O documento discute os elementos que compõem a cultura corporativa de uma organização, incluindo a importância da cultura, mitos organizacionais, símbolos e contracultura. A cultura corporativa une os indivíduos à organização e pode ser definida por princípios e valores claros, mas flexíveis o suficiente para acompanhar a evolução da empresa.
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Organização Contemporânea 7
1. Organização Contemporânea - Aula 7
Armando Levy
armando@epress.com.br
Elementos da cultura corporativa
1. A cultura é importante?
Já é possível perceber que a cultura corporativa insere o indivíduo na organização. Sem
culturas corporativas definidas, como as pessoas fariam para saber como agir, como se
vestir, que horas chegar, que tipo de idéias e projetos são valirzados?
Culturas corporativas, como afirmam Kotter e Haskett, são, sem sombra de dúvida, o maior
patrimônio de uma organização. Fusões que ignoram o choque cultural decorrente da
confrontação de culturas diversas podem encontrar o fim sem entenderem ao certo o que
aconteceu. Lembram-se da Autolatina? Volkswagen e Ford tentaram fundir suas operações
na América Latina, mas a fusão fracassou. O que aconteceu?
A cultura corporativa de uma empresa não pode ser descrita apenas através de feeling. Era
reúne elementos claros, visíveis, que podem ser estudados, analisados e revalorizados, se
for o caso.
Um estudo de Kotter e Haskett reunindo 202 grandes empresas americanas evidenciou que
as empresas melhores sucedidas tinha culturas que podiam ser definidas como densas, ou
seja, tinham princípios claros e definidos, mas eram flexíveis o bastante para assimilar
valores importantes necessários à evolução e sobrevivência.
Segundo o estudo desses dois consultores, as organizações com alto desempenho, com
culturas fortes, porém flexíveis, conseguiam:
• Partilhar os mesmos valores e métodos de fazer negócios
• Sujeitar pessoas de diferentes níveis hierárquicos aos mesmos padrões
• Alinhas metas, mesmo em ambientes pluralistas
• Criar níveis incomuns de motivação e lealdade
• Fornecer estrutura e controle sem necessidade de mais burocracia
• Permitir transições de poder sem sobressaltos
2. Inflexível & Flexível
Kotter e Haskett chegam a afirmar que as empresas de sucesso precisam administrar com
habilidade um conceito que parece contraditório:
• Ser inflexível em relação a valores centrais da cultura
o Gilette e a cultura do descartável
o Motorola e a portabilidade
o Intel e HP e a inovação
• Ser flexível em relação a todos os outros valores
o Participação das pessoas nos processos de decisão
1
2. o Estar aberto ao novo
3. Organizações Visionárias
Collins e Porras, dois consultores americanos, amparados pela Universidade de Stanford,
realizam uma pesquisa com várias empresas fundadas antes de 1950 para entender o que
fez com que elas sobrevivessem por tanto tempo, superando suas bem-sucedidas
concorrentes.
Os critérios para a seleção destas empresas foram:
• Ser a instituição líder no seu setor
• Deter a admiração e o reconhecimento do meio empresarial
• Ter imprimido marcas indeléveis no mercado
• Ter sido fundada há tempo considerável (antes de 1950) e vivenciado várias
gerações de executivos
As empresas apontadas como visionárias foram:
• 3M
• American Express
• Boeing
• Citicorp
• Ford
• General Electric
• Hewlett-Packard
• IBM
• Johnson & Johnson
• Marriott
• Merck
• Motorola
• Nordstrom
• Philip Morris
• Procter & Gamble
• Sony
• Wal-Mart
• Walt Disney
De acordo com a pesquisa de Collins e Porras, as práticas que faziam estas empresas
visionárias tinham dois focos claros:
Preservar o núcleo de cultura
Ótimos locais de trabalho
Acesso a escalões superiores para os que conheçam e pratiquem a ideologia
central da empresa
Estimular o progresso
Melhoria contínua
2
3. Altos níveis de ação e experimentação que produzam resultados inesperados
Metas audaciosas e até arriscadas
4. Como gerir a cultura organizacional
O trabalho de Collins e Porras levou o mundo corporativo a se questionar se era possível
gerenciar a cultura corporativa a ponto de alcançar situações de alto desempenho.
Vários pesquisadores e estudiosos se debruçaram sobre o tema. Embora o debate ainda seja
intenso, duas conclusões já podem ser anotadas:
• Mudanças radicais de culturas corporativa, que resultem em mudança da força
motriz organizacional ou do próprio self da organização, são altamente improváveis
e podem levar à extinção da empresa
• Mudanças organizacionais estruturadas, planejadas e conduzidas com o apoio
integral da alta direção da empresa são possíveis e podem obter êxito, mas exigem
tempo, investimento, treinamento e comprometimento
5. O que é cultura organizacional?
Para gerir a cultura organizacional é preciso, antes, entender quais são os elementos que a
compõe.
Silvio Luiz Johann assinala:
5.1 Cultura Organizacional
“Conjunto de pressupostos básicos que determinado grupo tem inventado ou
desenvolvido no processo de aprendizagem para lidar com problemas de adaptação
externa e inegração interna. É a maneira correta para perceber, pensar, sentir e agir
em relação a situações organizacionais. O modo como as coisas são realizadas num
determinado ambiente de trabalho. O jeitão ou a personalidade da organização,
permitindo antever atitudes, comportamentos e até mesmo o direcionamento da
tomada de decisão. Cultura organizacional são modelos mentais alicerçados em
mitos, ritos, tabus, crenças, regras e idéias preestabelecidas que, presentes na forma
de valores culturais de cada empresa, influenciam o mode de encarar o mundo e se
adaptar a ele”.
5.2 Mito Organizacional
Um dos componentes mais importantes da cultura de uma organização é o seu mito
fundador ou herói revitalizador.
Segundo Johann:
“Mito Organizacional ou Herói Civilizador é alguém que deu alma e vida à empresa
e forneceu-lhe um modelo de atuação. Geralmente é o fundador – ou o revitalizador
– da organização. Nem todos os mitos – ou heróis – tendem a ser carismáticos.
Alguns demonstram ser pessoas difíceis e insensíveis. Contudo, apesar de
3
4. relacionamento difícil, despertam admiração e confiança pelos seus feitos. Heróis
podem ser criados, como por exemplo os “campeões de vendas do mês”. Eles
vencem desafios. Assumem o palco durante determinado tempo. São heróis
situacionais. Narrativa dramática de eventos imaginados geralmente têm fundo de
verdade e é ligada à figura de um herói”.
Um exemplo de narrativa dramática é a luta de Thomas Edison para criar o terminal
incandescente que resultaria na lâmpada elétrica. Mostrada em filme, essa narrativa
dramática moldou o espírito da GE, uma empresa que buscava a inovação a qualquer preço.
Levantamento da Silvio Luiz Johann junto a 65 empresas entre as maiores e melhores
listadas pela Revista Exame, apontou para o mito ou herói organizacional de cada empresa.
Veja quais são:
Exemplos de mitos e heróis organizacionais
Empresa Mito/Herói Empresa Mito/Herói
Acesita Não consolidado Johnson &Johnson Robert W.Johnson
AES Roger Santt Klabin Samuel Klabin
AES Dennis Bankke Kaiser Não consolidado
Agip Liquigás Não consolidade Líder Táxi Aéreo José A Assumpção
Alcatel Sostenes Bem Localiza Salim Matar
Alpargatas Não consolidado Lucent Technologies Graham Bell
Andrade Gutierrez O Príncipe Lucent Technologies Tom Nielsen
Armazém Martins Alair Nascimento Maeda Agroindustrial Nelson Maeda
Banco do Brasil Não consolidado Mannesmann Irmãos Mannesmann
ABN Amro Bank Não consolidado Merck Sharp e Dohme Geroge Merck
Baneb Não consolidado Merck Sharp e Dohme Alpheus Sharp
BankBoston Henrique Meirelles Merck Sahrp e Dohme Louis Dohme
Bosch Roberto Bosch Milênia Oswaldo Pitol
Brahma Marcel Telles Monsanto Bob Shapiro
Empresa Mito/Herói Empresa Mito/Herói
Busscar Nielson Harold Nielsen Motorola Paul Galvin
CEF Não consolidado Motorola Josehp Galvin
Cargill W.W. Cargill Nestlé Henri Nestlé
Cedro Cachoeira Silvio Diniz Ferreira Odebrecht Emílio Odebrecht
Champion Ronaldo G. Pereira Odebrecht Norberto Odebrecht
Citigroup John Reed Petrobras Não consolidado
Copel Não consolidado Ponte Irmão Wellington P Souza
Correios e Telégrafos Não consolidado Procter&Gamble William Procter
Dupont E.I.DuPont de Nemours Procter&Gamble James Gamble
Electrolux Não consolidado Prosegur Não consolidado
Embasa Não consolidado Rigesa Bo Faars
Ericsson Lars Ramquist Ripasa Abrahão Zarzur
Ferrovia Centro Atlântica Não consolidado Sadia Atílio Fontana
Fiat Automóveis Giovanni Agnelli Springer Carreir Willis Carrier
Fiat Automóveis Lorenzo Genta Schincariol Primo Schincariol
Fiat Automóveis Franco Ciranni Siemens Werner von Siemens
Fiat Automóveis Pacífico Paoli Telefonica Não consolidado
Fiat Automóveis Gianni Coda Tigre João Hansen Jr.
Gessy Lever Não consolidado Ultragaz Perry Igel
Gerdau Kurt Johannpeter Usiminas Amaro Lannari Jr.
Gerdau Jorge Gerdau Johannpeter Usiminas Rinaldo Campos Soares
Guabi/Mogiana Thor Haaland Vale do Rio Doce Eliezer Batista
Infraero Não consolidado Volvo Assar Gabrielsson
Itambé Não consolidado Volvo Gustaf Larson
Itaú Olavo Egídio Setúbal Votorantim José Eermírio de Moraes
Ivaí Obras Dr. Souto Votorantim Antônio Ermírio de Moraes
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5. Segundo Johann, empresas sem mitos consolidados têm problemas de definição cultural.
Boa parte das estatais e ex-estatais brasileira padece da falta de um mito que oriente os
funcionários rumo a posturas com foco mercadológico, éticas, entre outras.
5.2.1 Jeff Bezos e a Amazon
Este filme revela todo o poder da figura do mito organizacional na construção de uma
empresa.
5.3 Símbolos da Cultura Organizacional
Toda empresa reúne símbolos de status que evidenciam o poder de seus detentores e
demarcam territórios. As mais antigas reúnem uma enormidade de símbolos desse tipo.
Segundo Johann:
“Símbolos da cultura organizacional são artefatos materiais criados pelas
organizações que refletem seus valores e orientações. Ícones como automóveis de
luxo, design dos móveis dos executivos e roupa. Imagens como logotipo, estilo do
vestuário predominante na empresa. Arquitetura dos prédios, escritórios abertos ou
fechados, estacionamento com vagas privativas, banheiro na sala do diretor”.
Em algumas empresas estes símbolos são tão importantes, que os novatos são orientados
sobre o que podem ou não usar já no primeiro dia de trabalho.
5.4 Contracultura Organizacional
Quando a cultura da empresa gera insatisfação, surgem focos de contracultura, ou seja,
ações destinadas a confrontar a cultura dominante. Raramente há conflito aberto. Via de
regra, a contracultura se manifesta em ações veladas, sutis, que procuram minar
paulatinamente a cultura dominante. Focos de contracultura revelam, por outro lado, a
existência de culturas direntes que podem vir a se impor e deslocar a cultura principal.
Segundo Johann:
“Contracultura organizacional são grupos ou subgrupos que rejeitam frontalmente
aquilo que a organização representa ou o que ela tenta conseguir. Oposição direta
aos valores dominantes ou à estrutura de poder da empresa. Oposição às interações e
intercâmbios que se encontram enraízados nos valores da cultura dominante.
Tentativa das pessoas de reconquistarem alguma sensação de controle sobre suas
vidas, ridicularizando ou menosprezando a cultura que a empresa pretende
estabelecer. Pode surgir em épocas de tensão ou no decorrer de grandes
transformações”.
A contracultura surge com bastante intensidade em momentos como fusões e
incorporações. Dependendo da habilidade da empresa de lidar com esta situação, o
processo de fusão pode ser interrompido (Autolatina) ou simplesmente fracassar (IBM e
Gerdau).
5.5 Cultura Organizacional Densa
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6. Outro elemento da cultura organizacional é a chamada Cultura Densa.
Segundo Johann:
“Culturas densas apresentam alto grau de valores e crenças compartilhadas pelas
pessoas. Intensa influência da cultura organizacional orientando o comportamento
das pessoas. As pessoas reagem de acordo com valores centrais da organização,
existindo pouca discórdia ou ambigüidade”.
Kotter e Haskett apontam para a importância da existência de culturas densas, desde que
elas não signifiquem uma trava ao surgimento de novos valores e idéias.
5.6 Força Motriz
Toda cultura organizacional determina a força motriz da empresa.
Segundo Johann:
“Pertencente ao núcleo da cultura organizacional, a força motriz é a vocação natural
da empresa, moldada pelo mito da respectiva organização. É monolítica. De acordo
com a empresa de consultoria internacional Kepner, Tregoe, a Força Motriz de uma
organização normalmente obedece a uma classificação composta por cinco tipos
básicos: Vendas e Distribuição, Cresicmento e Lucro, Produtos Oferecidos,
Necessidades do Mercado e Produção e Tecnologia”.
Já vimos estas especificações na aula 5, mas o importante a assinalar aqui é que a força
motriz de uma empresa é resultado de sua cultura e não pode ser alterada por decreto. Para
uma empresa movida por crescimento e lucro assumir um posicionamento focado nas
necessidades do cliente é preciso uma revaloração cultural que pode ser difícil de
conseguir, vai demandar tempo, troca de pessoas e um trabalho intenso de aculturação.
5.7 Rito de Socialização
Os ritos de socialização fazem parte da cultura da organização e a refletem em vários
sentidos.
Segundo Johann:
“Ritos de socilaização acontecem com a integração de novos funcionários em um
processo de socialização fundamentado no contato com vários executivos de
diversas áreas da empresa com a finalidade de mostrar como a empresa funciona, ou
seja, quais os valores compartilhados. Treinamento com ênfase em modelos sociais,
padrões comportamentais e códigos de conduta aceitos e estimulados pela empresa”.
Uma empresa que planeje valorizar o desempenho dos funcionários, não pode premiar, na
festa de final de ano, o funcionário com mais tempo de casa. Os ritos de socialização devem
ser coerentes com a cultura organizacional que se pretende implementar na empresa.
Dinâmicas de grupo, por exemplo, são excelentes mecanismos para estabelecer novos ritos
sociais.
5.8 Clima Organizacional
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7. Toda pessoa que atua em uma empresa sabe se o clima é descontraído ou pesado, informal
ou formal, realxado ou tenso. O clima organizacional é elemento integrante da cultura da
empresa e não apenas o “estado de espírito das pessoas”.
Segundo Johann
“Clima organizacional é o fenõmeno resultante da interação dos elementos da
cultura. Percepção resumida da atmosfera e do ambiente da organização. Indicador
do nível de satisfação das pessoas no trabalho. Medida de até que ponto estão sendo
cumpridas as expectativas das pessoas sobre como se deveria trabalhar na empresa”.
Bons climas organizacionais costumam funcionar como um fator de atração de bons
funcionários. Por outro lado, climas tensos, autoritários, formais, inflexíveis, acabam
levando muitas pessoas promissoras a procurarem trabalho em outras organizações ou até a
abrirem seus próprios negócios.
6. Gestão da Cultura Organizacional
A constatação de que a cultura organizacional é importante, para não dizer vital, levou
consultores e empresas à seguinte indagação: “E se a cultura da minha empresa não está
adequada para as mudanças que quero empreender? É possível mudá-la?”
Poucos estudiosos acreditam que seja possível empreender a mudança do self de uma
empresa, ou até mesmo de sua força motriz, sem provocar uma catástrofe antes. Esses
pesquisadores acreditam que seria necessário, antes, mudar boa parte do comando da
empresa e empreender um processo de revaloração da cultura da empresa que poderia
destruí-la.
Um desses estudiosos, Rensis Likert, estudou empresas com dinâmicas autoritárias e
democráticas e chegou à uma conclusão aparentemente óbvia: empresas democráticas, onde
os trabalhadores participam das decisões, são mais preparadas para enfrentar as mudanças
aceleradas que o mercado exige. Ele assinalou em seu estudo que é possível fazer uma
transição entre empresas autoritárias para empresas democráticas, mas evidenciou que, por
um tempo razoável, a empresa padece de sérios problemas de comando e adaptação –
principalmente entre as camadas médias de poder – o que leva a comprometer o lucro por
um período certamente maior do que um ano e próximo a dois ou três anos, o que, para
muitas empresas, pode significar a morte.
Likert assinalou que empresas autoritárias conseguem lucros a curto prazo, mas,
periodicamente, sofrem convulsões que as obrigam a mudar quadros, demitir gerências,
diretores e começar tudo de novo. Já empresas democráticas, conseguem lucratividade a
longo prazo, o que as torna economicamente mais interessantes. A transição de uma para
outra, no entanto, exige gerenciamento, troca de pessoal, treinamento, dinâmicas de grupo e
muita paciência.
Segundo Johann, há vários mecanismos que permitem a gestão da cultura corporativa de
uma empresa, que podem mudar conceitos, padrões, orientações e credos. As empresas, no
entanto, terão que planejar seu uso, integrando as diferentes ferramentas para conseguir
7
8. resultados a médio prazo. Muito importante: em gestão de cultura corporativa, nada
acontece do dia para a noite.
Os mecanismos de getão de cultura apontados por Johann são:
• Pesquisa ação de clima organizacional
• Matriz de valores
• Endomarketing
• Modelos sociais
• Padrões comportamentais
• Rituais
• Balanço social
• Comunidade inteligente
• Learning organization
Vamos ver a seguir, resumidamente, cada uma dessas opções, segundo Silvio Luiz Johann
relata em seu livro “Gestão da Cultura Coporativa”.
6.1 Pesquisa-ação de clima organizacional
“A pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social voltada para a ação ou para a resolução
de um problema coletivo, sendo um método no qual pesquisadores e integrantes
representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou
participativo. Nas organizações, uma pesquisa de clima organizacional, por exemplo,
pode transformar-se numa pesquisa-ação desde que venha a tender aos seguintes
requisitos:
• A coleta de dados não deverá ficar restrita ao uso de um simples questionário,
mas deverá abranger a interação efetiva entre o pesquisador e o entrevistado e,
principalmente, dever-se-á dar voz ativa às pessoas envolvidas na situação em
estudo
• O diagnóstico obtido através da pesquisa de clima deverá originar ações e
atividades cuja finalidade será atuar sobre os problemas identificados
• A ação corretiva deverá ser comunicada aos envolvidos na situação, garantindo-
lhes meios de acompanhar o andamento dos trabalhos
No ambiente de trabalho existe um bom espaço para a aplicabilidade da pesquisa-ação.
Ela presta-se para a introdução de novas tecnologias, para a transformação da estrutura
organizacional, para o estabelecimento de novos métodos de trabalho e, principalmente,
para corrigir anomalias detectadas nos processos operacionais e na própria interação
entre as pessoas. A pesquisa ação é uma excelente ferramenta da cultura de alto
desempenho”.
6.2 Matriz de indicadores e de valores de alto desempenho
8
9. “Quando se trata da construção de uma cultura organizacional de alto desempenho,
uma das perguntas que se impõe é: “Afinal, o que é uma organização de alto
desempenho?” Para responder a essa pergunta, devemos considerar que:
Uma organização de alto desempenho é aquela que consegue atingir, de forma
continuada, níveis elevados de performance quanto à sua razão de existir, aos
seus propósitos centrais e a satisfação das necessidades e das expectativas dos
seus vários públicos.
Nesse sentido, uma organização de alto desempenho é capaz de obter resultados
expressivos (eficácia) ao longo do tempo, cumprindo a sua missão, honrando a sua
ideologia central e praticando patamares superiores de retorno e de atuação junto
aos vários acionistas, funcionários e clientes. Quando uma organização de alto
desempenho também consegue atingir resultados expressivos em projetos de
interesse social – comunidade e meio ambiente – ela passa a ser, na expressão de
Peter Drucker, uma organização de alta efetividade.
Para gerenciar a busca do alto desempenho, uma das ferramentas que as empresas
dispõem é a matriz de indicadores e de valores de alto desempenho, conhecido
como Balanced ScoreCard.
A Matriz de Indicadores deve abrigar informações-chave sobre as diversas áreas da
empresa, como vendas/marketing, recursos humanos, finanças, operações/produção
entre outras. Nas empresas organizadas na forma de processos, os indicadores
refletirão o desempenho de pontos vitais dos vários processos. O importante é que
os indicadores selecionados pela empresa possam ser cotejados com os de outras
empresas, ou comparados com parâmetros internacionais representativos da cultura
de alto desempenho.
Em artigo publicado na Harvard Business Review, com o título “The Balanced
Scorecard: measures that drive performance”, os consultores Robert Kaplan e David
Norton lançaram pela primeira vez a idéia de que os progressos na materialização da
visão estratégica da empresa, além de poderem ser vinculados a ações operacionais,
deveriam também ser monitorados por meio de uma combinação de indicadores
financeiros com outros de caráter qualitativo. No Balanced Scorecard idealizado por
esses dois consultores organizacionais, a empresa define uma grande estratégia,
desdobra-a em pontos críticos e vincula-os às áreas operacionais em que as ações
deverão ser desenvolvidas para que o sucesso da estratégia seja alcançado.
Consolidadas numa planilha, as ações propostas passam a ser acompanhadas quanto
à sua progressiva execução por meio de indicadores de desempenho de natureza
quantitativa e qualitativa.
Embora as perspectivas sejam predeterminadas, os indicadores que as compõem
podem ser customizadas e adequados à estratégia formulada pela organização. As
quadro perspectivas e os seus indicadores básicos – alguns dos quais de natureza
não-financeira – são:
9
10. • Financeira/Acionista/Negócios: lucro, crescimento e composição da
receita, redução de custos, melhoria da produtividade, utilização dos ativos,
estratégia de investimentos
• Clientes/Mercado: participação no mercado, retenção de clientes, aquisição
de novos clientes, satisfação dos clientes, rentabilidade dos clientes,
qualidade do produto, relacionamento com clientes, imagem e reputação
• Processos internos/operações: inovação (desenvolvimento de novos
produtos e processos), operação (produção, distribuição, vendas), serviços
pós-venda (assistência técnica, atendimento a solicitação do cliente)
• Aprendizado e crescimento = pessoas e organização: desenvolvimento de
competências da equipe e manejo da infra-estrutura tecnológica
O Balanced Scorecard pressupõe que haja hierarquia entre as quatro perspectivas,
ou seja, os ganhos e os avanços verificados em aprendizado e crescimento, que
envolvem a cutlrua organizacional e o desenvolvimento de pessoas, redundariam em
melhorias nos processos internos, otimizariam a perspectiva clientes e mercados e,
enfim, proporcionariam os almejados resultados financeiros para a empresa”.
6.3 Endomarketing
“A comunicação – seja ela de caráter interpessoal ou organizacional – é um dos
mais importantes vetores de propagação/sedimentação da cultura porque abarca toda
sorte de mensagens trocadas entre pessoas e grupos, independentemente da
linguagem ou do código escolhido, do tipo de canal usado, do conteúdo ter origem
formal ou informal ou de obedecer a um sentido ascendente ou descendente na
estrutura hierárquica da empresa.
Basicamente, o endomarketing tem à sua disposição, dentre outros, os seguintes
instrumentos:
• Mídia eletrônica (intranet, vídeos, teleconferências, circuito interno de tv)
• Publicações internas (joprnais, boletins informativos e revistas internas)
• Publicações oficiais (relatóiros financeiros anuais, balanço social)
• Comunicação informal
• Quadros, murais
• Recursos gráficos (folders, banners)
• Cartoons, revistas em quadrinhos e assemelhados
• Eventos internos (misto de rituais e de endomarketing, como reuniões,
comemorações em geral, ações de integração funcional)
• Outros como gincanas, concursos
As ações de endomarketing permitem a revitalização e o fortalecimento do núcleo
da cultura da organização e, ao mesmo tempo, prestam-se à contínua revaloração
qualitativa dos valores adjancentes, por meio da adesão das pessoas às mudanças.
Para esse fim, o endomarketing pode – e deve – ser combinado com outras formas
10
11. de comunicação e de interação com o público interno, como treinamento (inclusive
com dinâmicas de grupo), palestras e cerimônias em geral”.
O endomarketing, como assinala Johann, serve de pano de fundo para dar sustentação aos
demais mecanismos de gestão da cultura, através de ações como:
• Suporte à fase de pesquisa-ação, de modo a facilitar a obtenção de dados
consistentes
• Elaboração de um calendário de rituais para dar solidificação à cultura
organizacional (Dia da Secretária, Aniversário da Empresa, Festa de Fim de Ano,
Encontro de Gerentes)
• Valorizar a atuação dos modelos sociais
• Divulgar os padrões comportamentais relacionados ao alto desempenho
• Compartilhar as vitórias no campo da cidadania corporativa
• Monitorar os diferentes estágios da mudança com a ajuda da matriz de
indicadores/balanced scorecard
• Estabelecer as bases de uma comunidade de aprendizado a partir do
compartilhamento do conhecimento (Gestão do Conhecimento)
• Dar ciência das mudanças havidas nos diferentes subsistemas de RH a partir do
realinhamento de várias de suas práticas
• Consolidar a adoção e o funcionamento de um modelo mais participativo na tomada
de decisões
6.4 Modelos Sociais
O fundador e a direção de uma empresa atuam como modelos sociais que vão ser seguidos
pelo restante da comunidade. Muitos líderes de empresas acreditam que “são como são e
não há o que fazer a respeito”, mas a realidade é que os mitos organizacionais, que
funcionam como modelos sociais, podem ser preparados para atuar com foco em alto
desempenho.
Segundo Johann:
“As características da cultura de uma organização são, em geral, positivas ou
negativas dependendo da relação que estabeleceram com o legado cultural de seu
mito. De fato, a história de vida do herói fundador, ou revitalizador, é traduzida em
valores que continuam a ser praticados mesmo anos depois que o mito já se retirou
da cena real e que podem, até, estar presos a uma visão de mundo já obsoleta”.
Se é importante mudar o modelo social (por exemplo, mudar a dinâmica autoritária da
empresa para uma dinâmica democrática), Johann assinala que é preciso ter em mente que:
“O grau de dificuldades na implantação das mudanças culturais será tão elevado quanto
a lacuna que existir entre os preexistentes e aquele almejado. Assim, supondo-se que
haja condições mínimas para a sua constituição, eis alguns passos importantes nessa
direção:
11
12. • Escolha de quem serão os modelos sociais: gerentes, supervisores ou os que
adotarem os novos valores, independentemente do nível hierárquico
• Criação do arquétipo comportamental e cultural: como fonte de inspiração para
as pessoas que assumirão na prática o novom papel, esse arquétipo deverá ser
estruturado teoricamente, a partir da escolha e da hierarquização dos valores,
das atitudes e dos comportamentos que comporão o novo modelo social
• Identificação das lacunas (gaps): tomando como referência os valores e as
práticas ainda vigentes, será necessário focar as novas competências e
habilidades que passarão a ser exigidas a partir da implantação da mudança,
bem como o guia a ser seguido até sua aquisição
• Sesibilização e treinamento: é de suma importância treinar (em algumas
habilidades específicas) e educar (conhecimento e sabedoria) os escolhidos para
desenvolver os atributos necessários e assumir as novas funções de gestores da
mudança. É interessante ressaltar que desse processo educativo, além dos
treinamentos direcionados, deve fazer parte uma reaprendizagem (outro
importante mecanismo de revaloração da cultura) com as disfunções, os erros e
os fracassos até então ocorridos, sob pena de as pessoas continuarem praticando-
os exatamente por não terem ainda se dado conta dessa mudança de foco
• Mecanismos de estímulo e de avaliação funcional que monitorem a efetiva
aplicação das novas práticas: caso já existam na cultura condições que
favoreçam o emprego de uma avaliação baseada num feedback 360º, este
mecanismo ajudará a sinalizar o avanço na direção desejada”.
No entanto, é evidente que os modelos sociais precisam ter atributos diferenciados. Vários
consultores definiram uma série de atributos, aparentemente focados em atributos
específicos de cada organização ou segmento de negócio. Steve Covey, por exemplo,
definiu os “sete hábitos das pessoas altamente eficazes” da seguinte forma: proatividade,
visão clara dos objetivos e das crenças, disciplina para fazer o mais importante, pensamento
na vitória, empatia com o outro, sinergia/criatividade e busca do aprimoramento.
6.5 Padrões comportamentais
“Um dos grandes desafios da gestão da cultura é fazer com que alguns aspectos
básicos da postura pessoal dos colaboradores de uma empresa venham a refleitr e
a expressar a cultura da organização. Uma empresa que tenha como valor cultural
o direcionamento aos clientes, por exemplo, terá interesse que os seus funcionários
tenham uma boa apresentação pessoal – higiene pessoal, roupas adequadas – e que
pratiquem no dia-a-dia normas de cordialidade, de atenciosidade e de boa
educação junto á clientela. Os administradores de pessoal sabem que esta é uma
dificuldade presente na maioria das organizações, constituindo-se em um grave
problema quando a empresa trabalha com grande número de funcionários,
apresenta um turnover elevado ou, ainda, dispõe de um quadro funcional com
baixa qualificação.
Na realidade, o estabelecimento de padrões comportamentais não se afiugura como
um caminho totalmente inovador, pois se inspira no pensamento de Skinner,
12
13. originalmente concebido para o terreno educacional. A teoria skinneriana defende
o controle do comportamento do indivíduo, observável em suas respostas a
determinadas situações. A aplicação dessa teoria permite mudar, inovar, extinguir
e diminuir atitudes e comportamentos do ser humanos mediante a administração de
prêmios e castigos. Skinner parte da premissa de que o comportamento das pessoas
pode ser condicionado por fatores externos (estimulos e reforços), os quais podem
ser estruturados e aplicados de forma que atinjam expectativas de terceiros (pais,
educadores e – por que não? – da organização).
Uma das primeiras providências adotadas pelo banco inglês HSBC quando
adquiriu o Bamerindus foi submeter os funcionários brasileiros a padrões
comportamentais que incluíssem regras elementares sobre higiene pessoal. Aliás,
antes de ficarmos horrorizados com a iniciativa dos ingleses é bom lembrar que o
Bradesco há muitas décadas proíbe que seus funcionários do sexo masculino se
apresentem ao trabalho com cabelos longos e barba”.
Neste aspecto, a posição do chefe, do líder, do superior imediato é fundamental, pois os
padrões de higiene e postura exigidos dos funcionários, deve ser adotado pelas chefias sob
pena de se criar uma situação absolutamente neurótica: exige-se de uns o que não se exige
de outros.
A adoção de padrões comportamentais exige extremo bom senso porque, rapidamente,
pode se configurar em invasão de privacidade.
6.6 Rituais
“Numa comunidade, a cultura é perpetuada através de ritos e cerimônias que,
repletos de simbolismo e de emoção, irmanam as pessoas em torno de ideais em
comum. Na cultura organizacional de alto desempenho, recomenda-se que os
indivíduos sejam envolvidos por inteiro, utilizando-se música, símbolos, arte e
drama para explorar as fontes mais profundas da emoção, da intuição e do saber. Os
ritos, geralmente, são de comemoração e de integração entre as pessoas. Quando
bem conduzidos, os rituais são extraordinários catalizadores da energia e da
motivação humana. Os rituais são os portais mágicos de acesso ao
convencionalmente inatingível. Através deles, a força do coletivo arrebata os
indivíduos inflamando-os pelo discurso, inebriando-os pela música repleta de
significado e fazendo seus espíritos vibrarem com uma corrente contínua de fervor,
entusiasmo e determinação. Não há crise, concorrente, inimigo ou situação
impossível que possa se opor à vontade celebrada nos rituais.
Nas cerimônias e rituais mais presentes na liturgia empresarial, bem como na gestão
simbólica utilizada para reforçar determinados valores adjacentes, em ordem
decrescente de preferência, destacam-se:
• Ritos de comemoração e integração: na maioria das empresas analisadas
são feitas referências às festas de final de ano, à organização de torneios
esportivos interdepartamentais (curiosamente só envolvendo homens) e a
datas especiais como aniversário do mês, dia da secretária, entre outras.
13
14. Também é citada a organização de churrascos, jantares, bailes e eventos
similares, envolvendo também a participação de familiares dos funcionários.
O modismo importado do “happy hour” às sextas-feiras, nas dependências
da empresa ou fora dela, também é bastante comentado, bem como a
organização de open days, que estimulam a inserção da empresa em seu
entorno, com visitas de familiares e da comunidade em geral.
• Ritos de reforço: são cada vez mais utilizadas as chamadas reuniões
interdepartamentais de apresentação de resultados e metas, em que os
indicadores na cor vermelha, de desempenho abaixo do previsto, são
acompanhados do respectivo plano de ação. Reuniões livres de coordenação,
“vai-quem-quer”, instantâneas, são alguns dos eventos que estão quebrando
a formalidade das reuniões de trabalho. Dando destaque ao desempenho
excepcional em projetos importantes, empresas como a Procter&Gamble,
Banco GM e Alpargatas aproveitam as comemorações de final de ano para
premiar publicamente seus destaques e a relevância de valores culturais
relacionados aos resultados, à competência, ao tempo de casa.
• Ritos de passagem: em apoio ao processo de retenção de talentos, algumas
empresas já apresentam inovações na integração dos novos funcionários, tais
como treinamento de “padrinhos” e liderança, roteiro de visitas a diferentes
setores, saudação ao “calouro”, apresentação do seu código de ética, entre
outros. Também promoções, casamentos, mudanças de cidade,
aposentadoria e até despedidas são momentos da vida pessoal e funcional
que provocam rituais carregados de emoção na mesma proporção do grau de
integração entre os colegas”.
Uma empresa que pretenda estimular seus empregados a produzir resultados, por
exemplo, deve repensar rituais como a premiação de funcionários por tempo de casa
porque este ritual seria conflitante com a mensagem que a empresa pretende passar.
6.7 Balanço Social
“Segundo Peter Drucker, as organizações não vivem para si próprias, mas são
meios, são órgãos da sociedade que visam à realização de uma tarefa social.
Compactuando com essa visão, Caravantes identifica como efetividade
organizacional o estágio em que uma empresa ou instituição comece a produzir
resultados sociais relevantes.
Como evidência do crescimento do interesse pela efetividade organizacional,
registra-se no Brasil um movimento caracterizado pelo Balanço Social, instrumento
que consolida e, principalmente, divulga as realizações da empresa junto aos seus
vários públicos.
Ainda sem regulamentação no Brasil, muitas empresas estão divulgando o seu
Balanço Social. Alguns dos indicadores que têm composto os Balanços Sociais das
empresas são:
14
15. • Imposto Recolhidos – como os impostos são destinados, em tese, a
investimentos em prol da sociedade, justifica-se divulgar o montante
recolhido pela empresa.
• Salários e Remunerações – entende-se como uma grande contribuição
social o retorno que a empresa dá à comunidade na forma de geração de
empregos, salários e remuneração em geral.
• Benefícios – planos de saúde, assistência médica, atividades recreativas,
assistência social, alimentação, complementação de aposentadoria, planos de
pensão, creches e investimentos em educação e treinamento, entre outros.
• Quantidade de empregos – a geração de empregos é uma das maiores
contribuições sociais que uma organização pode oferecer à sociedade.
• Investimentos na comunidade – investimentos sociais como projetos de
apoio a comunidades carentes, programas de adoção de escolas, ações de
suporte a instituições do terceiro setor e os projetos em áreas diversas como
cultura, recuperação do patrimônio histórico.
• Investimentos em meio ambiente – gastos com reflorestamento,
despoluição e com ações que visem a preservação ambiental”.
6.8 Gestão de Talentos
“A gestão de talentos é um dos mecanismos avançados do processo de revaloração
da cultura de uma empresa. De pouco adianta a ativação de outros mecanismos
importantes, como os rituais organizacionais, se a gestão de talentos não for
convenientemente estruturada e colocada em prática.
Seu ponto de partida é a montagem de um portfólio de executivos com uma análise
de cada profissional de acordo com duas variáveis básicas: desempenho funcional
representado pelos resultados operacionais que costuma alcançar e seu nível de
inserção na cultura estimulada da empresa.
Na cultura corporativa de alto desempenho é imprescindível que a totalidade – ou
pelo menos a maioria – dos executivos seja composta por pessoas que: (1) obtenham
resultados operacionais continuamente, (2) pratiquem os valores corporativos e (3)
atuem comportamentalmente de acordo com o modelo social delineado pela
empresa e alinhado com a cultura corporativa”.
6.9 Comunidade Organizacional Inteligente
“A consecução de uma cultura de alta efetividade exige um modelo participativo de
gestão, com predomínio de atributos como negociação, comunicação, empatia e
motivação, entre outros, muito próximos do espectro delineado por Goleman. Na
modelagem participativa ou democrática, todas as pessoas da organização
constróem não somente os valores da cultura, mas compartilham a própria gestão
da cultura, comprometendo-se fortemente neste processo. Embora os dois modelos
de gestão organizacional – autoritário e participátivo – quando bem conduzidos
possam estabelecer uma cultura de alto desempenho, existem fortes evidências de
que um deles produz melhores resultados no curto/médio prazo e de que o outro
oferece respostas mais duradouras, de longo prazo. Por outro lado, somente o
15
16. modelo participativo é capaz de consubstanciar uma cultura de alta efetividade.
Trata-se da transformação da empresa numa verdadeira comunidade cultural
inteligente. Contudo, a transição da autocracia para a democracia na
sorganizações também encerra riscos consideráveis para a organização que vier a
empreendê-la. Há muito tempo as pesquisas de Likert já indicavam que em médio e,
especialmente, longo prazo, o modelo democrático oferece resultados melhores do
que o método top-down. Entretanto, nos anos iniciais de introdução do modelo
participativo, a empresa tende a enfrentar um período de turbulência cultural,
podendo ocorrer um decréscimo, nesse período, da produtividade e da qualidade”.
6.10 Learning Organization
“Em 1989, ao fundar a Society for Organizational Learning (SOL), junto ao MIT, em
parceria com Chris Argyris, Aries de Geus e outros consultores, Peter Senge, marcou
uma nova etapa de estudos sobre a importância da cultura organizacional e do
conhecimento como ativo organizacional. Pra Senge, as chamadas Learning
Organizations são formadas por pessoas que expandem continuamente sua capacidade
de criar resultados, atingir novos padrões de raciocínio, libertar a aspiração coletiva e
aprender a aprender em grupo. Em seu livro “A Quinta Disciplina: Arte e Prática da
Organização que Aprende”, Peter Senge preconiza que a formação das cham,adas
Organizações que Aprendem passa pelo domínio de cinco disciplinas básicas:
• Domínio/Maestria Pessoal: motivar e pesquisar continuamente como as nossas
ações afetam o mundo em que vivemos. Aprender a expandir nossa capacidade
pessoal para criar os resultados que mais desejamos. Assim, domínio pessoal
significa fazer da vida um trabalho criativo, incorporando, para isto, dois
movimentos subjacentes:
o A) Estabelecer continuamente o que é importante para a pessoa
o Aprender a enxergar com mais clareza a realidade, gerando uma
“tensão criativa”
Falar a verdade e buscar incessantemente eliminar os mecanismos limitantes
ou enganosos para a própria pessoa, ajudará a lidar com o conflito e a
desenvolver uma comunicação entre o consciente e o inconsciente. Assim,
alguns aspectos do Domínio Pessoal que devem ser destacados são:
o Interação entre razão e intuição
o Trabalhar melhor nossa ligação com o mundo
o Ter mais compaixão
o Assumir compromisso com o todo
É papel do gerente trabalhar incansavelmente para criar um clima em que os
princípios do Domínio Pessoal sejam aplicados no dia-a-dia.
16
17. • Modelos Mentais: reflexionar, esclarecer continuamente e melhorar nossos
quadros internos do mundo, bem como perceber como moldam nossas ações e
decisões. Ássim, modelos mentais são idéias profundamente arraigadas,
generalizações ou mesmo imagens que influenciam nosso modo de ver o mundo
e até nossas atitudes e comportamentos. Sua origem, segundo Daniel Kim,
deve-se aos giros da nossa Roda do Aprendizado, ao mesmo tempo em que
esses modelos mentais determinam o número e a velocidade desses giros. Para
uma aprendizagem organizacional eficaz, a Rod do Aprendizado deve ser
exercitada no local de trabalho, ser compartilhada (e não individual) e ativa
(sujeita à experimentação):
o A) Experimentar experiências concretas no local de trabalho
o B) Refletir sobre essas experiências (entender as causas e por quês)
o C) Formar conceitos abstratos e generalizações com base nelas
o D) Testar esses conceitos e generalizações em novas experiências
Administrar os modelos mentais, em nível pessoal e interpessoal, certamente
ajudará a modificar os modelos mentais da organização, com a aprendizagem
daí resultante acarretando mudanças de atitudes e não simplesmente a
assimilação de novas idéias.
• Objetivo Comum: construir um senso de compromisso no grupo, desenvolvendo
imagens compartilhadas do futuro que se busca criar e os princípios e práticas
orientadoras pelos quais se espera chegar lá. Como conseqüência, conseguir
engajamento a longo prazo e proporcionar foco/direcionamento de esforços em
torno da aprendizagem, esta Visão Compartilhada de objetivos a serem
alcançados e valores/missão a serem praticados devem se espalhar por todos
os níveis da empresa, até porque as pessoas, ao se empenharem por essas
metas, criam o sentimento de coletividade.
• Aprendizagem em Grupo: transformar as habilidades de conversação e
coletivas de raciocínio, de modo que o grupo possa desenvolver inteligência e
capacidades maiores que a soma dos talentos individuais. Ou seja, oportunizar
que todas as pessoas enxerguem além das suas perspectivas e limitações
pessoais. Nas organizações, o aprendizado em grupo apresenta 3 dimensões:
o 1) Discernimento para analisar questões complexas
o 2) Adoção de ações inovadoras e coordenadas, onde cada um tem
consciência de equipe e age de modo a complementar a ação dos outros
o 3) Influência de um grupo sobre os demais, difundindo técnicas de
aprendizado em grupo
Esta disciplina requer a prática constante de dois elementos importantes:
o Diálogo: raciocínio pode ser coletivo e diferentes idéias tornam possível
o surgimento de uma nova alternativa
17
18. o Discussão: idéias alternativas devem ser avaliadas de modo a se optar
pela que reunir maior preferência
• Raciocínio Sistêmico: desenvolver uma linguagem para descrever e entender
as forças e inter-relações que moldam o comportamento sistêmico. Persistir na
mudança de mentalidade. O raciocínio sistêmico integra as outras 4
disciplinas, fundindo-as num conjunto coerente de teoria-prática, mostrando o
efeito sinérgico de que o todo é maior que a soma das partes, tornando
compreensível a nova maneira pela qual cada um vê a si mesmo e ao mundo,
como parte integrante dele”.
7. Caso Deep G
Esta caso, real, revela a importância da cultura organizacional em processos de fusão de
empresas. Por desconhecerem os efeitos do poderoso choque de culturas decorrente da
fusão de empresas com culturas muito diversas, todo o investimento na criação de uma
nova empresa foi perdido. Mais do que isso: perderam-se pessoas importantes, que
deixaram a empresa, perdeu-se investimento, perdeu-se mercado.
Joint Venture
Deep Blue e Grupo G
Case desenvolvido por professores da Fundação Getúlio Vargas para análise e debate em ambientes universitários. Por
critérios de metodologia didática, o case restringe-se a uma abordagem qualitativa dos fatos, não estando fundamentado
numa coleta científica de dados e devendo ser considerado apenas como uma livre versão dos acontecimentos.
O Cenário
Na década de 80 passou a vigorar no Brasil uma legislação protecionista que reservava o mercado de
prestação de serviços de processamento de dados para empresas nacionais. Nenhuma organização estrangeira
podia prestar serviços nesta área, no Brasil, exceto associando-se minoritariamente a empresas brasileiras. A
lei também previa que as empresas públicas e o próprio governo somente poderiam contratar serviços de
processamento de dados de empresas nacionais. As grandes organizações que atuavam neste segmento,
inclusive as multinacionais, tiveram de rever as suas estratégias, algumas delas buscando alianças estratégicas
com outras empresas. Neste cenário, interessa-nos especialmente a atuação de uma grande empresa nacional –
o chamado Grupo G, e a poderosa empresa estrangeira Deep Blue.
Os atores principais
1. A Deep Blue
No início da década de 80, a Deep Blue era uma das maiores corporações do planeta, reinando soberana no
mercado de computadores de grande porte – os mainframes. No Brasil, a Deep Blue aliava a sua tradicional
comercialização de equipamentos de informática com a prestação de serviços de processamento de dados a
grandes clientes. Nessa área de serviços, a Deep Blue contava com mais de 300 pessoas altamente
qualificadas, que utilizavam computadores de última geração instalados nas várias sedes regionais da
empresa. Com a restrição imposta pelo governo brasileiro, a Deep Blue viu-se repentinamente impedida de
continuar prestando serviços de processamento de dados a empresas nacionais, passando a conviver com a
ameaça da ociosidade em sua divisão de serviços.
A Deep Blue era uma referência de atuação no ambiente organizacional, pois detinha o know-how de
fabricação de um produto de alta tecnologia (computadores de grande porte), dominava o mercado e tinha um
18
19. retorno financeiro fantástico. A Deep Blue era praticamente um modelo que as demais empresas procuravam
seguir. Sua lucratividade e o seu mercado praticamente cativo – na época – permitia-lhe manter um talentoso
quadro funcional. Embora conservadora em termos de desenvolvimento de novos produtos, seus funcionários
tinham orgulho de atuar na companhia. A Deep Blue administrava por resultados e as pessoas eram
envolvidas no processo de definição de metas de vendas e outros. Predominava um clima de liberdade
psicológica, onde as pessoas podiam expor seus pensamentos abertamente e sem medo de represálias. Os
funcionários da Deep Blue desfrutavam de um padrão funcional elevado, com remuneração acima do
mercado, amplo pacote de benefícios e dispunham de recursos de primeira linha para o desenvolvimento do
seu trabalho – aluguel de carros do ano, hospedagem em hotéis 5 estrelas, entre outros.
Durante a sua exitosa trajetória ao longo dos anos, a Deep Blue iniciou seu processo de profissionalização na
gestão de Thomas J. Watson, que imprimiu uma marca indelével na empresa, tornando-a líder de mercado e
delineando uma espécie de vocação natural ou de força motriz caracterizada por produtos oferecidos. A área
de comercialização era a propulsora da companhia, geradora de crescimento e de lucratividade. Os
funcionários e executivos com alto desempenho em vendas eram considerados verdadeiros heróis, sendo
cumulados de prêmios (viagens por atingimento de metas e outros). Na batalha incessante por novas vendas, a
Deep Blue costumava utilizar todas as armas disponíveis, muitas vezes atropelando questões éticas.
Conhecida por seus profissionais vestidos de ternos invariavelmente escuros, com camisas brancas, sapatos
pretos e gravatas discretas, a Deep Blue estava completamente identificada como pertencente ao status quo
vigente na época. A estratégia mercadológica da empresa era oferecer aos seus clientes produtos
(computadores de grande porte) em versões tecnologicamente atualizadas (maiores, mais rápidos, com maior
capacidade de memória). A ideologia central da Deep Blue compreendia uma consideração total para com
todos os funcionários, a busca da superioridade no que era feito na companhia e, ainda, o emprego do tempo
que fosse necessário para deixar os clientes felizes.
A Deep Blue Brasil dos anos 80 era uma empresa flexível e direcionada aos clientes. Embora lenta na
identificação das tendências de mudanças no mercado, ela praticava uma gestão por resultados onde os
executivos atuavam em um ambiente de relativa liberdade, com bom relacionamento interpessoal que
privilegiava o atingimento das metas de vendas. Os executivos da Deep Blue atuavam com desenvoltura junto
à clientela e possuíam uma cultura globalizada, dada a dispersão mundial das suas diversas unidades. O
domínio do inglês era praticamente obrigatório e o treinamento e as reciclagens no exterior eram constantes.
2. O Grupo G
Na década dos 80, o segundo ator principal deste relato, identificado como Grupo G, contava com mais de 10
mil funcionários atuando no território nacional e obtinha um faturamento, na época, de aproximadamente US$
1,7 bilhão por ano, concentrando-se na fabricação de ferros, pregos, telas e vergalhões empregados na
construção civil. A imagem pública do Grupo G era de uma organização ética, competente em seu ramo de
atuação, com boa credibilidade no mercado e com uma certa influência política.
Embora não atuasse no segmento de informática, o Grupo G dispunha de um Centro de Processamento de
Dados dotado de equipamentos Deep Blue de última geração, que prestava serviços às diversas unidades da
empresa. Esse Centro de Processamento de Dados era operado por cerca de uma centena de profissionais
tecnicamente qualificados, entre analistas de sistemas, analistas de suporte técnico, programadores e
profissionais de organização e método (O&M), dentre outros. Pertencente ao pequeno e seleto universo de
organizações brasileiras pioneiras no uso de computadores e na implantação de sistemas informatizados, o
Grupo G orgulhava-se dos seus sistemas corporativos. Junto com grandes instituições financeiras, o Grupo G
era uma das poucas organizações brasileiras que, na metade da década dos 80, havia adquirido uma janela
para um satélite, interligando on-line todas as suas unidades de negócios no país. No final de 1986, o Grupo G
dispunha de aproximadamente 800 executivos e funcionários qualificados plugados no seu correio eletrônico
corporativo. A área de processamento de dados era motivo de orgulho para o Grupo G.
Contudo, a experiência do Grupo G na diversificação de seu ramo de atividades era bastante diminuta.
Resumia-se, basicamente, à desastrosa aquisição de uma instituição financeira nos anos 70. Essa
19
20. diversificação resultou em prejuízos, levando o Grupo G a encerrar as atividades na área financeira e
concentrando-se em seu ramo principal, a siderurgia.
Fundada há muitos anos por um homem de ascendência germânica, o Grupo G beneficiava-se de um forte
legado que valorizava, dentre outros aspectos, a ética no trabalho, a dedicação, a austeridade, a pontualidade e
a produtividade. Embora o fundador não mais existisse, muitas histórias eram relatadas a seu respeito, a
maioria das quais ressaltando que se tratava de uma pessoa excepcional, mas que não tolerava “cera” no
trabalho. Ele costumava efetuar uma ronda diária na empresa para cumprimentar pessoalmente os
funcionários da administração, mas também para verificar in loco se os funcionários não estavam matando o
tempo com leitura de jornais e outras atividades dispersivas. A geração que estava no comando do Grupo G,
nos anos 80, fora criada sob forte influência desses princípios. O próprio processo seletivo procurava
identificar pessoas com perfil comportamental que tivesse similaridade com os princípios dominantes no
Grupo G. Após a admissão, essas pessoas eram submetidas a um bem-elaborado processo de integração. No
caso de técnicos e executivos, esse processos estendia-se, muitas vezes, a um período de várias semanas
quando, durante algumas horas por dia, o novo funcionário assistia palestras proferidas por executivos do
Grupo G e visitava outros setores da empresa, onde tinha contato com os responsáveis pelas respectivas áreas.
Normalmente, nessas palestras e contatos transparecia o modo de ser do Grupo G, numa espécie de
conscientização que visava explicitar ao novo funcionário o que a organização esperava dele.
Embora o Grupo G fosse uma indústria siderúrgica, a sua essência ou força motriz não era produção e
tecnologia, mas sim crescimento e lucro. A maioria dos altos executivos do Grupo G não era composta de
engenheiros, mas sim contadores, economistas ou administradores financeiros. Normalmente eram
profissionais que haviam iniciado suas carreiras nas áreas de custos, planejamento financeiro, gestão de caixa
e assim por diante. O Grupo G caracterizava-se por ser uma organização vocacionada, acima de tudo, para a
obtenção de resultados financeiros. Os executivos do Grupo G que se destacavam em missões de corte de
custos e otimização de lucros passavam à galeria dos heróis da empresa.
A austeridade era a marca registrada do Grupo G, expressa no despojamento de suas instalações físicas e na
obsessão em reduzir e controlçar custos, conduzindo a um estilo de administrar que bania o supérfluo e
execrava a ostentação. Os altos executivos jamais cogitavam ter carros importados (embora sua remuneração
assim o permitisse). No estacionamento da empresa era comum diretores e gerentes gerais chegarem com
carros com mais de 5 anos de uso, embora, evidentemente, possuíssem outros automóveis para seu lazer.
O Grupo G privilegiava também a hierarquia e a centralização de comando, que eram expressas no dia a dia
nos mínimos detalhes. Assim, na década dos 80, as mesas dos funcionários, no Grupo G, eram de tamanho
diferenciado, de acordo com a posição da pessoa: quanto mais elevado o cargo, maior o tamanho da messa.
Nas viagens, os funcionários também ficavam em hotéis e aposentos relacionados ao seu cargo (diretores em
hotéis 5 estrelas, gerentes em hotéis 4 estrelas e assim por diante). No dia a dia, nos horários de cafezinho, os
funcionários tinham direito a um café. Os gerentes tinham direito a café, água mineral e podiam repetir o café.
Dotado de um modelo de gestão autocrático e centralizador, o Grupo G privava pela eficiência nos seus
processos operacionais. Em todos os setores e divisões da empresa, havia uma preocupação constante em
aperfeiçoar a execução das atividades, das rotinas, dos sistemas e dos processos. Embora extremamente
exigidas quando ao seu desempenho, as pessoas eram respeitadas quanto aos seus direitos e sentiam-se parte
de algo maior, que era o crescimento e a própria eficiência da organização, que projetava uma aura imabtível
na comunidade empresarial. Os altos escalões da empresa também trabalhavam arduamente. A empresa
estimulava a atuação dos funcionários em equipes de projetos e o ritmo de trabalho era intenso. A rotatividade
funcional, nos cargos executivos, era praticamente nula.
A preocupação com a produtividade era evidente no Grupo G. Cada unidade da empresa mantinha
funcionando posto bancário, refeitório, atendimento médico-odontológico e, inclusive, um serviço específico
à disposição dos funcionários, que se encarregava de pequenas tarefas externas como pagamento de contas.
Nos escritórios, até o cafezinho era servido nas mesas das pessoas, em horários pré-determinados. Tudo
funcionava com precisão suiça (ou germânica). Cabia ao funcionário afastar-se o mínimo possível do seu
posto de trabalho, evitando desconcentrações desnecessárias. Na sede do Grupo G, os vidros das janelas
20
21. externas sempre permaneciam fechados e bloqueados por grossas cortinas, sendo alguns deles revestidos com
uma película que impedia enxergar o lado de fora. Havia um entendimento tácito, por parte dos funcionários,
de que olhar através das janelas era desperdício de tempo.
As pessoas sentiam orgulho pela organização e uma devoção extremada que, beirando a fanatização, muitas
vezes bloqueava a possibilidade de haver quaisquer críticas ou feedback negativo sobre a condução da
empresa. Mesmo nas suas vidas particulares – no convívio social, nas viagens – os executivos sentiam-se
ofendidos caso alguém ousasse falar mal do Grupo G. Eram pessoas obcecadas pelo trabalho, tecnicamente
atualizados, fanatizados pela cultura da empresa e pouco direcionados ao mundo exterior. O Grupo G
considerava que a sua tecnologia de gestão era muito superior à da maiora das outras organizações. Uma das
suas regras não escritas – praticamente um tabu – impedia que seus funcionários lecionassem em
universidades, nas horas de folga (salvo algumas execções), pois poderiam expor inadvertidamente a terceiros
o know-how da empresa.
Com forte ênfase em um posicionamento focado em crescimento e lucro, o Grupo G sempre primava pela
objetividade em suas operações, sendo que na década dos 80 operava várias usinas siderúrgicas em diversos
estados brasileiros.
3. A criação da Deep G
Com a legislação de reserva de mercado vigente no Brasil, a Deep Blue procurou alternativas estratégicas
para continuar operando no país, no segmento de prestação de serviços de processamento de dados. Dispondo
de pessoal capacitado e de equipamentos de última geração, localizados nas principais capitais brasileiras e
interligados on-line, a Deep Blue desejava encontrar uma forma de continuar a oferecer o processamento e a
transmissão de dados para grandes empresas e, se possível, ampliar a prestação de serviços para as empresas
do prórprio governo, que se mostravam um mercado promissor.
Na vigiência da lei de reserva de mercado, contudo, a Deep Blue não poderia continuar operando e, muito
menos, prestar serviços às empresas do governo, exceto se efetuasse uma associação com uma empresa
nacional. Na procura de um parceiro, a Deep Blue prospectou o mercado e julgou ter encontrado o perfil ideal
no Grupo G, seu cliente, uma empresa capitalizada, ética, e com certa influência política junto aos possíves
clientes – a área pública. Interessado no negócio, o Grupo G concordou em estruturar uma joint venture, com
a Deep Blue em situação minoritária, como mandava a lei. Foi criada, então, a Deep G Serviços de
Processamento.
4. A estrutura organizacional da Deep G
O comando das operações da Deep G, sediada no Rio de Janeiro, foi confiado a um diretor executivo do
Grupo G, que havia se notabilizado por sua gestão numa das usinas siderúrgicas do grupo. Juntamente com
esse diretor, foram transferidos do Grupo G mais 10 pessoas, sendo 3 gerentes e alguns especialistas em
finanças e em sistemas.
A Deep Blue deslocou para a Deep G aproximadamente 300 pessoas, que compunham a sua antiga divisão de
serviços. Esses profissionais eram, preponderantemente, das áreas de sistemas e de marketing e vendas. Desse
total, 52 eram executivos que se incorporaram à Deep G através de um contrato de adesão com prazo pré-
definido de 2 anos. Após esse prazo, os mesmos poderiam optar entre permanecer na Deep G ou retornar à
Deep Blue, onde participariam de um programa de demissão incentivada. A atuação do gerente geral da
divisão de serviços da Deep Blue foi decisiva para que os seus subordinados aceitassem a transferência para a
Deep G. Seus argumentos variaram desde o enaltecimento das virtudes do novo parceiro, o Grupo G, até o
oferecimento de incentivos financeiros para que aceitassem a mudança.
A Deep G passou a utilizar as instalações físicas e os computadores da Deep Blue nas diversas capitais dos
estados brasileiros, prestando serviços de processamento e de transmissão de dados em nível nacional. Além
disso, a Deep G estava autorizada, também, a comercializar e implantar os sistemas que haviam sido
desenvolvidos no Grupo G, como gerenciamento de materiais, gestão de caixa corporativo e administração de
recursos humanos.
21
22. 5. Cenas de um casamento (o dia a dia da Deep G)
Formalizada a constituição da Deep G, o board executivo da empresa passou a operar no Rio de Janeiro. Nos
dois primeiros anos de funcionamento, algumas cenas simbolizam a interação entre as pessoas originárias,
respectivamente, da Deep Blue e do Grupo G. Para fins ilustrativos, foram selecionadas apenas algumas
cenas:
5.1 Atrasou, fica para trás
Oficializada a joint venture, os executivos da Deep Blue que seriam transferidos para a Deep G foram
convidados a conhecer a matriz do Grupo G. Motivados, eles imaginaram uma recepção festiva, com direito a
confraternizações, troca de idéias e elaboração de estratégias conjuntas. A viagem ocorreu num domingo à
tarde e a hospedagem foi em um hotel de status inferior ao do chamado padrão Deep Blue. No dia seguinte,
ao invés de automóveis de luxo, um ônibus apanhou o pessoal da Deep Blue no hotel, na hora marcada,
deixando alguns retardatários para trás. Durante uma semana de trabalho, na matriz do Grupo G, os
executivos da Deep Blue cumpriram uma rotina monótona, acomodados em cadeiras de plástico e ouvindo
palestras e apresentações que enalteciam os predicados do grupo G. Os almoços eram no refeitório da fábrica.
5.2 Fora com o inglês
Instalado no Rio de Janeiro, na nova sede da Deep G, o diretor executivo (ex-Grupo G) despacha com os
novos integrantes da empresa, oriundos da Deep Blue e do Grupo G. Ele se dirige à platéia e ridiculariza
alguns projetos apresentados pelo pessoal da Deep Blue que haviam sido entregues em inglês. Ele diz: “A
língua oficial do Grupo G é o português e, portanto, a língua oficial da Deep G será também o português”. E
ponto final.
5.3 Maus hábitos
Reunido com a alta administração do Grupo G, o diretor executivo da Deep G troca idéias sobre o andamento
das atividades da nova empresa. Todos concordam que o pessoal originário da Deep Blue tinha uma série de
maus hábitos. Era necessário colocá-los nos eixos, pois se comportavam de modo abusado, eram folgados e
pouco propensos ao trabalho. O pessoal do Grupo G estava chocado que muitos chefes da Deep Blue
costumavam ignorar os erros dos seus funcionários.
5.4 Religião
Nas constantes reuniões de trabalho na Deep G, o diretor executivo declarava a todos que a empresa devia se
espelhar no Grupo G, onde o trabalho sério e árduo sempre havia dado bons frutos. Essas declarações
costumavam gerar um certo mal-estar no pessoal da Deep Blue, ao mesmo tempo em que eram recebidas com
satisfação pelo pessoal do Grupo G.
5.5 Hora do cafezinho
Nos corredores da Deep G, no Rio de Janeiro, os funcionários oriundos da Deep Blue aproveitavam a hora do
cafezinho para confraternizar. Num dado momento, uma das pessoas fez um comentário irônico, que
provocou um riso nervoso nos demais. Ele disse: “No Grupo G quem manda é uma mulher, a Dona
Austeridade. Ela está presente em tudo: na simplicidade dos escritórios, na comida servida nos refeitórios e
nas cadeiras de plástico das salas de treinamento”.
5.6 Natal triste
Ao final do primeiro ano de atividade da nova empresa, às vésperas do Natal, o diretor executivo da Deep G
convoca uma reunião com todos os funcionários e, alegando prejuízos financeiros continuados, divulga uma
lista de demissões, atingindo cerca de 20% do quadro funcional da empresa. Todos os demitidos, sem
exceção, eram originários da Deep Blue.
6. Divórcio
Os dois anos iniciais da Deep G foram especialmente caóticos, apesar dos esforços da diretoria. A empresa
não estava obtendo sinergia interna e, preocupantemente, o cenário originalmente projetado pela Deep Blue e
pelo Grupo G teimava em não corresponder à realidade.
22
23. A Deep G enfrentou grandes percalços na viabilização técnica de sua rede nacional de transmissão de dados,
passando a conviver com um gargalo no atendimento a clientes. Ademais, ao tentar conquistar como clientes
as empresas públicas, a Deep G não soube vencer o poderoso lobby de outras grandes corporações que já
atuavam neste mercado. Os resultados foram registrados, obviamente, no sismógrafo dos balanços anuais da
Deep G, que permaneceram no vermelho.
O resultado do casamento da Deep Blue com o Grupo G talvez possa ser resumido no fato de que após dois
anos de operação da Deep G, apenas 1 dos 52 executivos oriundos da Deep Blue optou por permanecer na
empresa. Todos os demais se retiraram.
Com base nas informações que você leu aqui e nas informações seguintes, responda as perguntas:
23
24. 1. CULTURA ORGANIZACIONAL
1.1 Conjunto de pressupostos básicos que determinado grupo tem inventado ou desenvolvido no processo
de aprendizagem para lidar com problemas de adaptação externa e integração interna.
1.2 Maneira correta de perceber, pensar, sentir e agir em relação a situações organizacionais
1.3 O modo como as coisas são realizadas num determinado ambiente de trabalho
1.4 O jeitão ou a personalidade da organização, permitindo antever atitudes, comportamentos e até mesmo
o direcionamento da tomada de decisão
1.5 Modelos mentais alicerçados em mitos, ritos, tabus, crenças, regras e idéias preestabelecidas que,
presentes na forma de valores culturais de cada empresa, influenciam o modo de encarar o mundo e se
adaptar a ele
1. Quais os valores que expressam a cultura organizacional da Deep Blue e do Grupo G. Indique esses
valores escrevendo as siglas DB ou GG no espaço antes de cada frase. Se o valor for inerente aos dois,
indique isso.
[ ] A gestão por resultados (vendas, metas) nos conduz ao lucro
[ ] A austeridade nos protege dos períodos de vacas magras
[ ] A pontualidade e a obediência hierárquica geram sucesso na carreira
[ ] Levamos nossa vida profissional em alto estilo
[ ] A gestão de custos viabiliza o lucro
[ ] Somos cidadãos do mundo
[ ] Não podemos expor know-how porque outros podem copiá-lo
[ ] No mundo empresarial, a ostentação deve ser evitada
[ ] Ética em demasia pode nos prejudicar
[ ] Os sentimentos e as emoções são secundários frente ao lucro
2. MITO ORGANIZACIONAL
2.1 Herói civilizador é alguém que deu alma e vida à empresa e forneceu-lhe um modelo de atuação.
Geralmente é o fundador – ou o revitalizador – da organização
2.2 Nem todos os mitos – ou heróis – tendem a ser carismáticos. Alguns demonstram ser pessoas difíceis e
insensíveis. Contudo, apesar de relacionamento difícil, despertam admiração e confiança pelos seus feitos
2.3 Heróis podem ser criados, como por exemplo os “campeões de vendas do mês”. Eles vencem desafios.
Assumem o palco durante determinado tempo. São heróis situacionais.
2.4 Narrativa dramática de eventos imaginados geralmente têm fundo de verdade e são ligadas à figura de
um herói.
2. Com base nos conceitos acima, identifique no caso um mito da Deep Blue e um mito do Grupo G.
2.1 Mito Deep Blue: ________________________________________________________
2.2 Mito Grupo G: __________________________________________________________
3. SÍMBOLOS DA CULTURA ORGANIZACIONAL
3.1 Artefatos materiais criados pelas organizações que refletem seus valores e orientações
3.2 Ícones como automóveis de luxo, design dos móveis dos executivos e roupa
3.3 Imagens como logotipo, estilo do vestuário predominante na empresa
3.4 Arquitetura dos prédios, escritórios abertos ou fechados, estacionamento com vagas privativas,
banheiro na sala
3. Quais são os símbolos das culturas organizacionais da Deep Blue e do Grupo G. Indique os
respectivos símbolos escrevendo DB ou GG ao lado do respectivo símbolo.
[ ] Trajes escuros
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25. [ ] Tamanho das mesas
[ ] Automóveis com alguns anos de uso
[ ] Instalações despojadas
[ ] Janela com vidros opacos
[ ] Automóveis de luxo
[ ] Hotéis 5 estrelas para gerentes
4. CONTRACULTURA ORGANIZACIONAL
4.1 Grupos ou subgrupos que rejeitam frontalmente aquilo que a organização representa ou o que ela tenta
conseguir
4.2. Oposição direta aos valores dominantes ou à estrutura de poder da empresa
4.3 Oposição às interações e intercâmbios que se encontram enraízados nos valores da cultura dominante
4.4 Tentativa das pessoas de reconquistarem alguma sensação de controle sobre suas vidas, ridicularizando
ou menosprezando a cultura que a empresa pretende estabelecer
4. 5 Pode surgir em épocas de tensão ou no decorrer de grandes transformações
4. Indique um indício de contracultura na Deep G: ______________________________________
5. CULTURA ORGANIZACIONAL DENSA
5.1 Alto grau de valores e crenças compartilhadas pelas pessoas
5.2 Intensa influência da cultura organizacional orientando o comportamento das pessoas
5.3 As pessoas reagem de acordo com valores centrais da organização, existindo pouca discórdia ou
ambigüidade
5. Indique com um “x” as organizações com cultura densa:
Deep Blue ( ) Grupo G ( ) Deep G ( ) Todas as 3 ( )
6. FORÇA MOTRIZ ORGANIZACIONAL
6.1 Pertencente ao núcleo da cultura organizacional, a força motriz é a vocação natural da empresa,
moldada pelo mito da respectiva organização. É monolítica
6.2 De acordo com a empresa de consultoria internacional Kepner, Tregoe, a Força Motriz de uma
organização normalmente obedece a uma classificação composta por cinco tipos básicos: Vendas e
Distribuiçãpo, Cresicmento e Lucro, Produtos Oferecidos, Necessidades do Mercfado e Produção e
Tecnologia.
6. Quais são as respectivas forças motrizes das empresas abaixo?
Deep Blue: _________________________________
Grupo G: ___________________________________
Deep G: ____________________________________
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26. 7. RITO DE SOCIALIZAÇÂO
7.1 Integração de novos funcionários em um processo de socialização fundamentado no contato com vários
executivos e diversas áreas da empresa com a finalidade de mostrar como a empresa funciona, ou seja,
quais os valores compartilhados
7.2 Treinamento com ênfase em modelos sociais, padrões comportamentais e códigos de conduta aceitos e
estimulados pela empresa
7. Qual das três empresas apresenta, de acordo com os dados do caso, o processo de socialização mais
claramente definido?
Deep Blue ( ) Grupo G ( ) Deep G ( ) Todas as 3 ( )
8. CLIMA ORGANIZACIONAL
8.1 Fenômeno resultante da interação dos elementos da cultura
8.2 Percepção resumida da atmosfera e do ambiente da organização
8.3 Indicador do nível de satisfação das pessoas no trabalho
8.4 Medida de até que ponto estão sendo cumpridas as expectativas das pessoas sobre como se deveria
trabalhar na empresa
8. Indique abaixo, escrevendo a sigla da empresa, o clima organizacional correspondente. Deep Blue
(DB), Grupo G (GG) e Deep G (DG). Se o clima organizacional estiver em mais de uma empresa,
indique:
[ ] Orgulho em integrar o quadro funcional da empresa
[ ] Pouco direcionamento ao mundo exterior, auto-suficiência
[ ] Conflitos internos
[ ] Clima de liberdade psicológica para expor idéias
[ ] Fanatização e devoção cega à empresa
[ ] Falta de interação produtiva entre as pessoas
[ ] Sentimento de pertencer a algo maior
[ ] Impossibilidade de feedback negativo sobre a empresa
[ ] Vom relacionamento interpessoal
[ ] Críticas à companhia são tomadas como ofensas pessoais
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27. 8. Trabalho Final
Considerando os conceitos apresentados e debatidos ao longo das últimas aulas, o grupo
deve selecionar uma empresa real e responder as seguintes perguntas:
• Quem é o mito organizacional da empresa? Está vivo? Ou se trata de empresa sem
mito organizacional consolidado?
• Aponte os símbolos da cultura organizacional. Há privilégios para diretores?
Gerentes? Quais são?
• Há indícios de contracultura organizacional? Quais? Greves?
• A empresa tem cultura organizacional densa? Indique alguns elementos que
comprovem essa afirmação.
• Aponte a força motriz organizacional da empresa e indique elementos que apontam
nessa direção.
• Cite alguns ritos de socialização praticados na empresa. Integração de novos?
Despedida de aposentados? Prêmios por desempenho? Festa de final de ano?
• Fale sobre o clima organizacional, indicando elementos que comprovem as
afirmações.
Responda as perguntas e entregue o trabalho com o nome dos componentes do grupo.
Prepare uma apresentação em power point, respondendo uma pergunta em cada tela. Esta
apresentação deverá ser feita em sala de aula, na aula final. Cada grupo terá 15 minutos
para apresentar seu trabalho.
7. Leitura
Como a propaganda ajudou a implodir a Vésper
Armando Levy (*)
O lançamento do livro “Propaganda, a arte de gerar descrédito”, editado pela Editora da
Fundação Getúlio Vargas, provocou alguns debates sobre a eficácia da propaganda e levou
alguns publicitários a uma defesa apaixonada de sua arte. Para os que sairam em defesa da
publicidade, a “propaganda brasileira é boa, uma das melhores do mundo”. Segundo eles,
“quando a comunicação de um produto gera desgaste para a marca, o problema, na maioria
dos casos, deve-se à pouca qualidade do produto em si e não à comunicação que é feita
dele”. Esta posição parte do princípio de que os produtos e a propaganda que é feita deles
são universos separados, estanques e incomunicáveis.
Este artigo tem o objetivo de aprofundar essa discussão entre “propaganda boa” e “produto
ruim”, discutindo um caso bem real, o da criação, lançamento e queda da Vésper.
Empresa inovadora
A Vésper tinha um projeto tecnológico inovador. Sua tecnologia, baseada em rádio, era
similar à telefonia celular, mas seria usada para a instalação em tempo recorde de uma
27
28. grande infra-estrutura para telefonia fixa. Com isso a direção da Vésper esperava conquistar
em pouco tempo uma grande base de clientes, evitando gastos elevados com infra-estrutura
como cabos, fios, postes, tubulações e ruas quebradas.
O sistema adotado pela empresa, o WLL, sigla de wireless local loop ou conexão local sem
fio, em português, funcionava através da instalação de torres de rádio na freqüência de 1,9
GB, a mesma da telefonia celular. Essa torres conectavam-se ao centro operacional da
empresa via conexão em banda larga. Dessa forma, os moradores das residências ao redor
da torre não precisavam nada além de ligar um aparelho telefônico na tomada, dotado
também de receptor e transmissor de rádio, para ter acesso ao sinal telefônico
instantaneamente.
Bastante inovador, porque cortava a zero a necessidade de extensões de fios até a casa do
cliente, o sistema tinha, no entanto, algumas limitações dramáticas. A primeira delas era a
de que se tratava de um sistema claramente experimental, ainda pouco testado, que podia
apresentar falhas de conexão entre a Vésper e as outras operadoras de telefonia, o que de
fato ocorreu e continua a ocorrer ainda hoje. A outra limitação importante era o fato de que
a linha da Vésper permitia uma conexão com a Internet a velocidades muito baixas, algo ao
redor de 14,4 Kb, velocidade essa já na época totalmente suplantada por conexões discadas
com velocidades ao redor de 56 Kb que podiam ser conseguidas com a linha da
concorrente.
Os investimentos iniciais da Vésper, fixados em alguns bilhões de reais, permitiram criar
uma infra-estrutura de torres bastante limitada. Na verdade, a maior parte dos recursos
serviu para a implementação de centrais operacionais, além de um sistema de faturamento
de contas telefônicas adquirido de uma grande empresa de tecnologia de informação que
simplesmente não funcionava a contento e só veio a operar precariamente mais de três
meses após o início das operações da empresa.
O fator realidade
No início do ano 2000, quando a empresa entrou em operação, qual era a realidade da
companhia? Pouco mais de 60 torres implementadas em 17 Estados do País. Muitas
localidades não tinham torre alguma. Na cidade de São Paulo, bairros densamente
habitados, com forte demanda por telefone, como a Penha, na zona leste, tinham apenas
uma torre instalada. Ou seja, na data de seu lançamento, a empresa tinha capacidade real de
atendimento a não mais do que 120.000 clientes potenciais em todo o País. Em cidades
como São Paulo, essa capacidade de atendimento ficava limitada a 70.000 residências.
Se esta era a situação da oferta de linhas da Vésper, na ponta da demanda a empresa sabia
que as classes A e B sonhavam com uma segunda linha telefônica especificamente para uso
da Internet, que crescia exponencialmente no início do ano 2000. Em casas conectadas à
Internet e com moradores adolescentes, as famílias viviam o drama de terem a sua única
linha telefônica permanentemente congestionada.
28
29. Diante de um quadro como esse, com uma capacidade de atendimento limitada e com um
produto que não parecia atender a principal expectativa do público consumidor, o que seria
recomendável fazer em termos de propaganda?
O fator propaganda
Nas reuniões de briefing com a agência de propaganda, os problemas do produto foram
evidenciados: instabilidade técnica e impossibilidade de conexão à Internet eram os dois
pontos críticos, que poderiam impactar as vendas negativamente. A Vésper e a agência de
propaganda decidiram que esses problemas não seriam apontados pela propaganda. Para as
equipes de comunicação da empresa e da agência, a melhor alternativa seria explicitar os
problemas dos produtos aos consumidores no momento da venda, através do telemarketing,
o que permitiria argumentar, explicar, justificar e garantir a venda. Para a agência de
propaganda, o lado bom do produto, ou seja, o fato de que bastava comprar o aparelho
telefônico e ligá-lo na tomada para se ter uma linha 100% funcionando, significava a
libertação dos usuários de telefonia de antigos modelos que exigiam fios, cabos,
instalações, plugs, tomadas, postes e buracos nas ruas. “O usuário de telefone no Brasil
conquistou a liberdade!”, diziam os publicitários.
Com esse objetivo em mente, ou seja, mostrar a chegada da “liberdade” ao serviço de
telefonia brasileiro, a agência criou uma campanha publicitária cujo principal slogan era:
“Agora você tem liberdade de escolha”. Por sugestão da agência, a campanha previa
anúncios massivos em televisão, jornais, revistas, rádios, outdoors, por todo o país, para
marcar sem questionamentos o lançamento de uma grande empresa de telefonia.
Propaganda x Realidade
Duas centrais de atendimento telefônico estavam prontas e equipadas para receber as
ligações dos futuros clientes, uma em Campinas (SP) e outra em Macaé (RJ). Cada uma
dessas centrais reunia não mais do que 400 atendentes. Com a entrada da campanha
publicitária no ar, a procura pelas linhas da Vésper configurou-se em um dilúvio. Para os
homens da agência de propaganda, a forte demanda era a prova inequívoca da eficácia da
campanha. Entretanto, considerada a elevada demanda por telefones fixos na época, é
sensato supor que qualquer campanha, produzida por qualquer agência, se traduziria em
vendas a curto prazo.
As áreas de atendimento a clientes recebiam mais de 160.000 ligações por dia, das quais só
conseguiam atender 4.000. Dessas 4.000, menos de 5% podiam, de fato, receber uma linha
porque as outras 95% estavam simplesmente fora da área de cobertura das torres. E entre as
que podiam, muitos clientes acabavam rejeitando o serviço porque a linha não permitia
acesso à Internet, a principal demanda das classes A e B.
Muitos operadores de telemarketing, desesperados com a perda de vendas, começaram a
inovar na abordagem e convidavam o cliente a usar a linha da concorrente para acesso à
Internet e a linha da Vésper para serviço de voz. O argumento deles era: “para voz, nosso
serviço é imbatível porque permite atender duas ligações ao mesmo tempo, tem secretária
eletrônica, tem identificador de chamadas”, serviços que a concorrente não tinha na época.
29
30. A verdade do produto, seus problemas técnicos, suas deficiências, contrariavam
dramaticamente a afirmação da propaganda, que garantia a chegada da “liberdade de
escolha”. Que liberdade de escolha era essa que obrigava o cliente a usar sua linha de voz
para a Internet e ter que assumir um novo telefone para suas chamadas de voz?
Se você acompanhou um pouco da história da Vésper sabe que a empresa está sendo
incorporada pela Embratel sem o desembolso de dinheiro. Ou seja, bilhões em
investimentos, um conceito inovador em tecnologia, uma proposta de atendimento a
clientes que evitava a saída fácil da terceirização, acabaram no depósito das experiências
empresariais fracassadas. Antes disso, porém, mais de 2.000 profissionais perderam seus
empregos e a dura verdade é que os acionistas jamais vão recuperar seus investimentos.
Análises? Justificativas? Poucas. Foram feitas algumas tentativas de explicar a queda como,
por exemplo, culpar a Anatel por não ter permitido à empresa operar o serviço de SMS na
freqüência 1,9 GB ou o alto grau de endividamento da empresa com fornecedores como
Lucent, IBM, Northel, entre outros. No mais, um silêncio absoluto. Mas e a propaganda?
Ora, segundo a agência de propaganda que coordenou a campanha, a publicidade foi um
enorme sucesso! No entanto, a dura realidade é que a campanha da “liberdade de escolha”
vendeu, a custos próximos a R$ 60 milhões, o que a empresa, de fato, não podia entregar.
Gerou expectativas que a realidade se encarregou rapidamente de destruir. Até os poucos
que podiam escolher entre Vésper e Telefonica perceberam que o produto da Vésper era
inferior, apresentava falhas de conexão e, pior, não acessava a Internet.
O que teria sido sensato fazer em termos de comunicação, considerando a realidade da
empresa? A Vésper tinha em mãos uma informação preciosa: sabia, com precisão cirúrgica,
quais residências conseguiria atender porque alimentara sua base de dados com todos os
CEPs das ruas que suas torres de rádio cobriam. Com uma informação como essa e
conhecendo as limitações técnicas de seu produto, a empresa tinha como focar a
comunicação. Além de ações de relações públicas com os públicos que de fato podia
atender, a empresa podia ter considerado uma comunicação mais localizada, investindo em
propaganda em jornais e rádios com penetração nas cidades onde tinha como prestar
serviços, inclusive jornais de bairro e televisões comunitárias, sem falar em sites que se
relacionam com públicos específicos identificados pelo CEP, o que resultaria em uma
posição inovadora também em sua comunicação. No entanto, a Vésper optou por
propaganda de massa, gerando expectativas irrealizáveis em escala astronômica.
Leia as cartas com reclamações contra a Vésper nas colunas de defesa do consumidor da
época e de hoje e você saberá o que restou daquela propaganda maravilhosa, absolutamente
equivocada e irrealista. A Vésper cometeu muitos erros e a propaganda que marcou seu
lançamento foi, talvez, um dos maiores. Culpa da agência? Não apenas dela. Tanto a
empresa quanto a agência imaginaram que tudo o que importava em um primeiro momento
era vender, a qualquer preço. Eles esperavam que, após as vendas, os “pequenos”
problemas técnicos inerentes ao produto pudessem ser resolvidos. Mas não foram. O
resultado dessa aventura foi a destruição de uma empresa inovadora, que poderia significar,
de fato, uma alternativa à Telefonica, uma alternativa que desse aos clientes a liberdade de
escolha que a maioria ainda não tem.
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31. Lições
A odisséia da Vésper, que ainda está por merecer uma análise mais realista por parte do
mundo corporativo, coloca uma questão incomoda para os conselhos de administração das
empresas. Os acionistas precisam decidir se querem resultados a curtíssimo prazo, que
poderão ser comprometedores no futuro, ou se querem construir empresas sólidas,
ancoradas em meio à sociedade, que lucrem, gerem emprego e bem-estar social. Se a opção
é por empresas duradouras, socialmente importantes, então é mais do que hora de rever o
uso de ferramentas como a propaganda de massa, que geram lucros extraordinários para
alguns e terminam por destruir marcas e imagens corporativas como a da Vésper, cuja
história empresarial não chegou a completar três anos a despeito de enormes investimentos
em propaganda de massa.
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(*) Armando Levy é jornalista, autor do livro “Propaganda, a arte de gerar descrédito”, lançado pela Editora da
Fundação Getúlio Vargas, e professor de Marketing da Universidade Metodista.
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