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               PÓS-GRADUAÇÃO EM TEOLOGIA
                     Com enfoque em ensino religioso




                  LEANDRO SOARES DE SOUSA




COMO O PESQUISADOR DA RELIGIÃO ENTENDE O CONCEITO DE SAGRADO?

                  HIEROFANIA NA ESCOLA RELIGIOSA

       É POSSIVEL FALAR DO ESPAÇO SAGRADO NA SALA DE AULA?

          RITOS DE PASSAGEM NA ESCOLA É RELIGIOSO OU NÃO?




                                           Trabalho apresentado à prof. Antonio
                                           Boeing da disciplina de Fundamentos
                                           antropológicos da religião como
                                           avaliação e exigência para aprovação.




                          Rio de Janeiro
                         Novembro- 2012
2



COMO O PESQUISADOR DA RELIGIÃO ENTENDE O CONCEITO DE SAGRADO 1?
                                  Por Leandro Soares de Sousa

       Ao consultar o Dicionário Enciclopédico das Religiões2 sobre o termo Sagrado,
vemos que trata-se de uma "manifestação de algo de ordem diferente, de uma
realidade que não pertence ao nosso mundo natural, profano.
       As conotações ontológicas para o conceito do sagrado, tem o foco de interesse
dos representantes clássicos da Fenomenologia da Religião na experiência humana do
numinoso3, ou seja, na reação do sujeito religioso aos "chamados" do sagrado.
Metaforicamente falando, pode-se dizer que há uma instância própria no interior do ser
humano que reage à esfera divina transcendental analogicamente a uma caixa de
ressonância que, devido a seu material, vibra na mesma freqüência de um som
produzido próximo a ela. A Fenomenologia clássica da Religião, portanto, parte do
axioma antropológico de que o ser humano é equipado com uma faculdade específica
que o predispõe para a sensação da presença do sagrado. Esse sensus numinis[13]
possibilita a sensação ambígua do sagrado como mysterium tremendum et fascinosum
("mistério tremendo e fascinante"). Em outras palavras, o encontro do individuo com a
essência divina nele provoca, simultaneamente, "sentimentos inexplicáveis de horror e
espanto, por um lado, e êxtase irresistível e fascinação, por outro.
       Mircea Eliade chamou de "hierofanias", as auto-revelações do sagrado, que
constituem um elemento-chave na história humana, embora o lado irracional do
sagrado enfraqueça na medida em que uma religião concreta passa por um processo
de racionalização. Em outras palavras: "O elemento racional supera o estágio original
do „rudimento‟ e „esquematiza‟ os momentos irracionais por meio da moralização e


1
  Frank Usarski (2004) diz que há um uso aleatório da palavra sagrado, que é aplicada à vontade para
parafrasear algo que - de uma maneira ou outra - tem (mais ou menos) a ver com religião. Dá-se
também o contrário, ou seja, o termo sagrado é intuitivamente associado a um sentido mais específico
do que o da palavra religião. Em relação à suposição de sinonímia da noção do sagrado com o termo
"religião", seria uma tarefa sem fim listar todas as citações de títulos de livros, dissertações e teses,
anúncios de encontros interinstitucionais, aulas magnas, eventos temáticos e ementas de cursos
brasileiros apenas nos últimos anos para provar a "naturalidade" com a qual o sagrado é adotado como
se fosse um termo técnico inequívoco e imediatamente acessível para leitores, integrantes de bancas,
ouvintes em auditórios e alunos em salas de aula. Cf. Revista de Estudos da Religião Nº 4 / 2004 / pp.
73-95
2
  Cf. Dicionário Enciclopédico das Religiões, Vol.1, orgs. Por Hugo Schlesinger e Humberto Porto,
Petrópolis: Vozes, 1995, p.1265.
3
  Otto foi o criador do neologismo alemão numinoso, termo derivado da palavra latina numen que
significa aproximadamente : vontade divina", "atuação divina" ou "essência divina" e empregado para
designar a forma mais "abstrata"[5] do sagrado, tema central e título da sua "obra magna".
3



cultivo". Embora essa "sublimação" tenha diminuído o vigor do numinoso, ele não deixa
de repercutir nas formas posteriores. Pelo contrário: como Rudolf Otto afirma ainda no
início da sua obra magna, "o numinoso vive em todas as religiões."
        O ser humano concretiza sua relação com o sagrado na vida através de
símbolos, ritos e expressões estéticas culturalmente pré-estruturadas. Embora as
formas diversificadas e variáveis no tempo e espaço constituam o mundo religioso
empírico, elas não desviam a atenção de um pesquisador comprometido com o
programa da Fenomenologia da Religião4, uma vez que sua tarefa mais "digna" é a de
transpassar a multiplicidade dos fatos produzidos nos âmbitos de diferentes religiões
para compreender a essência da religião.
       É preciso que o pesquisador não se perca na complexidade dos fatos, e estude
a manifestação religiosa em si mas abstraia do mundo empírico por ativar seu próprio
sensus numinis e "treinar" sua empatia com o sagrado para se deixar penetrar
emocionalmente pelo numinoso e experienciá-lo.




BIBLIOGRAFIA CONSULTADA


Dicionário Enciclopédico das Religiões, Vol.1, orgs. Por Hugo Schlesinger e Humberto
Porto, Petrópolis: Vozes, 1995, p.1265.

ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. São Paulo:
Martins Fontes, 1995.

OTTO, R. O Sagrado, Lisboa: Edições 70, 1992

USARSKI .Frank .Revista de Estudos da Religião Nº 4 / 2004 / pp. 73-95.




4
 Para alguns críticos da fenomenologia “Clássica” da Religião , do Ponto de vista metodológico, não é
suficiente estudar as "meras" manifestações religiosas. Pelo contrário, é preciso que o pesquisador se
deixe penetrar emocionalmente pelo numinoso e experienciá-lo.
4



                                 HIEROFANIA NA ESCOLA RELIGIOSA5
                                        Por Leandro Soares de Sousa


        Esse texto tentará refletir sobre a Hierofanias na constelação escolar de escolas
religiosas. As seguintes questões são chaves de interpretação da realidade,
especialmente religiosa, na perspectiva antropológica.
        Sabemos        que     existem      diferentes      concepções        que     irão   contribuir     na
decodificação e compreensão do fenômeno religioso no contexto escolar. No caminho
metodológico será o itinerário da antropologia da religião, que está marcado por uma
longa investigação sobre as origens da religião. Há um consenso entre os
pesquisadores ao afirmar que a pesquisa neste campo foi aos poucos assumindo
objetivos mais limitados em torno do papel que a religião exerceu ou exerce, no
contexto das outras dimensões da vida associativa. Daqui resultam o casamento
epistemológico da análise antropológica e análise sociológica do fenômeno religioso,
particularmente, quando a primeira retém como fundamental o estudo das estruturas
sociais, especialmente a antropologia social, enquanto a segunda prolonga seus
próprios interesses no âmbito dos sistemas simbólicos.
        Podemos começar nossa reflexão partindo de Mircea Eliade no Tratado de
História das Religiões que pretende estudar os fenómenos religiosos. Ele aborda os
fenómenos religiosos em si mesmos, como hierofanias (fenómenos religiosos),
identificando tipologias e estudando a sua estrutura e significado. Mas o que é
hierofanias? O próprio Eliade define que: “ o homem pode tomar conhecimento do
sagrado, porque este se               manifesta; portanto, esta é caracteristica intrisica, a
capacidade de manifestação”. Logo a Hierofania é manifestação do sagrado que pode
se manifestar em qualquer objeto do mundo profano, e este assume a condição de
sagrado. Penso que a máxima dessa reflexão é pensar que o objeto passa a ser outra
coisa e continua a ser ele mesmo.
        Assim como outros teóricos, Mircea Eliade define o sagrado pela oposição ao
profano. Vê o sagrado como uma experiência natural, embora possa aparecer através
de coisas humanas e se revelar através da natureza.
        Rudolf Otto6, um grande historiador das religiões, foi que melhor definiu a
essência do sagrado com uma forma de experiência interna sui generis e incomum.

5
  Termo cunhado por Mircea Eliade e utilizado nesta reflexão por Leandro Soares para descrever a manifestação
religiosa nas escolas religiosas.
5



Ele analisou a manifestação do sagrado como uma experiência única, interna e
individual, mas que poderia ser partilhada. O autor defende ainda que o sagrado se
manifesta sempre com uma qualidade inteiramente diferente da realidade cotidiana e
da experiência natural.
        A religiosidade de um povo se manifesta não apenas em rituais complexos e
mitos dos tempos primordiais, mas também na experiência cotidiana em todas as áreas
da vida. A forma de entrar ou sair de uma casa, um simples gesto no momento da caça
ou pesca, a dieta alimentar, a direção do olhar ao se aproximar de determinado objeto,
o pronunciar discreto de determinadas palavras ao entrar na água e coisas
semelhantes podem expressar muito da religiosidade local. Desde que o ser humano
se compreendeu como ocupando determinada posição no cosmos, compreendeu uma
sacralidade. A partir do momento em que o humano pôde começar a descrever o que o
rodeava, as noções e os conceitos que formulou para descrever o que via emanaram
de uma interpretação que compreendia o sagrado. Vemos por toda a parte a
"tendência do homem para «consagrar» toda a sua vida". Neste sentido, há uma
tendência para o sacrifício no homem.
        Agora, como podemos entender o sagrado no contexto escolar? De primeira
mão podemos postular que essa hierofania não é tarefa essencial e especial da
disciplina ensino religioso e muito menos do professor de Ensino religioso. Acreditamos
que essa hierofania escolar só se efetivará na medida em que forem incorporados
pelos professores, não apenas no planejamento formalizado na escola, mas no efetivo
trabalho com os educandos.
        Tendo como ponto de partida as novas demandas para o Ensino Religioso, que
foram definidos nas Diretrizes Curriculares dessa disciplina, Cumpre relembrar que o
objeto do Ensino Religioso é o estudo das diferentes manifestações do sagrado no
coletivo7. Seu objetivo é analisar e compreender o sagrado enquanto o cerne da
experiência religiosa do universo cultural, que se contextualiza no cotidiano
educacional ou escolar de inter-relação dos diversos sujeitos.
        Contudo como comenta o antropólogo brasileiro Luiz Gonzaga Mello8, só é
possível isolar a religião dentro da cultura como um recurso didático e metodológico
apenas. Ou seja, o universo cultural religioso perpassa todas as disciplinas na escola.

6
  OTTO, R. O Sagrado, Lisboa: Edições 70, 1992.
7
  Em colégios católicos temos também a especificidade da filosofia cristã e espiritualidade dos fundadores.
8
  OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O Trabalho do Antropólogo – Olhar, Ouvir, Escrever. In: Revista de
Antropologia. Vl. 39, Nº 1. São Paulo: USP, 1996.
6



Podemos ainda falar de uma hierofania que se manifesta na relação educando x
educador e não somente na relação educando x conteúdo. Meslin9 (1992) em sua tese
central defende que o sagrado só se capta no interior da experiência humana. Daí se
segue que a experiência religiosa só se entende desde o concreto das pessoas que a
vivenciam no interior de suas religiões. Então podemos aplicar o mesmo principio aos
professores de colégios religiosos: A experiência religiosa de Fraternidade,
solidariedade, amor.. só se entende desde o concreto dos professores que a vivenciam
no interior de suas escolas.
        Sendo assim, podemos concluir afirmando que o sagrado é uma noção
fundamental que parece acompanhar a humanidade desde os primórdios. O estudo do
sagrado pode lançar luz sobre o modo de ser do ente que é capaz de se relacionar
com entes sagrados - sendo que "sagrado" na constelação escolar significa, ser, existir,
"dotado de sentido". Qualquer compreensão profunda do humano deve estar preparada
para esclarecer o fenómeno do sagrado. E desta forma, estudar a estrutura e o
significado dos fenómenos religiosos na escola deve ajudar a lançar luz sobre o ser do
ente que é capaz de se relacionar com o sentido na educação e na escola.


                                          BIBLIOGRAFIA

ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. São Paulo:
Martins Fontes, 1995.

MESLIN, Michel. A experiência humana do divino: Fundamentos de uma antropologia
religiosa. Petrópolis: Vozes, 1992.


OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O Trabalho do Antropólogo – Olhar, Ouvir, Escrever.
In: Revista de Antropologia. Vl. 39, Nº 1. São Paulo: USP, 1996.


OTTO, R. O Sagrado, Lisboa: Edições 70, 1992.




9
 MESLIN, Michel. A experiência humana do divino: Fundamentos de uma antropologia religiosa. Petrópolis:
Vozes, 1992.
7



           É POSSIVEL FALAR DO ESPAÇO SAGRADO NA SALA DE AULA?
                                     Por Leandro soares de Sousa


        Para desenvolver nossa reflexão sobre o espaço sagrado na escola, iniciamos a
construção de um arcabouço teórico, evidenciando a noção de sagrado como categoria
interpretativa do fenômeno religioso apoiado nas contribuições de Mircea Eliade 10 ;
Rudolf Otto11 e aliando essa construção as facetas do poder e sua legitimação na
religião com base nas teorizações de Michel Foucault12
        Segundo Gil Filho13 para que um espaço seja sagrado, ele necessita de
características que se identifiquem com a religião. Essas características constituem-se
nas representações. A existência dos espaços de representação acontece com o
controle e legitimação/apropriação desses por parte da instituição dominante. O
domínio se dá por diversos fatores, entre os quais encontram-se os discursos,
simbolismos e ritos, que exercem poder nesses espaços, formando territórios
sagrados.
        A tese principal de Cassirer14 é que toda relação do homem com o mundo é
mediada por um sistema de signos. Esses sistemas de signos não são
necessariamente lingüísticos, podem ser artísticos, matemáticos etc. Mas a linguagem,
enquanto sistema de signos, participa também de várias formas simbólicas, como mito,
religião, ciência. Dessa tese da mediação “signica” entre o sujeito e o objeto
desprendem-se várias outras. No seu trabalho Essência e efeito do conceito de
símbolo, resultado das conferências realizadas em 1921, encontra-se sua definição
mais explícita:
                          Por "forma simbólica" há de entender-se aqui toda a energia do espírito em cuja
                          virtude um conteúdo espiritual de significado é vinculado a um signo sensível
                          concreto e lhe é atribuído interiormente. Neste sentido, a linguagem, o mundo
                          mítico-religioso e a arte se nos apresentam como outras tantas formas
                                                                15
                          simbólicas particulares. (1975, p.163)


10
   Mircea Eliade (1907-1986), romeno naturalizado norte-americano, foi um notável historiador e filósofo das
religiões.
11
   Rudolf Otto (1869-1937) – teólogo protestante alemão que se destacou com a obra Das Heilige (1917).
12
   Michel Foucault (1926-1984), filósofo francês que de forma destacada investigou o tema do
poder.
13
   GIL FILHO, Sylvio Fausto. Espaço sagrado: estudo em geografia da religião. Curitiba:
IBPEX, 2008. 163p.
14
   CASSIRER, E. Linguagem, Mito e Religião. Porto: Rés-Editora, 2000.
15
   CASSIRER, E. Esencia y efecto del concepto de símbolo. México: Fondo de Cultura
Económica, 1975.
8



      Gil Filho ressalta que o principal conceito para o estudo da religião é o sagrado,
pois, sem este, o estudo perde a essência, fica limitado ao físico, ao visível, ou seja,
seu entendimento acaba distorcido. A partir do sagrado como poder, representação,
discurso religioso, identidade e territorialidade. A categoria “espaço sagrado” como
chave para a interpretação da religião em suas diversas expressões no mundo. Ele
enfatiza que o estudo da religião, em sua obra, está        relacionado à análise das
representações religiosas, com foco na religião como forma simbólica.
      Para estudar o sagrado, é de suma importância observar as representações
simbólicas que, muitas vezes, existem pelo exercício do poder. O sagrado de uma
religião é visto e revisto por meio de formas simbólicas. Este pode até vir da psique,
mas vem principalmente de sua constituição histórica, da essência do mundo, de
representações que remetem o homem ao sagrado, à religião. A partir do sagrado de
cada religião, constituem-se a Geografia e a importância das representações e do
poder exercido pela religião.
      A pós-modernidade forma um discurso religioso dinâmico pela acessibilidade à
informação existente. A religião perde seu papel de objeto de análise e começa a ser
vista como forma de conhecimento. Creio, que neste momento o espaço escolar, local
de aprendizagem por excelência, pode levar o ser em formação a uma reflexão do
mundo e de si e perceber como         suas atividades estão voltadas para o universo
simbólico, e que tudo que faz parte desse processo é da ordem simbólica, como
linguagem, mito e religião.
      A escola, neste sentido, tem o dever social de abordar a diversidade religiosa do
espaço sagrado buscando oportunizar aos educandos a leitura crítica dos fatos que
desafiam a vivência respeitosa entre pessoas de diferentes crenças.
      A ação institucional da escola ganha sentido quando se verifica que o discurso
embute no indivíduo transformações identitárias. Por isso, o discurso religioso é parte
integrante (essencial) do sagrado. Para manter o espaço sagrado, ou mesmo o
expandir, as religiões utilizam representações, dentre elas o poder do discurso
religioso, que é dinâmico, tem temporalidade específica e sempre será formulado de
acordo com a vida cotidiana da sociedade receptora.
      Então cabe a escola a formação de uma consciência critica do espaço sagrado
sem esquecer-se do respeito à diversidade religiosa e o respeito. Mas quem é o
responsável por essa mediação e reflexão do espaço sagrado na escola?- O
9



profissional do Ensino Religioso16 que seja capaz de viver a reverência da alteridade,
de considerar que família e comunidade religiosa são espaços privilegiados para a
vivência religiosa e para a opção de fé, e de colocar seu conhecimento e sua
experiência pessoal a serviço da liberdade do educando, subsidiando-o no
entendimento do fenômeno religioso. Seu papel é fazer que compreenda o fenômeno
religioso, contextualizando-o espacial e temporalmente e que configure o fenômeno
religioso através das ciências da religião e que conheça a sistematização do fenômeno
religioso pelas Tradições Religiosas e suas teologias
        Na sala de aula o professor de ensino religioso deve despertar a analise do
papel das Tradições Religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas,
signos, linguagens e manifestações sócio-culturais do espaço sagrado.
       Em suma, que professor de Ensino religioso relacione o sentido da atitude moral,
como conseqüência do espaço sagrado sistematizado pelas Tradições Religiosas e
como expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária das pessoas; e,
Saiba lidar, especialmente em sala de aula, com a diversidade religiosa e a
complexidade do fenômeno religioso na sociedade, sem proselitismo no respeito à
diferença.


                                           BIBLIOGRAFIA
BONJARDIM, Solimar Guindo Messias B.goiano.geogr. Goiânia, v. 31, n. 1, p. 175-179,
jan./jun. 2011.

CASSIRER, E. Linguagem, Mito e Religião. Porto: Rés-Editora, 2000.

CASSIRER, E. Esencia y efecto del concepto de símbolo. México: Fondo de Cultura
Económica, 1975.

GIL FILHO, Sylvio Fausto. Espaço sagrado: estudo em geografia da religião. Curitiba:
IBPEX, 2008. 163p.

ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. São Paulo:
Martins Fontes, 1995.




16
  No intuito de fomentar a formação de professores para o Ensino Religioso no Brasil, o FONAPER, O
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso, com a contribuição de muitos educadores,
pesquisadores e filiados, produziu 12 Cadernos para um Curso de Extensão a Distância denominado
Ensino Religioso: capacitação para um novo milênio. Nossa referencia está baseado no caderno 12:
Ensino Religioso no Cotidiano da Sala da Aula.
10



             RITOS DE PASSAGEM NA ESCOLA É RELIGIOSO OU NÃO?
                                Por Leandro Soares de Sousa


       Quando pensamos a estrutura escolar , logo pensamos em sua distribuição
física, com salas, pátio, biblioteca, recreio, laboratório e cantina; em sua população,
com professores, alunos e funcionários; eventualmente, em questões administrativas,
pedagógicas e políticas, mas dificilmente nos damos conta de um elemento
fundamental que agrega todos esses componentes físicos e abstratos do universo
escolar: o ritual e os ritos de passagem.
       O ritual é parte integrante de qualquer grupo social e estabelece uma série de
ações ou padrões simbólicos que permitem a esse grupo um entendimento e uma
sensação de pertencimento. Por essas razões, é um dos conceitos mais estudados
pela antropologia. Na escola não é diferente. Rituais e ritos de passagem ocupam
fartamente esse ambiente no dia a dia ou em eventos especiais.
       É comum que alguns rituais apareçam ao mesmo tempo que outros percam o
sentido, assim como é normal vermos rituais impostos convivendo com ritos
espontâneos. Muitos deles têm objetivos semelhantes, ainda que possam variar
dependendo do tipo de escola, mas a origem desse tipo de evento é quase sempre
religiosa. Entre os rituais escolares, os mais conhecidos por todos são os de
passagem17; por exemplo, as formaturas que celebram o início de novas fases na vida
do estudante e as festas e formalidades que representam isso.
       Em seu clássico estudo de 1909, Van Gennep 18 aponta que "nos lugares em que
as idades são separadas, e também as ocupações, esta passagem é acompanhada
por atos especiais, que, por exemplo, constituem, para nossos ofícios, a aprendizagem,
e entre os semicivilizados consistem em cerimônias, porque entre eles nenhum hábito
é absolutamente independente do sagrado". A ideia de "semicivilizado" pode ser uma
valiosa afirmação de que qualquer grupo em qualquer nível de desenvolvimento e
organização tem seus ritos.

17
    A expressão "ritos de passagem" foi usada pela primeira vez pelo antropólogo alemão Arnold van
Gennep para descrever dois tipos de ritos: os que acompanham a passagem de um indivíduo de um
status social para outro, no decorrer de sua vida, e os que marcam pontos determinados do tempo.no
sentido moderno, são os que acompanham o nascimento, a consecução do status de adulto, o
casamento, a morte".
18
  VAN GENNEP, A. Os ritos de passagem. Rio de Janeiro, Vozes. Cap. 1 e conclusão, pp. 25- 33, 157-
161. 1977.
11



        Quando observamos esses fenômenos no ambiente educacional, percebemos
rapidamente que os diferentes tipos de formatura, por exemplo, encerram ciclos e
colocam o estudante em um novo patamar. A passagem é normalmente festejada com
a participação das famílias. Mas o ritual de formatura na sua forma complexa serve
para legitimar o direito garantido pelo diploma. Podemos pensar que estes ritos com a
força da prática de relações sociais são importantes para a sustentação e manutenção
de crenças e valores ligados à escola.
        As passagens na escola coincidem com passagens de vida, como, por exemplo,
do aluno que deixa o ensino fundamental para ingressar no médio. Nesse momento já
há, indiretamente, a solenidade de formatura. A outra, que encerra o período na escola,
é a mais marcante, pois significa também o início da vida adulta da pessoa. De acordo
com a professora, por esses motivos, a expectativa de uma extensão maior da vida de
estudante no dias de hoje - escola, faculdade, pós-graduação - não desvaloriza os ritos
de passagem.
        O rito escolar sobre a óptica de seu papel social pode ser visto como um marco
simbólico do que o aluno atingiu em sua carreira escolar, inclusive perante o Estado. O
sociólogo francês Pierre Bourdieu19 propõe que se dê ao rito o nome de seu efeito e de
sua função: então, rito de passagem, rito de consagração, rito de legitimação seriam
vistos como ritos de instituição20.
        Junto da religiosidade presente nos rituais escolares, há outra influência
importante: a pátria. Símbolos nacionais, assim como efemérides, são os motivos mais
comuns nesses ritos. Evidentemente, houve, durante o governo militar, um
fortalecimento desses atos que eram estimulados e, algumas vezes, impostos nas
escolas como parte de um programa de formação de apoio ao governo por meio de
uma identificação coesa e patriótica com o país. No viés ideológico desses rituais "para
uma determinada ordem," nos ritos cívicos, havia o uso do espaço das celebrações
para a manifestação de ideias contrárias ao que era propagado pelo governo. Na
mesma época, rituais escolares, principalmente de formatura, serviram de palco de
denúncia e de resistência ao governo militar. Evidentemente, depois do fim da ditadura,
19
  BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009, p.116
20
   BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. São Paulo: Edusp,
2008. Para ele “é mais apropriado falar em rito de instituição, ou rito de consagração ou de legitimação
do que falar em rito de passagem” nomeado por Arnold Van Gennep. O autor lança alguns
questionamentos à nomenclatura ritos de passagem pois, segundo ele, pode mascarar um dos efeitos
essenciais do rito, qual seja, o de separar e instituir diferenças. De acordo com Bourdieu, através do rito
de instituição um estado de coisas é consagrado; uma ordem estabelecida é sancionada e santificada e
a diferença instituída passa a ser conhecida e reconhecida, passando a existir como tal.
12



alguns desses rituais perderam força, permanecendo apenas os mais relevantes, que
ainda podem ser encontrados nas escolas. Compondo o cenário do ritual, estão
sempre os símbolos nacionais: Bandeira e Hino Nacional - cantado por todos no início
da cerimônia - que dão à solenidade o caráter oficial e legal."
      Devemos também levar em consideração que                    os novos padrões de
comportamento são influentes nos rituais. Nós vivemos em uma sociedade complexa e
aberta em termos culturais. Um bom exemplo disso são as mudanças tecnológicas,
pois a entrada de equipamentos de mídia no interior da escola também vem indicando
mudanças nos rituais de agregação em torno deles. Ou seja, se no passado mais
distante o homem organizava certas tradições em volta da fogueira, hoje isso acontece
em redes de computadores.
      Os rituais são quase todos celebrados por diferentes classes econômicas, em
escolas públicas ou privadas de grandes centros e de regiões mais isoladas. Os rituais
são os mesmos, mas a organização, a linguagem, a estética e o espaço marcam muito
claramente a distinção das classes sociais. Ainda assim, sua realização parece ser
valorizada por qualquer camada da população.
      Os rituais escolares começam bastante cedo dentro das escolas. Logo que a
criança tem suas primeiras vivências no espaço de aula ela participa de rodas para
contar histórias, aprende músicas e hinos e obedece a formalidades que a ajudam a
entender o funcionamento do ambiente e a fortalecer seus laços com colegas e
professores. Desse modo, o contato paulatino com esses momentos faz com que ela
desenvolva uma relação mais natural na hora em que se depara com novos ritos
típicos da escola.


                                        BIBLIOGRAFIA
VAN GENNEP, A. Os ritos de passagem. Rio de Janeiro, Vozes, 1977.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009.
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. São
Paulo: Edusp, 2008

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Como o pesquisador entende o sagrado; hierofania na escola. é possível falar do espaço sagrado na escola; ritos de passagem

  • 1. 1 PÓS-GRADUAÇÃO EM TEOLOGIA Com enfoque em ensino religioso LEANDRO SOARES DE SOUSA COMO O PESQUISADOR DA RELIGIÃO ENTENDE O CONCEITO DE SAGRADO? HIEROFANIA NA ESCOLA RELIGIOSA É POSSIVEL FALAR DO ESPAÇO SAGRADO NA SALA DE AULA? RITOS DE PASSAGEM NA ESCOLA É RELIGIOSO OU NÃO? Trabalho apresentado à prof. Antonio Boeing da disciplina de Fundamentos antropológicos da religião como avaliação e exigência para aprovação. Rio de Janeiro Novembro- 2012
  • 2. 2 COMO O PESQUISADOR DA RELIGIÃO ENTENDE O CONCEITO DE SAGRADO 1? Por Leandro Soares de Sousa Ao consultar o Dicionário Enciclopédico das Religiões2 sobre o termo Sagrado, vemos que trata-se de uma "manifestação de algo de ordem diferente, de uma realidade que não pertence ao nosso mundo natural, profano. As conotações ontológicas para o conceito do sagrado, tem o foco de interesse dos representantes clássicos da Fenomenologia da Religião na experiência humana do numinoso3, ou seja, na reação do sujeito religioso aos "chamados" do sagrado. Metaforicamente falando, pode-se dizer que há uma instância própria no interior do ser humano que reage à esfera divina transcendental analogicamente a uma caixa de ressonância que, devido a seu material, vibra na mesma freqüência de um som produzido próximo a ela. A Fenomenologia clássica da Religião, portanto, parte do axioma antropológico de que o ser humano é equipado com uma faculdade específica que o predispõe para a sensação da presença do sagrado. Esse sensus numinis[13] possibilita a sensação ambígua do sagrado como mysterium tremendum et fascinosum ("mistério tremendo e fascinante"). Em outras palavras, o encontro do individuo com a essência divina nele provoca, simultaneamente, "sentimentos inexplicáveis de horror e espanto, por um lado, e êxtase irresistível e fascinação, por outro. Mircea Eliade chamou de "hierofanias", as auto-revelações do sagrado, que constituem um elemento-chave na história humana, embora o lado irracional do sagrado enfraqueça na medida em que uma religião concreta passa por um processo de racionalização. Em outras palavras: "O elemento racional supera o estágio original do „rudimento‟ e „esquematiza‟ os momentos irracionais por meio da moralização e 1 Frank Usarski (2004) diz que há um uso aleatório da palavra sagrado, que é aplicada à vontade para parafrasear algo que - de uma maneira ou outra - tem (mais ou menos) a ver com religião. Dá-se também o contrário, ou seja, o termo sagrado é intuitivamente associado a um sentido mais específico do que o da palavra religião. Em relação à suposição de sinonímia da noção do sagrado com o termo "religião", seria uma tarefa sem fim listar todas as citações de títulos de livros, dissertações e teses, anúncios de encontros interinstitucionais, aulas magnas, eventos temáticos e ementas de cursos brasileiros apenas nos últimos anos para provar a "naturalidade" com a qual o sagrado é adotado como se fosse um termo técnico inequívoco e imediatamente acessível para leitores, integrantes de bancas, ouvintes em auditórios e alunos em salas de aula. Cf. Revista de Estudos da Religião Nº 4 / 2004 / pp. 73-95 2 Cf. Dicionário Enciclopédico das Religiões, Vol.1, orgs. Por Hugo Schlesinger e Humberto Porto, Petrópolis: Vozes, 1995, p.1265. 3 Otto foi o criador do neologismo alemão numinoso, termo derivado da palavra latina numen que significa aproximadamente : vontade divina", "atuação divina" ou "essência divina" e empregado para designar a forma mais "abstrata"[5] do sagrado, tema central e título da sua "obra magna".
  • 3. 3 cultivo". Embora essa "sublimação" tenha diminuído o vigor do numinoso, ele não deixa de repercutir nas formas posteriores. Pelo contrário: como Rudolf Otto afirma ainda no início da sua obra magna, "o numinoso vive em todas as religiões." O ser humano concretiza sua relação com o sagrado na vida através de símbolos, ritos e expressões estéticas culturalmente pré-estruturadas. Embora as formas diversificadas e variáveis no tempo e espaço constituam o mundo religioso empírico, elas não desviam a atenção de um pesquisador comprometido com o programa da Fenomenologia da Religião4, uma vez que sua tarefa mais "digna" é a de transpassar a multiplicidade dos fatos produzidos nos âmbitos de diferentes religiões para compreender a essência da religião. É preciso que o pesquisador não se perca na complexidade dos fatos, e estude a manifestação religiosa em si mas abstraia do mundo empírico por ativar seu próprio sensus numinis e "treinar" sua empatia com o sagrado para se deixar penetrar emocionalmente pelo numinoso e experienciá-lo. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA Dicionário Enciclopédico das Religiões, Vol.1, orgs. Por Hugo Schlesinger e Humberto Porto, Petrópolis: Vozes, 1995, p.1265. ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. São Paulo: Martins Fontes, 1995. OTTO, R. O Sagrado, Lisboa: Edições 70, 1992 USARSKI .Frank .Revista de Estudos da Religião Nº 4 / 2004 / pp. 73-95. 4 Para alguns críticos da fenomenologia “Clássica” da Religião , do Ponto de vista metodológico, não é suficiente estudar as "meras" manifestações religiosas. Pelo contrário, é preciso que o pesquisador se deixe penetrar emocionalmente pelo numinoso e experienciá-lo.
  • 4. 4 HIEROFANIA NA ESCOLA RELIGIOSA5 Por Leandro Soares de Sousa Esse texto tentará refletir sobre a Hierofanias na constelação escolar de escolas religiosas. As seguintes questões são chaves de interpretação da realidade, especialmente religiosa, na perspectiva antropológica. Sabemos que existem diferentes concepções que irão contribuir na decodificação e compreensão do fenômeno religioso no contexto escolar. No caminho metodológico será o itinerário da antropologia da religião, que está marcado por uma longa investigação sobre as origens da religião. Há um consenso entre os pesquisadores ao afirmar que a pesquisa neste campo foi aos poucos assumindo objetivos mais limitados em torno do papel que a religião exerceu ou exerce, no contexto das outras dimensões da vida associativa. Daqui resultam o casamento epistemológico da análise antropológica e análise sociológica do fenômeno religioso, particularmente, quando a primeira retém como fundamental o estudo das estruturas sociais, especialmente a antropologia social, enquanto a segunda prolonga seus próprios interesses no âmbito dos sistemas simbólicos. Podemos começar nossa reflexão partindo de Mircea Eliade no Tratado de História das Religiões que pretende estudar os fenómenos religiosos. Ele aborda os fenómenos religiosos em si mesmos, como hierofanias (fenómenos religiosos), identificando tipologias e estudando a sua estrutura e significado. Mas o que é hierofanias? O próprio Eliade define que: “ o homem pode tomar conhecimento do sagrado, porque este se manifesta; portanto, esta é caracteristica intrisica, a capacidade de manifestação”. Logo a Hierofania é manifestação do sagrado que pode se manifestar em qualquer objeto do mundo profano, e este assume a condição de sagrado. Penso que a máxima dessa reflexão é pensar que o objeto passa a ser outra coisa e continua a ser ele mesmo. Assim como outros teóricos, Mircea Eliade define o sagrado pela oposição ao profano. Vê o sagrado como uma experiência natural, embora possa aparecer através de coisas humanas e se revelar através da natureza. Rudolf Otto6, um grande historiador das religiões, foi que melhor definiu a essência do sagrado com uma forma de experiência interna sui generis e incomum. 5 Termo cunhado por Mircea Eliade e utilizado nesta reflexão por Leandro Soares para descrever a manifestação religiosa nas escolas religiosas.
  • 5. 5 Ele analisou a manifestação do sagrado como uma experiência única, interna e individual, mas que poderia ser partilhada. O autor defende ainda que o sagrado se manifesta sempre com uma qualidade inteiramente diferente da realidade cotidiana e da experiência natural. A religiosidade de um povo se manifesta não apenas em rituais complexos e mitos dos tempos primordiais, mas também na experiência cotidiana em todas as áreas da vida. A forma de entrar ou sair de uma casa, um simples gesto no momento da caça ou pesca, a dieta alimentar, a direção do olhar ao se aproximar de determinado objeto, o pronunciar discreto de determinadas palavras ao entrar na água e coisas semelhantes podem expressar muito da religiosidade local. Desde que o ser humano se compreendeu como ocupando determinada posição no cosmos, compreendeu uma sacralidade. A partir do momento em que o humano pôde começar a descrever o que o rodeava, as noções e os conceitos que formulou para descrever o que via emanaram de uma interpretação que compreendia o sagrado. Vemos por toda a parte a "tendência do homem para «consagrar» toda a sua vida". Neste sentido, há uma tendência para o sacrifício no homem. Agora, como podemos entender o sagrado no contexto escolar? De primeira mão podemos postular que essa hierofania não é tarefa essencial e especial da disciplina ensino religioso e muito menos do professor de Ensino religioso. Acreditamos que essa hierofania escolar só se efetivará na medida em que forem incorporados pelos professores, não apenas no planejamento formalizado na escola, mas no efetivo trabalho com os educandos. Tendo como ponto de partida as novas demandas para o Ensino Religioso, que foram definidos nas Diretrizes Curriculares dessa disciplina, Cumpre relembrar que o objeto do Ensino Religioso é o estudo das diferentes manifestações do sagrado no coletivo7. Seu objetivo é analisar e compreender o sagrado enquanto o cerne da experiência religiosa do universo cultural, que se contextualiza no cotidiano educacional ou escolar de inter-relação dos diversos sujeitos. Contudo como comenta o antropólogo brasileiro Luiz Gonzaga Mello8, só é possível isolar a religião dentro da cultura como um recurso didático e metodológico apenas. Ou seja, o universo cultural religioso perpassa todas as disciplinas na escola. 6 OTTO, R. O Sagrado, Lisboa: Edições 70, 1992. 7 Em colégios católicos temos também a especificidade da filosofia cristã e espiritualidade dos fundadores. 8 OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O Trabalho do Antropólogo – Olhar, Ouvir, Escrever. In: Revista de Antropologia. Vl. 39, Nº 1. São Paulo: USP, 1996.
  • 6. 6 Podemos ainda falar de uma hierofania que se manifesta na relação educando x educador e não somente na relação educando x conteúdo. Meslin9 (1992) em sua tese central defende que o sagrado só se capta no interior da experiência humana. Daí se segue que a experiência religiosa só se entende desde o concreto das pessoas que a vivenciam no interior de suas religiões. Então podemos aplicar o mesmo principio aos professores de colégios religiosos: A experiência religiosa de Fraternidade, solidariedade, amor.. só se entende desde o concreto dos professores que a vivenciam no interior de suas escolas. Sendo assim, podemos concluir afirmando que o sagrado é uma noção fundamental que parece acompanhar a humanidade desde os primórdios. O estudo do sagrado pode lançar luz sobre o modo de ser do ente que é capaz de se relacionar com entes sagrados - sendo que "sagrado" na constelação escolar significa, ser, existir, "dotado de sentido". Qualquer compreensão profunda do humano deve estar preparada para esclarecer o fenómeno do sagrado. E desta forma, estudar a estrutura e o significado dos fenómenos religiosos na escola deve ajudar a lançar luz sobre o ser do ente que é capaz de se relacionar com o sentido na educação e na escola. BIBLIOGRAFIA ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. São Paulo: Martins Fontes, 1995. MESLIN, Michel. A experiência humana do divino: Fundamentos de uma antropologia religiosa. Petrópolis: Vozes, 1992. OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O Trabalho do Antropólogo – Olhar, Ouvir, Escrever. In: Revista de Antropologia. Vl. 39, Nº 1. São Paulo: USP, 1996. OTTO, R. O Sagrado, Lisboa: Edições 70, 1992. 9 MESLIN, Michel. A experiência humana do divino: Fundamentos de uma antropologia religiosa. Petrópolis: Vozes, 1992.
  • 7. 7 É POSSIVEL FALAR DO ESPAÇO SAGRADO NA SALA DE AULA? Por Leandro soares de Sousa Para desenvolver nossa reflexão sobre o espaço sagrado na escola, iniciamos a construção de um arcabouço teórico, evidenciando a noção de sagrado como categoria interpretativa do fenômeno religioso apoiado nas contribuições de Mircea Eliade 10 ; Rudolf Otto11 e aliando essa construção as facetas do poder e sua legitimação na religião com base nas teorizações de Michel Foucault12 Segundo Gil Filho13 para que um espaço seja sagrado, ele necessita de características que se identifiquem com a religião. Essas características constituem-se nas representações. A existência dos espaços de representação acontece com o controle e legitimação/apropriação desses por parte da instituição dominante. O domínio se dá por diversos fatores, entre os quais encontram-se os discursos, simbolismos e ritos, que exercem poder nesses espaços, formando territórios sagrados. A tese principal de Cassirer14 é que toda relação do homem com o mundo é mediada por um sistema de signos. Esses sistemas de signos não são necessariamente lingüísticos, podem ser artísticos, matemáticos etc. Mas a linguagem, enquanto sistema de signos, participa também de várias formas simbólicas, como mito, religião, ciência. Dessa tese da mediação “signica” entre o sujeito e o objeto desprendem-se várias outras. No seu trabalho Essência e efeito do conceito de símbolo, resultado das conferências realizadas em 1921, encontra-se sua definição mais explícita: Por "forma simbólica" há de entender-se aqui toda a energia do espírito em cuja virtude um conteúdo espiritual de significado é vinculado a um signo sensível concreto e lhe é atribuído interiormente. Neste sentido, a linguagem, o mundo mítico-religioso e a arte se nos apresentam como outras tantas formas 15 simbólicas particulares. (1975, p.163) 10 Mircea Eliade (1907-1986), romeno naturalizado norte-americano, foi um notável historiador e filósofo das religiões. 11 Rudolf Otto (1869-1937) – teólogo protestante alemão que se destacou com a obra Das Heilige (1917). 12 Michel Foucault (1926-1984), filósofo francês que de forma destacada investigou o tema do poder. 13 GIL FILHO, Sylvio Fausto. Espaço sagrado: estudo em geografia da religião. Curitiba: IBPEX, 2008. 163p. 14 CASSIRER, E. Linguagem, Mito e Religião. Porto: Rés-Editora, 2000. 15 CASSIRER, E. Esencia y efecto del concepto de símbolo. México: Fondo de Cultura Económica, 1975.
  • 8. 8 Gil Filho ressalta que o principal conceito para o estudo da religião é o sagrado, pois, sem este, o estudo perde a essência, fica limitado ao físico, ao visível, ou seja, seu entendimento acaba distorcido. A partir do sagrado como poder, representação, discurso religioso, identidade e territorialidade. A categoria “espaço sagrado” como chave para a interpretação da religião em suas diversas expressões no mundo. Ele enfatiza que o estudo da religião, em sua obra, está relacionado à análise das representações religiosas, com foco na religião como forma simbólica. Para estudar o sagrado, é de suma importância observar as representações simbólicas que, muitas vezes, existem pelo exercício do poder. O sagrado de uma religião é visto e revisto por meio de formas simbólicas. Este pode até vir da psique, mas vem principalmente de sua constituição histórica, da essência do mundo, de representações que remetem o homem ao sagrado, à religião. A partir do sagrado de cada religião, constituem-se a Geografia e a importância das representações e do poder exercido pela religião. A pós-modernidade forma um discurso religioso dinâmico pela acessibilidade à informação existente. A religião perde seu papel de objeto de análise e começa a ser vista como forma de conhecimento. Creio, que neste momento o espaço escolar, local de aprendizagem por excelência, pode levar o ser em formação a uma reflexão do mundo e de si e perceber como suas atividades estão voltadas para o universo simbólico, e que tudo que faz parte desse processo é da ordem simbólica, como linguagem, mito e religião. A escola, neste sentido, tem o dever social de abordar a diversidade religiosa do espaço sagrado buscando oportunizar aos educandos a leitura crítica dos fatos que desafiam a vivência respeitosa entre pessoas de diferentes crenças. A ação institucional da escola ganha sentido quando se verifica que o discurso embute no indivíduo transformações identitárias. Por isso, o discurso religioso é parte integrante (essencial) do sagrado. Para manter o espaço sagrado, ou mesmo o expandir, as religiões utilizam representações, dentre elas o poder do discurso religioso, que é dinâmico, tem temporalidade específica e sempre será formulado de acordo com a vida cotidiana da sociedade receptora. Então cabe a escola a formação de uma consciência critica do espaço sagrado sem esquecer-se do respeito à diversidade religiosa e o respeito. Mas quem é o responsável por essa mediação e reflexão do espaço sagrado na escola?- O
  • 9. 9 profissional do Ensino Religioso16 que seja capaz de viver a reverência da alteridade, de considerar que família e comunidade religiosa são espaços privilegiados para a vivência religiosa e para a opção de fé, e de colocar seu conhecimento e sua experiência pessoal a serviço da liberdade do educando, subsidiando-o no entendimento do fenômeno religioso. Seu papel é fazer que compreenda o fenômeno religioso, contextualizando-o espacial e temporalmente e que configure o fenômeno religioso através das ciências da religião e que conheça a sistematização do fenômeno religioso pelas Tradições Religiosas e suas teologias Na sala de aula o professor de ensino religioso deve despertar a analise do papel das Tradições Religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas, signos, linguagens e manifestações sócio-culturais do espaço sagrado. Em suma, que professor de Ensino religioso relacione o sentido da atitude moral, como conseqüência do espaço sagrado sistematizado pelas Tradições Religiosas e como expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária das pessoas; e, Saiba lidar, especialmente em sala de aula, com a diversidade religiosa e a complexidade do fenômeno religioso na sociedade, sem proselitismo no respeito à diferença. BIBLIOGRAFIA BONJARDIM, Solimar Guindo Messias B.goiano.geogr. Goiânia, v. 31, n. 1, p. 175-179, jan./jun. 2011. CASSIRER, E. Linguagem, Mito e Religião. Porto: Rés-Editora, 2000. CASSIRER, E. Esencia y efecto del concepto de símbolo. México: Fondo de Cultura Económica, 1975. GIL FILHO, Sylvio Fausto. Espaço sagrado: estudo em geografia da religião. Curitiba: IBPEX, 2008. 163p. ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. São Paulo: Martins Fontes, 1995. 16 No intuito de fomentar a formação de professores para o Ensino Religioso no Brasil, o FONAPER, O Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso, com a contribuição de muitos educadores, pesquisadores e filiados, produziu 12 Cadernos para um Curso de Extensão a Distância denominado Ensino Religioso: capacitação para um novo milênio. Nossa referencia está baseado no caderno 12: Ensino Religioso no Cotidiano da Sala da Aula.
  • 10. 10 RITOS DE PASSAGEM NA ESCOLA É RELIGIOSO OU NÃO? Por Leandro Soares de Sousa Quando pensamos a estrutura escolar , logo pensamos em sua distribuição física, com salas, pátio, biblioteca, recreio, laboratório e cantina; em sua população, com professores, alunos e funcionários; eventualmente, em questões administrativas, pedagógicas e políticas, mas dificilmente nos damos conta de um elemento fundamental que agrega todos esses componentes físicos e abstratos do universo escolar: o ritual e os ritos de passagem. O ritual é parte integrante de qualquer grupo social e estabelece uma série de ações ou padrões simbólicos que permitem a esse grupo um entendimento e uma sensação de pertencimento. Por essas razões, é um dos conceitos mais estudados pela antropologia. Na escola não é diferente. Rituais e ritos de passagem ocupam fartamente esse ambiente no dia a dia ou em eventos especiais. É comum que alguns rituais apareçam ao mesmo tempo que outros percam o sentido, assim como é normal vermos rituais impostos convivendo com ritos espontâneos. Muitos deles têm objetivos semelhantes, ainda que possam variar dependendo do tipo de escola, mas a origem desse tipo de evento é quase sempre religiosa. Entre os rituais escolares, os mais conhecidos por todos são os de passagem17; por exemplo, as formaturas que celebram o início de novas fases na vida do estudante e as festas e formalidades que representam isso. Em seu clássico estudo de 1909, Van Gennep 18 aponta que "nos lugares em que as idades são separadas, e também as ocupações, esta passagem é acompanhada por atos especiais, que, por exemplo, constituem, para nossos ofícios, a aprendizagem, e entre os semicivilizados consistem em cerimônias, porque entre eles nenhum hábito é absolutamente independente do sagrado". A ideia de "semicivilizado" pode ser uma valiosa afirmação de que qualquer grupo em qualquer nível de desenvolvimento e organização tem seus ritos. 17 A expressão "ritos de passagem" foi usada pela primeira vez pelo antropólogo alemão Arnold van Gennep para descrever dois tipos de ritos: os que acompanham a passagem de um indivíduo de um status social para outro, no decorrer de sua vida, e os que marcam pontos determinados do tempo.no sentido moderno, são os que acompanham o nascimento, a consecução do status de adulto, o casamento, a morte". 18 VAN GENNEP, A. Os ritos de passagem. Rio de Janeiro, Vozes. Cap. 1 e conclusão, pp. 25- 33, 157- 161. 1977.
  • 11. 11 Quando observamos esses fenômenos no ambiente educacional, percebemos rapidamente que os diferentes tipos de formatura, por exemplo, encerram ciclos e colocam o estudante em um novo patamar. A passagem é normalmente festejada com a participação das famílias. Mas o ritual de formatura na sua forma complexa serve para legitimar o direito garantido pelo diploma. Podemos pensar que estes ritos com a força da prática de relações sociais são importantes para a sustentação e manutenção de crenças e valores ligados à escola. As passagens na escola coincidem com passagens de vida, como, por exemplo, do aluno que deixa o ensino fundamental para ingressar no médio. Nesse momento já há, indiretamente, a solenidade de formatura. A outra, que encerra o período na escola, é a mais marcante, pois significa também o início da vida adulta da pessoa. De acordo com a professora, por esses motivos, a expectativa de uma extensão maior da vida de estudante no dias de hoje - escola, faculdade, pós-graduação - não desvaloriza os ritos de passagem. O rito escolar sobre a óptica de seu papel social pode ser visto como um marco simbólico do que o aluno atingiu em sua carreira escolar, inclusive perante o Estado. O sociólogo francês Pierre Bourdieu19 propõe que se dê ao rito o nome de seu efeito e de sua função: então, rito de passagem, rito de consagração, rito de legitimação seriam vistos como ritos de instituição20. Junto da religiosidade presente nos rituais escolares, há outra influência importante: a pátria. Símbolos nacionais, assim como efemérides, são os motivos mais comuns nesses ritos. Evidentemente, houve, durante o governo militar, um fortalecimento desses atos que eram estimulados e, algumas vezes, impostos nas escolas como parte de um programa de formação de apoio ao governo por meio de uma identificação coesa e patriótica com o país. No viés ideológico desses rituais "para uma determinada ordem," nos ritos cívicos, havia o uso do espaço das celebrações para a manifestação de ideias contrárias ao que era propagado pelo governo. Na mesma época, rituais escolares, principalmente de formatura, serviram de palco de denúncia e de resistência ao governo militar. Evidentemente, depois do fim da ditadura, 19 BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009, p.116 20 BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. São Paulo: Edusp, 2008. Para ele “é mais apropriado falar em rito de instituição, ou rito de consagração ou de legitimação do que falar em rito de passagem” nomeado por Arnold Van Gennep. O autor lança alguns questionamentos à nomenclatura ritos de passagem pois, segundo ele, pode mascarar um dos efeitos essenciais do rito, qual seja, o de separar e instituir diferenças. De acordo com Bourdieu, através do rito de instituição um estado de coisas é consagrado; uma ordem estabelecida é sancionada e santificada e a diferença instituída passa a ser conhecida e reconhecida, passando a existir como tal.
  • 12. 12 alguns desses rituais perderam força, permanecendo apenas os mais relevantes, que ainda podem ser encontrados nas escolas. Compondo o cenário do ritual, estão sempre os símbolos nacionais: Bandeira e Hino Nacional - cantado por todos no início da cerimônia - que dão à solenidade o caráter oficial e legal." Devemos também levar em consideração que os novos padrões de comportamento são influentes nos rituais. Nós vivemos em uma sociedade complexa e aberta em termos culturais. Um bom exemplo disso são as mudanças tecnológicas, pois a entrada de equipamentos de mídia no interior da escola também vem indicando mudanças nos rituais de agregação em torno deles. Ou seja, se no passado mais distante o homem organizava certas tradições em volta da fogueira, hoje isso acontece em redes de computadores. Os rituais são quase todos celebrados por diferentes classes econômicas, em escolas públicas ou privadas de grandes centros e de regiões mais isoladas. Os rituais são os mesmos, mas a organização, a linguagem, a estética e o espaço marcam muito claramente a distinção das classes sociais. Ainda assim, sua realização parece ser valorizada por qualquer camada da população. Os rituais escolares começam bastante cedo dentro das escolas. Logo que a criança tem suas primeiras vivências no espaço de aula ela participa de rodas para contar histórias, aprende músicas e hinos e obedece a formalidades que a ajudam a entender o funcionamento do ambiente e a fortalecer seus laços com colegas e professores. Desse modo, o contato paulatino com esses momentos faz com que ela desenvolva uma relação mais natural na hora em que se depara com novos ritos típicos da escola. BIBLIOGRAFIA VAN GENNEP, A. Os ritos de passagem. Rio de Janeiro, Vozes, 1977. BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. São Paulo: Edusp, 2008