O documento descreve a metodologia de trabalho de José Mourinho, incluindo sua abordagem à periodização tática, com foco na progressão, distribuição de conteúdos, intensidade, volume, exercícios, modelo de jogo, liderança e outros aspectos.
Palestra de Abertura - Pós Graduação (Estácio de Sá)
Metodologia de Trabalho - José Mourinho
1. Metodologia de trabalho de José Mourinho - Periodização Tática
Segundo o livro: “Por que tantas vitórias ?”
Lógicas Processuais
Progressão
Ocorre em três níveis:
- ao longo do ano;
- ao longo da semana (em função do jogo anterior e do jogo seguinte);
- ao longo de cada unidade de treino.
Distribuição de
Conteúdos
Norteadores das unidades de treino:
- princípios da progressão complexa;
- princípio da alternância horizontal em especificidade.
O Treino
Fatores a considerar:
- jogar com espaço de jogo;
- a duração;
- a complexidade dos comportamentos a vivenciar;
- só é bom quando consegue operacionalizar o que é a idéia-chave;
- encontrar exercícios que induzam a equipe a fazer o que faz no jogo;
- elevar a performance coletiva.
Intensidade
- concentração decisional;
- de concentração;
- estar no jogo é estar a pensar e tomar decisões;
- exige treino e aprendizagem estar concentrado o máximo de tempo
possível no jogo.
Volume
- volume de intensidades máximas relativas;
- volume de princípios de jogo, semanalmente semelhante, é o núcleo
duro do jogar, expressando seu crescimento qualitativo;
- se corresponde à densidade de intensidades máximas relativas,
representa a vivenciação hierarquizada dos princípios de jogo.
Sustentação da
Metodologia
- construção de uma forma de jogar;
- invenção e operacionalização de um modelo de jogo;
- coerência;
- integração (interação) de todos os fatores (dimensões) alicerçados na
organização e preparação tática;
- o todo deve passar a ser superior a soma das partes.
Filosofia de
trabalho
- o clube deve possuir um modelo de jogo e um modelo de treino
perfeitamente definidos;
- uma coisa são princípios e outra é o sistema;
- deve haver uma cultura tática dentro do clube.
Recuperação
Fatores a considerar:
- mental-emocional;
- físico;
- recuperar em especificidade;
- a matriz do recuperar relacionada a matriz do treinar;
- deve ocorrer ao nível das três estruturas: locomotora, orgânica e
perceptivo-cinética;
- pode ocorrer onde deverias estar o esforçar: no jogo.
Descansar com
bola
- bom jogo posicional;
- ocupação racional do espaço de jogo;
- posse de bola sem profundidade;
- a posse com o intuito de não prolongar os desgaste emocional e físico.
Fadiga
Caracterizações da fadiga:
- central (recuperação mais lenta, maiores preocupações);
- periférica.
Treino -
dominante
física
Tipo de treino / dia da semana:
- quarta-feira (elevada tensão específica - descontínua): boa velocidade
de contração, curta duração e tensão elevada (grande densidade de
contrações excêntricas);
- quinta-feira (dinâmica específica – menos descontínua): aumento da
2. duração da contração e diminuição da velocidade e tensão da contração;
- sexta-feira (elevada velocidade de contração – média descontínua):
elevada velocidade de contração, curta duração e não máxima tensão.
Menor desgaste mental-emocional e físico das três unidades.
Treino –
dominante
tática
- quarta-feira (elevada tensão específica - descontínuo): subprincípios,
subprincípios dos subprincípios (menor complexidade, subdinâmicas do
jogar);
- quinta-feira (dinâmica específica – menos descontínuo): grande
princípios do modelo de jogo – organização ofensiva, defensiva e
transições – e a articulação entre eles, mais a preparação estratégica
para o próximo adversário;
- sexta-feira (elevada velocidade de contração – média descontínua):
subprincípios, subprincípios dos subprincípios, preservação do desgaste,
incide sobre a velocidade de execução do desempenho e caracteriza-se
pela unidade de maior ênfase à parte estratégica do adversário.
Hábitos
- saber fazer que se adquire na ação;
- economia neurobiológica;
- treinar: aprendizagem pela repetição.
Treinando
concentração
- através de exercícios que a exijam;
- exercícios que obriguem a pensar, se comunicar, com complexidade
crescente, com concentração permanente;
- não podem ser exercícios demasiadamente fáceis;
- quando os jogadores resolvem os problemas de determinado exercício
deve-se buscar novos exercícios.
Trabalho
semanal
- semanas de trabalho-padrão que obedecem a um conjunto de princípios
metodológicos;
- diferenças entre a semana com um jogo e com dois jogos.
Padrões Táticos
- Técnicos
semanais
- do geral para o particular;
- gerais: aspectos imutáveis no meu modelo de jogo, os grandes
princípios de jogo e os principais subprincípios que lhes dão corpo
(treinados todas as semanas)
- particulares: detalhe tático posicional tendo em conta o lado
estratégico;
- em semanas com dois jogos os grandes princípios são treinados no dia
anterior ao jogo, quase sem competitividade com trabalho, teórico no
gabinete;
- no sábado recuperação ativa num contexto de introdução a competição.
Exercícios
- aproximar o acontecer no exercício a configuração do acontecer em
jogo que se pretende;
- principio metodológico das propensões;
- densidade;
- é uma determinada configuração geométrica e simbólica que condiciona
/ fomenta um determinado acontecer relacionado contra o todo que se
deseja;
- tem que conter o plano do aleatório do contingente do imprevisível;
- a estrutura acontecimental do treinar tem que refletir a natureza da
estrutura acontecimental do jogar;
- vivenciar dinâmicas;
- mecanismo não mecânico;
- automatismos libertadores.
Adversários
- muitas vezes apresentam um automatismo mecânico ao invés de uma
dinâmica;
- previsão dos comportamentos do adversário;
- posicionar em algumas zonas mais importantes dos campos em função
dos pontos fortes e fracos (detalhes posicionais);
- para conhecê-los são necessários quatro ou cinco jogos, movimentos-
padrão, dinâmicas da equipe (André Vilas-Boas).
Descoberta
guiada
- é preciso provar-lhes que estamos certos;
- jogadores vão descobrindo as coisas a partir de pistas que lhes vou
dando;
- construo situações de treino que os leve para um determinado
caminho;
- processo que visa a aquisição de um saber fazer sobrecondicionado ao
saber sobre esse saber fazer;
3. - objetiva fazer com que os jogadores percebam e acreditem no modelo
de jogo;
- instalação de um sistema de crenças.
Modelo de jogo
- passe e qualidade são fundamentais;
- assumir os jogos;
- para assumir o jogo é necessário ter a bola e usufruir dela;
- não se descaracterizar perante os adversários;
- mais importante é a própria equipe;
- mudar o sistema como alternativa de jogo, não pelo adversário;
- modelo de jogo perfeitamente definido, não fugir dele e acreditar nele;
- o mais forte que uma equipe pode ter é jogar como equipe;
- jogar como equipe é ter organização, ter determinadas regularidades
que fazem com que no quatro momentos do jogo, todos os jogadores
pensem em função da mesma coisa ao mesmo tempo;
- não dissociação entre defesa e ataque e suas respectivas organizações;
- em todos os jogos a equipe é preparada para ganhar;
- ênfase igual nas organizações ofensivas e defensivas;
- todos os jogadores tem funções ofensivas e defensivas, incluindo o
goleiro;
- jogo e treino preparados de forma equilibrada;
- a equipe é um todo e seu funcionamento assim o é;
- todos os jogadores têm que participar dos quatro momentos do jogo;
- a coisa mais importante no futebol moderno além de marcar gols é ter
a bola;
- alta circulação de bola e, para isso, bom jogo posicional, isto é, os
jogadores têm que saber que em determinada posição há um jogador,
que sob o ponto de vista geométrico há algo construído no terreno de
jogo que os permite antecipar a ação;
- campo grande a atacar, linhas juntas a defender;
- reação forte à perda da bola;
- uma estrutura fixa em termos posicionais e uma estrutura móvel,
jogadores que tem posições fixas em campo e outros que, pela sua
dinâmica tem mobilidade, sempre havendo um equilíbrio posicional;
- ter sempre a ambição de ganhar os jogos, sem perder a tranqüilidade e
equilíbrio posicional;
- os jogadores devem manter uma linha de jogo ofensiva, ambiciosa,
com nítida intenção de ganhar, sem nunca perder o controle do espaço, a
sua tranqüilidade e a comunicação entre eles, o que é fundamental;
- defender bem e ter qualidade individual são aspectos cruciais;
- bom posicionamento defensivo enquanto equipe, formando um bloco
coeso que possa jogar com as linhas muito juntas;
- muito trabalho de saída depois da recuperação da posse de bola;
- ter a capacidade de jogar de uma forma a defender e, depois em posse
de bola, modificar aquilo que é fundamental: a recuperação da posições
em campo, tirar a bola da zona de pressão, etc.
- tem como característica o “pressing alto zonal”, que é um meio para
recuperar a bola e só faz sentido se depois a equipe souber fazer uso
dessa posse;
- quer que sua equipe controle o jogo;
- jogue mais em ataque continuado;
- defender bem sem utilizar o princípio da aglomeração;
- defender bem é defender pouco, durante pouco tempo, é ter a bola o
maior tempo possível, é estar a maior parte do tempo com a iniciativa do
jogo, não tendo necessidade de estar em ações defensivas;
- defender bem é defender “pouco”, em termos de quantidade de tempo,
mesclado com o momento da perda da posse de bola;
- preferência por defender longe do próprio gol, porque quando recuperar
a bola estará mais próximo do gol adversário que é o objetivo do jogo;
- no alto nível: homem-a-homem não existe, zonal existe, mas não
convence e a zona pressionante é o futebol de hoje e o futebol do
amanhã;
- não há central de marcação, defende zonalmente com uma linha de
quatro que bascula em função da bola;
- não existem duas zonas pressionantes iguais;
4. - a do Milan com três linhas pressiona em largura enquanto a de
Mourinho (Porto, Chelsea) com seis linhas (4-4-2 losango) pressiona em
profundidade;
- o posicionamento da pressão é em função do adversário e a equipe
sabe como comportar-se contra determinado sistema;
- salvo raras exceções a equipe não muda de sistema em posse de bola,
independente do adversário;
- sem bola, a equipe tem a capacidade de ler o sistema adversário e
adaptar sua pressão ao posicionamento deste;
- não há o encaixe ao adversário;
- não se joga em função dos homens, mas em função dos espaços;
- bloco baixo é facilmente interpretável, sem a necessidade de grande
liderança ou feedback, bastando definir a referência visual do bloco e
nada mais;
- a liderança, dentro do processo defensivo, tem a ver sim com a
basculação, com a zona e com a capacidade que alguns jogadores têm,
pela sua posição em campo ou pela sua capacidade de análise do jogo,
de orientar suas ações coletivas;
- há jogadores fundamentais na dinâmica defensiva;
- utilizar o bloco baixo, linhas juntas e tranqüilizar o jogo quando estiver
difícil jogar numa zona pressionante ou fazer uma transição muito forte,
por fadiga, por determinado ascendente do adversário ou porque o
adversário tem uma determinada dinâmica ofensiva que está a criar
algum tipo de problema;
- sob o ponto de vista da eficácia é muito mais fácil jogar bloco baixo do
que bloco alto;
- para uma equipe que quer jogar em ataque continuado, que quer ter a
posse de bola, a iniciativa do jogo, tem que ser uma equipe sempre bem
posicionada, e isso só se consegue defendendo zonalmente;
- a forma de jogar da equipe é extremamente desgastante;
- quando não tem a bola, inicia logo as ações com vista a sua
recuperação, mesmo que seja necessário ir à área do adversário;
- após recuperada a bola, tem que decidir se tem condições de sucesso
para de imediato atacar e assim continuar o desgaste ou, não tendo
condições, optar por descansar com bola circulando-a;
- a transição defesa-ataque tem que ter uma relação íntima com a forma
ofensiva de jogar;
- quando uma equipe pressiona alto, precisa descansar durante o jogo;
Liderança
- gestão das derrotas igual à das vitórias;
- manter o grupo sob controle através da ampliação do modelo de jogo,
torná-lo mais rigoroso;
- utilizar o 4-4-2 (mais complexo) em complemento ao 4-3-3 (menos
complexo) como estratégia da evolução do modelo de jogo;
- utilizar exercícios mais complexos, que diminuam a eficácia dos
jogadores no treino como estratégia de controle de concentração;
- os jogadores não adoram o treinador, adoram é trabalhar com ele.
Leandro Zago – 22/03/2008