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FACULDADE PAULISTA DE ARTES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM HISTÓRIA DAS ARTES:
TEORIA E CRÍTICA
FLÁVIA GONZALES CORREIA
WASSILY KANDINSKY: TRANSCENDENDO PARADIGMAS DA ARTE
PELA EXPERIÊNCIA SINESTÉSICA
ORIENTADOR: PROFº MS. PAULO TREVISAN
SÃO PAULO
2014
FACULDADE PAULISTA DE ARTES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM HISTÓRIA DAS ARTES:
TEORIA E CRÍTICA
FLÁVIA GONZALES CORREIA
WASSILY KANDINSKY: TRANSCENDENDO PARADIGMAS DA ARTE
PELA EXPERIÊNCIA SINESTÉSICA
Artigo apresentado à Faculdade Paulista de Artes,
como requisito para conclusão do curso de Pós-
Graduação Lato Sensu em História das Artes:
Teoria e Crítica, sob orientação do Professor
Mestre Paulo Trevisan.
SÃO PAULO
2014
Ficha Catalográfica Elaborada Pela Biblioteca José Carlos
Figueiredo Ferraz
C824w
CORREIA, Flávia Gonzales
Wassily Kandinsky: Transcendendo paradigmas da arte pela experiência
sinestésica/ Flávia Gonzales Correia. Orientação do Professor Ms. Paulo Trevisan.
São Paulo: Faculdade Paulista de Artes, 2014.
1. Wassily Kandinsky. 2. Sinestesia. 3. Pintura. 4. Arte Moderna. 5. Percepção
CDD - 709
3
WASSILY KANDINSKY: TRANSCENDENDO PARADIGMAS DA ARTE PELA
EXPERIÊNCIA SINESTÉSICA
FLÁVIA GONZALES CORREIA
RESUMO
Este trabalho busca estabelecer relações entre a experiência sinestésica, o
transcendental e a pintura do século XX, por meio das vivências artísticas e teóricas de
Wassily Kandinsky, que incorporava a suas obras um cruzamento de sensações, para assim
proporcionar uma experiência mais ampla e complexa em seu público. Ao expor a
evolução de suas obras e pensamentos, pretende-se pensar as relações entre a sinestesia e a
arte, o que implica levar em conta a questão da percepção de modo abrangente, refletindo
sobre ela não somente como objeto de estudo da filosofia, da fisiologia, da neurologia ou
da psicologia – com suas múltiplas implicações em termos de consciência, pensamento e
cognição – mas em suas relações com o sentido de nossa experiência cultural, social e o
universo de significações que nos habita.
Palavras-chave: Sinestesia; pintura; arte moderna; Kandinsky; percepção.
Title: Wassily Kandinsky: Transcending paradigm of art by synaesthetic experience
ABSTRACT
This paper seeks to establish the relations between the synaesthetic experience, the
transcendental and the painting of the twentieth century through the artistic
and theoretical experiences of Wassily Kandinsky, who used to incorporate a combination
of sensations into his works of art, thereby to provide a broader and more complex
experience to their public. By exposing the evolution of his works of art and thoughts, we
intend to wonder about the relationship between synesthesia and art, which entails
taking into account the issue of a comprehensive perception reflecting upon it not only as
an object of philosophy, physiology , neurology or psychology study with its
multiple implications in terms of conscience, thought and cognition - but in their relations
with the sense of our cultural, and social experience and the universe of meanings
that inhabits us.
Keywords: Synesthesia; painting; modern art; Kandinsky; perception
4
A “Arte Moderna” no imaginário comum remete à arte que rompeu com todas as
tradições do passado e tentou fazer o que nenhum artista sequer sonharia realizar nos
tempos antigos. Contudo, sabe-se que a arte moderna, não menos do que a arte antiga,
surgiu em resposta a certos problemas bem definidos. Entre a última década do século XIX
e a primeira do século XX, a pintura, assim como as demais modalidades artísticas, tinha
como característica o extremo decorativismo, e devia exibir um padrão agradável ao olhar
antes de se poder ver o que representava: era uma arte carente de significado pictórico e
sentido simbólico. Aquilo que chamamos de arte moderna nasceu do sentimento de
insatisfação, de que algo escapara da arte e deveria ser recuperado.
O Impressionismo1
, movimento ocorrido na segunda metade do século XIX foi o
grande desencadeador desse sentimento. Para Paul Cézanne (1839-1906), perdera-se o
senso de ordem e equilíbrio, pois a preocupação dos impressionistas com o momento fugaz
os fez esquecer as sólidas e duradouras formas da natureza. Para Vincent Van Gogh (1853-
1890), ao render-se às impressões visuais e explorar somente as qualidades ópticas da luz e
da cor, a arte corria o perigo de perder a intensidade e a paixão, única forma do artista
expressar seus sentimentos e transmiti-los aos seus semelhantes. Paul Gauguin (1848-
1903), profundamente insatisfeito com sua vida e a arte como se encontrava, tinha a
ambição de realizar algo mais simples e direto, e esperava encontrar entre os primitivos os
meios para atingir seus objetivos. (GOMBRICH, 2011)
Cézanne, Van Gogh e Gauguin foram três homens solitários, que trabalharam com
pouca esperança de serem algum dia compreendidos. Mas suas inquietações e os
problemas de sua arte, dos quais tinham uma consciência tão aguda e dolorosa, foram
sentidos por um número cada vez maior da nova geração de artistas, que se preocupavam
em salvar a essência da pintura, tarefa que exigia propostas plásticas independentes e uma
sólida justificativa teórica. Ambas exigências foram preenchidas por um mesmo artista,
que buscou estabelecer relações entre a pintura, a experiência sinestésica e o
transcendental: Wassily Kandinsky (1866-1944).
Ele se destaca na pintura, não apenas não apenas por ser um dos pioneiros da arte
abstrata, mas por suas contribuições teóricas sobre a arte pictórica. Com sua tendência
espiritual de compreender a arte, pretendia nos reconduzir à realidade invisível, espiritual,
o que é comum ao mundo e ao homem, a alma do universo, à experimentação sensível por
meio da obra de arte. Concebeu a pintura abstrata como o triunfo do espírito sobre a
5
matéria, tal como descreveu em seu primeiro texto teórico Do espiritual na arte, no qual
fala sobre a cor e a forma e defende a intuição como valor artístico. Em meio à
instabilidade política de sua época, precisou conviver com a intolerância do regime
socialista e da Alemanha nazista para defender sua pintura. Pesquisador entusiasmado e
incansável, incorporou à sua obra uma originalidade carregada de idealismo.
1. SINESTESIA: FENÔMENO DA PERCEPÇÃO?
Algumas pessoas conseguem ver sons, sentir o aroma das palavras, ouvir cores,
saborear músicas ou atribuir cores a números e letras. Esse fenômeno é conhecido como
sinestesia. Percebem-se relações entre a sinestesia e a criatividade, pelo fato de muitos
sinestetas estarem de alguma forma inseridos no mundo artístico. Pode-se observar este
fenômeno de duas maneiras distintas: quando o artista realmente possui sinestesia e o
artista que não é sinesteta, mas que usa o conceito para criar a sua obra artística. A
sinestesia não aparece apenas em um contexto científico, ela está cada vez mais presente
nas artes visuais e o termo é usado constantemente para descrever obras cuja percepção
depende de vários sentidos ao mesmo tempo.
A palavra deriva do grego antigo, pela justaposição da preposição syn, denotando
união, com a palavra aisthēsis, que significa sensação. A sinestesia significa o cruzamento
de sensações, ou seja, a capacidade da estimulação de um sentido despertar a sensação de
outro. Ela é estudada por médicos e psicólogos como um transtorno da percepção, quando
esta sensação secundária se dá de forma involuntária e intensa, como uma sensação real. A
sinestesia de forma congênita se faz presente naturalmente no indivíduo, na sua criação e
em sua vida, sendo ela um sentido a mais (CYTOWIC, 1995).
Associam-se certas propriedades à experiência sinestésica: ela nos aparece como uma
experiência direta, pré-verbal do mundo; uma imersão na sensação, oposta àquela analítica,
racional; uma experiência específica do tempo, quase como uma dilação, um tempo
deslocado do tempo linear, diacrônico, da experiência ordinária. Assim, opondo-se a
aspectos decisivos da experiência perceptiva normatizada na cultura, a sinestesia se apresenta
como um modo particular de consciência, uma gestalt2
específica, uma construção de mundo
6
que provê uma cognição distinta, inefável – que o sinesteta experimenta, mas não consegue
expressar completamente. Tais qualidades levaram Cytowic a comparar a experiência
sinestésica ao êxtase espiritual. (Apud BASBAUM, 2008)
Há diversos tipos de sinestesias: considerando os cinco sentidos - visão, audição,
olfato, paladar e tato - pode haver diversas combinações de pares possíveis. Embora
normalmente opere num sentido só, alguns sinestetas apresentam sinestesias múltiplas.
Sean Day3
, linguista e membro-diretor da American Synesthesia Association (Associação
Americana de Sinestesia) descobriu até o momento 60 tipos de sinestesias. O tipo mais
frequente é o grafema-cor (onde as cores são associadas a números, palavras ou letras),
mas são muito comuns também sinestesias conhecidas como audição colorida (a percepção
de sons atuando como estímulo à percepção de cores). Seus estudos apontam a audição
como o sentido que mais desperta sinestesias.
Segundo Day, alguns músicos e pintores possuíam, provavelmente, a sinestesia
como condição neurológica, tais como Olivier Messiaen, Ligeti, Sibelius, Duke Ellington e
Charles Blanc-Gatti. Já outros utilizavam ideias sinestésicas em seus trabalhos, embora,
possivelmente, não possuíssem essa condição neurológica. Dentre estes pode-se citar
Scriabin, Miles Davis, Wassily Kandinsky, Paul Klee e Piet Mondrian.
Sérgio Roclaw Basbaum4
, Mestre e Doutor em Comunicação e Semiótica – PUC-
SP e Pós-Doutor em Filosofia pela UNESP, menciona que da Grécia ao século XVII, os
hábitos perceptivos ocidentais operaram segundo uma relação sinestésica com a realidade.
A cultura do século XIX separou os sentidos, e a arte moderna sustentou-se nesta lógica.
Mas a cultura digital contemporânea parece retomar modelos sinestésicos de percepção.
Basbaum aponta que a sociedade fragmentada, pautada numa ciência que fragmenta
o corpo, autonomiza e especializa os sentidos, associa a sinestesia a uma experiência
direta, a-racional, não mediada pela linguagem, que parece partilhar certa semelhança com
estados de consciência que nossa cultura classificou como espirituais ou místicos. Fala de
McLuhan, que tem como ideia central de que as tecnologias, ao imporem uma
reorganização de nossos sentidos, moldam a maneira como organizamos pensamento e
conhecimento.
Ele sugere também não ser coincidência que a tecnologia digital esteja implicada
diretamente em processos sinestésicos de representação retomados com o fim do
modernismo, pois a cultura digital imprimiu notável aceleração ao mundo. Estes ambientes
7
que chamamos imersivos são apenas espaços distintos dentro do ambiente maior de uma
cultura planetária em que estamos mais e mais imersos no instante: a noção de
historicidade dissolve-se na circularidade do instante sinestésico; as experiências do tempo
narrativo e do espaço contemplativo visual se dissolvem em sensação.
Para o autor, a experiência contemporânea, largamente sinestésica, traz de volta o
universo mágico, primitivo, de onde emergem todo o tipo de metáforas e discursos
espirituais e míticos de nossa experiência. Num quadro como este, a palavra sinestesia
assume um caráter fascinante, aparece em diferentes áreas do conhecimento. Evoca uma
sorte de temas, como se acenasse ao mistério do sentido contemporâneo: sensações
movidas pela subjetividade da nossa percepção.
2. WASSILY KANDINSKY: LÓGICA E INTUIÇÃO
Wassily Wassilyevich Kandinsky, foi um importante
pintor, teórico e professor russo, considerado o pioneiro da
pintura abstrata, ao lado do holandês Piet Mondrian e do também
russo Casimir Malevich.
Formado em Direito e Economia, porém sempre
interessado em música e arte descobre, em 1889, a arte popular
em uma viagem ao norte da Rússia, onde entra em contato com a
intensamente cromática cultura campesina russa. Aos 30 anos,
Kandinsky abandona a promissora carreira universitária e volta-
se para a pintura após visitar exposição dos Impressionistas
franceses, apresentada na Rússia em 1895. Uma tela em
particular causa-lhe profundo impacto: Montes de feno pela
manhã, final do verão de Claude Monet (1840-1926). Viajou a
Paris, decidido a dar início a seus estudos artísticos, depois
seguiu para Munique, onde estudou pintura por dois anos. Fundou e presidiu uma
associação de artistas e expositores, a Die Phalanx. Suas pinturas até esse momento são
dominadas pelo estilo fauvista5
.
Fotografia de Kandinsky
(Anonymous. Wassily
Kandinsky. c 1913. From
Wassily Kandinsky (1913).
Rückblicke. Berlin: Sturm
Verlag.)
8
Depois da dissolução da Die Phalanx, viaja pela Holanda, França, Tunísia e Itália
com Gabriele Münter (jovem artista por quem se apaixona), instala-se em Murnau e é
eleito presidente da associação artística NKVM. Tem contato com a tese de doutoramento
de Wilhelm Worringer, Abstraktion und Einfühlung (Abstração e Empatia)6
, de 1907,
considerada a primeira (e mais importante) elaboração teórica sobre a validade estética da
arte abstrata. Prossegue com seus estudos, e começa a elaborar as soluções formais que
permitiram à pintura libertar-se da representação naturalista e dos efeitos decorativos,
baseando-se no comportamento visual das cores e das formas, sustentados em um sólido
conceito compositivo e aprofunda-se na arte abstrata com as séries Impressões,
Improvisações e Composições.
Suas reflexões, sobre a arte de seu tempo e suas próprias experiências pictóricas
dariam origem ao livro Do espiritual na arte, publicado em 1911, considerado uma das
mais importantes obras teóricas da história da arte, além de abrir caminho para as novas
expressões artísticas do século XX. Kandinsky empreende uma investigação filosófica
sobre as cores e as formas, às quais confere sua visão de que a arte não necessita do motivo
natural para ser esteticamente válida, ela pode ser igualmente significativa se realizada por
meio da abstração. Para ele, as convenções do passado estavam esgotadas, o artista não
deve se submeter ao exterior, já que em sua espiritualidade reside o visionário de sua obra.
Profundamente influenciado pelo pensamento teosófico7
de Helena Blavatsky e
antroposófico8
de Rudolf Steiner, Kandinsky, assim como outros artistas das Vanguardas,
busca o regresso às origens, aos sentimentos mais profundos, às emoções universais,
enfim, ao espiritual, características da arte primitiva, da experiência do sagrado e dos ritos
religiosos. Ele aponta um parentesco espiritual entre os artistas do início do século XX
com os povos primitivos: “Como nós, esses artistas puros só se ligaram, em suas obras, à
essência interior, sendo por isso mesmo eliminada toda e qualquer contingência”.
(KANDINSKY, 1996, p. 27-28).
Para demonstrar sua visão do momento espiritual da sociedade, ele faz analogia a
um triângulo9
, dividido em partes desiguais, onde sua base representa o que existe de mais
material e o ápice o que há de mais espiritual e sublime. A base, larga, espaçosa e alta,
avança lentamente ao ápice, que é menor e mais agudo, e vai se desprendendo e se
afastando dos sentimentos mesquinhos e do materialismo e, assim, alcança com muito
esforço o lugar que os que estão no ápice já vivenciaram. Estes, que ocupam o ápice, a
9
ponta extrema, são poucos, muitas vezes não há mais que um homem solitário, que mesmo
incompreendido pela maioria, se faz responsável pelo avançar de toda a humanidade.
Nesse sentindo, a criação artística tem a função de revelar à humanidade o próximo passo
do progresso espiritual. Para ele, "Quem quer que mergulhe nas profundezas de sua arte,
em busca de tesouros invisíveis, trabalha para erguer essa pirâmide espiritual que chegará
ao céu."(KANDINSKY, 1996, p.59).
Para ele, o objetivo do artista, além de alcançar a essência de cada forma e cada cor
é “extrair da alma humana a vibração certa”(Idem p.76) que conduza a humanidade de
volta à realidade invisível, espiritual, à experimentação sensível por meio da obra de arte.
A maneira de atingir esses objetivos é seguir o Princípio da Necessidade Interior10
, que é
constituída de três necessidades místicas: A primeira é o elemento da personalidade,
próprio de cada artista, enquanto ser criador; a segunda é o elemento próprio de cada
época, a cultura de um povo e a terceira é o elemento artístico puro e eterno, que se
encontra em todos os seres humanos e é próprio da arte.
Dentro destas três necessidades místicas, a mais importante, para Kandinsky, é a
terceira, pois ele não trata a arte como atividade cultural humana, mas sim como o produto
de um espírito elevado. Assim, a Necessidade Interior não corresponde a uma vontade
pessoal do artista, ou a expressão de seus sentimentos ou de seu ponto de vista; na verdade
ela seria um componente espiritual objetivo, que não se origina no artista, mas fora dele,
em um plano sensível, envolta em misticismo. O artista sintoniza-se com este princípio, e a
partir dele, busca as melhores formas e cores para traduzi-lo, logo, o desenvolver da arte é
uma exteriorização progressiva do eterno-objetivo no temporal-subjetivo.
Sua primeira obra totalmente abstrata é uma aquarela sem título, datada de 1910,
onde, sobre um espaço imaginário branco formas indefinidas flutuam, nas cores vermelha,
azul, verde e preta. Seu traço sinuoso, uma possível influência de sua admiração pela
caligrafia japonesa, árabe e cirílica, por sua capacidade de transmitir emoções sem recorrer
a imagens, combinados com pinceladas soltas, inclinadas, curvas e onduladas, contraste
entre as cores quentes e frias, demonstram sua preocupação em transmitir a sensação de
movimento. Teórico da cor, nesta aquarela, privilegiou as virtudes do vermelho, quente e
expansivo, em alguns momentos disposto em forma circular, com a particularidade de
estabelecer limites dinâmicos, uma contradição que busca mostrar a vitalidade da cor em
destaque.
10
Kandinsky discorre sobre a cor no seguinte trecho:
“O vermelho tal qual como o imaginamos, cor sem limites, essencialmente
quente, age interiormente como uma cor transbordante de vida ardente e agitada.
[...] Apesar de toda a sua energia e intensidade, o vermelho atesta uma imensa e
irresistível potência, quase consciente de seu objetivo. Nesse ardor, nessa
efervescência, transparece uma espécie de maturidade masculina, voltada
sobretudo para si mesma e para a qual o exterior conta muito pouco.”
(KANDINSKY, 1996, p. 97).
Sua busca era por uma pintura onde as cores, linhas e formas se libertassem da
representação de objetos reconhecíveis, que considerava uma distração, um desvio do olhar
do espectador da verdadeira essência da obra. Visava à evolução de sua pintura para uma
linguagem visual que, assim como a linguagem abstrata da música, exprimisse conceitos
gerais e provocasse emoções profundas. Não era casual a linguagem musical aplicada à
pintura. Além do contato com a música durante sua infância (ele estudou piano e
violoncelo), em 1896, o artista ficara impressionado com a ópera Lohengrin de Richard
Wagner (1813-1883), que postulava a "arte total"11
. Também se relacionou com Schönberg
(1874-1951), compositor contemporâneo a ele, que com as suas pesquisas, aspirou libertar
a composição musical de qualquer forma pré-estabelecida12
.
Sem título (Primeira Aquarela Abstrata) 1910-1913 - Lápis, tinta-da-
china e aquarela sobre papel 49,6x64,8 cm. Musée National d’Art
Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris (França)
11
A primeira afirmação de seu livro é: “Toda a obra de arte é filha do seu tempo e,
muitas vezes, mãe dos nossos sentimentos.” (KANDINSKY, 1996, p.23). Em toda sua
obra defende esse conceito, de que a arte não deve ser um espelho do passado. Mais
adiante, encontra-se a seguinte afirmação:
“Para o artista criador que quer e que deve exprimir o seu universo interior, a
imitação, mesmo que bem sucedida, das coisas da natureza não pode ser um fim
em si. E ele inveja a desenvoltura, a facilidade com que a mais imaterial de todas,
a música, alcança esse fim. Compreende-se que ele se volte para essa arte e que se
esforce, na dele, por descobrir procedimentos similares. Daí, na pintura, a atual
busca de ritmo, da construção abstrata, matemática; daí também o valor que se
atribui hoje à repetição dos tons coloridos, ao dinamismo da cor.” (Idem p. 57-58)
Do mesmo modo que os compositores, ele pretendia libertar a pintura de todos os
cânones instituídos até aquele momento. Para tanto, se utiliza de diversas metáforas
sinestésicas, o que o torna uma incógnita: para alguns pesquisadores, ele era de fato
sinestésico, para outros, um entusiasta do fenômeno da sinestesia, que se utilizou dela
como suporte de sua teoria, e em suas obras. A afirmação a seguir é um exemplo claro de
sua compreensão sinestésica da pintura:
“Tais efeitos se correspondem porque a pintura não se recebe exclusivamente
pelos olhos, nem a música exclusivamente pelos ouvidos, mas ambas as artes se
dirigem aos cinco sentidos (tato: impressão de picotamento ou de suavidade;
olfato: o violeta tem um cheiro diferente do amarelo; paladar: pintura
saborosa…). A arte produz também efeitos psicológicos: fala-se de pintura ‘fria’,
de música ‘glacial’, os tons e os sons pode ser ‘quentes’.” (Idem, Ibidem p. 255)
Conforme já dito anteriormente, o aprofundamento de Kandinsky na abstração se
dá com as séries Impressões, Improvisações e Composições. A obra a seguir pertence à
série Composições. Sobre esta série, ele diz:
“Expressões que se formam de maneira semelhante, mas que, lentamente
elaboradas, foram repetidas, examinadas e longamente trabalhadas a partir dos
primeiros esboços, quase de modo pedante. Chamo-lhes Composições. A
inteligência, o consciente, a intenção lúcida, a finalidade precisa, desempenham
neste caso um papel capital; só que não é o cálculo que predomina, mas sempre a
intuição” (KANDINSKY, 1996, p.135)”
12
Composição VI (1913) – Óleo sobre tela 195x300 cm - Hermitage, São Petesburgo (Rússia)
Nesta obra, as formas estão diluídas em uma representação puramente pictórica,
abstrata, onde as cores independem dos objetos. Há uma profusão de cores, que vai desde
tons escuros na parte superior aos tons rosados e delicados à esquerda, aos azuis e
vermelhos espalhados do centro à direita, e mais abaixo tons de branco, rosa e azul que
parecem se dissolver em meio a uma névoa. A possível inspiração para esta tela era sua
visão da evolução da catástrofe apocalíptica para uma época de grande espiritualidade.
Diante da expressiva combinação de linhas e cores, pode-se observar a aplicação
prática de suas observações sobre a cor e sobre como esta provoca sensações no espectador.
“As cores claras atraem mais o olho e o retêm. As cores claras e quentes retêm-
no ainda mais: assim como a chama atrai irresistivelmente o homem, também o
vermelho atrai e irrita o olhar. O amarelo-limão vivo fere os olhos. A vista não
consegue suportá-lo. Dir-se-ia um ouvido dilacerado pelo som estridente do
trompete. Os olhos piscam e vão mergulhar nas profundezas calmas do azul e do
verde.[...] A cor provoca, portanto, uma vibração psíquica. E seu efeito físico
superficial é apenas, em suma, o caminho que lhe serve para atingir a alma.[...]
Fala-se correntemente do ‘perfume das cores’ ou de sua sonoridade. E não há
quem possa descortinar uma semelhança entre o amarelo-vivo e as notas baixas
do piano ou entre a voz do soprano e a laca vermelho-escura, tanto essa
sonoridade é evidente." (Idem p. 66-68)
13
Para ele, era evidente a força real da cor sobre todo o ser humano, fato que carecia
de mais estudos. “Com maior razão, não é possível contentar-se com a associação para
explicar a ação da cor sobre a alma. A cor, não obstante, é um meio de exercer sobre ela
uma influência direta. A cor é a tecla. O olho é o martelo. A alma é o piano de inúmeras
cordas” (KANDINSKY, 1996, p. 68). Fala também sobre o princípio de harmonia das
cores: “É evidente, portanto, que a harmonia das cores deve unicamente basear-se no
princípio do contato eficaz (Grifo do autor). A alma humana, tocada em seu ponto mais
sensível, responde.” (Idem p. 69).
Kandinsky retorna a Moscou antes da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Em
1917, estoura a Revolução Russa13
, que o deixa sem recursos, mas, mesmo assim, ele
colabora com o novo regime. Nesse período ele se casa e tem um filho, morto em 1920.
Abalado pela morte de seu filho, parte para a Alemanha, onde é contratado para lecionar na
Bauhaus14
. O corpo docente da prestigiada escola de arquitetura e artes aplicadas era
constituído por alguns dos mais importantes artistas da época, com quem ele dividiu suas
inquietações.
A suma de seu elaborado programa de ensino é publicada por ele em seu livro
Ponto e linha sobre plano, a sequência orgânica de seu primeiro trabalho, onde apresenta a
teoria das formas sensivelmente ampliada, com uma análise aprofundada das formas
básicas e suas relações. Do mesmo modo que fez com a cor, ele procura as ressonâncias
espirituais para o que denomina ponto e linha, seu dinamismo particular, estabelecendo as
mesmas metáforas sinestésicas em relação à música, e estuda as tensões que se
estabelecem sobre o plano e como este, aparentemente neutro, influencia os efeitos que se
obtém com uma composição.
A partir desse momento, elabora uma pintura geométrica carregada de misticismo,
onde se pode notar a influência que o Suprematismo15
e o Construtivismo16
tiveram
durante a sua estadia na Rússia. Sua tela Composição VIII, pintada em 1923, durante o
período em que lecionou na Bauhaus, apresenta um ritmo geométrico e racional em vez da
emoção lírica de suas Composições anteriores. O quadro se constitui de formas
geométricas (círculos, semicírculos, blocos de quadrados e retângulos, elementos lineares,
ângulos e figuras irregulares). Um grande círculo em tons escuros no canto superior
esquerdo, ao lado de um círculo menor vermelho é o ponto focal da pintura.
14
Há uma enorme mudança do predomínio da cor para o predomínio da forma na
composição pictórica. As formas se traduzem em um equilíbrio dinâmico da tela, as cores
são utilizadas para acentuar a geometria, como nos círculos com halos contrastantes, e nas
linhas angulares com cores diluídas de azul e rosa. O fundo também contribui para realçar
a sensação de dinamismo na tela, suas cores definem a profundidade: o azul claro na parte
inferior, amarelo claro no cimo e branco no meio. As formas tendem a retroceder e avançar
em um espaço indefinido, criando um aspecto ambíguo.
Nesta obra, podemos ver claramente seu estudo dos efeitos que a forma exerce
sobre a cor.
“A forma, mesmo abstrata, geométrica, possui seu próprio som interior; ela é um
ser espiritual, dotado de qualidades idênticas às dessa forma. Um triângulo (não
tendo outras características que indiquem se é agudo, obtuso ou isósceles) é um
ser. Um perfume espiritual que lhe é próprio emana dele. Associado a outras
formas, esse perfume se diferencia-se, enriquece-se de nuanças – como um som,
de seus harmônicos - , mas, no fundo, permanece inalterável. Assim é o perfume
da rosa, que jamais pode ser confundido com o da violeta. Assim são o círculo, o
quadrado, todas as formas imagináveis. [...] E vemos claramente aparecer a
reação da forma e da cor. [...] Cores ‘agudas’ têm suas qualidades ressoando
melhor numa forma pontiaguda (o amarelo, por exemplo, num triângulo). As
cores que podemos qualificar de profundas veem-se reforçadas, sua ação
Composição VIII (1923) - óleo sobre tela 140x201 cm - Solomon R. Guggenheim
Museum, New York.
15
intensificada, por formas redondas (o azul, por exemplo, num círculo). É claro,
por outro lado, que o fato de não combinar a forma numa cor não deve ser
considerado uma ‘desarmonia’. Cumpre ver aí, pelo contrário, uma nova
possibilidade, portanto, uma causa de harmonia.” (KANDINSKY, 1996, p. 75)
Após o fechamento da Bauhaus pelo governo Nazista em 1933, vários artistas
migram para outros países. Kandinsky vai se abrigar em Neuilly-sur-Seine, próxima a
Paris, e aproxima-se dos pintores surrealistas Hans Arp e Joan Miró, com quem manteve
uma estreita amizade. Gradativamente, sua pintura se desvincula dos elementos
geométricos e deriva para abstração biomórfica, originando um novo estilo ao final de sua
trajetória artística. Outros fatores também influenciam essa mudança, como seu interesse
pela cultura popular eslava e sua fascinação pelas ciências naturais, especialmente a
botânica, zoologia e embriologia. A última fase da pintura de Kandinsky parece querer
fugir das atrocidades, arbitrariedades e restrições impostas pela ocupação nazista. Sua
pintura vai buscar abrigo em um universo onírico, que transborda fantasia, representado em
grande parte das suas pinturas, aquarelas e desenhos produzidos em Neuilly-sur-Seine até
sua morte em 1944.
Azul Celeste (1940) – Óleo sobre tela 100x73 cm –
Musée National d’Art Moderne, Centre Georges
Pompidou, Paris
16
Um exemplo dessa fase é a tela “Azul Celeste”, onde uma série de formas
biomórficas, diferentes umas das outras, se mantém relacionadas pelo seu aspecto e suas
cores vivas , dispostas sobre um fundo azul suave, em que ele demonstra sua teoria de que
“O azul é a cor tipicamente celeste. Ela apazigua e acalma ao se aprofundar”
(KANDINSKY, 1996, p. 92). A espiritualidade que o impulsionou desde o princípio, se
mostra presente, assim como suas referências: o colorido dos ícones russos, uma figura que
lembra um cavalo de madeira, o brinquedo, que remete à sua fase em Munique e à imagem
e simbolismo do cavaleiro que ocupavam suas telas nesse período, o axadrezado que
remete a Moscou e ao período da Bauhaus.
A característica mais marcante da teoria sobre as cores de Kandinsky é sua
coerência interna. A partir da hipótese de que a cor é um elemento da linguagem da alma,
ele empreende uma análise ordenada, que se inicia com a qualidade da cor (quente-frio,
claro-escuro) e logo caminha para o espaço-temporalidade do elemento colorido. Assim,
pela lógica dos contrastes é que ele estabelece a relação das cores entre si. Mesmo
passando por diversas transformações, seu objetivo de atingir a harmonia e a “Necessidade
Interior” se manteve em sua obra, os ecos de sua teoria sempre estão presentes, como se
pode verificar pelo trecho a seguir.
“Luta de sons, equilíbrio perdido, ‘princípios alterados, rufar inopinado de tambores,
grandes indagações, aspirações sem objetivo visível, impulsos aparentemente
incoerentes, cadeias desfeitas, vínculos quebrados, reatados num só, contrastes e
contradições, eis o que é a nossa Harmonia. A composição que se baseia nessa
harmonia é um acordo de formas coloridas e desenhadas que, como tais, têm uma
existência independente, procedente da Necessidade Interior, e constituem, na
comunidade que daí resulta, um todo chamado quadro” (Idem p. 103-104)
3. UM ARTISTA VISIONÁRIO
O conjunto de obras analisadas demonstra que o objetivo de Kandinsky era propor
um novo modelo de percepção do mundo, com o qual pretendia despertar o ser humano da
sua indiferença, retirá-lo do seu olhar e sentir convencionais, e trazê-lo para uma
experiência estética pura, primordial, em busca de uma interpretação singular em relação
17
ao que está ao nosso redor, e principalmente de nossa força interior. Seu processo
investigativo é carregado de espiritualidade e sensibilidade, latentes de sua origem oriental
moscovita, porém com a objetividade de sua herança cultural alemã. De Moscou, ele traz a
paixão, a força da cor e o desejo pelo transcendental; da Alemanha, traz sistematização, o
apreço pela descoberta da teoria e a busca pelo conhecimento, mas acima de tudo, toda a
mudança filosófica causada por Kant no final do século XIX. O que significa compreender
o mundo não mais como um sistema baseado na exatidão daquilo que se vê, onde o valor
coincide com a realidade: o mundo que nossos sentidos nos desvendam é um conjunto de
fenômenos que tem poucas relações com a realidade das coisas.
Sua proposta era de que a reeducação estética e espiritual não fosse feita somente a
nível superficial, da ilusão das aparências, mas sim pela inocência, o olhar de primeira vez,
que induz a descobrir a essência do mundo e de si mesmo. Segundo ele, “O “Belo interior”
é aquele para o qual nos impele uma necessidade interior quando se renunciou às formas
convencionais do Belo. Os profanos chamam-na feiúra. O homem é sempre atraído, e hoje
mais do que nunca, pelas coisas exteriores, não reconhecendo de bom grado a necessidade
interior. Essa recusa total das formas habituais do “Belo” leva a admitir como sagrados
todos os procedimentos que permitem manifestar sua personalidade.” (KANDINSKY,
1996, p. 51)
Essa realidade transcendental do mundo sensível, que vai além da compreensão
racional, era chamada de “alma” por Kandinsky. Para ele, toda a natureza, a vida e o
mundo interno que circundam o artista e a essência de sua alma, são a fonte única de cada
arte. O pintor se “alimenta” de impressões exteriores (sua vida cotidiana, seus estudos e
pesquisas) e as transforma em sua alma (sua vida interior, sua essência), traduzindo seus
sonhos e suas realidades em sua obra, de forma inconsciente. Logo, a concepção da forma
sensível por meio da pintura é compreendida como a expressão do artista, sua vida interior
e direta, com seus mais intensos e profundos sentimentos e intuições.
Simbolizar é construir novos mundos. Ao pensarmos a arte como uma visão do
mundo, vemos a obra como uma janela para ampliar essa visão. Utilizando seu rico
universo simbólico, Kandinsky transfigurou a realidade de uma maneira única, chegando a
praticamente se desfazer dela. Sua intuição visionária percebeu o potencial de uma arte
puramente abstrata por meio da sua crença na ‘musicalização’ da pintura. No entanto,
sempre deixou claro que não desejava ‘pintar a música’. Ele pensava que as cores, assim
como as formas e as linhas, poderiam evocar sons. Ele estabelece e preconiza a
aproximação entre a pintura e a música, arte puramente “espiritual”, por ter vivenciado
18
essa relação, pois era dotado de uma sensibilidade excepcional. Conta em suas recordações
que, ao escutar Lohengrin, as cores se apresentavam a seus olhos. Ele as via. O que ele
busca com o efeito sensorial das cores é a sua ressonância espiritual, a ação direta da cor
sobre a alma.
É notável o fato de que a sinestesia estimulou sua sensibilidade artística, se não de
forma congênita, como um entusiasta dessa modalidade perceptiva e produto cultural, que
para ele era passível de ser despertada em qualquer um. Sua arte impregnou-se desse
conceito, e estruturou seu pensamento. Em 1935, em artigo para a revista dinamarquesa
Konkretion, Kandinsky explica seu conceito de “olhar interior” da seguinte forma: “Chamo
‘olhar interior’ à experiência de sentir a alma secreta das coisas com o olho desarmado,
através do microscópio ou do telescópio. Esse olhar atravessa a dura casca, a ‘forma’
exterior, para chegar ao interior das coisas e nos permitir captar, com todos nossos
sentidos, o ‘palpitar’ interior das mesmas” (Apud FOLHA, 2007)
Sérgio Basbaum diz que os elementos fundantes do abstracionismo de Kandinsky
parecem muito próximos daquilo que apontamos como qualidades da percepção
sinestésica. Não deve ser surpresa, portanto, que encontremos seu trabalho associado quase
sempre ao conceito de sinestesia. Cytowic cita, por exemplo, o discurso do pintor em 1910:
'Entregue seus ouvidos à música, abra seus olhos à pintura e... Pare o pensamento!
Apenas pergunte a você mesmo se o trabalho (de arte) permitiu a você passear em um
mundo desconhecido. Se a resposta é sim, o que mais você quer?’ A obra pictórica de
Kandinsky transcende aos elementos teosóficos os doutrinários presentes em seu discurso,
mas a aspiração a sinestesia e os elementos básicos ligados aos trabalhos sinestésicos
encontram-se lá expressos de maneira nítida: espiritualidade, não-objetividade, sensação,
cognição sinestésica. (BASBAUM, 2001, p.58-59)
Acima de todas as coisas, Kandinsky acreditava na necessidade de regeneração do
indivíduo e da sociedade, superando o caos presente por meio da arte, e o artista carregava
essa árdua missão de sensibilizar a alma humana e abrir caminho para a ascensão
espiritual. A pintura, deveria se libertar da mera representação figurativa, assim, nasce sua
necessidade impregnar de ritmo a pintura, de construção matemática abstrata, de notas
repetidas de cor, de colocar em movimento as cores, enfim, de abstrair. A experimentação
pictórica que ele empreende, como um primeiro contato do ser humano com um mundo
19
desconhecido, metamorfoseando gestos em signos, visa analisar a experiência estética em
sua origem.
Segundo suas próprias palavras: A arte está em busca de uma resposta.
Especializada, ela só ficará inteligível para os próprios artistas, que começam a se queixar
da indiferença do público por suas obras. Nessas épocas, o artista, em geral, tem muito
pouco a dizer. Basta-lhe uma nuança insignificante para fazer-se conhecer e apreciar por
um grupo de mecenas e apreciadores de arte que o exaltam (o que não deixa de se traduzir,
se for o caso, em algumas vantagens materiais). Vê-se então uma legião de homens
dotados de uma aparência de talento que se lançam, não sem habilidade, sobre uma arte
que lhes parece tão simples de conquistar. Em cada ‘centro artístico’ vivem milhares de
artistas dessa espécie, a maioria unicamente preocupada em procurar um novo estilo e que
cria, com o coração frio, sem entusiasmo, sem empolgação, milhões de obras de arte
(KANDINSKY, 1996, p. 37-38)
Para Kandinsky a arte moderna deve resgatar o homem da superficialidade, ao lhe
proporcionar uma experiência global de sua realidade, onde é possível buscar a si mesmo.
Ele percebeu as relações entre cores, musicalidade e movimento. Para ele todas as artes
emergem de uma raiz única, diferenciando-se apenas pelo meio de expressão, pois as leis
complexas e precisas de composição sempre aproximam as diferenças, já que se
apresentam de forma similar em todas as artes. Logo, ele acreditava não só na
correspondência ideal e diacrônica das obras de todas as épocas, mas além disso, na
equivalência absoluta de todas as diferentes artes entre si. Tinha uma necessidade de
coerência propriamente pictórica, e, durante sua vida, alinhou a prática artística com a
elaboração teórica acerca daquilo em que acreditava. Como visionário que era, percebeu o
grande problema da arte de seu tempo e porque não? da arte do nosso tempo.
20
NOTAS
1
O Impressionismo é o movimento artístico que inaugura a arte moderna e tem como característica
preferência pelo registro da experiência contemporânea; observação da natureza com base em impressões
pessoais e sensações visuais imediatas; suspensão dos contornos e dos claro-escuros em prol de pinceladas
fragmentadas e justapostas; aproveitamento máximo da luminosidade e uso de cores complementares,
favorecidos pela pintura ao ar livre. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso
em: 25 Mai. 2014)
2
A psicologia da Gestalt, também conhecida como psicologia da forma ou psicologia da percepção, surge
como escola no início do século XX, na Alemanha, devido aos trabalhos de três principais estudiosos: Max
Wertheimer (1880-1943), Wolfgang Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886- 1941). Até então, a percepção
humana era explicada segundo uma análise atomista e associacionista, ou seja, vigorava a idéia de que
percebemos uma figura a partir de seus elementos e partes componentes, e a compreendemos por associação
com experiências passadas. Em contraposição a essa noção, os psicólogos da Gestalt defendem que a
percepção não é o resultado da soma de sensações de pontos luminosos individuais, mas uma apreensão
imediata e unificada do todo, devido a uma necessidade interna de organização. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ
CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 25 Mai. 2014)
3
Ver DAY (2013)
4
Ver BASBAUM (2012)
5 Ao contrário de outras vanguardas que povoam a cena europeia entre fins do século XIX e a 1ª Guerra
Mundial, o fauvismo não é uma escola com teorias, manifestos ou programa definido. Para boa parte dos
artistas que adere ao novo estilo expressivo - com forte presença na França entre 1905 e 1907 -, o fauvismo
representa sobretudo uma fase em suas obras. Falar em vida curta e em organização informal de pintores em
torno de questões semelhantes, não significa minimizar as inovações trazidas à luz pelos fauves ('feras'). O
grupo, sob a liderança de Henri Matisse (1869-1954), tem como eixo comum a exploração das amplas
possibilidades colocadas pela utilização da cor. A liberdade com que usam tons puros, nunca mesclados,
manipulando-os arbitrariamente, longe de preocupações com verossimilhança, dá origem a superfícies
planas, sem claros-escuros ilusionistas. As pincelas nítidas constroem espaços que são, antes de mais nada,
zonas lisas, iluminadas pelos vermelhos, azuis e alaranjados. Como afirma Matisse a respeito de A Dança
(1910): "para o céu um belo azul, o mais azul dos azuis, e o mesmo vale para o verde da terra, para o
vermelhão vibrante dos corpos". (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em:
25 Mai. 2014)
21
6
A tese de Worringer parte da análise das relações entre o ser humano e a natureza. O autor afirma que há
duas grandes tendências na experiência humana no confronto com o mundo natural. Uma, pacífica, vê na
natureza a fonte tranquila dos recursos vitais. A natureza é a Grande Mãe que tudo dá e, com ela, o ser
humano desenvolve uma empatia que se revela através de uma arte que reproduz com maior ou menor
justeza o que se vê no mundo natural. A segunda tendência, ao contrário, é conflituosa. A natureza é fonte,
principalmente, de apreensões e de temores. O ser humano vive sacudido pelo pânico de ser devorado por
algum animal ou lançado aos ares por algum cataclismo. A arte que este ser humano produz é uma arte que
nega o mundo natural, que se afasta dele através da abstração. (CAMPOS, Jorge Lucio de. A propósito de
Wörringer. A Parte Rei 47 - Set. 2006. Disponível em: http://serbal.pntic.mec.es/AParteRei/lucio47.pdf.
Acesso em: 07 Abr 2014.)
7
A Sociedade Teosófica (S.T.) foi fundada em 1875, por um pequeno grupo de pessoas, dentre as quais se
destacavam uma russa e um norte americano: Helena Petrovna Blavatsky e o cel. Henry Steel Olcott, seu
primeiro presidente. A origem da palavra Theosophia é grega e significa primária e literalmente Sabedoria
Divina. Foi cunhada em Alexandria, no Egito, no século III d.C. por Amônio Saccas e seu discípulo Plotino
que eram filósofos neo-platônicos. Fundaram a Escola Teosófica Eclética e também eram chamados de
Philaletheus (Amantes da Verdade) e Analogistas, porque não buscavam a Sabedoria apenas nos livros, mas
através de analogias e correspondências da alma humana com o mundo externo e os fenômenos da Natureza.
Assim a S.T., enquanto sucessora moderna daquela Escola antiga, almeja tal busca da Sabedoria não pela
mera crença, mas pela investigação direta da Verdade manifesta na Natureza e no homem. Dizia Blavatsky:
“o verdadeiro Ocultismo ou Teosofia é a ‘Grande Renúncia ao eu’, incondicional e absolutamente, tanto em
pensamento como em ação – é Altruísmo”. “Teosofia é sinônimo de Verdade Eterna”, Divina, Absoluta,
Paramarthika Satya ou Brahma-Vidya, que são seus equivalentes muito mais antigos na filosofia oriental.
(SOCIEDADE TEOSÓFICA NO BRASIL: http://www.sociedadeteosofica.org.br. Acesso em: 25 Mai. 2014)
8
A Antroposofia (palavra derivada do grego anthropós, homem, e sophia, sabedoria) é uma filosofia de vida
que reúne os pensamentos científico, artístico e espiritual numa unidade e que responde às questões mais
profundas do homem moderno sobre si mesmo e sobre suas relações com o universo. Elaborada no início
deste século pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), a Antroposofia é um método de
conhecimento que aborda o ser humano em seus níveis físico, vital, anímico e espiritual, e mostra como essas
naturezas, absolutamente distintas entre si, atuam em constante inter-relação. Trata-se de uma Ciência que se
interessa pelos processos físicos abordados pelas ciências naturais e também por todos aqueles processos que
não podem ser materialmente mensuráveis. Esta abrangente e organizada compreensão do ser humano e de
suas relações com o Cosmos trouxe um substancial enriquecimento a todos os campos práticos da sociedade,
contribuindo, com suas descobertas, para uma vida humana mais íntegra (GREUEL, Marcelo. O que é
Antroposofia. Disponível em: http://www.associacaotravessia.org.br/html/antroposofia.html)
22
9
Ver KANDINSKY (1996) p. 35-39
10
Ver KANDINSKY (1996) p. 73, 83-84
11
Richard Wagner, dentro de uma linha de discurso romântico que teve grande impacto em músicos e outros
artistas dos séculos XIX e XX, preconizou a obra de arte total, o Gesamtkunstwerk, a união sinergética de
música e drama através da síntese de seus elementos, 'como efeito total sendo maior do que a soma de suas
partes' e, mais ainda, sendo o 'testemunho da unidade natural de uma cultura de modo geral' (Flinn, 1992). 0
discurso wagneriano será adotado muitas vezes no século XX na defesa do cinema enquanto espetáculo
artístico total, reunião de todas as artes, 'sétima arte', mas não se pode dizer, no entanto, que seja um discurso
especificamente da sinestesia. (BASBAUM, 2001 p.47)
12
0 sistema musical elaborado por Schöenberg, no entanto, como sugere Riley (1995), 'faz o uso da ideia cor
em sentidos variados'. Timbre e dissonância seriam duas das mais usuais. (Apud BASBAUM, 2001 p. 48)
13
A Revolução Russa de 1917 foi uma série de eventos políticos na Rússia, que, após a eliminação da
autocracia russa, e depois do Governo Provisório (Duma), resultou no estabelecimento do poder soviético sob
o controle do partido bolchevique. O resultado desse processo foi a criação da União Soviética, que durou até
1991. (SÓ HISTÓRIA (2009). Disponível em: http://www.sohistoria.com.br/ef2/revolucaorussa/)
14 Criada em 1919 pelo arquiteto germânico Walter Adolf Gropius (1883 - 1969) com a fusão da Academia
de Belas Artes com a Escola de Artes Aplicadas de Weimar, Alemanha, a nova escola de artes aplicadas e
arquitetura traz na origem um traço destacado de seu perfil: a tentativa de articulação entre arte e artesanato.
Ao ideal do artista artesão defendido por Gropius soma-se a defesa da complementaridade das diferentes
artes sob a égide do design e da arquitetura. O termo bauhaus - haus, "casa", bauen, "para construir" - permite
flagrar o espírito que conduz o programa da escola: a idéia de que o aprendizado e o objetivo da arte ligam-se
ao fazer artístico, o que evoca uma herança medieval de reintegração das artes e ofícios. A proposta de
Gropius para a Bauhaus deixa entrever a dimensão estética, social e política de seu projeto. Trata-se de
formar novas gerações de artistas de acordo com um ideal de sociedade civilizada e democrática, em que não
há hierarquias, mas somente funções complementares. O trabalho conjunto, na escola e na vida, possibilitaria
não apenas o desenvolvimento das consciências criadoras e das habilidades manuais como também um
contato efetivo com a sociedade urbano-industrial moderna e seus novos meios de produção.
(ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 8 Jun. 2014)
15 Movimento russo de arte abstrata, o suprematismo surge por volta de 1913, mas sua sistematização teórica
data de 1925, do manifesto Do Cubismo ao Futurismo ao Suprematismo: o Novo Realismo na Pintura,
escrito por Kazimir Malevich em colaboração com o poeta Vladimir Maiakóvski. O suprematismo está
23
diretamente ligado ao seu criador, Malevich, e às pesquisas formais levadas a cabo pelas vanguardas russas
do começo do século XX, o raionismo de Mikhail Larionov e Natalia Goncharova e o construtivismo de
Vladimir Evgrafovic Tatlin. Nesse contexto, o suprematismo defende uma arte livre de finalidades práticas e
comprometida com a pura visualidade plástica. Trata-se de romper com a ideia de imitação da natureza, com
as formas ilusionistas, com a luz e cor naturalistas - experimentadas pelo impressionismo - e com qualquer
referência ao mundo objetivo que o cubismo de certa forma ainda alimenta. Malevich ainda fala em
"realismo", e o faz com base nas sugestões do místico e matemático russo P.D. Ouspensky, que defende
haver por trás do mundo visível um outro mundo, espécie de quarta dimensão, além das três a que os sentidos
humanos têm acesso. O suprematismo representaria essa realidade, esse "mundo não objetivo", referido a
uma ordem superior de relação entre os fenômenos - espécie de "energia espiritual abstrata" -, que é invisível,
mas nem por isso menos real. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 8
Jun. 2014)
16 Para o construtivismo, a pintura e a escultura são pensadas como construções - e não como representações
-, guardando proximidade com a arquitetura em termos de materiais, procedimentos e objetivos. O termo
construtivismo liga-se diretamente ao movimento de vanguarda russa e a um artigo do crítico N. Punin, de
1913, sobre os relevos tridimensionais de Vladimir Evgrafovic Tatlin (1885 - 1953). A consideração das
especificidades do construtivismo russo não deve apagar os elos com outros movimentos de caráter
construtivo na arte, que ocorrem no primeiro decênio do século XX, por exemplo, o grupo de artistas
expressionistas reunidos em torno de Wassily Kandinsky (1866 - 1944) no Der Blaue Reiter [O Cavaleiro
Azul], em 1911, na Alemanha; o De Stijl [O Estilo], criado em 1917, que agrupa Piet Mondrian (1872 -
1944), Theo van Doesburg (1883 - 1931) e outros artistas holandeses ao redor das pesquisas abstratas; e o
suprematismo, fundado em 1915 por Kazimir Malevich (1878 - 1935), também na Rússia. Isso sem esquecer
os pressupostos construtivos que se fazem presentes, de diferentes modos, no cubismo, no dadaísmo e no
futurismo italiano.(ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 8 Jun. 2014
24
REFERÊNCIAS
AMERICAN SYNESTHESIA ASSOCIATION (2011). Disponível em:
http://www.synesthesia.info. Acesso em: 07 Abr. 2014
BASBAUM, Sérgio Roclaw. Fundamentos da Cromossonia: Sinestesia, Arte e Tecnologia.
Dissertação de Mestrado (2001). Disponível em:
http://pt.scribd.com/doc/114129633/Sergio-Basbaum-Sinestesia-arte-e-tecnologia-
dissertacao-de-mestrado. Acesso em: 19 Mai. 2014.
______ Percepção Digital: Sinestesia, Hiperestesia, Infosensações. RUA - Revista
universitária do audiovisual - Outubro 2008. Disponível em:
http://www.rua.ufscar.br/site/?p=662. Acesso em: 31 Mar. 2014.
______ Sinestesia e percepção digital. TECCOGS (2012). Disponível em:
http://www.pucsp.br/pos/tidd/teccogs/artigos/2012/edicao_6/9-
sinestesia_e_percepcao_digital-sergio_basbaum.pdf. Acesso em: 31 Mar. 2014.
CYTOWIC, Richard E. Synesthesia: Phenomenology And Neuropsychology: A Review of
Current Knowledge. PSYCHE, 2(10), July 1995. Disponível em:
http://www.theassc.org/files/assc/2346.pdf. Acesso em: 12 Mai. 2014.
______ Touching tastes, seeing smells – and shaking up brain science. Cerebrum, v.4,n.3:
p.7–26, 2002. Disponível em: http://www.daysyn.com/CytowicCerebrum2002.pdf. Acesso
em 12 Mai. 2014
25
DAY, Sean A. Synesthesia. Disponível em: http://www.daysyn.com. Acesso em: 07 Abr.
2014
FOLHA DE SÃO PAULO (COORD. E ORG). Wassily Kandinsky. Tradução de Martín
Ernesto Russo. Barueri: Editorial Sol 90, 2007 – (Coleção Folha Grandes Mestres da
Pintura: 18).
GOMBRICH, Ernst Hans. A história da arte. Tradução Álvaro Cabral. Rio de Janeiro:
LTC, 2011 (Reimpr.).
KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte e na pintura em particular . 2ª Ed. São
Paulo: Martins Fontes, 1996.
______ Ponto e Linha sobre Plano: Contribuições à análise dos elementos da pintura. 2ª
Ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.

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Aula 01 introdução a arte como experiência
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Definindo arte
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Kandinsky e a arte sinestésica

  • 1. FACULDADE PAULISTA DE ARTES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM HISTÓRIA DAS ARTES: TEORIA E CRÍTICA FLÁVIA GONZALES CORREIA WASSILY KANDINSKY: TRANSCENDENDO PARADIGMAS DA ARTE PELA EXPERIÊNCIA SINESTÉSICA ORIENTADOR: PROFº MS. PAULO TREVISAN SÃO PAULO 2014
  • 2. FACULDADE PAULISTA DE ARTES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM HISTÓRIA DAS ARTES: TEORIA E CRÍTICA FLÁVIA GONZALES CORREIA WASSILY KANDINSKY: TRANSCENDENDO PARADIGMAS DA ARTE PELA EXPERIÊNCIA SINESTÉSICA Artigo apresentado à Faculdade Paulista de Artes, como requisito para conclusão do curso de Pós- Graduação Lato Sensu em História das Artes: Teoria e Crítica, sob orientação do Professor Mestre Paulo Trevisan. SÃO PAULO 2014
  • 3. Ficha Catalográfica Elaborada Pela Biblioteca José Carlos Figueiredo Ferraz C824w CORREIA, Flávia Gonzales Wassily Kandinsky: Transcendendo paradigmas da arte pela experiência sinestésica/ Flávia Gonzales Correia. Orientação do Professor Ms. Paulo Trevisan. São Paulo: Faculdade Paulista de Artes, 2014. 1. Wassily Kandinsky. 2. Sinestesia. 3. Pintura. 4. Arte Moderna. 5. Percepção CDD - 709
  • 4. 3 WASSILY KANDINSKY: TRANSCENDENDO PARADIGMAS DA ARTE PELA EXPERIÊNCIA SINESTÉSICA FLÁVIA GONZALES CORREIA RESUMO Este trabalho busca estabelecer relações entre a experiência sinestésica, o transcendental e a pintura do século XX, por meio das vivências artísticas e teóricas de Wassily Kandinsky, que incorporava a suas obras um cruzamento de sensações, para assim proporcionar uma experiência mais ampla e complexa em seu público. Ao expor a evolução de suas obras e pensamentos, pretende-se pensar as relações entre a sinestesia e a arte, o que implica levar em conta a questão da percepção de modo abrangente, refletindo sobre ela não somente como objeto de estudo da filosofia, da fisiologia, da neurologia ou da psicologia – com suas múltiplas implicações em termos de consciência, pensamento e cognição – mas em suas relações com o sentido de nossa experiência cultural, social e o universo de significações que nos habita. Palavras-chave: Sinestesia; pintura; arte moderna; Kandinsky; percepção. Title: Wassily Kandinsky: Transcending paradigm of art by synaesthetic experience ABSTRACT This paper seeks to establish the relations between the synaesthetic experience, the transcendental and the painting of the twentieth century through the artistic and theoretical experiences of Wassily Kandinsky, who used to incorporate a combination of sensations into his works of art, thereby to provide a broader and more complex experience to their public. By exposing the evolution of his works of art and thoughts, we intend to wonder about the relationship between synesthesia and art, which entails taking into account the issue of a comprehensive perception reflecting upon it not only as an object of philosophy, physiology , neurology or psychology study with its multiple implications in terms of conscience, thought and cognition - but in their relations with the sense of our cultural, and social experience and the universe of meanings that inhabits us. Keywords: Synesthesia; painting; modern art; Kandinsky; perception
  • 5. 4 A “Arte Moderna” no imaginário comum remete à arte que rompeu com todas as tradições do passado e tentou fazer o que nenhum artista sequer sonharia realizar nos tempos antigos. Contudo, sabe-se que a arte moderna, não menos do que a arte antiga, surgiu em resposta a certos problemas bem definidos. Entre a última década do século XIX e a primeira do século XX, a pintura, assim como as demais modalidades artísticas, tinha como característica o extremo decorativismo, e devia exibir um padrão agradável ao olhar antes de se poder ver o que representava: era uma arte carente de significado pictórico e sentido simbólico. Aquilo que chamamos de arte moderna nasceu do sentimento de insatisfação, de que algo escapara da arte e deveria ser recuperado. O Impressionismo1 , movimento ocorrido na segunda metade do século XIX foi o grande desencadeador desse sentimento. Para Paul Cézanne (1839-1906), perdera-se o senso de ordem e equilíbrio, pois a preocupação dos impressionistas com o momento fugaz os fez esquecer as sólidas e duradouras formas da natureza. Para Vincent Van Gogh (1853- 1890), ao render-se às impressões visuais e explorar somente as qualidades ópticas da luz e da cor, a arte corria o perigo de perder a intensidade e a paixão, única forma do artista expressar seus sentimentos e transmiti-los aos seus semelhantes. Paul Gauguin (1848- 1903), profundamente insatisfeito com sua vida e a arte como se encontrava, tinha a ambição de realizar algo mais simples e direto, e esperava encontrar entre os primitivos os meios para atingir seus objetivos. (GOMBRICH, 2011) Cézanne, Van Gogh e Gauguin foram três homens solitários, que trabalharam com pouca esperança de serem algum dia compreendidos. Mas suas inquietações e os problemas de sua arte, dos quais tinham uma consciência tão aguda e dolorosa, foram sentidos por um número cada vez maior da nova geração de artistas, que se preocupavam em salvar a essência da pintura, tarefa que exigia propostas plásticas independentes e uma sólida justificativa teórica. Ambas exigências foram preenchidas por um mesmo artista, que buscou estabelecer relações entre a pintura, a experiência sinestésica e o transcendental: Wassily Kandinsky (1866-1944). Ele se destaca na pintura, não apenas não apenas por ser um dos pioneiros da arte abstrata, mas por suas contribuições teóricas sobre a arte pictórica. Com sua tendência espiritual de compreender a arte, pretendia nos reconduzir à realidade invisível, espiritual, o que é comum ao mundo e ao homem, a alma do universo, à experimentação sensível por meio da obra de arte. Concebeu a pintura abstrata como o triunfo do espírito sobre a
  • 6. 5 matéria, tal como descreveu em seu primeiro texto teórico Do espiritual na arte, no qual fala sobre a cor e a forma e defende a intuição como valor artístico. Em meio à instabilidade política de sua época, precisou conviver com a intolerância do regime socialista e da Alemanha nazista para defender sua pintura. Pesquisador entusiasmado e incansável, incorporou à sua obra uma originalidade carregada de idealismo. 1. SINESTESIA: FENÔMENO DA PERCEPÇÃO? Algumas pessoas conseguem ver sons, sentir o aroma das palavras, ouvir cores, saborear músicas ou atribuir cores a números e letras. Esse fenômeno é conhecido como sinestesia. Percebem-se relações entre a sinestesia e a criatividade, pelo fato de muitos sinestetas estarem de alguma forma inseridos no mundo artístico. Pode-se observar este fenômeno de duas maneiras distintas: quando o artista realmente possui sinestesia e o artista que não é sinesteta, mas que usa o conceito para criar a sua obra artística. A sinestesia não aparece apenas em um contexto científico, ela está cada vez mais presente nas artes visuais e o termo é usado constantemente para descrever obras cuja percepção depende de vários sentidos ao mesmo tempo. A palavra deriva do grego antigo, pela justaposição da preposição syn, denotando união, com a palavra aisthēsis, que significa sensação. A sinestesia significa o cruzamento de sensações, ou seja, a capacidade da estimulação de um sentido despertar a sensação de outro. Ela é estudada por médicos e psicólogos como um transtorno da percepção, quando esta sensação secundária se dá de forma involuntária e intensa, como uma sensação real. A sinestesia de forma congênita se faz presente naturalmente no indivíduo, na sua criação e em sua vida, sendo ela um sentido a mais (CYTOWIC, 1995). Associam-se certas propriedades à experiência sinestésica: ela nos aparece como uma experiência direta, pré-verbal do mundo; uma imersão na sensação, oposta àquela analítica, racional; uma experiência específica do tempo, quase como uma dilação, um tempo deslocado do tempo linear, diacrônico, da experiência ordinária. Assim, opondo-se a aspectos decisivos da experiência perceptiva normatizada na cultura, a sinestesia se apresenta como um modo particular de consciência, uma gestalt2 específica, uma construção de mundo
  • 7. 6 que provê uma cognição distinta, inefável – que o sinesteta experimenta, mas não consegue expressar completamente. Tais qualidades levaram Cytowic a comparar a experiência sinestésica ao êxtase espiritual. (Apud BASBAUM, 2008) Há diversos tipos de sinestesias: considerando os cinco sentidos - visão, audição, olfato, paladar e tato - pode haver diversas combinações de pares possíveis. Embora normalmente opere num sentido só, alguns sinestetas apresentam sinestesias múltiplas. Sean Day3 , linguista e membro-diretor da American Synesthesia Association (Associação Americana de Sinestesia) descobriu até o momento 60 tipos de sinestesias. O tipo mais frequente é o grafema-cor (onde as cores são associadas a números, palavras ou letras), mas são muito comuns também sinestesias conhecidas como audição colorida (a percepção de sons atuando como estímulo à percepção de cores). Seus estudos apontam a audição como o sentido que mais desperta sinestesias. Segundo Day, alguns músicos e pintores possuíam, provavelmente, a sinestesia como condição neurológica, tais como Olivier Messiaen, Ligeti, Sibelius, Duke Ellington e Charles Blanc-Gatti. Já outros utilizavam ideias sinestésicas em seus trabalhos, embora, possivelmente, não possuíssem essa condição neurológica. Dentre estes pode-se citar Scriabin, Miles Davis, Wassily Kandinsky, Paul Klee e Piet Mondrian. Sérgio Roclaw Basbaum4 , Mestre e Doutor em Comunicação e Semiótica – PUC- SP e Pós-Doutor em Filosofia pela UNESP, menciona que da Grécia ao século XVII, os hábitos perceptivos ocidentais operaram segundo uma relação sinestésica com a realidade. A cultura do século XIX separou os sentidos, e a arte moderna sustentou-se nesta lógica. Mas a cultura digital contemporânea parece retomar modelos sinestésicos de percepção. Basbaum aponta que a sociedade fragmentada, pautada numa ciência que fragmenta o corpo, autonomiza e especializa os sentidos, associa a sinestesia a uma experiência direta, a-racional, não mediada pela linguagem, que parece partilhar certa semelhança com estados de consciência que nossa cultura classificou como espirituais ou místicos. Fala de McLuhan, que tem como ideia central de que as tecnologias, ao imporem uma reorganização de nossos sentidos, moldam a maneira como organizamos pensamento e conhecimento. Ele sugere também não ser coincidência que a tecnologia digital esteja implicada diretamente em processos sinestésicos de representação retomados com o fim do modernismo, pois a cultura digital imprimiu notável aceleração ao mundo. Estes ambientes
  • 8. 7 que chamamos imersivos são apenas espaços distintos dentro do ambiente maior de uma cultura planetária em que estamos mais e mais imersos no instante: a noção de historicidade dissolve-se na circularidade do instante sinestésico; as experiências do tempo narrativo e do espaço contemplativo visual se dissolvem em sensação. Para o autor, a experiência contemporânea, largamente sinestésica, traz de volta o universo mágico, primitivo, de onde emergem todo o tipo de metáforas e discursos espirituais e míticos de nossa experiência. Num quadro como este, a palavra sinestesia assume um caráter fascinante, aparece em diferentes áreas do conhecimento. Evoca uma sorte de temas, como se acenasse ao mistério do sentido contemporâneo: sensações movidas pela subjetividade da nossa percepção. 2. WASSILY KANDINSKY: LÓGICA E INTUIÇÃO Wassily Wassilyevich Kandinsky, foi um importante pintor, teórico e professor russo, considerado o pioneiro da pintura abstrata, ao lado do holandês Piet Mondrian e do também russo Casimir Malevich. Formado em Direito e Economia, porém sempre interessado em música e arte descobre, em 1889, a arte popular em uma viagem ao norte da Rússia, onde entra em contato com a intensamente cromática cultura campesina russa. Aos 30 anos, Kandinsky abandona a promissora carreira universitária e volta- se para a pintura após visitar exposição dos Impressionistas franceses, apresentada na Rússia em 1895. Uma tela em particular causa-lhe profundo impacto: Montes de feno pela manhã, final do verão de Claude Monet (1840-1926). Viajou a Paris, decidido a dar início a seus estudos artísticos, depois seguiu para Munique, onde estudou pintura por dois anos. Fundou e presidiu uma associação de artistas e expositores, a Die Phalanx. Suas pinturas até esse momento são dominadas pelo estilo fauvista5 . Fotografia de Kandinsky (Anonymous. Wassily Kandinsky. c 1913. From Wassily Kandinsky (1913). Rückblicke. Berlin: Sturm Verlag.)
  • 9. 8 Depois da dissolução da Die Phalanx, viaja pela Holanda, França, Tunísia e Itália com Gabriele Münter (jovem artista por quem se apaixona), instala-se em Murnau e é eleito presidente da associação artística NKVM. Tem contato com a tese de doutoramento de Wilhelm Worringer, Abstraktion und Einfühlung (Abstração e Empatia)6 , de 1907, considerada a primeira (e mais importante) elaboração teórica sobre a validade estética da arte abstrata. Prossegue com seus estudos, e começa a elaborar as soluções formais que permitiram à pintura libertar-se da representação naturalista e dos efeitos decorativos, baseando-se no comportamento visual das cores e das formas, sustentados em um sólido conceito compositivo e aprofunda-se na arte abstrata com as séries Impressões, Improvisações e Composições. Suas reflexões, sobre a arte de seu tempo e suas próprias experiências pictóricas dariam origem ao livro Do espiritual na arte, publicado em 1911, considerado uma das mais importantes obras teóricas da história da arte, além de abrir caminho para as novas expressões artísticas do século XX. Kandinsky empreende uma investigação filosófica sobre as cores e as formas, às quais confere sua visão de que a arte não necessita do motivo natural para ser esteticamente válida, ela pode ser igualmente significativa se realizada por meio da abstração. Para ele, as convenções do passado estavam esgotadas, o artista não deve se submeter ao exterior, já que em sua espiritualidade reside o visionário de sua obra. Profundamente influenciado pelo pensamento teosófico7 de Helena Blavatsky e antroposófico8 de Rudolf Steiner, Kandinsky, assim como outros artistas das Vanguardas, busca o regresso às origens, aos sentimentos mais profundos, às emoções universais, enfim, ao espiritual, características da arte primitiva, da experiência do sagrado e dos ritos religiosos. Ele aponta um parentesco espiritual entre os artistas do início do século XX com os povos primitivos: “Como nós, esses artistas puros só se ligaram, em suas obras, à essência interior, sendo por isso mesmo eliminada toda e qualquer contingência”. (KANDINSKY, 1996, p. 27-28). Para demonstrar sua visão do momento espiritual da sociedade, ele faz analogia a um triângulo9 , dividido em partes desiguais, onde sua base representa o que existe de mais material e o ápice o que há de mais espiritual e sublime. A base, larga, espaçosa e alta, avança lentamente ao ápice, que é menor e mais agudo, e vai se desprendendo e se afastando dos sentimentos mesquinhos e do materialismo e, assim, alcança com muito esforço o lugar que os que estão no ápice já vivenciaram. Estes, que ocupam o ápice, a
  • 10. 9 ponta extrema, são poucos, muitas vezes não há mais que um homem solitário, que mesmo incompreendido pela maioria, se faz responsável pelo avançar de toda a humanidade. Nesse sentindo, a criação artística tem a função de revelar à humanidade o próximo passo do progresso espiritual. Para ele, "Quem quer que mergulhe nas profundezas de sua arte, em busca de tesouros invisíveis, trabalha para erguer essa pirâmide espiritual que chegará ao céu."(KANDINSKY, 1996, p.59). Para ele, o objetivo do artista, além de alcançar a essência de cada forma e cada cor é “extrair da alma humana a vibração certa”(Idem p.76) que conduza a humanidade de volta à realidade invisível, espiritual, à experimentação sensível por meio da obra de arte. A maneira de atingir esses objetivos é seguir o Princípio da Necessidade Interior10 , que é constituída de três necessidades místicas: A primeira é o elemento da personalidade, próprio de cada artista, enquanto ser criador; a segunda é o elemento próprio de cada época, a cultura de um povo e a terceira é o elemento artístico puro e eterno, que se encontra em todos os seres humanos e é próprio da arte. Dentro destas três necessidades místicas, a mais importante, para Kandinsky, é a terceira, pois ele não trata a arte como atividade cultural humana, mas sim como o produto de um espírito elevado. Assim, a Necessidade Interior não corresponde a uma vontade pessoal do artista, ou a expressão de seus sentimentos ou de seu ponto de vista; na verdade ela seria um componente espiritual objetivo, que não se origina no artista, mas fora dele, em um plano sensível, envolta em misticismo. O artista sintoniza-se com este princípio, e a partir dele, busca as melhores formas e cores para traduzi-lo, logo, o desenvolver da arte é uma exteriorização progressiva do eterno-objetivo no temporal-subjetivo. Sua primeira obra totalmente abstrata é uma aquarela sem título, datada de 1910, onde, sobre um espaço imaginário branco formas indefinidas flutuam, nas cores vermelha, azul, verde e preta. Seu traço sinuoso, uma possível influência de sua admiração pela caligrafia japonesa, árabe e cirílica, por sua capacidade de transmitir emoções sem recorrer a imagens, combinados com pinceladas soltas, inclinadas, curvas e onduladas, contraste entre as cores quentes e frias, demonstram sua preocupação em transmitir a sensação de movimento. Teórico da cor, nesta aquarela, privilegiou as virtudes do vermelho, quente e expansivo, em alguns momentos disposto em forma circular, com a particularidade de estabelecer limites dinâmicos, uma contradição que busca mostrar a vitalidade da cor em destaque.
  • 11. 10 Kandinsky discorre sobre a cor no seguinte trecho: “O vermelho tal qual como o imaginamos, cor sem limites, essencialmente quente, age interiormente como uma cor transbordante de vida ardente e agitada. [...] Apesar de toda a sua energia e intensidade, o vermelho atesta uma imensa e irresistível potência, quase consciente de seu objetivo. Nesse ardor, nessa efervescência, transparece uma espécie de maturidade masculina, voltada sobretudo para si mesma e para a qual o exterior conta muito pouco.” (KANDINSKY, 1996, p. 97). Sua busca era por uma pintura onde as cores, linhas e formas se libertassem da representação de objetos reconhecíveis, que considerava uma distração, um desvio do olhar do espectador da verdadeira essência da obra. Visava à evolução de sua pintura para uma linguagem visual que, assim como a linguagem abstrata da música, exprimisse conceitos gerais e provocasse emoções profundas. Não era casual a linguagem musical aplicada à pintura. Além do contato com a música durante sua infância (ele estudou piano e violoncelo), em 1896, o artista ficara impressionado com a ópera Lohengrin de Richard Wagner (1813-1883), que postulava a "arte total"11 . Também se relacionou com Schönberg (1874-1951), compositor contemporâneo a ele, que com as suas pesquisas, aspirou libertar a composição musical de qualquer forma pré-estabelecida12 . Sem título (Primeira Aquarela Abstrata) 1910-1913 - Lápis, tinta-da- china e aquarela sobre papel 49,6x64,8 cm. Musée National d’Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris (França)
  • 12. 11 A primeira afirmação de seu livro é: “Toda a obra de arte é filha do seu tempo e, muitas vezes, mãe dos nossos sentimentos.” (KANDINSKY, 1996, p.23). Em toda sua obra defende esse conceito, de que a arte não deve ser um espelho do passado. Mais adiante, encontra-se a seguinte afirmação: “Para o artista criador que quer e que deve exprimir o seu universo interior, a imitação, mesmo que bem sucedida, das coisas da natureza não pode ser um fim em si. E ele inveja a desenvoltura, a facilidade com que a mais imaterial de todas, a música, alcança esse fim. Compreende-se que ele se volte para essa arte e que se esforce, na dele, por descobrir procedimentos similares. Daí, na pintura, a atual busca de ritmo, da construção abstrata, matemática; daí também o valor que se atribui hoje à repetição dos tons coloridos, ao dinamismo da cor.” (Idem p. 57-58) Do mesmo modo que os compositores, ele pretendia libertar a pintura de todos os cânones instituídos até aquele momento. Para tanto, se utiliza de diversas metáforas sinestésicas, o que o torna uma incógnita: para alguns pesquisadores, ele era de fato sinestésico, para outros, um entusiasta do fenômeno da sinestesia, que se utilizou dela como suporte de sua teoria, e em suas obras. A afirmação a seguir é um exemplo claro de sua compreensão sinestésica da pintura: “Tais efeitos se correspondem porque a pintura não se recebe exclusivamente pelos olhos, nem a música exclusivamente pelos ouvidos, mas ambas as artes se dirigem aos cinco sentidos (tato: impressão de picotamento ou de suavidade; olfato: o violeta tem um cheiro diferente do amarelo; paladar: pintura saborosa…). A arte produz também efeitos psicológicos: fala-se de pintura ‘fria’, de música ‘glacial’, os tons e os sons pode ser ‘quentes’.” (Idem, Ibidem p. 255) Conforme já dito anteriormente, o aprofundamento de Kandinsky na abstração se dá com as séries Impressões, Improvisações e Composições. A obra a seguir pertence à série Composições. Sobre esta série, ele diz: “Expressões que se formam de maneira semelhante, mas que, lentamente elaboradas, foram repetidas, examinadas e longamente trabalhadas a partir dos primeiros esboços, quase de modo pedante. Chamo-lhes Composições. A inteligência, o consciente, a intenção lúcida, a finalidade precisa, desempenham neste caso um papel capital; só que não é o cálculo que predomina, mas sempre a intuição” (KANDINSKY, 1996, p.135)”
  • 13. 12 Composição VI (1913) – Óleo sobre tela 195x300 cm - Hermitage, São Petesburgo (Rússia) Nesta obra, as formas estão diluídas em uma representação puramente pictórica, abstrata, onde as cores independem dos objetos. Há uma profusão de cores, que vai desde tons escuros na parte superior aos tons rosados e delicados à esquerda, aos azuis e vermelhos espalhados do centro à direita, e mais abaixo tons de branco, rosa e azul que parecem se dissolver em meio a uma névoa. A possível inspiração para esta tela era sua visão da evolução da catástrofe apocalíptica para uma época de grande espiritualidade. Diante da expressiva combinação de linhas e cores, pode-se observar a aplicação prática de suas observações sobre a cor e sobre como esta provoca sensações no espectador. “As cores claras atraem mais o olho e o retêm. As cores claras e quentes retêm- no ainda mais: assim como a chama atrai irresistivelmente o homem, também o vermelho atrai e irrita o olhar. O amarelo-limão vivo fere os olhos. A vista não consegue suportá-lo. Dir-se-ia um ouvido dilacerado pelo som estridente do trompete. Os olhos piscam e vão mergulhar nas profundezas calmas do azul e do verde.[...] A cor provoca, portanto, uma vibração psíquica. E seu efeito físico superficial é apenas, em suma, o caminho que lhe serve para atingir a alma.[...] Fala-se correntemente do ‘perfume das cores’ ou de sua sonoridade. E não há quem possa descortinar uma semelhança entre o amarelo-vivo e as notas baixas do piano ou entre a voz do soprano e a laca vermelho-escura, tanto essa sonoridade é evidente." (Idem p. 66-68)
  • 14. 13 Para ele, era evidente a força real da cor sobre todo o ser humano, fato que carecia de mais estudos. “Com maior razão, não é possível contentar-se com a associação para explicar a ação da cor sobre a alma. A cor, não obstante, é um meio de exercer sobre ela uma influência direta. A cor é a tecla. O olho é o martelo. A alma é o piano de inúmeras cordas” (KANDINSKY, 1996, p. 68). Fala também sobre o princípio de harmonia das cores: “É evidente, portanto, que a harmonia das cores deve unicamente basear-se no princípio do contato eficaz (Grifo do autor). A alma humana, tocada em seu ponto mais sensível, responde.” (Idem p. 69). Kandinsky retorna a Moscou antes da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Em 1917, estoura a Revolução Russa13 , que o deixa sem recursos, mas, mesmo assim, ele colabora com o novo regime. Nesse período ele se casa e tem um filho, morto em 1920. Abalado pela morte de seu filho, parte para a Alemanha, onde é contratado para lecionar na Bauhaus14 . O corpo docente da prestigiada escola de arquitetura e artes aplicadas era constituído por alguns dos mais importantes artistas da época, com quem ele dividiu suas inquietações. A suma de seu elaborado programa de ensino é publicada por ele em seu livro Ponto e linha sobre plano, a sequência orgânica de seu primeiro trabalho, onde apresenta a teoria das formas sensivelmente ampliada, com uma análise aprofundada das formas básicas e suas relações. Do mesmo modo que fez com a cor, ele procura as ressonâncias espirituais para o que denomina ponto e linha, seu dinamismo particular, estabelecendo as mesmas metáforas sinestésicas em relação à música, e estuda as tensões que se estabelecem sobre o plano e como este, aparentemente neutro, influencia os efeitos que se obtém com uma composição. A partir desse momento, elabora uma pintura geométrica carregada de misticismo, onde se pode notar a influência que o Suprematismo15 e o Construtivismo16 tiveram durante a sua estadia na Rússia. Sua tela Composição VIII, pintada em 1923, durante o período em que lecionou na Bauhaus, apresenta um ritmo geométrico e racional em vez da emoção lírica de suas Composições anteriores. O quadro se constitui de formas geométricas (círculos, semicírculos, blocos de quadrados e retângulos, elementos lineares, ângulos e figuras irregulares). Um grande círculo em tons escuros no canto superior esquerdo, ao lado de um círculo menor vermelho é o ponto focal da pintura.
  • 15. 14 Há uma enorme mudança do predomínio da cor para o predomínio da forma na composição pictórica. As formas se traduzem em um equilíbrio dinâmico da tela, as cores são utilizadas para acentuar a geometria, como nos círculos com halos contrastantes, e nas linhas angulares com cores diluídas de azul e rosa. O fundo também contribui para realçar a sensação de dinamismo na tela, suas cores definem a profundidade: o azul claro na parte inferior, amarelo claro no cimo e branco no meio. As formas tendem a retroceder e avançar em um espaço indefinido, criando um aspecto ambíguo. Nesta obra, podemos ver claramente seu estudo dos efeitos que a forma exerce sobre a cor. “A forma, mesmo abstrata, geométrica, possui seu próprio som interior; ela é um ser espiritual, dotado de qualidades idênticas às dessa forma. Um triângulo (não tendo outras características que indiquem se é agudo, obtuso ou isósceles) é um ser. Um perfume espiritual que lhe é próprio emana dele. Associado a outras formas, esse perfume se diferencia-se, enriquece-se de nuanças – como um som, de seus harmônicos - , mas, no fundo, permanece inalterável. Assim é o perfume da rosa, que jamais pode ser confundido com o da violeta. Assim são o círculo, o quadrado, todas as formas imagináveis. [...] E vemos claramente aparecer a reação da forma e da cor. [...] Cores ‘agudas’ têm suas qualidades ressoando melhor numa forma pontiaguda (o amarelo, por exemplo, num triângulo). As cores que podemos qualificar de profundas veem-se reforçadas, sua ação Composição VIII (1923) - óleo sobre tela 140x201 cm - Solomon R. Guggenheim Museum, New York.
  • 16. 15 intensificada, por formas redondas (o azul, por exemplo, num círculo). É claro, por outro lado, que o fato de não combinar a forma numa cor não deve ser considerado uma ‘desarmonia’. Cumpre ver aí, pelo contrário, uma nova possibilidade, portanto, uma causa de harmonia.” (KANDINSKY, 1996, p. 75) Após o fechamento da Bauhaus pelo governo Nazista em 1933, vários artistas migram para outros países. Kandinsky vai se abrigar em Neuilly-sur-Seine, próxima a Paris, e aproxima-se dos pintores surrealistas Hans Arp e Joan Miró, com quem manteve uma estreita amizade. Gradativamente, sua pintura se desvincula dos elementos geométricos e deriva para abstração biomórfica, originando um novo estilo ao final de sua trajetória artística. Outros fatores também influenciam essa mudança, como seu interesse pela cultura popular eslava e sua fascinação pelas ciências naturais, especialmente a botânica, zoologia e embriologia. A última fase da pintura de Kandinsky parece querer fugir das atrocidades, arbitrariedades e restrições impostas pela ocupação nazista. Sua pintura vai buscar abrigo em um universo onírico, que transborda fantasia, representado em grande parte das suas pinturas, aquarelas e desenhos produzidos em Neuilly-sur-Seine até sua morte em 1944. Azul Celeste (1940) – Óleo sobre tela 100x73 cm – Musée National d’Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris
  • 17. 16 Um exemplo dessa fase é a tela “Azul Celeste”, onde uma série de formas biomórficas, diferentes umas das outras, se mantém relacionadas pelo seu aspecto e suas cores vivas , dispostas sobre um fundo azul suave, em que ele demonstra sua teoria de que “O azul é a cor tipicamente celeste. Ela apazigua e acalma ao se aprofundar” (KANDINSKY, 1996, p. 92). A espiritualidade que o impulsionou desde o princípio, se mostra presente, assim como suas referências: o colorido dos ícones russos, uma figura que lembra um cavalo de madeira, o brinquedo, que remete à sua fase em Munique e à imagem e simbolismo do cavaleiro que ocupavam suas telas nesse período, o axadrezado que remete a Moscou e ao período da Bauhaus. A característica mais marcante da teoria sobre as cores de Kandinsky é sua coerência interna. A partir da hipótese de que a cor é um elemento da linguagem da alma, ele empreende uma análise ordenada, que se inicia com a qualidade da cor (quente-frio, claro-escuro) e logo caminha para o espaço-temporalidade do elemento colorido. Assim, pela lógica dos contrastes é que ele estabelece a relação das cores entre si. Mesmo passando por diversas transformações, seu objetivo de atingir a harmonia e a “Necessidade Interior” se manteve em sua obra, os ecos de sua teoria sempre estão presentes, como se pode verificar pelo trecho a seguir. “Luta de sons, equilíbrio perdido, ‘princípios alterados, rufar inopinado de tambores, grandes indagações, aspirações sem objetivo visível, impulsos aparentemente incoerentes, cadeias desfeitas, vínculos quebrados, reatados num só, contrastes e contradições, eis o que é a nossa Harmonia. A composição que se baseia nessa harmonia é um acordo de formas coloridas e desenhadas que, como tais, têm uma existência independente, procedente da Necessidade Interior, e constituem, na comunidade que daí resulta, um todo chamado quadro” (Idem p. 103-104) 3. UM ARTISTA VISIONÁRIO O conjunto de obras analisadas demonstra que o objetivo de Kandinsky era propor um novo modelo de percepção do mundo, com o qual pretendia despertar o ser humano da sua indiferença, retirá-lo do seu olhar e sentir convencionais, e trazê-lo para uma experiência estética pura, primordial, em busca de uma interpretação singular em relação
  • 18. 17 ao que está ao nosso redor, e principalmente de nossa força interior. Seu processo investigativo é carregado de espiritualidade e sensibilidade, latentes de sua origem oriental moscovita, porém com a objetividade de sua herança cultural alemã. De Moscou, ele traz a paixão, a força da cor e o desejo pelo transcendental; da Alemanha, traz sistematização, o apreço pela descoberta da teoria e a busca pelo conhecimento, mas acima de tudo, toda a mudança filosófica causada por Kant no final do século XIX. O que significa compreender o mundo não mais como um sistema baseado na exatidão daquilo que se vê, onde o valor coincide com a realidade: o mundo que nossos sentidos nos desvendam é um conjunto de fenômenos que tem poucas relações com a realidade das coisas. Sua proposta era de que a reeducação estética e espiritual não fosse feita somente a nível superficial, da ilusão das aparências, mas sim pela inocência, o olhar de primeira vez, que induz a descobrir a essência do mundo e de si mesmo. Segundo ele, “O “Belo interior” é aquele para o qual nos impele uma necessidade interior quando se renunciou às formas convencionais do Belo. Os profanos chamam-na feiúra. O homem é sempre atraído, e hoje mais do que nunca, pelas coisas exteriores, não reconhecendo de bom grado a necessidade interior. Essa recusa total das formas habituais do “Belo” leva a admitir como sagrados todos os procedimentos que permitem manifestar sua personalidade.” (KANDINSKY, 1996, p. 51) Essa realidade transcendental do mundo sensível, que vai além da compreensão racional, era chamada de “alma” por Kandinsky. Para ele, toda a natureza, a vida e o mundo interno que circundam o artista e a essência de sua alma, são a fonte única de cada arte. O pintor se “alimenta” de impressões exteriores (sua vida cotidiana, seus estudos e pesquisas) e as transforma em sua alma (sua vida interior, sua essência), traduzindo seus sonhos e suas realidades em sua obra, de forma inconsciente. Logo, a concepção da forma sensível por meio da pintura é compreendida como a expressão do artista, sua vida interior e direta, com seus mais intensos e profundos sentimentos e intuições. Simbolizar é construir novos mundos. Ao pensarmos a arte como uma visão do mundo, vemos a obra como uma janela para ampliar essa visão. Utilizando seu rico universo simbólico, Kandinsky transfigurou a realidade de uma maneira única, chegando a praticamente se desfazer dela. Sua intuição visionária percebeu o potencial de uma arte puramente abstrata por meio da sua crença na ‘musicalização’ da pintura. No entanto, sempre deixou claro que não desejava ‘pintar a música’. Ele pensava que as cores, assim como as formas e as linhas, poderiam evocar sons. Ele estabelece e preconiza a aproximação entre a pintura e a música, arte puramente “espiritual”, por ter vivenciado
  • 19. 18 essa relação, pois era dotado de uma sensibilidade excepcional. Conta em suas recordações que, ao escutar Lohengrin, as cores se apresentavam a seus olhos. Ele as via. O que ele busca com o efeito sensorial das cores é a sua ressonância espiritual, a ação direta da cor sobre a alma. É notável o fato de que a sinestesia estimulou sua sensibilidade artística, se não de forma congênita, como um entusiasta dessa modalidade perceptiva e produto cultural, que para ele era passível de ser despertada em qualquer um. Sua arte impregnou-se desse conceito, e estruturou seu pensamento. Em 1935, em artigo para a revista dinamarquesa Konkretion, Kandinsky explica seu conceito de “olhar interior” da seguinte forma: “Chamo ‘olhar interior’ à experiência de sentir a alma secreta das coisas com o olho desarmado, através do microscópio ou do telescópio. Esse olhar atravessa a dura casca, a ‘forma’ exterior, para chegar ao interior das coisas e nos permitir captar, com todos nossos sentidos, o ‘palpitar’ interior das mesmas” (Apud FOLHA, 2007) Sérgio Basbaum diz que os elementos fundantes do abstracionismo de Kandinsky parecem muito próximos daquilo que apontamos como qualidades da percepção sinestésica. Não deve ser surpresa, portanto, que encontremos seu trabalho associado quase sempre ao conceito de sinestesia. Cytowic cita, por exemplo, o discurso do pintor em 1910: 'Entregue seus ouvidos à música, abra seus olhos à pintura e... Pare o pensamento! Apenas pergunte a você mesmo se o trabalho (de arte) permitiu a você passear em um mundo desconhecido. Se a resposta é sim, o que mais você quer?’ A obra pictórica de Kandinsky transcende aos elementos teosóficos os doutrinários presentes em seu discurso, mas a aspiração a sinestesia e os elementos básicos ligados aos trabalhos sinestésicos encontram-se lá expressos de maneira nítida: espiritualidade, não-objetividade, sensação, cognição sinestésica. (BASBAUM, 2001, p.58-59) Acima de todas as coisas, Kandinsky acreditava na necessidade de regeneração do indivíduo e da sociedade, superando o caos presente por meio da arte, e o artista carregava essa árdua missão de sensibilizar a alma humana e abrir caminho para a ascensão espiritual. A pintura, deveria se libertar da mera representação figurativa, assim, nasce sua necessidade impregnar de ritmo a pintura, de construção matemática abstrata, de notas repetidas de cor, de colocar em movimento as cores, enfim, de abstrair. A experimentação pictórica que ele empreende, como um primeiro contato do ser humano com um mundo
  • 20. 19 desconhecido, metamorfoseando gestos em signos, visa analisar a experiência estética em sua origem. Segundo suas próprias palavras: A arte está em busca de uma resposta. Especializada, ela só ficará inteligível para os próprios artistas, que começam a se queixar da indiferença do público por suas obras. Nessas épocas, o artista, em geral, tem muito pouco a dizer. Basta-lhe uma nuança insignificante para fazer-se conhecer e apreciar por um grupo de mecenas e apreciadores de arte que o exaltam (o que não deixa de se traduzir, se for o caso, em algumas vantagens materiais). Vê-se então uma legião de homens dotados de uma aparência de talento que se lançam, não sem habilidade, sobre uma arte que lhes parece tão simples de conquistar. Em cada ‘centro artístico’ vivem milhares de artistas dessa espécie, a maioria unicamente preocupada em procurar um novo estilo e que cria, com o coração frio, sem entusiasmo, sem empolgação, milhões de obras de arte (KANDINSKY, 1996, p. 37-38) Para Kandinsky a arte moderna deve resgatar o homem da superficialidade, ao lhe proporcionar uma experiência global de sua realidade, onde é possível buscar a si mesmo. Ele percebeu as relações entre cores, musicalidade e movimento. Para ele todas as artes emergem de uma raiz única, diferenciando-se apenas pelo meio de expressão, pois as leis complexas e precisas de composição sempre aproximam as diferenças, já que se apresentam de forma similar em todas as artes. Logo, ele acreditava não só na correspondência ideal e diacrônica das obras de todas as épocas, mas além disso, na equivalência absoluta de todas as diferentes artes entre si. Tinha uma necessidade de coerência propriamente pictórica, e, durante sua vida, alinhou a prática artística com a elaboração teórica acerca daquilo em que acreditava. Como visionário que era, percebeu o grande problema da arte de seu tempo e porque não? da arte do nosso tempo.
  • 21. 20 NOTAS 1 O Impressionismo é o movimento artístico que inaugura a arte moderna e tem como característica preferência pelo registro da experiência contemporânea; observação da natureza com base em impressões pessoais e sensações visuais imediatas; suspensão dos contornos e dos claro-escuros em prol de pinceladas fragmentadas e justapostas; aproveitamento máximo da luminosidade e uso de cores complementares, favorecidos pela pintura ao ar livre. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 25 Mai. 2014) 2 A psicologia da Gestalt, também conhecida como psicologia da forma ou psicologia da percepção, surge como escola no início do século XX, na Alemanha, devido aos trabalhos de três principais estudiosos: Max Wertheimer (1880-1943), Wolfgang Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886- 1941). Até então, a percepção humana era explicada segundo uma análise atomista e associacionista, ou seja, vigorava a idéia de que percebemos uma figura a partir de seus elementos e partes componentes, e a compreendemos por associação com experiências passadas. Em contraposição a essa noção, os psicólogos da Gestalt defendem que a percepção não é o resultado da soma de sensações de pontos luminosos individuais, mas uma apreensão imediata e unificada do todo, devido a uma necessidade interna de organização. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 25 Mai. 2014) 3 Ver DAY (2013) 4 Ver BASBAUM (2012) 5 Ao contrário de outras vanguardas que povoam a cena europeia entre fins do século XIX e a 1ª Guerra Mundial, o fauvismo não é uma escola com teorias, manifestos ou programa definido. Para boa parte dos artistas que adere ao novo estilo expressivo - com forte presença na França entre 1905 e 1907 -, o fauvismo representa sobretudo uma fase em suas obras. Falar em vida curta e em organização informal de pintores em torno de questões semelhantes, não significa minimizar as inovações trazidas à luz pelos fauves ('feras'). O grupo, sob a liderança de Henri Matisse (1869-1954), tem como eixo comum a exploração das amplas possibilidades colocadas pela utilização da cor. A liberdade com que usam tons puros, nunca mesclados, manipulando-os arbitrariamente, longe de preocupações com verossimilhança, dá origem a superfícies planas, sem claros-escuros ilusionistas. As pincelas nítidas constroem espaços que são, antes de mais nada, zonas lisas, iluminadas pelos vermelhos, azuis e alaranjados. Como afirma Matisse a respeito de A Dança (1910): "para o céu um belo azul, o mais azul dos azuis, e o mesmo vale para o verde da terra, para o vermelhão vibrante dos corpos". (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 25 Mai. 2014)
  • 22. 21 6 A tese de Worringer parte da análise das relações entre o ser humano e a natureza. O autor afirma que há duas grandes tendências na experiência humana no confronto com o mundo natural. Uma, pacífica, vê na natureza a fonte tranquila dos recursos vitais. A natureza é a Grande Mãe que tudo dá e, com ela, o ser humano desenvolve uma empatia que se revela através de uma arte que reproduz com maior ou menor justeza o que se vê no mundo natural. A segunda tendência, ao contrário, é conflituosa. A natureza é fonte, principalmente, de apreensões e de temores. O ser humano vive sacudido pelo pânico de ser devorado por algum animal ou lançado aos ares por algum cataclismo. A arte que este ser humano produz é uma arte que nega o mundo natural, que se afasta dele através da abstração. (CAMPOS, Jorge Lucio de. A propósito de Wörringer. A Parte Rei 47 - Set. 2006. Disponível em: http://serbal.pntic.mec.es/AParteRei/lucio47.pdf. Acesso em: 07 Abr 2014.) 7 A Sociedade Teosófica (S.T.) foi fundada em 1875, por um pequeno grupo de pessoas, dentre as quais se destacavam uma russa e um norte americano: Helena Petrovna Blavatsky e o cel. Henry Steel Olcott, seu primeiro presidente. A origem da palavra Theosophia é grega e significa primária e literalmente Sabedoria Divina. Foi cunhada em Alexandria, no Egito, no século III d.C. por Amônio Saccas e seu discípulo Plotino que eram filósofos neo-platônicos. Fundaram a Escola Teosófica Eclética e também eram chamados de Philaletheus (Amantes da Verdade) e Analogistas, porque não buscavam a Sabedoria apenas nos livros, mas através de analogias e correspondências da alma humana com o mundo externo e os fenômenos da Natureza. Assim a S.T., enquanto sucessora moderna daquela Escola antiga, almeja tal busca da Sabedoria não pela mera crença, mas pela investigação direta da Verdade manifesta na Natureza e no homem. Dizia Blavatsky: “o verdadeiro Ocultismo ou Teosofia é a ‘Grande Renúncia ao eu’, incondicional e absolutamente, tanto em pensamento como em ação – é Altruísmo”. “Teosofia é sinônimo de Verdade Eterna”, Divina, Absoluta, Paramarthika Satya ou Brahma-Vidya, que são seus equivalentes muito mais antigos na filosofia oriental. (SOCIEDADE TEOSÓFICA NO BRASIL: http://www.sociedadeteosofica.org.br. Acesso em: 25 Mai. 2014) 8 A Antroposofia (palavra derivada do grego anthropós, homem, e sophia, sabedoria) é uma filosofia de vida que reúne os pensamentos científico, artístico e espiritual numa unidade e que responde às questões mais profundas do homem moderno sobre si mesmo e sobre suas relações com o universo. Elaborada no início deste século pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), a Antroposofia é um método de conhecimento que aborda o ser humano em seus níveis físico, vital, anímico e espiritual, e mostra como essas naturezas, absolutamente distintas entre si, atuam em constante inter-relação. Trata-se de uma Ciência que se interessa pelos processos físicos abordados pelas ciências naturais e também por todos aqueles processos que não podem ser materialmente mensuráveis. Esta abrangente e organizada compreensão do ser humano e de suas relações com o Cosmos trouxe um substancial enriquecimento a todos os campos práticos da sociedade, contribuindo, com suas descobertas, para uma vida humana mais íntegra (GREUEL, Marcelo. O que é Antroposofia. Disponível em: http://www.associacaotravessia.org.br/html/antroposofia.html)
  • 23. 22 9 Ver KANDINSKY (1996) p. 35-39 10 Ver KANDINSKY (1996) p. 73, 83-84 11 Richard Wagner, dentro de uma linha de discurso romântico que teve grande impacto em músicos e outros artistas dos séculos XIX e XX, preconizou a obra de arte total, o Gesamtkunstwerk, a união sinergética de música e drama através da síntese de seus elementos, 'como efeito total sendo maior do que a soma de suas partes' e, mais ainda, sendo o 'testemunho da unidade natural de uma cultura de modo geral' (Flinn, 1992). 0 discurso wagneriano será adotado muitas vezes no século XX na defesa do cinema enquanto espetáculo artístico total, reunião de todas as artes, 'sétima arte', mas não se pode dizer, no entanto, que seja um discurso especificamente da sinestesia. (BASBAUM, 2001 p.47) 12 0 sistema musical elaborado por Schöenberg, no entanto, como sugere Riley (1995), 'faz o uso da ideia cor em sentidos variados'. Timbre e dissonância seriam duas das mais usuais. (Apud BASBAUM, 2001 p. 48) 13 A Revolução Russa de 1917 foi uma série de eventos políticos na Rússia, que, após a eliminação da autocracia russa, e depois do Governo Provisório (Duma), resultou no estabelecimento do poder soviético sob o controle do partido bolchevique. O resultado desse processo foi a criação da União Soviética, que durou até 1991. (SÓ HISTÓRIA (2009). Disponível em: http://www.sohistoria.com.br/ef2/revolucaorussa/) 14 Criada em 1919 pelo arquiteto germânico Walter Adolf Gropius (1883 - 1969) com a fusão da Academia de Belas Artes com a Escola de Artes Aplicadas de Weimar, Alemanha, a nova escola de artes aplicadas e arquitetura traz na origem um traço destacado de seu perfil: a tentativa de articulação entre arte e artesanato. Ao ideal do artista artesão defendido por Gropius soma-se a defesa da complementaridade das diferentes artes sob a égide do design e da arquitetura. O termo bauhaus - haus, "casa", bauen, "para construir" - permite flagrar o espírito que conduz o programa da escola: a idéia de que o aprendizado e o objetivo da arte ligam-se ao fazer artístico, o que evoca uma herança medieval de reintegração das artes e ofícios. A proposta de Gropius para a Bauhaus deixa entrever a dimensão estética, social e política de seu projeto. Trata-se de formar novas gerações de artistas de acordo com um ideal de sociedade civilizada e democrática, em que não há hierarquias, mas somente funções complementares. O trabalho conjunto, na escola e na vida, possibilitaria não apenas o desenvolvimento das consciências criadoras e das habilidades manuais como também um contato efetivo com a sociedade urbano-industrial moderna e seus novos meios de produção. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 8 Jun. 2014) 15 Movimento russo de arte abstrata, o suprematismo surge por volta de 1913, mas sua sistematização teórica data de 1925, do manifesto Do Cubismo ao Futurismo ao Suprematismo: o Novo Realismo na Pintura, escrito por Kazimir Malevich em colaboração com o poeta Vladimir Maiakóvski. O suprematismo está
  • 24. 23 diretamente ligado ao seu criador, Malevich, e às pesquisas formais levadas a cabo pelas vanguardas russas do começo do século XX, o raionismo de Mikhail Larionov e Natalia Goncharova e o construtivismo de Vladimir Evgrafovic Tatlin. Nesse contexto, o suprematismo defende uma arte livre de finalidades práticas e comprometida com a pura visualidade plástica. Trata-se de romper com a ideia de imitação da natureza, com as formas ilusionistas, com a luz e cor naturalistas - experimentadas pelo impressionismo - e com qualquer referência ao mundo objetivo que o cubismo de certa forma ainda alimenta. Malevich ainda fala em "realismo", e o faz com base nas sugestões do místico e matemático russo P.D. Ouspensky, que defende haver por trás do mundo visível um outro mundo, espécie de quarta dimensão, além das três a que os sentidos humanos têm acesso. O suprematismo representaria essa realidade, esse "mundo não objetivo", referido a uma ordem superior de relação entre os fenômenos - espécie de "energia espiritual abstrata" -, que é invisível, mas nem por isso menos real. (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 8 Jun. 2014) 16 Para o construtivismo, a pintura e a escultura são pensadas como construções - e não como representações -, guardando proximidade com a arquitetura em termos de materiais, procedimentos e objetivos. O termo construtivismo liga-se diretamente ao movimento de vanguarda russa e a um artigo do crítico N. Punin, de 1913, sobre os relevos tridimensionais de Vladimir Evgrafovic Tatlin (1885 - 1953). A consideração das especificidades do construtivismo russo não deve apagar os elos com outros movimentos de caráter construtivo na arte, que ocorrem no primeiro decênio do século XX, por exemplo, o grupo de artistas expressionistas reunidos em torno de Wassily Kandinsky (1866 - 1944) no Der Blaue Reiter [O Cavaleiro Azul], em 1911, na Alemanha; o De Stijl [O Estilo], criado em 1917, que agrupa Piet Mondrian (1872 - 1944), Theo van Doesburg (1883 - 1931) e outros artistas holandeses ao redor das pesquisas abstratas; e o suprematismo, fundado em 1915 por Kazimir Malevich (1878 - 1935), também na Rússia. Isso sem esquecer os pressupostos construtivos que se fazem presentes, de diferentes modos, no cubismo, no dadaísmo e no futurismo italiano.(ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTES VISUAIS, Acesso em: 8 Jun. 2014
  • 25. 24 REFERÊNCIAS AMERICAN SYNESTHESIA ASSOCIATION (2011). Disponível em: http://www.synesthesia.info. Acesso em: 07 Abr. 2014 BASBAUM, Sérgio Roclaw. Fundamentos da Cromossonia: Sinestesia, Arte e Tecnologia. Dissertação de Mestrado (2001). Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/114129633/Sergio-Basbaum-Sinestesia-arte-e-tecnologia- dissertacao-de-mestrado. Acesso em: 19 Mai. 2014. ______ Percepção Digital: Sinestesia, Hiperestesia, Infosensações. RUA - Revista universitária do audiovisual - Outubro 2008. Disponível em: http://www.rua.ufscar.br/site/?p=662. Acesso em: 31 Mar. 2014. ______ Sinestesia e percepção digital. TECCOGS (2012). Disponível em: http://www.pucsp.br/pos/tidd/teccogs/artigos/2012/edicao_6/9- sinestesia_e_percepcao_digital-sergio_basbaum.pdf. Acesso em: 31 Mar. 2014. CYTOWIC, Richard E. Synesthesia: Phenomenology And Neuropsychology: A Review of Current Knowledge. PSYCHE, 2(10), July 1995. Disponível em: http://www.theassc.org/files/assc/2346.pdf. Acesso em: 12 Mai. 2014. ______ Touching tastes, seeing smells – and shaking up brain science. Cerebrum, v.4,n.3: p.7–26, 2002. Disponível em: http://www.daysyn.com/CytowicCerebrum2002.pdf. Acesso em 12 Mai. 2014
  • 26. 25 DAY, Sean A. Synesthesia. Disponível em: http://www.daysyn.com. Acesso em: 07 Abr. 2014 FOLHA DE SÃO PAULO (COORD. E ORG). Wassily Kandinsky. Tradução de Martín Ernesto Russo. Barueri: Editorial Sol 90, 2007 – (Coleção Folha Grandes Mestres da Pintura: 18). GOMBRICH, Ernst Hans. A história da arte. Tradução Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: LTC, 2011 (Reimpr.). KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte e na pintura em particular . 2ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. ______ Ponto e Linha sobre Plano: Contribuições à análise dos elementos da pintura. 2ª Ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.