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Cassandra Rios e o Tesão de mulher por mulher
Por Valentina

Tesão de mulher
Pioneira da literatura lésbica no Brasil, Cassandra Rios foi considerada moralista por escancarar
estereótipos e preconceitos em linguagem popular
Adriane Piovezan
O sexo era assunto tabu. O prazer feminino não era concebido como uma possibilidade, muito
menos um direito. A religião regia a moral e os bons costumes. Foi neste cenário adverso que
surgiram os livros de Cassandra Rios, no fim da década de 1940. Seus temas: o erotismo entre
mulheres, os conflitos internos e estereótipos associados a essa experiência. Tudo escrito de
forma direta e sexualmente explícita.
Tamanha ousadia resultou em um tremendo sucesso editorial. Cassandra Rios, nascida Odete
(1932-2002), tornou-se a pioneira da literatura homossexual no país e manteve-se como
principal autora do gênero durante mais de trinta anos, resistindo inclusive à implacável
censura imposta durante a ditadura militar (1964-1985).
Populares, em prosa simples quando não vulgar, veiculadas em livros baratos com capas
provocantes e títulos chamativos, suas obras surpreendiam e cativavam um vasto número de
leitores. Cassandra Rios chegou a vender 300 mil exemplares em um ano, transcendendo o
público exclusivamente lésbico ou mesmo feminino.
Como explicar essa aceitação? Talvez, justamente por seu estilo ousado e extrovertido. Era
uma mulher escrevendo sobre o prazer com outra mulher, e apresentando essa vivência como
um caminho possível para a vida afetiva e amorosa. Quando seus livros foram publicados, a
sigla GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros) estava longe de existir, não havia
organizações de homossexuais, e nem mesmo os meios de comunicação publicavam conteúdo
erótico. Em uma sociedade patriarcal e machista, a maternidade ainda era considerada o
principal papel feminino. Razão pela qual, embora um sucesso de vendas, seus livros sempre
foram encarados como marginais.
A homossexualidade só aparecia, na literatura do final do século XIX e da primeira metade do
XX, associada a três tabus: o pecado, a patologia e o crime. Esses elementos não estão
ausentes da narrativa de Cassandra; pelo contrário: aparecem como formas de preconceito que
suas personagens enfrentam. Por isso, as minorias sexuais, que não eram sequer pensadas como
tal no Brasil daquela época, perceberam naqueles livros uma oportunidade de verem retratados
aspectos de seu cotidiano.
O primeiro romance de temática lésbica a alcançar repercussão nacional foi o livro de estréia
de Cassandra Rios, A volúpia do pecado, lançado em 1948. Nele, as personagens Lyeth e Irez
buscam no dicionário um termo que defina seu comportamento ?elas próprias questionavam a
normalidade de um amor diferente dos padrões de sua época. A idéia de que o termo ?lésbica?
correspondia a um pecado está intimamente ligada ao amor homoerótico nesta obra: ?Vinhamlhe à mente os nomes proferidos por dona Margot atribuídos às mulheres que se amavam como
elas. Curiosas, consultaram o dicionário: Homossexuais, Tríbadas, Lesbianas! Seriam elas? (...)
Queriam saber o porquê de um amor tão desnatural?,escreveu Cassandra.
Em Eudemônia, de 1956, o panorama é diferente: a protagonista vai parar em uma clínica
psiquiátrica. Por trás da trama erótica, o que se lê é um retrato do fenômeno da divulgação da
psicanálise, em especial da chamada ?questão sexual?. Nessa história, a lésbica assumida se
submete a um tratamento clínico que considera seu comportamento uma perversão sexual. O
psiquiatra procura convencê-la a mudar: ?Senhorita Eudemônia, todos aqueles que quiseram
libertar-se do instinto pervertido foram bem-sucedidos em nossas clínicas. Tornaram-se
criaturas normais e muitos deles hoje têm seu lar e até filhos?.
Seus livros revelam também elementos de transformação histórica: ao retratar um grande
número de mulheres urbanas ao longo das décadas de 1950, 1960 e 1970, as obras indicam
mudanças de comportamento das homossexuais femininas nesse período. Em Eu sou uma
lésbica, de 1979, um baile de carnaval revela a postura mais assumida de gays e lésbicas, o que
gerava forte reação contrária. A personagem vê um casal ser retirado à força do salão: ?Meu
carnaval estava acabado. (...) A bicha, gritando com sua voz esguaniçada coisas que eu nunca
ouvira antes, sendo posta para fora; a machona, carregada pelos guardas escada abaixo?. Essas
atitudes ainda eram encaradas como caso de polícia.
Apesar do preconceito, na década de 1970 a minoria homossexual passou a se fazer mais visível
no Rio de Janeiro, e a ficção de Cassandra trazia várias referências reconhecíveis para quem
freqüentava esse submundo. Nos livros Marcella (1975) e Anastácia (1982), por exemplo,
aparece o fictício Aço?s Bar, uma alusão ao Ferro?s Bar, ponto de reunião desse público. Em
várias outras obras, personagens se encontram em uma certa galeria sem nome, mas
facilmente identificável: era a Galeria Alaska, tradicional reduto gay de Copacabana.
Durante a ditadura, a literatura erótica de Cassandra Rios tornou-se alvo certo para os
censores. Produções vistas como pervertidas e pecaminosas eram desvios que precisavam ser
combatidos pelo Estado. Resultado: trinta e seis dos seus quase cinqüenta títulos foram
proibidos na época.
Na maioria das vezes, ela lançava os livros por pequenas editoras, em alguns casos com
dinheiro do próprio bolso. Foi assim com o primeiro deles, A volúpia do pecado, pago pela mãe
da escritora, que, no entanto, nunca leria um livro da filha. Hoje em dia, só é possível
encontrar obras essenciais, como Copacabana posto 6 ? A madastra (1972) e Eu sou uma lésbica
(1979), em bibliotecas ou em sebos, pois estão esgotados e fora de catálogo. Recentemente,
foram relançados alguns títulos: As traças (1975), Uma mulher diferente (1980), onde o
personagem principal é um travesti, e o surpreendente Crime de Honra (2000), única obra até
então inédita, na qual Cassandra se aventura pelo universo homossexual masculino.
Tachada de ?pornográfica?, a literatura de Cassandra Rios não mereceu qualquer esforço de
crítica naquele período. Porém, se ela não primava pelo rebuscamento do estilo, tinha o
inegável mérito de descrever de forma aguda os conflitos subjetivos vividos pelos personagens:
seus temores, questionamentos, e o preconceito já internalizado.
Em tempos de ?politicamente correto?, se comparados à literatura lésbica atual ? como nas
coleções ?Edições GLS? (Summus) e ?Aletheia? (Brasiliense) ?, seus escritos podem parecer
moralistas ou mesmo condenatórios ao lesbianismo. Afinal, ela se utilizava dos códigos
culturais vigentes, cheios de preconceito, para narrar experiências afetivas fora dos padrões da
sociedade heterossexual. Lançava mão de termos comuns aos estereótipos com os quais a
sociedade, de maneira geral, se referia às homossexuais, como ?machinha?, ?sapatão?, ?corça?
e lésbica.
Mas esta escolha de narrativa, longe de significar moralismo, revela um caráter transgressor,
uma opção pelo enfrentamento: utilizar os códigos conhecidos para compor uma nova
abordagem do tema. A intenção é inserir o amor entre mulheres e a existência destas
personagens no mundo concreto, com termos que são de domínio público, em vez de adotar
uma linguagem compreendida apenas no ambiente homoerótico. E ela nem poderia fazer
diferente, pois buscava o máximo de divulgação para suas obras.
A partir dos anos 1990, a literatura homossexual feminina assume um perfil engajado, de
afirmação positiva dessa minoria. Ao privilegiar protagonistas atraentes e bem-sucedidas,
acaba enquadrando o lesbianismo nos padrões hegemônicos na sociedade, com seus valores
heterossexuais e mercadológicos. Um discurso que pode ter boas intenções políticas, mas faz
alusão a um mundo artificial, distante do cotidiano concreto dos homossexuais.
?Ultrapassadas? ou ?pornográficas? que sejam, as narrativas de Cassandra Rios apresentam um
quadro muito mais verossímil da situação social e emocional das lésbicas de seu tempo.
ADRIANE PIOVEZAN é Mestre em Estudos Literários pela UFPR e autora da dissertação "Amor
romântico X Deleite dos sentidos: Cassandra Rios e a identidade homoerótica feminina na
literatura? (UFPR, 2006).
Saiba Mais - Livros:FACCO, Lucia. As heroínas saem do armário: literatura lésbica
contemporânea. São Paulo: GLS, 2004.RTINARI, Denise. O discurso da homossexualidade
feminina. São Paulo: Brasiliense, 1989.RIOS, Cassandra. As traças. São Paulo: Brasiliense, 2005.
Saiba Mais - Filmes:?Ariella, a paranóica? (1980). http://www.imdb.com/title/tt0241196
http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=1524

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Cassandra rios e o tesão de mulher por mulher

  • 1. Cassandra Rios e o Tesão de mulher por mulher Por Valentina Tesão de mulher Pioneira da literatura lésbica no Brasil, Cassandra Rios foi considerada moralista por escancarar estereótipos e preconceitos em linguagem popular Adriane Piovezan O sexo era assunto tabu. O prazer feminino não era concebido como uma possibilidade, muito menos um direito. A religião regia a moral e os bons costumes. Foi neste cenário adverso que surgiram os livros de Cassandra Rios, no fim da década de 1940. Seus temas: o erotismo entre mulheres, os conflitos internos e estereótipos associados a essa experiência. Tudo escrito de forma direta e sexualmente explícita. Tamanha ousadia resultou em um tremendo sucesso editorial. Cassandra Rios, nascida Odete (1932-2002), tornou-se a pioneira da literatura homossexual no país e manteve-se como principal autora do gênero durante mais de trinta anos, resistindo inclusive à implacável censura imposta durante a ditadura militar (1964-1985). Populares, em prosa simples quando não vulgar, veiculadas em livros baratos com capas provocantes e títulos chamativos, suas obras surpreendiam e cativavam um vasto número de leitores. Cassandra Rios chegou a vender 300 mil exemplares em um ano, transcendendo o público exclusivamente lésbico ou mesmo feminino. Como explicar essa aceitação? Talvez, justamente por seu estilo ousado e extrovertido. Era uma mulher escrevendo sobre o prazer com outra mulher, e apresentando essa vivência como um caminho possível para a vida afetiva e amorosa. Quando seus livros foram publicados, a sigla GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros) estava longe de existir, não havia organizações de homossexuais, e nem mesmo os meios de comunicação publicavam conteúdo erótico. Em uma sociedade patriarcal e machista, a maternidade ainda era considerada o principal papel feminino. Razão pela qual, embora um sucesso de vendas, seus livros sempre foram encarados como marginais. A homossexualidade só aparecia, na literatura do final do século XIX e da primeira metade do XX, associada a três tabus: o pecado, a patologia e o crime. Esses elementos não estão ausentes da narrativa de Cassandra; pelo contrário: aparecem como formas de preconceito que suas personagens enfrentam. Por isso, as minorias sexuais, que não eram sequer pensadas como tal no Brasil daquela época, perceberam naqueles livros uma oportunidade de verem retratados aspectos de seu cotidiano. O primeiro romance de temática lésbica a alcançar repercussão nacional foi o livro de estréia de Cassandra Rios, A volúpia do pecado, lançado em 1948. Nele, as personagens Lyeth e Irez buscam no dicionário um termo que defina seu comportamento ?elas próprias questionavam a normalidade de um amor diferente dos padrões de sua época. A idéia de que o termo ?lésbica? correspondia a um pecado está intimamente ligada ao amor homoerótico nesta obra: ?Vinhamlhe à mente os nomes proferidos por dona Margot atribuídos às mulheres que se amavam como elas. Curiosas, consultaram o dicionário: Homossexuais, Tríbadas, Lesbianas! Seriam elas? (...) Queriam saber o porquê de um amor tão desnatural?,escreveu Cassandra. Em Eudemônia, de 1956, o panorama é diferente: a protagonista vai parar em uma clínica psiquiátrica. Por trás da trama erótica, o que se lê é um retrato do fenômeno da divulgação da psicanálise, em especial da chamada ?questão sexual?. Nessa história, a lésbica assumida se submete a um tratamento clínico que considera seu comportamento uma perversão sexual. O psiquiatra procura convencê-la a mudar: ?Senhorita Eudemônia, todos aqueles que quiseram libertar-se do instinto pervertido foram bem-sucedidos em nossas clínicas. Tornaram-se criaturas normais e muitos deles hoje têm seu lar e até filhos?. Seus livros revelam também elementos de transformação histórica: ao retratar um grande número de mulheres urbanas ao longo das décadas de 1950, 1960 e 1970, as obras indicam mudanças de comportamento das homossexuais femininas nesse período. Em Eu sou uma lésbica, de 1979, um baile de carnaval revela a postura mais assumida de gays e lésbicas, o que
  • 2. gerava forte reação contrária. A personagem vê um casal ser retirado à força do salão: ?Meu carnaval estava acabado. (...) A bicha, gritando com sua voz esguaniçada coisas que eu nunca ouvira antes, sendo posta para fora; a machona, carregada pelos guardas escada abaixo?. Essas atitudes ainda eram encaradas como caso de polícia. Apesar do preconceito, na década de 1970 a minoria homossexual passou a se fazer mais visível no Rio de Janeiro, e a ficção de Cassandra trazia várias referências reconhecíveis para quem freqüentava esse submundo. Nos livros Marcella (1975) e Anastácia (1982), por exemplo, aparece o fictício Aço?s Bar, uma alusão ao Ferro?s Bar, ponto de reunião desse público. Em várias outras obras, personagens se encontram em uma certa galeria sem nome, mas facilmente identificável: era a Galeria Alaska, tradicional reduto gay de Copacabana. Durante a ditadura, a literatura erótica de Cassandra Rios tornou-se alvo certo para os censores. Produções vistas como pervertidas e pecaminosas eram desvios que precisavam ser combatidos pelo Estado. Resultado: trinta e seis dos seus quase cinqüenta títulos foram proibidos na época. Na maioria das vezes, ela lançava os livros por pequenas editoras, em alguns casos com dinheiro do próprio bolso. Foi assim com o primeiro deles, A volúpia do pecado, pago pela mãe da escritora, que, no entanto, nunca leria um livro da filha. Hoje em dia, só é possível encontrar obras essenciais, como Copacabana posto 6 ? A madastra (1972) e Eu sou uma lésbica (1979), em bibliotecas ou em sebos, pois estão esgotados e fora de catálogo. Recentemente, foram relançados alguns títulos: As traças (1975), Uma mulher diferente (1980), onde o personagem principal é um travesti, e o surpreendente Crime de Honra (2000), única obra até então inédita, na qual Cassandra se aventura pelo universo homossexual masculino. Tachada de ?pornográfica?, a literatura de Cassandra Rios não mereceu qualquer esforço de crítica naquele período. Porém, se ela não primava pelo rebuscamento do estilo, tinha o inegável mérito de descrever de forma aguda os conflitos subjetivos vividos pelos personagens: seus temores, questionamentos, e o preconceito já internalizado. Em tempos de ?politicamente correto?, se comparados à literatura lésbica atual ? como nas coleções ?Edições GLS? (Summus) e ?Aletheia? (Brasiliense) ?, seus escritos podem parecer moralistas ou mesmo condenatórios ao lesbianismo. Afinal, ela se utilizava dos códigos culturais vigentes, cheios de preconceito, para narrar experiências afetivas fora dos padrões da sociedade heterossexual. Lançava mão de termos comuns aos estereótipos com os quais a sociedade, de maneira geral, se referia às homossexuais, como ?machinha?, ?sapatão?, ?corça? e lésbica. Mas esta escolha de narrativa, longe de significar moralismo, revela um caráter transgressor, uma opção pelo enfrentamento: utilizar os códigos conhecidos para compor uma nova abordagem do tema. A intenção é inserir o amor entre mulheres e a existência destas personagens no mundo concreto, com termos que são de domínio público, em vez de adotar uma linguagem compreendida apenas no ambiente homoerótico. E ela nem poderia fazer diferente, pois buscava o máximo de divulgação para suas obras. A partir dos anos 1990, a literatura homossexual feminina assume um perfil engajado, de afirmação positiva dessa minoria. Ao privilegiar protagonistas atraentes e bem-sucedidas, acaba enquadrando o lesbianismo nos padrões hegemônicos na sociedade, com seus valores heterossexuais e mercadológicos. Um discurso que pode ter boas intenções políticas, mas faz alusão a um mundo artificial, distante do cotidiano concreto dos homossexuais. ?Ultrapassadas? ou ?pornográficas? que sejam, as narrativas de Cassandra Rios apresentam um quadro muito mais verossímil da situação social e emocional das lésbicas de seu tempo. ADRIANE PIOVEZAN é Mestre em Estudos Literários pela UFPR e autora da dissertação "Amor romântico X Deleite dos sentidos: Cassandra Rios e a identidade homoerótica feminina na literatura? (UFPR, 2006). Saiba Mais - Livros:FACCO, Lucia. As heroínas saem do armário: literatura lésbica contemporânea. São Paulo: GLS, 2004.RTINARI, Denise. O discurso da homossexualidade feminina. São Paulo: Brasiliense, 1989.RIOS, Cassandra. As traças. São Paulo: Brasiliense, 2005. Saiba Mais - Filmes:?Ariella, a paranóica? (1980). http://www.imdb.com/title/tt0241196 http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=1524