Ação trabalhista por danos morais após roubos em agência dos Correios
1. 10/03/2014
Número: 0010634-93.2013.5.14.0031
Classe: AÇÃO TRABALHISTA - RITO ORDINÁRIO
Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região
PJe - Processo Judicial Eletrônico
Consulta Processual
Partes
Tipo Nome
AUTOR ODAIR VIEIRA DA LAVA - CPF: 527.108.312-87
ADVOGADO SILVIO VINICIUS SANTOS MEDEIROS - OAB: RO3015
RÉU EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS - CNPJ: 34.028.316/0001-03
ADVOGADO ANDERSON FERNANDES DE CARVALHO - OAB: RO1774
Documentos
Id. Data da
Assinatura
Documento Tipo
48749
2
14/02/2014 09:55 Sentença Sentença
2. PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – 14ª REGIÃO
1ª VARA DO TRABALHO DE ARIQUEMES
Juscelino Kubitschek, 2351, Setor Institucional, ARIQUEMES - RO - CEP: 76870-046
PROCESSO Nº 0010634-93.2013.5.14.0031
RECLAMANTE(S): ODAIR VIEIRA DA LAVA
RECLAMADO(S): EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
SENTENÇA
I – RELATÓRIO
O reclamante ajuizou ação trabalhista em 20/10/2013, alegando ser funcionário do reclamado e
lotado na agência da cidade de Alto Paraíso, na qual houve três roubos. Asseverou ter havido dano moral.
Pleiteou indenização, além dos benefícios da Justiça gratuita e honorários advocatícios. Juntou
documentos.
O reclamado apresentou contestação, alegando, preliminarmente, ilegitimidade passiva ad
causam. No mérito, pugnou pela total improcedência dos pedidos da inicial. Juntou documentos, tendo
sido impugnados, conforme ID n. 357159.
Dispensado o depoimento das partes. Sem mais provas, encerrou-se a instrução processual.
Razões finais remissivas pelas partes. Rejeitada a renovação da proposta conciliatória.
II – FUNDAMENTAÇÃO
PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM
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3. O reclamado alegou não ser parte legítima a figurar no polo passivo do presente feito porque não
haveria nexo de causalidade entre os danos alegados e a sua conduta.
Na verdade a reclamada confunde questão preliminar com matéria de fundo, de mérito.
Legitimados ao processo são os sujeitos da lide, ou seja, os titulares dos interesses em conflito,
cabendo a legitimação passiva ao titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão1.
Aplica-se à questão a teoria da asserção, segundo a qual a análise das condições da ação é feita à
luz das afirmações do demandante contida em sua petição inicial.
No entanto, se existe a responsabilidade do reclamado ou não são pontos que dizem respeito ao
direito material deduzido em Juízo, logo, questões de mérito, que serão analisados oportunamente.
Rejeita-se, pois, a preliminar em tela.
DO MÉRITO
DOS DANOS MORAIS
O reclamante alegou na inicial que é funcionário do reclamado e lotado na agência situada na
cidade de Alto Paraíso-RO, a qual, nos dias 05/02/2013, 1º/04/2013 e 17/05/2013 foi roubada.
Salientou o obreiro que no dia 05/02/2013, dois homens adentraram na agência com um revólver,
anunciaram o roubo, subtraindo pertences de clientes e de valores que estavam no caixa. Inclusive o
reclamante teve seu aparelho celular roubado, conforme Termo de Declarações e Ocorrência Policial n.
322/2013/DRCCP de Ariquemes.
Continuou o reclamante, relatando que a Ocorrência Policial n. 715/2013/DRCCP de Ariquemes
noticia que no dia 1º/04/2013 ocorreu um roubo no interior da referida agência por dois assaltantes,
ambos portando armas de fogo, tipo pistola, tendo sido subtraído dinheiro, bem como, pertences e
dinheiro de clientes que estavam no interior da agência. Foi noticiada uma possível participação de um
terceiro que estava do lado de fora, nas redondezas, passando informações por telefone celular.
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4. Acrescentou o obreiro que o mais recente roubo ocorreu no dia 17/05/2013 no interior da mesma
agência com dois homens com armas de fogo roubaram dinheiro que estava no cofre e ameaçaram matar
os funcionários caso não permanecessem debaixo da mesa, fatos registrados na Ocorrência Policial n.
1169/2013/DRCCP de Ariquemes.
O reclamante argumentou que pelo abalo psicológico sofrido decorrente da omissão da empresa
em adotar medidas efetivas de segurança a seus empregados necessitou afastar-se de suas atividades
laborais e também preencheu o formulário de Levantamento Interno Sobre Acidentes (LISA)
comunicando ao setor de Segurança do Trabalho sobre o acidente referente ao roubo ocorrido no dia
1º/04/2013, já mencionado.
O reclamante alegou, ainda, que trabalha inseguro e melindroso, pois a qualquer momento está
sujeito a ser novamente vitimado, temendo pela sua vida, sendo a situação de constante perigo porque
continua a exercer as suas atividades em ambiente sujeito a outros assaltos e sem aparatos de segurança,
justificando, portanto, o seu temor e o abalo psicológico permanente.
Além disso, os funcionários têm seus pertences roubados e são ameaçados durante um roubo.
Disse também o reclamante que estaria mais do que clara a ausência de segurança no trabalho e a
omissão da empresa em adotar medidas de proteção a seus empregados. Tanto seria verdade que em uma
ação coletiva, movida pelo SINTECT/RO em face da ECT o Ministério Público do Trabalho emitiu
parecer favorável e reconhecendo a omissão da ECT em adotar medidas de segurança capazes de evitar os
constantes assaltos que vem ocorrendo.
O reclamado, por sua vez, não negou os fatos, quais sejam, a ocorrência de três assaltos na
agência de Alto Paraíso, nem mesmo os problemas de saúde psíquica enfrentados pelo reclamante.
Limitou-se a dizer que não é agência bancária e com ela não se confunde, não estando obrigada a
adequar-se aos ditames da Lei 7102/93.
Não há dúvida que o reclamante foi vítima de fatos ocorridos em razão do trabalho, tendo,
inclusive, o reclamado providenciado emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho, conforme ID n.
271715, após o último evento.
Não se trata de considerar o reclamado como instituição bancária. No entanto, não se pode negar
que parte de suas atividades envolvem a movimentação de numerário.
Também é inegável o fato de que o reclamado não está preparado para lidar com esse tipo de
situação, já que não possui o aparato necessário para garantir a segurança de seus empregados.
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5. Ainda que não esteja obrigada a cumprir a Lei n. 7.102, mas o fato é que é público e notório que
os meliantes também sabem disso, tanto que nos últimos tempos as pequenas localidades, dentre as quais,
Alto Paraíso-RO, passaram a ser o foco de ações visando subtração de numerário e verdadeiro terror.
Dano moral, previsto no art. 186 do Código Civil, é aquele decorrente da prática de um ato que
tem o condão de macular a honra objetiva ou a honra subjetiva do indivíduo, de tal sorte a lhe causar dor,
angústia, humilhação, sofrimento, vindo a ofender seu direito de personalidade, sua dignidade enquanto
pessoa humana.
Assenta a Constituição Federal de 1988 (art. 5.o, V e X) que são invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização por dano material ou moral
decorrente dessa violação.
A própria Carta Magna também estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos
fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III). Direitos da personalidade são aqueles
destinados a resguardar a dignidade humana. Trata-se da honra, do nome, da vida, da saúde. A
personalidade é o ponto de apoio de todos os direitos e obrigações (Caio Mário, in Instituições de Direito
Civil, vol. 1, Forense, 1991).
É mister enfatizar que para ficar configurada a existência do dano moral, faz-se necessária a
presença de seus elementos caracterizadores, quais sejam: a ação (o ato ilícito), a ocorrência da lesão (o
dano em si) e o nexo causal que será o elo entre os dois elementos anteriores.
Demais disso, é necessário que o dano sofrido seja provado, competindo ao suposto lesionado o
ônus de provar a lesão que lhe foi acometida, nos termos do art. 818 da CLT c/c o art. 333, I, do CPC.
No presente caso, não há dúvida que o reclamado tem sido negligente em relação a garantir a
incolumidade do trabalhador.
Constitui obrigação do reclamado assegurar a integridade física e segurança de seus empregados
e dos usuários de seus serviços, na forma do que estabelece os arts. 7º, XXII e XXIII da CR/88; 154 e 157
da CLT e 19, § 1º da Lei 8.213/91.
O reclamado não nega que o local de trabalho do reclamante não é seguro, sendo que apenas
afirma não ter obrigação para tanto e que nem mesmo a segurança pública tem sido capaz de deter a ação
dos meliantes.
Acontece que todo contrato de emprego há uma cláusula de segurança, a qual poderia até ser
considerada como explícita, diante da imensa quantidade de normas a serem observadas pelo empregador,
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6. a fim de proporcionar aos seus empregados a máxima segurança e a proteção de sua saúde, nos seus
aspectos físico e mental. Daí se tem como direito fundamental do trabalhador a “redução dos riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”, nos moldes do inciso XXII do
art. 5ª da Constituição da República.
O reclamado, de qualquer forma, tem o dever de segurança em relação aos seus empregados,
enquanto estiverem em seu estabelecimento empresarial, em atenção, inclusive, ao princípio da dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III, da CRFB).
Omitir-se e negligenciar a segurança dos empregados, não investindo adequada e razoavelmente
em segurança, como é o caso dos autos, atrai a responsabilidade do reclamado.
Não se trata de um fato inevitável. Fácil presumir que um local com fragilidade na segurança,
manuseando numerários, mais cedo ou mais tarde teria a ação de bandidos perigosos.
Portanto, a omissão do reclamado e a falta de investimento na área de segurança atrai a sua
responsabilidade nos eventos sofridos pelo reclamante, estando plenamente presente o nexo de
causalidade.
Além disso, o fato também precisa ser analisado pelo prisma do homem médio.
Obviamente, ter sido vítima de roubos no horário de trabalho por três vezes, por pessoas portanto
armas de fogo, correndo risco de ser morto a qualquer momento e, além disso, permanecer com esse
medo, já que a situação fática da falta de segurança na agência de Alto Paraíso-RO não mudou, traz
angústia, dor, sentimentos de revolta, indignação e tristeza.
Ao contrário da indenização por danos materiais, a do dano moral tem natureza compensatória,
pois os bens imateriais são insuscetíveis de valoração econômica, por isso não se pode falar no pretio
doloris, ou preço da dor.
A sua finalidade objetiva minimizar a dor sentida pela vítima por meio da concessão de um bem
material que lhe proporcione alguma compensação para o sofrimento.
Segundo a teoria de desestímulo, sua finalidade é punir o ofensor para com isso evitar
reincidências e alertar a sociedade sobre as consequências do ato praticado.
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7. No caso dos autos, o reclamado precisa ser severamente punido para evitar que fatos que
aconteceram com o reclamante voltem a ocorrer com outros trabalhadores em outras localidades.
De nada adianta uma condenação suave, e a situação fática permanecer sem solução.
Ressalto que a indenização devida não poderá ser vultosa a ponto de constituir-se em fonte de
enriquecimento ilícito, nem tão diminuta de forma que não represente qualquer abalo nas finanças do
ofensor.
Portanto, fixo o valor da indenização em R$75.000,00, já que este foi o valor máximo pleiteado.
DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Indefiro o pedido, tendo em vista que não restaram preenchidos os requisitos exigidos pela Lei n.
5.584/70.
DA JUSTIÇA GRATUITA
Defiro ao reclamante os benefícios da justiça gratuita, nos termos da Lei nº 1.060/50 c/c o art.
790, § 3º, da CLT, em face de sua alegação constante da inicial, sem provas em sentido contrário.
DO TRATAMENTO COMO FAZENDA PÚBLICA
O reclamado deverá ser tratado com as prerrogativas e privilégios de Fazenda Pública, conforme
dispõe o Decreto-lei n. 779/69.
Nesse sentido, já decidiu o E. TRT-14ª Região:
“CORREIOS. PRERROGATIVAS DA FAZENDA PÚBLICA. A Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos goza das prerrogativas processuais pertinentes à Fazenda Pública, dentre elas os
prazos processuais dilatados, tendo em vista que presta serviços públicos assemelhados às autarquias, por
força do art. 12 do Decreto-Lei nº 509/69, recepcionado pela vigente Carta Magna conforme
pronunciamento da Suprema Corte”. (Autos do Processo n. 00031.2006.001.14.00-4, Relator
Desembargador VULMAR DE ARAÚJO COÊLHO JUNIOR, publicado no DOJT n.164,de 05/9/2006).
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8. DA EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS
Considerando a situação de insegurança não negada pelo reclamado em relação a agência de Alto
Paraíso-RO, após o trânsito em julgado, a Secretaria da Vara deverá expedir ofício ao Ministério Público
do Trabalho, com cópia da presente sentença para que tome as providências que o caso requer.
III – CONCLUSÃO
Ante o exposto, e o que mais dos autos consta, rejeito a preliminar arguida pelo reclamado e, no
mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados nessa ação trabalhista ajuizada
por ODAIR VIEIRA DA LAVA em face de EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E
TELÉGRAFOS, para o fim de condenar o reclamado a pagar ao reclamante o valor de R$75.000,00, a
título de indenização por danos morais.
Tudo se observando os termos e parâmetros da fundamentação precedente que passa a integrar
este dispositivo para todos os efeitos legais.
Nos termos do §3º, do art. 832 da CLT, indico as parcelas relativas ao saldo de salário e 13º
salário proporcional como as que haverá incidência de INSS, sendo que a parte devida pelo reclamante
deverá ser deduzida de seu crédito.
Nos termos do §3º, do art. 832 da CLT não há INSS e nem imposto de renda decorrente das
verbas deferidas nesta sentença, uma vez que possuem natureza indenizatórias.
Após o trânsito em julgado, a Secretaria deverá expedir ofício ao MPT, conforme
fundamentação, bem como, encaminhe-se cópia da presente sentença ao Tribunal Superior do Trabalho,
por meio do endereço eletrônico regressivas@tst.jus.br.
Custas processuais pelo reclamado no importe de R$1.500,00, calculadas sobre o valor da
condenação em R$75.000,00, nos do art. 789, I, da CLT.
Cientes as partes. Ariquemes, 14 de fevereiro de 2014. Nada mais. cx//
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9. CÂNDIDA MARIA FERREIRA XAVIER
Juíza Titular de Vara do Trabalho
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