O documento discute o conceito de cidadania ao longo da história, desde sua origem na Grécia e Roma antigas, passando pela Idade Média e Revolução Francesa, até os dias atuais. A educação escolar deve promover o acesso de todos aos bens socialmente produzidos para que a cidadania seja plenamente exercida.
1. Formação humana para a
cidadania e educação escolar
Professora Maria de Fátima Rodrigues Pereira
Araucária, 21/07/2011
A primeira constatação que é preciso fazer é que a palavra cidadania tem sido muito
proferida e em muitos casos pouco esclarecida. Proferimos a palavra e sabemos pouco do
seu conteúdo.
Convido-os a refletirmos e pensarmos juntos sobre o tema cidadania, formação humana e
educação escolar.
Para tal organizei esta fala em três partes: na 1ª parte abordo a origem da palavra cidadania;
na 2ª o seu conteúdo na modernidade e após a Revolução Francesa e na 3ª o que hoje
podemos considerar cidadania e as contribuições que a educação escolar pode fazer para tal.
2. Cidadania entre os povos latinos- A
cidadania em português, corresponde:
em espanhol, ciudadanía;
em italiano, cittadinanza;
em francês, citoyennité;
Já a cidadão em português corresponde no espanhol
ciudadano; cottadino no italiano e citoyen no
francês.
Temos, então que cidadania está na história dos
povos latinos, cuja constituição está ligada à cultura
greco - romano.
3. Sobre a palavra Cidadania - Se perguntarmos pelo étimo(origem) da
palavra cidadania, temos:
que deriva do latim civitas, que é cidade em latim, no
mundo romano;
corresponde a pólis, a Cidade-Estado dos gregos- daí
deriva política – governo da cidade.
a Antiguidade Grega e Romana era um mundo de
cidades; Roma chegou no século I d.C. a um milhão
de habitantes.
Portanto, a palavra cidadania, está desde sua
origem, associada à vida na cidade, ao governo da
cidade.
4. O Coliseu- sua construção data de 70 a 80 d. C.
Tinha capacidade para receber até noventa mil espectadores.
6. Seu surgimento na língua portuguesa
Segundo o Dicionário Etimológico de José Pedro Machado,
cidadania, na língua portuguesa, surge no século XIII- e se
reportava, nesse final de Idade Média ao homem que vivia
no burgo, na cidade medieval, aquele que não estava
“adscrito” ao feudo;
A final uma minoria, se considerarmos que na Idade Média
a vida se faz no feudo, cerca de 90% da população vivia no
campo
Portanto, desde já podemos fixar três sentidos associados a
cidadania: do latim: vida na cidade, governo da vida na
cidade e liberdade por oposição ao servo da gleba.
7. A Cidadania na cidade medieval
Liberdade entendida aqui como libertação da servidão. O servo da
gleba fugia então dos feudos e penetrava nos muros da cidade,
onde se considerava ao mesmo tempo protegido e livre do
senhor feudal e da sujeição que devia a ele (a vassalagem). Daí
o dito que demonstra o "espírito da época" (cf. Maria
Encarnação B. Spósito): "O ar da cidade é o ar da liberdade" ou,
melhor, "o ar da cidade é libertador" (Stadtluft macht frei).
Tratava-se, como é claro, de uma liberdade de fato, o que não
impedia de torná-las pólos de atração para uma população que
crescia desde o século XI.
Mas, ligado ao renascimento do comércio, o processo de
urbanização da Europa da Idade Média — um fenômeno
complexo e controvertido — era "lento demais para permitir às
cidades absorver a imigração em massa da população rural"
(Bronislaw Geremek).
9. Mas é na Modernidade (1789- marco da Revolução Francesa para cá) que
cidadania ganha mais sentido
Em outubro de 1774, na França, Pierre-Augustin Caron de
Beaumarchais, autor da peça - Bodas de Fígaro, depois musicada
por Mozart, empregava num discurso, a palavra citoyen, para se
referir ao homem livre; ao homem que rompe com o antigo
Regime de adscricão feudal, que se pauta pela razão e por estar
na cidade.
Diziä: “Sou um cidadão; isto é, alguma coisa de novo, de
inaudito; nem financeiro, nem abade, nem cortesão, nem
favorito; nem NADA QUE SE POSSA CHAMAR PODER...
Sou um cidadão -o quê os senhores deviam ser desde há
duzentos anos e hão de ser dentro de vinte, talvez".
10. Bodas de Fígaro
Trata, entre outros temas, do direito feudal do senhor....
11. Contudo>>>A maioria da população, ao final do
século XVIII, era camponesa, não citadina.
Poucas eram, então, as cidades, a mais numerosa era
Londres com um milhão de habitantes, seguida de Paris
com meio milhão e, umas outras, com uma população de
100 mil ou mais: duas na França, duas na Alemanha, talvez
quatro na Espanha, cinco na Itália, duas na Rússia,, e
apenas 1 em Portugal, na Polônia, na Holanda, na Áustria,
na Irlanda, na Escócia e na Turquia.
O verdadeiro homem da cidade tinha desprezo pelo campo
atrasado, ainda que dele depende-se porque a cidade ainda
dependia do que o campo produzia, dos impostos que
arrecadava, dos que o abandonavam e se constituíam
operários assalariados nas manufaturas e indústrias
nascentes nas cidades.
12. Na França a Assembléia Nacional,
na qual se transformara a Reunião dos Estados
Gerais, no 14 de julho de 1789 (data nacional da
França até hoje, - queda da Bastilha-) decidiu que a
Constituição deveria conter uma Declaração dos
Direitos do homem e do cidadão- que foi votada
em 26 de agosto de 1789.
14. Esta Declaração foi tão importante....
que é um marco no mundo ocidental;
tão grande.... Que influenciou as Constituições do
mundo ocidental.
15. Mas, o que continha esta Declaração?
17 artigos: sobre isonomia (igualdade) perante a Lei;
liberdade pessoal; de opinião; de religião; de
imprensa; justiça fiscal; separação de poderes e
direito de propriedade.
Ali se diz que todo o cidadão pode falar; escrever,
imprimir, respondendo pelo abuso dessa liberdade,
nos teremos da lei....
16. Mas Declaração não é efetivação
Foi na luta que a cidadania foi se efetivando-
Na conquista de direitos civis, políticos, sociais
17. E por que não basta a Declaração
Porque ainda que os indivíduos produzam
coletivamente os bens sociais, toda a riqueza
material e cultural e todas as instituições sociais e
políticas, dada a divisão social em classes, nem
todos os homens se apropriam desses bens por eles
mesmos criados;
De todo o modo a proclamação desses direitos teve
importante significado revolucionário;
Hoje seria uma equívoco entender que cidadania
não exige luta, trabalho, formação;
18. Portanto - Cidadania depende de
trabalho de luta,
de vivê-la, de conquistá-la e como tudo que não é
natural, que é artificial, da história, da cultura exige
formação, educação para tal;
E assim tem sido.....
19. Thomas Humprey Marshall (1893-1981) sociólogo
britânico autor de- cidadania e classe social e status
Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1967.
20. O sociólogo T. H. Marshall – direitos civis
Tomando como pressuposto o que aconteceu na
Inglaterra, em seu estudo – Cidadania, classe social e
status nos fala que o primeiro conjunto de direitos,
historicamente conquistados, foram os civis – direito
à vida, à liberdade de pensamento, de movimento, de
propriedade.
21. Direitos Políticos
O segundo conjunto de direitos foram, no caso
inglês, os políticos- direito de votar e ser votado, de
associação,organização.
Foi fácil a conquista destes direitos, no Brasil, para
quem não possuía propriedade, era mulher ou
analfabeto?
O sufrágio universal, no Brasil, só foi garantido pela
Constituição de 1988.
22. Direitos Sociais
Neste conjunto de direitos está o acesso e usufruto
de bens socialmente produzidos, entre os quais está
a saúde, a educação, a moradia, o alimento, a arte, a
cultura, o trabalho.
23. No Brasil- a duras penas fomos fazendo
conquistas de cidadania
E um dos marcos da cidadania historicamente
conquistada no Brasil é a Constituição de 1988,
chamada de Constituição Cidadã.
24. A Constituição cidadã de 1988 quanto à
educação
Em seu artigo 205, estabelece que a educação é
direito de todos e dever do Estado e da família deve
visar o pleno desenvolvimento da pessoa humana,
seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho, que é também, como
vimos, uma das várias dimensões da idéia-força da
cidadania.
25. A Constituição, Educação, Cidadania
A educação como prática social, histórica, para todos que implica
formação para acesso, apropriação e usufruto de todos os bens
socialmente produzidos;
Que hoje tem na escola o lócus dessa formação que se pretende alargada
para a pré-escola e stricto-sensu.
Mas, vivendo nós em sociedades de classes temos aqui uma contradição, já
apresentada no slide n. 13-
- dada a divisão social em classes, nem todos os homens se
apropriam desses bens por eles mesmos criados-
Isto tem implicado diferenças no acesso e usufrutos para os filhos
das classes trabalhadoras e para as elites-
Como bem disse Adam Smith -"Instrução para os
trabalhadores, porém, em doses homeopáticas".
26. Quais são os desafios da educação escolar para a cidadania
enquanto acesso e usufruto dos bens socialmente produzidos ?
Certamente - ultrapassar os mínimos, a míngua, a
fome, o que dá acesso à apropriação do
conhecimento, hoje reconhecidamente, um meio de
produção; que ao ser apropriado por todos deixaria
de ser propriedade privada somente de alguns.
27. E se cidadania é o acesso e usufruto dos
bens socialmente produzidos....
Isto implica que a educação escolar, antes de mais
nada, possibilite entender este nosso modo de
existir, no qual a produção incorpora não só
funções manuais para as máquina, mas, também as
próprias operações intelectuais;
formação sólida, no mais alto patamar, possibilite a
intervenção cidadã, o governo do mundo.
28. Para isto, a educação escolar tem que ser
um banquete, todos os dias......
Onde estejam os conhecimentos sistematizados da arte, da ciência, da filosofia, da técnica;
Onde seja superada a dicotomia entre a teoria e prática;
A pesquisa seja princípio pedagógico;
O trabalho princípio educativo;
E o princípio ético político seja a formação omnilateral do homem;
Onde a escola tenha “boniteza”como disse Paulo Freire;
Onde haja profunda ligação do trabalho educativo com a vida e seus frutos mais promissores;
Isto exige trabalho educativo unitário, integrado, avaliação constante e
reflexão em conjunto de todos os envolvidos nos processos escolares.
Isto exige uma agenda
29. COUTINHO, Carlos Nelson. Notas sobre Cidadania
e Modernidade. In: Estudos de Política e Serviço
Social. Vol. 1, n.1. set. de 1997.
DUBY, Georges. Economia rural e a vida no campo
no ocidente medieval. V. 1. Lisboa: Edições 70,
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 2. ed. São
Paulo: Nobel, 1993.
SAVIANI, Dermeval. O trabalho como princípio
educativo frente as novas tecnologias.
SMITH, A. Inquérito sobre a natureza e as causas
da riqueza das Nações. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1981, v. 2.