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I UNIDADE: VANGUARDA EUROPEIA.
CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES:
Abalada em suas estruturas socioeconômicas e políticas, em decorrência
dos conflitos desencadeados pela 1ª Guerra Mundial, que vai de 1914 a
1918, a Europa dos anos 20 é também marcada por uma série de mudanças
implementadas pelo desenvolvimento da indústria e da tecnologia. O início
do século XX é tido como apogeu da época industrial e técnica. Verifica-
se, nesse período, o crescimento acelerado da indústria automobilística,
que, de três mil carros produzidos no ano de 1900, passa em 1913 a mais de
cem mil; o surgimento de grandes transatlânticos; o aeroplano, a realização
dos primeiros voos extensos, um sobre o canal da Mancha e outro sobre os
Alpes, realizados, respectivamente, em 1909, por Louis Blériot e, em
1910, por George Chávez; a construção de grandes estradas de ferro, como
a Transsiberiana, que ligava a Rússia Ocidental à costa do Pacífico,
finalizada em 1905, a Transafricana e a Transandina, a qual, ligando
Buenos Aires a Valparaíso, era apontada como “uma grande proeza da
engenharia, pois os trilhos se erguem a três mil metros , nos Andes, na
fronteira argentina”1
; as primeiras experiências de transmissão radiofônica,
1
In: PERLOFF, Marjorie. O movimento futurista. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
1993, p. 11.
de transmissão de imagens e da radiotelegrafia, entre outras invenções, que,
encurtando distâncias, agilizando os meios de comunicações, imprimiram
ao novo século um novo ritmo mais veloz, mais dinâmico.
Diante desse cenário de tanta agitação, os artistas e intelectuais europeus da
época começam a sentir a necessidade de romper com os padrões estéticos
em vigor, por considerá-los não mais adequados para expressar esse novo
tempo. A necessidade de inovar, de imprimir também às artes um ritmo
mais dinâmico leva-os a uma ruptura muitas vezes bastante radical com os
valores estéticos e ideológicos que norteavam a arte até então. Surge,
assim, em vários pontos da Europa, uma série de movimentos a cujo
conjunto se dá o título de Vanguarda Europeia, do qual fizeram parte o
Futurismo, o Expressionismo, o Cubismo, o Cubo-Futurismo, o Dadaísmo,
o Espiritonovismo e o Surrealismo, e sobre os quais faremos algumas
considerações em função de sua ressonância no ideológico e estético que
norteavam a poética explícita (manifestos e textos teóricos) e implícita (
textos literários) dos nossos modernistas. .
ORIGEM E SIGNIFICADO DO TERMO VANGUARDA
Segundo os dicionários etimológicos, o termo vanguarda provém do
francês – avant-garde – e é empregado para designar a tropa de frente de
uma unidade militar. Em francês, os termos avant e garde, entre outros
significados, indicam também,, respectivamente, “o que vem antes ou
primeiro” e “guarda”, no sentido de corpo militar. Possui, portanto, esse
termo um sema de origem bélica, na medida em que, dentro de um contexto
militar, remete para um conflito, para quem inicia uma ação, uma ofensiva.
Por isso mesmo, por extensão, vanguarda passou a designar, na arte,
aqueles movimentos que tinham como meta combater as velhas formas e
iniciar uma nova concepção artística.
Como tendências inovadoras da arte, os movimentos de Vanguarda são
impulsionados pelo desejo de ruptura, de mudança, de choque, de abertura.
Daí a negação dos modelos anteriores e dos valores que os sustentam.
Em termos bem genéricos, vanguarda remete a “todo e qualquer inovador
pregresso – de Dante a Cervantes, de Leonardo a Beethoven, de Cruz e
Sousa a Oswald de Andrade”.2
No entanto, “se todas as épocas conheceram suas “vanguardas”, só uma
conheceu a ´Vanguarda Histórica` , com maiúscula, título forjado para
designar os áureos anos de 1905 a 1935”.3
E é essa a que nos interessa.
Imbuídos, pois, desse espírito de inovação, os artistas dessa época rompem
com a tradicional ideia de harmonia, de beleza e de verossimilhança. Para
combater o bloco solidificado das concepções artísticas vigentes, advindas
da herança cultural recebida, partem eles, muitas vezes, para a
2
PATRIOTA, Margarida de Aguiar. Vanguarda, do conceito ao texto. Belo Horizonte: Itatiaia; Brasília:
INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1985, p. 18.
3
_____ Op. Cit. p. 18/19
agressividade, para o radicalismo. “Acusação precisa”, “insulto bem
definido” estavam na base de seus discursos e propostas.
Contrapondo-se à ideia de perenidade que norteava a concepção clássica da
arte, eles, em consonância com seu desejo de abertura, se voltam para o
experimentalismo, para o autogoverno, para a autorreflexão. Não é por
outra razão que, ao falar sobre o modernismo brasileiro, ou melhor, sobre a
nossa Vanguarda, Mário de Andrade destaca como um dos grandes ganhos
o direito permanente à pesquisa estética.
FUTURISMO
Em 20 de fevereiro de 1909, Filippo Tomasso Marinetti publica, no jornal
francês Fígaro, o manifesto do primeiro movimento vanguardista europeu,
o movimento Futurista, através do qual, de maneira bastante violenta e
precisa, critica a forma de expressão vigente, presa à tradição clássica.
Segundo ele,
A terra se estreita pela velocidade, por novos meios de comunicação,
transporte e informação e exige uma arte verbal completamente nova, que
pode expressar a completa renovação da sensibilidade humana trazida
pelas grandes descobertas da ciência.
É esse entusiasmo pela velocidade, pelo dinamismo advindo dos novos
inventos, que mobiliza o projeto ideológico e estético do futurismo.
Para imprimir à arte esse mesmo ritmo veloz e dinâmico, Marinetti, em seu
Manifesto Técnico da Literatura Futurista, apresenta como propostas
estéticas: abolição do adjetivo e do advérbio, considerados por ele
amortecedores do discurso; no lugar do adjetivo, propõe o uso do
substantivo para imprimir maior vigor à analogia criada, e cita, como
exemplos, multidão-ressaca, homem-torpedeiro, etc; preferência pelo
verbo no infinitivo, uma vez que o mais importante era o foco na ação;
quebra da sintaxe tradicional presa aos moldes clássicos, inadequados a
“essa nova linguagem de telefones, fonógrafos, aeroplanos, cinema”;
substituição da pontuação convencional por sinais da matemática e da
música, evitando as pausas que atrapalham a vivacidade do discurso;
palavras em liberdade e imaginação sem fios, ou seja, criação de imagens,
de analogias expressas em palavras livres, soltas, totalmente libertas de
qualquer convenção sintática ou lógica.
O entusiasmo pela tecnologia, pela máquina reflete-se no manifesto pela
prioridade dada à matéria na poesia em detrimento do eu. Para Marinetti,
fazia-se necessário “substituir a psicologia do homem, agora exaurida, pela
obsessão lírica da matéria.” 4
Esse entusiasmo exacerbado leva, por outro lado, a uma rejeição exagerada
do passado, evidenciada pela proposta radical de destruição das
bibliotecas, museus e academias, considerados por Marinetti “cemitérios de
esforços perdidos”.
4
MARINETTI, F. T. Manifesto Técnico da Literatura. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda
Europeia e Modernismo Brasileiro. Apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. 12.
ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994, p.97
EXPRESSIONISMO
Contemporâneo do Futurismo, o Expressionismo, movimento de origem
alemã, em consonância com o vanguardismo da época, também se encontra
norteado pelo mesmo espírito de ruptura e de abertura para implementação
de novas formas de expressão, vazadas na quebra da sintaxe convencional,
na eliminação das palavras supérfluas, tendo em vista o enxugamento e a
precisão da linguagem, para melhor atingir a essência do que se quer
expressar. Essa preocupação com a essência advém, sobretudo, do viés
espiritualista que norteia o Expressionismo.
Diferentemente do Futurismo, cuja motivação tem por base a admiração
pela máquina, pela tecnologia, o Expressionismo não vê com o mesmo
olhar otimista o surgimento desses avanços técnicos, sobretudo no que
tange à supremacia dada à máquina em detrimento do homem. Daí a
necessidade sentida de apreender o movimento interior das coisas e dos
seres. Aos expressionistas, não interessa o fato em si, mas a forma como o
artista o percebe, como ele o vê, pois, para eles, a realidade estaria dentro
de nós, e cabe-nos expressar o que percebemos, vemos e sentimos. Através
de suas produções artísticas, nos damos conta da inquietude, da angústia
humana frente ao vazio com o qual se defronta, ante a coisificação a que é
reduzido o homem dentro daquele universo tecnológico, conforme bem o
demonstram estes versos do poema No terraço do café Josty, do alemão
Paul Boldt, que assim diz, segundo tradução feita pelo português João
Barrento:
Praça de Potsdam: eternos gritos
Dos glaciares das lavinas febris
Pelas ruas fora: carros em carris
Os automóveis e os homens-detritos.
Observe-se que, em meio à agitação nervosa, frenética e, ao mesmo tempo,
indiferente da praça, assinalada pelos lexemas gritos, glaciares e febris,
quem primeiro assoma ao espaço poético são os carros, os automóveis,
enfim, as máquinas, como a demarcar a prioridade destas sobre os homens,
que, além de virem nomeados por últimos, aparecem referidos como
homens-detritos, ou seja, como restos, coisas sem valor.
Ao contrário, pois, dos futuristas, os expressionistas querem, antes de tudo,
destacar os aspectos negativos da modernidade sobre os homens. Para isso,
recorrem à estética do feio, do choque, através da deformação das imagens
e da utilização de palavras abjetas. A tensão, o conflito e a subjetividade
presentes em suas realizações levam os críticos a ver neles aproximação
com a estética barroca e a romântica. Não esqueçamos que o feio resultante
das deformações efetivadas na representação também faz parte da estética
do grotesco, explorada pelos barrocos quando “tudo o que era certo se
contorce”. Por outro lado, semelhantemente ao romantismo, o
expressionismo, como já vimos, além de ter a mesma origem alemã, tem
como veículo de suas ideias a revista Der Sturm (A Tempestade), o que
lembra o espírito pré-romântico da Sturm und Drang (ou seja, Tempestade
e Ímpeto).
CUBISMO
O termo cubismo surgiu a partir do quadro “Casas en l´Estaque”, de
Georges Braque, exposto no Salão de Outono de 1908, qualificado pelo
pintor Matisse, que fazia parte do júri, como “caprichos cúbicos” pela
semelhança de suas formas com elementos geométricos desmembrados em
facetas que se superpõem e intervêm umas nas outras. Braque e Pablo
Picasso são considerados os criadores do Cubismo na pintura. Na literatura,
Apollinaire é um dos responsáveis por sua introdução, cujo texto de 1913,
intitulado Meditações estéticas. A pintura cubista, segundo Gilberto Teles,
“pode ser tomado como um desses manifestos”5
.
Como já foi mencionado, a estética cubista privilegia o geometrismo, mas
dele também fazem parte a descontinuidade, a decomposição e
recomposição, a simultaneidade. Nas palavras do crítico de arte Jean
Cassou, trazidas por Guillermo de Torre, “o cubismo é um estilo de ruptura
intelectual, e as sua obras assumem o aspecto de uma combinação de
formas descontínuas. É por isso que se aproximam da poesia moderna, que
5
TELES, G. O Cubismo. In: Op. Cit., p. 109
foge ao discurso, à regularidade métrica, à pontuação e que se manifesta
sob a forma de fragmentos ou instantâneos” 6
.
É, também de 1913, o texto A antitradição futurista, de Apollinaire, cujo
título por si só já deixa entrever a relação do cubismo com as ideias
futuristas de ruptura total com o passado. Para além disso, o texto se
encontra em profunda consonância com as propostas cubistas, sobretudo no
que tange à sua estruturação pelo fragmentarismo, pela simultaneidade das
ideias apresentadas, quebrando assim com qualquer sequência lógica. Logo
no início do manifesto, tem-se uma frase constituída, em sua maior parte,
por palavras sem sentido, cujas primeiras letras terminam formando a
palavra “passadismo”, através da qual nos é apresentada a rejeição ao
passado. Eis a frase:
ABAIXO OPominir Aliminé SSkprsusu otalo ADIScramir MOnigme.
Depois disso, o texto segue estruturado de forma justaposta, com palavras
grifadas das mais diversas maneiras, em termos de tipos ou tamanhos
gráficos, dispostas na horizontal e na vertical, homologando através da
forma de expressão o que apresenta em termos de destruição e
construção. Registre-se que, no bloco no qual se encontram alocadas as
propostas de destruição das formas consideradas passadistas de expressão,
entre os vários pontos elencados, temos a supressão da harmonia
6
TORRES, Guillermo. Cubismo. In: _____ História das Literaturas de Vanguarda, Lisboa: Presença;
Santos,SP: Martins Fontes, 1972, p. 100
TORRE, G. Op. Cit., p.100
tipográfica, das sintaxes já condenadas pelo uso em todas as línguas e da
pontuação. Aspectos que já não fazem mesmo parte do manifesto.
Por sua vez, no bloco em que se encontram as propostas de construção de
uma nova forma de expressão artística, encontramos no item 1, referente a
Técnicas ou ritmos renovados sem cessar, encabeçando a lista, a
proposta de Literatura pura palavras em liberdade Invenção de palavras,
seguida das ideias, entre outras, de Plástica pura (5 sentidos),
Simultaneidade em oposição ao Particularismo e à divisão, os quais são
perceptíveis na organização textual do manifesto; já no item 2, relacionado
com intuição, velocidade e ubiquidade, podemos destacar também como
elementos corroboradores dessa relação, entre o que se diz e o que se faz,
proposições como Analogias e trocadilhos trampolins líricos e única
ciência das línguas calicó Calicut Calcutá cachacia Sofia o Sofos
suficiente oficiar oficial ó fios Aficionado Dona-Sol Donatello Doador dei
erradamente topedeiro, por meio da qual a propositura apresentada é ao
mesmo tempo realizada e, ainda, a paródia musical, resultante de uma
analogia sonora, da frase melódica constituída de MER........DE......que
significa Mar..... de.... com o termo MERDE, que em francês é Merda,
portanto, excrementos. E, na sequência, é isso que é oferecido a todos os
guardiães da tradição, a exemplo de pegadogos, professores, museus, etc.,
em contraposição à rosa que é ofertada aos responsáveis pela renovação
artística, começando por Marinetti, Picasso e o próprio Apollinaire, entre
tantos outros. Exaltação com a qual se encerra o texto.
CUBO-FUTURISMO
O Cubo-Futurismo tem sua origem na Rússia, mais precisamente, em
Moscou, a partir de 1913. Esse movimento vanguardista, como se
depreende do próprio título, tem como subsídios estéticos e ideológicos
muito do que foi proposto pelo Futurismo de Marinetti e pelo Cubismo de
Picasso e Braque, sobretudo, no que tange ao empenho em imprimir à arte
uma maior dinamização, o que, em termos de concretização artística, leva
também à adoção das técnicas futuristas e cubistas de libertação total da
palavra, fragmentação, decomposição, recomposição, simultaneidade.
Como o cubismo, o cubo-futurismo começou com a pintura. Entre os
pintores cubo-futuristas, Kazimir Malevich é apontado como responsável
pelo desenvolvimento desse estilo entre os russos, tendo sido o primeiro a
empregar o termo Cubo para falar de suas pinturas.
Diferente, porém, dos futuristas, os artistas russos investiam mais na práxis
do que na teoria e não compartilhavam da apologia futurista da máquina e
da guerra. Auto-intitulando-se de “comunistas-futurista, se encontravam
ideologicamente vinculados aos movimentos revolucionários que
culminaram com a Revolução de Outubro, de 1917, ocorrida na Rússia.
Para eles, a palavra era vista também como instrumento de transformação
social.
Em seu único manifesto coletivo, assinado pelos poetas David Burliuk,
Krutchônikh, Vladimir Maiakovski e Khlebnikov, de 1912, os cubo-
futuristas se colocavam como arautos do novo tempo e se insurgiam contra
o passado, criticando duramente, sobretudo, os poetas simbolistas, cujas
obras vazadas em uma “perfumada sensibilidade” não traduziam a
virilidade do seu tempo.
“A todos esses Kuprin, Block, Sologúb, Remizov, Avertchenko, Cherny,
Kusmin, Bunin, et., etc.,*
só está faltando uma casa uma casa à beira de
um rio. Tal recompensa o destino reserva também para os alfaiates.
Do alto dos arranha-céus discernimos sua nulidade!”7
Realizado de forma muito sintética, o poema Balalaica , abaixo transcrito,
de autoria de Maiakovski, traduz bem o viés estético do cubo-futurismo no
que diz respeito à assimilação dos procedimentos futuristas e cubistas e o
vínculo da poesia com os anseios revolucionários da época.
Vejamos o poema:
*
São todos nomes de poetas simbolistas russos acusados pelos cubo-futuristas de misticismo, abstração e
artificialismo da linguagem..
7
BURLIUK, D. et alii. Bofetada no gosto público. In: TELLES, G. Op. Cit. p.121
BALALAICA
Vladimir Maiakóvski
Balalaica
[como um balido abala
a balada do baile
de gala]
[com um balido abala]
abala [ com balido]
[ a gala do baile]
louca a bala
laica
(1913)
Para início de conversa sobre este poema, registre-se que o termo Balalaica
designa um instrumento musical de cordas, parecido com um bandolim ou
com um cavaquinho, usado na música popular russa.
Para além de intitular o poema, o termo Balalaica pode também ser visto
como matriz geradora do mesmo. Através de um processo de
decomposição, comum aos cubistas, o termo se desmembra em vários
outros, jogando, sobretudo, com as palavras bala e laica e com os fonemas
nelas presentes, com os quais cria o poeta outros termos, valendo-se para
isso das analogias e trocadilhos trampolins, proposto por Apollinaire em A
antitradição futurista, como se pode perceber em bala, baile, gala, abala,
balido, balada, laica, louca.
Em termos de conteúdo, o poema nos fala de um baile de gala, ou seja, um
baile da nobreza, uma vez que gala, segundo Aurélio, remete para trajes
solenes, ornamentação ou enfeites ricos e preciosos, o qual foi abalado por
uma bala laica, ou seja, uma bala que veio de fora, uma bala estranha
àquele meio. Em termos sonoros, os últimos vocábulos do poema
bala/laica recompõem o termo balalaica. E, se consideramos que este,
enquanto instrumento, se liga ao povo, podemos inferir que veio do povo, o
qual não teria vez em um baile de gala, a bala que detona esse baile. É o
povo, portanto, que, de forma irreverente, barulhenta (como um balido/
com um balido, termo que tanto pode ser lido como barulho e como
projetil), abala a nobreza. Isto tudo, porém, nos é passado através dos
recursos futuristas e cubistas adotados pelo poeta: fragmentarismo,
decomposição, recomposição, liberdade de expressão, criatividade,
concisão e simultaneidade.
Como observação final em torno desse movimento, vale a pena registrar
que, apesar de sua curta duração, o Cubo-Futurismo foi de grande valia
para a arte russa.
DADAÍSMO
Considerado o mais radical de todos os movimentos que constituíram a
Vanguarda Europeia, o Dadaísmo nasce em Zurique, na Suíça, tendo como
mentores cinco artistas que lá se encontravam refugiados por conta da
guerra, contra a qual se insurgiam, pela sensação de que todo um sistema
de civilização se desmontava bruscamente, e que nada, nem Filosofia, nem
Religião, nem Ciência, nada pôde impedir a catástrofe da guerra. São eles:
os alemães HUGO BALL e RICHARD HUELSEMBECK; o alsaciano
HANS HARP E OS ROMENOS, Marcel Jango e Tristan Tzara.
Posteriormente, a eles se juntaram o francês FRANCIS PICCABIA e o
chileno VICENTE HUIDOBRO.
Em decorrência do espírito de revolta, de frustração que norteava o grupo,
as propostas dadaístas são marcadas pelo ceticismo, pelo nihilismo. Para
eles, DADA, palavra com a qual batizaram o movimento, escolhida por
acaso em um dicionário, não significava NADA. O objetivo era, segundo
Tristan Tzara, “criar uma palavra expressiva que, mediante sua magia,
fechasse todas as portas à compreensão e não fosse um – ismo a mais”8
Daí
a valorização do non-sense, do absurdo, da contradição, do anarquismo, da
destruição que se depreende das ideias apresentadas em seus manifestos,
sobretudo, no Manifesto Dada 1918. Eis algumas delas:
• Eu redijo um manifesto e não quero nada, eu digo portanto certas
coisas e sou por princípio contra os manifestos, como sou também
contra os princípios...
• Assim nasceu DADÁ de um desejo de independência, de
desconfiança na comunidade./.../ Nós não reconhecemos nenhuma
teoria.
8
Apud TELLES, G. Op. Cit. p. 124/125
• Nós rasgamos, vento furioso, o linho das nuvens e das preces, e
preparamos o grande espetáculo do desastre, do incêndio, da
decomposição.
• Eu destruo as gavetas do cérebro e as da organização social:
desmoralizar por todo lado e lançar a mão do céu ao inferno, os
olhos do inferno ao céu, restabelecer a roda fecunda de um circo
universal nos poderes reais e na fantasia de cada indivíduo.
Em termos ideo-estéticos, assinale-se ainda que o Dadaísmo em sua crítica
exacerbada não poupa nem os próprios movimentos vanguardistas
precedentes, embora seja pela crítica visto como “um vértice de
confluências vanguardistas”9
; a ludicidade, o humor estão na base das suas
realizações assim como a técnica do ready made, estratégia que, em termos
gerais, consiste em criar em cima de material já existente, sendo, portanto,
de grande valia, a arte dadaísta, empenhada na desconstrução, na
dessacralização da arte, em consonância, pois, com sua proposta de
antiarte, antiliteratura. Nesse sentido, são exemplares as criações do
dadaísta Marcel Duchamp, realizadas com objetos como bacia sanitária,
roda de bicicleta, os quais são por ele, irreverentemente, transmudados em
objetos artísticos.
Entretanto, por mais paradoxal que pareça toda essa negação dadaísta, ela
termina se revertendo em positivo para a arte. Razão pela qual, para o
9
TORRES, G. Op. Cit.. p. 254.
escritor e filósofo André Gide, “Dada é o dilúvio após o qual tudo
recomeça”10
Parafraseando Fernando Pessoa, acreditamos poder dizer que DADÁ foi o
nada que é tudo.
ESPIRITONOVISMO
Conforme sugere o próprio nome, bem diferente da postura iconoclasta,
destruidora do Dadaísmo, esse movimento, de origem francesa, surge em
1918, portanto, no final da I Guerra Mundial, motivado realmente por um
espírito novo de reconstrução. Assim sendo, procedem a uma verdadeira
revirada ideológica na medida em que retomam a ordem, o bom senso, o
sentido do dever, a clareza, a sistematização e o equilíbrio.
Ao contrário de seus predecessores, reconhece, de modo bastante
conciliatório, a importância da tradição clássica; ao mesmo tempo, exalta
as mudanças implementadas nas artes pelos movimentos anteriores,
referentes às rupturas estéticas, à liberdade de expressão, à valorização dos
artifícios tipográficos responsáveis pelo nascimento de um lirismo visual e
à concisão poética. Vejamos, em termos ilustrativos, um trecho da
conferência O Espírito Novo e os Poetas, de Apollinaire:
10
TORRES, G. Dadaísmo. In: _____ Op. Cit. p. 237.
As pesquisas relacionadas com a forma tomaram desde então uma
grande importância. Importância legítima.
Como poderia esta pesquisa não interessar ao poeta, ela que podia
determinar novas descobertas no pensamento e no lirismo?
A assonância, a aliteração, tanto quanto a rima, são convenções
que têm, isoladamente, os seus méritos. Os artifícios tipográficos
levados muito longe, com uma grande audácia, tiveram a vantagem de
fazer nascer um lirismo visual que era quase desconhecido antes de
nossa época. Estes artifícios podem ir muito longe ainda e consumar a
síntese das artes, da música, da pintura, da literatura.
Tudo isso não é mais que uma pesquisa para chegar a novas
expressões perfeitamente legítimas.
Quem ousaria dizer que os exercícios de retórica, as variações
sobre o tema de: Eu morro de sede ao pé da fonte não tiveram uma
influência determinante sobre o gênio de Villon? Quem ousaria dizer
que as pesquisas de forma dos retóricos e da escola marótica não
serviram para apurar o gosto francês até sua perfeita florescência no
século XVII?
Ressaltam ainda os espiritonovistas a importância para a arte do riso, que
“fornece ao poeta um lirismo novo”; do ridículo, por ser inerente à própria
vida; da surpresa, “grande mecanismo do mundo moderno”, que advém da
invenção, da imprevisibilidade, do estranhamento provocado. Segundo
eles, “só devemos chamar de poeta àquele que inventa, àquele que cria. E,
ainda, a importância da alegria, considerada um valor característico da
poesia e do cotidiano, das coisas prosaicas como matéria de poesia, pois
“um lenço que cai pode ser para o poeta a alavanca com a qual ele
levantará todo um universo”.
Além desses aspectos, o Espiritonovismo vê como imprescindível o viés
nacionalista nas produções artísticas. Para eles,
A arte só deixará de ser nacional no dia em que o universo
inteiro, vivendo sob um mesmo clima, em casas edificadas sobre o
mesmo modelo, falar a mesma língua, com o mesmo sotaque, ou seja,
nunca.
Nessa perspectiva, exaltam por demais a França, conforme se pode ver
em afirmações como estas abaixo transcritas:
O espírito novo que dominará o mundo inteiro não se evidenciou
na poesia de nenhum país como na França.
Segundo o que podemos saber, não há quase poetas hoje que não
sejam de língua francesa.
Todas as outras línguas parecem fazer silêncio para que o
universo possa escutar melhor a voz dos novos poetas franceses.
Os franceses levam a poesia a todos os povos.11
Embora a Vanguarda Brasileira dialogue com quase todos esses
movimentos europeus, é com o Espiritonovismo que seus integrantes
mais se identificam, sobretudo, no que concerne à valorização da
tradição, do passado. Mas isso veremos depois.
SURREALISMO
Insatisfeito com o viés anárquico dos dadaístas, André Breton, que, até
então, se vinculava ao movimento, terminou rompendo com o Dadaísmo
e criando o Surrealismo, cujo manifesto data de 1924. Daí por que
vamos encontrar na história do movimento afirmações de que ele
11
Todas essas passagens citadas foram extraídas de APOLLINAIRE, G. O Espírito Novo e os Poetas. In:
TELES, G. Op. Cit. p. 155/166.
“nasceu de uma costela de Dada” ou de que “nasceu das cinzas de
Dada”12
.
Um dos pontos principais do rompimento diz respeito ao ceticismo, ao
niilismo que norteavam as propostas dadaístas. Breton concordava com o
pensamento de Rimbaud de, através da arte, mudar a vida. E, como
Marx, ele também queria contribuir para a transformação do mundo. Ao
niilismo dadaísta, opunham os surrealistas o conhecimento total do
homem, para o que tanto a poesia como a pintura não passavam de meios
de investigação que lhes permitiam como “cientistas” explorar o
inconsciente, o sonho, o maravilhoso. Para facilitar seu trabalho, Breton,
tomando por base as teorias freudianas, chegou inclusive a criar um
laboratório destinado a investigações oníricas – o Bureau des Recherches
Surrealistes ( Birô de pesquisas surrealistas) .
Diferentemente da visão escatológica, apocalíptica dos dadaístas, os
surrealistas, acreditando na vida, na possibilidade de mudança,
exaltavam o AMOR e o EROTISMO.
A dissidência, entretanto, não lhes impediu manterem alguns traços
dadaístas, a exemplo do amor ao protesto, da valorização do improviso e
da espontaneidade da linguagem.
12
A primeira das afirmações, segundo Guillermo de Torre é atribuída a Ribemont-Dessaignes, um
dadaísta que depois se torna também surrealista e a segunda a Tristan Tzara que era o líder do Dadaísmo.
Cf. TORRE, G. In: Op. Cit. vol. 3, p. 9
Protesto quanto à repressão a que era submetido o homem, minando a
sua verdadeira essência, impedindo sua ascensão como sujeito de si
mesmo, da sua história. Daí a valorização da infância, fase também
privilegiada pela psicanálise de Freud, por remeter para um período de
liberdade, em que, segundo os surrealistas, se encontra ausente “todo
rigor conhecido”;
A valorização do improviso e da espontaneidade da linguagem era
defendida pelos surrealistas por acreditarem ser, através do improviso e
da espontaneidade, que o inconsciente afloraria. Por essa razão, Breton
define surrealismo como “automatismo psíquico pelo qual alguém se
propõe a exprimir seja verbalmente, seja por escrito, seja de qualquer
outra maneira, o funcionamento real do pensamento. Ditado do
pensamento, na ausência de todo controle exercido pela razão, fora de
qualquer preocupação estética ou moral.”13
À semelhança dos futuristas, para quem as imagens mais poderosas são
aquelas que ligam realidades distantes, aparentemente diversas e hostis,
os surrealistas também definem como imagem forte aquela que apresenta
o maior grau de arbitrariedade, ou seja, aquela que leva mais tempo para
ser compreendida.
Outro ponto do ideário surrealista que o aproxima dos futuristas diz
respeito à valorização da imaginação, pela liberdade que ela propicia.
13
Apud TELES, G. Op. Cit., p. 191
Para Breton, a imaginação dá conta do que pode ser. E isso é o suficiente
para suspender um pouco a terrível interdição a que está sujeito o
homem. Por extrapolarem o nível do real, são também valorizados o
maravilhoso e a loucura: o primeiro, por incidir no sobrenatural, e o
segundo pelo comprazimento no delírio. Enfim, pelo que apresentam de
ilógico, de quebra com o racional, com o interdito.
Inserir um trecho de poema
Como o cubismo, o surrealismo se apresenta de forma vigorosa na
pintura, tendo como figuras expressivas Salvador Dali e Miró, entre
outros.
Na linha do automatismo psíquico, Salvador Dali14
adota o “método
paranoico-crítico”, ou seja, um método espontâneo de conhecimento
irracional, baseado na associação interpretativo-crítica de fenômenos
delirantes.15
Juntamente com Luis Buñuel, cineasta, Salvador Dali enveredou pela
arte cinematográfica, levando até ela o surrealismo. Dessa atividade
conjunta, resultaram dois filmes que são ícones do surrealismo no
cinema: O cão andaluz(1928) e A idade de Ouro(1930). Para consecução
das películas, adotaram eles o mesmo princípio da escritura automática
e, em comum, concordaram em não aceitar nenhuma ideia, nenhuma
14
Registre-se que a pintura de Salvador Dali não se prende apenas ao surrealismo. Sua obra apresenta
quadros feitos à luz do impressionismo, do cubismo, do fauvismo.
15
NÉRET, Gilles. Salvador Dali 1904-1989. German: Benedikt Taschen, 1994, p. 66
imagem que pudessem dar lugar a uma explicação racional, psicológica
ou cultural.
Embora também vinculado ao surrealismo, a pintura de Joan Miró se
distingue da de Salvador Dali por seu abstracionismo. Seus personagens:
seres humanos, animais, elementos da paisagem, etc. foram se reduzindo
a formas mínimas e a signos permeados de uma vitalidade e uma
impulsividade próprias de um desenho infantil, o que lhe confere uma
aparência sensível e ingênua que, entretanto, advém de uma profunda
introspecção e de sua capacidade visionária de indagar o subjetivo.16
16
Cf. BERNÁRDEZ, Carmen. Historia Del Arte. Primeras Vanguardias. Barcelona, Espanha: Palneta,
1994, p. 114.

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  • 1. I UNIDADE: VANGUARDA EUROPEIA. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES: Abalada em suas estruturas socioeconômicas e políticas, em decorrência dos conflitos desencadeados pela 1ª Guerra Mundial, que vai de 1914 a 1918, a Europa dos anos 20 é também marcada por uma série de mudanças implementadas pelo desenvolvimento da indústria e da tecnologia. O início do século XX é tido como apogeu da época industrial e técnica. Verifica- se, nesse período, o crescimento acelerado da indústria automobilística, que, de três mil carros produzidos no ano de 1900, passa em 1913 a mais de cem mil; o surgimento de grandes transatlânticos; o aeroplano, a realização dos primeiros voos extensos, um sobre o canal da Mancha e outro sobre os Alpes, realizados, respectivamente, em 1909, por Louis Blériot e, em 1910, por George Chávez; a construção de grandes estradas de ferro, como a Transsiberiana, que ligava a Rússia Ocidental à costa do Pacífico, finalizada em 1905, a Transafricana e a Transandina, a qual, ligando Buenos Aires a Valparaíso, era apontada como “uma grande proeza da engenharia, pois os trilhos se erguem a três mil metros , nos Andes, na fronteira argentina”1 ; as primeiras experiências de transmissão radiofônica, 1 In: PERLOFF, Marjorie. O movimento futurista. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1993, p. 11.
  • 2. de transmissão de imagens e da radiotelegrafia, entre outras invenções, que, encurtando distâncias, agilizando os meios de comunicações, imprimiram ao novo século um novo ritmo mais veloz, mais dinâmico. Diante desse cenário de tanta agitação, os artistas e intelectuais europeus da época começam a sentir a necessidade de romper com os padrões estéticos em vigor, por considerá-los não mais adequados para expressar esse novo tempo. A necessidade de inovar, de imprimir também às artes um ritmo mais dinâmico leva-os a uma ruptura muitas vezes bastante radical com os valores estéticos e ideológicos que norteavam a arte até então. Surge, assim, em vários pontos da Europa, uma série de movimentos a cujo conjunto se dá o título de Vanguarda Europeia, do qual fizeram parte o Futurismo, o Expressionismo, o Cubismo, o Cubo-Futurismo, o Dadaísmo, o Espiritonovismo e o Surrealismo, e sobre os quais faremos algumas considerações em função de sua ressonância no ideológico e estético que norteavam a poética explícita (manifestos e textos teóricos) e implícita ( textos literários) dos nossos modernistas. . ORIGEM E SIGNIFICADO DO TERMO VANGUARDA Segundo os dicionários etimológicos, o termo vanguarda provém do francês – avant-garde – e é empregado para designar a tropa de frente de uma unidade militar. Em francês, os termos avant e garde, entre outros significados, indicam também,, respectivamente, “o que vem antes ou
  • 3. primeiro” e “guarda”, no sentido de corpo militar. Possui, portanto, esse termo um sema de origem bélica, na medida em que, dentro de um contexto militar, remete para um conflito, para quem inicia uma ação, uma ofensiva. Por isso mesmo, por extensão, vanguarda passou a designar, na arte, aqueles movimentos que tinham como meta combater as velhas formas e iniciar uma nova concepção artística. Como tendências inovadoras da arte, os movimentos de Vanguarda são impulsionados pelo desejo de ruptura, de mudança, de choque, de abertura. Daí a negação dos modelos anteriores e dos valores que os sustentam. Em termos bem genéricos, vanguarda remete a “todo e qualquer inovador pregresso – de Dante a Cervantes, de Leonardo a Beethoven, de Cruz e Sousa a Oswald de Andrade”.2 No entanto, “se todas as épocas conheceram suas “vanguardas”, só uma conheceu a ´Vanguarda Histórica` , com maiúscula, título forjado para designar os áureos anos de 1905 a 1935”.3 E é essa a que nos interessa. Imbuídos, pois, desse espírito de inovação, os artistas dessa época rompem com a tradicional ideia de harmonia, de beleza e de verossimilhança. Para combater o bloco solidificado das concepções artísticas vigentes, advindas da herança cultural recebida, partem eles, muitas vezes, para a 2 PATRIOTA, Margarida de Aguiar. Vanguarda, do conceito ao texto. Belo Horizonte: Itatiaia; Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1985, p. 18. 3 _____ Op. Cit. p. 18/19
  • 4. agressividade, para o radicalismo. “Acusação precisa”, “insulto bem definido” estavam na base de seus discursos e propostas. Contrapondo-se à ideia de perenidade que norteava a concepção clássica da arte, eles, em consonância com seu desejo de abertura, se voltam para o experimentalismo, para o autogoverno, para a autorreflexão. Não é por outra razão que, ao falar sobre o modernismo brasileiro, ou melhor, sobre a nossa Vanguarda, Mário de Andrade destaca como um dos grandes ganhos o direito permanente à pesquisa estética. FUTURISMO Em 20 de fevereiro de 1909, Filippo Tomasso Marinetti publica, no jornal francês Fígaro, o manifesto do primeiro movimento vanguardista europeu, o movimento Futurista, através do qual, de maneira bastante violenta e precisa, critica a forma de expressão vigente, presa à tradição clássica. Segundo ele, A terra se estreita pela velocidade, por novos meios de comunicação, transporte e informação e exige uma arte verbal completamente nova, que pode expressar a completa renovação da sensibilidade humana trazida pelas grandes descobertas da ciência. É esse entusiasmo pela velocidade, pelo dinamismo advindo dos novos inventos, que mobiliza o projeto ideológico e estético do futurismo. Para imprimir à arte esse mesmo ritmo veloz e dinâmico, Marinetti, em seu Manifesto Técnico da Literatura Futurista, apresenta como propostas estéticas: abolição do adjetivo e do advérbio, considerados por ele
  • 5. amortecedores do discurso; no lugar do adjetivo, propõe o uso do substantivo para imprimir maior vigor à analogia criada, e cita, como exemplos, multidão-ressaca, homem-torpedeiro, etc; preferência pelo verbo no infinitivo, uma vez que o mais importante era o foco na ação; quebra da sintaxe tradicional presa aos moldes clássicos, inadequados a “essa nova linguagem de telefones, fonógrafos, aeroplanos, cinema”; substituição da pontuação convencional por sinais da matemática e da música, evitando as pausas que atrapalham a vivacidade do discurso; palavras em liberdade e imaginação sem fios, ou seja, criação de imagens, de analogias expressas em palavras livres, soltas, totalmente libertas de qualquer convenção sintática ou lógica. O entusiasmo pela tecnologia, pela máquina reflete-se no manifesto pela prioridade dada à matéria na poesia em detrimento do eu. Para Marinetti, fazia-se necessário “substituir a psicologia do homem, agora exaurida, pela obsessão lírica da matéria.” 4 Esse entusiasmo exacerbado leva, por outro lado, a uma rejeição exagerada do passado, evidenciada pela proposta radical de destruição das bibliotecas, museus e academias, considerados por Marinetti “cemitérios de esforços perdidos”. 4 MARINETTI, F. T. Manifesto Técnico da Literatura. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda Europeia e Modernismo Brasileiro. Apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. 12. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994, p.97
  • 6. EXPRESSIONISMO Contemporâneo do Futurismo, o Expressionismo, movimento de origem alemã, em consonância com o vanguardismo da época, também se encontra norteado pelo mesmo espírito de ruptura e de abertura para implementação de novas formas de expressão, vazadas na quebra da sintaxe convencional, na eliminação das palavras supérfluas, tendo em vista o enxugamento e a precisão da linguagem, para melhor atingir a essência do que se quer expressar. Essa preocupação com a essência advém, sobretudo, do viés espiritualista que norteia o Expressionismo. Diferentemente do Futurismo, cuja motivação tem por base a admiração pela máquina, pela tecnologia, o Expressionismo não vê com o mesmo olhar otimista o surgimento desses avanços técnicos, sobretudo no que tange à supremacia dada à máquina em detrimento do homem. Daí a necessidade sentida de apreender o movimento interior das coisas e dos seres. Aos expressionistas, não interessa o fato em si, mas a forma como o artista o percebe, como ele o vê, pois, para eles, a realidade estaria dentro de nós, e cabe-nos expressar o que percebemos, vemos e sentimos. Através de suas produções artísticas, nos damos conta da inquietude, da angústia humana frente ao vazio com o qual se defronta, ante a coisificação a que é reduzido o homem dentro daquele universo tecnológico, conforme bem o demonstram estes versos do poema No terraço do café Josty, do alemão
  • 7. Paul Boldt, que assim diz, segundo tradução feita pelo português João Barrento: Praça de Potsdam: eternos gritos Dos glaciares das lavinas febris Pelas ruas fora: carros em carris Os automóveis e os homens-detritos. Observe-se que, em meio à agitação nervosa, frenética e, ao mesmo tempo, indiferente da praça, assinalada pelos lexemas gritos, glaciares e febris, quem primeiro assoma ao espaço poético são os carros, os automóveis, enfim, as máquinas, como a demarcar a prioridade destas sobre os homens, que, além de virem nomeados por últimos, aparecem referidos como homens-detritos, ou seja, como restos, coisas sem valor. Ao contrário, pois, dos futuristas, os expressionistas querem, antes de tudo, destacar os aspectos negativos da modernidade sobre os homens. Para isso, recorrem à estética do feio, do choque, através da deformação das imagens e da utilização de palavras abjetas. A tensão, o conflito e a subjetividade presentes em suas realizações levam os críticos a ver neles aproximação com a estética barroca e a romântica. Não esqueçamos que o feio resultante das deformações efetivadas na representação também faz parte da estética do grotesco, explorada pelos barrocos quando “tudo o que era certo se contorce”. Por outro lado, semelhantemente ao romantismo, o expressionismo, como já vimos, além de ter a mesma origem alemã, tem como veículo de suas ideias a revista Der Sturm (A Tempestade), o que
  • 8. lembra o espírito pré-romântico da Sturm und Drang (ou seja, Tempestade e Ímpeto). CUBISMO O termo cubismo surgiu a partir do quadro “Casas en l´Estaque”, de Georges Braque, exposto no Salão de Outono de 1908, qualificado pelo pintor Matisse, que fazia parte do júri, como “caprichos cúbicos” pela semelhança de suas formas com elementos geométricos desmembrados em facetas que se superpõem e intervêm umas nas outras. Braque e Pablo Picasso são considerados os criadores do Cubismo na pintura. Na literatura, Apollinaire é um dos responsáveis por sua introdução, cujo texto de 1913, intitulado Meditações estéticas. A pintura cubista, segundo Gilberto Teles, “pode ser tomado como um desses manifestos”5 . Como já foi mencionado, a estética cubista privilegia o geometrismo, mas dele também fazem parte a descontinuidade, a decomposição e recomposição, a simultaneidade. Nas palavras do crítico de arte Jean Cassou, trazidas por Guillermo de Torre, “o cubismo é um estilo de ruptura intelectual, e as sua obras assumem o aspecto de uma combinação de formas descontínuas. É por isso que se aproximam da poesia moderna, que 5 TELES, G. O Cubismo. In: Op. Cit., p. 109
  • 9. foge ao discurso, à regularidade métrica, à pontuação e que se manifesta sob a forma de fragmentos ou instantâneos” 6 . É, também de 1913, o texto A antitradição futurista, de Apollinaire, cujo título por si só já deixa entrever a relação do cubismo com as ideias futuristas de ruptura total com o passado. Para além disso, o texto se encontra em profunda consonância com as propostas cubistas, sobretudo no que tange à sua estruturação pelo fragmentarismo, pela simultaneidade das ideias apresentadas, quebrando assim com qualquer sequência lógica. Logo no início do manifesto, tem-se uma frase constituída, em sua maior parte, por palavras sem sentido, cujas primeiras letras terminam formando a palavra “passadismo”, através da qual nos é apresentada a rejeição ao passado. Eis a frase: ABAIXO OPominir Aliminé SSkprsusu otalo ADIScramir MOnigme. Depois disso, o texto segue estruturado de forma justaposta, com palavras grifadas das mais diversas maneiras, em termos de tipos ou tamanhos gráficos, dispostas na horizontal e na vertical, homologando através da forma de expressão o que apresenta em termos de destruição e construção. Registre-se que, no bloco no qual se encontram alocadas as propostas de destruição das formas consideradas passadistas de expressão, entre os vários pontos elencados, temos a supressão da harmonia 6 TORRES, Guillermo. Cubismo. In: _____ História das Literaturas de Vanguarda, Lisboa: Presença; Santos,SP: Martins Fontes, 1972, p. 100 TORRE, G. Op. Cit., p.100
  • 10. tipográfica, das sintaxes já condenadas pelo uso em todas as línguas e da pontuação. Aspectos que já não fazem mesmo parte do manifesto. Por sua vez, no bloco em que se encontram as propostas de construção de uma nova forma de expressão artística, encontramos no item 1, referente a Técnicas ou ritmos renovados sem cessar, encabeçando a lista, a proposta de Literatura pura palavras em liberdade Invenção de palavras, seguida das ideias, entre outras, de Plástica pura (5 sentidos), Simultaneidade em oposição ao Particularismo e à divisão, os quais são perceptíveis na organização textual do manifesto; já no item 2, relacionado com intuição, velocidade e ubiquidade, podemos destacar também como elementos corroboradores dessa relação, entre o que se diz e o que se faz, proposições como Analogias e trocadilhos trampolins líricos e única ciência das línguas calicó Calicut Calcutá cachacia Sofia o Sofos suficiente oficiar oficial ó fios Aficionado Dona-Sol Donatello Doador dei erradamente topedeiro, por meio da qual a propositura apresentada é ao mesmo tempo realizada e, ainda, a paródia musical, resultante de uma analogia sonora, da frase melódica constituída de MER........DE......que significa Mar..... de.... com o termo MERDE, que em francês é Merda, portanto, excrementos. E, na sequência, é isso que é oferecido a todos os guardiães da tradição, a exemplo de pegadogos, professores, museus, etc., em contraposição à rosa que é ofertada aos responsáveis pela renovação
  • 11. artística, começando por Marinetti, Picasso e o próprio Apollinaire, entre tantos outros. Exaltação com a qual se encerra o texto. CUBO-FUTURISMO O Cubo-Futurismo tem sua origem na Rússia, mais precisamente, em Moscou, a partir de 1913. Esse movimento vanguardista, como se depreende do próprio título, tem como subsídios estéticos e ideológicos muito do que foi proposto pelo Futurismo de Marinetti e pelo Cubismo de Picasso e Braque, sobretudo, no que tange ao empenho em imprimir à arte uma maior dinamização, o que, em termos de concretização artística, leva também à adoção das técnicas futuristas e cubistas de libertação total da palavra, fragmentação, decomposição, recomposição, simultaneidade. Como o cubismo, o cubo-futurismo começou com a pintura. Entre os pintores cubo-futuristas, Kazimir Malevich é apontado como responsável pelo desenvolvimento desse estilo entre os russos, tendo sido o primeiro a empregar o termo Cubo para falar de suas pinturas. Diferente, porém, dos futuristas, os artistas russos investiam mais na práxis do que na teoria e não compartilhavam da apologia futurista da máquina e da guerra. Auto-intitulando-se de “comunistas-futurista, se encontravam ideologicamente vinculados aos movimentos revolucionários que
  • 12. culminaram com a Revolução de Outubro, de 1917, ocorrida na Rússia. Para eles, a palavra era vista também como instrumento de transformação social. Em seu único manifesto coletivo, assinado pelos poetas David Burliuk, Krutchônikh, Vladimir Maiakovski e Khlebnikov, de 1912, os cubo- futuristas se colocavam como arautos do novo tempo e se insurgiam contra o passado, criticando duramente, sobretudo, os poetas simbolistas, cujas obras vazadas em uma “perfumada sensibilidade” não traduziam a virilidade do seu tempo. “A todos esses Kuprin, Block, Sologúb, Remizov, Avertchenko, Cherny, Kusmin, Bunin, et., etc.,* só está faltando uma casa uma casa à beira de um rio. Tal recompensa o destino reserva também para os alfaiates. Do alto dos arranha-céus discernimos sua nulidade!”7 Realizado de forma muito sintética, o poema Balalaica , abaixo transcrito, de autoria de Maiakovski, traduz bem o viés estético do cubo-futurismo no que diz respeito à assimilação dos procedimentos futuristas e cubistas e o vínculo da poesia com os anseios revolucionários da época. Vejamos o poema: * São todos nomes de poetas simbolistas russos acusados pelos cubo-futuristas de misticismo, abstração e artificialismo da linguagem.. 7 BURLIUK, D. et alii. Bofetada no gosto público. In: TELLES, G. Op. Cit. p.121
  • 13. BALALAICA Vladimir Maiakóvski Balalaica [como um balido abala a balada do baile de gala] [com um balido abala] abala [ com balido] [ a gala do baile] louca a bala laica (1913) Para início de conversa sobre este poema, registre-se que o termo Balalaica designa um instrumento musical de cordas, parecido com um bandolim ou com um cavaquinho, usado na música popular russa. Para além de intitular o poema, o termo Balalaica pode também ser visto como matriz geradora do mesmo. Através de um processo de decomposição, comum aos cubistas, o termo se desmembra em vários outros, jogando, sobretudo, com as palavras bala e laica e com os fonemas nelas presentes, com os quais cria o poeta outros termos, valendo-se para isso das analogias e trocadilhos trampolins, proposto por Apollinaire em A antitradição futurista, como se pode perceber em bala, baile, gala, abala, balido, balada, laica, louca. Em termos de conteúdo, o poema nos fala de um baile de gala, ou seja, um baile da nobreza, uma vez que gala, segundo Aurélio, remete para trajes
  • 14. solenes, ornamentação ou enfeites ricos e preciosos, o qual foi abalado por uma bala laica, ou seja, uma bala que veio de fora, uma bala estranha àquele meio. Em termos sonoros, os últimos vocábulos do poema bala/laica recompõem o termo balalaica. E, se consideramos que este, enquanto instrumento, se liga ao povo, podemos inferir que veio do povo, o qual não teria vez em um baile de gala, a bala que detona esse baile. É o povo, portanto, que, de forma irreverente, barulhenta (como um balido/ com um balido, termo que tanto pode ser lido como barulho e como projetil), abala a nobreza. Isto tudo, porém, nos é passado através dos recursos futuristas e cubistas adotados pelo poeta: fragmentarismo, decomposição, recomposição, liberdade de expressão, criatividade, concisão e simultaneidade. Como observação final em torno desse movimento, vale a pena registrar que, apesar de sua curta duração, o Cubo-Futurismo foi de grande valia para a arte russa. DADAÍSMO Considerado o mais radical de todos os movimentos que constituíram a Vanguarda Europeia, o Dadaísmo nasce em Zurique, na Suíça, tendo como mentores cinco artistas que lá se encontravam refugiados por conta da
  • 15. guerra, contra a qual se insurgiam, pela sensação de que todo um sistema de civilização se desmontava bruscamente, e que nada, nem Filosofia, nem Religião, nem Ciência, nada pôde impedir a catástrofe da guerra. São eles: os alemães HUGO BALL e RICHARD HUELSEMBECK; o alsaciano HANS HARP E OS ROMENOS, Marcel Jango e Tristan Tzara. Posteriormente, a eles se juntaram o francês FRANCIS PICCABIA e o chileno VICENTE HUIDOBRO. Em decorrência do espírito de revolta, de frustração que norteava o grupo, as propostas dadaístas são marcadas pelo ceticismo, pelo nihilismo. Para eles, DADA, palavra com a qual batizaram o movimento, escolhida por acaso em um dicionário, não significava NADA. O objetivo era, segundo Tristan Tzara, “criar uma palavra expressiva que, mediante sua magia, fechasse todas as portas à compreensão e não fosse um – ismo a mais”8 Daí a valorização do non-sense, do absurdo, da contradição, do anarquismo, da destruição que se depreende das ideias apresentadas em seus manifestos, sobretudo, no Manifesto Dada 1918. Eis algumas delas: • Eu redijo um manifesto e não quero nada, eu digo portanto certas coisas e sou por princípio contra os manifestos, como sou também contra os princípios... • Assim nasceu DADÁ de um desejo de independência, de desconfiança na comunidade./.../ Nós não reconhecemos nenhuma teoria. 8 Apud TELLES, G. Op. Cit. p. 124/125
  • 16. • Nós rasgamos, vento furioso, o linho das nuvens e das preces, e preparamos o grande espetáculo do desastre, do incêndio, da decomposição. • Eu destruo as gavetas do cérebro e as da organização social: desmoralizar por todo lado e lançar a mão do céu ao inferno, os olhos do inferno ao céu, restabelecer a roda fecunda de um circo universal nos poderes reais e na fantasia de cada indivíduo. Em termos ideo-estéticos, assinale-se ainda que o Dadaísmo em sua crítica exacerbada não poupa nem os próprios movimentos vanguardistas precedentes, embora seja pela crítica visto como “um vértice de confluências vanguardistas”9 ; a ludicidade, o humor estão na base das suas realizações assim como a técnica do ready made, estratégia que, em termos gerais, consiste em criar em cima de material já existente, sendo, portanto, de grande valia, a arte dadaísta, empenhada na desconstrução, na dessacralização da arte, em consonância, pois, com sua proposta de antiarte, antiliteratura. Nesse sentido, são exemplares as criações do dadaísta Marcel Duchamp, realizadas com objetos como bacia sanitária, roda de bicicleta, os quais são por ele, irreverentemente, transmudados em objetos artísticos. Entretanto, por mais paradoxal que pareça toda essa negação dadaísta, ela termina se revertendo em positivo para a arte. Razão pela qual, para o 9 TORRES, G. Op. Cit.. p. 254.
  • 17. escritor e filósofo André Gide, “Dada é o dilúvio após o qual tudo recomeça”10 Parafraseando Fernando Pessoa, acreditamos poder dizer que DADÁ foi o nada que é tudo. ESPIRITONOVISMO Conforme sugere o próprio nome, bem diferente da postura iconoclasta, destruidora do Dadaísmo, esse movimento, de origem francesa, surge em 1918, portanto, no final da I Guerra Mundial, motivado realmente por um espírito novo de reconstrução. Assim sendo, procedem a uma verdadeira revirada ideológica na medida em que retomam a ordem, o bom senso, o sentido do dever, a clareza, a sistematização e o equilíbrio. Ao contrário de seus predecessores, reconhece, de modo bastante conciliatório, a importância da tradição clássica; ao mesmo tempo, exalta as mudanças implementadas nas artes pelos movimentos anteriores, referentes às rupturas estéticas, à liberdade de expressão, à valorização dos artifícios tipográficos responsáveis pelo nascimento de um lirismo visual e à concisão poética. Vejamos, em termos ilustrativos, um trecho da conferência O Espírito Novo e os Poetas, de Apollinaire: 10 TORRES, G. Dadaísmo. In: _____ Op. Cit. p. 237.
  • 18. As pesquisas relacionadas com a forma tomaram desde então uma grande importância. Importância legítima. Como poderia esta pesquisa não interessar ao poeta, ela que podia determinar novas descobertas no pensamento e no lirismo? A assonância, a aliteração, tanto quanto a rima, são convenções que têm, isoladamente, os seus méritos. Os artifícios tipográficos levados muito longe, com uma grande audácia, tiveram a vantagem de fazer nascer um lirismo visual que era quase desconhecido antes de nossa época. Estes artifícios podem ir muito longe ainda e consumar a síntese das artes, da música, da pintura, da literatura. Tudo isso não é mais que uma pesquisa para chegar a novas expressões perfeitamente legítimas. Quem ousaria dizer que os exercícios de retórica, as variações sobre o tema de: Eu morro de sede ao pé da fonte não tiveram uma influência determinante sobre o gênio de Villon? Quem ousaria dizer que as pesquisas de forma dos retóricos e da escola marótica não serviram para apurar o gosto francês até sua perfeita florescência no século XVII? Ressaltam ainda os espiritonovistas a importância para a arte do riso, que “fornece ao poeta um lirismo novo”; do ridículo, por ser inerente à própria vida; da surpresa, “grande mecanismo do mundo moderno”, que advém da invenção, da imprevisibilidade, do estranhamento provocado. Segundo eles, “só devemos chamar de poeta àquele que inventa, àquele que cria. E, ainda, a importância da alegria, considerada um valor característico da poesia e do cotidiano, das coisas prosaicas como matéria de poesia, pois “um lenço que cai pode ser para o poeta a alavanca com a qual ele levantará todo um universo”. Além desses aspectos, o Espiritonovismo vê como imprescindível o viés nacionalista nas produções artísticas. Para eles,
  • 19. A arte só deixará de ser nacional no dia em que o universo inteiro, vivendo sob um mesmo clima, em casas edificadas sobre o mesmo modelo, falar a mesma língua, com o mesmo sotaque, ou seja, nunca. Nessa perspectiva, exaltam por demais a França, conforme se pode ver em afirmações como estas abaixo transcritas: O espírito novo que dominará o mundo inteiro não se evidenciou na poesia de nenhum país como na França. Segundo o que podemos saber, não há quase poetas hoje que não sejam de língua francesa. Todas as outras línguas parecem fazer silêncio para que o universo possa escutar melhor a voz dos novos poetas franceses. Os franceses levam a poesia a todos os povos.11 Embora a Vanguarda Brasileira dialogue com quase todos esses movimentos europeus, é com o Espiritonovismo que seus integrantes mais se identificam, sobretudo, no que concerne à valorização da tradição, do passado. Mas isso veremos depois. SURREALISMO Insatisfeito com o viés anárquico dos dadaístas, André Breton, que, até então, se vinculava ao movimento, terminou rompendo com o Dadaísmo e criando o Surrealismo, cujo manifesto data de 1924. Daí por que vamos encontrar na história do movimento afirmações de que ele 11 Todas essas passagens citadas foram extraídas de APOLLINAIRE, G. O Espírito Novo e os Poetas. In: TELES, G. Op. Cit. p. 155/166.
  • 20. “nasceu de uma costela de Dada” ou de que “nasceu das cinzas de Dada”12 . Um dos pontos principais do rompimento diz respeito ao ceticismo, ao niilismo que norteavam as propostas dadaístas. Breton concordava com o pensamento de Rimbaud de, através da arte, mudar a vida. E, como Marx, ele também queria contribuir para a transformação do mundo. Ao niilismo dadaísta, opunham os surrealistas o conhecimento total do homem, para o que tanto a poesia como a pintura não passavam de meios de investigação que lhes permitiam como “cientistas” explorar o inconsciente, o sonho, o maravilhoso. Para facilitar seu trabalho, Breton, tomando por base as teorias freudianas, chegou inclusive a criar um laboratório destinado a investigações oníricas – o Bureau des Recherches Surrealistes ( Birô de pesquisas surrealistas) . Diferentemente da visão escatológica, apocalíptica dos dadaístas, os surrealistas, acreditando na vida, na possibilidade de mudança, exaltavam o AMOR e o EROTISMO. A dissidência, entretanto, não lhes impediu manterem alguns traços dadaístas, a exemplo do amor ao protesto, da valorização do improviso e da espontaneidade da linguagem. 12 A primeira das afirmações, segundo Guillermo de Torre é atribuída a Ribemont-Dessaignes, um dadaísta que depois se torna também surrealista e a segunda a Tristan Tzara que era o líder do Dadaísmo. Cf. TORRE, G. In: Op. Cit. vol. 3, p. 9
  • 21. Protesto quanto à repressão a que era submetido o homem, minando a sua verdadeira essência, impedindo sua ascensão como sujeito de si mesmo, da sua história. Daí a valorização da infância, fase também privilegiada pela psicanálise de Freud, por remeter para um período de liberdade, em que, segundo os surrealistas, se encontra ausente “todo rigor conhecido”; A valorização do improviso e da espontaneidade da linguagem era defendida pelos surrealistas por acreditarem ser, através do improviso e da espontaneidade, que o inconsciente afloraria. Por essa razão, Breton define surrealismo como “automatismo psíquico pelo qual alguém se propõe a exprimir seja verbalmente, seja por escrito, seja de qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento. Ditado do pensamento, na ausência de todo controle exercido pela razão, fora de qualquer preocupação estética ou moral.”13 À semelhança dos futuristas, para quem as imagens mais poderosas são aquelas que ligam realidades distantes, aparentemente diversas e hostis, os surrealistas também definem como imagem forte aquela que apresenta o maior grau de arbitrariedade, ou seja, aquela que leva mais tempo para ser compreendida. Outro ponto do ideário surrealista que o aproxima dos futuristas diz respeito à valorização da imaginação, pela liberdade que ela propicia. 13 Apud TELES, G. Op. Cit., p. 191
  • 22. Para Breton, a imaginação dá conta do que pode ser. E isso é o suficiente para suspender um pouco a terrível interdição a que está sujeito o homem. Por extrapolarem o nível do real, são também valorizados o maravilhoso e a loucura: o primeiro, por incidir no sobrenatural, e o segundo pelo comprazimento no delírio. Enfim, pelo que apresentam de ilógico, de quebra com o racional, com o interdito. Inserir um trecho de poema Como o cubismo, o surrealismo se apresenta de forma vigorosa na pintura, tendo como figuras expressivas Salvador Dali e Miró, entre outros. Na linha do automatismo psíquico, Salvador Dali14 adota o “método paranoico-crítico”, ou seja, um método espontâneo de conhecimento irracional, baseado na associação interpretativo-crítica de fenômenos delirantes.15 Juntamente com Luis Buñuel, cineasta, Salvador Dali enveredou pela arte cinematográfica, levando até ela o surrealismo. Dessa atividade conjunta, resultaram dois filmes que são ícones do surrealismo no cinema: O cão andaluz(1928) e A idade de Ouro(1930). Para consecução das películas, adotaram eles o mesmo princípio da escritura automática e, em comum, concordaram em não aceitar nenhuma ideia, nenhuma 14 Registre-se que a pintura de Salvador Dali não se prende apenas ao surrealismo. Sua obra apresenta quadros feitos à luz do impressionismo, do cubismo, do fauvismo. 15 NÉRET, Gilles. Salvador Dali 1904-1989. German: Benedikt Taschen, 1994, p. 66
  • 23. imagem que pudessem dar lugar a uma explicação racional, psicológica ou cultural. Embora também vinculado ao surrealismo, a pintura de Joan Miró se distingue da de Salvador Dali por seu abstracionismo. Seus personagens: seres humanos, animais, elementos da paisagem, etc. foram se reduzindo a formas mínimas e a signos permeados de uma vitalidade e uma impulsividade próprias de um desenho infantil, o que lhe confere uma aparência sensível e ingênua que, entretanto, advém de uma profunda introspecção e de sua capacidade visionária de indagar o subjetivo.16 16 Cf. BERNÁRDEZ, Carmen. Historia Del Arte. Primeras Vanguardias. Barcelona, Espanha: Palneta, 1994, p. 114.