Texto de Tatiana Carmilo, para a revista Leaf #01.
Tatiana Camilo é Designer Gráfica desde 2010. Apaixonada por arte, trabalha com criação e entre tantas outras coisas continua escrevendo textos belíssimos.
Twitter: @tatianacamilo
Desconectados da realidade: o desafio de viver em rede
1. Desconectados.
Escolhemos Design. Uma profissão que talvez nossos pais nem soubessem que existia.
Uma profissão que seus avós nunca irão entender. Alguns acham que decoramos casas
porque existe um programa chamado DesignStar num canal de TV por assinatura.
Alguns acham que fazemos gráficos. Outros acham que apenas desenhamos ou apenas
fazemos cartões de visita. Já ouvi de tudo. E na hora de explicar, tenho a sensação que
as pessoas só entendem a parte do computador. Já me perguntaram até se eu sei
concertar. Não, eu faço diagramações. - Diagramação? O que é isso? - Ah, deixa pra lá.
Muita gente acha que passamos o dia inteiro “mexendo” no computador (o que chega
a ser engraçado, porque hoje em dia, difícil alguém que não “mexa” no computador,
mesmo que seja só pra joga paciência).
Além da internet, bluetooths, wirelles, entrada para USB, pendrives, softwares
atualizados, tecnologias e acessórios cada vez mais avançados, que invadem nossa vida
e faz com que nos rendamos num piscar de olhos, as redes sociais também surgiram
para facilitar nossa vida. Ou pelo menos, esse seria o propósito. Ficamos online e
pronto, não estamos mais sozinhos. (Será?). Em poucos minutos temos um bocado de
“amigos”. Imagens aleatórias de alguns gigabytes, com pixels estourados, ocupando
pouco espaço e muito do nosso tempo.
A internet nos faz interativos. Podemos curtir e comentar sobre tudo. Podemos
expressar nossa opinião ou simplesmente passarmos opiniões alheias adiante. Não
conseguimos mais nos imaginar sem esse poder, não conseguimos mais nos imaginar
sem esse luxo que hoje é tão necessário e torna tudo tão mais veloz. Contudo, tenho a
impressão de que o jovem de hoje possui dificuldades em se relacionar. Irônico? Pode
até ser. Mas a realidade é que nem sempre somos tudo aquilo que postamos. O jovem
atual é esperto, dinâmico, rápido e tímido. Por incrível que pareça, grande parte
desses jovens – nos incluindo - estão desconectadas de si mesmos e dos outros.
Muitas vezes, optamos em manter relacionamentos a distância ao invés de jogar
conversa fora com nosso vizinho.
Observe. Os mais velhos possuem certa facilidade em iniciar uma conversa pessoal
com um estranho do que nós jovens, que preferimos manter contato com as pessoas
que já conhecemos, através de um telefone celular que pode nos conectar com o
mundo. E digo mais. Não temos paciência para conhecer as pessoas. Quando nossos
tios e avós nos encontram, eles querem saber nosso estado civil, o que fazemos da
vida, se ainda somos amigos do fulano, se fomos ao aniversário de ciclano. Enquanto
nós, jovens práticos da geração Y, também chamada geração do milênio ou geração da
Internet, acessamos profiles que nos respondem algumas perguntas. Quem é você? Do
que você gosta? Quais lugares frequentam? Mesmo assim, muitas vezes nos
enganamos.
Essa persuasão da qual manuseamos nosso trabalho - através da razão ou emoção, ou
os dois em uma única tacada - algumas vezes se volta contra nós. Nós acreditamos um
pouquinho nas fotos sem defeitos, nas ilustrações da página e na vida diagramada das
2. pessoas. E com isso, achamos a grama do vizinho mais verde, o twitter do famoso mais
interessante, a cadeira do outro mais confortável, o celular do amigo mais moderno...
Ficamos viciados em estereótipos.
Quando minha mãe ainda não era acostumada com o fato de eu precisar ficar horas na
frente de um computador para fazer trabalhos da faculdade, ela dizia: “Menina sai da
frente disso, vai viver o mundo real, isso aí é tudo ilusão!”. Hoje ela entende melhor
minha realidade de designer e eu até acho que ela tinha um pouco de razão quando
me dava àquelas broncas. Entendi que ela não estava falando de Illustrator,
Photoshop, InDesign, Dreamweaver, entre outros softwares que nos deixam loucos. Ela
estava falando das redes sociais.
Não vou negar, adoro Facebook, Twitter, Orkut já nem tanto. Mas me pergunto se isso
aproxima mesmo as pessoas. Se tudo aquilo não passa de uma disputa de quem é mais
feliz, de quem grita “Cadê meu chip” mais alto (lembra disso?), de quem leva o maior
susto, de quem faz o melhor remix da notícia, de quem tem mais amigos,de quem é
mais engraçado e assim por diante. Quem pode ser mais? Alguém, por favor, me diga
onde isso vai parar.
Através do youtube, a possibilidade de se mostrar para o mundo. Nos anos 80, o jovem
pertencia a alguma tribo para ser aceito. Nos anos 90, isso se enfraqueceu e o jovem
começou a se chamar de normal para poder transitar em várias tribos. Atualmente, ser
normal tornou-se chato e é possível ser várias coisas ao mesmo tempo. Designer,
skatista, mergulhador, DJ, mochileiro, professor, escritor, desenhista, ator... A
consequência disso é uma grande ansiedade para acompanhar as informações que se
transformam a todo o momento e, ao mesmo tempo, o medo de se sentir perdido na
multidão. Isso trás a necessidade de ser destacado, reconhecido, diferente,
irreverente, ou no mínimo, visualizado.
Por que as pessoas publicam que vão tomar banho, dormir, que acordam, que irão
almoçar, que foram ao cinema, que estão cansadas? Que atire o primeiro mouse quem
nunca escreveu algo do tipo. Mas não se culpe. Nós somos jovens e queremos abraçar
o mundo. Nós queremos aproximar as pessoas. Porém, nossa relação com as pessoas e
com o mundo está se tornando cada vez mais frágil e criamos uma ilusão de que até
aquelas, que só nos deram “oi” uma vez na vida, estão perto de nós, separadas apenas
por uma conexão banda larga.
Por isso, hoje daria um conselho, ou melhor, um convite. “Mexa” no computador o
quanto quiser, afinal, não há quem duvide do quanto ele é útil em nossas vidas. Mas
vamos usar a tecnologia a nosso favor ao invés de tentar nos camuflar. Vamos fazer
mais amigos de verdade. Adicionar pessoas na nossa vida. Adicionar conhecimento,
não apenas informações. Vamos compartilhar coisas mais importantes. Vamos ligar,
visitar, abraçar, beijar, sentir o cheiro das coisas. Vamos cuidar da NOSSA vida como se
ela fosse aquelas fazendinhas virtuais. Vamos ser mais naturais. Sem querer ser
rabugento ou engraçado demais. Vamos ser quem realmente somos, pois esse é o
melhor jeito de sermos únicos.
3. Tatiana Camilo é Designer Gráfica desde 2010. Apaixonada por arte, trabalha com criação e
entre tantas outras coisas continua escrevendo textos belíssimos.
@tatianacamilo