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UFF – Universidade Federal Fluminense
Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e
Turismo
Departamento de Turismo
Pós-Graduação em Turismo
Apostila de Patrimônio Cultural
Profª Msc. Telma Lasmar
Museóloga
2011
2
1. INTRODUÇÂO
A elaboração desta apostila teve como objetivo facilitar o acesso dos alunos aos princípios
fundadores dos processos de preservação do patrimônio no Brasil a partir do esclarecimento dos
conceitos sobre o mesmo, desde a sua mais remota origem. Este é um capítulo de minha dissertação
de Mestrado realizada na COPPE/UFRJ em Engenharia de Produção, que teve como título A gestão
dos museus e do patrimônio no Brasil na modernidade contemporânea e as práticas turísticas.
2. PATRIMÔNIO E TOMBAMENTO NO BRASIL
2.1 As origens do IPHAN – Síntese Histórica
O sentido de “patrimônio cultural”, como bem coletivo de uma nação a ser protegido por leis,
surgiu sob o impacto da Revolução Francesa de 1789, quando a violência dos revolucionários
ameaçava destruir todo e qualquer referencial histórico e cultural do país. Segundo FONSECA
(1997:58)
Os atos de vandalismo, que se intensificaram após a prisão do rei em
Varennes, repugnavam os eruditos e contrariavam os ideais
Iluministas de acumulação e difusão do saber. Por esse motivo,
desde 1789, o governo revolucionário tentou regulamentar a proteção
dos bens confiscados, justificando essa preocupação pelo interesse
desses bens para a instrução pública.
A posse coletiva dos bens de valor histórico e artístico, até então propriedade particular dos
reis, do clero e da nobreza, trouxe consigo uma conotação de patrimônio a esses bens, que passaram
a ser reconhecidos como propriedade da nação. O fortalecimento do sentimento de nacionalidade foi
uma das decorrências da Revolução Francesa, contribuindo para a formação, em diversos países da
Europa, de museus nacionais, bibliotecas e arquivos, onde seriam guardados os testemunhos “mais
importantes” da história dos países. A nação unificada e consolidada deveria preservar, proteger e
valorizar seus bens artísticos, históricos, arquitetônicos e arqueológicos que contribuiriam com seu
significado simbólico, para a formação da identidade cidadã. Importantes manifestações de memória
coletiva - os museus, as bibliotecas, os arquivos e os bens patrimoniais adquiriram, no século XVIII,
caráter de instrumento político a serviço do universo simbólico da Nação.
Na visão de (ARANTES,1989:14), o que ocorreu com relação à ação de preservação foi que:
(...) Na maioria das sociedades contemporâneas, a produção do
patrimônio cultural passou a ser administrada pelo Estado com
maior ou menor envolvimento da sociedade civil, conforme os
regimes políticos vigentes.
3
No Brasil, o nacionalismo adquiriu caráter retórico e ufanista, a partir do início do século XX,
por volta de 1900, como sugere a obra de Afonso Celso “Porque me ufano de meu país”. Neste
contexto muita literatura de cunho nacionalista veio a ser produzida até 1930, inclusive após a
Semana de 22. Com uma linguagem literária focada no modernismo, surgiram diversos movimentos
que buscavam o fortalecimento do sentimento de nacionalidade. A partir da década de 10 do século
XX, alguns segmentos da intelectualidade brasileira começaram a manifestar a sua preocupação com
a perda das referências históricas nacionais e com a necessidade de se preservar a identidade
cultural brasileira. Várias eram as causas apontadas para tal apreensão, tais como:
1 – a urbanização das cidades – no afã de europeizá-las e torná-las modernas, demoliam-se, sem o
menor critério, referências importantes da arte, da arquitetura e da história nacional, como ocorreu,
por exemplo, com o “Bota-abaixo” do prefeito Pereira Passos, no Rio de Janeiro;
2 – a imigração – o grande número de imigrantes que se instalou nas principais cidades e no interior
do país, criando novas cidades e implantando escolas onde só se falava e estudava nas suas línguas
de origem, ameaçando a unidade nacional e
3 – o contrabando – a valorização, cada vez mais crescente, da arte sacra, de objetos e do mobiliário
do estilo barroco e rococó, principalmente da Bahia e de Minas Gerais, e ainda, de exemplares
arqueológicos, no mercado internacional, incentivando o contrabando desses objetos.
Paralelamente, os integrantes do Movimento Modernista, liderado por Oswald e Mário de
Andrade, desenvolviam pesquisas etnográficas e literárias focadas na valorização das manifestações
culturais, tanto em nível regional como nacional. Redescobrindo o Brasil, o arquiteto Lúcio Costa
buscava, nas heranças portuguesas, uma arquitetura autenticamente nacional. De suas pesquisas
origina-se um novo estilo arquitetônico, o Neocolonial, que recuperava elementos decorativos e
funcionais das casas-grandes e dos sobrados edificados até o início do século XIX, em contraposição
ao ecletismo arquitetônico predominante a partir da segunda metade daquele século. O ideário
neocolonial estava presente em diversas expressões artísticas, tais como a literatura e a pintura e
criou um clima favorável à implantação de uma política governamental de preservação dos
testemunhos de nosso passado.
Em busca desse resgate e do conhecimento do que de fato era o seu patrimônio histórico e
artístico, os governos da Bahia, em 1927 e de Pernambuco, em 1928, criaram suas Inspetorias
Estaduais de Monumentos Nacionais, iniciativas isoladas de preservação que se limitavam a
inventariar os bens locais.
A partir de 1930, o governo revolucionário de Getúlio Vargas, visando à modernização do
Ministério da Educação e Saúde, buscou dar novas orientações aos seus departamentos culturais.
Uma das primeiras iniciativas no sentido de preservar exemplares da arquitetura do período colonial
foi através do Decreto nº 22.928, de 12 de junho de 1933, que consagrou Ouro Preto como
“Monumento Nacional”, pela sua importância histórica, artística e social, revelada e divulgada por
Mário de Andrade, Manuel Bandeira, José Marianno, Gustavo Barroso e outros intelectuais, cada qual
sob sua ótica. Para Gustavo Barroso, Ouro Preto era uma “Cidade Sagrada” que deveria ser
defendida “dos insultos do tempo e protegendo das tolices dos homens a soberba floração dos seus
monumentos”. (MAGALHÃES,2001:192) Em 16 de julho de 1934, foi assinado pelo presidente Getúlio
4
Vargas o Decreto 24.735 que regulamentava a atuação, no Museu Histórico Nacional, da Inspetoria
de Monumentos Nacionais sob a direção de Gustavo Barroso, cuja missão era inspecionar e fiscalizar
os monumentos do país. Uma das mais importantes ações desta Inspetoria foi a preservação da Casa
dos Contos, alguns chafarizes e a Igreja do Rosário, em Ouro Preto.
A mentalidade preservacionista adquiriu mais consistência quando medidas legais foram
incluídas na Carta Magna de 1934. Segundo (CASTRO,1991:9), havia interesse público na
preservação, pois a (...) Constituição de 1934, no art. 148, previa a competência da União, dos
Estados e dos Municípios para: (...) proteger os objetos de interesse histórico e o patrimônio artístico
do país(...). Ainda segundo a mesma autora, a Constituição de 37 trocou a palavra objetos por
monumentos históricos e artísticos e a Constituição de 1946 substituiu as esferas administrativas pelo
Poder Público.
Convocado pelo Ministro Gustavo Capanema, Mário de Andrade elaborou, em 1936, de
acordo com o seu entendimento do que deveria ser considerado patrimônio, o projeto de um órgão
que deveria ser criado para estabelecer critérios e formas de controle para a preservação do
patrimônio histórico e artístico nacional. Mário de Andrade entendia que era preciso preservar todo o
conjunto de manifestações artísticas e culturais do país pela sua riqueza e diversidade, em
contraposição à ação da Inspetoria de Monumentos Nacionais. O projeto original de Mário de Andrade
previa que as atividades da memória, da história e da cultura nacionais deveriam estar protegidas por
uma lei reguladora. No escopo de seu projeto estavam contempladas as diversas formas de arte:
patrimoniais, indígenas, arqueológicas, eruditas e aplicadas nacionais e estrangeiras.
1
Todos os
aspectos do acervo patrimonial de brasilidade deveriam ser registrados, catalogados, preservados de
modo a serem utilizados como elementos pedagógicos de formação cultural da população, para,
conforme Mário afirmava, “abrasileirar os brasileiros”.
Em 1936, Rodrigo Melo Franco de Andrade - advogado e jornalista com grande trânsito entre
a intelectualidade nacional - foi indicado por Mário de Andrade e Manuel Bandeira e nomeado pelo
ministro Gustavo Capanema para organizar e dirigir o SPHAN – Serviço de Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional, que foi oficialmente criado pela Lei nº 378 de 13 de janeiro de 1937. Logo a seguir,
em 30 de novembro de 1937, foi promulgado o Decreto-lei nº 25, que não contemplava na íntegra o
projeto de Mário de Andrade, mas que determinava a conservação e proteção do
(...) conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja
conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a
fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional
valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.
(CAMPOFIORITO,1984:35)
1
Como obras de artes patrimoniais estavam entendidos os bens edificados e os bens a eles agregados, pertencentes ao poder
público ou a particulares; arte indígena compreendia cestaria, plumária, cerâmica e demais artefatos produzidos pelos índios; como arte
arqueológica estavam entendidas as pinturas rupestres e demais objetos encontrados em sítios arqueológicos produzidos pelo homem; arte
erudita era a produzida pela academia: como arte aplicada nacionais e estrangeiras estavam contemplados os objetos manufaturados ou
industrializados de valor artístico.
5
O agente encarregado de atribuir valores e determinar a classificação destes bens para efeito de
tutela pública era o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, através do seu Conselho
Consultivo, formado por arquitetos, historiadores e demais intelectuais. Estes bens passaram a ser
classificados como:
- obras de arte erudita nacionais e estrangeiras existentes no país;
- obras de arte aplicadas (artes menores) e
- obras de arte popular.
Muito embora contempladas com a oficialização da preservação, as artes populares e aplicadas,
a arqueologia, a arte ameríndia e as origens da raça negra no Brasil foram, nesse primeiro momento,
pouco estudadas, o que revela o caráter erudito das prioridades adotado pelo IPHAN. Para registrar
os bens a serem preservados foram criados quatro Livros de Tombo:
- Livro de Tombo Arqueológico, Etnológico e Paisagístico;
- Livro de Tombo Histórico;
- Livro de Tombo das Belas Artes e
- Livro de Tombo das Artes Aplicadas.
2
Cabe aqui ressaltar que o tombamento não esgota as formas legais de proteção dos bens
culturais. É apenas um instrumento jurídico. Mas a legislação de preservação no Brasil foi de tamanha
abrangência e vanguarda, que o Decreto-lei nº 25 de 30 de setembro de 1937 está em vigência até
hoje. As poucas alterações que sofreu, pelo Decreto-lei nº 3.866 de 29 de novembro de 1941 e pela
Lei 6.292 de 1975, só trouxeram alguns complementos.
A política de preservação do SPHAN centrava-se em conhecer e preservar as obras do
barroco, sobretudo da arquitetura dos séculos XVII e XVIII, consideradas a essência da brasilidade e
a produção material dos colonizadores portugueses: os fortes, os engenhos e as igrejas, e ainda, os
exemplares de escultura e pintura a elas ligadas. O critério de preservação adotado era o da
consagração e preservação dos símbolos das classes dominantes do passado da Nação – sedes do
poder político, religioso e militar. Estes bens tombados estavam vinculados a fatos memoráveis, mas
possuíam, acima de tudo, relevante qualidade construtiva e estética, segundo padrões então vigentes
no SPHAN. Geograficamente falando, os focos das atenções eram Minas Gerais, Rio de Janeiro e
Bahia. Seriam também consideradas “notáveis” ou de “excepcional valor” as obras neoclássicas de
Grandjean de Montigny e de seus discípulos da Imperial Academia de Belas Artes.
Embora expressivos plasticamente e edificados em quantidade significativa, os exemplares do
ecletismo do Séc. XIX não eram considerados, pelos intelectuais do SPHAN, arte brasileira. O
movimento modernista forjou seu próprio passado, numa busca pela essência da nacionalidade
brasileira e ignorando qualquer movimento artístico e arquitetônico ocorrido entre o fim do Império e a
Semana de 22. A questão não era somente estética ou conceitual, era também política: na medida em
que se voltavam para preservar o passado remoto, os modernistas (vinculados ao Estado Novo)
estavam desta forma, renegando a República Velha e todas as suas realizações. Segundo
CAMPOFIORITO (Ibid., 34), o movimento preservacionista no Brasil foi impar:
2
Os Livros de Tombo são constituídos de páginas numeradas, rubricadas e encadernadas, nas quais são lançadas, manuscritamente,
as informações sobre os bens tombados. São utilizados pelos órgãos de preservação e pelos museus.
6
(...) Sendo coisa que só ocorreu no Brasil, o antigo foi aqui
selecionado pelo modernismo revolucionário, o que explica a
ojeriza a tudo o que cheirasse a acadêmico, no sentido das belas
artes recentes do termo. Nada, entretanto, da recusa sistemática
do passado, à maneira anarquista, ou dada, dos europeus de
antes de 1914.
Preocupado em preservar o patrimônio de “pedra e cal”, o SPHAN não tomou para si a tarefa
de preservar, por exemplo, nossa produção literária e musical, mesmo que erudita, assim como o
meio ambiente.
Embora tendo toda a sua ação voltada para um passado remoto, o IPHAN reconheceu e
valorizou monumentos modernistas, tombando-os, com o visível propósito premonitório de impedir
que seus detratores tivessem, no futuro, oportunidade de demoli-los. Foi esse o caso do tombamento,
em 1947, da Igreja de São Francisco, de Oscar Niemeyer, na Pampulha, em Belo Horizonte e, em
1948, da sede do Ministério da Educação e Saúde, de Oscar Niemeyer, Lúcio Costa e outros.
Durante 30 anos Rodrigo Melo Franco de Andrade foi diretor geral do SPHAN e, segundo
Lúcio Costa (MARINHO, 1986:5), a orientação, os estudos e as pesquisas foram sempre iniciativa
dele”. Todos os anos de sua gestão foram empenhados em proteger os bens históricos e artísticos do
Brasil criando uma legislação específica; preparando e capacitando mão-de-obra técnica; executando
trabalhos de campo; lutando judicialmente contra aqueles que se opunham ao seu propósito;
empenhando seu prestígio pessoal junto a políticos e governantes para que o SPHAN sobrevivesse;
divulgando, através de suas publicações, as ações desenvolvidas; e, acima de tudo, batalhando para
a criação de uma consciência nacional de preservação. E assim, “com Rodrigo o clima no Patrimônio
era universitário. Ele orientava, atraía os colaboradores mais qualificados, editava revistas, estimulava
vocações”. (Ibid.,7)
Nos primeiros anos de criação do SPHAN, Rodrigo Melo Franco de Andrade contou com a
colaboração de intelectuais, pesquisadores, arquitetos, engenheiros, juristas, mestres de obras que,
seduzidos pelo seu entusiasmo e dedicação, empenharam-se na defesa do patrimônio cultural
brasileiro. De Manuel Bandeira a Dom Clemente da Silva Neto, de Gustavo Barroso a Vinícius de
Moraes, de Carlos Drummond de Andrade a Lúcio Costa, a mobilização em prol do resgate e da
recuperação do patrimônio edificado foi o que deu a Rodrigo a sustentação para transformar o
SPHAN num órgão de vanguarda e de reconhecimento nacional e internacional. De acordo com o
FARIA (1995:34), no Estado Novo surgiram
(...) instituições criadas para exercer o controle centralizado sobre
o espaço e as pessoas, integrantes do contexto em relação ao qual
se deve entender o surgimento da gestão do patrimônio.
Para conhecer e tombar bens patrimoniais, os técnicos faziam viagens de inspeção às
cidades do nordeste, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul. Onde houvesse monumentos históricos
e artísticos, a equipe de pesquisadores, acompanhada de fotógrafos, partia para o levantamento de
7
dados, diagnóstico do imóvel, registro fotográfico e pesquisa de documentos nos arquivos municipais
e das irmandades. Tudo havia de ser feito no recém-criado SPHAN, desde a definição conceitual de
patrimônio até as obras de restauração.
Obras de conservação, consolidação e restauração realizaram-se em proveito dos bens
tombados; foram empreendidos estudos e pesquisas relacionadas com a história e a arte no país em
diversas áreas; organizou-se arquivo de documentos e dados colhidos em arquivos públicos e
particulares, de irmandades sobretudo; iniciaram-se os trabalhos de inventário dos bens tombados;
reuniu-se valiosos arquivos fotográficos e estruturou-se uma biblioteca rigorosamente especializada; o
laboratório-ateliê recuperava obras de pintura antiga, esculturas e documentos; o setor de museus
apoiava o surgimento de novas unidades nos monumentos tombados e assegurava a preservação
das edificações e a proteção de patrimônio móvel ameaçado. (MARINHO,1986:21-22)
De acordo com ARANTES (1989:13),
“em pouco mais de dez anos estava identificada e sob proteção do
Estado a maior parte dos bens que até hoje conformam o núcleo
do patrimônio histórico oficial do Brasil”.
Com o propósito de registrar e divulgar os trabalhos e as pesquisas desenvolvidas no
SPHAN, Rodrigo Melo Franco de Andrade criou uma linha editorial denominada Publicações, para
editar ensaios e monografias, e a Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, existente até
hoje e fonte de pesquisa para historiadores e demais pesquisadores. Além disso, Rodrigo tratava de
divulgar, através da imprensa, os propósitos do SPHAN e buscava, em seus artigos, fazer com que o
patrimônio fosse de interesse de todos os brasileiros. Para ele era imprescindível que as camadas
mais pobres e iletradas da população despertassem para a tarefa de preservar e proteger os
testemunhos da história e da arte, tendo consciência de sua importância. Todavia, a missão do
SPHAN não foi de todo entendida e aceita por grande parte da população, do clero e de muitas
autoridades, nas mais diferentes instâncias. Na medida em que brigavam para defender seus próprios
interesses – na maioria das vezes contrários às propostas de preservação e conservação do SPHAN
– os oponentes recorriam à justiça e as demoradas pendengas muitas vezes eram fatais para a
sobrevivência do bem histórico, arquitetônico ou artístico em litígio.
A falta de verbas e as demandas judiciais emperravam o bom desenvolvimento dos projetos
do SPHAN. Muitas vezes, atendendo a interesses pessoais, eleitoreiros ou mesmo comerciais,
prefeitos, governadores e até presidentes da República interferiam nos processos de tombamento. A
prática de obstruir processos de tombamento em prol da especulação imobiliária com o aval dos
poderes constituídos sempre foi muito comum em nosso país, pois estes buscam transformar as
cidades em nome do progresso e da modernidade, com vistas unicamente ao seu próprio
enriquecimento.
Analisando o comportamento das classes dominantes com relação aos processos de
tombamento, CHAUÍ (1992:38) fez o seguinte comentário, ao proferir um discurso no Congresso
Internacional sobre Patrimônio Histórico e Cidadania promovido pela cidade de São Paulo, em 1991:
8
(...)aplicada a bens móveis como objetos de arte, coleções de
documentos privados, fotografias, mobiliário e assim por diante,
a legislação do patrimônio histórico contribui para valorizá-los ao
máximo perante as leis de mercado, por significar na prática
uma espécie de autenticidade de valor cultural (...) mas quando
aplicada aos bens imóveis de significação histórica e cultural,
esta mesma legislação tem sido entendida e duramente
combatida entre nós como um verdadeiro atentado ao direito de
propriedade, porque significaria na prática a desvalorização de
bens particulares.
Retornando, a gestão de Rodrigo Melo Franco de Andrade, de 1936 a 1967, pela sua
dedicação, obstinação e competência, manteve, durante todo esse período, a maior autonomia que
qualquer órgão público jamais teve e foi fundamental, não só para a preservação do patrimônio
histórico e artístico constituído, como ainda, para o resgate da memória histórica do Brasil, através
das inúmeras restaurações de documentos cartoriais e eclesiásticos. Uma das últimas grandes
conquistas de sua gestão foi a promulgação da Lei nº3.924 de 26 de julho de 1961 que “Dispõe sobre
os monumentos arqueológicos e pré-históricos”. Preocupados com a exploração indiscriminada do
solo e do subsolo e a conseqüente destruição de jazidas arqueológicas, sambaquis, casqueiros,
concheiros, grutas, lapas, abrigos, inscrições rupestres e outros vestígios da ocupação de nosso
território pelos paleoameríndios, a equipe do SPHAN conseguiu, através de seu dirigente, que o
Presidente Jânio Quadros, no corpo da referida lei, submetesse qualquer exploração ao aval, à
autorização e conseqüente fiscalização daquele órgão. Todas as jazidas arqueológicas e pré-
históricas passaram a ser consideradas patrimônio da União e sua exploração sem a expressa
autorização do SPHAN seria considerada crime contra o Patrimônio Nacional.
Mesmo aposentado, em 5 de setembro de 1968, Rodrigo Melo Franco de Andrade tomou
posse como membro do Conselho Consultivo do SPHAN. Faleceu naquele mesmo ano. Numa síntese
conclusiva da fase “rodrigueana” do SPHAN, cabe destacar a análise feita por ARANTES (1989:13):
“Apesar dos riscos das grandes generalizações, diríamos que o
caminho seguido pela ação preservacionista oficial no Brasil levou à
construção de um campo de atuação profissional que conquistou
estatuto acadêmico, base jurídico-administrativa, força política e
legitimidade social. Sem dúvida, esta atividade acabou se
estancando, se tecnificando, perdendo assim, durante muito tempo,
seu sentido político mais amplo, para acabar transformada e
entendida como sendo válida em si e por si mesma”.
2.2. A política de atuação do IPHAN a partir da década de 60
No início dos anos 60, na Europa, a arquitetura e o urbanismo passaram a ser tema de
discussão e questionamentos quanto aos critérios de tombamento e preservação, principalmente
diante dos impactos da padronização da paisagem urbana impostos pela industrialização, servindo de
9
veículo para a perda das identidades nacionais e regionais. Um dos documentos mais importantes
então gerados foi a “Carta de Veneza”, de maio de 1964, documento firmado quando da realização do
II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, realizado pelo
ICOMOS - Conselho Internacional de Monumentos e Sítios. A Carta de Veneza
(..) recomenda ampliar a noção de monumentos à moldura que os
envolve. Paradoxalmente, em nome dessa subordinação ao
excepcional, reconhece valor monumental a “obras modestas” que
tivessem adquirido através do tempo “significação cultural e humana”.
(CAMPOFIORITO,1984:35)
O que se pretendia era conciliar o desenvolvimento urbano com a proteção dos bens imóveis
protegidos por tombamentos, salvaguardando os valores ambientais.
No caso específico do Brasil as proposições da Carta de Veneza embasaram a elaboração e
a implantação de “planos de desenvolvimento urbano”, que visavam a assegurar um convívio
harmonioso entre os indivíduos e o patrimônio protegido. Mas a ineficácia desses planos logo veio à
tona. Eles eram elaborados “de cima para baixo”, em gabinetes de órgãos públicos, ignorando
realidades e demandas locais.
Outros encontros internacionais se sucederam. Neles foram produzidas novas “cartas”,
visando ao estabelecimento de novos critérios e parâmetros, quanto à conceituação e ação dos
governos na preservação de seus patrimônios: Quito (1967), Bruxelas (1969), Amsterdã (1975) e
Nairobi (1976). Em linhas gerais, esses documentos embasam o conceito contemporâneo de
patrimônio, que reconhece, por exemplo, a importância dos conjuntos urbanos cujo papel histórico e
social é relevante, mas cuja arquitetura não era até então considerada expressiva, tais como as vilas
operárias, fábricas, oficinas e estações ferroviárias. É também priorizada a urbanização de centros
tradicionais e bairros antigos visando assegurar o bem estar de seus moradores. Essas edificações e
seu entorno são considerados como lugares de suporte da memória social, e passam a ser vistas
como bens coletivos a serem tombados.
Merecem desta que nesse contexto as Normas de Quito, documento produzido no encontro
promovido pelo Departamento de Assuntos Culturais da OEA – Organização dos Estados
Americanos, em novembro/dezembro de 1967, das quais Brasil foi um dos signatários. Elas
influenciaram o governo do presidente Castelo Branco a criar nesse mesmo ano a EMBRATUR -
Empresa Brasileira de Turismo e o Conselho Nacional de Turismo. No seu texto recomendavam:
(...) que os projetos de valorização do patrimônio fizessem parte dos
planos de desenvolvimento nacional e fossem realizados
simultaneamente com o equipamento turístico das regiões
envolvidas. Recomendava-se, ainda, a cooperação dos interesses
privados e o respaldo da opinião pública para o desenvolvimento
desses projetos. (RODRIGUES,2001:18)
O governo militar brasileiro promoveu, através do Ministério de Educação e Cultura, em abril
de 1970, em Brasília, um encontro entre governadores, prefeitos e gestores de instituições culturais
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para discutirem questões sobre a proteção do patrimônio histórico e natural, bem como mecanismos
de ação complementares à ação do IPHAN. Foi então assinado o Compromisso de Brasília (Idem,
2001:22), mediante o qual museus, conselhos, fundações e programas passaram a desenvolver
serviços que visavam à descentralização do IPHAN. Dentre outras coisas, o documento propunha a
criação de cursos de história da arte, arquivologia e museologia, além de conservação e restauração
nos níveis superior, médio e artesanal; da inclusão de disciplinas que contribuíssem para a
conscientização da importância do patrimônio histórico em todos os níveis do ensino formal; a
capacitação dos professores para que esses atuassem como agentes de conscientização e cidadania;
o entrosamento entre as universidades, os arquivos e as bibliotecas municipais e estaduais; criação
de serviços estaduais para a preservação da natureza, articulados com o então IBDF – Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal. Propunha-se ademais a fomentar o entendimento de que
áreas militares, patrimônios de ordens religiosas e confrarias, com destaque para “cemitérios e
especialmente túmulos históricos e artísticos e monumentos funerários”, deveriam ser considerados
como parte integrante do patrimônio nacional, e que os seus gestores deveriam viabilizar a sua
preservação.
Após o Compromisso de Brasília surgem, através de iniciativas isoladas, órgãos estaduais de
preservação do Patrimônio, com políticas específicas de preservação e tombamento, o que gerou
variações regionais. O Estado da Guanabara, atual Estado do Rio de Janeiro, elaborou uma
legislação específica de proteção ao patrimônio. Em São Paulo, o CONDEPHAAT propôs então a
compatibilização, ainda que sem muito fundamento teórico, entre patrimônio e turismo. Na Bahia, o
IPAC promoveu um inventário de preservação que visava “possibilitar a planejadores uma atuação
preventiva, substituindo a preservação passiva pela reintegração dos monumentos na vida sócio-
econômica”.(CAMPOFIORITO,1984:39)
Internamente, o IPHAN mudava aos poucos os seus conceitos de bens a serem tombados. O
Conselho Consultivo do IPHAN intensificou no período de 1970 a 1990 os debates sobre a
preservação do entorno dos bens tombados, de exemplares da arquitetura do século XX, do
patrimônio natural, dos centros e sítios históricos e da evasão das obras de arte. É nesse contexto de
referência que, a partir de 1972, começaram a ser tombados exemplares da arquitetura eclética do
Rio de Janeiro. Os técnicos do IPHAN, pressionados por veemente solicitação do Instituto dos
Arquitetos do Brasil e do Clube de Engenharia defendendo o tombamento dos prédios da Avenida Rio
Branco (nas imediações da Cinelândia), como testemunhos da reforma urbanística do prefeito Pereira
Passos, admitem serem aqueles imóveis registros da história da arquitetura no Brasil. Assim foram
tombados o Museu Nacional de Belas Artes, o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional e a Caixa de
Amortização, testemunhos da Belle Époque na então capital da República.
Nova mudança ocorrerá nos conceitos e políticas de preservação e tombamento em razão
dos movimentos ecológicos da década de 70. O meio ambiente passa a ser reconhecido como
patrimônio natural e moldura das cidades, e a sua preservação é afirmada como necessária à
manutenção da qualidade de vida da população. Sítios e conjuntos urbanos de valor cotidiano, bens
móveis e imateriais produzidos pelos artesãos, festejos e tradições populares que nada mais eram do
que formas de comunicação simbólica, aliadas ao meio ambiente e às heranças naturais passíveis de
11
serem destruídas pelo homem, começaram a ser considerados “patrimônio cultural”. Nesse mesmo
contexto, novos bens intangíveis, condições de possibilidade da construção da memória da
população, deveriam ser preservados. Além disso, algumas das obras da tecnologia industrial
adquiriam um novo valor estético. Desta forma, pontes metálicas, chafarizes, fábricas, estações
ferroviárias, faróis, mercados, dentre outros, vieram a ser tombados pelo IPHAN.
Os novos conceitos de patrimônio agudizam uma crise interna ao IPHAN, quando Aluísio
Magalhães, presidente da recém-criada Fundação Nacional Pró-Memória, veio a assumir a
presidência do Conselho Consultivo do SPHAN em 1979, tomando para si a tarefa de dar maior
abrangência à atuação do órgão, em consonância com o espaço de experiências e o horizonte de
expectativas da abertura política por que passava o país ao fim do regime militar.
Nos anos 80 emergem movimentos sociais e comunitários que reivindicavam uma mudança
na política de patrimônio de modo a contemplar outros aspectos e manifestações da cultura nacional,
até então desvalorizados. Não bastava só preservar lugares históricos e objetos sem outro objetivo
que o de resguardar modelos estéticos e simbólicos, testemunhos de um passado, considerado imune
às mudanças dos novos tempos. Não bastava tentar cristalizar, através do tombamento e da
preservação, testemunhos de pedra e cal. Os novos movimentos sociais evidenciavam que os
testemunhos culturais que o IPHAN até então preservara não davam conta da diversidade constitutiva
da identidade cultural brasileira. De acordo com FONSECA (1997:227),
(...) a carga afetiva que pressupõem as noções de identidade ou de
qualidade de vida, constitui um problema levantado neste período –
problema que, como vem sendo abordado, assumiu uma dimensão
não apenas conceitual mas também política.
Questionamentos profundos quanto à política de preservação levaram os órgãos oficiais de
patrimônio e tombamento existentes no país a reverem os seus conceitos e a perceberem, por
exemplo, que um monumento arquitetônico do período colonial era testemunho, subliminar, não só de
um estilo artístico, como também de modos de vida e /memória coletivos (das ordens religiosas, dos
fiéis, dos escravos, dos índios). Tais tinham reconhecida uma importância simbólica, social e política,
que ia além de sua carga estritamente percebida em temos arquitetônicos e artísticos.
Embora todas as questões de ordem social, estética e política norteassem as discussões e
pressionassem por uma reestruturação interna, havia, no cerne de tudo isto, uma questão básica para
o IPHAN. Este órgão tinha que mudar a sua política de tombamento. Ganha destaque nesse contexto
o fato de que as opções de tombamento, segundo os critérios inicialmente estabelecidos pelo IPHAN
estavam, em 1982, praticamente esgotadas. Segundo as diretrizes traçadas por Mário de Andrade,
praticamente todos os exemplares arquitetônicos, bens móveis e arqueológicos, de belas artes e artes
aplicadas já haviam sido tombados.
Todavia as mudanças não aconteceram sem acaloradas discussões nas reuniões do
Conselho Consultivo. CAMPOFIORITO (1984:42) chegou a dizer que (...)“é preciso reconhecer que
cultura é coisa muito séria para ser entregue a especialistas”. A título de exemplo e para ilustrar as
divergências de pensamento dos Conselheiros do IPHAN, a sessão para decidir sobre o tombamento
12
do Terreiro da Casa Branca, bem cultural representativo da etnia afro-brasileira, em Salvador, Bahia,
quase não aconteceu: foram “3 votos a favor, 1 contra, 2 abstenções e 1 pedido de
adiamento”.(FONSECA,1997:240) De forma inédita, testemunhos da imigração japonesa, italiana e
alemã, passaram, a partir daquela ocasião, a receber registro no Livro de Tombo Arqueológico,
Etnográfico e Paisagístico.
Todas estas propostas de proteção e discussões sobre o patrimônio histórico e artístico
nacional influenciaram os parlamentares que redigiram a Constituição de 1988, promulgada em 5 de
outubro daquele ano. Consta do corpo da Carta Magna:
Art. 216: Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial,
tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória
dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais incluem:
I – as formas de expressão;
II – os modos de criar, fazer e viver;
III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações
artístico-culturais;
V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.
§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o
patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e
desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. (CASTRO,1991:9)
A partir de 1988, com a unificação do SPHAN e da Fundação Nacional Pró-Memória, os
processos de tombamento “não convencionais” que até então eram encaminhados para arquivamento
passaram a serem analisados pelo Conselho Consultivo, que teve sua esfera de atuação ampliada e
passou a opinar em todas as decisões sobre tombamentos.
CAMPOFIORITO (1984:42) traça um perfil da política de tombamento do IPHAN no período
de 1937 a 1982 e nos informa que, dos bens tombados, 40% eram exemplares da arquitetura
religiosa, 94% eram bens arquitetônicos, 4% eram bens móveis e 2% bens paisagísticos. Quanto à
sua localização geográfica, 22,5% estavam no Rio de Janeiro, 20% em Minas Gerais, 18% na Bahia e
8% em Pernambuco. Após a reestruturação do IPHAN e a conseqüente mudança de critérios para os
bens a serem tombados, este quadro se alterou substancialmente. Entre 1970 e 1990, o Livro de
Tombo Arqueológico, Etnológico e Paisagístico recebeu 46 inscrições; o Livro de Tombo Histórico, 94
inscrições e o Livro das Belas Artes, 86 inscrições.
No início da década de 90, a pluralidade da cultura brasileira alcançava uma maior expressão,
como bem cultural a ser preservado pelo Poder Público Federal. Mas justamente nesse momento em
que sua área de atuação é mais diversificada e que se torna evidente a necessidade de ampliar e
qualificar o seu corpo técnico, o IPHAN sofre duro revés. Com o governo Collor e a política de radical
desestatização seu quadro funcional foi substancialmente reduzido, e novas contratações de pessoal
especializado são proibidas. Essa inflexão nos rumos da política pública brasileira deixa até hoje
marcas. A exemplo de outros órgãos federais, o IPHAN não admite técnicos desde 1987. A evasão de
13
antigos profissionais mediante aposentadoria e uma acelerada terceirização de tarefas provocou uma
lacuna nos quadros técnicos, e uma grave descontinuidade nos trabalhos de preservação,
tombamento e fiscalização, seqüelas reiteradamente denunciadas por técnicos do órgão em reuniões
plenárias, seminários e demais fóruns da área de patrimônio promovidos pelo IPHAN. Ainda assim o
IPHAN conseguiu no passado recente ampliar sua área de atuação e equiparar seus procedimentos
técnicos e critérios de preservação às tendências internacionais. O Decreto nº 3.551 de 4 de agosto
de 2000 que “Institui o registro de bens de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural
brasileiro, cria o Programa Nacional de Patrimônio Imaterial e dá outras providências” visa impedir a
perda de referências culturais e contribuir para preservação da memória social das comunidades. Na
maioria das vezes estas práticas não possuem um referencial escrito, uma “receita” que lhes
assegure a continuidade: elas existem na tradição oral da comunidade. Tem destaque nesse
contexto, por exemplo, o canto popular, sem partitura nem letra escrita.
A exemplo do Decreto-lei nº 25, pelo Decreto 3.551 foram criados os Livros de Tombo com o
propósito de registrar, por categorias, os bens imateriais a serem preservados. Diz a Lei:
Art.1º - Fica instituído o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que
constituem patrimônio cultural brasileiro.
§ 1º Esse registro se fará em um dos seguintes livros:
I – Livro de Registro dos Saberes, onde serão inscritos conhecimentos e modos de
fazer enraizados no cotidiano das comunidades;
II – Livro de Registro das Celebrações, onde serão inscritos rituais e festas que marcam a
vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social;
III – Livro de Registro das Formas de Expressão, onde serão inscritas manifestações
literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas;
IV – Livro de Registro dos Lugares, onde serão inscritos mercados, feiras, santuários, praças
e demais espaços onde se concentra e reproduzem práticas culturais coletivas.
§ 2º A inscrição num dos livros de registro terá sempre como referência a continuidade
histórica do bem e sua relevância nacional para a memória, a identidade e a formação da
sociedade brasileira.
Art.7º - O IPHAN fará a reavaliação dos bens culturais registrados, pelo menos a cada dez
anos, e a encaminhará ao Conselho Consultivo do patrimônio Cultural para decidir sobre a
revalidação do título de Patrimônio Cultural do Brasil.
Parágrafo único. Negada a revalidação, será mantido apenas o seu registro, como
referência cultural de seu tempo.
3
Danças de roda, bandas de música, rodas de samba, literatura de cordel, rendas de bilro,
teatro de mamulengos, feiras populares, dobrares de sinos e demais manifestações populares tiveram
seus pedidos de tombamento encaminhados ao IPHAN e, junto às igrejas setecentistas, sobrados e
fortalezas, canhões e santos barrocos, constituem hoje Patrimônio Cultural Brasileiro, num empenho
pela preservação da memória tanto das coisas como das palavras.
3
Decreto nº 3.551 de 4 de agosto de 2000
14
2.3. Política de Patrimônio no Estado e no Município do Rio de Janeiro
Devido a todos esses movimentos preservacionistas que ocorriam no país e com o propósito
de fortalecer e ratificar o papel dos Estados e Municípios quanto à política e à ação de preservação, a
Constituição de 1988, determina:
Art.23 – É competência da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios (...)
III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico,
Artístico e cultural, as paisagens naturais notáveis e os sítios
arqueológicos(...)
Precedendo às leis e decretos, o antropólogo Darcy Ribeiro, ao assumir a Secretaria de
Ciência e Cultura do Estado do Rio de Janeiro, na gestão do governador Leonel Brizola, de 1982 a
1986, reestruturou a política cultural no Estado. Como decorrência, no INEPAC – Instituto Estadual de
Patrimônio Artístico e Cultural, o patrimônio cultural passou a ser analisado a partir de três premissas
propostas pelo arquiteto Italo Campofiorito, responsável pela direção dos serviços estaduais de
proteção ao patrimônio cultural, a saber:
1 – a diversificação ilimitada do bem cultural deve ser reconhecida e
louvada;
2 – o patrimônio não constitui um acervo de coisas passadas, mas, ao
contrário, é parte viva da poética do povo e dos artistas;
3 – as populações, com sua sabedoria local, devem participar
ativamente da defesa de um patrimônio que é seu.
(CAMPOFIORITO,1984)
Sob o respaldo da autoridade científica e institucional de Darcy Ribeiro, foram, de fato,
revistos os critérios de tombamentos de bens a serem preservados, o, sob a proteção do Estado, um
patrimônio de extrema significância popular, indissoluvelmente ligado à memória afetiva dos cidadãos.
Os gestores do patrimônio começaram a perceber que, mobilizados e motivados a preservar o que
lhes dizia respeito, os cidadãos “comuns” seriam, também, agentes culturais. Era tempo de resgatar a
memória do cotidiano e da experiência social, vivenciada pela população e constituí-la em patrimônio
cultural.
Desta maneira, a Fundição Progresso, os Bondinhos de Santa Teresa, a Casa da Flor de
Gabriel dos Santos e o Sítio de Santo Antônio da Bica, de Roberto Burle Marx, foram considerados
casos exemplares da nova atitude
4
. Eles receberam tratamento de bem cultural, bem como outros
testemunhos materiais de grande significado simbólico, como a Pedra do Sal, no bairro da Saúde, na
cidade do Rio de Janeiro, berço do rancho carioca e “testemunho secular de religiosidade e arte afro-
brasileira” (Idem,1984:6); as pedras da Moreninha e dos Namorados, em Paquetá, símbolos do
romantismo literário nacional; e as dunas entre Cabo Frio e Arraial do Cabo testemunhos ambientais
dos hábitos e tradições de populações pesqueiras e da necessidade de conservação da
4
4
Esses tombamentos foram propostos pelo arquiteto Italo Campofiorito durante a sua gestão no INEPAC.
15
biodiversidade. Nesse mesmo Contexto, visando sustar a expansão urbana predatória, foi tombada,
em 1984, a praia de Grumari
5
, no Rio de Janeiro, com 10km de praia, ilhas, pontões e suas
paisagens.
Após um período sem grandes inovações, nem preservações de significado valorativo, foi
tombada, em 1999, a cidade de Petrópolis com seus monumentos, palácios e palacetes, praças, ruas
e esculturas, sítio histórico de extrema representatividade do Império. A efetivação deste tombamento,
provisório desde 1980, permitiu que bens isolados e toda a ambiência de seu entorno fossem
preservados, contrariando fortes interesses de especuladores imobiliários.
Há alguns anos o INEPAC sofre com a precária estrutura administrativa. A fiscalização da
preservação dos bens tombados se faz com muita dificuldade. A isso se soma o fato corrente de que
os Conselheiros sejam obrigados a ocupar parte significativa de seu tempo com análises de propostas
de tombamento (negadas, na sua grande maioria), remetidas por parlamentares com fins puramente
eleitoreiros e demagógicos, sem nenhuma relevância cultural.
No âmbito municipal, a cidade do Rio de Janeiro assumiu uma posição de vanguarda quanto
à preservação de bens culturais que não estavam contemplados pelo IPHAN nem pelo INEPAC. O
“Corredor Cultural”, instituído em 1979 pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, tinha como
objetivo preservar e revitalizar o centro da cidade, bem como ordenar seu crescimento urbano sob
uma nova ótica.
Atendendo anseios de comerciantes, moradores e urbanistas que buscavam revitalizar
aquela área sem necessariamente, demolir e, conseqüentemente, destruir a memória da cidade, o
Escritório Técnico do Corredor Cultural mapeou o Centro da cidade e diagnosticou que era possível
perceber que havia conjuntos urbanos significativos, testemunhos dos diversos períodos históricos e
sociais pelos quais a cidade passou desde a sua fundação e que, pelo seu caráter civil e cotidiano,
não haviam sido considerados até então como exemplares carregados de “história e arte “.
Em 1983, ao ser promulgada a Lei Municipal do Corredor Cultural, foram tombados 3.000
imóveis no Centro Histórico do Rio de Janeiro, preservando a ambiência cultural urbana e valorizando
o conjunto, ao invés do monumento isolado. A limitação do gabarito de edifícios a serem erguidos nas
circunvizinhanças permitiu valorizar e resgatar a história da arquitetura eclética carioca do final do
século XIX e início do século XX, recuperando “cenários” históricos característicos da Colônia, do
Império, da República Velha e do Estado Novo. Assim, exemplarmente, o Saara dos imigrantes
árabes e judeus, a Lapa da boemia e a Cinelândia requintada foram considerados como bens
culturais de vital importância para se entenderem as transformações culturais ocorridas na cidade.
As cores das fachadas, as formas e os ornatos do ecletismo arquitetônico do início do século
XX foram restaurados e preservados, recuperando o colorido do conjunto como foram concebidos
esses imóveis no início do século. A participação dos proprietários e comerciantes na escolha das
cores foi democrático-participativa. Sob orientação do Escritório Técnico, foi instituído o projeto Cores
da Cidade, na Rua Sete de Setembro, e padronizados os letreiros e as vitrines.
Para que os comerciantes e proprietários mantivessem seus imóveis nas condições técnicas
desejáveis, recuperados e conservados, a partir de 1986 a Prefeitura do Rio de Janeiro passou a
5
Os tombamentos de Cabo Frio, Arraial do Cabo e Grumari foram propostos pelo governador Leonel Brizola. Ver Campofiorito,
1984 – ofícios e propostas de tombamentos dirigidas ao Secretário de Ciência e Cultura do Estado do Rio de Janeiro.
16
isentá-los do pagamento de taxas e impostos municipais (IPTU). Essa iniciativa atraiu comerciantes e
moradores para o Centro, repovoando a área e recuperando a dinâmica social e cultural necessária
para a sua revitalização. Instalaram-se assim no Centro novos bares, restaurantes, casas de
espetáculos e centros culturais. A noite carioca recuperou vitalidade em regiões como a Praça XV, a
Lapa e a Rua do Lavradio. Consta dos projetos do Escritório Técnico do Corredor Cultural a
reurbanização da Cinelândia e a restauração e revitalização da Praça Tiradentes e arredores (com
apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID).
Tão logo o Corredor Cultural começou a apresentar sinais de sucesso, outras iniciativas de
preservação surgiram na cidade do Rio de Janeiro: as APACs – Áreas de Proteção aos Ambientes
Culturais. A legislação do Corredor Cultural foi replicada em outras áreas com feições diversas na
cidade, através de leis ou decretos municipais, o que, segundo alguns especialistas em patrimônio e
urbanismo, é um equívoco. Cada bairro tem uma feição e precisa ter a sua própria narrativa. Muitas
APACs não alcançaram os objetivos previstos nas suas leis ou decretos de origem porque não
surgiram da vontade da comunidade, que não foi envolvida nem ouvida para a elaboração dos
critérios de preservação a serem estabelecidos. Discordâncias à parte, o que cabe aqui salientar é
que diversos bairros – Santa Teresa, Gamboa, Urca, Cruz Vermelha, Laranjeiras, Santa Cruz, Lido
(Copacabana) e Vila Izabel - tiveram suas feições preservadas.
2.4 Participação da iniciativa privada na preservação
A preservação é uma prática social de múltiplas implicações. Sob esta ótica, ARANTES
(1989:16) nos diz que:
(...) trata-se de uma atividade produtiva, criadora de valor: de valor
econômico que pode ser aumentado ou diminuído, dependendo do
tratamento que se dê aos bens preservados; de valor histórico,
constitutivo da memória, da territorialidade e da identidade nacional,
além de outras identidades mais específicas e locais; e de valor
político, levando ao aspecto da hegemonia e ao dos direitos dos
cidadãos.
No início dos anos 80 a ameaça da perda da memória coletiva fez com que muitas instituições
empresariais e industriais, ligadas ou não ao Poder Público, buscassem criar, autonomamente,
departamentos, setores ou coisa que o valha, com o intuito de resgatar a sua própria memória
corporativa, e impedir o total desaparecimento dos testemunhos de sua trajetória e de sua história
institucionais. Foi assim que a Rede Ferroviária Federal S.A, a LIGHT, a Eletrobrás, os Correios, a
Fundação Oswaldo Cruz, o Banco do Brasil e outras empresas implantaram programas de
preservação e resgate da sua história, que redundaram na criação de museus, centros de
documentação, arquivos fotográficos e documentais e centros culturais.
CANCLINI (1998:89) busca explicar tais iniciativas:
17
Enquanto o patrimônio tradicional continua sendo responsabilidade
dos Estados, a promoção da cultura moderna é cada vez mais
tarefa de empresas e órgãos privados. Dessa diferença derivam
dois estilos de ação cultural. Enquanto os governos pensam sua
política em termos de proteção e preservação do patrimônio
histórico, as iniciativas inovadoras ficam nas mãos da sociedade
civil, especialmente daqueles que dispõem de poder econômico
para financiar arriscando. Uns e outros buscam na arte dois tipos de
édito simbólico: os Estados, legitimidade e consenso ao aparecer
como representantes da história nacional; as empresas, obter lucro
e construir, através da cultura de ponta, renovadora, uma imagem
“não interessada” de sua expansão econômica.
A formação e a preservação do patrimônio passou a ser também obra da sociedade civil, de
empresas privadas ou grupos comunitários, diversificando os seus objetivos constitutivos. Muitos
bancos e fundações não estatais e governamentais constituíram seus museus de história e de arte,
cuja origem se deu na acumulação de riqueza através de investimentos em bens culturais e como
estratégia de marketing e de promoção social. Outras empresas buscaram patrocinar grandes obras
de restauração de bens culturais, uma ação que visava à divulgação de seu nome à uma ação social,
ao estabelecimento de uma imagem corporativa.
Acompanhamos de perto um destes processos de preservação: o da empresa pioneira nesse
segmento que foi a Rede Ferroviária Federal S.A. Em 1980, o então prefeito de São João del Rey,
Octávio Neves, com o apoio da população local, reivindicou, junto à RFFSA, o retorno a sua cidade da
Locomotiva Nº 1 da Estrada de Ferro Oeste de Minas, pela sua importância histórica e pelas relações
de memória que aquela máquina era capaz de estabelecer com a comunidade. O Ministério dos
Transportes, que naquele mesmo ano havia criado o PRESERVE, Programa de Preservação do
Patrimônio Histórico, optou por, não só fazer com que a Locomotiva Nº 1 retornasse, como também,
transformar todo o conjunto ferroviário daquela cidade no Centro de Preservação da História
Ferroviária de Minas Gerais.
O trabalho de pesquisa histórica para a sua instalação foi acompanhado, auxiliado e
estimulado pela própria população que, motivada, levava para a equipe de museólogos recortes de
jornais, revistas, fotografias, documentos e objetos que há anos guardavam consigo e que eram parte
de suas histórias pessoais. Inaugurado por ocasião do centenário da inauguração da Estrada de Ferro
Oeste de Minas, em 1981, com a estação, a gare, as plataformas, as oficinas, as locomotivas, os
carros de passageiros e os vagões totalmente restaurados e em operação, o Museu Ferroviário
resgatou o orgulho e a identidade da população mineira na medida em que lhe foi devolvido o “seu
trem”. Em 1982 foram erradicados os 200 km de linhas férreas comerciais e de passageiros que,
divididas em dois ramais, ligavam São João del Rey a Aureliano Mourão e São João del Rey a
Antônio Carlos. Foram preservados, para fins turísticos, apenas 12 km de linha entre São João del
Rey e Tiradentes, posteriormente tombado pelo IPHAN. É importante ressaltar, nesse caso que
citamos, que a comunidade foi estimulada a preservar os seus referenciais de memória. Caso não o
fizesse, sofreria as conseqüências posteriormente: uma amnésia coletiva com relação a sua própria
18
origem que resultariam, como diz LE GOFF (1996:469), em “perturbações graves de identidade
coletiva”.
Logo outras Superintendências Regionais da RFFSA, impressionadas com os resulta dos de
mídia e de valorização da auto-estima entre os ferroviários e a população local, resolveram instalar
museus ferroviários nos importantes centros servidos pelas diversas malhas ferroviárias, cada qual
com sua origem, com sua história e com suas tradições. Foram então criados, até 1990, Centros de
Preservação da História Ferroviária nas seguintes cidades: Recife, Fortaleza, Rio de Janeiro, Belo
Horizonte, Juiz de Fora, Campos, Miguel Pereira, Curitiba, São Leopoldo e Bauru, todos com a efetiva
participação das comunidades locais.
Com o desmonte da ferrovia através da privatização de suas malhas, alguns destes museus
ferroviários foram fechados, outros transferidos para a administração das prefeituras locais e outros
ainda, como o do Rio de Janeiro, continuam funcionando, embora precariamente e sem nenhum
interesse dos liquidantes em revitalizá-lo. Importantes peças correm o risco de se perderem, dentre
elas a primeira locomotiva a vapor do Brasil, a Baronesa, tombada, inclusive, pelo IPHAN em 1957.
Um outro aspecto de preservação a ser considerado é que, percebendo que, em todos os
países o Poder Público não possui recursos suficientes para cuidar de todo o patrimônio a ser
preservado, dada a sua diversidade e amplitude, uma nova instituição de apoio, fomento e subvenção
de proteção e conservação do patrimônio surge nos anos 80: o setor privado que, através de
fundações sem fins lucrativos e de ONGs – Organizações Não Governamentais e de incentivos fiscais
oferecidos pelos governos, passam a atuar na preservação do patrimônio cultural, sem, contudo,
criarem seus próprios museus. Como exemplo podemos citar a Fundação Calouste Gulbenkian, em
Portugal e a Fundação Roberto Marinho e a VITAE, no Brasil.
Este é, numa síntese sumária, o histórico das políticas de preservação e tombamento no
Brasil.
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Apostila -gestao_de_bens_culturais

  • 1. 1 UFF – Universidade Federal Fluminense Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Turismo Departamento de Turismo Pós-Graduação em Turismo Apostila de Patrimônio Cultural Profª Msc. Telma Lasmar Museóloga 2011
  • 2. 2 1. INTRODUÇÂO A elaboração desta apostila teve como objetivo facilitar o acesso dos alunos aos princípios fundadores dos processos de preservação do patrimônio no Brasil a partir do esclarecimento dos conceitos sobre o mesmo, desde a sua mais remota origem. Este é um capítulo de minha dissertação de Mestrado realizada na COPPE/UFRJ em Engenharia de Produção, que teve como título A gestão dos museus e do patrimônio no Brasil na modernidade contemporânea e as práticas turísticas. 2. PATRIMÔNIO E TOMBAMENTO NO BRASIL 2.1 As origens do IPHAN – Síntese Histórica O sentido de “patrimônio cultural”, como bem coletivo de uma nação a ser protegido por leis, surgiu sob o impacto da Revolução Francesa de 1789, quando a violência dos revolucionários ameaçava destruir todo e qualquer referencial histórico e cultural do país. Segundo FONSECA (1997:58) Os atos de vandalismo, que se intensificaram após a prisão do rei em Varennes, repugnavam os eruditos e contrariavam os ideais Iluministas de acumulação e difusão do saber. Por esse motivo, desde 1789, o governo revolucionário tentou regulamentar a proteção dos bens confiscados, justificando essa preocupação pelo interesse desses bens para a instrução pública. A posse coletiva dos bens de valor histórico e artístico, até então propriedade particular dos reis, do clero e da nobreza, trouxe consigo uma conotação de patrimônio a esses bens, que passaram a ser reconhecidos como propriedade da nação. O fortalecimento do sentimento de nacionalidade foi uma das decorrências da Revolução Francesa, contribuindo para a formação, em diversos países da Europa, de museus nacionais, bibliotecas e arquivos, onde seriam guardados os testemunhos “mais importantes” da história dos países. A nação unificada e consolidada deveria preservar, proteger e valorizar seus bens artísticos, históricos, arquitetônicos e arqueológicos que contribuiriam com seu significado simbólico, para a formação da identidade cidadã. Importantes manifestações de memória coletiva - os museus, as bibliotecas, os arquivos e os bens patrimoniais adquiriram, no século XVIII, caráter de instrumento político a serviço do universo simbólico da Nação. Na visão de (ARANTES,1989:14), o que ocorreu com relação à ação de preservação foi que: (...) Na maioria das sociedades contemporâneas, a produção do patrimônio cultural passou a ser administrada pelo Estado com maior ou menor envolvimento da sociedade civil, conforme os regimes políticos vigentes.
  • 3. 3 No Brasil, o nacionalismo adquiriu caráter retórico e ufanista, a partir do início do século XX, por volta de 1900, como sugere a obra de Afonso Celso “Porque me ufano de meu país”. Neste contexto muita literatura de cunho nacionalista veio a ser produzida até 1930, inclusive após a Semana de 22. Com uma linguagem literária focada no modernismo, surgiram diversos movimentos que buscavam o fortalecimento do sentimento de nacionalidade. A partir da década de 10 do século XX, alguns segmentos da intelectualidade brasileira começaram a manifestar a sua preocupação com a perda das referências históricas nacionais e com a necessidade de se preservar a identidade cultural brasileira. Várias eram as causas apontadas para tal apreensão, tais como: 1 – a urbanização das cidades – no afã de europeizá-las e torná-las modernas, demoliam-se, sem o menor critério, referências importantes da arte, da arquitetura e da história nacional, como ocorreu, por exemplo, com o “Bota-abaixo” do prefeito Pereira Passos, no Rio de Janeiro; 2 – a imigração – o grande número de imigrantes que se instalou nas principais cidades e no interior do país, criando novas cidades e implantando escolas onde só se falava e estudava nas suas línguas de origem, ameaçando a unidade nacional e 3 – o contrabando – a valorização, cada vez mais crescente, da arte sacra, de objetos e do mobiliário do estilo barroco e rococó, principalmente da Bahia e de Minas Gerais, e ainda, de exemplares arqueológicos, no mercado internacional, incentivando o contrabando desses objetos. Paralelamente, os integrantes do Movimento Modernista, liderado por Oswald e Mário de Andrade, desenvolviam pesquisas etnográficas e literárias focadas na valorização das manifestações culturais, tanto em nível regional como nacional. Redescobrindo o Brasil, o arquiteto Lúcio Costa buscava, nas heranças portuguesas, uma arquitetura autenticamente nacional. De suas pesquisas origina-se um novo estilo arquitetônico, o Neocolonial, que recuperava elementos decorativos e funcionais das casas-grandes e dos sobrados edificados até o início do século XIX, em contraposição ao ecletismo arquitetônico predominante a partir da segunda metade daquele século. O ideário neocolonial estava presente em diversas expressões artísticas, tais como a literatura e a pintura e criou um clima favorável à implantação de uma política governamental de preservação dos testemunhos de nosso passado. Em busca desse resgate e do conhecimento do que de fato era o seu patrimônio histórico e artístico, os governos da Bahia, em 1927 e de Pernambuco, em 1928, criaram suas Inspetorias Estaduais de Monumentos Nacionais, iniciativas isoladas de preservação que se limitavam a inventariar os bens locais. A partir de 1930, o governo revolucionário de Getúlio Vargas, visando à modernização do Ministério da Educação e Saúde, buscou dar novas orientações aos seus departamentos culturais. Uma das primeiras iniciativas no sentido de preservar exemplares da arquitetura do período colonial foi através do Decreto nº 22.928, de 12 de junho de 1933, que consagrou Ouro Preto como “Monumento Nacional”, pela sua importância histórica, artística e social, revelada e divulgada por Mário de Andrade, Manuel Bandeira, José Marianno, Gustavo Barroso e outros intelectuais, cada qual sob sua ótica. Para Gustavo Barroso, Ouro Preto era uma “Cidade Sagrada” que deveria ser defendida “dos insultos do tempo e protegendo das tolices dos homens a soberba floração dos seus monumentos”. (MAGALHÃES,2001:192) Em 16 de julho de 1934, foi assinado pelo presidente Getúlio
  • 4. 4 Vargas o Decreto 24.735 que regulamentava a atuação, no Museu Histórico Nacional, da Inspetoria de Monumentos Nacionais sob a direção de Gustavo Barroso, cuja missão era inspecionar e fiscalizar os monumentos do país. Uma das mais importantes ações desta Inspetoria foi a preservação da Casa dos Contos, alguns chafarizes e a Igreja do Rosário, em Ouro Preto. A mentalidade preservacionista adquiriu mais consistência quando medidas legais foram incluídas na Carta Magna de 1934. Segundo (CASTRO,1991:9), havia interesse público na preservação, pois a (...) Constituição de 1934, no art. 148, previa a competência da União, dos Estados e dos Municípios para: (...) proteger os objetos de interesse histórico e o patrimônio artístico do país(...). Ainda segundo a mesma autora, a Constituição de 37 trocou a palavra objetos por monumentos históricos e artísticos e a Constituição de 1946 substituiu as esferas administrativas pelo Poder Público. Convocado pelo Ministro Gustavo Capanema, Mário de Andrade elaborou, em 1936, de acordo com o seu entendimento do que deveria ser considerado patrimônio, o projeto de um órgão que deveria ser criado para estabelecer critérios e formas de controle para a preservação do patrimônio histórico e artístico nacional. Mário de Andrade entendia que era preciso preservar todo o conjunto de manifestações artísticas e culturais do país pela sua riqueza e diversidade, em contraposição à ação da Inspetoria de Monumentos Nacionais. O projeto original de Mário de Andrade previa que as atividades da memória, da história e da cultura nacionais deveriam estar protegidas por uma lei reguladora. No escopo de seu projeto estavam contempladas as diversas formas de arte: patrimoniais, indígenas, arqueológicas, eruditas e aplicadas nacionais e estrangeiras. 1 Todos os aspectos do acervo patrimonial de brasilidade deveriam ser registrados, catalogados, preservados de modo a serem utilizados como elementos pedagógicos de formação cultural da população, para, conforme Mário afirmava, “abrasileirar os brasileiros”. Em 1936, Rodrigo Melo Franco de Andrade - advogado e jornalista com grande trânsito entre a intelectualidade nacional - foi indicado por Mário de Andrade e Manuel Bandeira e nomeado pelo ministro Gustavo Capanema para organizar e dirigir o SPHAN – Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que foi oficialmente criado pela Lei nº 378 de 13 de janeiro de 1937. Logo a seguir, em 30 de novembro de 1937, foi promulgado o Decreto-lei nº 25, que não contemplava na íntegra o projeto de Mário de Andrade, mas que determinava a conservação e proteção do (...) conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. (CAMPOFIORITO,1984:35) 1 Como obras de artes patrimoniais estavam entendidos os bens edificados e os bens a eles agregados, pertencentes ao poder público ou a particulares; arte indígena compreendia cestaria, plumária, cerâmica e demais artefatos produzidos pelos índios; como arte arqueológica estavam entendidas as pinturas rupestres e demais objetos encontrados em sítios arqueológicos produzidos pelo homem; arte erudita era a produzida pela academia: como arte aplicada nacionais e estrangeiras estavam contemplados os objetos manufaturados ou industrializados de valor artístico.
  • 5. 5 O agente encarregado de atribuir valores e determinar a classificação destes bens para efeito de tutela pública era o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, através do seu Conselho Consultivo, formado por arquitetos, historiadores e demais intelectuais. Estes bens passaram a ser classificados como: - obras de arte erudita nacionais e estrangeiras existentes no país; - obras de arte aplicadas (artes menores) e - obras de arte popular. Muito embora contempladas com a oficialização da preservação, as artes populares e aplicadas, a arqueologia, a arte ameríndia e as origens da raça negra no Brasil foram, nesse primeiro momento, pouco estudadas, o que revela o caráter erudito das prioridades adotado pelo IPHAN. Para registrar os bens a serem preservados foram criados quatro Livros de Tombo: - Livro de Tombo Arqueológico, Etnológico e Paisagístico; - Livro de Tombo Histórico; - Livro de Tombo das Belas Artes e - Livro de Tombo das Artes Aplicadas. 2 Cabe aqui ressaltar que o tombamento não esgota as formas legais de proteção dos bens culturais. É apenas um instrumento jurídico. Mas a legislação de preservação no Brasil foi de tamanha abrangência e vanguarda, que o Decreto-lei nº 25 de 30 de setembro de 1937 está em vigência até hoje. As poucas alterações que sofreu, pelo Decreto-lei nº 3.866 de 29 de novembro de 1941 e pela Lei 6.292 de 1975, só trouxeram alguns complementos. A política de preservação do SPHAN centrava-se em conhecer e preservar as obras do barroco, sobretudo da arquitetura dos séculos XVII e XVIII, consideradas a essência da brasilidade e a produção material dos colonizadores portugueses: os fortes, os engenhos e as igrejas, e ainda, os exemplares de escultura e pintura a elas ligadas. O critério de preservação adotado era o da consagração e preservação dos símbolos das classes dominantes do passado da Nação – sedes do poder político, religioso e militar. Estes bens tombados estavam vinculados a fatos memoráveis, mas possuíam, acima de tudo, relevante qualidade construtiva e estética, segundo padrões então vigentes no SPHAN. Geograficamente falando, os focos das atenções eram Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia. Seriam também consideradas “notáveis” ou de “excepcional valor” as obras neoclássicas de Grandjean de Montigny e de seus discípulos da Imperial Academia de Belas Artes. Embora expressivos plasticamente e edificados em quantidade significativa, os exemplares do ecletismo do Séc. XIX não eram considerados, pelos intelectuais do SPHAN, arte brasileira. O movimento modernista forjou seu próprio passado, numa busca pela essência da nacionalidade brasileira e ignorando qualquer movimento artístico e arquitetônico ocorrido entre o fim do Império e a Semana de 22. A questão não era somente estética ou conceitual, era também política: na medida em que se voltavam para preservar o passado remoto, os modernistas (vinculados ao Estado Novo) estavam desta forma, renegando a República Velha e todas as suas realizações. Segundo CAMPOFIORITO (Ibid., 34), o movimento preservacionista no Brasil foi impar: 2 Os Livros de Tombo são constituídos de páginas numeradas, rubricadas e encadernadas, nas quais são lançadas, manuscritamente, as informações sobre os bens tombados. São utilizados pelos órgãos de preservação e pelos museus.
  • 6. 6 (...) Sendo coisa que só ocorreu no Brasil, o antigo foi aqui selecionado pelo modernismo revolucionário, o que explica a ojeriza a tudo o que cheirasse a acadêmico, no sentido das belas artes recentes do termo. Nada, entretanto, da recusa sistemática do passado, à maneira anarquista, ou dada, dos europeus de antes de 1914. Preocupado em preservar o patrimônio de “pedra e cal”, o SPHAN não tomou para si a tarefa de preservar, por exemplo, nossa produção literária e musical, mesmo que erudita, assim como o meio ambiente. Embora tendo toda a sua ação voltada para um passado remoto, o IPHAN reconheceu e valorizou monumentos modernistas, tombando-os, com o visível propósito premonitório de impedir que seus detratores tivessem, no futuro, oportunidade de demoli-los. Foi esse o caso do tombamento, em 1947, da Igreja de São Francisco, de Oscar Niemeyer, na Pampulha, em Belo Horizonte e, em 1948, da sede do Ministério da Educação e Saúde, de Oscar Niemeyer, Lúcio Costa e outros. Durante 30 anos Rodrigo Melo Franco de Andrade foi diretor geral do SPHAN e, segundo Lúcio Costa (MARINHO, 1986:5), a orientação, os estudos e as pesquisas foram sempre iniciativa dele”. Todos os anos de sua gestão foram empenhados em proteger os bens históricos e artísticos do Brasil criando uma legislação específica; preparando e capacitando mão-de-obra técnica; executando trabalhos de campo; lutando judicialmente contra aqueles que se opunham ao seu propósito; empenhando seu prestígio pessoal junto a políticos e governantes para que o SPHAN sobrevivesse; divulgando, através de suas publicações, as ações desenvolvidas; e, acima de tudo, batalhando para a criação de uma consciência nacional de preservação. E assim, “com Rodrigo o clima no Patrimônio era universitário. Ele orientava, atraía os colaboradores mais qualificados, editava revistas, estimulava vocações”. (Ibid.,7) Nos primeiros anos de criação do SPHAN, Rodrigo Melo Franco de Andrade contou com a colaboração de intelectuais, pesquisadores, arquitetos, engenheiros, juristas, mestres de obras que, seduzidos pelo seu entusiasmo e dedicação, empenharam-se na defesa do patrimônio cultural brasileiro. De Manuel Bandeira a Dom Clemente da Silva Neto, de Gustavo Barroso a Vinícius de Moraes, de Carlos Drummond de Andrade a Lúcio Costa, a mobilização em prol do resgate e da recuperação do patrimônio edificado foi o que deu a Rodrigo a sustentação para transformar o SPHAN num órgão de vanguarda e de reconhecimento nacional e internacional. De acordo com o FARIA (1995:34), no Estado Novo surgiram (...) instituições criadas para exercer o controle centralizado sobre o espaço e as pessoas, integrantes do contexto em relação ao qual se deve entender o surgimento da gestão do patrimônio. Para conhecer e tombar bens patrimoniais, os técnicos faziam viagens de inspeção às cidades do nordeste, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul. Onde houvesse monumentos históricos e artísticos, a equipe de pesquisadores, acompanhada de fotógrafos, partia para o levantamento de
  • 7. 7 dados, diagnóstico do imóvel, registro fotográfico e pesquisa de documentos nos arquivos municipais e das irmandades. Tudo havia de ser feito no recém-criado SPHAN, desde a definição conceitual de patrimônio até as obras de restauração. Obras de conservação, consolidação e restauração realizaram-se em proveito dos bens tombados; foram empreendidos estudos e pesquisas relacionadas com a história e a arte no país em diversas áreas; organizou-se arquivo de documentos e dados colhidos em arquivos públicos e particulares, de irmandades sobretudo; iniciaram-se os trabalhos de inventário dos bens tombados; reuniu-se valiosos arquivos fotográficos e estruturou-se uma biblioteca rigorosamente especializada; o laboratório-ateliê recuperava obras de pintura antiga, esculturas e documentos; o setor de museus apoiava o surgimento de novas unidades nos monumentos tombados e assegurava a preservação das edificações e a proteção de patrimônio móvel ameaçado. (MARINHO,1986:21-22) De acordo com ARANTES (1989:13), “em pouco mais de dez anos estava identificada e sob proteção do Estado a maior parte dos bens que até hoje conformam o núcleo do patrimônio histórico oficial do Brasil”. Com o propósito de registrar e divulgar os trabalhos e as pesquisas desenvolvidas no SPHAN, Rodrigo Melo Franco de Andrade criou uma linha editorial denominada Publicações, para editar ensaios e monografias, e a Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, existente até hoje e fonte de pesquisa para historiadores e demais pesquisadores. Além disso, Rodrigo tratava de divulgar, através da imprensa, os propósitos do SPHAN e buscava, em seus artigos, fazer com que o patrimônio fosse de interesse de todos os brasileiros. Para ele era imprescindível que as camadas mais pobres e iletradas da população despertassem para a tarefa de preservar e proteger os testemunhos da história e da arte, tendo consciência de sua importância. Todavia, a missão do SPHAN não foi de todo entendida e aceita por grande parte da população, do clero e de muitas autoridades, nas mais diferentes instâncias. Na medida em que brigavam para defender seus próprios interesses – na maioria das vezes contrários às propostas de preservação e conservação do SPHAN – os oponentes recorriam à justiça e as demoradas pendengas muitas vezes eram fatais para a sobrevivência do bem histórico, arquitetônico ou artístico em litígio. A falta de verbas e as demandas judiciais emperravam o bom desenvolvimento dos projetos do SPHAN. Muitas vezes, atendendo a interesses pessoais, eleitoreiros ou mesmo comerciais, prefeitos, governadores e até presidentes da República interferiam nos processos de tombamento. A prática de obstruir processos de tombamento em prol da especulação imobiliária com o aval dos poderes constituídos sempre foi muito comum em nosso país, pois estes buscam transformar as cidades em nome do progresso e da modernidade, com vistas unicamente ao seu próprio enriquecimento. Analisando o comportamento das classes dominantes com relação aos processos de tombamento, CHAUÍ (1992:38) fez o seguinte comentário, ao proferir um discurso no Congresso Internacional sobre Patrimônio Histórico e Cidadania promovido pela cidade de São Paulo, em 1991:
  • 8. 8 (...)aplicada a bens móveis como objetos de arte, coleções de documentos privados, fotografias, mobiliário e assim por diante, a legislação do patrimônio histórico contribui para valorizá-los ao máximo perante as leis de mercado, por significar na prática uma espécie de autenticidade de valor cultural (...) mas quando aplicada aos bens imóveis de significação histórica e cultural, esta mesma legislação tem sido entendida e duramente combatida entre nós como um verdadeiro atentado ao direito de propriedade, porque significaria na prática a desvalorização de bens particulares. Retornando, a gestão de Rodrigo Melo Franco de Andrade, de 1936 a 1967, pela sua dedicação, obstinação e competência, manteve, durante todo esse período, a maior autonomia que qualquer órgão público jamais teve e foi fundamental, não só para a preservação do patrimônio histórico e artístico constituído, como ainda, para o resgate da memória histórica do Brasil, através das inúmeras restaurações de documentos cartoriais e eclesiásticos. Uma das últimas grandes conquistas de sua gestão foi a promulgação da Lei nº3.924 de 26 de julho de 1961 que “Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos”. Preocupados com a exploração indiscriminada do solo e do subsolo e a conseqüente destruição de jazidas arqueológicas, sambaquis, casqueiros, concheiros, grutas, lapas, abrigos, inscrições rupestres e outros vestígios da ocupação de nosso território pelos paleoameríndios, a equipe do SPHAN conseguiu, através de seu dirigente, que o Presidente Jânio Quadros, no corpo da referida lei, submetesse qualquer exploração ao aval, à autorização e conseqüente fiscalização daquele órgão. Todas as jazidas arqueológicas e pré- históricas passaram a ser consideradas patrimônio da União e sua exploração sem a expressa autorização do SPHAN seria considerada crime contra o Patrimônio Nacional. Mesmo aposentado, em 5 de setembro de 1968, Rodrigo Melo Franco de Andrade tomou posse como membro do Conselho Consultivo do SPHAN. Faleceu naquele mesmo ano. Numa síntese conclusiva da fase “rodrigueana” do SPHAN, cabe destacar a análise feita por ARANTES (1989:13): “Apesar dos riscos das grandes generalizações, diríamos que o caminho seguido pela ação preservacionista oficial no Brasil levou à construção de um campo de atuação profissional que conquistou estatuto acadêmico, base jurídico-administrativa, força política e legitimidade social. Sem dúvida, esta atividade acabou se estancando, se tecnificando, perdendo assim, durante muito tempo, seu sentido político mais amplo, para acabar transformada e entendida como sendo válida em si e por si mesma”. 2.2. A política de atuação do IPHAN a partir da década de 60 No início dos anos 60, na Europa, a arquitetura e o urbanismo passaram a ser tema de discussão e questionamentos quanto aos critérios de tombamento e preservação, principalmente diante dos impactos da padronização da paisagem urbana impostos pela industrialização, servindo de
  • 9. 9 veículo para a perda das identidades nacionais e regionais. Um dos documentos mais importantes então gerados foi a “Carta de Veneza”, de maio de 1964, documento firmado quando da realização do II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, realizado pelo ICOMOS - Conselho Internacional de Monumentos e Sítios. A Carta de Veneza (..) recomenda ampliar a noção de monumentos à moldura que os envolve. Paradoxalmente, em nome dessa subordinação ao excepcional, reconhece valor monumental a “obras modestas” que tivessem adquirido através do tempo “significação cultural e humana”. (CAMPOFIORITO,1984:35) O que se pretendia era conciliar o desenvolvimento urbano com a proteção dos bens imóveis protegidos por tombamentos, salvaguardando os valores ambientais. No caso específico do Brasil as proposições da Carta de Veneza embasaram a elaboração e a implantação de “planos de desenvolvimento urbano”, que visavam a assegurar um convívio harmonioso entre os indivíduos e o patrimônio protegido. Mas a ineficácia desses planos logo veio à tona. Eles eram elaborados “de cima para baixo”, em gabinetes de órgãos públicos, ignorando realidades e demandas locais. Outros encontros internacionais se sucederam. Neles foram produzidas novas “cartas”, visando ao estabelecimento de novos critérios e parâmetros, quanto à conceituação e ação dos governos na preservação de seus patrimônios: Quito (1967), Bruxelas (1969), Amsterdã (1975) e Nairobi (1976). Em linhas gerais, esses documentos embasam o conceito contemporâneo de patrimônio, que reconhece, por exemplo, a importância dos conjuntos urbanos cujo papel histórico e social é relevante, mas cuja arquitetura não era até então considerada expressiva, tais como as vilas operárias, fábricas, oficinas e estações ferroviárias. É também priorizada a urbanização de centros tradicionais e bairros antigos visando assegurar o bem estar de seus moradores. Essas edificações e seu entorno são considerados como lugares de suporte da memória social, e passam a ser vistas como bens coletivos a serem tombados. Merecem desta que nesse contexto as Normas de Quito, documento produzido no encontro promovido pelo Departamento de Assuntos Culturais da OEA – Organização dos Estados Americanos, em novembro/dezembro de 1967, das quais Brasil foi um dos signatários. Elas influenciaram o governo do presidente Castelo Branco a criar nesse mesmo ano a EMBRATUR - Empresa Brasileira de Turismo e o Conselho Nacional de Turismo. No seu texto recomendavam: (...) que os projetos de valorização do patrimônio fizessem parte dos planos de desenvolvimento nacional e fossem realizados simultaneamente com o equipamento turístico das regiões envolvidas. Recomendava-se, ainda, a cooperação dos interesses privados e o respaldo da opinião pública para o desenvolvimento desses projetos. (RODRIGUES,2001:18) O governo militar brasileiro promoveu, através do Ministério de Educação e Cultura, em abril de 1970, em Brasília, um encontro entre governadores, prefeitos e gestores de instituições culturais
  • 10. 10 para discutirem questões sobre a proteção do patrimônio histórico e natural, bem como mecanismos de ação complementares à ação do IPHAN. Foi então assinado o Compromisso de Brasília (Idem, 2001:22), mediante o qual museus, conselhos, fundações e programas passaram a desenvolver serviços que visavam à descentralização do IPHAN. Dentre outras coisas, o documento propunha a criação de cursos de história da arte, arquivologia e museologia, além de conservação e restauração nos níveis superior, médio e artesanal; da inclusão de disciplinas que contribuíssem para a conscientização da importância do patrimônio histórico em todos os níveis do ensino formal; a capacitação dos professores para que esses atuassem como agentes de conscientização e cidadania; o entrosamento entre as universidades, os arquivos e as bibliotecas municipais e estaduais; criação de serviços estaduais para a preservação da natureza, articulados com o então IBDF – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal. Propunha-se ademais a fomentar o entendimento de que áreas militares, patrimônios de ordens religiosas e confrarias, com destaque para “cemitérios e especialmente túmulos históricos e artísticos e monumentos funerários”, deveriam ser considerados como parte integrante do patrimônio nacional, e que os seus gestores deveriam viabilizar a sua preservação. Após o Compromisso de Brasília surgem, através de iniciativas isoladas, órgãos estaduais de preservação do Patrimônio, com políticas específicas de preservação e tombamento, o que gerou variações regionais. O Estado da Guanabara, atual Estado do Rio de Janeiro, elaborou uma legislação específica de proteção ao patrimônio. Em São Paulo, o CONDEPHAAT propôs então a compatibilização, ainda que sem muito fundamento teórico, entre patrimônio e turismo. Na Bahia, o IPAC promoveu um inventário de preservação que visava “possibilitar a planejadores uma atuação preventiva, substituindo a preservação passiva pela reintegração dos monumentos na vida sócio- econômica”.(CAMPOFIORITO,1984:39) Internamente, o IPHAN mudava aos poucos os seus conceitos de bens a serem tombados. O Conselho Consultivo do IPHAN intensificou no período de 1970 a 1990 os debates sobre a preservação do entorno dos bens tombados, de exemplares da arquitetura do século XX, do patrimônio natural, dos centros e sítios históricos e da evasão das obras de arte. É nesse contexto de referência que, a partir de 1972, começaram a ser tombados exemplares da arquitetura eclética do Rio de Janeiro. Os técnicos do IPHAN, pressionados por veemente solicitação do Instituto dos Arquitetos do Brasil e do Clube de Engenharia defendendo o tombamento dos prédios da Avenida Rio Branco (nas imediações da Cinelândia), como testemunhos da reforma urbanística do prefeito Pereira Passos, admitem serem aqueles imóveis registros da história da arquitetura no Brasil. Assim foram tombados o Museu Nacional de Belas Artes, o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional e a Caixa de Amortização, testemunhos da Belle Époque na então capital da República. Nova mudança ocorrerá nos conceitos e políticas de preservação e tombamento em razão dos movimentos ecológicos da década de 70. O meio ambiente passa a ser reconhecido como patrimônio natural e moldura das cidades, e a sua preservação é afirmada como necessária à manutenção da qualidade de vida da população. Sítios e conjuntos urbanos de valor cotidiano, bens móveis e imateriais produzidos pelos artesãos, festejos e tradições populares que nada mais eram do que formas de comunicação simbólica, aliadas ao meio ambiente e às heranças naturais passíveis de
  • 11. 11 serem destruídas pelo homem, começaram a ser considerados “patrimônio cultural”. Nesse mesmo contexto, novos bens intangíveis, condições de possibilidade da construção da memória da população, deveriam ser preservados. Além disso, algumas das obras da tecnologia industrial adquiriam um novo valor estético. Desta forma, pontes metálicas, chafarizes, fábricas, estações ferroviárias, faróis, mercados, dentre outros, vieram a ser tombados pelo IPHAN. Os novos conceitos de patrimônio agudizam uma crise interna ao IPHAN, quando Aluísio Magalhães, presidente da recém-criada Fundação Nacional Pró-Memória, veio a assumir a presidência do Conselho Consultivo do SPHAN em 1979, tomando para si a tarefa de dar maior abrangência à atuação do órgão, em consonância com o espaço de experiências e o horizonte de expectativas da abertura política por que passava o país ao fim do regime militar. Nos anos 80 emergem movimentos sociais e comunitários que reivindicavam uma mudança na política de patrimônio de modo a contemplar outros aspectos e manifestações da cultura nacional, até então desvalorizados. Não bastava só preservar lugares históricos e objetos sem outro objetivo que o de resguardar modelos estéticos e simbólicos, testemunhos de um passado, considerado imune às mudanças dos novos tempos. Não bastava tentar cristalizar, através do tombamento e da preservação, testemunhos de pedra e cal. Os novos movimentos sociais evidenciavam que os testemunhos culturais que o IPHAN até então preservara não davam conta da diversidade constitutiva da identidade cultural brasileira. De acordo com FONSECA (1997:227), (...) a carga afetiva que pressupõem as noções de identidade ou de qualidade de vida, constitui um problema levantado neste período – problema que, como vem sendo abordado, assumiu uma dimensão não apenas conceitual mas também política. Questionamentos profundos quanto à política de preservação levaram os órgãos oficiais de patrimônio e tombamento existentes no país a reverem os seus conceitos e a perceberem, por exemplo, que um monumento arquitetônico do período colonial era testemunho, subliminar, não só de um estilo artístico, como também de modos de vida e /memória coletivos (das ordens religiosas, dos fiéis, dos escravos, dos índios). Tais tinham reconhecida uma importância simbólica, social e política, que ia além de sua carga estritamente percebida em temos arquitetônicos e artísticos. Embora todas as questões de ordem social, estética e política norteassem as discussões e pressionassem por uma reestruturação interna, havia, no cerne de tudo isto, uma questão básica para o IPHAN. Este órgão tinha que mudar a sua política de tombamento. Ganha destaque nesse contexto o fato de que as opções de tombamento, segundo os critérios inicialmente estabelecidos pelo IPHAN estavam, em 1982, praticamente esgotadas. Segundo as diretrizes traçadas por Mário de Andrade, praticamente todos os exemplares arquitetônicos, bens móveis e arqueológicos, de belas artes e artes aplicadas já haviam sido tombados. Todavia as mudanças não aconteceram sem acaloradas discussões nas reuniões do Conselho Consultivo. CAMPOFIORITO (1984:42) chegou a dizer que (...)“é preciso reconhecer que cultura é coisa muito séria para ser entregue a especialistas”. A título de exemplo e para ilustrar as divergências de pensamento dos Conselheiros do IPHAN, a sessão para decidir sobre o tombamento
  • 12. 12 do Terreiro da Casa Branca, bem cultural representativo da etnia afro-brasileira, em Salvador, Bahia, quase não aconteceu: foram “3 votos a favor, 1 contra, 2 abstenções e 1 pedido de adiamento”.(FONSECA,1997:240) De forma inédita, testemunhos da imigração japonesa, italiana e alemã, passaram, a partir daquela ocasião, a receber registro no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. Todas estas propostas de proteção e discussões sobre o patrimônio histórico e artístico nacional influenciaram os parlamentares que redigiram a Constituição de 1988, promulgada em 5 de outubro daquele ano. Consta do corpo da Carta Magna: Art. 216: Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. § 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. (CASTRO,1991:9) A partir de 1988, com a unificação do SPHAN e da Fundação Nacional Pró-Memória, os processos de tombamento “não convencionais” que até então eram encaminhados para arquivamento passaram a serem analisados pelo Conselho Consultivo, que teve sua esfera de atuação ampliada e passou a opinar em todas as decisões sobre tombamentos. CAMPOFIORITO (1984:42) traça um perfil da política de tombamento do IPHAN no período de 1937 a 1982 e nos informa que, dos bens tombados, 40% eram exemplares da arquitetura religiosa, 94% eram bens arquitetônicos, 4% eram bens móveis e 2% bens paisagísticos. Quanto à sua localização geográfica, 22,5% estavam no Rio de Janeiro, 20% em Minas Gerais, 18% na Bahia e 8% em Pernambuco. Após a reestruturação do IPHAN e a conseqüente mudança de critérios para os bens a serem tombados, este quadro se alterou substancialmente. Entre 1970 e 1990, o Livro de Tombo Arqueológico, Etnológico e Paisagístico recebeu 46 inscrições; o Livro de Tombo Histórico, 94 inscrições e o Livro das Belas Artes, 86 inscrições. No início da década de 90, a pluralidade da cultura brasileira alcançava uma maior expressão, como bem cultural a ser preservado pelo Poder Público Federal. Mas justamente nesse momento em que sua área de atuação é mais diversificada e que se torna evidente a necessidade de ampliar e qualificar o seu corpo técnico, o IPHAN sofre duro revés. Com o governo Collor e a política de radical desestatização seu quadro funcional foi substancialmente reduzido, e novas contratações de pessoal especializado são proibidas. Essa inflexão nos rumos da política pública brasileira deixa até hoje marcas. A exemplo de outros órgãos federais, o IPHAN não admite técnicos desde 1987. A evasão de
  • 13. 13 antigos profissionais mediante aposentadoria e uma acelerada terceirização de tarefas provocou uma lacuna nos quadros técnicos, e uma grave descontinuidade nos trabalhos de preservação, tombamento e fiscalização, seqüelas reiteradamente denunciadas por técnicos do órgão em reuniões plenárias, seminários e demais fóruns da área de patrimônio promovidos pelo IPHAN. Ainda assim o IPHAN conseguiu no passado recente ampliar sua área de atuação e equiparar seus procedimentos técnicos e critérios de preservação às tendências internacionais. O Decreto nº 3.551 de 4 de agosto de 2000 que “Institui o registro de bens de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional de Patrimônio Imaterial e dá outras providências” visa impedir a perda de referências culturais e contribuir para preservação da memória social das comunidades. Na maioria das vezes estas práticas não possuem um referencial escrito, uma “receita” que lhes assegure a continuidade: elas existem na tradição oral da comunidade. Tem destaque nesse contexto, por exemplo, o canto popular, sem partitura nem letra escrita. A exemplo do Decreto-lei nº 25, pelo Decreto 3.551 foram criados os Livros de Tombo com o propósito de registrar, por categorias, os bens imateriais a serem preservados. Diz a Lei: Art.1º - Fica instituído o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro. § 1º Esse registro se fará em um dos seguintes livros: I – Livro de Registro dos Saberes, onde serão inscritos conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades; II – Livro de Registro das Celebrações, onde serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social; III – Livro de Registro das Formas de Expressão, onde serão inscritas manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas; IV – Livro de Registro dos Lugares, onde serão inscritos mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentra e reproduzem práticas culturais coletivas. § 2º A inscrição num dos livros de registro terá sempre como referência a continuidade histórica do bem e sua relevância nacional para a memória, a identidade e a formação da sociedade brasileira. Art.7º - O IPHAN fará a reavaliação dos bens culturais registrados, pelo menos a cada dez anos, e a encaminhará ao Conselho Consultivo do patrimônio Cultural para decidir sobre a revalidação do título de Patrimônio Cultural do Brasil. Parágrafo único. Negada a revalidação, será mantido apenas o seu registro, como referência cultural de seu tempo. 3 Danças de roda, bandas de música, rodas de samba, literatura de cordel, rendas de bilro, teatro de mamulengos, feiras populares, dobrares de sinos e demais manifestações populares tiveram seus pedidos de tombamento encaminhados ao IPHAN e, junto às igrejas setecentistas, sobrados e fortalezas, canhões e santos barrocos, constituem hoje Patrimônio Cultural Brasileiro, num empenho pela preservação da memória tanto das coisas como das palavras. 3 Decreto nº 3.551 de 4 de agosto de 2000
  • 14. 14 2.3. Política de Patrimônio no Estado e no Município do Rio de Janeiro Devido a todos esses movimentos preservacionistas que ocorriam no país e com o propósito de fortalecer e ratificar o papel dos Estados e Municípios quanto à política e à ação de preservação, a Constituição de 1988, determina: Art.23 – É competência da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (...) III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, Artístico e cultural, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos(...) Precedendo às leis e decretos, o antropólogo Darcy Ribeiro, ao assumir a Secretaria de Ciência e Cultura do Estado do Rio de Janeiro, na gestão do governador Leonel Brizola, de 1982 a 1986, reestruturou a política cultural no Estado. Como decorrência, no INEPAC – Instituto Estadual de Patrimônio Artístico e Cultural, o patrimônio cultural passou a ser analisado a partir de três premissas propostas pelo arquiteto Italo Campofiorito, responsável pela direção dos serviços estaduais de proteção ao patrimônio cultural, a saber: 1 – a diversificação ilimitada do bem cultural deve ser reconhecida e louvada; 2 – o patrimônio não constitui um acervo de coisas passadas, mas, ao contrário, é parte viva da poética do povo e dos artistas; 3 – as populações, com sua sabedoria local, devem participar ativamente da defesa de um patrimônio que é seu. (CAMPOFIORITO,1984) Sob o respaldo da autoridade científica e institucional de Darcy Ribeiro, foram, de fato, revistos os critérios de tombamentos de bens a serem preservados, o, sob a proteção do Estado, um patrimônio de extrema significância popular, indissoluvelmente ligado à memória afetiva dos cidadãos. Os gestores do patrimônio começaram a perceber que, mobilizados e motivados a preservar o que lhes dizia respeito, os cidadãos “comuns” seriam, também, agentes culturais. Era tempo de resgatar a memória do cotidiano e da experiência social, vivenciada pela população e constituí-la em patrimônio cultural. Desta maneira, a Fundição Progresso, os Bondinhos de Santa Teresa, a Casa da Flor de Gabriel dos Santos e o Sítio de Santo Antônio da Bica, de Roberto Burle Marx, foram considerados casos exemplares da nova atitude 4 . Eles receberam tratamento de bem cultural, bem como outros testemunhos materiais de grande significado simbólico, como a Pedra do Sal, no bairro da Saúde, na cidade do Rio de Janeiro, berço do rancho carioca e “testemunho secular de religiosidade e arte afro- brasileira” (Idem,1984:6); as pedras da Moreninha e dos Namorados, em Paquetá, símbolos do romantismo literário nacional; e as dunas entre Cabo Frio e Arraial do Cabo testemunhos ambientais dos hábitos e tradições de populações pesqueiras e da necessidade de conservação da 4 4 Esses tombamentos foram propostos pelo arquiteto Italo Campofiorito durante a sua gestão no INEPAC.
  • 15. 15 biodiversidade. Nesse mesmo Contexto, visando sustar a expansão urbana predatória, foi tombada, em 1984, a praia de Grumari 5 , no Rio de Janeiro, com 10km de praia, ilhas, pontões e suas paisagens. Após um período sem grandes inovações, nem preservações de significado valorativo, foi tombada, em 1999, a cidade de Petrópolis com seus monumentos, palácios e palacetes, praças, ruas e esculturas, sítio histórico de extrema representatividade do Império. A efetivação deste tombamento, provisório desde 1980, permitiu que bens isolados e toda a ambiência de seu entorno fossem preservados, contrariando fortes interesses de especuladores imobiliários. Há alguns anos o INEPAC sofre com a precária estrutura administrativa. A fiscalização da preservação dos bens tombados se faz com muita dificuldade. A isso se soma o fato corrente de que os Conselheiros sejam obrigados a ocupar parte significativa de seu tempo com análises de propostas de tombamento (negadas, na sua grande maioria), remetidas por parlamentares com fins puramente eleitoreiros e demagógicos, sem nenhuma relevância cultural. No âmbito municipal, a cidade do Rio de Janeiro assumiu uma posição de vanguarda quanto à preservação de bens culturais que não estavam contemplados pelo IPHAN nem pelo INEPAC. O “Corredor Cultural”, instituído em 1979 pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, tinha como objetivo preservar e revitalizar o centro da cidade, bem como ordenar seu crescimento urbano sob uma nova ótica. Atendendo anseios de comerciantes, moradores e urbanistas que buscavam revitalizar aquela área sem necessariamente, demolir e, conseqüentemente, destruir a memória da cidade, o Escritório Técnico do Corredor Cultural mapeou o Centro da cidade e diagnosticou que era possível perceber que havia conjuntos urbanos significativos, testemunhos dos diversos períodos históricos e sociais pelos quais a cidade passou desde a sua fundação e que, pelo seu caráter civil e cotidiano, não haviam sido considerados até então como exemplares carregados de “história e arte “. Em 1983, ao ser promulgada a Lei Municipal do Corredor Cultural, foram tombados 3.000 imóveis no Centro Histórico do Rio de Janeiro, preservando a ambiência cultural urbana e valorizando o conjunto, ao invés do monumento isolado. A limitação do gabarito de edifícios a serem erguidos nas circunvizinhanças permitiu valorizar e resgatar a história da arquitetura eclética carioca do final do século XIX e início do século XX, recuperando “cenários” históricos característicos da Colônia, do Império, da República Velha e do Estado Novo. Assim, exemplarmente, o Saara dos imigrantes árabes e judeus, a Lapa da boemia e a Cinelândia requintada foram considerados como bens culturais de vital importância para se entenderem as transformações culturais ocorridas na cidade. As cores das fachadas, as formas e os ornatos do ecletismo arquitetônico do início do século XX foram restaurados e preservados, recuperando o colorido do conjunto como foram concebidos esses imóveis no início do século. A participação dos proprietários e comerciantes na escolha das cores foi democrático-participativa. Sob orientação do Escritório Técnico, foi instituído o projeto Cores da Cidade, na Rua Sete de Setembro, e padronizados os letreiros e as vitrines. Para que os comerciantes e proprietários mantivessem seus imóveis nas condições técnicas desejáveis, recuperados e conservados, a partir de 1986 a Prefeitura do Rio de Janeiro passou a 5 Os tombamentos de Cabo Frio, Arraial do Cabo e Grumari foram propostos pelo governador Leonel Brizola. Ver Campofiorito, 1984 – ofícios e propostas de tombamentos dirigidas ao Secretário de Ciência e Cultura do Estado do Rio de Janeiro.
  • 16. 16 isentá-los do pagamento de taxas e impostos municipais (IPTU). Essa iniciativa atraiu comerciantes e moradores para o Centro, repovoando a área e recuperando a dinâmica social e cultural necessária para a sua revitalização. Instalaram-se assim no Centro novos bares, restaurantes, casas de espetáculos e centros culturais. A noite carioca recuperou vitalidade em regiões como a Praça XV, a Lapa e a Rua do Lavradio. Consta dos projetos do Escritório Técnico do Corredor Cultural a reurbanização da Cinelândia e a restauração e revitalização da Praça Tiradentes e arredores (com apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID). Tão logo o Corredor Cultural começou a apresentar sinais de sucesso, outras iniciativas de preservação surgiram na cidade do Rio de Janeiro: as APACs – Áreas de Proteção aos Ambientes Culturais. A legislação do Corredor Cultural foi replicada em outras áreas com feições diversas na cidade, através de leis ou decretos municipais, o que, segundo alguns especialistas em patrimônio e urbanismo, é um equívoco. Cada bairro tem uma feição e precisa ter a sua própria narrativa. Muitas APACs não alcançaram os objetivos previstos nas suas leis ou decretos de origem porque não surgiram da vontade da comunidade, que não foi envolvida nem ouvida para a elaboração dos critérios de preservação a serem estabelecidos. Discordâncias à parte, o que cabe aqui salientar é que diversos bairros – Santa Teresa, Gamboa, Urca, Cruz Vermelha, Laranjeiras, Santa Cruz, Lido (Copacabana) e Vila Izabel - tiveram suas feições preservadas. 2.4 Participação da iniciativa privada na preservação A preservação é uma prática social de múltiplas implicações. Sob esta ótica, ARANTES (1989:16) nos diz que: (...) trata-se de uma atividade produtiva, criadora de valor: de valor econômico que pode ser aumentado ou diminuído, dependendo do tratamento que se dê aos bens preservados; de valor histórico, constitutivo da memória, da territorialidade e da identidade nacional, além de outras identidades mais específicas e locais; e de valor político, levando ao aspecto da hegemonia e ao dos direitos dos cidadãos. No início dos anos 80 a ameaça da perda da memória coletiva fez com que muitas instituições empresariais e industriais, ligadas ou não ao Poder Público, buscassem criar, autonomamente, departamentos, setores ou coisa que o valha, com o intuito de resgatar a sua própria memória corporativa, e impedir o total desaparecimento dos testemunhos de sua trajetória e de sua história institucionais. Foi assim que a Rede Ferroviária Federal S.A, a LIGHT, a Eletrobrás, os Correios, a Fundação Oswaldo Cruz, o Banco do Brasil e outras empresas implantaram programas de preservação e resgate da sua história, que redundaram na criação de museus, centros de documentação, arquivos fotográficos e documentais e centros culturais. CANCLINI (1998:89) busca explicar tais iniciativas:
  • 17. 17 Enquanto o patrimônio tradicional continua sendo responsabilidade dos Estados, a promoção da cultura moderna é cada vez mais tarefa de empresas e órgãos privados. Dessa diferença derivam dois estilos de ação cultural. Enquanto os governos pensam sua política em termos de proteção e preservação do patrimônio histórico, as iniciativas inovadoras ficam nas mãos da sociedade civil, especialmente daqueles que dispõem de poder econômico para financiar arriscando. Uns e outros buscam na arte dois tipos de édito simbólico: os Estados, legitimidade e consenso ao aparecer como representantes da história nacional; as empresas, obter lucro e construir, através da cultura de ponta, renovadora, uma imagem “não interessada” de sua expansão econômica. A formação e a preservação do patrimônio passou a ser também obra da sociedade civil, de empresas privadas ou grupos comunitários, diversificando os seus objetivos constitutivos. Muitos bancos e fundações não estatais e governamentais constituíram seus museus de história e de arte, cuja origem se deu na acumulação de riqueza através de investimentos em bens culturais e como estratégia de marketing e de promoção social. Outras empresas buscaram patrocinar grandes obras de restauração de bens culturais, uma ação que visava à divulgação de seu nome à uma ação social, ao estabelecimento de uma imagem corporativa. Acompanhamos de perto um destes processos de preservação: o da empresa pioneira nesse segmento que foi a Rede Ferroviária Federal S.A. Em 1980, o então prefeito de São João del Rey, Octávio Neves, com o apoio da população local, reivindicou, junto à RFFSA, o retorno a sua cidade da Locomotiva Nº 1 da Estrada de Ferro Oeste de Minas, pela sua importância histórica e pelas relações de memória que aquela máquina era capaz de estabelecer com a comunidade. O Ministério dos Transportes, que naquele mesmo ano havia criado o PRESERVE, Programa de Preservação do Patrimônio Histórico, optou por, não só fazer com que a Locomotiva Nº 1 retornasse, como também, transformar todo o conjunto ferroviário daquela cidade no Centro de Preservação da História Ferroviária de Minas Gerais. O trabalho de pesquisa histórica para a sua instalação foi acompanhado, auxiliado e estimulado pela própria população que, motivada, levava para a equipe de museólogos recortes de jornais, revistas, fotografias, documentos e objetos que há anos guardavam consigo e que eram parte de suas histórias pessoais. Inaugurado por ocasião do centenário da inauguração da Estrada de Ferro Oeste de Minas, em 1981, com a estação, a gare, as plataformas, as oficinas, as locomotivas, os carros de passageiros e os vagões totalmente restaurados e em operação, o Museu Ferroviário resgatou o orgulho e a identidade da população mineira na medida em que lhe foi devolvido o “seu trem”. Em 1982 foram erradicados os 200 km de linhas férreas comerciais e de passageiros que, divididas em dois ramais, ligavam São João del Rey a Aureliano Mourão e São João del Rey a Antônio Carlos. Foram preservados, para fins turísticos, apenas 12 km de linha entre São João del Rey e Tiradentes, posteriormente tombado pelo IPHAN. É importante ressaltar, nesse caso que citamos, que a comunidade foi estimulada a preservar os seus referenciais de memória. Caso não o fizesse, sofreria as conseqüências posteriormente: uma amnésia coletiva com relação a sua própria
  • 18. 18 origem que resultariam, como diz LE GOFF (1996:469), em “perturbações graves de identidade coletiva”. Logo outras Superintendências Regionais da RFFSA, impressionadas com os resulta dos de mídia e de valorização da auto-estima entre os ferroviários e a população local, resolveram instalar museus ferroviários nos importantes centros servidos pelas diversas malhas ferroviárias, cada qual com sua origem, com sua história e com suas tradições. Foram então criados, até 1990, Centros de Preservação da História Ferroviária nas seguintes cidades: Recife, Fortaleza, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Juiz de Fora, Campos, Miguel Pereira, Curitiba, São Leopoldo e Bauru, todos com a efetiva participação das comunidades locais. Com o desmonte da ferrovia através da privatização de suas malhas, alguns destes museus ferroviários foram fechados, outros transferidos para a administração das prefeituras locais e outros ainda, como o do Rio de Janeiro, continuam funcionando, embora precariamente e sem nenhum interesse dos liquidantes em revitalizá-lo. Importantes peças correm o risco de se perderem, dentre elas a primeira locomotiva a vapor do Brasil, a Baronesa, tombada, inclusive, pelo IPHAN em 1957. Um outro aspecto de preservação a ser considerado é que, percebendo que, em todos os países o Poder Público não possui recursos suficientes para cuidar de todo o patrimônio a ser preservado, dada a sua diversidade e amplitude, uma nova instituição de apoio, fomento e subvenção de proteção e conservação do patrimônio surge nos anos 80: o setor privado que, através de fundações sem fins lucrativos e de ONGs – Organizações Não Governamentais e de incentivos fiscais oferecidos pelos governos, passam a atuar na preservação do patrimônio cultural, sem, contudo, criarem seus próprios museus. Como exemplo podemos citar a Fundação Calouste Gulbenkian, em Portugal e a Fundação Roberto Marinho e a VITAE, no Brasil. Este é, numa síntese sumária, o histórico das políticas de preservação e tombamento no Brasil. BIBLIOGRAFIA DE REFERÊNCIA - ARANTES, Antonio Augusto. A preservação de bens culturais como prática social. Revista de Museologia, São Paulo, ano 1, n.1, p. 12-16, 1989. _____.(Org.). Produzindo o passado: estratégias de construção do patrimônio cultural. São Paulo: Brasiliense, 1984. - BOMENY, Helena Busquet. O patrimônio de Mário de Andrade. In: CHUVA, Márcia (Org.). A invenção do patrimônio: continuidade e ruptura na constituição de uma política de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: IPHAN, 1995. p. 11-25. (Debates, 2). - BRASIL. Compromisso de Brasília, de abril de 1970: 1. Encontro de Governadores de Estado, Secretários Estaduais da Área Cultural, Prefeitos de Municípios interessados, Presidentes e Representantes de Instituições Culturais. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/cartas patrimoniais/compromissobsb-70.htm> Acesso em: 15 out. 2001.
  • 19. 19 - BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: de 5 de out. de 1988. Artigos referentes ao Patrimônio Cultural Brasileiro. <http://www.iphan.gov/legislac/const88.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - BRASIL. Decreto n. 3.551, de 4 de agosto de 2000. Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem o Patrimônio Cultural Brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial e dá outras providências. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/decreto3551.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - BRASIL. Decreto-lei n. 25, de 30 de novembro de 1937. Organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/nacionais/decretolei25.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - BRASIL. Lei n. 378, de 13 de janeiro de 1937. Dá nova organização ao Ministério da Educação e da Saúde Pública. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/nacionais/lei378-37.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - BRASIL. Lei 3.924, de 26 de julho de 1961. Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré- históricos. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/nacionais/lei3924.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - BRASIL. Lei 6.513, de 20 de novembro de 1977. Dispõe sobre a criação de áreas especiais e locais de interesse turístico; sobre o inventário com finalidades dos bens de valor natural acresce inciso ao Art. 2º da Lei 4132, de 10 de setembro de 1962; altera a redação e acrescenta dispositivo à Lei nº 4717, de 29 de junho de 1965 e dá outras providências. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/turismo%20cultural/6513-77.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - CAMPOFIORITO, Italo. Muda o mundo do patrimônio: notas para um balanço crítico. Revista do Brasil, Rio de Janeiro, v.1, n.1, p.32-43, 1984. - _____. Patrimônio cultural: onde a cultura existe, dar voz a ela. Revista do Brasil, Rio de Janeiro, p.6-17, 1984. Edição especial. - _____.O tombamento é um santo remédio. Revista do Brasil, Rio de Janeiro, v.1, n.2, p.20-29, 1984. - CASTRO, Sonia Rabello de. O estado na preservação de bens culturais. Rio de Janeiro: Renovar, 1991. - CHAUÍ, Marilena. Política cultural, cultura política e patrimônio histórico. In: O DIREITO à memória: patrimônio histórico cidadania. São Paulo: DPH, 1992. p.37-46. - DAMIÁN, Eduardo Salinas. Turismo cultural, conservación del patrimonio y viabilidad económica. In: MUSEOS, patrimonio y turismo cultural. Paris: ICOM, 2000. p.51-57. - FARIA, Luiz de Castro. Nacionalismo, nacionalismos: dualidade e poliformia. In: A Invenção do patrimônio: continuidade e ruptura na constituição de uma política de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: IPHAN, 1995. v.1, p. 27-40. (Debates, 2). - FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimômio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ: IPHAN, 1997. p.27-40. - HERRMAN, Yani. Prefácio. In: MUSEOS, patrimonio y turismo cultural. Paris: ICOM, 2000.
  • 20. 20 - HORTA, Maria de Lourdes Parreiras et al. Guia básico de educação patrimonial. Rio de Janeiro: IPHAN; Petrópolis: Museu Imperial, 1999. - _____. Semiótica e museu. In: CADERNOS de ensaios: estudos de museologia. Rio de Janeiro: IPHAN, 1994. p.9-28. - ICOM. Carta de Veneza, de maio de 1964: carta internacional sobre conservação e restauração de monumentos e sítios. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/cartas patrimoniais/veneza-64.htm>. Acesso em: 15 out. 2001. - KESSEL, Carlos. O movimento neocolonial e a preservação do patrimônio. Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 23, p.173-188, 2001. - LE GOFF, Jacques. História e memória. 4. ed. Campinas: UNICAMP, 1996. - MAGALHÃES, Aline Montenegro. Ouro Preto entre antigos e modernos. Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 33, p. 187-208, 2001. - MARINHO,Teresinha. Rodrigo e seus tempos: Rodrigo Melo Franco de Andrade. Rio de Janeiro: Função Nacional Pró-Memória, 1986. - _____ ; BERNARDES, Vera. Rodrigo e o SPHAN: Rodrigo Mello Franco de Andrade. Rio de Janeiro: IPHAN, 1994. p. 29-40. - QUEBEC. Declaração de Quebec, princípios de base para uma nova museologia: 1984 Disponível em: <http://www.revistamuseu.com.br/legislacao/museologia/quebec.htm.> Acesso em: 03 set. 2001. - QUETIN, Christine. Patrimonio, museos y turismo cultural: elementos para el debate. In: MUSEO, patrimonio y turismo cultural. Paris: ICOM, 2000. - RODRIGUES, Marly. Preservar e consumir: o patrimônio histórico e turístico. In: FUNARIO, Pedro Paulo; PINSKY, Jaime (Org.). Turismo e patrimônio cultural. São Paulo: Contexto, 2001. Cap. 2. - RÚSSIO, Waldisa. Cultura, patrimônio e preservação. In: ARANTES, Antonio Augusto (Org.). Produzindo o passado: estratégias de construção do patrimônio cultural. São Paulo: Brasiliense, 1984. Cap. 3. - SCHEINER, Teresa Cristina. Museologia, turismo y patrimonio: perspectivas de acción integrada. In: MUSEOS, patrimonio y turismo cultural. Paris: ICOM, 2000. p. 115-112. - _____. Museus e museologia. Uma relação científica? Ciências em Museus, Rio de Janeiro, v.1, p. 59-63, 1989. - UNESCO. Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural, de 16 de novembro de 1972. Disponível em: <http://www.iphan.gov/legislac/cartaspatrimoniais/17cofunesco-72.htm> Acesso em: 15 out. 2001. - URRY, John. O olhar do turista: lazer e viagens nas sociedades contemporâneas. São Paulo: SESC, 1996. p.20-33.