1. ponto_e_virgula JULHO 2007 EDIÇÃO 4
Um documentário sobre o tempo
“Bobagem também é literatura”
De janeiro a dezembro, no
Brasil é sempre temporada
de café
Despimos o poderoso velhinho
2. ponto_e_virgula
JUlHO 2007 EDIÇÃO 4
ESPAÇOS
REDAÇÃO
04
Adriana Seguro
Perfil Carolina Moura
NESTA EDIÇÃO
Fernanda Dutra
Tio Sam – Despimos o poderoso velhinho
Juliana Sakae
06 12
Cinema Lucas Sarmanho
O Café dos Cafés Luisa Frey
Santiago, de João Moreira Salles: Marina Ferraz
De janeiro a dezembro, no Brasil é sempre
Marina Veshagem
um documentário sobre o tempo temporada de café
08
Matheus Joffre
15
Música Maurício Tussi
Vanguart Pedro Santos
Nirvana, Kurt Cobain e a voz de O homem de lugar nenhum na estrada - As viagens,
uma juventude angustiada EDIÇÃO
estradas e canções de Hélio Flanders, vocalista do
10
Fernanda Volkerling
Vanguart
Literatura Luisa Frey
18 De Chaplin a Sganzerla Marina Veshagem
A cegueira sobre o ponto de vista de um
dos maiores romancistas portugueses
DIAGRAMAÇÃO
Cineclubismo - O cinema que discute, toma sopa e
21 Carolina Moura
passa longe dos shopping centers.
Entrevista Maurício Tussi
Thiago Bora
Mário Prata - “Bobagem também é
literatura”
CAPA
25 Esporte Juliana Sakae
ARTE FINAL
A tocha dos Jogos Pan-americanos
Carolina Moura
chega esse mês a Florianópolis
28 Viagem REVISÃO
Adriana Seguro
Fim do Exílio - Minha terra tem palmeiras Lucas Sarmanho
e posso dizer que já fui lá Marina Ferraz
30 Rodrigo Tonetti
Fotografia
;
Álbum de viagens
Florianópolis - SC
33 Criação
Um homem e um telefone no dia dos
namorados.
34 Causos&Coisas
www.revistapontoevirgula.com
3. 03
[car ta a o l e i to r ]
A
revista ponto-e-vírgula chega à
quarta edição. Durante esse percur-
so, recebemos elogios e críticas, to-
dos muito bem-vindos. Estamos buscando
estilo e criando peculiaridades para fazer
uma revista com o jeito de quem a faz e a
cara de quem a lê.
A edição de julho – mês de férias para
algumas pessoas, mas não para nós – traz
duas novidades. A primeira se refere à
criação de um novo espaço. Sentíamos
que faltava algo na parte cultural da re-
vista: a música. Conheça algumas cu-
riosidades sobre o Nirvana, o conjunto
de rock que quebrou tudo nos anos 90.
Outra novidade são os textos de quem, até
então, nunca tinha escrito para a revista.
O revisor Lucas Sarmanho e o diagrama-
dor Maurício Tussi mostram, respectiva-
mente, um perfil do Tio Sam e o “Conto do
Telefone” .
E ainda: reportagem sobre a tradição
dos cafés na Lagoa da Conceição, em Flo-
Confira o novo espaço de rianópolis, mais música na trajetória do
MÚSICA da ponto-e-vírgula. vocalista da banda Vanguart e a história
dos cineclubes no Brasil. Tem também o
pág 8
espaço de fotografia, onde reunimos fotos
que mostram duas faces de três lugares
diferentes.
Julho, mês de férias. Se você decidir
viajar, não esqueça de ler a ponto-e-vír-
gula antes. Você não vai se arrepender!
A Redação
imagem disponível em groupe.bliss.free.fr
4. 04
[per fil ]
por Lucas Sarmanho
L
ivre, rico, diabólico, patriota, imperialista. São vários os
adjetivos encontrados por aí na tentativa de defini-lo, O velhinho de
mas Tio Sam não é do tipo que se abala por fofocas. Com
mais de dois
231 anos completos neste 4 de julho, a figura mais famosa do
séculos de vida
mundo continua disputando o centro das atenções mundiais
e nega com veemência que esteja ficando velho.
não perde a
Seu nome verdadeiro é U.S.A., mas prefere ser chamado
majestade
de Uncle Sam, ou Tio Sam (na tradução em português). Dife-
renciado no nascimento, por atingir a independência antes
dos seus vizinhos, apresentava um grande fascínio pela guer-
ra desde garoto: 37 conflitos contaram com a sua participação
direta, o que resultou na morte de mais de um milhão dos
seus filhos e em muitos outros milhões de vítimas nos países
onde guerreou.
Tio Sam, no entanto, defende que foram exatamente as
guerras que lhe permitiram liberdade e o levaram à condição
de superpotência mundial. Afinal, os momentos mais mar-
cantes de sua vida se deram através delas; desde a Guerra de
Secessão - na qual fez crescer a sua indústria - até a Segunda
Tio Sam
Guerra Mundial - que apaziguou a crise da Grande Depressão
de 1929 e o levou, como superpotência, à Guerra Fria, contra
os socialistas soviéticos.
Com o fim da União Soviética em 1991 e a ascensão de-
finitiva de Tio Sam como única superpotência mundial, havia
muito que se comemorar. Mas a alegria não durou muito. Por
todo o mundo existia ainda muita oposição aos seus interes-
ses; por isso o velho Sam continuou seu vício de resolver os
problemas no braço, ou melhor, nas guerras.
Assim, inicia-se um movimento contra o imperialismo de
Tio Sam no mundo. Ele ainda se defende: afirma ser tudo em
nome da honra, da liberdade, e de seu crescimento. Mas é
inevitável: onde quer que vá, o apelido “imperialista” o acom-
Imperialismo
panha. Hoje se tornou tão comum, que mesmo líderes de Es-
tado não pensam duas vezes antes de citar o adjetivo outra
no dicionário
vez.
Fama de imperialista que não é sem motivos. O professor
“Dominação política e/ou econômica por parte de
da Universidade Federal de Santa Catarina, Dr. Waldir José
Rampinelli - especialista em História das Américas - explica uma grande nação, sobre nações mais fracas; doutri-
que o U.S. é tão nacionalista que se fecha para as influências na política que preconiza esta forma de domínio; a
externas, mas exige que os outros países façam o contrário,
tendência à expansão política e econômica de um
abrindo-se para suas vontades. “E eles estão certos em agir
Estado ou de uma organização econômica.”
Fonte: www.priberam.pt/dlpo
5. 05
assim, nós é que estamos errados” afirma o professor, alegando
que os culpados pelo sucesso do imperialismo estadunidense
são os países que se deixam dominar.
Mas esse quadro tem se modificado nos últimos anos. As
crescentes críticas ao velho Sam, sua ineficiência para lidar
com conflitos cada vez mais catastróficos e o crescimento de
outras potências no planeta são fatores que já indicam a perda
iminente do posto de número um do mundo.
Porém, naturalmente, assim como qualquer uma de suas
estrelas de Hollywood, Tio Sam também ganha com as críticas.
É a fama que vende seu maior produto: o “sonho americano”!
Foi com esse ideal de liberdade, de riqueza e de superioridade,
que Tio Sam espalhou sua cultura pelo mundo. E mesmo que
agora a hegemonia política e econômica ameace fugir de con-
trole, o seu Imperialismo Cultural está com força total. Para o
professor Rampinelli isso é muito mais difícil de conter, pois
atinge principalmente os jovens, exigindo maiores investimen-
tos culturais por parte dos países afetados, o que ainda não
acontece, por exemplo, no Brasil.
Por isso, Tio Sam, mesmo aos 231 anos, ainda pode
realmente se considerar “enxuto”. Enquanto houver elites se
aproveitando das desigualdades sociais e consumindo o “sonho
americano”, não faltará espaço para que a sua figura continue
presente em cada canto do mundo. ;
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6. 06
[cinema]
Santiago
(uma reflexão sobre o material bruto)
O filme de João Moreira Salles usa a história de um mordomo e seus fantasmas
como espelho, refletindo sobre o tempo, a memória, o acaso e a ilusão do documentário.
por Carolina Moura
O
banqueiro Walther Moreira onde Santiago serviu por 30 anos a em 1992. Optou por incluí-las e cri-
ticá-las no documentário. Em Santiago
Salles, a caminho de um jan- família Salles, e no pequeno apartamen-
(uma reflexão sobre o material bruto), as
tar, chamou seu mordomo e lhe to em que ele vivia sozinho, no Leblon.
disse que podia se recolher mais cedo, Quando Santiago morreu, três anos de- histórias do personagem, de João e da
já que os meninos estariam na cama. À pois, restaram dele 30 mil páginas da- produção do filme se misturam.
meia-noite, João, o mais novo, acordou tilografadas e nove horas de filme. Santiago não era acostumado a
com o som do piano. Quando chegou ao Material não finalizado. As horas receber pessoas em seu apartamento.
salão, deparou-se com Santiago, vestin- de entrevista, as cenas da casa e as Na época, deu aos visitantes que vinham
do o fraque que usava nas noites de imagens de ilustração (um trem elétrico filmá-lo um guardanapo com cânfora,
festa. O piano não o surpreendeu; San- abrindo caminho em meio à fumaça, um para que limpassem as mãos. Sentado
tiago sempre o tocava. Surpreendeu-o o lutador de boxe, sacos plásticos voando ao canto da sala, ao lado de uma es-
fraque. ao vento e um vaso de flor) pareciam se tante, apresentou seu tesouro: milhares
– Por que essa roupa, Santiago? encaixar no papel, mas não na prática. de páginas transcritas de bibliotecas do
– Porque é Beethoven, meu filho. Após editar uma curta seqüência sem mundo todo. Contando a vida de vári-
Muitos anos mais tarde, em 1992, obter um efeito satisfatório, João aban- os personagens esquecidos, Santiago
João Moreira Salles decidiu fazer um donou o projeto. Treze anos depois, em tentava manter vivas essas “grandes
documentário sobre o peculiar mordo- 2006, voltou ao material bruto. Obser- marionetas que construíram a história
mo argentino, já aposentado. Filmou vando-o com outros olhos, percebeu universal”. Ele dizia conhecer cada um
durante cinco dias; na casa da Gávea, as falhas do filme que tentara fazer deles - e estes lhe faziam companhia.
7. 07
Sem perceber que a câmera já es- “premio de la divina providencia”, sina- idade que tinha na época das filmagens,
tava filmando, Santiago pergunta se não liza que acabou a fala e se exalta: “Ah! “você não sabe que o tempo passa”, con-
é melhor desligar o relógio cuco pousado Que memória!”, levantando eloqüente- fessa; é apenas um conceito abstrato,
na parede, acima da estante. Atendendo mente o braço. “Uh, salió eso?”, reprime- intelectual. “Aos 43, infelizmente, você
ao pedido de João, prossegue: “Por que se, levando a mão à boca. Também apa- sabe”. Montando o filme anos depois,
morre essa gente? Os bons não deviam rece a relação dele com o documentarista João pôde compreender a grande questão
morrer”. Para ele, realmente, não estão – como quando, contando uma história, de Santiago. Acariciando a estante, o
mordomo se perguntara: “Em que manos
mortos. Santiago conversa com seus fan- Santiago refere-se a João como “mara-
tasmas, os adora. Não fica só, pois está vilhoso Joãozinho Moreira Salles”. João cairiam estas pobres páginas?”, escritas
rodeado daquela gente; amigos que o pede-lhe que repita, mas sem mencionar com tanto carinho, temendo que se per-
compreendem. No meio da tomada, como seu nome. dessem no “tempo implacável por sua fal-
previa Santiago, o cuco toca. Mas ele não É assim que João conduz a entre- ta de consideração”.
interrompe a fala: o relógio, com mais de vista: buscando a fala perfeita, o quadro As páginas de Santiago caíram nas
100 anos, mantém vivos seus velhos e si- perfeito. Por isso, algumas cenas de San- mãos de João Moreira Salles e atuam no
lenciosos amigos. tiago têm até seis tomadas diferentes. documentário que leva o nome do escri-
Esses momentos, antes e depois da “Queria adaptar a realidade, eliminar o tor e antigo guardião. O que Santiago fez
cena, foram excluídos da seleção para acaso”. Mas Santiago sabia que a per- com seus personagens, naqueles escritos,
montagem de 1992. Quando finalmente feição era impossível, por mais que a bus- João fez com ele em seu filme. A princípio,
editou o material, João percebeu que o casse insistentemente ao fazer seus ar- a morte de Santiago seria revelada só
mais importante (e interessante) havia ranjos de flores. João demorou um pouco no fim. Na edição final, porém, Santiago
sido cortado. É nestas imagens que se mais para entender isso. morre logo no início do documentário e
conhece um Santiago espontâneo – de- “O filme é sobre a passagem do tem- termina vivo, sentado à cozinha na casa
da Gávea, contando histórias. ;
pois de declarar que sua memória é um po”, segundo o diretor. Com 29 anos, a
8. 08
[música ]
ELE S QUEBRAVAM TUDO.
LITE RA LMENTE
Uma nova geração. Jovens sem perspectivas, que se drogam para
chegar em algum lugar. Ou lugar nenhum. Um som diferente. Mistura
de heavy metal com punk rock Grunge. Dor, solidão, gritos, pratos e
distorção. A evasão de si, o ponto mais alto, o culminar da busca da
libertação. O Nirvana.
por Pedro Santos
E
les foram a voz de uma juventude aos 14 anos, os shows underground, as
angustiada. Letras que expres- bandas que não deram certo.
saram sentimentos de revolta e re- Com amigos do tempo da escola (ele
beldia. O fim do calmo, do comum, da abandonou o Ensino Médio um ano an-
melodia harmônica. A vinda do som ras- tes de se formar), montou a banda que
gado, o visual chocante, o grito (como em seria chamada de Nirvana: Kurt (guitarra
“You Know You´re Right”: “yeah, yeah!”). e voz), Krist Novoselic (baixo) e, depois de
Em meio a uma família que vivia várias tentativas para encaixar um bate-
brigando, Kurt Cobain - um garoto hipe- rista, Dave Grohl.
rativo, vítima de bronquite crônica e úl- Em abril de 1991, Kurt conver-
ceras no estômago (desde cedo ingeria re- sava com uma amiga sobre a influên-
médios de tarja preta) - não se adequava cia das bandas de rock na rebeldia dos
a lugar nenhum. Obrigado a mudar pe- adolescentes. Antes de ir embora, a ga-
riodicamente de casa, sob o cuidado de rota picha um muro com os seguintes
vários parentes, ele encontra a si mesmo dizeres: “Kurt smells like Teen Spirit”
através da música. A primeira guitarra (Kurt cheira como espírito adolescente,
imagem disponível em www.boolsite.net
Discografia
Bleach (1989) Nevermind (1991) Agora Incesticide (1992) Gra- In Utero (1993) O Nirvana já era
Gravado em com o baterista Dave vado durante turnês conhecido no mundo todo. A fama
poucos dias, o Grohl, o clássico do da banda de 1988 a prejudicou a banda, especialmente
investimento Nirvana chegou ao disco 1992, o álbum serviu o vocalista. Cobain tinha que
para esse ál- de ouro (500 mil cópias como aperitivo para responder constantemente sobre
bum foi de apenas vendidas) em menos de um mês. A acalmar a ânsia por novo material sua vida pessoal e o casamento conturbado
US$600. Na maioria das capa exibe um bebê que nada em entre o sucesso de Nevermind e com Courtney Love, com quem teve uma filha.
faixas, a bateria fica por direção a uma isca - uma nota de 1 o próximo trabalho, que sairia no Um momento difícil metaforizado no título:
conta de Chad Channing. dólar- presa por um anzol. ano seguinte. voltar ao útero para nascer de novo.
9. 09
MTV Unplugged in Nirvana (2002) With The Lights Out
From the
Coletânea de
New York (1994) A (2004) A tentativa de
Muddy Banks
versão acústica das 15 músicas de uma versão defini-
of Wishka
músicas da banda só maior suces- tiva sobre a obra da
(1996) Lança-
foi lançada sete meses so na história banda. Trata-se de
do dois anos
depois da morte do vocalista. É da banda, incluindo uma um box que resgata a carreira
após o fim da banda, é o
um disco que segue a idéia origi- faixa inédita: You Know do Nirvana desde a primeira
disco ao vivo que com-
nal da MTV: o som feito quando You’re Right. O álbum vez que tocaram ao vivo. São
preende shows gravados
bandas de rock “desplugassem” ainda traz uma versão 81 faixas de ensaios, gravações
em diferentes lugares de
os instrumentos elétricos. inédita de Been a Soon. e demos, além de um DVD.
1989 até 1994.
Discografia
imagem disponível em www.wallpaperbase.com
em português). Teen Spirit era um desodo- O último grande momento do Nir-
vana é a gravação do show acústico MTV
rante da época, mas Cobain pensou que a
Unplugged in New York - disco em que
frase se referia ao papo que acabaram de
discutir. O vocalista do Nirvana compõe, pesadas distorções, gritos agudos e prata-
então, a música que ficaria conhecida das vigorosas são amenizados pelo som do
como o hino daquela geração dos anos 90: violão, além de vocal e bateria levemente
“Smells like Teen Spirit”. mais comportados.
A canção ficou imortalizada no ál- Kurt se suicida em abril de 1994. É o
bum Nevermind - sucesso no ranking da fim da banda.
Billboard, que avalia os discos mais vendi-
O CD de 2002
dos e mais tocados dos Estados Unidos. A
Cbanda, taispodem ser ruins?determina-
fama não fez bem a Kurt Cobain e, por ex- oletâneas Ao reunir
tensão, ao Nirvana. Alegando dores fortes os destaques musicais de
no estômago, ele se vicia em heroína. As da álbuns têm a intenção de
overdoses se tornam constantes. presentear os fãs com os sucessos, apre-
Em 1993, quando o próximo disco ainda sentar alguma composição inédita e, ob-
estava sendo produzido, o Nirvana vem ao viamente, dar dinheiro sobretudo à gra-
Brasil no festival Hollywood Rock. O apre- vadora.
sentador da MTV, João Gordo, acompanhou Lançado oito anos após o suicídio de
o grupo durante três dias, em São Paulo: as Kurt Cobain – e fim do Nirvana –, o disco
visitas ao centro da cidade, as conversas com com título homônimo ao nome da banda
travestis e muitas drogas. João Gordo – para (Nirvana, Universal Music, 2002) traz al-
quem Kurt Cobain “era um sujeito cabis- gumas das músicas mais famosas, além do CD. Tratam-se das músicas mais clás-
baixo, triste e sem vontade de viver” – reve- de uma faixa bônus – a então inédita “You sicas de todas (ainda que “Polly”, “Breed”
lou à banda que o festival não apoiava gru- Know You´re Right”. e “Drain You” tenham ficado de fora).
pos underground, que Hollywood era marca A seleção de 15 faixas não poderia, Ideal para quem quer saber o básico
de cigarro e o preço do ingresso era caro. O é claro, abarcar tudo o que o Nirvana sig- sobre Nirvana e um bom começo para nos
resultado: cuspes nas câmeras, músicas que nificou. Uma música do disco de estréia aprofundarmos na banda que, nos anos
(Bleach), quatro de Nevermind, duas de
acabavam pela metade e o pênis de Cobain à 90, mostrou que o rock’n roll ainda estava
Inseticide, cinco de In Utero e duas do Un-
mostra em rede nacional. A Rede Globo tira longe de morrer. Ainda está? ;
plugged, além da nova, são a substância
o show do ar antes de terminar.
10. 10
[literat u ra ]
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A cegueira
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Cegueira,
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do mestre José
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Saramago
por Marina Veshagem
A
bri o livro. Eu tinha então doze anos. Tão acostumada
que estava aos travessões, assustei-me com aqueles
diálogos entre vírgulas. Quando contei onze linhas sem
um único ponto, caí no desconforto e fechei o livro.
Só voltei a tocá-lo seis anos depois. Aquele desconfor-
to ficou ali na minha prateleira recolhendo a poeira, como
que esperando por outro “eu”. Abri- o. O mal-estar continu-
ava, agora mais pela sensação de irrealidade que o livro me
causava.
Não havia um “quando”, não havia um “quem”, muito
menos um “onde”. Um homem, em meio ao trânsito, sem mo-
tivo, de repente, perdeu a visão. Mas nem mesmo a cegueira
era real; a escuridão da falta de visão havia sido substituída
por uma superfície branca.
Não, não há tempo para respirar; vão-se cegando vári-
os personagens. “O médico”, “o homem da venda preta”, “a
rapariga dos óculos escuros”, “o cão das lágrimas”, todos
os cegos sem nome são recolhidos em quarentena em um
ma-nicômio abandonado. Ao assumirem que os nomes são
desnecessários ao seu relacionamento, as personagens dei-
xam implícita a trajetória a ser seguida, na descoberta dolo-
rosa do eu e do outro.
“Tão longe estamos do mundo que não tarda que come-
cemos a não saber quem somos, nem nos lembramos se-
quer de dizer-nos como nos chamamos, e para quê, para que
iriam servir-nos os nomes, nenhum cão reconhece outro cão,
ou se lhe dá a conhecer, pelos nomes que lhes foram postos,
11. 11
foto: Carolina Moura
é pelo cheiro que identifica e se dá a identificar, nós aqui
somos como uma outra raça de cães, conhecemo-nos pelo
ladrar, pelo falar, o resto, feições, cor dos olhos, da pele,
do cabelo, não conta, é como se não existisse, eu ainda
vejo, mas até quando”.
Anoitecia, e eu estava presa, cega? Enganava a mim
mesma, “mais um capítulo e vou dormir”. Mas não! Den-
tre tantos cegos, uma pessoa ainda enxergava. Ela tam-
bém não tinha nome: era “a mulher do médico”.
Não foi difícil me identificar com a personagem, afi-
nal, quem não gostaria de enxergar o mundo, enquanto
pessoas se rendiam aos seus instintos mais primários,
entregues à perda de tudo o que consideravam civiliza-
ção...? Era a eterna contradição: a mesma mulher que viu
o lindo banho de chuva das mulheres na varanda, viu (os)
cachorros a devorar o cadáver de um homem na rua.
“Já lá dizia o outro que na terra dos cegos quem tem
um olho é rei. Deixa lá o outro, Este não é o mesmo, Aqui
nem os zarolhos se salvariam [...] O outro também dizia
que quem parte e reparte e não fica com a melhor parte,
ou é tolo, ou no partir não tem arte, Merda, acabe lá com
Ensaio sobre a cegueira
o que diz o outro, os ditados põem-me nervoso”.
é um romance
O fio condutor do romance, a cegueira, leva não só
as personagens como também o leitor a refletir sobre as do escritor português José
relações entre o individual e o coletivo, erguendo o véu de Saramago,
nosso desconhecimento. A cegueira branca, que ilumina
publicado em 1995 e
ao invés de lançar nas trevas os que a contraem, é o sím-
traduzido para diversas
bolo do discurso da perplexidade.
línguas. A obra se tornou
Não dormi. Em minha perplexidade percebi que o
livro era mais real do que eu podia imaginar. Ele não uma das mais
apontou modelos de uma trajetória a ser seguida. Olhei, famosas do autor e lhe
e, enfim, reparei. ;
rendeu o Prêmio Nobel da
Literatura, em 1998.
Ensaio Sobre a Cegueira
de José Saramago
Companhia das Letras
312 páginas
R$ 26,50
12. 12
cafe...cafe....cafe....cafe...
N
o centro da Lagoa da Conceição
- bairro de Florianópolis - há três
Cafés colados, parede com parede.
Além desses, existem mais dez na região.
Mas os proprietários parecem não se
preocupar com isso. “É uma concorrên-
cia saudável. Chama o freguês, porque
ele sabe que aqui se concentram os Ca-
O Café dos
fés. Cada um tem um estilo, um atendi-
mento, um salgado diferente; e os seus
próprios clientes. Aos finais de semana,
todos ficam cheios” - afirma Edinete
Santana, funcionária e ex-dona do Tom
Cafés
Café, um dos três que dividem a mesma
A tradição da bebida calçada. O chef Mário Vilhena - consul-
tor há um ano e meio do Rocambole Café
no cotidiano da Lagoa
- explica que todos os Cafés da redon-
da Conceição
deza possuem praticamente o mesmo
– e no Brasil
por Adriana Seguro preço; “as pessoas sentam onde se sen-
tem bem”. O preço do expresso pequeno
varia de R$1,50 a R$2,00, no bairro.
Os Cafés não têm baixa tempora-
da. “No verão, são os turistas que vêm.
Depois, é o povo daqui mesmo” – declara
Mário. “A venda do café ocorre o ano
todo, mas é maior de maio a setembro”.
Nesses meses frios, o consumo sobe mais
de 50%, segundo Edinete. “Começa a au-
mentar em maio, quando em Florianópo-
lis já está esfriando”.
De segunda a sexta, após o trabalho,
o representante comercial Paulo Roberto
Bartolozzo, 52 anos, freqüenta Cafés.
13. ...cafe...cafe....cafe.... 13
Consumo
“Chego sozinho e sento onde os meus ami-
gos estiverem. Jogo xadrez, leio jornal, “O café é um ritual de família. Minha
converso.” Ele reveza a ida a dois estabe- mãe sempre fazia uma garrafa depois do
lecimentos na Lagoa da Conceição e toma almoço”, conta Paulo Roberto. No estudo
de dois a três expressos pequenos. O chef realizado em 2006 pela pesquisadora de
Mário comenta: “o café, hoje em dia, é um mercado Interscience, o hábito e o cos-
evento social” – função, aliás, mais antiga tume foram apontados como os principais
do que pensa (ver box na próxima página). motivos para o consumo de café (79% e
Edinete confirma ser o Café um ponto de en- 73%, nessa ordem). “Com a história do
contro e confra-ternização. “A maioria vem Brasil, veio o costume, que foi passando
acompanhada. Há também os que chegam de geração em geração. O café daqui tem
Consumo de
sozinhos, e às vezes fazem amizade; a gente tradição e qualidade; é um dos melhores
também fica amigo dos clientes”. Ela mes- do mundo”, defende Edinete. Freqüenta-
cafe no Brasil
ma é um bom exemplo. “Eu até casei aqui. dora do Café Cultura, também na Lagoa
-
De cliente virou amigo, de amigo a mais da Conceição, a arquiteta Maici Silvério,
amigo e hoje ele é meu marido”, ri. 33 anos, está entre os 53% que abusam - 94% dos brasileiros tomam café
Os Cafés são, ainda, um local de do efeito estimulante do fruto. “Tomo
- Quase um milhão de toneladas são
produção intelectual e cultural. No início café principalmente para acordar. Acho
consumidas ao ano
do século XVIII, na Europa, tornam-se que viciei na cafeína”, brinca. Paulo Ro-
- O consumo per capita é de mais de
pontos de encontro de aristocratas e bur- berto, como 65% dos brasileiros, con-
4 quilos de café torrado
gueses. Escritores, artistas e pensadores sidera a bebida saborosa: “para despertar,
também foram atraídos para o local. O eu uso energético. Café é a melhor coisa - 4 quilos equivalem a aproximada-
escritor português Eça de Queiroz - que que tem, eu tomo pelo gosto mesmo”. mente 70 litros do líquido para cada
brasileiro por ano
viveu na segunda metade do século XIX Maici toma café com leite, e Pau-
- afirmou ter nascido das taças de café, lo Roberto “chácafé” com duas gotas de
Fonte: Interscience, outubro de 2006
o “raio luminoso de 89”. Era uma refe- adoçante “e um pingo de leite, no frio”.
rência aos pensadores iluministas pré- Porém, o melhor café é o expresso curto
Revolução Francesa. Edinete afirma: “O sem açúcar, explica Maurício Catapano,
público do Café é o formador de opinião”. barista (especialista em café) do Cultura.
“Nos primeiros cinco segundos, há maior
concentração de cafeína na máquina de
expresso, depois é só água.” O café curto
leva o mesmo tanto de pó, mas é retirado
antes, com menor quantidade de água.
14. 14
...cafe...cafe....cafe....
Grafico
- História
Maurício fez cursos em São Paulo e em
Porto Alegre para aprender a lidar de ma- As primeiras mudas de café chega-
Classes
neira mais profissional com o grão. Foi ele ram ao Brasil em 1727, trazidas clandes-
consumidoras
quem elaborou o cardápio do Cultura, con- tinamente da Guiana Francesa pelo oficial
de café
corrente do Tom e do Rocambole. “Existem português Francisco Palheta. Do Pará,
milhões de cafés, você cria o seu” – de- onde foi plantado primeiro e com sucesso,
clara. Ele explica que para estabelecer um o fruto foi levado para o Maranhão, para
A16% padrão, deve-se manter a temperatura da o Rio de Janeiro e para o Vale do Paraíba.
B35% máquina de expresso constante. “É sempre O Brasil passou a ser o líder mundial de
a mesma: 10º C. Além disso, a máquina exportação cafeeira em 1840. Tinha iní-
tem um filtro especial, tornando o café de cio, após o período da mineração, o ciclo
C35%
maior qualidade do que o coado comum. econômico do café no Brasil. O reinado
D14% durou até o crack na Bolsa de Nova York,
em 1929, que causou sua desvalorização.
Hoje, as áreas de cultivo localizam-se
principalmente nos estados de São Paulo,
bida espalharam-se de um monastério a
Lenda . . . outro e, mais tarde, por todo o mundo”. Minas Gerais, Paraná, Espírito Santo e Ba-
hia. O país lidera a produção e a exporta-
Mas...
ção de café no mundo. Quanto ao consu-
Não há certeza quanto à data em
Uma lenda remete as ori- mo, somente os norte-americanos estão à
que o primeiro café foi tomado, porém
gens do café ao século III d. C.
frente dos brasileiros. Mas, pelo desenvolvi-
os registros sugerem ter sido em meados
Uma noite, um pastor chamado do século XV, na Etiópia Central - Áfri- mento do mercado interno – crescimento
Kaldi foi atrás de suas cabras. Ele as ca. Pensa-se que os persas podem ter
de 5,1 por cento em 2006 –, a ABIC (As-
encontrou agitadas, mastigando frutos levado o café para a Etiópia no século
sociação Brasileira da Indústria de Café)
desconhecidos. Kaldi os experimentou e VI d.C., quando invadiram a região. Ao
prevê que até 2010 o país deve ser também
também se sentiu com muita energia. O se tornar uma bebida popular, os mais
o maior consumidor mundial de café. ;
pastor, então, levou a novidade ao mos- ricos reservaram salas especiais em suas
teiro local, mas as reações foram nega- casas, para tomá-lo. Começaram a sur-
tivas. Ele voltou e ateou fogo no café. gir as Casas de Café. A primeira abriu
O perfume dos grãos torrados atraiu em Meca, no início do século XVI. Ape-
os monges, que recolheram os frutos sar de serem inicialmente locais de re-
das cinzas e sugeriram que fossem es- uniões religiosas, logo se tornaram cen-
magados na água. Logo, descobriram tros de música, dança, jogos de xadrez,
que o preparado os mantinha acordados gamão, conversas e lugar de negócios.
durante as rezas e períodos de medita-
Adaptado de planetaorganico.com.br
ção. As notícias sobre os efeitos da be-
15. 15
E
stradas, viagens, lugares inusita-
dos, a temática é recorrente nas
composições de Hélio Flanders, vo-
calista da banda independente Vanguart.
VaNGuaRT
As canções da banda de Cuiabá (MT) têm
influências folk, de Bob Dylan e Nick
Drake. Para Hélio, o clima bucólico combi-
na com o Centro-Oeste. O fortalecimento
da cena independente brasileira - que dis-
A trajetória de Hélio Flanders, vocalista do Vanguart, entre cidades
pensa as grandes gravadoras e se mantém
e canções com shows pequenos e a ajuda da troca de
arquivos pela internet - contribuiu para o
reconhecimento da banda na imprensa.
Mas o Vanguart ainda não toca nas rádios
e não faz shows grandes, exceto nos maio-
res festivais de música alternativa, como o
Bananada (GO) e o Calango (MT).
Há quatro anos, a banda viaja pelo
Brasil. Hélio calcula ter passado por 40 ci-
dades brasileiras.
- Dá pra conhecer algum lugar real-
mente?
- Alguns. Já rolou de passarmos uma
semana em Aracaju. Ou cinco dias em
Porto Velho. Aí você conhece o bairro, ten-
ta criar os hábitos que sente falta quando
por Fernanda Dutra se está viajando, como fazer amizade com
o cara da padaria.
- How many roads must a man walk down before you can call him a man? (Quantas - E você compõe muito viajando?
estradas um homem deve percorrer antes que se possa chamá-lo de homem?, trecho - Não muito. Só quando o Reginaldo
da música “Blowing in the wind”, de Bob Dylan) [baixista da banda] começa. Acho até ruim
- Só o próprio homem sabe pelas estradas que passou, portanto só cabe a ele saber não rolar muito... Às vezes me inspiro de-
quantas estradas serão necessárias. mais com novas cidades, mas é algo que
- E pra você? só vou conseguir expressar em músicas
- Não andei nem a rua de casa... Faltam muitas ainda. bem mais pra frente. Geralmente, quando
estou em casa é que lembro das coisas...
*
16. 16
LaNÇaMeNToS
O novo álbum do Vanguart vai ser
- Se eu não tivesse ido para lá não
lançado neste mês pela Revista Outra
existiria esse Vanguart.
BoLíVia Coisa, publicação que vem com um
- Existe alguma diferença entre com-
álbum de uma banda independente
por em casa ou em um país estrangeiro?
“This town is not enough”, cantava por mês. Lobão, Faichecleres, Carbona,
- Não existe. Mas é impossível não
Hélio no primeiro album do Vanguart, entre outros, fizeram da revista um
pensar boa parte do tempo em sua “vida
The Noon Moon. Aos 17 anos, o vocalista meio de divulgar os últimos trabalhos
passada”. Quando se exila de algo ou al-
morava em Várzea Grande, cidade vizinha sem a participação de grandes gravado-
guém, cogita-se uma nova vida, então
à Cuiabá (MT) e era conhecido como No- ras. O disco do Vanguart foi produzido
essa vida vem. Mas nem sempre. E você
where Man [Homem de Lugar Nenhum], no começo deste ano, com o patrocínio
tende a ficar remoendo sua antiga vida
em referência à música dos Beatles. de leis de incentivo cultural e tem 14
ordinária, que aos olhos da saudade e da
- De alguma maneira, sempre estive faixas, sendo sete em inglês, seis em
solidão, lhe parece maravilhosa.
dizendo adeus à Cuiabá. português e uma em espanhol.
- O Vanguart é a única banda que
A primeira mudança veio aos 18 O primeiro single oficial é Hey
eu conheço que canta em quatro idi-
anos. Após terminar o Ensino Médio e não Yo Silver, lançado no fim de maio no
omas...
passar no vestibular, Hélio decidiu ir para site TramaVirtual e vendido em alguns
- Sí. Nunca foi algo pensado, como
Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. Os shows. A faixa homônima ao single é
“vamos compor em vários idiomas”. No
avós moravam lá. um folk-rock já consagrado nos shows
começo, seria só em inglês. Logo em
- Foi uma maneira de chegar à Bolívia. da banda. “The cowboy has the money”
seguida rolou um reggae em francês. Aí
Mas depois fui para La Paz. Fiquei nove e “There are a million things I need to
veio “Semáforo” e outras em português.
meses num auto-exílio, que dividi em um know by heart” foram gravadas exclusi-
Aí Reginaldo acordou de uma bebedeira
emprego num restaurante e algumas via- vamente para o single.
em casa e pegou meu violão. Peguei meu
gens com gringos malucos e meu profes- O Vanguart participou de uma co-
caderno e li um poema que tinha escrito
sor de inglês maconheiro. Guardo muitas letânea do site Urbanaque com bandas
em espanhol. Assim, surgiu Los chicos de
histórias. Uma bacana é eu entrando num independentes. Com a temática Love
ayer. Quando vi já tínhamos três. O reg-
bar que eu descobriria depois ser um bor- Hurts [O amor machuca], o single foi
gae em francês a gente deixou de fora...
del, às cinco da manhã, e ouvir os metais lançado no dia 12 de Junho, Dia dos
Hélio era colega de trabalho de Re-
de “Amigo”, do Roberto Carlos, en espa- Namorados. O cover de “Leonor”, origi-
ginaldo Lincoln e David Dafré, baixista e
ñol. nal da banda recifense Mundo Livre
guitarrista da banda, respectivamente.
A idéia era ficar no máximo cinco S/A, é uma parceria do Vanguart com
Os três davam aulas em uma escola de
anos, mas a saudade dos amigos encurtou Ludovic, banda paulistana. “Soon We’ll
inglês. A opção de compor em espanhol,
a estada na Bolívia. Além disso, o Vanguart Be Nothing” é uma composição de Hélio
inglês, português e francês está menos
nascia como um projeto. Depois de tocar e Flanders e Reginaldo Lincoln.
relacionada às viagens e mais ao prazer
compor sozinho por dois anos, Hélio quis pelos idiomas.
convidar os amigos para formar a banda.
17. “
17
Você sorri
movendo quase nada
”
E antecipa a velha longa estrada
E os teus galhos
São PauLo
vão me arborizando nu
2006 foi um ano decisivo. Após
acumular elogios e shows em festivais in-
dependentes, o Vanguart foi convidado a
letra de Cachaça
participar de uma turnê por oito cidades
do Nordeste, junto com outras cinco ban-
das independentes.
- Foi uma loucura. 12 dias com
32 malucos num puta ônibus, tocando
em várias cidades do Nordeste. Rolou de
tudo.
eSCoLHeu
A turnê foi promovida pelo canal de
aS MeLHoReS
HéLio
música MTV e os melhores momentos
CoMPaNHiaS PaRa Se ouViR
foram ao ar no ano passado, em uma sé-
Na eSTRaDa:
rie de seis episódios.
- Não somos uma banda de massa,
De LuGaR NeNHuM
mas é incrível como atinge muita gente a
tal televisão.
A banda levou Hélio a conhecer Buffalo Springfield, On the way home.
1)
A repercussão do programa não foi
outras cidades, pessoas diferentes, via- Bob Dylan, Back to the road.
2)
determinante, mas contou na decisão da
jar... Algumas coisas, então, mudaram. Joni Mitchell, This flight tonight.
3)
mudança de Cuiabá para São Paulo. A
- Quando eu era adolescente, No- Tom Jobim, Chansong.
4)
capital paulista foi escolhida por facilitar
where Man significava ser o único do am- The Beach Boys, Sloop John B.
5)
o contato com a mídia e no deslocamento
biente a gostar de poesia e rock and roll.
para shows pelo país.
Hoje continua fazendo sentido, mas de
- Acho bacana [morar em São Pau-
outra maneira. Nowhere Man talvez seja-
lo]. Tem mais opções, mas sinto falta da
mos todos nós, que vivemos pelos idos do
proximidade das pessoas, que rolava em
mundo, sem lugar fixo. ;
Cuiabá.
18. 18
De
Chaplin a
sganzerla
A história dos cineclubes no Brasil
Q uinze pessoas reunidas, tomando são exibidos filmes clássicos com uma
sopa e conversando sobre cinema. discussão que destaca a linguagem cine-
O cenário não é uma residência ou matográfica. Lucian Chaossard, um dos
um restaurante, mas uma casa de cul- organizadores, diz que o Sganzerla vai
por Juliana Sakae tura na subida do Morro do Horácio, em além da discussão do conteúdo: procura
Florianópolis. O Pomar das Artes, todo situar o filme na história do cinema. “Não
último domingo do mês, cede o espaço estamos preocupados apenas com o que
para o Cineclube Sopão de Filmes. Com o filme quer passar, mas o que ele signifi-
entrada gratuita e doação sugerida de ca para o cinema e o contexto histórico
R$1, o cineclube exibe curtas-metragem no qual está inserido”, diz o cineclubista.
de produção independente desde 2003. Antes da exibição, o cineclube distribui
Alan Langdon, criador do Sopão, orga- textos com uma pequena análise do filme.
niza cada sessão através de um tema, O auditório enche; cerca de 70 pessoas
como a metalinguagem ou a história de participam das sessões.
Florianópolis, escolhido de acordo com Entre o Sopão e o Sganzerla, en-
o número de filmes disponíveis para exi- contra-se o Centro Integrado de Cultura
bição. “As discussões são mais direciona- (CIC), com o Cineclube Nossa Senhora do
Desterro. De Scoop ao As Férias de Mister
das que antigamente, quando não havia
Bean, o cineclube exibe filmes a R$10 e não
temas”, afirma.
Do outro lado do morro, num au- reserva espaço às discussões pós-sessão.
ditório da Universidade Federal de San- Chamar o Nossa Senhora de cineclube ou
ta Catarina (UFSC), alunos do Curso de não; este foi um dos temas da discussão
Cinema promovem as sessões do Cine- do Encontro de Cineclubistas do 11° Fes-
clube Rogério Sganzerla. Toda quinta tival Audiovisual Mercosul (FAM).
19. 19
Afinal, o que é cineclube? erro. Um filme pode gerar tanto uma
discussão técnica, de roteiro a edição,
E ngana-se quem pensa que cineclube quanto teórica, sobre o conteúdo do
é um local de filme alternativo. A filme.
definição de cinema alternativo é polêmi- Lucian Chaossar, do Cineclube
ca, não há um limite bem definido entre Rogério Sganzerla e estudante de cine-
este e o cinema comercial. O cineclube ma da UFSC, tenta definir o termo como
também não pode ser considerado um “uma espécie de iniciativa entre pessoas
lugar; existem, no Brasil, alguns itine- que gostam de cinema, não-profissio-
rantes, cujas sessões acontecem em nais, que encaram o cinema como não-
praças públicas, escolas, teatros e até comercial”. Para ele, o cinema tem, hoje,
igrejas. um caráter individualista. O objetivo do
Pensar que cineclube discute so- cineclube é “sociabilizar a experiência
mente a construção do cinema é outro do cinema”.
to Estadual de Imprensa e Propaganda
De Chaplin a Gerlach
(DEIP) interdita o projeto dos estudantes,
No Brasil,registro édeo junho de Club.
o primeiro cineclube que que retorna somente após a Segunda
se tem Chaplin Guerra Mundial. O acervo mantido pelo
Fundado no dia 13 1928 grupo transformou-se em arquivo do
na então capital federal, Rio de Ja- Museu de Arte Moderna (MAM) e, hoje,
neiro, o Chaplin marca a história da faz parte da Cinemateca Brasileira, ins-
crítica cinematográfica com o lança- tituição responsável pela preservação
mento do periódico O Fan, revista que da produção audiovisual do país.
durou apenas nove edições. Almir Cas- Em Florianópolis, o cineasta Gilber-
tro, Cláudio Mello, Octávio de Faria e to Gerlach cria em 1968, na Faculdade
Plínio Sussekind Rocha, responsáveis de Engenharia da UFSC, o Cineclube
pelo Chaplin Club e O Fan, realizam a da Engenharia. Utilizando um projetor
primeira exibição no Brasil do clássi- recebido através de um convênio com a
co O Encouraçado Potenkim, do diretor Alemanha Oriental, o cineclube inaugu-
ra com o filme francês A Besta Humana,
Eisenstein.
Doze anos após o Chaplin, surge de Jean Renoir. Oficializado em 1972,
o Clube de Cinema de São Paulo, em o cineclube passa a se chamar “Nossa
1940, dentro da Faculdade de Filosofia Senhora do Desterro” em homenagem
da USP. Pouco depois, o Departamen- ao antigo nome da capital.
20. 20
De Gerlach a Sganzerla pela professora Carmen Suzana. Michel Silva,
um dos organizadores do cineclube, diz que o
Gerlach éCine York,responsável pela criação
também Cinearte não tem um perfil como o Sopão ou o
do Bar em São José, cidade vi- Sganzerla. Por estar ligado a Departamento de
zinha a Florianópolis. Em uma casa histórica, Educação, o cineclube tem uma função mais
a pequena sala de cinema possui um bar ao pedagógica e trabalha com ciclos temáticos,
lado, que incentiva as conversas informais so- como o Clube da Luta ou o Cinema, Loucura
bre cinema. e Outras Viagens.
O cineclube Aliança Francesa funciona, O Rogério Sganzerla foi criado por alunos
também, em um clima informal. No centro da do curso de Cinema da UFSC em 2005 e ofi-
cidade, a sala de projeção da Fundação Cul- cializado um ano depois como projeto de ex-
tensão. Inaugurou com a exibição do filme O
tural Badesc funciona como cineclube às se-
Bandido da Luz Vermelha, de Sganzerla, esco-
gundas. A organizadora Marta César diz que
a discussão não é planejada, “depende do pú- lhido pelos organizadores por unanimidade. Os
blico que temos”. Na exibição de O Pesadelo cineclubes, embora responsáveis pela forma-
de Darwin, documentário sobre a fome na ção de vários cineastas brasileiros como Mário
Tanzânia, as 15 pessoas presentes discutiram Peixoto e Gilberto Gerlach, está mais ligado à
sobre globalização. formação de platéia, diferente do cinema de
Na Universidade do Estado de Santa Cata- consumo e entretenimento. “Uma relação par-
ticular”, como afirma Lucian Chaossard. ;
rina (Udesc), funciona o Cinearte, coordenado
imagem disponível em www.cineclube.ufsc.br
21. [entrev i s t a ] 21
Mário Prata
O jeito de transformar a banalidade em arte
por Marina Ferraz
M ário Alberto Prata já foi funcionário
do Banco do Brasil, assessor da Se-
cretaria de Cultura, repórter, colunista
social, romancista, articulista, cronista e
muito mais. Iniciou sua carreira aos 14
anos escrevendo para o jornal Gazeta de
Lins. Desde então não parou. Já são mais
de 50 trabalhos, entre livros, peças de
teatro e novelas para televisão.
Autor de conhecidos livros – como
Diário de um magro (1997), Minhas mu-
lheres e meus homens (1998) e Anjos de
Badaró (2000) –, Mário Prata mora hoje
em um apartamento com vista para o
mar no bairro de Jurerê Tradicional, em
Florianópolis, e afirma que tem a melhor
profissão do mundo. Entre um cigarro e
outro, vendo o pôr-do-sol da varanda de
sua casa, ele fala à ponto-e-vírgula sobre
vida e carreira.
22. 22
Ponto-e-vírgula – Você já fez muita coisa desde que iniciou MP – Eu gosto. Mas cometi um erro em Minhas mulheres e meus
sua carreira. O que dá mais prazer? homens. As pessoas dizem: “escreveu um livro das mulheres que
comeu”. Eu fui contar: eram 12 em 36 anos, uma a cada três
Mario Prata – O que eu gosto é de escrever. Mas ninguém vive anos. É uma média razoável, né? [risos]. O livro é a história da
de livro no Brasil, mesmo uma pessoa que venda bem como eu. minha geração. E ela passa por droga, por desbunde até chegar
“
Eu não imaginei que pudesse viver disso há 40 anos atrás. Fui fa- onde eu tava, em 1998. Aquela época tinha uma galinhagem
zer uma faculdade, ter uma profissão que se apresente, como dizia muito empenhada.
meu pai. Naquela época eu tive sorte, pois
”
chegava na minha casa a Manchete, a
O que eu gosto é de escrever. Mas ninguém vive de livro
Cruzeiro e a Última Hora. Elas tinham os
melhores cronistas do Brasil da época e
no Brasil, mesmo uma pessoa que venda bem como eu.
talvez até hoje, que eram o Millôr Fernandes,
Nelson Rodrigues, Rubem Braga... Esse pes-
soal me mostrou que a literatura não era só
aquelas coisas chatas que a gente lê na escola. Isso foi importante pra ; – E hoje não existe isso?
saber que podia escrever bobagem, que bobagem também era litera-
tura. Naquela época eu não tinha noção que ia chegar a escrever em MP – Ah, é muito diferente. Depois que inventaram esse
jornais importantes, revistas. Mas eu nunca deixei de escrever. negócio de ficar, resolveu. Esse
negócio de ficar é uma puta des-
; – Alguns escritores afirmam que existe preconceito com a coberta. Um dia eu tava na casa
profissão. O Moacyr Scliar diz que quando vai se registrar da minha filha e ela desceu com
em algum hotel, se registra como médico. Você acha que um carinha que eu não conheço.
ainda existe isso? Eu perguntei: “você tá namoran-
do?”. E ela: “não, fiquei com ele
MP – Não, eu acho que tinha. Eu sempre dizia jornalista, agora hoje”. No meu tempo não tinha
eu digo que sou escritor. Mas há 20 anos, quando eu falava es- isso. Agora, no começo dos anos
critor as pessoas olhavam. Não sei como imaginam que é um es- 80, eu não sei o que deu, virou
critor. Eles davam uma conferida pra ver como era, se era uma uma galinhagem esse país. Você
pessoa normal [risos]. ia pro bar, olhava e fazia assim
pra menina [balança a cabeça in-
; – Nas suas obras você usa muito do seu cotidiano. Desse dicando algum lugar], então saía,
jeito quem lê sabe bastante da sua vida. Isso não te inco- transava e voltava. Tava nesse
moda? nível a coisa.
23. 23
; – Você fez um livro on-line, Os anjos de Badaró. As pes- quando eu tenho uma idéia, sou capaz de lembrar a hora em
soas queriam dar palpite ou mudar a história? que tive a idéia da maioria dos meus trabalhos, dos melhores,
com quem eu tava, em que situação. A idéia é um segundo.
MP – Eu quis ir mais longe, eu queria não só escrever, mas que Isso que é legal, essa coisa que toma conta e começa a criar os
as pessoas me vissem. Eu escrevia em casa e no computador personagens que vão povoar aquele universo. E é uma coisa de-
ia aparecendo letrinha por letrinha que eu digitava. Só que a liciosa de fazer. E pagam pra eu ficar na rede, puxando fumo. É
coisa tomou uma proporção muito maior do que todos nós ima- uma maravilha, é a melhor profissão do mundo. Eu moro aqui,
ginávamos. As pessoas podiam entrar e falar o que quisessem. nesse silêncio.
Eles [os internautas] vinham fazendo revisão, mudando uma
palavra, vírgula, às vezes cortando pedaços. O que eles inter- ; – Você conhece muita gente. Pessoas que a maioria gos-
feriram na história é que ficou mais romântica do que policial. taria de conhecer, como Chico Buarque, Fernando Morais,
Mas essa experiência [escrever pela internet] eu não repetiria. Marília Gabriela. Qual a pessoa mais interessante que você
já conheceu?
; – Por quê?
MP – [longa pausa] Pergunta complicada... As melhores histórias
MP – Depois desse livro eu entendi que a literatura não vai en- são de pessoas não famosas. A melhor história pra mim é a do
trar na internet. O e-book nasceu morto. Foi uma tentativa de meu pai: ele queria convencer o pai do Pelé a não deixar o Pelé
fazer livro, mas é um saco. Eu acho um saco ler pela internet. jogar. Sensacional. Uma vez eu tava no Rio de Janeiro, meus
Mas da internet eu tenho certeza absoluta que vai sair uma filhos eram pré-adolescentes, e eu falei: “vou apresentar os dois
puta literatura. Eu adorei quando aquela Bruna Surfistinha homens mais inteligentes que eu conheço”. Um era o Chico
estourou. Eu já manjava a Surfistinha há muito tempo. Eu Buarque e o outro era o Aderbal Freire Filho, de quem na época
falava pra minha editora: “publica esse blog”. As editoras pre- eu era muito amigo. Eu gosto muito das pessoas lúdicas, que
cisam contratar um cara, um editor de internet. Ele vem pra brincam muito, que só falam merda e esses dois caras são as-
cá, fica oito horas por dia, procurando autores na internet. Se sim. A visão que se tem do Chico é muito equivocada, daquele
ele ficar um ano, oito horas por dia lendo esses blogs, descobre tímido. O Chico quando tem intimidade é outra pessoa. É um
no mínimo dez ótimos escritores. Escrever pra mim é a função moleque, o tempo todo só fala merda, muito engraçado. Eu ha-
de transformar a banalidade em arte. É você pegar uma coisa via lido os dois livros dele, Estorvo e Benjamim. E falei: “Chico,
que está na cara do leitor. Você escreve e ele fala: “é isso mes- eu não entendo essa literatura que você faz, porque chega a ser
mo”. É olhar em volta com olho de quem pode ganhar a vida chata. Você é um cara tão engraçado, mas, na hora em que vai
escrever, você leva a sério. Parece seu pai escrevendo Raízes
com aquilo.
do Brasil”. Quando ele escreveu Budapeste, na terceira página,
; – E hoje, o que você lê? puta que pariu, Budapeste é muito engraçado. Ali está o Chico,
liguei na hora: “Chico, você conseguiu”. E tem umas coisas que
MP – Eu estou lendo muito. De uns três anos pra cá, muito [liv- você não sabe, por exemplo, aqueles nomes dos húngaros, tudo
ro] policial. Eu tenho um compromisso com a editora de quatro da seleção da Hungria de 54 [risos]. Eu sabia, então eu ria mais
livros, mas depois eu quero escrever policial. Eu me sinto bem ainda [mais risos]. Quer dizer, é uma brincadeira dele, sabe.
24. “
24
Escrever pra mim é a função de
transformar a banalidade em arte.
É você pegar uma coisa que está
na cara do leitor. Você escreve e
ele fala: ‘é isso mesmo’. É olhar
”
em volta com olho de quem pode
ganhar a vida com aquilo.
; – Você disse ter um projeto de faculdade para escritores... quase uma especialização. O cara escolhe se quer ser cronista,
contista, poeta, romancista, roteirista de cinema ou de televisão,
MP – Essa faculdade é um projeto meu que não morreu. As pes- dramaturgo. Claro que esse dramaturgo vai ter aula também de
soas vão dizer assim: “porra, mas o cara é presunçoso, abrir crônica, de poesia, etc.
uma faculdade de escritor”. Eu vou abrir uma faculdade de es-
; – Pra entrar...
critor para eu ser aluno, nos moldes que eu imagino.
; – E quais são esses moldes? MP – O vestibular seria uma redação, pela internet. Aí elimina
e quando chegar a 400 candidatos traz pra cá e fala: “agora faz
MP – São quatro anos. Nos dois primeiros, ninguém vai ensi- uma redação na minha frente”. Ah, vai ter Educação Física tam-
nar ninguém. Sempre vão ter palestras, que podem se estender bém. O pessoal tem que fazer musculação pra poder escrever 42
por uma semana. Por exemplo, eu trago o García Márquez, páginas por dia. Educação física é importantíssimo.
ele fica uma semana com esses garotos pra cima e pra baixo,
batendo um papo. Eu quero as pessoas no bar com ele, que ; – Então pra ser escritor tem que estudar?
ele dê uma cantada numa aluna, que peide, tome um porre,
fique triste. Pra conhecer o escritor mesmo. Seriam 28 ma- MP – Tem, principalmente ler sempre. Eu quero uma biblioteca
térias, divididas nos quatro anos. E teria de tudo: Admi- muito grande, só de livros de literatura. Pedir doações pra escri-
nistração de empresas, Advocacia, Medicina, algumas línguas, tores. Eu vou dar a minha. A não ser que seja um livro que você
Português. Pra escrever precisa ter um mínimo de informação. A precise pra consulta, é legal ler e passar pra frente. [pausa] Um
partir do terceiro ano, começaria aula mesmo. O último ano seria escritor não devia dizer isso [risos].
25. 25
[espor te ]
O Fogo na Ilha por Matheus Joffre
Pela primeira vez a tocha pan-americana, um dos símbolos mais
marcantes dos Jogos Pan-americanos, chega à Florianópolis
A
Corrida de Revezamento da Tocha Acesa nas Pirâmides de Teotihuacán a 31ª a receber o fogo pan-americano. A
é uma tradição que teve origem – templo do deus Sol da antiga civilização chama percorre 51 localidades de todo o
há mais de 26 séculos, durante os asteca – no México, a tocha chega ao Brasil país, passando pelas 26 capitais dos es-
antigos Jogos Olímpicos da Grécia. Os para o Pan-americano Rio 2007. A Cidade tados brasileiros e pelo distrito federal,
gregos levavam a tocha por todo o ter- Maravilhosa é palco da XV edição dos jo- até acender a Pira Pan-americana no dia
ritório para divulgar a proximidade dos gos. Pela segunda vez, o Brasil é o país an- 13 de julho, no Rio de Janeiro. No Es-
jogos e anunciar a paz, uma vez que era fitrião do Pan. Em 1963, a cidade de São tado de Santa Catarina, além da capi-
proibido qualquer tipo de conflito durante Paulo sediou a quarta edição dos Jogos. tal, a tocha também passa pelas cidades
a competição. O modelo atual foi desen- Naquela ocasião, a tocha foi acesa em um de Blumenau e Balneário Camboriú.
volvido em 1936 nas Olimpíadas de Berlim ritual indígena por índios Carajás, em Bra- Para facilitar sua condução, a
e desde então o revezamento sempre ante- sília, e seguiu direto para a capital paulista. tocha, que integra dois materiais dis-
cede os Jogos Olímpicos. Criado em 1951, No dia 1º de julho, pela primeira vez tintos – metal e acrílico – possui um
o Pan-americano, versão mais compacta a tocha passa por Florianópolis. A cidade formato alongado nas pontas. Cerca
dos jogos e restrito às Américas, adotou – que representa Porto Rico, um dos 42 de quinhentos exemplares foram pro-
os mesmos rituais e tradições olímpicas. países que participam da competição – é duzidos para o Pan Rio 2007 e serão
26. 26
distribuídas entre os atletas do revezamen- balão do mascote do Pan 2007, Cauê, com
to. As cidades que fazem parte da rota da mais de 40 metros de diâmetro. Um sorteio
tocha possuem um protótipo da pira, que entre crianças de escolas municipais da
se acende no final da cerimônia e permane- cidade selecionará algumas delas para da-
ce acesa durante a manutenção dos jogos. rem uma voltinha no balão do Pan. A tocha
O revezamento em Florianópolis é passa pelos principais bairros e praias de
realizado pela delegação catarinense do Florianópolis: Jurerê, Canasvieiras, Ingle-
Pan e por ex-atletas consagrados na Ilha, ses, Barra da Lagoa, Trindade, entre outros.
como Gustavo Kuerten, Giovanne Gávio, A diversidade geográfica da ilha pos-
Renan Dal Zotto e Fernando Scherer; sibilita uma maior dinâmica no reveza-
cada integrante leva a tocha por 400 me- mento e oferece várias opções para o des-
tros. Ao contrário de outras cidades, ce- locamento da tocha. Além do tradicional
lebridades e artistas foram deixados em percurso a pé, alguns trechos serão per-
segundo plano. Segundo o presidente da corridos por bicicleta, na região do Itaco-
Fundação Municipal de Esportes, Car- rubi, e por barco, na Lagoa da Conceição.
lão – ex-jogador da seleção brasileira de Um dos momentos mais esperados é
vôlei – a escolha dos participantes levou a passagem da tocha pela Barra da Lagoa;
em consideração os que de alguma for- uma surpresa envolvendo o tenista Gus-
ma contribuem para o esporte na região. tavo Kuerten aguarda a multidão. A chama
“Nós procuramos atender a todo mundo também vai percorrer a Universidade Fe-
e estamos tentando não deixar ninguém deral de Santa Catarina (UFSC), no bairro
de fora”. Atletas dos Jogos Parapan- da Trindade. O revezamento acaba no tra-
americanos, que ocorre na seqüência do piche da Beira-Mar Norte e a cerimônia se
Pan e é disputado por deficientes físicos, encerra quando o último atleta atear o fogo
também vão participar do revezamento. à pira de Florianópolis. A chama segue de
O ponto de partida é a Praia do Forte, avião, dentro de um compartimento espe-
cial, para a próxima cidade, Blumenau. ;
no norte da ilha. Às 10 da manhã, a cele-
bração começa com a entrega da tocha
pelo embaixador do Pan em Florianópo-
lis, o tenista Gustavo Kuerten, ao prefei-
to da cidade, Dário Berguer. O prefeito,
por sua vez, passará a tocha ao primei-
ro atleta, dando início ao revezamento.
O percurso é acompanhado por um
trio elétrico, que, além de animar a mul-
tidão, segue em comboio com a tocha du-
rante as paradas. Uma atração à parte é o