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Das 21 horas da segunda-feira, 19 de maio de 1986, aos dez minutos do dia seguinte, os
radares da Aeronáutica registraram a presença de um objeto luminoso não-identificado nos céus
do eixo Rio - São Paulo. O objeto se deslocava a velocidade supersônica e fazia manobras
absolutamente impossíveis para um avião. Tão logo foi percebido, seis caças da FAB
levantaram vôo para observar o estranho fenômeno.
Os pilotos disseram depois ter visto focos de luz irradiados nas cores verde e vermelha. Eles não
fizeram contato com o objeto nem conseguiram explicá-lo. De uma coisa tiveram certeza: não
se tratava de qualquer tipo de aeronave conhecida. Mais tarde surgiram as costumeiras
hipóteses: era o planeta Vênus, era um satélite reentrando na atmosfera, era uma sonda. E, como
sempre, houve quem jurasse: os sinais luminosos pertenciam a uma nave espacial de outro
planeta, um disco voador.
Desde 1947, quando o piloto norte-americano Kenneth Arnoldlançou a expressão disco voador,
essas naves têm freqüentado, senão o espaço real, pelo menos as histórias contadas por
aviadores, funcionários de aeroportos e os mais variados tipos de pessoas. Tanto que o
misterioso objeto visto nos céus do Brasil em 1986 não foi um caso único no país. No dia 8 de
fevereiro de 1982, uma esquadrilha da FAB tentou, sem sucesso, descobrir que objeto
perseguiu um Boeing da VASP durante boa parte da viagem de Fortaleza ao Rio. A
aparição foi também testemunhada pelas tripulações de dois outros jatos.
Episódios como esses entram para o alentado anedotário dos OVNIs, os objetos voadores não-
identificados, que nesses últimos quarenta anos conquistaram um lugar seguro na imaginação
popular, até porque tem mais graça supor que existe vida inteligente em outros planetas e que
uma luz diferente no céu é uma nave cheia de marcianos do que um reles fenômeno
meteorológico.
Por outro lado, como nem sempre as pessoas tomam conhecimento das explicações afinal
encontradas para uma aparição misteriosa, sobrevive no ar a atraente idéia de que um OVNI é
produto de alguma civilização extraterrestre. As histórias em quadrinhos, a literatura e o cinema
só fizeram reforçar essa crença.
Segundo os ufologistas - palavra que veio do inglês UFO (Unidentified Flying Object) - já
foram registrados 200 mil casos de objetos voadores não-identificados no mundo todo, dos
quais 10 mil apenas no Brasil. Eles próprios, no entanto, tratam de separar bem as coisas.
"Cerca de 90 por cento dos casos não são fenômenos ufológicos, mas fraudes ou erros de
interpretação", calcula o engenheiro Claudeir Covo, fundador do Centro de Estudos e Pesquisas
Ufológica de São Paulo, um dos vários grupos formais e informais de interessados no assunto
existentes no país. Claudeir, um ufologista com os pés no chão, baseia suas contas nas
constatações atribuídas ao ATIC (Air Technical Intelligence Center), o serviço de contra-
espionagem aérea dos Estados Unidos encarregado de localizar e identificar qualquer aparelho
que sobrevoe o país.
O Projeto Blue Book, ou Livro Azul, do ATIC, mostrou que quase todos os 13 mil casos de
OVNIs relatados em vinte anos de estudo são na verdade fenômenos astronômicos e
meteorológicos. Entre os astronômicos estão o brilho de planetas, meteoros, estrelas cadentes.
Entre os meteorológicos estão os casos de auroras, fogos-de-santelmo, descargas elétricas em
tempestades. Mais prosaicamente ainda, há pessoas que enxergam OVNIs onde só há aviões,
balões, reflexos de holofotes, gases poluidores, satélites artificiais, mísseis - ou a combinação de
qualquer um desses elementos com fenômenos da natureza. Radares, por exemplo, podem ser
enganados por interferência eletrônica, reflexos de nuvens ionizadas, chuvas e diferenças de
temperatura.
Outra explicação que não pode ser desconsiderada tem a ver com a mente humana. Num estudo
de 1958, o psicanalista suíço Carl Jung (1875-1961) afirmou que os discos voadores seriam
alucinações provocadas por ansiedades coletivas que ocorrem em períodos de crise ou tensão
internacional. Seriam portanto uma versão moderna das visões de santos e demônios tão
comuns na Idade Média. Segundo essa interpretação, o homem da era espacial espera ser salvo
de seus problemas cotidianos não por anjos, como antigamente, mas por seres extraterrestres.
Talvez por isso, muitos ufologistas acreditam que ETs estiveram presentes quando o profeta
Elias, como conta a Bíblia, subiu aos céus numa carruagem de fogo; ou quando os egípcios
veneravam o Sol, representado como um disco de ouro com asas; ou, ainda, quando os persas
acrescentaram a essa representação uma cauda e duas patas que, com alguma boa vontade,
podem ser comparadas a trem de aterrissagem. Os ufologistas também encontram ETs nos
livros da mitologia hindu que falam de discos destruidores, dotados de raios de fogo.
Com tudo isso, compreende-se por que ver um OVNI é fácil - o difícil é fazer com que alguém
acredite. No Brasil, os únicos que levam tais visões a sério são os grupos de estudos
ufológicos. "De cada dez pessoas que fazem parte desses grupos, treze são piradas", brinca o
engenheiro eletrônico Ricardo Varela, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), referindo-se à
salada de místicos, curiosos e visionários de todo tipo que se abrigam nas sociedades ufológicas.
O engenheiro Varela, que trabalha no lançamento de balões à estratosfera, até que se interessa
pelos OVNIs - uma exceção no meio científico. Pois, sob o argumento de que não trata de fatos
comprovados, a discussão do assunto passa ao largo das universidades e instituições de
pesquisa.
Os cientistas reagem com impaciência, até mesmo com desagrado, às sugestões de estudos
ufológicos. "Qualquer coisa que se disser sobre o assunto é puro chute ou crença pessoal", afirma
o astrofísico Roberto Boscko, da USP.
Ele acredita que boa parte dos astrônomos pensa em disco voador "como sinônimo de
pilantragem". Mas por que os OVNIs despertam uma reação tão violenta? Afinal, ver um deles
não significa automaticamente entrar de sócio no fã-clube dos discos voadores - indica apenas
alguma coisa incompreendida. E numa época em que satélites humanos se afastam dos limites
do sistema solar com mensagens do planeta Terra, seria natural que a ciência estudasse a
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discos, se for o caso.

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  • 2. O Projeto Blue Book, ou Livro Azul, do ATIC, mostrou que quase todos os 13 mil casos de OVNIs relatados em vinte anos de estudo são na verdade fenômenos astronômicos e meteorológicos. Entre os astronômicos estão o brilho de planetas, meteoros, estrelas cadentes. Entre os meteorológicos estão os casos de auroras, fogos-de-santelmo, descargas elétricas em tempestades. Mais prosaicamente ainda, há pessoas que enxergam OVNIs onde só há aviões, balões, reflexos de holofotes, gases poluidores, satélites artificiais, mísseis - ou a combinação de qualquer um desses elementos com fenômenos da natureza. Radares, por exemplo, podem ser enganados por interferência eletrônica, reflexos de nuvens ionizadas, chuvas e diferenças de temperatura. Outra explicação que não pode ser desconsiderada tem a ver com a mente humana. Num estudo de 1958, o psicanalista suíço Carl Jung (1875-1961) afirmou que os discos voadores seriam alucinações provocadas por ansiedades coletivas que ocorrem em períodos de crise ou tensão internacional. Seriam portanto uma versão moderna das visões de santos e demônios tão comuns na Idade Média. Segundo essa interpretação, o homem da era espacial espera ser salvo de seus problemas cotidianos não por anjos, como antigamente, mas por seres extraterrestres. Talvez por isso, muitos ufologistas acreditam que ETs estiveram presentes quando o profeta Elias, como conta a Bíblia, subiu aos céus numa carruagem de fogo; ou quando os egípcios veneravam o Sol, representado como um disco de ouro com asas; ou, ainda, quando os persas acrescentaram a essa representação uma cauda e duas patas que, com alguma boa vontade, podem ser comparadas a trem de aterrissagem. Os ufologistas também encontram ETs nos livros da mitologia hindu que falam de discos destruidores, dotados de raios de fogo.
  • 3. Com tudo isso, compreende-se por que ver um OVNI é fácil - o difícil é fazer com que alguém acredite. No Brasil, os únicos que levam tais visões a sério são os grupos de estudos ufológicos. "De cada dez pessoas que fazem parte desses grupos, treze são piradas", brinca o engenheiro eletrônico Ricardo Varela, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), referindo-se à salada de místicos, curiosos e visionários de todo tipo que se abrigam nas sociedades ufológicas. O engenheiro Varela, que trabalha no lançamento de balões à estratosfera, até que se interessa pelos OVNIs - uma exceção no meio científico. Pois, sob o argumento de que não trata de fatos comprovados, a discussão do assunto passa ao largo das universidades e instituições de pesquisa. Os cientistas reagem com impaciência, até mesmo com desagrado, às sugestões de estudos ufológicos. "Qualquer coisa que se disser sobre o assunto é puro chute ou crença pessoal", afirma o astrofísico Roberto Boscko, da USP. Ele acredita que boa parte dos astrônomos pensa em disco voador "como sinônimo de pilantragem". Mas por que os OVNIs despertam uma reação tão violenta? Afinal, ver um deles não significa automaticamente entrar de sócio no fã-clube dos discos voadores - indica apenas alguma coisa incompreendida. E numa época em que satélites humanos se afastam dos limites do sistema solar com mensagens do planeta Terra, seria natural que a ciência estudasse a possibilidade de algo parecido "do lado de lá" - até para derrubar, uma a uma as histórias de discos, se for o caso.