualmente o público foi se tornando o espaço da sociabilidade. A expressão “sair em público” era usada na época e persiste até hoje. No século XVIII, nas cidades de Paris e Londres, grupos diversos estavam entrando em contato com a sociedade. De acordo com o termo francês registrado em 1738, o homem público urbano era designado “cosmopolita”. O cosmopolita era um homem que se movimentava despreocupadamente em meio à diversidade, que está à vontade em situações sem nenhum vínculo nem paralelo com aquilo que lhe é familiar. Assim sendo, o público significava uma vida que se passava fora da vida da família e dos amigos íntimos. Era o espaço de convivência de grupos sociais diferentes, cujo contato era inevitável. Nessa época que surgiram enormes parques urbanos, ruas com passeio para pedestres, centros sociais como bares, cafés, estalagens, abertura do teatro e ópera para todos, através da compra de entradas.
  • 3. 19 No século XIX, o capitalismo industrial estimulou a privatização dos espaços. A família tornou-se cada vez mais o refúgio ideal, com valor moral mais elevado em relação ao domínio público, pois em público ocorriam violações morais, rompimento de leis. Era em público que a sociedade experimentava sensações e relações humanas que não poderiam ser experimentadas em qualquer outro espaço. Segundo Relph (1987), as paisagens são feitas pelas idéias e pela construção, e a última década do século XIX estava cheia de idéias sobre a forma como a sociedade e as cidades evoluiriam no futuro. Uma vaga de inovações tecnológicas prometia progressos drásticos ao nível do conforto e da saúde, enquanto as filosofias do socialismo sugeriam que esses progressos estariam em breve ao alcance de todos. O domínio público e privado se diferenciava para homens e mulheres da época. Para as mulheres o público significava o perigo, o risco de perder as virtudes. Já para o homem o público tinha uma conotação moral diversa, pois podiam “perder- se em público” O público e o privado carregam ainda muitas conotações da história. Ferreira (1986) afirma que o público tem vários significados, entre eles, relativos ou pertencentes ao povo, à coletividade; relativo a governo; o que é de uso comum; o que é aberto a qualquer pessoa; o que não é secreto; conjunto de pessoas que assistem a espetáculos, reuniões; conjunto de pessoas que lêem, vêem ou ouvem uma obra literária, dramática, musical. O privado significa o que não é público, o desprovimento, a carência. Atribuindo-se o conceito de privado ao espaço consideram-se os espaços livres urbanos, utilizados pelos diferentes grupos sociais. Toda sociedade tem seus códigos culturais que viabilizam a apropriação dos espaços urbanos, que se constituem em dois tipos: espaços construídos (casas, lojas, indústrias, igrejas, bares, escolas) e livres (ruas, vielas, avenidas, becos, largos, praças, jardins, pátios, quintais, parques, terrenos baldios, praias). Embora o espaço construído seja fechado ou privado nada impede que seja público. O espaço livre, embora aberto, pode também ser privado. Entre essas tipologias dos espaços urbanos se estabelecem as relações de apropriações. Para Santos, Vogel e Mello (1985):
  • 4. 20 as manifestações sócios-culturais são características de um grupo e que servem para distingui-lo, em relação a quem é de fora e para seus próprios membros, sempre estarão referidas ao conceito de “abertura” de espaço. Irão se dar em locais públicos ou naqueles que, por força de um uso especial, passarão a ser vistos “como se fossem públicos”. Jogos, reuniões, festas, encontros, cerimônias e atividades semelhantes que se oponham às idéias de privacidade e de intimidade, encontram na rua o seu lugar ideal. É aí que deve estar o que é de todos, de modo que, quando se dão em locais fechados, fazem-nos sofrer uma transformação. Em contrapartida, quando são levados à rua ações que tenham sentido particular e restrito, a via pública como que se fecha. Na definição de Macedo (1996) espaços livres são todos aqueles não contidos entre as paredes e tetos dos edifícios construídos pela sociedade para sua moradia e trabalho. Para ele há divisão nos espaços livres urbanos, que devem ser classificados em espaços livres de edificação e espaços livres de urbanização. Nos espaços livres de edificação encontra-se toda sobra de terreno não edificado no lote, utilizado para quintais ou para jardins. Assim sendo, a morfologia urbana, particularmente no quarteirão, influi na possibilidade ou não da existência desse espaço livre. Além disso, o reparcelamento do solo e a propriedade do solo alteram os lotes, pois as formas de apropriação por diferentes extratos sociais da população influenciam a concepção dos espaços livres urbanos de edificação. No Brasil esses espaços livres de edificação se modificaram também através do tempo, acompanhando a própria evolução das cidades. No período colonial, as vilas e cidades apresentavam casas térreas e assobradadas construídas no alinhamento da via pública e sobre os limites laterais do terreno. Já no século XIX as casas urbanas se afastavam dos terrenos vizinhos laterais, surgindo os jardins laterais, passando a exigir mudanças nos tipos de lotes. No século XX as casas urbanas passam a exigir não só o afastamento lateral como o afastamento da rua. Nos espaços livres de urbanização estão todos os espaços e áreas verdes urbanas, bem como as áreas de lazer e de circulação. Considera-se espaço verde toda área urbana ou porção do território ocupada por qualquer tipo de vegetação e que tenha um valor social, como são as áreas utilizáveis na produção de alimentos e as áreas de preservação ambiental. Já a área verde é toda e qualquer área que exista vegetação, como são as praças, jardins e avenidas. Se essa área verde for destinada prioritariamente ao lazer é considerada área de lazer, mesmo que seja todo e qualquer espaço livre de edificação, ativo (área de jogos e brincadeiras) ou passivo (áreas de contemplação). A área de circulação é atribuída aos sistema de
  • 5. 21 comunicação e circulação urbana (ruas, avenidas, rotatórias, rodovias, ferrovias, hidrovia). A globalização modificou o conceito de espaço público e privado nas cidades contemporâneas. O processo de globalização é ao mesmo tempo econômico, social e cultural e estabelecem uma integração entre os países e as pessoas do mundo todo. É a expansão do capitalismo gerando novas formas de relações entre as nações. 2.2 A GLOBALIZAÇÃO E AS MODIFICAÇÕES NO ESPAÇO PÚBLICO A globalização consiste em um movimento de transnacionalização das grandes empresas, transformações tecnológicas e científicas, avanços dos meios de comunicação, dissolução das fronteiras nacionais, diminuição do poder do Estado e privatizações das estatais. O processo de globalização teve suas origens na era dos descobrimentos e das grandes navegações. Fatores históricos, como a queda do muro de Berlim, fortaleceram o capitalismo, bem como o fim da Guerra Fria. Esse processo foi intensificado com a formação dos blocos econômicos, que tem como objetivo a unificação econômica entre países. No Brasil, como em todo mundo, as cidades os espaços também vistos como produtos de consumo assistem à deterioração dos espaços públicos, principalmente da área central. Esses espaços vão sendo abandonados ou degradados, destinando-se muitas vezes à passagem das pessoas e não à permanência. Soma- se a isso a falta de incentivo governamental e as diferenças sociais. O resultado é a morte dos espaços públicos de urbanização, que em geral, dependem dos governos municipais e do uso adequado por parte da população para sobreviverem. Os espaços públicos urbanos, principalmente, nos grandes e médios centros urbanos, são destinados ao uso da população mais carente, para os mais diferentes fins. Segundo Frúgoli (1995) os homens que se apropriam dos espaços públicos, adaptando-os e modificando-os às suas necessidades específicas são os chamados atores sociais de rua. São eles; os desempregados, os engraxates, os ambulantes, as prostitutas, os idosos e aposentados, os mendigos, os marginais e as crianças de rua. Para atender suas necessidades os atores de rua subvertem o caráter democrático da cidade, na medida em que criam um domínio privado no espaço
  • 6. 22 público. Certos atores de ruas demarcam o espaço público com “regras” por eles estabelecidas, determinam “posses” de “pontos”, estabelecem lideranças e alianças. Nesses casos, os espaços públicos tornam-se espaços privados. A conjugação de todos esses fatores faz com que os espaços públicos urbanos, especialmente os espaços livres estejam cada vez menos utilizados. Os shoppings centers, de propriedade privada são considerados o edifício símbolo da globalização, a representação máxima do consumismo. Ele permite o uso interclasses, com certa predominância dos estratos mais privilegiados e da classe média. É um espaço privado funcional, de ocupação organizada, seletiva, previsível e controlada e dá a idéia de proteção contra os males do espaço público. São cidades dentro das cidades, expressões da centralidade urbana, possibilitando a ilusão de acesso público e de segurança. Os shoppings centers transformaram-se em cenários para as relações sociais como lazer, encontros, ócio, exibição, passeio e principalmente o consumo, modificando as relações temporais, já que na maioria deles o espaço intramuros proporcionado isolamento com o exterior, possibilitado pelo sistema de iluminação artificial e pelo sistema de circulação, refrigeração ou de aquecimento do ar. Mas os shoppings dão margem a um conjunto de ocupações por parte de diversos grupos sociais que eventualmente não agradam a grupos de maior poder aquisitivo, podendo levar a uma nova resignificação na apropriação desse espaço. 2.3 A GLOBALIZAÇÃO E AS MODIFICAÇÕES NO ESPAÇO PRIVADO É no espaço livre da edificação que se caracteriza o espaço privado, mais especificamente, no lote. O modelo ideal de lote no mundo globalizado é aquele em que é possível ter a edificação, com afastamentos laterais e frontais e de preferência espaço para automóveis. A impossibilidade sócio-econômica na aquisição de um lote com bom padrão dimensional por classes de baixo poder aquisitivo faz surgir adaptações e apropriações indevidas nos espaços livres, criando uma cidade real que difere da cidade legal. Em quase todas as cidades brasileiras a situação é a mesma, mas permanece a inexistência de programas de implementação de espaços livres de edificação, destinado ao lazer, principalmente para as camadas mais carentes da
  • 7. 23 sociedade. Para as camadas de melhor poder aquisitivo, a solução implementada é a dos condomínios, enfatizando cada vez mais a criação dos espaços privados. Os condomínios são a resposta rápida para a busca dos espaços livres de edificação e, ao mesmo tempo, de urbanização, pois neles são implantadas áreas de lazer, praças, parques, dentro das devidas proporções, mas com a vantagem da segurança do espaços privados. Eles são a representação da negação do espaço público. Embora sejam eles espaços organizados para moradia procuram recriar internamente uma “comunidade”, cuja identificação está principalmente no mesmo patamar sócio-econômico. São espaços à parte das cidades. Nas populações de composição social de classe média, as loteadoras vendem a idéia dos condomínios, embora com menor ostentação. No entanto a principal motivação para sua implantação é a proteção quanto à violência urbana. 2.4 INFLUÊNCIA DA GLOBALIZAÇÃO NA ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA As exigências colocadas pela globalização resultaram numa competição nacional e internacional voltada para atração de investimentos, capitais, atividades administrativas e comerciais e para o incremento da movimentação turística visando dinamizar as estruturas econômicas das cidades. O aumento e a diversificação da produção industrial refletiram diretamente na organização da indústria da construção e nas mudanças da estrutura dos países implantando a produção dos bens duráveis, que se tornaram mais acessíveis pela propagação e facilidade de crédito ao consumidor. A produção de materiais em larga escala modificou o cotidiano das pessoas, principalmente das classes média e alta. As inovações tecnológicas do final do século XIX modificaram a aparência das cidades. O aço estrutural torna possível a construção de arranha-céus, a eletricidade muda o aspecto da noite e os automóveis por sua vez também pedem adaptações no desenho urbano. As cidades passam a precisar de aeroportos e são povoadas por anúncios e comunicação visual de todo o tipo. A globalização mudou tudo, tornou o mundo um lugar mais imprevisível, mais competitivo, eliminou quase que completamente ou enfraqueceu as antigas idéias culturais e artísticas, tornando a arquitetura um desafio ainda maior. Não se tem
  • 8. 24 mais um contexto limitado para dizer o que é bom ou não e nem é possível rotular um estilo, pois os rótulos se foram. A arquitetura foi sempre condicionada pelas contradições dos processos sócio-econômicos. No século XX construiu-se tanto que o espaço rural se tornou urbano e com isso foi perdido o equilíbrio de ambiente natural e construído. O mercado passou à exigir que o arquiteto equilibrasse a relação custo- benefício de uma obra, tornando a criação um pouco limitada. Por outro lado, a facilidade de informação e materiais de altíssima tecnologia possibilitam aos arquitetos a liberdade de criar e pensa. É necessário superar esse momento de embriaguez de tanta informação e balancear a relação entre possibilidade de criações e até onde o mercado pode aceitar financeiramente essas criações. Nos prédios antigos é possível notar o exagero de espaços e abuso de medidas, pois o mercado oferecia e podia pagar por isso, hoje essa questão de espaço já está muito mais restrita. A busca pelo imóvel próprio fez com que houvesse uma supervalorização do mercado imobiliário. Segundo Relph (1987), a arquitetura se tornou com o tempo, uma forma de demonstração de status, com isso a vida dos menos favorecidos e dos que não tem poder é diretamente afetada pelas paisagens, já que pouco alteram seu entorno e apenas se adaptam. Já os ricos e politicamente poderosos podem alterar em larga escala as paisagens conforme suas necessidades para exibirem a suposta superioridade social. O resultado global é uma paisagem urbana caracterizada, sobretudo pelo seu trabalho de composição de funções, onde há lugar para tudo e tudo tem um lugar definido, segundo Alison Ravetz (1983), denomina-a “a cidade segregada”. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A discussão do espaço público e privado apresenta uma dinâmica social com aceleradas modificações no tempo e no espaço. O que foi público no passado torna- se privado no presente. O que é privado no momento poderá se tornar público no futuro. Da Antiguidade à Idade Barroca a representação máxima do espaço público, ou seja, a praça, foi concebida para a reunião da coletividade. Era a própria imagem pública facilmente identificada pelo cidadão, onde ele se sentia livre. Nas cidades reurbanizadas do século XIX, as praças eram deixadas à parte. Valorizava-se os
  • 9. 25 grandes espaços exteriores, que se tornaram impróprios para o uso coletivo. No modernismo, a arquitetura do vidro prometia oferecer a integração entre o espaço público e privado. O encurtamento das distâncias entre as cidades e nações, a melhoria do sistema de informação e de meios de comunicação, a possibilidade de se trabalhar em casa e passar maior tempo com a família não facilitou o lazer nos espaços livres urbanos. A facilidade em reencontrar pessoas, fazer novos contatos, integrar pelo acesso instantâneo à informação, surpreendeu e construiu uma relação do homem com o tempo e o espaço. As vantagens do comércio digital interferiram no espaço da cidade. O mercado local cedeu lugar ao mercado digital devido à redução dos custos com pessoal, com as instalações físicas e manutenção, segurança aos usuários. A internet elimina a presença física nas relações pessoais e comerciais. Por outro lado, a mundialização dos saberes, a ampliação do conhecimento das outras culturas em relação ao turismo, gastronomia, moda, arquitetura, música, cinema possibilitou um avanço cultural na sociedade. Na atualidade, o fax, o computador, a tv à cabo, os serviços on-line estão favorecendo a não-distinção entre espaço de moradia e de trabalho, sendo desnecessário buscar nas ruas as mercadorias. Sendo as cidades o reflexo de seus cidadãos, é essencial conhecer o comportamento humano para supor os caminhos futuros do espaço público e privado. O homem está preocupado cada vez voltado para si próprio, com suas emoções particulares. Há uma confusão entre vida pública e privada: as pessoas tratam, em termos de sentimentos pessoais, assuntos públicos, que deveriam ser tratados dentro dos códigos da impessoalidade. Convivem menos socialmente a cada dia. O mundo globalizado tornou-se a metáfora da democracia, onde todos tem acesso a tudo. Porém aumenta a distância entre os que têm acesso e os que não têm, por conseqüência aumentam as disparidades sociais Os espaços livres de uso público privado podem ser reapropriados, com programas de incentivo por parte dos governantes, estimulando a cidadania e conscientizando a população na importância de vivenciar sua cidade.
  • 10. 26 A paisagem urbana precisa ser revalorizada, devolvendo a ela o que há de histórico, de memória, de sociabilidade, de convivência, de identidade e de traço humano na cidade. GLOBALIZATION AND URBAN SPACE ABSTRACT The present article aims at analyzing the dynamics of globalization and interference in urban areas. The transformations of the public space in the contemporary society show changes in life-style, in the perceptions of time and space, and in the uses of the city. The public-private dichotomy shows how the space changes in the process of globalization. Keywords: Globalization. Public space. Private space. REFERÊNCIAS ARANTES, O. B. F. O lugar da arquitetura depois dos modernos. São Paulo: EDUSP; FAPESP, 1993. FARIA, H. F.; SOUZA, V. Vidadania cultural em São Paulo. Revista Pólis, São Paulo, n. 28,1997. REIS FILHO, N. G. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1995. FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. FRÚGOLI, H. J. São Paulo: espaços públicos e interação social. São Paulo: Marco Zero, 1995. MACEDO, S. S. Paisagem Urbana : os espaços livres como elementos de desenho urbano. Bauru: UNESP, 1996 (Cadernos Paisagem, Paisagens 1 - Uma visão interdisciplinar sobre o estudo da Paisagem). SANTOS, C. N. F.; VOGEL, A.; MELLO, M. A. da S. Quando a rua vira casa. São Paulo: Projeto Arquitetos Associados, 1985.
  • 11. 27 SENNETT, R. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. São Paulo: Cia das Letras, 1988. RELPH, E. A Paisagem Urbana Moderna. Rio de Janeiro: Edições 70, 1987.